MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO ESTADO DO PARÁ

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MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS NO ESTADO DO PARÁ:

“É urgente melhorar e avançar” O Instituto Universidade Popular – UNIPOP, em conjunto com as entidades da sociedade civil, abaixo-assinadas, através do Programa de Promoção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes em Instituições Assistenciais e Judiciais no Estado do Pará (Pró-DCA), vem se propondo a fazer discussões e avaliações acerca do atendimento socioeducativo aos adolescentes autores de atos infracionais, oferecido pelo Estado e pelos Municípios Paraenses. Dentre as abordagens necessárias a se enfatizar, identificamos lacunas e desafios no atendimento socioeducativo, destacando-se: ausência de políticas públicas para adolescente usuário de drogas e programas de apoio à egressos do sistema socioeducativo, além das constantes denúncias de violência institucional a esses adolescentes, seja por parte da polícia – nas apreensões e intervenções dentro das unidades de internação – ou por monitores, que não conseguem compreender os princípios fundamentais do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE). O que se constata é a insuficiente atuação do Estado para tais questões que permeiam a execução das medidas socioeducativas no Pará. A Audiência Pública neste dia 05 de outubro de 2011, na Assembléia Legislativa, pretende ser um espaço que nos dê subsídios para mobilizar, monitorar e intervir politicamente no sentido de garantir a efetividade de políticas públicas para crianças e adolescentes asseguradas na Constituição Federal de 1988, no Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, no ECA, no SINASE, no Projeto Político Institucional da Fundação de Atendimento Socioeducativo do Pará – FASEPA (antiga FUNCAP) e nas Convenções Internacionais dos Direitos Humanos, as quais o Brasil é signatário e já ratificou no seu ordenamento jurídico interno. Como um dos parâmetros de análise do atendimento socioeducativo no Pará, apresentamos os resultados da pesquisa realizada de outubro de 2010 a março de 2011, pelo PróDCA, desenvolvido pela UNIPOP e por um conjunto de parceiros, como CEDECA EMAÚS, SDDH, SODIREITOS, Fórum Estadual DCA, FAMCOS-Santarém. Alguns dados se destacam: 1) 72% dos adolescentes inseridos no sistema socioeducativo são usuários de drogas, com destaque ao crack e à maconha; 2) 61% destes já haviam evadido do ambiente escolar ao cometerem atos infracionais; 3) Os atos infracionais, em sua grande maioria, são em decorrência de aspectos patrimoniais (furto, roubos, homicídios, latrocínios, entre outros), o que demonstra as necessidades de consumo, que a desigualdade social os impede de usufruir; 4) 61% dos adolescentes são reincidentes; 5) 63% já sofreram algum tipo de violência dentro da unidade de internação; 6) quase 80% tem como objetivo de vida estudar e trabalhar, quando for desligado do sistema. O desafio é que precisamos otimizar, neste momento, o aprofundamento no entendimento das causas deste grave problema, noutras palavras, articular nossas ações para fazer valer o artigo 4º do ECA”: “É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação


dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

Nesse sentido, conclamamos a sociedade paraense a problematizar e refletir a situação dos adolescentes autores de atos infracionais, cobrando mais empenho daqueles que compõem o chamado Sistema de Garantia de Direitos de Criança e do Adolescente. Da mesma forma, faz-se necessária a instigação para o comprometimento dos agentes públicos e políticos (Poderes Executivo e Legislativo), para a coerente e eficaz implementação de políticas públicas e de incremento ao orçamento, privilegiando ainda mais o público infanto-juvenil. Também deve ser instituído um compromisso com os formadores de opinião pública (imprensa, comunicadores, artistas, igrejas, lideranças), para que haja maior difusão desses direitos – sem distorções – promovendo maior conhecimento do texto legal, em prol da sociedade, expondo situações de violação e supressão de direitos, munindo-a de instrumentos de denúncia, cobrança, fiscalização e proposição. Nessa composição, os adolescentes e familiares não podem ficar alheios a este processo, cujo protagonismo e organização devem ser favorecidos, para que sejam defensores de seus direitos e do cumprimento de deveres. É importante destacar que não é de hoje que o Estado do Pará precisa pôr em prática o que determina o SINASE e o Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo, tendo em vista que a estrutura atualmente oferecida ainda é precária e que muitos profissionais que atuam no sistema socioeducativo padecem de melhores condições de trabalho, remuneração digna e de melhor convívio com os adolescentes internos. O atendimento socioeducativo deve assegurar aos adolescentes, mesmo àqueles em privação de liberdade, todos os direitos fundamentais, como educação, saúde, esporte, lazer e garantir a convivência familiar e comunitária. Mas, infelizmente, este processo de garantir os direitos desses adolescentes ainda está muito precarizado, longe do que preconiza o ECA. O certo é que todas as instâncias governamentais e da sociedade civil devem investir, como meta prioritária e absoluta, a implementação de condições dignas de trato com o adolescente que cometeu ato infracional para que ele/ela, durante o período de cumprimento da medida, possa se recuperar se for usuário de droga, continuar e/ou retomar seus estudos e obter uma profissionalização, para que ao concluir sua medida, possa vislumbrar outra perspectiva de vida e não retornar para a mesma situação que o levou à cometer a infração (61% de reincidência aponta a pesquisa). É preciso uma ação conjunta para que essas condições sejam criadas de forma mais ampla e eficaz e, para isso, faz-se necessário garantir mais recursos para políticas públicas tanto da Assistência Social quanto da Educação, da Saúde, do Esporte e Lazer, entre outros. Ou seja, fazer valer o SINASE, que, aprovado em 2006, teve como objetivo traçar uma série de estratégias e recomendações para a promoção de uma ação articulada entre União, Estados e Municípios, além do Poder Judiciário e do Ministério Público, da Defensoria, para o atendimento aos adolescentes autores de atos infracionais.


Outro ponto importante que ganha espaço na mídia é a ampliação do período de internação ou a redução da maioridade penal para internação dos adolescentes. Isto não é a solução, pois se constata, a partir de levantamento de organizações como Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA, que aponta a ineficácia das medidas em meio fechado, ou seja, das medidas que restringem liberdades e que representam maior custo administrativo para o Estado e mais violação da dignidade do ser humano, pois se torna um processo acelerado de desumanização. Então, o SINASE priorizou a aplicação de medidas em meio aberto, com a recomendação de que privação somente deve ocorrer em caráter excepcional e durante curto período de tempo, conforme determina o ECA. Busca-se, com isso, superar uma forte cultura de internação que ainda hoje existe em nosso país. Precisamos, também, exigir a implementação do Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo, construído em 2010, com boa participação da sociedade civil e representação das unidades de medidas socioeducativa, em evento realizado no Hangar. Além disso, a sociedade civil deve tomar conhecimento sobre a implementação do Plano Político Institucional do Atendimento Socioeducativo no Pará, construído pela FASEPA, cuja perspectiva é de quebrar o paradigma punitivo e abrir para uma nova pedagogia de atendimento ao adolescente, considerando-o sujeito de direitos, central nas práticas político-pedagógicas. Com o PPI, são elencadas mudanças de conteúdo e abordagens no atendimento socioeducativo, assim como em seus parâmetros e procedimentos. Para tanto, cabe ao Legislativo Paraense o devido incremento no Orçamento Público Estadual com políticas para os que mais precisam. Este ano será definido um novo Plano Plurianal – PPA (2012-2015), e esperamos que os deputados priorizem com recursos (ver alíneas de “a” a “d”, do artigo 4º, do ECA), a infância e a juventude, em especial a melhoria no sistema socioeducativo do Estado. Assim, os direitos da criança e do adolescente poderão ser cada vez mais respeitados. Desta feita, vimos propor uma agenda mínima para a esfera estadual em consonância com a política nacional traçada, buscando assegurar nos investimentos de planejamento os compromissos orçamentários, atendendo à política pública de atendimento aos adolescentes autores de atos infracionais. Com a participação de todos, teremos uma sociedade cada vez mais consciente e responsável para com os direitos da criança e do adolescente, a partir do momento que a interação necessária para a sonhada efetivação destes direitos esteja realmente consolidada, o que, em última análise, favorecerá o conjunto da sociedade brasileira. Vamos valorizar e reconhecer os avanços trazidos pelo ECA, sem olvidar em propor melhorias no seu texto e na execução de políticas públicas! Como síntese da inquietação e proposições, listamos as seguintes demandas: • Que as unidades de atendimento socioeducativo no Estado do Pará atendam aos parâmetros do SINASE, com estrutura física das unidades adequada para a execução das medidas, sem privar adolescente a direitos fundamentais como saúde, educação, profissionalização, lazer, entre outros.


• O elevado índice de drogadição dos adolescentes que cometem atos infracionais expressa um problema social da juventude contemporânea, mas revela, também, a ineficiência do Estado, que não possui um espaço socioeducativo destinado a este público. Assim, o Estado deve disponibilizar o tratamento psicossocial e de saúde adequado para os adolescentes drogadictos, para além das casas terapêuticas e religiosas, pois a diversidade deve ser respeitada. • Os adolescentes que cometem atos infracionais são, em sua maioria, oriundos de famílias com ocupações mal remuneradas, que se expressam na baixa renda, na elevada incidência de trabalho infanto-juvenil e, consequentemente, na ausência da referência familiar. Por isso, devem ser fortalecidos os laços familiares e a profissionalização desses jovens. • A elevada reincidência do ato infracional expressa a ineficiência do Estado em programas para os adolescentes “egressos”. É urgente o investimento na escolarização e profissionalização dos adolescentes, bem como em políticas públicas de “apoio ao egresso” no Estado do Pará, fundamentais para o retorno do adolescente ao convívio social; • Que o Estado amplie o quadro de servidores concursados e estáveis de maneira a garantir o aproveitamento das iniciativas de capacitação continuada, com destaque para a alta complexidade. Assim, chamamos a sociedade em geral para formação de um Comitê Paraense Interinstitucional do Sistema Socioeducativo para monitorar o que se tem implantado enquanto política pública, especialmente ao Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo. Belém (PA), 05 de outubro de 2011 Assinam esta Carta: Fórum Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente – Fórum DCA; Instituto Universidade Popular – UNIPOP; Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes – APACC; Sociedade de Defesa aos Direitos Humanos – SDDH.


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