Revista Território Solidário - Costa do Descobrimento - Instituto Mãe Terra 2020

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VELHO CHICO COSTA DO DESCOBRIMENTO VELHO CHICO VELHO CHICO Uma publicação da Humana Brasil e Secretaria do Trabalho, Emprego, UMA

PUBLICAÇÃO DO INSTITUTO

MÃE TERRA E SECRETARIA

DO

TRABALHO,

Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre EMPREGO, RENDA E ESPORTE DO GOVERNO DA BAHIA - SETRE VELHO CHICO Uma publicação da Humana e Secretaria do Trabalho, ANO 1,Emprego, N0 1, PORTO SEGURO - BAHIA VELHO Uma publicação da Humana Brasil e Brasil Secretaria do Trabalho, Emprego, ANO 1, Nº CHICO 1, SALVADOR, BAHIA Renda e Esporte do Governo da Bahia Setre Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre VELHO CHICO Uma publicação Brasil e Secretaria do Trabalho, Emprego, ANO Nºda 1, Humana SALVADOR, BAHIA Uma 1, publicação da Humana Brasil e Secretaria do Trabalho, Emprego, ANO Nº 1, 1, SALVADOR, BAHIA Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre Uma 1, publicação da Humana Brasil e Secretaria do Trabalho, Emprego, ANO Nº 1, SALVADOR, BAHIA ANO 1, Nº 1, SALVADOR, BAHIA Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre ANO 1, Nº 1, SALVADOR, BAHIA

REALIZAÇÃO : REALIZAÇÃO:

PARCERIA:

PARCERIA:



ÍNDICE

03

Editorial E ApresentAção

04 06 10 18 31 41

Economia solidária nA bAhiA

o ProjEto dEscobrindo a costa as VEias abErtas da CostA do desCobrimento Economia solidária: o que é importAnte pArA voCê

os EmPrEEndimEntos 1


EXPEDIENTE: GOVERNO FEDERAL

jair Bolsonaro Presidente onix lorEnzoni Ministro da cidadania Ênio antônio marquEs secretário nacional de inclusão social e Produtiva GOVERNO DA BAHIA

rui Costa Governador Davidson Magalhães secretário do trabalho eMPreGo renda e esPorte Milton Barbosa suPerintendente de econoMia solidária Dayvid Souza coordenador de forMação e divulGação INSTITUTO MÃE TERRA:

PRODUÇÃO:

Elismar FErnandEs Presidente

Altemar Felberg Gisele Porto Raony Palicer textos

altEmar FElbErg diretor executivo Calitta FElbErg gisElE Porto KarKajú Pataxó lia ValEntE raony PaliCEr equiPe técnica

bárbara almEida Projeto Gráfico e Editoração Raony Palicer revisão Lucas Porto fotoGrafias TIRAGEM: 300 E xEmplarEs G ratuitos VENDA PROIBIDA Revista Território Solidário, Edição única. Nov 2020 - Porto Seguro: Instituto Mãe Terra 2020. ISBN: 978-65-86639-20-9 | CDD: 330


EDITORIAL:

A Economia Solidária tem origem em práticas econômicas ancestrais de produção e troca de alimentos, de itens necessários para nossa subsistência e reprodução sociocultural de saberes, fazeres e afetos, estabelecendo como centro das relações, a vida e o bem-estar individual, coletivo e do meio ambiente, em contraponto com a economia capitalista. Essa economia alternativa não apenas apresenta produtos e formas de produção diversos, mas se organiza de maneira a romper com a lógica tradicional de hierarquização e exploração de pessoas e dos recursos, superando, assim, com o ciclo da desigualdade na produção. Trata-se de uma estratégia de desenvolvimento sustentável e solidário, que propõe ações urgentes para garantir as condições de vida no planeta, sem degradar o meio ambiente e respeitando o ciclo completo da natureza, ou seja, uma produção para a construção de um bem viver. Falar sobre economia solidária é falar sobre como vamos cuidar dos nossos formatos de trabalho, produção e reprodução cultural, daí a importância de abordar outros formatos de economia que cumpram com esse papel. É nesse contexto que surge o Projeto “Desenvolvimento Territorial Solidário: estruturação e fortalecimento de empreendimentos econômicos solidários da Costa do Descobrimento”, fruto de termo de colaboração entre o Instituto Mãe Terra (IMT) e a Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Estado da Bahia (SETRE/BA). Suas atividades foram executadas, desde fevereiro/2019, nos oito (8) municípios do território: Belmonte, Eunápolis, Itabela, Itagimirim, Itapebi, Guaratinga, Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália, que possuem uma rica diversidade sociocultural e ambiental. Acreditamos que o projeto despertou e relevou o potencial da economia solidária no Território, mas também suas fragilidades e desafios. Do ponto de vista econômico, a iniciativa fomentou a busca por alternativas de desenvolvimento comunitário para geração de trabalho decente, ocupação e renda. Do ponto de vista institucional, as atividades de apoio às associações/cooperativas fortaleceram os grupos para a reivindicação de políticas públicas de desenvolvimento local/territorial, associado à ampliação de direitos humanos e liberdades fundamentais. Do ponto de vista político, a promoção de políticas públicas e parcerias fortaleceu o processo de construção da autonomia dessas comunidades e o estabelecimento de redes de diálogo e cooperação, rumo à conquista de direitos e universalização da cidadania.

ExECuÇão

INSTITUTO MÃE TERRA

O Instituto Mãe Terra é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos, fundada em outubro/2006, com sede no Município de Porto Seguro e atuação no Território de Identidade Costa do Descobrimento - BA, tendo como missão “Potencializar os ativos das pessoas e das comunidades - tradicionais, do campo e periféricas, para o desenvolvimento integral e fomento dos seus arranjos produtivos, engajadas/os com a construção do bem viver”. Está estruturado em quatro maCro-aÇÕEs: Arranjos Produtivos Locais; Desenvolvimento Integral de Crianças, Adolescentes e Jovens; Gestão do Conhecimento e Percursos Formativos e; Participação, Articulação em Rede e Apoio Institucional. Por meio de iniciativas socioambientais estruturadas com base nessas macro-ações, tem como Visão “Ser um agente potencializador de tecnologias sociais para promoção do bem viver no Território de Identidade Costa do Descobrimento – BA.” www.maeterra.org.br @maeterra.org.br contato@maeterra.org.br

parCEria

SETRE

A Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Governo da Bahia - Setre, é o órgão público contratante do Projeto Território Solidário. A Setre tem a finalidade de planejar e executar as politicas de emprego e renda e de apoio à formação do trabalhador; executar e coordenar: a Política Estadual de Economia Solidária, a Política Estadual de Economia Solidária, a Política Estadual de Apoio ao Cooperativismo, a Política Estadual de Esporte e Lazer, bem como as ações de prevenção, Incentivo, promoção e divulgação do artesanato baiano.

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ECONOMIA SOLIDÁRIA na bahia

trabalHo

foto: pedro moraes

D

foto: pedro moraes

as economias alternativas ao modelo hegemônico de produção e consumo, tipificadas como economia solidária, do acesso, do compartilhamento, colaborativas etc., propõem, cada uma à sua abordagem, uma ressignificação das forças produtivas, tendo como base comum, a crítica ao capitalismo. Esses tipos de economia podem ser exemplificados em empreendimentos econômicos solidários; redes e cadeias de produção, comercialização e consumo; bancos comunitários; fundos rotativos solidários; clubes de troca, centrais e pontos fixos de comercialização; feiras de produtos e serviços; processos educativos baseados na pedagogia da autogestão, entre tantas outras formas. Esta última ação, pioneira, que parte da concepção de uma nova prática econômica, culminou na criação da Superintendência de Economia Solidária e Cooperativismo - SESOL, na Secretaria do 4

foto: camila souza

foto: camila souza

Trabalho, Emprego, Renda e Esporte - SETRE, atendendo a uma demanda da sociedade civil, representada pelo Fórum Baiano de Economia Solidária e outros atores, para o fomento aos Empreendimentos de Economia Solidária. Com a SESOL, o governo passa a planejar, coordenar, executar e acompanhar as ações e programas de fomento à economia solidária e ao cooperativismo no Estado da Bahia. Uma ação de destaque dessa nova superintendência é a promoção de políticas de economia solidária nos Territórios do Velho Chico, com um dos menores índices de Desenvolvimento Humano – IDH; no Território Itaparica, pela ampla quantidade de empreendimentos solidários, inclusive com presença de comunidades indígenas e; no Território da Costa do Descobrimento, por possuir grande número de empreendimentos econômicos solidários (EES),


Essa ação da SETRE, em parceira com o Ministério do Trabalho – MTE, objetivou proporcionar ações de estruturação e de fortalecimento de empreendimentos econômicos solidários como estratégia de superação da extrema pobreza e de promoção da melhoria da qualidade de vida a partir da construção e da integração de ações e de políticas públicas de desenvolvimento territorial no Estado da Bahia.

moção da economia solidária na Bahia. Tem como objetivo gerar trabalho e renda através do associativismo e cooperativismo solidário, e promover o desenvolvimento local e territorial, atuando em quatro frentes estratégicas: 1) Centro Público de Economia Solidária da Bahia – Assistência Técnica aos EES e suas redes territoriais; 2) Rede Centros Vocacionais Tecnológicos – Formação e difusão tecnológica para inclusão socioprodutiva; 3) credibahia (Programa de Microcrédito do Estado da Bahia) – Acesso ao crédito e finanças solidárias e; 4) Prove (Promoção e Vendas da Economia Solidária) – Promoção, vendas e acesso a mercados.

Foi em colaboração a essa ação que o Instituto Mãe Terra desenvolveu o Projeto “Desenvolvimento Territorial Solidário na Costa do Descobrimento”, voltado a estruturar e fortalecer vinte (20) empreendimentos econômicos solidários, os quais, em seu conjunto, ofertam produtos advindos da agricultura familiar, beneficiados de frutas, derivados da mandioca, mel, pescados e mariscos, artesanatos, produtos reciclados e opções de turismo étnico-cultural.

Nesse fulcro, a economia popular e solidária constitui-se como uma estratégia para o desenvolvimento e como alternativa de geração de renda. Esta economia é fundada em relações de colaboração e cooperação, inspirada por valores culturais que colocam o ser humano como sujeito e razão das atividades econômicas, não como mero objeto e instrumento de desenvolvimento do capital. Possui como diretrizes a solidariedade, a divisão justa dos frutos do trabalho, a ampla participação da sociedade civil e a sustentabilidade social, econômica e ambiental e encontra no cooperativismo e no associativismo suas maiores expressões.

sobretudo aqueles ligados a povos e comunidades tradicionais, nesta revista representados.

O proGrama baHia soliDária, outra estratégia da SETRE/SESOL, configura-se, também, como um grande impulsionador das políticas públicas de pro-

ECoNomia soliDária

foto: Yago matheus

foto: marcelo reis

foto: Yago matheus

foto: andré frutuoso

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o projEto Vinte empreendimentos distribuídos pelos oito municípios da costa do descobrimento participaram do projeto desenVolVimento territorial solidário, que Visou estruturar e fortalecer a economia solidária no território.

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ruto do Termo de Colaboração nº 016/2018 entre a Organização da Sociedade Civil, Instituto Mãe Terra (IMT), e a Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte do Estado da Bahia (SETRE/BA), o projeto “Desenvolvimento Territorial Solidário: estruturação e fortalecimento de Empreendimentos Econômicos Solidários como estratégia de superação da pobreza no Estado da Bahia – Território Costa do Descobrimento” foi realizado entre os meses de fevereiro de 2019 e novembro de 2020. Suas atividades foram executadas nos oito (8) municípios do Território de Identidade Costa do Descobrimento – a saber, Belmonte, Eunápolis, Itabela, Itagimirim, Itapebi, Guaratinga, Porto Seguro e Santa Cruz Cabrália. Esses municípios possuem frágeis indicadores socioeconômicos, conforme demonstrou o último levantamento do Atlas do Desenvolvimento

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Humano (2018), porém, contam grande potencial de inovação e desenvolvimento. O público participante do projeto é composto por trabalhadores/as rurais e da pesca, incluídos neste grupo agricultores familiares e outras formas de produção familiar, assentados ou em processo de assentamento, pescadores, piscicultores, populações tradicionais étnicas e trabalhadores/as em atividades sujeitas a sazonalidade ou instabilidade na ocupação e fluxo de renda. Para esse público, muitas vezes a economia solidária é uma saída, pela impossibilidade de se encaixar na economia “tradicional”. O principal objetivo da economia solidária é organizar empreendimentos econômicos para viabilizar alternativas de trabalho e renda para grupos de pessoas, nos quais todos são responsáveis pelo que o empreendimento vai produzir ou pelos


serviços que vai prestar, como ele vai produzir e o que fará com os resultados.

• 02 feiras de economia solidária

Diferente da economia capitalista, a viabilidade de um empreendimento de economia solidária não pode ser avaliada somente pelos seus resultados econômicos. Como, na economia solidária, todas as pessoas que trabalham em um empreendimento devem ser sócios, participar das decisões sobre o que vão fazer e como vão organizar o trabalho e o que fazer com os resultados, a gestão do empreendimento e os frutos dessa gestão são tão importantes como os seus resultados financeiros e a sua viabilidade econômica. Porém, a economia solidária não é apenas uma prática de solidariedade, mas também, um modelo de economia, que deve ser considerado como uma alternativa ao capitalismo neoliberal, não como emenda no tecido social esgarçado, mas como uma possibilidade real de democratização econômica.

• 01 pesquisa de mercado

Assim, por meio do desenvolvimento do Projeto Desenvolvimento Territorial Solidário, pretendeu-se provocar três grandes impactos e mudanças sociais. Do ponto de vista econômico, a iniciativa promove alternativas de desenvolvimento sustentável de comunidades vulneráveis para geração de trabalho, ocupação e renda. Do ponto de vista institucional, as atividades de apoio às associações trazem fortalecimento e empoderamento para comunidades, promovendo políticas públicas que relacionem o desenvolvimento com a promoção de direitos humanos e liberdades fundamentais. Do ponto de vista político, a promoção de políticas e parcerias públicas fortalece o processo de afirmação da identidade destas comunidades, dando continuidade a iniciativas políticas de conquista de direitos.

N.º GErais do projeto

• 20 empreendimentos, distribuídos em 8 municípios • 20 Estudos de Viabilidade Econômica e 20 Diagnósticos Participativos realizados • 10 atividades formativas presenciais e 12 videoaulas disponíveis online

• 1800 horas de assessoria técnica

N.º GErais dos participantes • 58% dos participantes são mulheres

• 77% se identificaram como pardos ou pretos, 13% como indígenas • 24% assentados e acampados da reforma agrária, 15% pescadores, 15% povos indígenas, 3% ribeirinhos. • 81% tem a economia solidária como a principal atividade • 75% recebem menos de um salário mínimo • 76% nunca tinha participado de treinamentos, encontros ou seminários de economia solidária. • 85% nunca tinha participado de uma feira de economia solidária

DaDos dos empreendimentos

• 16 associações (80%), 2 cooperativas (10%), 1 rede (5%) e 1 grupo informal (5%) • 80% dos empreendimentos são rurais • 80% dos empreendimentos desenvolvem alguma ação social ou comunitária • 8 empreendimentos (40%) cuja principal produção é a agricultura familiar e /ou orgânica, 4 empreendimentos (20%) de mandiocultura, 2 empreendimentos (10%) de apicultura, 2 empreendimentos (10%) de pescados ou mariscos, 1 empreendimento (5%) de etnoturismo, 1 empreendimento (5%) de costura, 1 empreendimento (5%) de materiais recicláveis e 1 empreendimento (5%) cuja principal produção é o artesanato • Principal motivo citado para a criação dos empreendimentos foi o “desenvolvimento comunitário de capacidades e potencialidades” • Juntos, os 20 empreendimentos movimentam mensalmente cerca de R$330.000,00 7


“desenvolvimento comunitário de capacidades e potencialidades” •

Juntos, os 20 empreendimentos movimentam mensalmente cerca de 300 mil reais

GráfiCo 01: DistribuiÇão Do faturamENto Do projEto DEFaturamento aCorDodas Com a atiViDaDE ECoNômiCa categorias do Projeto Molhos, Doces e Geléias temperos e condimentos 2% 1%

Café, Chá e Cacau 3%

Laticínios 4%

Roupas, Calçados e acessórios 1%

Casa e cozinha 4% Mel e derivados 6%

Frutas e Legumes 34%

Farinhas e derivados 19% Peixes e Mariscos 26%

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

dados comparatiVos dos

EmprEENDimENtos Dados comparativos dos empreendimentos

• 62% dos empreendimentos sabem qual a quan• 62% dos empreendimentos sabem qual a quantidade mínima de produtos tidade mínima de produtos ou serviços precisa ser ou serviços para cobrir todos os custos – antes do vendida para cobrir todos os custosprecisa – antesser do vendida projeto eram 37% projeto eram 37%

• 37% dos empreendimentos buscaram e 25% buscaram e 25% obtiveram crédito ou • 37% dos empreendimentos obtiveram crédito ou financiamento – antes do projefinanciamento antes do projeto 30% havia buscado e 15% havia obtido to 30% havia buscado e 15% havia– obtido crédito ou financiamento crédito ou financiamento

fazem reserva de fazem reserva de manutenção dos • 38% dos empreendimentos • 38% dos empreendimentos manutenção dos equipamentos – antes do projeto equipamentos – antes do projeto eram 13% eram 13%

• 62% dos empreendimentos encontram dificuldades para a comercialização encontram dificul• 62% dos empreendimentos dades para a comercialização antes do projeto – antes do– projeto eram 87% eram 87% • 63% dos empreendimentos possuem sede própria – antes do projeto eram 38% • 75% dos empreendimentos utilizam equipamentos próprios – antes do projeto eram 50% 8

apresentação cultural do samba de roda das marisi seminário e feira de economia solidária e agricultura familiar da costa do descobrimento

queiras no


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DEsCobriNDo a Costa o território de identidade costa do descobrimento ainda traz inÚmeras marcas da colonização portuguesa, porém, sua história é muito mais ampla e não se limita ao litoral.

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A

história do território hoje chamado de costa do descobriMento começa muito antes do nascimento da colônia que viria a se tornar país. Mata fechada, abundância e diversidade da fauna e flora, povos originários vivendo em estreita e respeitosa relação com o ambiente, princípios, práticas e espiritualidade de comunhão com a natureza, estes eram os aspectos compartilhado pelas nações que aqui existiam.

Uma visão mercantil, com práticas de exploração devastadoras, foi a forma de colonização iniciada na região. Uma colônia que surge suprimindo nações preexistentes e extraindo suas riquezas naturais, para o enriquecimento da metrópole e de poucos colonizadores, agraciados pela coroa. Passados mais de cinco séculos, políticas compensatórias são necessárias e urgentes para a mitigação da desigualdade decorrente deste modelo.

a Vista do alto do monte pascoal explicita o contraste entre o desmatamento promoVido pelo agronegócio e a conserVação das matas originais promoVida pelos poVos originários.

O

Monte Pascoal, foi o primeiro ponto da costa brasileira avistado, antes do desembarque dos

portugueses, em 1500. Hoje o parquE NaCioNal

Do

moNtE pasCoal é guardado pelos Pataxó da Aldeia

Pé do Monte, que guiam visitantes até o seu cume, em meio a mata preservada, mas ameaçada pelo desmatamento ilegal.

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A associação que representa a aldeia é uma dos participantes do projeto Desenvolvimento Territorial Solidário, trabalho desenvolvido pela Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte, e executado pelo Instituto Mãe Terra, que procura colaborar para a instauração da justiça, desenvolvimento sustentável e reconhecimento dos povos e

comunidades tradicionais, visando a restauração da terra e melhoria da qualidade de vida do seu povo, em busca do “Bem Viver”, baseado em princípios herdados dos povos originários. Para tanto, os esforços das políticas governamentais, na presente gestão, abrangem os oito municípios do território, cada um com sua história e importância.

o centro histórico de porto seguro preserVa construções do período colonial

Porto seGuro o epicentro da colonização, passou ao longo dos séculos por transformações políti-

co-administrativas, sociais, culturais e econômicas, transformando-se, com a conclusão da rodovia BR-101, em 1972, em um importante centro turístico. Além da Associação Pataxó Aldeia Pé do Monte (APAPEM), mais quatro empreendimentos participam do projeto, contando com mais uma aldeia Pataxó, uma cooperativa de artesanato da periferia da cidade, um coletivo de mulheres rurais agroecológicas e um núcleo de uma rede de certificação orgânica.

santa cruZ cabrália disputa com os municípios de Porto Seguro e Prado, a primazia de ter

sido o local de chegada dos portugueses ao Brasil em 1500 e onde foram realizadas a 1ª e a 2ª Missas no Brasil, ambas celebradas por Frei Henrique de Coimbra, capelão da armada de Pedro Álvares Cabral. 12


Em 1536, Pero do Campo Tourinho fundou uma povoação denominada Vera Cruz, que foi arrasada pelos Aimorés em 1564. Em decorrência do ataque, os habitantes constituíram uma nova povoação conhe-

cida por Santa Cruz, a qual, na década de 1580, foi transferida para um platô na foz do Rio João de Tiba, o atual Centro Histórico, com melhores condições de defesa contra os frequentes ataques indígenas.

encontro do mar com o rio joão de tiba, Visto a partir do centro histórico de santa cruz cabrália

A Vila de santa cruz é criada em 1833, sendo agregada ao município de Porto Seguro em 1931. Em 1933, passa a chamar-se Santa Cruz Cabrália, para tornar-se novamente autônoma, como cidade, em 1938. Na década de 1970, com a conclusão da BR-101 e a construção da estrada oriunda de Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália passa atrair também grande fluxo de turistas. Algumas aldeias e indígenas se beneficiam deste progresso, mas a maioria per-

manece numa difícil situação socioeconômica e ainda lutam pela demarcação de boa parte de suas terras ameaçadas. Uma das aldeias contempladas pelo projeto encontra-se distante dos centros comerciais e enfrenta dificuldade com relação à geração de renda. Uma realidade que não mudará sem a ampliação de políticas de proteção e promoção de direitos dos povos tradicionais. Também faz parte do projeto uma associação de produtores rurais do município.

belMonte, durante muito tempo, foi importante porta de entrada para Minas Gerais, através do rio Jequitinhonha, única via navegável até Salto da Divisa. Localizada entre este importante rio e o oceano Atlântico, o local floresceu devido ao cultivo do cacau, no final do século XIX, tornando-se cidade em 1891, com o nome Belmonte do Jequitinhonha. 13


Antes da praga da vassoura-de-bruxa impactar drasticamente esta cultura, o cacau representava 80% da economia do município (hoje, corresponde a apenas 17%). Por outro lado, as produções dos segmentos de pecuária e pesca têm significância na renda do município. Na foz do Jequitinhonha, ainda existem manguezais com a vegetação típica local e uma fauna riquíssima.

O projeto Desenvolvimento Territorial Solidário beneficia um coletivo predominantemente de mulheres agricultoras da região, um coletivo de pequenos agricultores do distrito de Petrolândia e um coletivo exclusivamente de mulheres marisqueiras e pescadoras. As últimas avançaram nas duas últimas décadas em direção a sua autonomia e valorização do ofício, conquistaram a unidade de beneficiamento e os equipamentos para viabilizar seu trabalho.

o jequitinhonha deságua no mar em belmonte, mudando a coloração da água e dando à cidade seu epíteto “cidade do mar moreno”.

O grande desafio é realizar a comercialização a preço justo, em um comércio dominado por atravessadores. A luta pela independência econômica é acompanhada

pela luta por todos os direitos ainda não conquistados e pelo fortalecimento da identidade local, ligada às tradições de pesca e coleta de mariscos do mangue.

itaPebi, termo tupi que significa “água da pedra achatada” (itá = “pedra”, peb = “achatado” e ‘y = “água”),

dá nome ao próximo município. A cidade teve sua origem de moradores do povoado de Cachoeirinha, localizado nas proximidades do rio, deslocados por sucessivos acontecimentos naturais. Sua população era composta de agricultores, pescadores, artesãos e pequenos comerciantes que utilizavam canoas para chegar aos centros comerciais. Elevado a distrito em 1938, do município de Belmonte, torna-se município em 1958, abarcando Itagimirim. 14


Devido às enchentes recorrentes do Rio Jequitinhonha, surge um novo núcleo de povoamento mais afastado das margens, a Cidade Nova ou Cidade Alta que se tornou sede em decorrência da concentração da população. A dinâmica socioeconômica de Itapebi é baseada na silvicultura, com o plantio de eucalipto e agropecuária, ambas atividades de grande impacto na Mata Atlântica. O esforço do projeto é no apoio a um coletivo de mulheres costureiras, um coletivo de agricultura

familiar diversificada, mas que promove o resgate do cacau e um coletivo de produção de Tilápia, formada por pescadores transformados em piscicultores, impactados pelo assoreamento do Rio Jequitinhonha. Dois municípios constituíram-se a partir da exploração da madeira advinda da exuberante Mata Atlântica da região: Itagimirim e Itabela. O início da povoação de Itagimirim data da década de 1930.

cidade baixa de itapebi, às margens do jequitinhonha, o assoreamento do rio é uma ameaça às populações das cidades que se encontram abaixo da represa.

Reza a lenda que dois foragidos da justiça se estabeleceram em uma clareira ocasionada pela extração de madeira e fizeram um barracão para fins comerciais de gêneros alimentícios, utensílios e ferramentas para os exploradores. Este local tornou-se ponto de pouso para tropeiros que faziam comércio entre Minas Gerais e o extremo sul da Bahia, mas teve um rápido declínio devido ao decrescimento da exploração madeireira.

Apenas com a chegada de um motor de luz a diesel, em 1954, o povoado passa beneficiar arroz. Emancipado em 1962, o município tem uma economia que se distribui entre construção civil, serviços e comércio; Agropecuária, Extração Vegetal, Caça e Pesca e Administração. Os dois empreendimentos apoiados pelo projeto no município têm a mandioca e derivados como produto principal. 15


itabela, também surge com a chegada de madeireiros, por volta de 1949. Em meados da década de 1960, milhares de imigrantes ligados à exploração madeireira ocupam a microrregião, protagonizando a chamada “febre do jacarandá”. As fontes principais de renda da cidade, que se emancipou em 1989, são o cultivo do café e do mamão, seguidos pelo cacau, coco-da-baía, banana e maracujá, bem como a pecuária e o comércio. Neste

município o projeto apoia um coletivo de apicultores, cuja produção de mel, a partir da florada do café, é bastante apreciada.

a cultura da mandioca e o processamento da farinha são atiVidades importantes do município de itagimirim e seu distrito de união baiana.

GuaratinGa originou-se dentro de uma propriedade da Sra. Maria da Conceição que deixou em testamento sua fazenda para a fundação de um arraial. Com terras boas para o cultivo, desencadeou-se relativo crescimento a partir dos cultivos de subsistência de mandioca, milho, feijão e outros cereais e da criação de gado. A produção excedente, para fins comerciais, era levada para Porto Seguro, a 118 km de distância, através de tropas, em picadas. O arraial prosperou, 16

elevando-se a distrito subordinado a Porto Seguro, quando então passou a ser denominado Guaratinga, que na língua Tupy significa Garça Branca. Em 1961, passa à categoria de município. Guaratinga é um município que tem grandes potenciais turísticos inexplorados, como outros pontos do


território, mas seu diferencial encontra-se no relevo montanhoso, com pequenos riachos e cachoeiras que compõem uma paisagem surpreendente. Neste município, o apoio do projeto volta-se a uma coope-

rativa de temperos e um coletivo de apicultores, cujo volume e qualidade da produção de mel é referência na região.

a pedra do oratório demonstra a beleza do releVo e o potencial turístico do município de guaratinga.

eunáPolis surgiu pela permanência dos chamados garimpeiros, profissionais que construíam estradas

usando pás picaretas e galeotas, na região inicialmente conhecida como km 64, que era a distância de Porto Seguro ao entroncamento da futura BA-2, atual BR-101. A cidade iniciou-se com a construção de choupanas para abrigar os que esperavam a chegada das empreiteiras que iriam dar continuidade à construção da estrada principal. O vilarejo cresceu bastante, chegando a ser conhecido pelo topônimo de Eunápolis, como o “Maior Povoado do Mundo”. Hoje a cidade concentra o comércio e rede de serviços mais diversificados da região, mantendo uma área rural produtiva. Em Eunápolis, o projeto apoia um empreendimento urbano baseado em reciclagem e um coletivo rural, formado por mulheres assentadas, que possuem a mandioca como matéria prima para produtos diversificados. Por todo território Costa do Descobrimento, a exploração, a extração e destruição permanecem sen-

do a forma de ocupação, mas a luta por sua preservação e desenvolvimento também se tornou marca de sua história. Hoje, a biodiversidade e a riqueza cultural têm sido valorizadas pelo seu grande potencial, que colabora para o desenvolvimento socioambiental sustentável da região. É com esse objetivo, de se desenvolver sustentavelmente, sem impactar negativamente os recursos naturais e sem explorar os trabalhadores participantes, que atuam os vinte empreendimentos participantes do projeto. 17


as VEias abErtas Da costa do descobrimento os

diagnósticos participatiVos, realizados nos Vinte empreendimentos mostram um cenário de contradições típicas da américa latina e persistente há mais de cinco séculos. por gisele porto

C

omeçamos esta análise mobilizando trechos de parte da introdução do Livro “As veias abertas da América Latina” de Eduardo Galeano (2010), livro indispensável para uma reflexão profunda do nosso lugar na conjuntura global, desde o início da idade moderna, quando fomos invadidos e violentados, física e simbolicamente, justamente nesta bela e rica costa, denominada “Costa do desCobrimento”, perspectiva adotada a partir da visão de mundo do colonizador.

120 milHÕEs DE CriaNÇas No CENtro Da tormENta 1 A divisão internacional do trabalho significa que alguns países se especializam em ganhar e outros em perder. Nossa comarca no mundo, que hoje chamamos América Latina, foi precoce: especializou-se em perder desde os remotos tempos em que os europeus do Renascimento se aventuraram pelos mares e lhe cravaram os dentes na garganta. Passaram-se os séculos e a América Latina aprimorou suas funções. Ela já não é o reino das maravilhas em que a realidade superava a fábula e a imaginação era humilhada pelos troféus da conquista, as jazidas de ouro e as montanhas de prata. Mas a região continua trabalhando como serviçal, continua existindo para satisfazer as necessidades alheias, como fonte e reserva de petróleo e ferro, de cobre e carne, frutas e café, matérias-primas e alimentos, destinados aos países ricos que, consumindo-os, ganham muito mais do que ganha a América Latina ao produzi-los. [...] Do descobrimento aos nossos dias, tudo sempre se transformou em capital europeu ou, mais tarde, norte-americano, e como tal se acumulou e se acumula nos distantes centros do poder. Tudo: a terra, seus frutos e suas profundezas ricas em minerais, os homens e sua capacidade de trabalho e de consumo, os recursos naturais e os recursos humanos. O modo de produção e a estrutura de classes de cada lugar foram sucessivamente determinados, do exterior, por sua incorporação à engrenagem universal do capitalismo. [...] Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória dos outros. Nossa riqueza sempre gerou nossa pobreza por nutrir a prosperidade alheia: os impérios e seus beleguins nativos. Na alquimia colonial e neocolonial o ouro se transfigura em sucata, os alimentos em veneno. [...] O capitalismo central pode dar-se ao luxo de criar seus próprios mitos e acreditar neles, mas mitos não se comem, bem sabem os países pobres que constituem o vasto capitalismo periférico.

1 Versão brasileira de “As veias abertas da América Latina” – Eduardo Galeano. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4194484/mod_resource/content/1/As%20veias%20abertas%20da%20Am%C3%A9rica%20Latina.pdf> 18

18


A

ssim, comprometidos com esse movimento de busca pela autonomia, autodeterminação e construção de um desenvolvimento de novo tipo, do bem viver, que abaixo apresentamos uma análise dos resultados de 20 encontros de diagnósticos participativos, baseados no levantamento das Fortalezas, Oportunidades, Fraquezas e Ameaças referentes aos processos produtivos e relacionais dos 20 EES da Costa do Descobrimento, assistidos pelo projeto “Desenvolvimento Territorial Solidário: estruturação e fortalecimento de Empreendimentos Econômicos Solidários como estratégia de superação da pobreza no Estado da Bahia”.

No conjunto desses encontros, estiveram presentes 409 associados e cooperados, os quais expuseram suas percepções do processo, através de 1141 opiniões, referidas no documento como “menções”, categorizadas e organizadas nos gráficos compartilhados neste documento. É a dramática história da América Latina que se perpetua, através de seu povo que luta e permanece à margem das riquezas que ele próprio produz.

no conjunto desses ENCoNtros, estiVeram presentes 409 associados e cooperados

19


sobre fortaleZas Sobre fortalezas

Comentado [GP3]: Todo trecho sobre fortalezas deve ocupar 3 páginas, não mais, nem menos. Usar o que está marcado em negrito como destaque para ocupar o espaço das 3 páginas

gráfico 02: menções às fortalezas: QUADRO GERAL DE MENÇÕES ÀS FORTALEZAS:

Comentado [GP4]: Cuidado no manuseio do gráfico, pois a legenda não pode sumir. Ele deve ficar grande para ter leitura. Tem 19 legendas.

valor cultural da mandioca 3 4 5 7 8

ações educativas empoderamento feminino referência local

Tenho duas armas para lutar 8

82

serviço público conquistado

9

11 12

tramitação fundiária gestão qualificada

15

participação democrática articulação de parceirias

62

outros

22

infraestrutura/equipamentos saberes ténicos cultura tradicional/popular/ancestral agroecologia /sustentablidade

e o galope do sonho.

20

saberes

sentimentos positivos

e até a morte: o riso a cavalo

14

saberes tradiconais

produtos diversificados

contra o desespero, tristeza

10

23 60 39 45

atitude empreendedora

É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver. ariano suassuna

solidariedade/coletividade

Fonte: Diagnósticos Participativos, IMT, 2020. “Tenho duas armas para lutar contra o desespero, tristeza e até a morte: o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.” Ariano Suassuna

E

Em meio à luta pela terra e pela vida, em posição de enfrentamento à lógica capitalista,

que devasta, territórios concretos e subjetivos, os 20poempreendimentos de economia mdesde meio1500, à luta pela terra e pela vida, em Aparentemente,

a luta comum pela conquista da tersolidária que diagnosticamos, acompanhamos e apoiamos, constituíram-se coletivos sição de enfrentamento à lógica capitalista, raenquanto e pela sobrevivência da coletividade – à revelia das que resistem através de fortalezas internas, conquistadas e reconquistadas dia após dia. que devasta, desde 1500, territórios condificuldades impostas por um país essencialmente laticretos e subjetivos, os 20 empreendimentos de ecofundiário e historicamente violento contra suas popunomia solidária que diagnosticamos, acompanhamos lações tradicionais e periféricas – e o desejo e escolha e apoiamos, constituíram-se enquanto coletivos que grupal de empreender coletivamente, motivaram a resistem através de fortalezas internas, conquistadas e constituição destas 18 associações e 02 cooperativas. reconquistadas dia após dia. Esses coletivos organizados, mesmo com as dificuldades relatadas nas fraquezas e ameaças abaixo, são Mesmo com toda a dificuldade intrínseca da conviverdadeiros empreendimentos, pois 62 vezes aparevência, das 473 menções às fortalezas, 82 vezes focem menções às características empreendedoras dos ram feitas menções a aspectos que remetem a um participantes como fortalezas. comportamento de “solidariedade e coletividade”.

20


Outro aspecto bastante recorrente nas falas, de forma distribuída entre os coletivos, foram menções do que generalizamos aqui como “sentimentos positivos”, que aparecem como fé, confiança, apoio mútuo, otimismo, entre outros que extrapolam as relações de trabalho e permeiam as relações pessoais, principalmente entre mulheres, especialmente as solteiras, mães solo, separadas ou viúvas, que se apoiam mutuamente, que embora tenhamos escolhido separar das menções denominadas de solidariedade e coletividade, por referirem a sentimentos mais do que posturas com o outro, sentimento e ação, são duas faces de uma forma de existir que se revelou, em alguns aspectos fundamentais, oposta à forma de existir do mundo contemporâneo, individualista. Talvez a facilidade para conviver com a diversidade de posturas, pensamentos e histórias advenha da convivência com a diversidade da natureza e dos processos produtivos, pois 45 vezes apareceu a menção à diversidade da produção, ou seja ao redor de 2 menções por encontro, o que era corroborado pelo coletivo, significando concordância de praticamente os 409 presentes (mesmo sem a menção explícita de todos). Todos reconhecem a enorme riqueza real conquistada pelo esforço da lida coletiva na produção agrícola, neste fértil, embora “machucado”, território. Produção esta que vem carregada por grande valorização e conhecimento agroecológico e de sustentabilidade (com 39 menções). Importante salientar que, neste contexto retratado, tal conhecimento foi adquirido através da cultura, passada por gerações, dos ancestrais referenciados como o que há de mais sagrado: a cultura popular, tradicional e ancestral, com 23 menções. Essa população, em oposição ao neoliberalismo que avança no país e no mundo, valoriza seus idosos, o que é antigo, tradicional, mesmo que considerado “improdutivo” ou ultrapassado para outras culturas, essencialmente urbanas e de consumo. São comunidades que tem saberes tradicionais (10 menções) e saberes difusos diversos (15 menções, somando 25 menções) e embora também tenham saberes técnicos (22 menções), este é insuficiente, diante dos avanços tecnológicos e principalmente das burocracias governamentais, o que aparecerá nas fraquezas.

Ocupando um lugar de menor centralidade nas conversas, aparece a conquista de infraestrutura que, por serem fruto de luta há muitos anos, é relativamente baixa (20 menções), sendo um aspecto considerado mais como fraqueza ou ameaça. A articulação de parcerias e a participação democrática em instâncias e mecanismos de participação, como conselhos de políticas públicas, por exemplo, aparecem, respectivamente, 12 e 11 vezes, sendo um processo em andamento, com maiores conquistas por alguns coletivos e poucas por outros. Serviços públicos conquistados, com 8 menções, referem-se à capacidade de participação, articulação e de demandar benefícios, principalmente em localidades mais isoladas. Tramitações fundiárias, também com 8 menções, refere-se a parciais conquistas, em meio a um contexto de luta entre poderes desiguais, em geral se arrastando por anos, sem conclusão satisfatória, pois tais tramitações referem-se a comodatos de curta duração e terras em antigos processos de homologação. A baixa ocorrência do “empoderamento feminino” (5 menções) deve-se aparentemente à dificuldade da percepção deste processo por parte das mulheres que não nomeiam o machismo e ainda estão distantes dos conceitos feministas; entretanto, esse é um processo que atravessa todos os coletivos femininos e a maior parte das mulheres. Mesmo em comunidades mais religiosas e tradicionais, onde o patriarcado e o machismo não é motivo de queixas, as conquistas das mulheres saltam aos olhos de qualquer observador mais atento e sensível a tais lutas. O valor cultural da mandioca aparece nos empreendimentos onde esta cultura é central e aponta para um avanço em direção a produtos locais identitários, percepção e processo ainda incipientes, mas com potencial explosivo. O item “Outros” presente no gráfico é composto por: identidade local, 1 menção; institucionalidade, 1 menção; liderança positiva, 1 menção; qualidade dos produtos, 1 menção; autonomia alimentar, 2 menções; capacidade produtiva, 2 menções; certificações/selos, 2 menções; crédito financeiro, 2 menções e; distribuição diversificada, 2 menções. Tomados conjuntamente, formam, assim, um conjunto de fortalezas ainda incipientes, em alguns casos, com o conceito oposto aparecendo de forma significativa em fraquezas. 21


sobre as fraqueZas

Sobre as fraquezas

Comentado [GP5]: Fraquezas ocupam 2 páginas

gráfico 03: menções às fraquezas

QUADRO GERAL DE MENÇÕES ÀS FRAQUEZAS

Comentado [GP6]: Devem aparecer 12 legendas

falta de identidade da marca sentimentos negativos

...é muito difícil você vencer

falta de consciência ambiental

a injustiça secular, que dila-

outros falta de formalização/certificação

cera o Brasil em dois países

falta de saberes técnicos

distintos: o país dos privile-

falta de recursos financeiros

giados e o país dos despos-

deficiência logística deficiência de gestão

suídos.

falta de infraestrutura

ariano suassuna

postura desagregadora deficiência de equipamentos/insumos

Fonte: Diagnósticos Participativos, IMT, 2020. “...é muito difícil você vencer a injustiça secular, que dilacera o Brasil em dois países distintos: o país dos privilegiados e o país dos despossuídos.” Ariano Suassuna

A

A riqueza natural da região, oportunidade somada às tantas fortalezas de sua

população, encontra um país historicamente negligente, para dizer o mínimo, com seu

riqueza natural da região, oportunidade somada às tantas fortalezas de sua população, encontra um país historicamente negligente, para dizer o mínimo, com seu povo trabalhador. As fraquezas elencadas poderiam ser consideradas facilmente como ameaças ou falta de oportunidades; entretanto, são internalizadas pelo público participante como culpa ou ineficiência deles próprios. Sem eximir as falhas certamente presentes, listaremos as fraquezas levantadas como tal, apontando para as prováveis causas externas destas. 22

Dito isso, aparece como a maior fraqueza a “deficiência em insumos e equipamentos” (55 menções), quando a falta deveria ser de crédito e incentivo (em ameaças); bem como a “falta de infraestrutura” (34 menções), também responsabilidade de políticas públicas inadequadas e insuficientes, não acessíveis para a estruturação dos empreendimentos; do mesmo modo, muito do que é visto como “deficiência em gestão” (23 menções), pode ser considerado como falta de oferta de formação educacional e técnica.


Por sua vez, a “deficiência em logística” (19 menções), referida como falta de transporte ou barracas para as vendas, por exemplo, também aponta claramente para a falta de serviços públicos, políticas de incentivo e estrutura social para viabilizar o que o país produz de melhor no seu campo. A falta de recursos financeiros (18 menções), falta de saberes técnicos (12 menções) e falta de formalização e certificação (11 menções), também são apontadas como falhas internas, enquanto poderiam perfeitamente serem lastreadas nas deficiências externas, tais como a atuação estatal e empresarial que beneficia os grandes produtores, acentuando a concentração de renda, conhecimento, recursos e terras. Neste contexto, as menções críticas às posturas desagregadoras (43 menções) encontram como alvo o outro, o parceiro, o companheiro, o irmão, o parente, o outro que não é outro, pois está do mesmo lado da trincheira. E mais uma vez poderíamos esvaziar as fraquezas, migrando para ameaças que geram sentimentos desagregadores na população mais vulnerável, a qual, ignorante do contexto econômico e histórico, oprime seu par, sem ter consciência de mais esta arma de dominação: a separação entre os iguais.

outras fraquEzas de menor iNCiDêNCia apontam para a mesma lóGiCa, de falta de oportuNiDaDEs de fiNaNCiamENto e formaÇão.

Outras fraquezas de menor incidência apontam para a mesma lógica, de falta de oportunidades de financiamento e formação, sendo consideradas e nomeadas como fraquezas: perda da tradição e cultura, 3 menções; falta de identidade da marca, 5 menções; sentimentos negativos, 5 menções; e falta de consciência ambiental, 6 menções.

a falta de rECursos fiNaNCEiros, sabErEs téCNiCos, formalizaÇão e CErtifiCaÇão também são apontadas como falHas iNtErNas.

23


sobre oPortunidades Sobre Oportunidades

Comentado [GP7]: Oportunidades ocupam 3 páginas. Pode ampliar e reduzir as fotos.

gráfico 04: menções às oportunidades: Comentado [GP8]: São 13 lgendas no gráfico

QUADRO GERAL DE MENÇÕES ÀS OPORTUNIDADES:

3

acordo fundiário

3

5

identidade local

Um sujeito de sorte

7 12

espaço de representação crédito

Presentemente eu posso me considerar

3

Porque apesar de muito moço

70 13

outros editais/financiamento

Me sinto são e salvo e forte 13

capacitações Veracel

14

infraestrutura

parceiros institucionais

Deus é brasileiro e anda do meu lado E assim já não posso sofrer o ano

poder público recusos naturais

E tenho comigo pensado

24

35 24

passado. belchior – sujeito de sorte

público consumidor /turismo

Fonte: Diagnósticos Participativos, IMT, 2020.

“Pessoalmente eu posso me considerar Um sujeito de sorte Porque apesar de muito moço Me sinto são e salvo e forte E tenho comigo pensado Deus é brasileiro e anda do meu lado E assim já não posso sofrer o ano passado Belchior – Sujeito de sorte”

N

Neste contexto de descaso histórico pelas comunidades tradicionais, agrícolas e

ribeirinhas,este as oportunidades predominantemente relacionadas ao público contexto desãodescaso histórico pe-

las comunidades tradicionais, agrícolas e ribeirinhas, as oportunidades são predominantemente relacionadas ao público consumidor, por tratar-se de um território com um dos maiores destinos turísticos do país: Porto Seguro. Das 233 menções às oportunidades, 70 são com relação ao público consumidor potencial, entretanto, quase não acessado por nenhum dos empreendimentos afastados da orla turística. Mesmo com a exuberância natural local, apenas 24 menções referem-se aos recursos naturais, os quais, abundantes, acabam aparecendo 24

mais em ameaças, por encontrarem-se em desequilíbrio (aquecimento global, venenos, etc.). Parceiros institucionais (35 menções) são significativos no panorama. Estes são o Estado, a sociedade civil e o comércio local, sendo que o poder público aparece em separado com 24 menções, referindo-se a serviços básicos necessários, mas não suficientes para viabilizar os empreendimentos, nem diretamente relacionados aos processos produtivos. Entretanto, tais oportunidades encontram a barreira de muitas ameaças e fraquezas para serem devida-


mente acessadas, permanecendo, muitas vezes, em condição de oportunidades não aproveitadas. A infraestrutura aqui é corretamente apontada como oportunidade, abarcando estradas e outros serviços, como estruturas disponíveis para a comercialização. A Veracel Celulose aparece nomeada explicitamente como oportunidade devido a doações, capacitações, oferta de serviços, compra de produtos, apoio técnico e disponibilização de insumos; entretanto, é fundamental observar que a empresa aparece de forma não explicitada (não nomeada) como enorme ameaça ao território, assim como detentora de grandes extensões de áreas, produtivas ou degradadas, privatizadas em processos não apropriados e oferecidas em comodato ou vendidas de forma vantajosa para empresa, aparecendo também como investimentos de compensação ambiental pelos enormes impactos de degradação local. Fatos que envolvem Veracel e outras empresas extrativistas, gerando enorme tensão com os agricultores familiares, no território, assim como em todo país.

As capacitações (13 menções) oferecidas nos territórios realmente são excelentes oportunidades, sendo em geral com temas adequados; porém seu acesso é dificultado pelo alto custo do deslocamento, ou desconhecimento dos mesmos, por parte dos produtores em geral. Os editais (12 menções) também são em parte adequados às necessidades locais, mas são de difícil acesso, salvo raras exceções, pois exigem redação complexa e documentação continuamente atualizada, em meio ao labirinto de informações e processos, quase impossíveis aos empreendimentos. Outras oportunidades de baixa incidência têm potenciais diversos, por exemplo, a compra coletiva (1 menção) poderá ser promovida e auxiliar os processos. A baixa incidência de 2 menções aos “atrativos históricos” revela a baixa percepção e pouco uso de um potencial gigantesco da história da Costa do Descobrimento, com sua “identidade local” (3 menções) diversa e rica. Concluímos que uma das grandes ameaças é a falta de mais oportunidades formativas sobre a história e o valor da cultura local.

riqueza natural como oportunidade para o crescimento da economia real e solidária.

25


sobre aMeaças Sobre ameaças

Comentado [GP10]: 2 páginas

gráfico 05: menções às ameaças

QUADRO GERAL DE MENÇÕES ÀS AMEAÇAS

Comentado [GP11]: 18 legendas

3

falta de crédito/capital

3

longe de mercado

4 4

dependência do turismo

4 4

dificuldade logística 52

machismo

Vejo um gado amuado

5

Um mau tempo vai chegar

6

pragas

Vento oeste tá gelado

8

recessão

8

equipamentos/insumo de alto custo outros

O mundo tá pra virar 8

forças políticas opositoras

10

mercado competitivo burocrácias em excesso conflito pela terra

41

13

falta de infraestrutura 14

hegemonia do agronegócio degradação ambiental

16

14

degradação ambiental local

Fonte: Diagnósticos Participativos, IMT, 2020. Vejo um gado amuado Um mau tempo vai chegar Vento oeste tá gelado O mundo tá pra virar Ó, Deus, meu pai Parai a mão do opressor Calai a voz do enganador[...] Passarinhos depenados É sinal de extinção Vejo fome em todo lado Meu Deus, que situação Ó, Deus, meu pai Parai a mão do opressor Calai a voz do enganador Fazei chover só chuva de amor Samba-Oração - Mateus Aleluia

alarmante e inegável que a omissão do Estado (52 menções), somado à falta de infraestrutura, relacionada diretamente ao Estado (14 menções, totalizando 67) e a degradação ambiental (local, 41, mais global, 16, totalizando 57 menções) sejam percebidas pelas pessoas ouvidas, como as maiores ameaças aos empreendimentos. Pois, como podemos constatar cotidianamente, todos os aspectos da vida humana, inclusive a própria vida e a morte, são determinadas por políticas públicas, ou pela falta delas.

26

Parai a mão do opressor Calai a voz do enganador[...] Passarinhos depenados É sinal de extinção

Estado omisso

É

Ó, Deus, meu pai

Vejo fome em todo lado Meu Deus, que situação Ó, Deus, meu pai Parai a mão do opressor Calai a voz do enganador Fazei chover só chuva de amor. samba-oração - mateus aleluia

Políticas, também omissas local e globalmente, na área ambiental, redundam em devastação sem precedentes, desaguando no risco eminente de uma catástrofe pela primeira vez gerada por uma espécie animal, não por causas naturais, sendo o agronegócio (14 menções) um dos instrumentos de destruição da diversidade da vida. Além destas ameaças macro, de difícil combate local, os grupos apontam os conflitos locais pela terra em 13 dos 20 empreendimentos. Embora a ocor-


rência não tenha sido grande, a discussão diante de cada menção, em cada um dos grupos, tomou o tempo e o tom grave, eventualmente medroso, que tal ameaça representa: a possibilidade de perder a terra, perder o meio de sobrevivência, a identidade e pertencimento à cultura.

são, 5 menções e; equipamentos/insumo de alto custo; 6 menções; vale salientar o já referido em fortalezas, que o machismo é uma força opositora aos empreendimentos das mulheres, não nomeado, embora apareça em muito mais falas, de formas difusas, que as 4 menções assinaladas.

As burocracias em excesso (10 menções), forças políticas opositoras (8 menções) e o mercado competitivo (8 menções) aparecem como ameaças micro, que podem ser minimizadas com o aperfeiçoamento dos coletivos.

além destas amEaÇas maCro,

Das outras ameaças de menor ocorrência (atravessador, 1 menção; choque cultural, 1 menção; culpabilização do indígena, 1 menção; plágio, 1 menção; interferência externa, 2 menções; mercado instável, 2 menções; falta de crédito/capital, 3 menções; distância do mercado, 3 menções; dependência do turismo, 4 menções; dificuldade logística, 4 menções; machismo, 4 menções; pragas, 4 menções; reces-

de difícil CombatE local, os Grupos apontam os CoNflitos locais pela tErra em

13 dos 20 EmprEENDimENtos.

contra a degradação ambiental, os empreendimentos cuidam do solo e das sementes.

27


conclusão

tÚ no puedes comprar el Viento tÚ no puedes comprar el sol tÚ no puedes comprar la lluVia tÚ no puedes comprar el calor tÚ no puedes comprar las nubes tÚ no puedes comprar los colores tÚ no puedes comprar mi alegría tÚ no puedes comprar mis dolores LATINOAMERICA - CALLE 13 28


M

as, afinal, o que é a economia solidária? Não pode ser apenas um programa governamental com risco de desaparecer na mudança de gestão. Não pode ser, tampouco, uma política pública isolada. A economia solidária, e outras economias baseadas na distribuição justa da riqueza, no suprimento de todas as necessidades humanas, físicas, emocionais, espirituais, do abrigo à cultura, deve ser a economia que intermedeia todas as relações, sejam elas entre humanos, suas classes sociais, instituições e países. Acima de tudo, a relação mais importante se dá entre os humanos e o planeta Terra, de onde originariamente advêm toda a riqueza, sem qualquer preço monetário, com toda sua diversidade e abundância. A economia solidária se apresenta, portanto, como a economia que poderá reverter os séculos de opressão da minoria sobre a maioria. Isso é possível? A história dirá. A economia solidária é a economia da utopia, aquela a ser perseguida para que, ao suprir todas as necessidades, de toda a população planetária, transborde riqueza para o compartilhamento e a justiça socioambiental. Ser solidário numa economia da escassez, na qual impera a sensação de haver menos recursos do que a necessidade destes, é praticamente impossível. O capitalismo financeiro sob o regime neoliberal, a mais recente e mais perversa forma de capitalismo, gera a falta, o medo, a competição e a violência, oriundos do desespero pela sobrevivência. Gera acima de tudo uma cegueira. Todos cegos frente à verdadeira riqueza, em busca do dinheiro, cujo valor simbólico é manipulado ao sabor de um mercado que serve historicamente à minoria que detém o poder e a força, detendo, assim, as regras de todo jogo financeiro. A servidão humana se perpetua através de uma cultura e uma economia que não aponta saídas, apenas o agravamento da desigualdade e da exploração. A economia solidária, ou qualquer outra denominação que tenha o sentido de compartilhamento e justiça socioambiental, é a economia que se relaciona com a terra e seus recursos, através de um ciclo de

extração, descanso, regeneração e manutenção de abundância. É uma economia que rege as relações fundantes dos coletivos deste projeto, é uma economia ameaçada pelo paradigma do sucesso a partir do lucro, individual e concentrado. Mais, é a economia contra hegemônica, é a economia que ameaça os senhores do mundo, e portanto, é a economia a ser tratada como exceção, para acalmar aqueles que, por estarem organizados, podem ameaçar o estabelecido, e, desta forma, devem ser calados através de alternativas paliativas. A economia solidária baseia-se em diversos princípios e valores que promovem a justiça socioambiental, como a autogestão e distribuição justa do rendimento; o uso consciente dos recursos finitos com a preocupação de sua reposição; a busca do processo produtivo limpo, com destinação adequada de resíduos. Pode caracterizar-se pela criação de produtos identitários que valorizam e revelam a riqueza natural e cultural de sua origem, eventualmente realiza trocas e sempre disponibiliza seus produtos a preços justos, prioritariamente em mercados locais. Evita atravessadores e na medida do possível, tem uma relação direta, muitas vezes afetiva com seus consumidores. Entretanto, estas práticas e princípios são a contracultura, na contramão da lógica predominante, intrínseca das relações do mundo moderno, pautada na individualidade. Como reverter este quadro? Na macro política nos parece quase impossível, portanto, falemos de perspectivas tangíveis. Está ao nosso alcance o fortalecimento de políticas que ganhem território para esta lógica. Entretanto, estas políticas brotarão de outros governos, eleitos por uma população mais consciente. Para tanto, é necessária a prática de uma educação que crie indivíduos e sociedade engajados nesta mudança. Infelizmente, a escola pública da qual atualmente dispomos, não está preparada para este modelo de educação, a educação popular. Entretanto, deve ser influenciada pela sua comunidade e ocupar um papel de diálogo e aproximação da prática de outras formas de educação. 29


Crescem as experiências baseadas na pedagogia do oprimido, de Paulo Freire, na pedagogia da autogestão, nos princípios da escola democrática, no conceito de cidade educadora e tantas outras pedagogias pela garantia dos direitos humanos universais. Esta educação acontece em algumas escolas, como de assentamentos de movimentos sem-terra e ocupações de sem-teto, acontece através de alguns programas de educação de jovens e adultos, mas acontece, principalmente, na vida. Os movimentos sociais são educativos, as manifestações e marchas de protesto com problemáticas contemporâneas de enfrentamento de injustiças históricas são educativas, as manifestações culturais, as festas populares, os saraus periféricos, os grupos de cultura juvenil, os espaços populares de produção cultural, as organizações sociais, os movimentos estudantis, a participação política partidária, a própria internet, se bem utilizada, são oportunidades de outras aprendizagens. Cabe a todos os que lutam por uma sociedade mais justa engajarem-se nesta outra educação para o “bem viver”. Parte dos coletivos produtivos solidários tem esta perspectiva, mas a reeducação de seus participantes deve ser uma das missões prioritárias das

lideranças. Pois, a cultura da solidariedade exige desconstruções e aprendizagens contínuas, para os cuidados com a terra, como o outro, com o ambiente, consigo próprio e para o engajamento na luta por direitos. Todas as conquistas sociais deste país vieram através de lutas, protestos, reivindicações, confrontos, inclusive através de das mortes de lideranças e populações. Não somos um país de pessoas dóceis e cordatas. Os indígenas lutaram contra a invasão de suas terras à exaustão, numa correlação de forças desigual. Foram quase exterminados e a perseguição genocida persiste agravando-se. A população negra escrava, resistiu de todas as formas, aquilombaram-se embrenhados nas matas e ainda criam quilombos de resistência religiosa, cultural e de mercado para buscarem as compensações que a história lhes deve. Os sem-terra e sem-teto relacionam-se com o direito à terra e moradia da forma que as mais justas cartas magnas e leis universais garantem. O oprimido levanta-se contra a injustiça sempre que suas forças são maiores que sua impotência paralisante gerada pela própria injustiça. E os empreendimentos solidários são zonas de transformação, de inversão da lógica da desigualdade, maior mazela deste país. Esta consciência deve nos animar para a persistência, mesmo com tantas ameaças.

a economia solidária é a economia da utopia, aquela a ser perseguida para que, ao suprir todas as necessidades, de toda a população planetária, transborde riqueza para o compartilhamento e a justiça socioambiental.

30


ECoNomia soliDária:

o que é importante para VocÊ? pesquisa de opinião realizada no Âmbito do projeto traz tendÊncias e aponta estratégias para inserção de produtos da economia solidária no mercado.

O

t u o y a l

uvir o mercado consumidor traz subsídios importantes para o planejamento da produção. Foi com isso em mente que o Instituto Mãe Terra, com o fundamental apoio da Cebec Consultoria e Coaching e de Débora Jorge Consultoria e Comunicação, investiu na realização de uma pesquisa de mercado voltada para os produtos da economia solidária no Território Costa do Descobrimento. A pesquisa é uma ferramenta para conhecer e identificar as melhores oportunidades de negócios para os empreendimentos de economia solidária. Para além da subsistência, o sucesso da comercialização de seus produtos significa melhoria de qualidade de vida para centenas de famílias.

Por meio dos resultados e aprofundamento das análises, é possível montar uma estratégia para ampliar e consolidar as oportunidades de negócios dos empreendimentos da economia solidária em Porto Seguro e Arraial d’Ajuda/BA. A escolha da cidade de Porto Seguro sede e distrito de Arraial d’Ajuda para esta amostragem considerou o mercado real e potencial criado pela atividade turística. Sendo um dos mais importantes polos turísticos do Brasil, essas localidades concentram hotéis, pousadas, restaurantes e negócios afins, cuja demanda pode ser abastecida pela produção dos coletivos da economia solidária da Costa do Descobrimento. 31


consumidor final, os hábitos de consumo são influenciados pelo turismo e de moradores oriundos de outras culturas nacionais e internacionais, trazendo oportunidades que podem favorecer a economia solidária.

Do ponto de vista do consumidor final, os hábitos de orientar os próximos ciclos produtivos dos empreenO modelo aqui utilizado poderá ser atualizado periodicamente, ainda ser(EES) na Costa do consumo são influenciados pelo turismo e de moradimentos econômicosousolidários dores oriundosem de outras outras culturas e internaDescobrimento. O objetivo é consolidar a Economia replicado regiões, nacionais para desta forma, estabelecer dados comparativos e o cionais, trazendo oportunidadesdaque favoreSolidária uma alternativa viável no território. eventual acompanhamento suapodem evolução dos assuntos aquicomo investigados. Os dados cer a economia solidária. considerados oseconômicos produtos da agroecologia em também podem orientar os próximos ciclos produtivosForam dos empreendimentos O modelo aqui utilizado poderá ser atualizado periopequena escala, apicultura, pescas e mariscos, artesolidários (EES) na Costa do Descobrimento. O objetivo é consolidar a Economia dicamente, ou ainda ser replicado em outras regiões, sanatos, produtos reciclados e etnoturismo, dentre Solidária como uma alternativa viável no território. para desta forma, estabelecer dados comparativos e outros assistidos pelo projeto “Desenvolvimento Tero eventual acompanhamento da os suaprodutos evoluçãodados asritorial Foram considerados agroecologia em Solidário”. pequena escala, apicultura, suntos aqui investigados. Os dados também podem pescas e mariscos, artesanatos, produtos reciclados e etnoturismo, dentre outros assistidos pelo projeto “Desenvolvimento Territorial Solidário”.

GráfiCo 06: proDutorEs por CatEGorias DE mErCaDo Do projEto

CEBEC CONSULTORIA E COACHING

DÉBORA JORGE CONSULTORIA E COMUNICAÇÃO

cebecconsultoria@gmail.com

debora@djorgecomunica.com.br1 99685-5198

31 98420-6634

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020. Esta cebecconsultoria@gmail.com análise considerou as respostas de 97 questio-DÉBORApode afirmar serE COMUNICAÇÃO igual resultado para outras categoJORGE CONSULTORIA nários de pessoa jurídica da região de interesse da rias de itens de consumo. 31 98420-6634 debora@djorgecomunica.com.br pesquisa. Ou seja, 2,25%, das empresas/instituições 31 99685-5198 É importante considerar que o momento da aplicacadastradas em 2018, na Região de Porto Seguro, ção da pesquisa é o de pandemia por coronavírus conforme registro oficial. No caso das pessoas físicas, e a campanha política para eleições municipais em com 159 questionários respondidos por moradores curso. Pesquisas de opinião são como uma fotografia da região de interesse da pesquisa, sendo 77% da congelada na data do evento: refletem as opiniões amostragem, representa 0,10% da população de das pessoas naquele momento exato das entrevistas, Porto Seguro sede e Arraial d’Ajuda em 2020. Conas quais poderão, ou não, sofrer alterações ao longo sequentemente, não é possível estender os resultado tempo, em função das mais diversas circunstâncias dos obtidos para todo o território Costa do Descoque afetam a percepção dos respondentes. brimento. Em função da especificação dos serviços e produtos que balizam este trabalho, também não se 32


a ECoNomia soliDária E as EmprEsas Da rEGião

Por qual tipo depotencialidades empresa ou instituição as jurídicas, podemos visualizar para de modo que aproximadamente 80% das empresas os empreendimentos econômico solidários atuarem entrevistadas são os principais clientes para os procomo fornecedores dessas empresas e instituições, você responde? dutos ofertados pelo projeto Desenvolvimento Terque movimentam a economia do território, aponAo investigarmos os padrões de consumo das pesso-

ritorial Solidário. Soma-se a isso o fato de que mais de 91% das pessoas que responderam por empresas estão em cargos, potencialmente, com poder de decisão no processo de compra, sendo 66% diretores ou proprietários e 25% gerentes.

tando as necessidades e preferências desse perfil de Supermercado/Padaria consumidor.

4%

Primeiramente, cabe apontar que do universo de pessoas jurídicas respondentes, 40% são dos setores de hospedagem, comércio e serviços e 29% são de Comércio/Serviços

Entidade de classe 2% GráfiCoRestaurante 07: p or qual tipo DE EmprEsa ou iNstituiÇão Por ou instituição Escola/Universidade 23%qual tipo de empresa VoCê vocêrEspoNDE responde?? 5% Hospital Supermercado/Padaria 1% Hotel/Pousada 4% 21% 19%

Comércio/Serviços 19%

Entidade de classe

Organizações da 2% MEIRestaurante Escola/Universidade Sociedade Civil 7% 23% 5% (OSC) Hospital Indústria Imprensa 1% Hotel/Pousada 15% 1% 2% 21% Organizações da MEI Sociedade Civil 7% (OSC) Indústria 15% 1%

(Gráfico 2)

oria@gmail.com

Imprensa 2%

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

(Gráfico 2)

GráfiCo 08: qual é sua situaÇão Na EmprEsa ou iNstituiÇão?

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SULTORIA E COACHING31 98420-6634

4

alimentos (restaurantes, supermercados ou padarias),

(Gráfico 3)

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Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

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Outro ponto importante para se considerar, referente ao perfil das empresas

(Gráfico respondentes, é a sua dimensão. Nesse 3) sentido, seguindo a classificação oficial da ANVISA, 65% das empresas entrevistadas são de pequeno porte, faturando anualmente

33


e padarias”), quais já consumiam os produtos e com que frequência. De modo geral, 52% das empresas entrevistadas consomem os produtos ou serviços mencionados na pesquisa, sendo que os pequenos e médios hotéis e pousadas são os que mais consomem, seguidos

Outro ponto importante para se considerar, refeUtilizaremos essa divisão, juntamente com o recorte rente ao perfil das empresas respondentes, é a sua do tipo de empresa, focando nas áreas de maior de empresas de todos os portes de restaurantes, supermercados e padarias. Em todas os redimensão. Nesse sentido, seguindo a classificação levância para a economia solidária, para analisarmos o setores empresariais, as empresas de grande porte foram as que menos consomem os oficial da ANVISA, 65% das empresas entrevistadas perfil de consumo dessas empresas. são de pequeno porte, faturando anualmente até 1 à frequência, em todas os setores e portes produtos de interesse da pesquisa. No tocante A primeira questão a ser investigada é qual o estágio milhão de reais, 29% são empresas médias, faturanatual de inserçãode dosmodo produtos entre essasEsta empresas. de empresas, as compras são realizadas, principalmente, mensal. do entre 1 e 10 milhões de reais por ano e 7% são A pesquisa buscou captar, entre os diferentes setores grandes empresas, de 10 produtivo milhões por e logística dos empreendimentos de base frequência podefaturando orientarmais o ciclo (agrupados em “comércio e serviços”, “hotéis e pousaano. Essa estratificação por porte das empresas pere “restaurantes, supermercados e padarias”), comunitária, pois mais doisespecifi dos camente principais atributosdas”para fornecedores percebidos pelas quais mite direcionar ainda as estrajá consumiam os produtos e com que frequência. tégias dos produtores para foram a inserção no mercado. empresas entrevistadas regularidade e pontualidade.

GráfiCo 09: CoNsumo DE proDutos por

Consumo de produtos por categoria de empresas 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0%

61%

59% 41%

CatEGoria DE EmprEsas 52% 39%

48%

53%

47%

Consomem/compram Não consomem/compram ou raramente

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Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

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De modo geral, 52% das empresas entrevistadas (Gráfico preendimentos de base comunitária, pois dois dos 4) consomem os produtos ou serviços mencionados principais atributos para fornecedores percebidos na pesquisa, sendo os pequenos e médiose hopelas empresas entrevistadas forame regularidade Tendo emque mente quem compra quando compra, podemos avançar analisar e téis e pousadas são os que mais consomem, seguipontualidade. como e porque maiores canais de compras são os supermercados dos de compram empresas de todos oscompram. portes de Os restauranTendo em mente quem compra e quando comtes, e padarias. todas os setores e o supermercados Whatsapp, ambos foramEm utilizados por 82 das 97 empresas entrevistadas, perfazendo pra, podemos avançar e analisar como compram e empresariais, as empresas de grande porte foram as 85% dos respondentes. O volume da presença doporque Whatsapp para Os estemaiores fim aparece como compram. canais de compras que menos consomem os produtos de interesse da são os supermercados e o Whatsapp, ambos foram pesquisa. No tocante àpara frequência, em todas os seto- da economia uma oportunidade os empreendimentos solidária, tendo em vista suas utilizados por 82 das 97 empresas entrevistadas, res e portes de empresas, as compras são realizadas, compreensíveis dificuldades de se montar um setor estruturado de vendas. Por ser perfazendo 85% dos respondentes. O um volume principalmente, de modo mensal. Esta frequência da presença do Whatsapp para este fim aparece pode orientar o ciclo produtivo e logística dos emcebecconsultoria@gmail.com

...98%

31 98420-6634

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das EmprEsas disseram que estão ou poderiam estar 31 99685-5198

Dispostas a troCar um produto de marCa rECoNHECiDa, por um produto artEsaNal/rEGioNal,... 34

Coment 85% das e fornecedo que tem f


como uma oportunidade para os empreendimentos da economia solidária, tendo em vista suas compreensíveis dificuldades de se montar um setor estruturado de vendas. Por ser um aplicativo de fácil uso e reconhecida popularidade, contando com descontos ou gratuidades nos planos de dados, o Whatsapp é uma das principais ferramentas para o comércio dos empreendimentos econômicos solidários. Não é só pelo Whatsapp que as oportunidades de venda se abrem para os EES. As feiras, muito utiliza-

das pelos empreendimentos de modo geral, apareceram como canais de compras para 76% das empresas, além disso, 55% das empresas já compram através de associações e cooperativas. Outro aspecto positivo que apareceu na pesquisa é a abertura para os produtos artesanais e regionais, 98% das empresas disseram que estão ou poderiam estar dispostas a trocar um produto de marca reconhecida, por um produto artesanal/regional, sendo que 46% responderam “sim” à pergunta e 52% responderam “talvez”.

GráfiCo 10: CaNais DE Compra mais utilizaDos

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

GráfiCo 11: sua EmprEsa DEixaria DE Comprar um proDuto ou sErViÇo DE marCa rECoNHECiDa para CoNsumir um proDuto artEsaNal E tipiCamENtE rEGioNal?

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020. 35


Voltando à estratificação por setores, para aprofundar nossa análise, temos que, no setor de Comércio e Serviços, os principais canais de compra citados foram supermercados, feiras, lojas especializadas, sites de lojas, sites de compras, Instagram/Facebook e WhatsApp. Este é um setor que utiliza muito a internet, pois 58% dos respondentes a utilizam mais de 6 vezes por mês para este fim. Para o setor de comércio e serviços, os principais atributos que um fornecedor deve ter são, por ordem de importância, qualidade, pontualidade, preço e condições de pagamento, e regularidade. Além disso, destaca-se que, para 33% das empresas desta categoria, causar impacto socioambiental positivo faz parte da análise para a escolha de um fornecedor em sua empresa/ instituição. No setor de alimentação, composto pelos restaurantes, supermercados e padarias, novamente aparecem todos os canais de compras, com ênfase para as compras pela internet, com 52% dos respondentes utilizando-a como meio de compra mais de 6 vezes por mês. Também é equiparável com o setor de comércio e serviços, o nível de preocupação com o impacto socioambiental, sendo que 33% das empresas desta categoria utilizam esse critério para análise da escolha de um fornecedor em sua empresa/instituição. Destaca-se que, para os restaurantes, supermercados e

36

padarias, a regularidade é o principal atributo de um fornecedor, seguido pelo preço e condições de pagamento e acompanhado pela pontualidade. No setor hoteleiro, os canais de compra se repetem, porém, com uma presença consideravelmente menor das compras pela internet. Apenas 26% dos Hotéis e Pousadas compram regularmente pelo meio virtual, em contrapartida, para 63% das empresas desta categoria, causar impacto socioambiental positivo faz parte da análise para a escolha de um fornecedor em sua empresa/instituição. Destaca-se que para os hotéis e pousadas, o principal atributo de um fornecedor deve ser a qualidade, seguido pela pontualidade e, por fim, o preço e condições de pagamento. Neste cenário, abre-se duas estratégias: pode-se ampliar a base de clientes que já compram buscando novos clientes com o mesmo perfil de consumo atual de cada categoria de produtos ou serviços; concomitantemente, pode-se focar na oportunidade de abrir novos mercados e buscar novos clientes no perfil de quem não é comprador/consumidor atualmente. Recomenda-se utilizar as duas opções para obter um maior resultado da ação, pois este se mostrou o principal nicho e o que tem maiores oportunidades pelo seu tamanho e afinidade com os produtos ofertados pelos produtores do projeto .


a ECoNomia soliDária E os CoNsumiDorEs Da rEGião Além das empresas, a pesquisa também buscou captar as preferências e necessidades dos consumidores finais. Estas informações permitem traçar estratégias de comercialização direta, bem como traz orientações e adequações no desenvolvimento e disponibilização dos produtos.

fiGura 01: rEsumo Dos CoNsumiDorEs

Novamente, é essencial conhecer o perfil dos respondentes, para termos em mente quais as características do público que foi atingido pela pesquisa. Neste sentido, temos que, de modo geral, os entrevistados são pessoas entre 20 e 50 anos, em sua maioria mulheres, economicamente ativas e altamente escolarizadas. Também se destaca a renda familiar dos respondentes, com 61% possuindo renda entre 1 e 5 salários mínimos e 29% possuindo renda superior a 5 salários mínimos. A primeira questão analisada foi a importância dada pelos consumidores para a origem ou procedência dos produtos consumidos. Para 79% dos entrevistados, a origem foi apontada como algo importante ou muito importante. Buscando aprofundamento na decisão de compra, foram apresentadas algumas características de produtos, para os consumidores definirem seu grau de relevância no processo de decisão. Neste caso, 95% dos entrevistados acreditam que os principais atributos que fazem a diferença na hora

de escolher um produto ou fechar negócios são os que melhoram a vida das pessoas, diminuem a pobreza e geram renda e emprego na região. 90% dos entrevistados também veem importância ou muita importância em produtos que beneficiam a natureza, fazem parte da cultura da região, tem prioridades medicinais e bons preço e condições de pagamento. Por fim, 50 % dos entrevistados veem importância ou muita importância, em produtos que representam religiosidade ou espiritualidade.

GráfiCo 12: VoCê sE importa Com a oriGEm Dos proDutos quE CoNsomE?

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020.

37


GráfiCo 13: quais os atributos quE fazEm a DifErENÇa Na Hora DE EsColHEr um proDuto ou fECHar um NEGóCio? E qual a importâNCia DE CaDa atributo?

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020. 38


Este grau de importância dada pelos entrevistados para a origem dos produtos e para elementos comuns da economia solidária, como gerar renda na região e possuir valor cultural, abre perspectivas positivas para os EES. Tendo em vista essa dinâmica, também foi questionado o que caracterizaria um produto típico regional, para os consumidores entrevistados.

Para 73% dos entrevistados, as principais características de um produto típico regional são: ser ecológico, ser saudável e ser caseiro; já para 68% dos entrevistados a característica mais importantes é ser artesanal; 55% acreditam que a maior característica é ter memória afetiva e; 42 % veem a exclusividade e ser rústico como características importantes.

GráfiCo 14: quais as priNCipais CaraCtErístiCas DE um proDuto típiCo rEGioNal?

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020. Visando o aperfeiçoamento contínuo dos produtos da economia solidária, a pesquisa tentou captar quais melhorias as pessoas enxergavam como necessárias para os produtos típicos regionais. Em suma, 73% dos entrevistados acreditam que os fatores que podem melhorar são as informações do produto/rotulagem, os locais de venda e a divulgação dos produtos típicos regionais; 56% dos entrevistados acreditam que podem ser melhoradas as embalagens e acondicionamento, a aparência e apresentação e o preço

e as condições de pagamento; 49% acredita que a qualidade e o atendimento podem ser melhorados e; 25% acreditam que o tamanho, sabor e paladar dos produtos podem ser melhorados. Também aqui se verifica um cenário positivo, pois de modo geral, questões relativas à qualidade dos produtos são bem vistas pelos consumidores, sendo as questões referentes a apresentação dos produtos as que possuem amplo espaço para avanços.

GráfiCo 15: Em quE os proDutos típiCos artEsaNais poDEm mElHorar?

Fonte: Pesquisa de Mercado, IMT, 2020. 39


CoNsiDEraÇÕEs fiNais Em resumo, a pesquisa nos mostra que ouvir o consumidor é importante, porém as melhores oportunidades estão em dialogar com as pessoas, à despeito da compra. A economia solidária pode ser favorecida pelo empoderamento do consumidor e todas as consequências desse seu novo papel na sociedade. Abrir um canal de comunicação produtor-consumidor pode ser uma boa prática.

Apresentar as experiências transformadoras do ciclo produtivo e a riqueza da identidade cultural podem suscitar questões ligadas à denominação de origem, como fazem os europeus e já é feito em Minas Gerais e com vinhos no Rio Grande do Sul, por exemplo. Por fim, qualidade e preço são interesse certo de qualquer consumidor. Toda iniciativa que resulte em impacto positivo nestes itens, será sempre uma estratégia robusta.

é importaNtE que os proDutos apresentem as ExpEriêNCias traNsformaDoras do CiClo proDutiVo e a riquEza da iDENtiDaDE Cultural.

40


OS EMPREENDIMENTOS

A

ECONOMIA SOLIDÁRIA NA COSTA DO DESCOBRIMENTO É MOVIDA POR ASSOCIAÇÕES, COOPERATIVAS, GRUPOS IN-

FORMAIS, REDES DE PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO, FORMADAS POR AGRICULTORES FAMILIARES, POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS, PESCADORES, MARISQUEIRAS E UMA DIVERSIDADE DE FORMAS DE VIVER E PRODUZIR. NAS PRÓXIMAS PÁGINAS CONHECEREMOS UM POUCO DESSA DIVERSIDADE, ATRAVÉS DOS EMPREENDIMENTOS PARTICIPANTES DO PROJETO DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL SOLIDÁRIO 41


AssociAção pAtAxó

ALDEIA JUERANA

O

povo Pataxó está presente nesta faixa da costa brasileira desde muito antes de ela ser chamada “do descobrimento”. Aliás, o nome Costa do Descobrimento é contestado, não sem razão, por diversos representantes deste e de outros povos originários, devido ao apagamento das violências perpetradas durante o período da colonização portuguesa. Mais representativo, apontam, seria o nome “Costa da Invasão”. De todo modo, ao longo dos mais de 500 anos de história deste traumático contato intercultural, diversas aldeias Pataxó resistem até hoje, mantendo seu território e sua cultura encravados pelos municípios baianos de Porto Seguro, Santa Cruz Cabrália, Prado e também em regiões de Minas Gerais. Dentre as aldeias indígenas de Porto Seguro, uma se destaca pela forte presença e liderança feminina. Na aldeia Juerana, localizada na zona rural do município, vivem 68 famílias que trabalham com agricultura e artesanato.

42

a prEsENÇa fEmiNiNa na aldeia é marcante polítiCa e CulturalmENtE.


A presença feminina é marcante política e culturalmente. Politicamente, pois muitas lideranças são mulheres, incluindo a principal liderança, a Cacica Yamani Pataxó. Além de Yamani, outras mulheres também tem forte atuação política, não só dentro das aldeias, mas também a nível municipal e estadual. Culturalmente, as mulheres são as responsáveis pelo principal atributo que torna a aldeia Juerana reconhecida: sua culinária. Valorizando a cultura genuinamente brasileira e indígena da mandioca, as mulheres da aldeia cozinham, a partir da farinha e de derivados produzidos na própria aldeia, delícias como tapiocas, beijus, bolos, gomas e pubas, que circulam primariamente dentro da aldeia e entre aldeias, mas que também são vendidas para moradores e turistas nas feiras do município. Parte da aldeia também se dedica a produção de hortaliças e hortifrútis orgânicos, integrando a certificação participativa da Rede Povos da Mata – Núcleo Monte Pascoal.

A comunidade aguarda há 16 anos a demarcação de sua terra, que ainda não foi efetivada, mas é assim, mantendo sua cultura, seus modos de produção tradicionais e garantindo a participação e atuação política das mulheres Pataxó, que a aldeia Juerana se mantém resistindo há 520 anos.

a árVorE juEraNa, que dá nome à aldeia, também recepciona os Visitantes

43


cooperAtivA de costurA e ArtesAnAto de porto seguro

COOPCIART

L

ocalizada na Vila Valdete, em Porto Seguro, a Cooperativa de Costura e Artesanato de Porto Seguro (COOPCIART) teve início em 2012. A cooperativa é ao mesmo tempo uma ferramenta de empreendimento econômico – na busca da autonomia e geração renda para as famílias de baixa renda da localidade – resgate cultural, empoderamento feminino, ampliação de conhecimento e fomento da identidade local e territorial, através do artesanato que é trabalhado de forma sustentável.

os CoopEraDos trabalham com diferentes proDutos, Estilos e matEriais: crochÊs, bordados, bijuterias, madeira, sementes, material reciclado, e muitos outros 44


Os cooperados trabalham com diferentes produtos, estilos e materiais: costura, crochês, bordados, bijuterias, luminárias, camisetas, móveis, cartonagem, madeira, tecidos, sementes, material reciclado, etc. Além da produção, a cooperativa tem uma importante atuação na formação e difusão das técnicas artesanais, ministrando palestras e oficinas e servindo como um ponto de referência cultural do bairro, promovendo eventos e campanhas sociais e mobilizando politicamente os moradores em ações como o Novembro Negro, mutirões de limpeza, rodas de conversa, oficinas de artesanato, troca de saberes e o Cine Valdete.

além da produção, a CoopEratiVa tem uma importante atuaÇão na formaÇão e Difusão das téCNiCas artEsaNais.

45


46


47


AssociAção ApícolA de itAbelA

E

APISBELA

m uma área que até meados do século XX era constituída por Mata Atlântica preservada e poucas famílias de agricultores, surge um povoado dominado pela “febre do jacarandá”. A instalação de serrarias e madeireiras dizimou a floresta e deu origem ao município de Itabela. Atualmente, a cidade possui cerca de 32.000 habitantes e concentra 80% da fonte de renda na área rural, através da produção de café, mamão, maracujá, pimenta do reino e cacau. Cientes da importância ecológica, com reverência à natureza e visando aproveitar o potencial apícola inexplorado dessa região de intensa atuação rural, um grupo de cerca de 20 pessoas se reuniu para formar a Associação Apícola de Itabela (APISBELA). 48

Os apicultores aproveitam a disponibilidade de campos e de mananciais de água potável do município para introduzir seus enxames, realizando um constante deslocamento de uma lavoura para outra, de modo a permitir que as abelhas coletem o néctar das floradas de diversos plantios. Desse modo, quando acaba a florada do café, as caixas são deslocadas para a de eucalipto e assim sucessivamente.

cada apiCultor proDuz e Vende iNDiViDualmENtE, contando com a assoCiaÇão para apoio téCNiCo e rEprEsENtaÇão polítiCa


Cada apicultor produz e vende individualmente, contando com a associação para o apoio técnico (com equipamentos para o beneficiamento do mel e com a troca de saberes entre os associados) e como representação política. A produção de mel tem caráter sazonal, a depender da florada utilizada. Como a associação não possui capacidade de estoque, suas receitas estão concentradas apenas nos meses da florada. O mesmo não ocorre com o custo de manutenção dos apiários, que se mantém durante os doze meses do ano, de modo que a apicultura aparece como uma complementação de renda e não

a história de DEsmatamENto de itabEla e a fragilidade das abElHas, despertam nos associados um iNCENtiVo

como principal fonte de recurso dos associados. Porém, os meses de safra do mel, em anos em que o produto está valorizado no mercado (pois o preço varia drasticamente), representam um ganho significativo para os produtores. E, além disso, a apicultura aparece como um resgate da relação dos associados com a natureza. A história de desmatamento de Itabela e a extrema fragilidade das abelhas (que são exigentes com a qualidade dos recursos naturais e vulneráveis ao uso de agrotóxicos e defensivos agrícolas), despertam nos associados um incentivo à defesa do meio natural. Cláudio Ambrosini, presidente da associação, mantém um viveiro de mudas nativas, utilizadas para o reflorestamento e Marola, como é chamado um dos participantes do grupo, é considerado um dos maiores especialistas de sementes crioulas do território. Ele atua no reflorestamento e na defesa de espécies nativas da região.

à DEfEsa do mEio Natural.

49


Essa troca de conhecimento prático, especializado, tradicional e ancestral é uma marca do grupo. Eles conhecem processos de reflorestamento, produção agroflorestal e agroecologia e buscam se dedicar a estas práticas, pois trabalham para a recuperação da natureza devastada, tendo consciência do valor da floresta preservada. É um grupo com conhecimento teórico e prático acumulado, para quem a atitude de preservação do ecossistema exige disciplina, que abrange desde a consciência para preservar, até o uso prático do conhecimento no manejo de reflorestamento. A “febre do jacarandá” que deu origem ao município já passou, porém, deixou sequelas nesta terra, onde a APISBELA e suas abelhas atuam como anticorpos para a cura.

é um Grupo com conhecimento tEóriCo e prátiCo acumulado, para quem a atitude de prEsErVaÇão do ECossistEma exige DisCipliNa.


AssociAção indígenA pAtAxó AldeiA

MATA MEDONHA

A

Associação Indígena Pataxó Aldeia Mata Medonha (AIPAMM) é formada por homens e mulheres indígenas da aldeia de mesmo nome, no município de Santa Cruz Cabrália. A aldeia constituiu-se a partir da migração, em 1960, de cinco famílias originárias, da etnia Pataxó, provenientes da região do Monte Pascoal que encontraram apenas a mata fechada, inspiradora de seu nome. Desde a chegada inicia-se o cultivo de mandioca. Na ocasião, o acesso à localidade era através de caminhos estreitos, por onde não passavam animais de carga, portanto, tudo era transportado a pé pelos novos habitantes, inclusive a mandioca para plantio.

Na década de 1970, supostos proprietários quiseram reivindicar as terras, mas os Pataxó resistiram e conseguiram o reconhecimento enquanto terra indígena, pela FUNAI, em 1985. O território está em parte homologado, mas a maior parte permanece em litígio. Uma grande porção da aldeia ainda é mata nativa preservada, com muitos animais silvestres e água disponível.

fugindo do “foGo DE 51”, cinco famílias da EtNia pataxó chegaram na região, encontrando apenas a mata fECHaDa que inspirou o NomE Da alDEia. 51


A natureza é de uma beleza exuberante e a produção é diversificada: abacaxi sem agrotóxicos, mandioca, piaçava, apicultura e hortaliças. Sendo o artesanato indígena um ponto forte deste coletivo, que mantém o conhecimento tradicional de extração e uso de materiais de forma sustentável, principalmente feito de sementes, sem o uso de madeira, com acabamento diferenciado, totalmente natural, evitando materiais industrializados ou tintas sintéticas. Hoje, além do artesanato, a aldeia comercializa farinha, beiju, cana, abacaxi e piaçava para consumidores externos, antigamente transportados por canoa até o povoado de Santo Antônio, atualmente esse trajeto é feito de moto, bicicleta ou carro, além de hortaliças, cuja circulação é apenas interna.

a NaturEza é de uma bElEza ExubEraNtE e a proDuÇão é diVersificada: abaCaxis orGâNiCos, maNDioCa, piaÇaVa, apiCultura e HortaliÇas.

52

a alDEia é baNHaDa por dois rios e prEsErVa boa parte da mata que lhe deu o NomE.


Os Pataxó dessa comunidade buscam fortalecer a língua materna, o Patxohã, que é ensinado desde a pré-escola ao ensino médio, na escola da própria comunidade. No momento, a intenção é construir um kijeme (construção típica pataxó), para práticas da cultura tradicional, pois junto ao isolamento que penaliza economicamente a aldeia, existe a busca da preservação e difusão da cultura ancestral. A Aldeia está localizada às margens do Rio Santo Antônio, a 10 km do povoado de mesmo nome e encontra-se sempre aberta a visitas, por acesso terrestre, através do contato com as lideranças.

a alDEia está localizada a 10 km do poVoaDo de saNto aNtôNio e encontra-se sempre aberta a Visitas, atraVés do CoNtato com as liDEraNÇas.

o artEsaNato, feito segundo as tradições pataxó, é um dos pontos fortEs da alDEia. 53


AssociAção dos pequenos e Médios produtores rurAis dA ZonA do córrego dA prAtA de itAgiMiriM

O

APMPRZCPI

nome é longo e a sigla complicada, mas por trás da Associação dos Pequenos e Médios Produtores Rurais da Zona do Córrego da Prata de Itagimirim (APMPRZCPI), está uma ideia simples: plantar. Com o foco no plantio da mandioca, o grupo recebeu em regime de comodato, uma área de 25 lotes no interior da cidade, já arada, gradeada e feita a correção com calcário. A conquista da terra, através do esforço conjunto dos 32 agricultores associados, marca apenas uma etapa inicial da associação, que busca se fortalecer com a construção de uma farinheira própria (atualmente dependem da farinheira municipal, cedida pela prefeitura). A APMPRZCPI é mais conhecida pelo nome do projeto que levam à frente e no qual a filosofia do grupo está bem demarcada: Agrovida.

54

a CoNquista da tErra, atraVés do EsforÇo conjunto dos 32 aGriCultorEs associados, marca a etapa inicial da assoCiaÇão.


Tendo com o plantio uma conexão intensa. Além da mandioca e seus derivados – farinha, puba, beijus e tapiocas – o grupo também produz hortaliças e culturas como abóbora, quiabo e feijão-de-corda, tanto para consumo como para a venda externa, que é feita em feiras livres e nas roças dos associados A maior parte do grupo é composta por mulheres e idosos, que encontram na associação o apoio mútuo, bem como incremento na geração de renda familiar, aumento da autoestima e melhoras na saúde.


AssociAção coMunitáriA AgropecuáriA cosMe e dAMião

A

ACACD

Associação Comunitária Agropecuária Cosme e Damião (ACACD) está sediada na fazenda de cacau Estrela do Norte, ocupada há anos pelo grupo, localizada na cidade de Itapebi, à margem do rio Jequitinhonha. A associação é composta por 32 famílias - com cerca de 120 pessoas, sendo que 11 famílias residem na sede da antiga fazenda e as restantes em sítios nos arredores. O ambiente da fazenda é marcado pelo tempo, com fachadas sem manutenção nos últimos anos, mas seu interior esconde uma escola com lindo piso de madeira e paredes recentemente pintadas, ocupadas por painéis que demonstram a riqueza do processo pedagógico. A sede também conta com uma cozinha onde são preparadas refeições coletivas, abundantes no fogão à lenha, quase integral56

mente com produtos produzidos e colhidos pelos associados, que compram apenas arroz, açúcar, sal e carnes. O trabalho árduo, somado ao conhecimento tradicional e ancestral do cultivo da terra,


gera abundância e enorme diversidade da produção local: pimenta do reino, hortaliças, milho, feijão, café, banana, mandioca, abacaxi, graviola, porco, galinha da angola, pato, ganso, etc. O principal produto, porém, é o cacau, que tem uma produção anual de aproximadamente 1200 arrobas, normalmente comercializadas em um armazém local. Na comunidade também são produzidos doces e licores para consumo próprio e venda na feira do município. A comunidade produz sob a “cabruca”, um sistema agroflorestal tradicional, o qual maneja culturas à sombra das árvores nativas da Mata Atlântica, sendo que na área de produção é possível visualizar árvores nativas centenárias e oito nascentes de água doce, preservadas por matas ciliares com os cuidados dos moradores. Não é só na plantação que o grupo preserva métodos tradicionais, o cacau também é fermentado em cochos de madeira e seco em barcaças, por fim, toda a produção é escoada por canoa, já que o acesso por terra está inutilizável.

a principal proDuÇão é o cacau, que chega a 1200 arrobas anuais, as quais são ComErCializaDas em um armazém local.

57


Este é um coletivo que ilustra com incomparável fidelidade o contraste de todo o território: beleza, alegria, luta, persistência e muito trabalho em meio à abundância natural, sob as ameaças de uma conjuntura de múltiplas negligências por parte dos detentores de recursos e poder.

a CabruCa perm

proDuÇão de CaCau e prEsErVa a

58

mata N


AssociAção dos pescAdores ArtesAnAis dA região do bAixo jequitinhonhA do Município de itApebi

V

ASBAPE

indo do interior, o Rio Jequitinhonha tem muita importância para o norte de Minas Gerais, por onde o rio passa possibilitando a irrigação para plantações, abastecimento para consumo humano e criando em suas margens uma rica cultura relacionada ao seu vale, expressa, por exemplo, nas Lavadeiras de Almenara e reunida anualmente no Festival de Cultura Popular do Vale do Jequitinhonha – FESTIVALE.

a CoNstruÇão da represa mudou a Vida dos pEsCaDorEs artEsaNais de ItapEbi, que se aDaptaram e se tornaram pisCiCultorEs.

Menos conhecida é a passagem do rio pelo sul baiano, por onde entra em seu caminho rumo ao mar. Menos conhecida, porém não menos impactante. Em Belmonte-BA, cidade onde o rio finalmente deságua no mar, ele tinge as águas de marrom, dando o epíteto de “cidade do mar moreno” para o município. Pouco acima de Belmonte, o Jequitinhonha passa por Itapebi-BA, onde foi criada uma tradição de pesca artesanal em suas águas. Porém, a instalação de uma usina hidrelétrica no município alterou a vazão da água e diminuiu drasticamente a quantidade de peixes. 59


Os pescadores, que estavam organizados em torno da Associação dos Pescadores Artesanais da Região do Baixo Jequitinhonha do Município de Itapebi (ASBAPE), foram em busca de soluções. O meio encontrado para manter sua subsistência, sem perder sua relação com as águas, foi a aquicultura. Hoje, os pescadores da ASBAPE estão voltados para a criação de peixes na área represada. Foi necessária uma adaptação, de pescadores artesanais para piscicultores, porém, os associados buscaram se capacitar para a correta instalação e manutenção dos tanques e, embora saudosos de suas antigas práticas – e de seu antigo rio –, encontram-se confortáveis na condição de criadores. A mudança também permitiu uma expansão do número de associados. Atualmente agricultores e moradores urbanos também podem fazer parte da associação, mantendo seu tanque indiretamente, com o auxílio dos pescadores que moram próximos à criação e atuam diretamente na manutenção e alimentação dos peixes. Desse modo, a associação conta com aproximadamente 100 famílias, totalizando 182 tanques, com uma

60

produção anual de 100 toneladas. O principal produto é a tilápia, que pode ser vendida in natura ou em filés, mas a associação também cria tambaquis e pretende se estruturar para a venda de beneficiados de peixe, tais como linguiças, almôndegas e hambúrgueres de tilápia, bem como o aproveitamento do couro. Tal qual o rio que os abriga e fornece a fonte de seu sustento, os pescadores de Itapebi também se transformam e se adaptam ao longo de sua trajetória, em estreita relações com suas águas e a vida que lá se desenvolve.


a assoCiaÇão conta com aproximadamente 100 famílias, totalizando 182 taNquEs, cuja proDuÇão anual é de 100 toNElaDas

61


AssociAção dos produtores rurAis do projeto MArAvilhA ii

A

APROMA

força da coletividade é um aspecto marcante da Associação dos Produtores Rurais do Projeto Maravilha II (APROMA). O pré-assentamento conta com 74 famílias de agricultores, que se reúnem constantemente, não só para tomar as decisões pertinentes à associação, mas também em mutirões para o plantio, construção de viveiros, colheitas e formação de bancos de sementes. Localizadas na zona rural de Santa Cruz Cabrália, as famílias vivem em lotes com excelente estrutura para o plantio de hortaliças e diversos gêneros alimentícios, bem como para produção de leite, café, farinha, feijão, milho e frutas da região. No viveiro, a produção de mudas é distribuída para os agricultores e os produtos são característicos 62

da agricultura orgânica, visando a qualidade de vida e geração de renda para a comunidade.


É um grupo já consolidado, consciente de seus direitos e com uma produção expressiva de leite, para o qual já possuem destinação certa, sendo vendida previamente para fabricação de derivados como manteigas, requeijão e iogurtes, além do próprio leite pasteurizado. Além do leite, o cacau vem se firmando como uma possibilidade para a associação, embora ainda em estágio inicial.

o lEitE é o priNCipal proDuto da assoCiaÇão.

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AssociAção gotA do óleo

S

AGO

egundo o Ministério do Meio Ambiente um litro de óleo de cozinha usado contamina até um milhão de litros de água. Evitando que esse óleo chegue aos terrenos baldios, rios, mares, lagos e reservatórios de água potável que a Associação Gota do Óleo (AGO) atua e, no caminho, contribui para educação ambiental e a geração de emprego e renda da sua comunidade através da coleta do óleo de cozinha usado do comércio que trabalha com frituras e das residências de Eunápolis e Região. Um grupo de amigos se reuniu e resolveu criar a AGO ASSOCIAÇÃO GOTA DO ÓLEO que foi registrada em 22 de maio de 2016. O primeiro projeto da AGO foi o da coleta do óleo de cozinha usado para fazer o sabão artesanal ecológico Aruba, nome 64

este em homenagem a rua da sede da instituição. Na sequência veio o projeto de palestras de educação ambiental e de combate ao trabalho infantil irregular, bem como o da geração de emprego e renda com a realização de oficinas de sabão nas escolas públicas e privadas, faculdades e universidades, associações, empresas e órgãos das prefeituras (CREAS, CRAS, Setor Habitacional) tanto na zona urbana quanto rural de Eunápolis, Itagimirim, Itamaraju e Região. Os maiores desafios da AGO advêm da falta de consciência ambiental da população. A associação produz menos sabão do que poderia, por dificuldade de acesso ao óleo usado, o qual muitas vezes é descartado incorretamente e não chega até à associação. Por esse motivo, os associados se empenham em palestras e oficinas de educação ambiental


e de sabão para escolas e a comunidade em geral, recitando aquela frase tão absurda e impactante. Um litro de óleo contamina até um milhão de litros de água. Mas ele também pode virar sabão e ajudar toda a comunidade.

a AGO contribui para a EDuCaÇão ambiENtal e para GEraÇão de emprego e rENDa na sua ComuNiDaDE.

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Projetos da aGo 1. Projeto da coleta do óleo de cozinha usado das

6. Projeto de Geração de Emprego e Renda que tem

residências e empresas para a fabricação do Sabão Artesanal Ecológico Aruba em barra, líquido e em pó (1500 a 2000 litros são coletados por mês);

70 famílias de Eunápolis e Região. Estas famílias recebem os produtos que são produzidos na AGO e revendem, com isto melhoram a renda familiar. Muitas famílias nas oficinas de sabão aprendem a fazer o sabão e vendem para melhorar a renda.

2. Projeto de coleta da água da chuva; 3. Projeto de coleta de Banners, Faixas e Outdoors de lona de Publicidade para fazer Bolsas Ecológica (Ecobag);

4. Projeto de coleta de garrafas pet para a produção de Vassouras, Vassourões e Cordas de Varal Ecológica (15.000 garrafas pet são coletadas e compradas por mês);

7. Oficinas de Sabão em barra, pasta e líquido com objetivo da proteção ao meio ambiente e a geração de emprego e renda;

8. Projeto de Palestras de Educação Ambiental; 9. Projeto de Palestras de Combate ao Trabalho Infantil Irregular;

5. Projeto de Coleta Seletiva Solidária de Materiais

10. Projeto de arrecadação de doações de roupas,

Recicláveis em toda a cidade de Eunápolis;

brinquedos, sapatos e bolsas para famílias carentes apoiadas pelos projetos da AGO.

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AssociAção de Mulheres de itApebi

AS MARGARIDAS

A

mulhErEs dE itaPEbi – As Margaridas (AMIM) é uma organização de costureiras que trabalham na confecção de diversos produtos por encomenda (principalmente uniformes e ecobags, mas com ampla versatilidade) e na produção e venda de lingeries e biquínis. ssoCiação das

de acolhimento para as mulheres da localidade além de complementar a busca do ganho financeiro. Desta forma, recepcionam as mulheres que queiram aprender a costurar e produzir, mas também, e talvez com o mesmo peso, tenham necessidade ou desejo de pertencimento a um coletivo, sendo todas recebidas e integradas ao grupo.

O coletivo, exclusivamente de mulheres, é bastante coeso e o empreendimento também é um espaço

o EmprEENDimENto também é um EspaÇo de aColHimENto para as mulHErEs da loCaliDaDE.

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Enquanto negócio, estão concretizando seus sonhos, passo a passo: tornaram-se as costureiras do uniforme da guarda municipal para o desfile de aniversário da cidade, desenvolveram a identidade da marca e conquistaram um espaço para a loja própria. Embora tenham sua oficina em um espaço cedido pela prefeitura, já adquiriram várias máquinas próprias e tornam-se a cada ano mais autônomas.

além das ENComENDas, o Carro-CHEfE da associação é a proDuÇão de liNGEriEs, maiôs e biquíNis. 68


69


Fotos cedidas por Bruno Pinheiro

AssociAção dAs MArisqueirAs e pescAdorAs de belMonte

A

AMPB

Associação das Marisqueiras e Pescadoras de Belmonte (AMPB) é uma organização de mulheres que trabalham na coleta e beneficiamento de mariscos, pescados tratados, pó de camarão, temperos e outros itens secos. É um coletivo com reconhecimento na Costa do dEsCobrimEnto por suas práticas enquanto marisqueiras, por receitas com o “sabor especial do mangue” e pela qualidade de seus produtos, feitos exclusivamente de forma artesanal, cujos saberes são repassados, há décadas, de geração em geração. Cumprem também papel importante, com sua persistência, força e lucidez em recorrentes participações no Conselho de Assistência Social, no Colegiado da Costa do Descobrimento e no Conselho Deliberativo da RESEX de Canavieiras, 70

atuando no fortalecimento do território, em especial, na conservação da natureza, junto às lutas travadas pela Reserva Extrativista de Canavieiras - Unidade de Conservação. Outra grande fortaleza deste coletivo é a conservação da cultura através do seu samba de roda, brincadeira e dança que se mistura à sua identidade. Contam com conquistas recentes importantes, como a constituição da cooperativa, a finalização da nova unidade de beneficiamento e o investimento de programas estaduais para a estruturação de sua unidade. Entretanto, são trabalhadoras fortemente marcadas pelas dificuldades do “oficio de marisqueiras”, tido como secundário e subalterno, alvo de preconceito, sendo um ofício extenuante, executado por horas, que machuca as mãos, pouco valorizado e de baixo rendimento.


reconhecido na

Costa Do DEsCobrimENto, pela qualidade de seus proDutos, com o sabor

Fotos cedidas por Bruno Pinheiro

ĂŠ um EmprEENDimENto

Fotos cedidas por Bruno Pinheiro

EspECial do maNGuE.

71


Fotos cedidas por Bruno Pinheiro

são trabalHaDoras fortemente marCaDas

Enfrentam

problemas de saúde, falta de capital de

giro e o machismo, mesmo assim, as marisqueiras são reconhecidas, admiradas e queridas por características positivas: respeito ao ambiente, compromisso e participação na comunidade, na conquista do respeito às mulheres, preservação da ancestralidade, conhecimento e responsabilidade no trabalho, união, senso de coletividade, trabalho em equipe, e ainda, pela alegria do samba de roda! Impedidas do trabalho de beneficiamento de mariscos e do encontro, devido a pandemia, reinventam-se. Temporariamente suspendem a concretização do salto de qualidade que a unidade e os equipamentos conquistados significam, decidem permanecer em suas casas e empreender de outras formas. Voltam-se ao artesanato e ao resgate da confecção de doces e de salgados com recheio de marisco, tradição também forte da cidade de Belmonte. 72

pelas DifiCulDaDEs do ofíCio de marisquEiras.


as DifiCulDaDEs do trabalho são supEraDas pela uNião e DisposiÇão das mulHErEs e pela alEGria do samba de roDa.

73


AssociAção de Mulheres produtorAs rurAis AgroecológicAs

A

AMPRA

Associação de Mulheres Produtoras Rurais Agroecológicas (AMPRA) é um grupo exclusivamente de mulheres que também fazem parte da Associação de Produtores Rurais Unidos Venceremos (APRUNVE), composta por uma comunidade de 63 famílias, localizada ao lado do Parque Nacional Pau Brasil, em Porto Seguro. No território da APRUNVE há uma grande produção de frutas, legumes e hortaliças, tais como milho, abóbora, aipim, graviola, goiaba, abacaxi, acerola, entre outros. A comunidade tem consciência da riqueza advinda da substituição da monocultura pela produção agroecológica e assume atitudes que revelam consciência ambiental: implantação de cobertura verde das casas, desenvolvimento do banco de sementes crioulas, esforço para não poluir o ambiente, consciência do privilégio 74

de terem fonte de água, e acima de tudo, a posse da terra, mesmo que conquistada com dificuldade.


a assoCiaÇão representa o EmpoDEramENto fEmiNiNo fundamentado na busca por GEraÇão de rENDa, qualiDaDE de ViDa, prEsErVaÇão da Cultura local e do mEio ambiENtE.

75


Os produtores detêm grande saber tradicional e técnico, agroecológico e sustentável, fazem parte da Rede Povos da Mata que os apoia no esforço de transição da produção convencional hegemônica para a orgânica. O coletivo específico da AMPRA decidiu dedicar-se ao beneficiamento do excedente desses produtos, transformando-os em geleias, doces, chips, bolos em geral e licores de frutas típicas da região, depois de várias experiências bem sucedidas na oferta de lanches, cafés e refeições em eventos locais. O grupo faz parte do conselho do Parque Nacional Pau Brasil, que as apoia, da Rede de Economia Solidária, além da já citada Rede Povos da Mata, o que lhes dá confiabilidade. O coletivo de mulheres conquistou a construção de uma cozinha comunitária para, num primeiro momento, viabilizar a comercialização de doces, geleias e compotas, e posteriormente investir em novos nichos de mercado utilizando o excedente da produção de toda a comunidade.

a ComuNiDaDE tem CoNsCiêNCia da riquEza adVinda da substituição da moNoCultura pela proDuÇão aGroEColóGiCa.

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AssociAção pAtAxó dA AldeiA

O

Pé do Monte

s índios Pataxó já ocupavam parte da faixa litorânea e interior do Extremo Sul da Bahia, no século XVI, quando chegaram os colonizadores, segundo relatos da época. Como em todo território brasileiro, os indígenas desta região foram alvo de perseguições e genocídio durante os séculos subsequentes, com objetivo de colonização e exploração econômica. Em 19 de abril de 1943, agravando o contexto local, a criação do Parque Nacional do Monte Pascoal determinou que os índios do entorno do Parque seriam impedidos de caçar ou plantar naquele território delimitado pelo governo como área de proteção ambiental. Devido à decorrente insuficiência de áreas para atender a demanda de produção da população, na década de 90 é retomado o processo de reivindicação do território. 77


Apenas em 19 de agosto de 1999 representantes de seis aldeias locais retomam a sede do Parque e assumem a gestão do mesmo com o compromisso de proteger as matas e o Monte, através de projetos de desenvolvimento sustentável. Desde então, os Pataxó já passaram a trabalhar com turismo regional para ajudar na preservação do meio ambiente; anos depois, em 15 de maio de 2007, jovens interessados em consolidar o etnoturismo no Monte Pascoal criam a Associação Pataxó Aldeia Pé do Monte (APAPEM), que atua também com produções agrícolas, artesanato e criações, representando 89 famílias que residem na aldeia, localizada literalmente aos pés do Monte Pascoal, em Porto Seguro. A atração turística da Aldeia Pé do Monte é, como não poderia deixar de ser, o Parque Nacional e Histórico Monte Pascoal. Considerada primeira porção de terra avistada pelos portugueses, o Monte possui, nos 22.383 hectares delimitados do parque, atrativos naturais repleto de belezas cênicas, promove a realização de diversas atividades recreativas como caminhadas em trilhas, contemplação da natureza, observação de fauna e flora, participação de manifestações culturais indígenas, vivência do modo de vida local, degustação da culinária indígena e compra de artesanato. O etnoturismo desenvolvido pelos indígenas, além de fonte de renda, tem a função de preservação da riqueza natural do território sobre o qual readquiriam o direito perdido, após séculos de luta. Os guias são profissionais diferenciados, com conhecimento dos costumes, rituais tradicionais ancestrais e espiritualidade ligada à natureza, mas acima de tudo são os guardiões da terra a qual pertencem, a qual reverenciam, a qual querem preservar para seus descendentes, e não explorar até sua exaustão, por exclusivo interesse financeiro.

78

os guias iNDíGENas são profissionais DifErENCiaDos, com CoNHECimENto dos CostumEs, dos rituais tradicionais e da EspiritualiDaDE ligada à NaturEza.


o artEsaNato e a CoNfECÇão de CamisEtas com DEsENHos criados pelos artistas da alDEia também são fontes de rENDa e forma de ValorizaÇão da Cultura.


AssociAção dos pequenos Agricultores de

A

PETROLÂNDIA

Associação dos Pequenos Agricultores de Petrolândia (APAP), situada no distrito homônimo da cidade de Belmonte, é formada por cerca de 40 famílias de agricultores e extrativistas de piaçava. Vivem numa comunidade rural que tem como base a agricultura familiar, com grande potencial para a produção de hortaliças, abóbora, melancia, milho, feijão, quiabo e mandioca. O plantio compartilhado é feito numa área de amortecimento da monocultura de eucalipto, às margens da rodovia que liga Belmonte à Eunápolis, em regime de comodato, divididos em 21 lotes. Toda sua produção visa chegar à mesa do consumidor com qualidade, buscando criar um vínculo de afetividade entre produtor e consumidor. 80


É um coletivo de produtores com experiência, conhecimento e tradição rural, cada um tem sua terra própria e priorizam seu sustento individual. Estão empreendendo coletivamente para complementar a renda e constituir um grupo que os fortaleça. No espaço comum, cultivam vegetais de ciclos curtos, como melancia e abóbora, para os quais os mercados de Eunápolis e Belmonte têm demanda e existe a possibilidade de venda dos produtos para a merenda escolar.

estão EmprEENDENDo ColEtiVamENtE para complementar a rENDa e CoNstituir um grupo que os fortalEÇa.

a APAP é formada por 40 famílias de aGriCultorEs e ExtratiVistas da piaÇaVa.

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AssociAção dos pequenos produtores rurAis de

UNIÃO BAIANA

P

arte do município de Itagimirim-BA, o distrito de União Baiana é um local surpreendente. O viajante que se direciona para o distrito passa por plantações, pastagens e muitos quilômetros de produção de eucalipto. Os arredores levam a crer que urbanização ficou distante e que se chegará a um povoado diminuto e isolado. Ledo engano. Encravada entre as pastagens e a silvicultura, União Baiana aparece extensa e organizada, com suas ruas de paralelepípedos e cerca de 760 habitantes. A organização do distrito é reflexo dos seus habitantes, cuja maior parte se encontra organizada também na Associação dos Pequenos Produtores Rurais de União Baiana (APPRUB). A APPRUB é uma associação em pleno processo de expansão, apresentando volume e diversidade na produção, composta por abacaxi, hortaliças, 82

ENCraVaDa entre as pastaGENs e a silViCultura,

UNião BaiaNa aparece ExtENsa e orGaNizaDa.


verduras, coco, galinha caipira, abóbora, criação de peixe e outras. Mas o principal produto, não só em volume de produção, como em importância cultural para o distrito, é a mandioca. O vegetal essencialmente brasileiro, consumido desde os povos originários e de extrema importância para toda a região nordeste, encontra em União Baiana mais um de seus santuários. A comunidade produz 1.200 toneladas da raiz por ano. Toda a mandioca produzida, além de ser vendida in natura, é beneficiada pelos próprios moradores da comunidade, gerando derivados como fécula e farinha. A partir desses derivados a comunidade ainda produz bolos, doces e salgados, gerando um importante incremento de renda.“Em 2012, fomos contemplados com a construção de uma agroindústria para a fabricação de fécula de goma. Participamos de inúmeros cursos de qualificação e treinamento com o objetivo de profissionalizar a nossa produção. Então, os benefícios são inúmeros, mas tudo isso veio de muito suor e trabalho”, explica Agnevaldo Cardoso Rodrigues, presidente da associação.

83


As conquistas passadas foram muitas, mas isso não fez com que os associados se acomodassem, pelo contrário, continuam organizados e atuantes, na busca de mais melhorias para a comunidade. Em uma de suas últimas conquistas, a APPRUB tem conseguido reformar sua casa de farinha, com modernizações no projeto arquitetônico e no maquinário. Com isso, apresentam-se como referência para coletivos de produtores rurais de todo o território, demonstrando como aliar luta, produção e sustentabilidade, sem abrir mão da rentabilidade e de sua identidade cultural.

a ComuNiDaDE também tem VariEDaDE na proDuÇão de frutas e HortaliÇas.

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Grupo de Mulheres

RAÍZES DA TERRA

A

Associação Comunitária dos Produtores Rurais da Baixa Verde (ASCOMBAVE) fica localizada na zona rural de Eunápolis, com 60 famílias assentadas e integra o Movimento de Luta pela Terra (MLT). O grupo de mulheres Raízes da Terra se constituiu dentro da ASCOMBAVE com o propósito de melhorar a renda das famílias, trabalhar a agroecologia sustentável, promover a recuperação ambiental e manter as práticas culturais ancestrais.

O Território de Identidade da Costa do Descobrimento tem uma história de grilagem secular. Em 2007, o MLT, cujos integrantes tiveram suas terras ilegalmente invadidas, realizou uma pesquisa de terras devolutas e retomou 1.333 hectares de terras em 2008. A terra é retomada e através da produção alimentar de aproximadamente 300 hectares, o movimento garante a permanência na área, pois rapidamente

As produções são consorciadas e variadas, para a recuperação da área e produção de alimentos, tais como feijão, girassol, abóbora, hortaliças, quiabo, maxixe, pimentas, abacaxi, melancia e, principalmente, a mandioca. A comunidade trabalha em lotes coletivos e individuais e realiza atividades sociais em conjunto com universidades, institutos, CRAS e outras instituições locais, regionais e estaduais.

melhorar a rENDa das famílias,

o Grupo se constituiu para trabalhar a agroecologia sustENtáVEl, promoVer a rECupEraÇão ambiENtal e manter práticas Culturais aNCEstrais. 85


entram na economia local fornecendo alimentos para o PAA, PNAE, ONGs, entre outros consumidores diretos. A área, extremamente degradada, também é reflorestada pelos acampados. São plantados 80 hectares de árvores nativas da Mata Atlântica, mais 800 de árvores frutíferas e nativas para a revitalização de uma nascente, antes seca, devido ao agronegócio. A comunidade conquistou uma escola, montou uma biblioteca, passou a receber visitas médicas, estruturou um grupo teatral de jovens e adultos e organiza festas comunitárias anuais de Natal, Dia das Mães e São João. Neste contexto, renascem na comunidade os rituais, a medicina, saberes e fazeres tradicionais e a mandioca ocupa um lugar de destaque. O pré-assentamento torna-se um dos maiores produtores e fornecedores de mandioca para produção de farinha na região. Através dos saberes e práticas ancestrais indígenas e de afrodescendentes, da evocação das estratégias 86

de luta e resistência destas populações oprimidas, as mulheres adotaram a mandioca e a produção de seus derivados, culturalmente associados a estas populações menos favorecidas, como símbolo valoroso da cultura nacional. Da cultura do plantio e da gastronomia tradicional da mandioca, surge o grupo de mulheres Raízes da Terra, com a intenção de intensificar a comercialização de seus derivados. Estas mulheres pré-assentadas e agricultoras, mães, lutadoras desprovidas de muitos direitos, acreditam no coletivo para avançar nos processos de resistência. Unidas pela ideia de disseminar a utilização da mandioca, passam a ”rechear” todas as festividades do pré-assentamento com seus produtos. Convidados, visitantes,


estagiários e professores de universidades e institutos federais que degustaram as iguarias, apontaram seu diferencial e interesse em seu consumo.

motiVaDas pelo suCEsso,

Motivadas pelo sucesso “em casa”, as mulheres do Raízes da Terra passam a oferecer serviços culinários para eventos com cafés da manhã, coffee break e festividades em geral. O grupo se aperfeiçoa na produção de diversos produtos, tais como cacuanga e enrolados doces e salgados, pizza, panqueca, pães, bolinhos, bolos de aipim, puba, beijus e tapioca, usando a mandioca como insumo ideal para receitas desconhecidas e requintadas, além das receitas tradicionais.

passam a oferecer serViços

as mulHErEs do grupo CuliNários para EVENtos.

Ao perceberem a aceitação do público surge a ideia do empreendimento, dando destaque à mandioca como patrimônio imaterial, devido ao uso ancestral da raiz, sua presença no cotidiano e na construção identitária do povo da região.

rENasCEm, na ComuNiDaDE, sabErEs e fazErEs, e a maNDioCa ocupa local de DEstaquE.

87


88


89


AssociAção de Apicultores e Meio AMbiente de guArAtingA

E

ASAPMAG

m 2019, como parte de seu Programa de Desenvolvimento Territorial (PRODETER), o Banco do Nordeste elegeu a apicultura como atividade econômica prioritária para financiamentos na Costa do Descobrimento. Essa escolha, que abre muitas possibilidades para o desenvolvimento da apicultura no território, vem para solidificar o já conhecido potencial da atividade na região. Um dos principais exemplos de sucesso quando se pensa a apicultura da Costa do Descobrimento é a Associação de Apicultores e Meio Ambiente de Guaratinga (ASAPMAG). Fundada em 2006, desde seu início a associação vem contribuindo para o desenvolvimento socioeconômico e geração de renda local, atualmente contam com cerca de 70 associa90

dos, abrangendo famílias da área urbana e rural. Sua principal produção é o mel, com aproximadamente 15 toneladas produzidas pelos apicultores associados no ano de 2019. A ASAPMAG possui uma casa de mel própria, o que permite a extração e decantação do produto, porém ainda enfrenta dificuldades para o envasamento e a venda direta, sendo obrigada a

a ASAPMAG é um dos principais ExEmplos quando se pensa no suCEsso da apiCultura na

Costa Do DEsCobrimENto.


recorrer a atravessadores para a comercialização de sua produção. Para enfrentar esse problema, o grupo tem lançado seu próprio mel, o Apis Guará. Além disso, o conhecimento tecnológico é continuamente buscado por seus integrantes. O grupo domina um diversificado saber apícola, além da própria produção de mel, também são capazes de produzir própolis, gerir o processo de produção de rainhas e o manejo da cera apícola. Como aponta o nome da associação, o cuidado com o meio ambiente também é um aspecto fundamental do

com muito EsforÇo, a assoCiaÇão Vem se estruturando, possuindo hoje uma sEDE e uma Casa Do mEl.

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grupo, que segue práticas agroecológicas e atua no reflorestamento de nascentes na área rural, com o objetivo de colaborar com a sustentabilidade ambiental do município. Ao longo dos seus 14 anos de existência, a ASAPMAG vem se fortalecendo e se tornando referência para os apicultores da Costa do Descobrimento, demonstrando que com um pouco de incentivo e muito esforço coletivo, é possível uma produção econômica solidária, justa e sustentável.

o VElamE, comum em GuaratiNGa, permite uma floraDa silVestre Valiosa para os apiCultorEs da assoCiaÇão.

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AssociAção dos produtores rurAis dA ZonA dA conceição e AdjAcênciAs

A

MARGARIDAS DE BELMONTE

s Margaridas de Belmonte, cujo registro formal leva o nome de Associação dos Produtores Rurais da Zona da Conceição e Adjacências, é uma organização de agricultores familiares (em sua maioria mulheres) urbanos e rurais, que possuem uma vasta diversidade de produtos.

comercializar, embora com baixo preço, quase a totalidade do que colhem e beneficiam.

O coletivo, além do plantio, realiza processos diversificados de beneficiamento: geleias, doces, temperos, farinhas, óleos, produtos cosméticos, sabão, vinagre, massas, catchup, mostarda etc.

Mas, acima dos ganhos financeiros advindos da produção, as participantes avaliam que o maior valor do coletivo é o pertencimento ao grupo, pois este é unido e possui uma dinâmica de apoio mútuo nas dificuldades emocionais e materiais, criando especialmente um ambiente de pertencimento, referência e apoio para a autonomia e força daquelas que sustentam suas casas e criam seus filhos sozinhas.

Tais produtos são comercializados numa feira semanal do município ou entregues a domicílio, de bicicleta ou a pé. Segundo as produtoras, estas conseguem

Através do coletivo também se tem acesso a cursos de capacitações, como o de olericultura, piscicultura e suinocultura, cujos certificados disponibilizados pelo 93


SENAR são motivos de orgulho para os associados. O coletivo já atingiu um dos seus objetivos que é a comercialização local dos produtos in natura e beneficiados; mas estão se organizando para avançar as certificações dos produtos, para expandir as vendas a outras localidades e consumidores. Além disso, trazem como conquista a realização de um Seminário de Agricultura Familiar, com a presença de representantes da SETAF, Bahia ATER, Bahia Pesca e do Banco do Brasil, tratando do Pronaf. Por fim, através do esforço conjunto, realizaram um mutirão de regularização de Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), com o apoio do secretário de agricultura local.

o ColEtiVo, além do plaNtio, realiza proCEssos DiVErsifiCaDos de bENEfiCiamENto.

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cruzando o jEquitiNHoNHa, chega-se à tErra de luCiNalVa, produtora associada às marGariDas DE bElmoNtE.

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cooperAtivA AgroindustriAl de guArAtingA

COOPERAG

A

Cooperativa Agroindustrial de Guaratinga (COOPERAG) está inserida nas tradições de um povo simples que busca a coletividade, com base nas quais o pioneiro agricultor Otacilo do Carmo Dias começou o plantio de cacau e urucum no pé da pedra que é símbolo da cidade. A cooperativa foi fundada em 2014, pelo apicultor Izaías Domingues Marques, com o intuito de iniciar a industrialização de alimentos produzidos por agricultores de Guaratinga e de cidades próximas (principalmente Itabela) e conta com produtores de cacau, café, cupuaçu, pimenta do reino, criatório de frango, peixe, suíno e apicultores de mel orgânico. Dessa forma, a cooperativa funciona como uma espécie de central de beneficiamento, recolhendo produções de pequenos agricultores e revendendo-as, após o processo de beneficiamento e envasamento. O grupo é composto por pessoas que já participaram de diversos cursos, como aquaponia, apicultura básica, produção de rainhas, cooperativismo e associa96

tivismo, piscicultura, entre outros, adquirindo e acumulando conhecimento técnico e vivencial, formando um coletivo rural que conta com múltiplos saberes. Constantemente realizam pesquisas e cursos online para atualização contínua e contam com componentes que compartilham seus conhecimentos individuais entre os cooperados. Constitui-se assim como um

a CoopEratiVa funciona como uma espécie de CENtral de bENEfiCiamENto, recolhendo e reVendendo proDuÇÕEs de pequenos aGriCultorEs após o processo de bENEfiCiamENto e ENVasamENto.


coletivo que tem conhecimento técnico e especifico extenso e diferenciado. Umas de suas principais características é a produção artesanal de corante e pimenta moída, feitos no pilão de modo tradicional, como os antigos faziam.

os CoopEraDos constantemente realizam pEsquisas e Cursos online para atualizaÇão contínua.

o Carro-CHEfE da COOPERAG é a pimENta-Do-rEiNo, mas a CoopEratiVa possui uma ampla cartela de proDutos.

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rede povos dA MAtA

NÚCLEO MONTE PASCOAL

N

o final de 2015, surge a Rede de Agroecologia Povos da Mata, primeira certificadora participativa orgânica da Bahia. Dois anos depois, os agricultores e indígenas de Porto Seguro aderiram a Rede Povos da Mata com apoio da Secretaria de Agricultura e Pesca. Uma equipe técnica foi formada e começou a apoiar os grupos interessados em agricultura orgânica, foram realizados cursos, capacitações e visitas nas propriedades. No final de 2017, em Porto Seguro, nasce o Núcleo Monte Pascoal. A criação deste Núcleo viabilizou a adesão ao sistema participativo orgânico dos agricultores e indígenas da região Extremo Sul da

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Bahia. Pois além de Porto Seguro com a criação do Núcleo os municípios do território Costa do Descobrimento foram incluídos. De forma participativa, como rodas de conversa e visitas, os agricultores de Porto Seguro compartilharam suas experiências e conhecimentos, adquiridos em Rede, com as cida-

aGriCultor Visitando aGriCultor, diVidindo sabErEs, sEmENtEs e ExpEriêNCias.


a traNsiÇão de sistEmas de proDuÇão conVencionais para aGroEColóGiCo não é apenas a substituiÇão de insumos químiCos por outros orGâNiCos.

des do território. Agricultor visitando agricultor, dividindo saberes, sementes e trocando experiências. A transição de sistemas de produção convencional para agroecológico não é somente substituição de insumos químicos por outros orgânicos, mas requer um olhar sistêmico e a compreensão de um conjunto de práticas para que este sistema seja de fato produtivo e viável.

O produtor que participa voluntariamente em algum Núcleo da Rede de Agroecologia Povos da Mata deve submeter-se aos procedimentos do Sistema Participativo de Garantia (SPG). A certificação participativa viabiliza aos pequenos agricultores o acesso ao SELO ORGÂNICO para comercializar seus produtos em mercados, lojas, feiras agroecológicas na Bahia e no Brasil. Também podem participar da Certificação Participativa o artesanato de extrativismo sustentável, onde buscamos o resgate cultural dos povos tradicionais.

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A proposta do Núcleo Monte Pascoal vai além da certificação dos produtos, visando primeiro a soberania alimentar, um alimento de verdade, sem resíduos químicos na mesa das famílias participantes. E também a geração de renda local sustentável com valor agregado. Atualmente os agricultores comercializam seus produtos através da entrega de cestas, feiras agroecológicas, PAA e PNAE, são 130 famílias que participam do Núcleo Monte Pascoal, nas cidades de Porto Seguro, Cabrália, Caravelas, Teixeira de Freitas, Alcobaça e Mucuri. O agricultor que tiver seu produto certificado como orgânico pode recebe até 30% a mais na entrega do PAA e PNAE. Também na comercialização em mercados e atacados recebe um valor diferenciado. Em 2018, os primeiros agricultores do Extremo Sul da Bahia, em Porto Seguro, recebem o Selo Orgânico Brasil de certificação participativa. Este selo é a garantia para o consumidor da rastreabilidade dos produtos. 100

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Velho Chico.

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