Guia sobre o queijo do Serro - Anglo American

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“Falar de Serro sem queijo, é uma frase sem verbo. Não tem sentido.” Jorge Simões, Presidente da Associação de Produtores Artesanais do Queijo do Serro (Apaqs)

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O queijo é muito mais do que um produto que fomenta a economia do Serro. É uma herança cultural da região, que ainda mantém como tesouro o ritual de produção.

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sua qualidade reconhecida internacionalmente e ganhou o título de patrimônio cultural do Brasil. Para celebrar os 300 anos do Serro, a Anglo American produziu uma pequena homenagem.

A cidade, especialmente a partir do século 20,

Essa publicação traz personagens e fatos que

passou a se confundir com o seu queijo. Contan-

contam um pouco da história da cidade e de seu

do com condições ambientais e climáticas propí-

maior patrimônio cultural: o queijo. Nas páginas

cias, o produto, feito de forma artesanal, sem dei-

a seguir você vai saber como ele é feito, além de

xar de incorporar técnicas modernas, passou a ter

conhecer o que está por trás dessa tradição.

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Cultura e alimentos vivos

“Status singular”. É assim que os produtores

O reconhecimento contribui para a organiza-

de queijo do Serro demonstram o orgulho de seu

ção dos produtores, fortalece a produção e sua

produto, oficialmente reconhecido como único.

adequação às melhores normas de classificação Hoje, o Serro e arredores são cada vez mais

trados como Patrimônio Cultural Imaterial pelo Ins-

alvo de interesse e visitas, que tentam compre-

tituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico

ender e aprender sobre o cotidiano de uma ci-

de Minas Gerais (Iepha). Em 2008, ganhou o título

dade que, unindo sua cultura e tradição, trans-

de Patrimônio Cultural do Brasil, pelo Instituto do

formou-se na terra do queijo.

Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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e controle sanitário.

título de patrimônio é peça fundamental para a sustentabilidade da nossa “ O tradição. Nossa arma para manter o nosso queijo como ele sempre foi.

Desde 2002, o modo artesanal de produção e as características distintas do queijo da região são regis-

Roberto “Maravilha”, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais

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Para ganhar o mundo

A

classificação do Iphan é resultado de uma extensa pesquisa histórica e trabalho

H

oje o queijo do Serro tem status semelhante ao champagne francês.

Ou seja, apenas o produto feito na região,

de campo para assegurar a identificação e

seguindo métodos específicos de produção

catalogação dos bens culturais observados.

e

No caso do queijo de Minas, o Instituto

chamado de queijo artesanal de Minas

inventariou as regiões do Serro, Serra da

Gerais. Passo fundamental que mantém

Canastra e Serra do Salitre (Alto Paranaíba).

a qualidade uniforme das unidades e que

determinada

fiscalização,

pode

ser

torna o produto cada vez mais apreciado na culinária sofisticada.

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Do ouro ao leite - Da carroça ao container

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A tradição do queijo faz parte da vida do Ser-

Transportado antigamente em lombo de burro,

ro há três séculos. Introduzido pelos coloniza-

pelas tropas, envolvidos por jacás de taquara ou

dores portugueses no século 18 para alimentar

em bruacas de couro cru, o queijo artesanal do

a crescente população que migrou para a região

Serro mantém as mesmas características e segre-

em virtude da exploração de ouro e diamantes,

dos que tornam o seu sabor tão especial e referên-

o produto chegou a ser alvo de investigações

cia da culinária brasileira. O que mudou é que se

para evitar o contrabando de pedras preciosas

antes eram transportados em carros de boi, agora

em seu interior. Com a decadência do ciclo do

são acondicionados em caminhões frigoríficos.

ouro, a opção dos moradores foi intensificar a

A madeira dos utensílios e mesa também deu

atividade agropecuária, em um processo que

lugar a materiais de plástico e a superfícies de aço

resultaria no estabelecimento do queijo como o

inoxidável, ardósia ou granito, seguindo o rigor da

produto símbolo local.

legislação sanitária.

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Salão do Queijo

U

ma casa histórica no centro do Serro está em reforma para sediar o Salão do

Queijo. O espaço terá um museu com peças antigamente usadas na produção do produto, além de biblioteca, café e uma cozinha experimental onde serão oferecidos cursos. O imóvel pertencia a família de Valdemir Lins Mesquita, antigo produtor e comerciante de queijo da cidade. Enquanto o local não é inaugurado, os interessados podem visitar a fazenda de Jorge Simões. O produtor e presidente da

R

egistros documentais apontam que as técnicas de fabricação do chamado

“queijo minas” têm origem na tradição portuguesa da Serra da Estrela, em Portugal, onde o produto é elaborado com leite de ovelha e extrato de flor de cardo. Outra versão remete à iguaria a Ilha da Madeira, na região dos Açores. A produção no local é feita a partir de coalho animal, como ocorre hoje no Serro.

Associação de Produtores Artesanais do Queijo do Serro (Apaqs) mantém interessante acervo com materiais históricos usados nos então chamados “quartos de queijo”.

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Não basta parecer, é preciso seguir o ritual

Para ser considerado Queijo Minas Artesanal do Serro, todos os exemplares do produto devem possuir ingredientes e características específicas: Ingredientes obrigatórios: Leite de vaca cru integral, cultura lática natural (soro, pingo ou fermento natural), coalho e sal. Características necessárias: forma cilíndrica com diâmetro de 13 a 15 cm; consistência semiduro; crosta fina, sem trinca; textura compacta; cor branca amarelada; altura de 4 a 6 cm e peso entre 700 g e 1 kg; maturação mínima de 7 dias em local fresco, sem incidência direta de luz solar.

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Seis décadas de experiência

Aos 14 anos Sanção Pereira já ajudava o pai

o ofício. Apesar do endereço não ter mudado, o

a fazer o queijo que sustentava a família. Aos

quarto do queijo já não é mais o mesmo. O local

74, a queijaria continua a fazer parte da sua ro-

foi reformado e Sanção passou a seguir diversas

tina. Por suas mãos, 30 a 35 unidades são feitas

exigências, como o uso da touca e do avental. “Foi

diariamente. O trabalho começa cedo, por volta

difícil no começo porque eu fiz de um jeito a vida

das 5 horas da manhã, e termina às 9 da noite.

toda, mas agora já acostumei e acho bom porque

“Para fazer um queijo do Serro tem que ter ca-

garante a qualidade”. Do tempo do pai, ele sente

pricho, não pode fazer correndo”, conta. Ele con-

falta do capim meloso. “Dava um sabor especial

tinua morando no lugar que nasceu e aprendeu

ao queijo”, relembra.

filhos saíram da roça para estudar. Espero que um deles “Meus dê continuidade a queijaria, assim como fiz com meu pai.

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Sanção Pereira, produtor de queijo

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Ambiente favorece a produção Situada à oeste da Serra do Espinhaço, a cidade

de capim gordura (também nomeado de meloso)

historicamente teve seu desenvolvimento limitado

e capins típicos dos campos de altitude. Com isso,

pela dificuldade de acesso – as rodovias BR 367 e

ocorre o desenvolvimento de especificidades que,

120, receberam pavimentação apenas nos anos

a partir da alimentação das vacas, influenciam di-

1980. Essa situação provocou dificuldades de escoa-

retamente o grupo de bactérias que proporcionam

mento da produção do leite “in-natura” pela ausên-

o sabor ao queijo.

de conversão do produto em algum ativo.

A cereja no bolo ou, nesse caso, o gosto do queijo, o que o distingue e confere identidade, vem da tra-

Outros fatores naturais e culturais, no entan-

dição cultural que, passada de pai para filho, usa o

to, são determinantes para explicar a existência

leite cru e a adição do pingo, fermento lácteo natural

de um produto tão especial. O relevo, o clima e

recolhido do soro drenado do próprio queijo, para

a vegetação da região propiciam o aparecimento

lhe dar a qualidade característica.

de pastagens naturais em que há predominância

dos maiores segredos da nossa produção está na associação “dasUmcondições naturais com a relação pessoal que todos os serranos mantêm com o queijo, considerando-o nosso maior patrimônio. Jorge Simões, Presidente da Associação de Produtores Artesanais do

cia de melhores vias e da consequente necessidade

Queijo do Serro (Apaqs) 18

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Como saber se o queijo é bom

te, mas fora daqui é o que mais vende”, conta.

te, a força do ofício de seus antepassados trou-

Os queijos curados de Eduardo chegam às mesas

xe Eduardo de Melo de volta ao Serro. Há três

de Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo.

anos, ele se dedica integralmente à produção do

Para conseguir cruzar fronteiras, foi preciso mui-

queijo, aprendida do bisavô. “É como andar de

ta adequação. “Adaptei a queijaria às exigências

bicicleta, não se esquece”, diz. Dos cerca de mil

e consegui a certificação para vender em todo o

produtores da região, ele é o único especializa-

Brasil”. E como saber se um queijo é bom? “Di-

do no queijo curado. “O mineiro não tem tanto

zem que se o queijo afundar em um balde d’água

hábito de comer queijo com o gosto mais for-

é bom, se boiar não presta”, brinca.

não fico preocupado em guardar minha receita não. Posso passar a receita pro su“jeito,Euque ele não vai conseguir fazer igual. Apesar do padrão exigido, os mesmos ingredientes podem resultar em queijos diferentes. Essa é a beleza do produto artesanal.

Depois de anos trabalhando como comercian-

Eduardo de Melo, produtor

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Trabalho de artesão O processo de fabricação do Queijo Minas Artesanal do Serro pode levar até uma semana. Ao leite fresco é adicionado fermento e um coagulante. Em seguida a massa é cortada, triturada e colocada em fôrmas. Doze horas depois, é momento de lavar e colocar sal grosso em um dos lados. Mais seis horas, virar e salgar o outro lado. Para atingir o ponto ideal, são mais dois dias até retirar da forma e deixar na maturação.

Produtores

950

Produção Anual

3.600 toneladas (12/dia)

Valor da Produção

R$ 40.000.000 (120 mil/dia) fonte: Prefeitura de Serro

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Muitos produtores aprenderam a fazer queijo quando eram “crianças, seus avós e bisavós foram produtores. Desde pequeno me recordo bem da necessidade de participar da produção, de botar a mão na massa. Acredito que todos nós do Serro crescemos tendo uma relação muito próxima ao queijo.

Impacto econômico e social do queijo para o Serro

Carlos Dumont, Presidente da Cooperativa dos Produtores Rurais do Serro 23


Nasce um queijo

5– Aperta-se com as mãos para sair o excesso do soro,

6– O passo seguinte é lavar com água e salgar.

sem colocar muito peso.

1– Ordenha mecânica: o leite fica em um

2– Coloca-se o coalho (enzima retirada do

tambor que é protegido por uma manta

estômago) do boi no leite. O processo

térmica quando está muito frio. O pro-

leva entre 1h e 1h30 para talhar.

cedimento mantém a temperatura de 35

7– Após 12h, lava-se o queijo com

graus em que o leite está quando é tirado

água e o outro lado é salgado.

da vaca.

Novamente, ele fica descansando. 3– “Corta-se”

a

massa,

separando o soro através de uma peneira feita com tecido bem fino e poroso.

4– A massa é colocada em formas de plástico grosso, furadas embaixo.

9– A casca grossa que se forma é

Depois, deixar descansando.

8– O queijo vai para as “prateleiras” para maturar.

10– Hora do embalo e refrigera-

ralada para dar o acabamento.

mento. O frio é para o processo de maturação.

O soro que é retirado da massa é usado para alimentar o gado. Também é recolhido o pingo, usado na receita do dia seguinte. Ele tem bactérias que dão o gosto do queijo. 24

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O queijo e eu somos praticamente irmãos. Desde pequeno, vivo com ele, no início “aprendendo com meu pai como fazê-lo e hoje produzindo-o diariamente. É uma Raul Clementino Júnior (Raulzinho), produtor local

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tradição e uma parte da minha família que faço questão de preservar.

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Receitas de família

Comadres de profissão e gravidez, Maria Gar-

massa em eventos beneficentes da cidade. Antes

cia e Marilene de Melo também dividem o amor

mesmo de se aposentar das salas de aula, Mari-

pelo fogão. Suas receitas saem das mesas de casa

lene vendia quitandas para ajudar no orçamento

para dar água na boca de serranos e turistas.

da família. “Sou neta de quitandeira. Meu marido

Filhas do Serro, o queijo é ingrediente certo para

brinca que fico feliz quando estou perto de um for-

muitas aventuras na cozinha.

no”, diz ela, que desde pequena aprendeu a usar

A intimidade com as panelas também é coisa

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na cozinha os queijos produzidos pelo pai.

antiga. “Eu tinha 12 irmãos. Acabei aprendendo

Elas abriram seus livros de receitas e mos-

a cozinhar para ajudar a minha mãe”, conta a

tram como fazer duas iguarias que levam o queijo

professora Maria, que também coloca a mão na

do Serro.

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por Maria Garcia

Recheio (opcional)

Ferva o óleo com o sal e uma xícara de leite;

“Para o aniversário do meu filho, recheei o pão de quei-

Ingredientes:

Em uma vasilha, misture o polvilho e a manteiga;

jo com muçarela e presunto. O recheio fica a gosto do

Escalde o polvilho com o óleo fervido com leite.

freguês, pode ser com frango, carne moída. Depois que

1 kg de polvilho azedo

Espere ficar morno para sovar e desmanchar os

a massa estiver pronta, basta colocar o recheio dentro

1 xícara de chá de óleo vegetal

caroços da massa;

de cada bolinha e fechar antes de levar ao forno”.

2 xícaras de leite

Bata a cebola no liquidificador ou processador

1 colher de manteiga

com uma xícara de leite;

6 ovos

Coloque a cebola na massa do polvilho e

1 colher de sopa rasa de sal (a medida varia se

salpique orégano;

o queijo já for salgado)

Bata os ovos e misture-os na massa até que ela

100 gramas de orégano

fique homogênea;

1 cebola grande

Acrescente o queijo, sem sovar a massa. Se achar

Acabou caindo no gosto deles e dos

800 gramas de queijo do serro meia cura

necessário, vá colocando mais leite para amolecer

amigos. Pão de queijo feito com o nosso

(ralado grosso)

a mistura; Faça as bolinhas e leve ao forno pré-aquecido por

Inventei esse pão de queijo para “ comemorar os 15 anos de um dos meus filhos. Era uma brincadeira, já que meninos não fazem baile de debutante.

queijo é mais suave.

Pão de queijo especial

Modo de fazer:

40 minutos, em média. O tempo de cozimento varia para cada forno.; 30

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Modo de fazer:

3 xícaras de nata ou 1 e ½ de manteiga 3 ovos

Biscoitinho de queijo por Marilene de Melo

1 colher de sopa rasa de sal 1 xícara de leite 2 xícaras de queijo do serro curado ralado 1 kg de trigo com fermento *Essa receita rende em média 1 kg de biscoitos.

Em uma bacia, misture a nata (ou manteiga), os ovos, o leite, o sal e o queijo; Coloque o trigo aos poucos e misture até que ele solte das mãos; Enrole e asse em forno pré-aquecido a 180 graus por aproximadamente 30 minutos.

Esse biscoito é campeão de ven“das. O pessoal encomenda para levar para outras cidades

Ingredientes:

Dica: “para os biscoitos ficarem neste formato, faço uma tira grande e vou cortando com um copo americano. Depois é só dar uma torcidinha com os dedos”.

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Quiz O queijo artesanal de Minas conta com alguns termos específicos, comuns aos produtores e habitantes da região, mas que nem sempre são de entendimento de pessoas de fora. Teste seus conhecimentos completando os espaços com as palavras abaixo: 1. curado | 2. merendeiro | 3. rala |4. meia cura | 5. fatura | 6. pingo 7. queijeiro | 8. coalho | 9. pango | 10. quarto de queijo | 11.banca Superfície de pedra ardósia ou granito em que o queijo é faturado Enzima retirada do estômago de ruminantes utilizada para coagular o leite usado na produção do queijo Estágio de maturação do queijo. Processo que dá forma ao queijo e prepara-o para as próximas etapas Queijo com pouco tempo de maturação. Queijo destinado especificamente ao consumo familiar, ou mesmo, que aproveita a sobra de massa que seria insuficiente para um queijo de tamanho normal Planta utilizada na higienização de instrumentos e materiais necessários à fatura do queijo artesanal Fermento lático coletado do soro resultante das primeiras horas após a fatura e salga do queijo. É produzido no próprio local de produção do queijo Expressão comum no Serro, remete ao local em que é produzido o queijo. Na Serra da Canastra e na região do Alto Paranaíba é conhecido como “Queijaria” Produtor de queijo. Expressão típica da região do Serro Massa de queijo ralada, normalmente destinada à quitandas e farofas fonte: Prefeitura de Serro

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resposta: 11, 8, 1, 5, 4, 2, 9, 6, 10, 7, 3

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Vila do Príncipe na Serra dos ventos frios

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O Serro carrega no próprio nome um pouco

formado para a exploração da região. Em 1714,

da história da sua origem. Os índios botocudos,

o povoado foi elevado à ‘Vila do Príncipe’, em ho-

primeiros habitantes da região, atribuíam ao local

menagem ao príncipe português D.José I, marcan-

o nome de Ivituruí, que no seu idioma significa-

do a fundação da cidade.

va “serra dos ventos frios”. Mais tarde essa seria a

Uma das cidades mais importantes do estado

inspiração para a nomeação da cidade, primeira-

no período colonial, o Serro atraiu muitos aven-

mente como Serro Frio e, em seguida, Serro.

tureiros em busca de riquezas. Com eles, vieram

Os dados da fundação mostram que expedições

um grande número de exploradores e religiosos,

portuguesas do início do século 18 descobriram

que ajudaram a trazer para a cidade muitas das

grandes jazidas de ouro e diamantes no local, fa-

características consideradas definidoras da cultura

zendo com que, rapidamente, um povoado fosse

mineira, como a arquitetura e culinária.

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Por mais de cem anos, a cidade viveu em torno da mineração de pedras preciosas. Contudo, com a riqueza finita, no início do século 19, a maioria da população foi obrigada a iniciar um novo ciclo de desenvolvimento, baseado, principalmente, na pecuária e agricultura de subsistência. As dificuldades de acesso fizeram com que o desenvolvimento e a modernidade demorassem a chegar aos serranos, que por isso, ainda hoje são marcados como povo extremamente tradicional e

A

lguns nomes famosos no cenário nacional nasceram no Serro, entre eles o ex-

governador de Minas Gerais, João Pinheiro, o escultor Mestre Valentim, o republicano Teófilo Otoni, o maestro Lobo de Mesquita e o escritor Oswaldo França Júnior.

apegado às suas raízes. Aspectos fundamentais, por exemplo, para a constituição do queijo artesanal.

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Esses olhos azuis já viram muita coisa

De 1º de janeiro a 31 de dezembro, Luiz de Almeida faz jus ao seu apelido na cidade – Luiz do Paletó. A peça faz parte do seu vestuário diariamente há muitos anos, sejam qual forem os números nos termômetros. Acostumado na infância a dividir queijo entre os 18 irmãos, ele logo pergunta como se faz para partir uma unidade em oito pedaços iguais com apenas três facadas. “É simples! Uma na diagonal, outra diagonal oposta e uma no meio”, diz sorrindo. Aos 93 anos, ele traz catalogados na memória diversos “causos” sobre sua terra.

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Luiz do Paletó

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Carnaval

sagem para que eu não voltasse andando. Me levou na

“Na quarta-feira de cinzas, saía uma procissão com de-

rodoviária ae esperou o ônibus sair para ter certeza de

zenas de andores. Tinha um estandarte que represen-

que eu não ia enganá-la”.

tava a morte, um homem vestia uma fantasia como se fosse uma radiografia de um esqueleto e uma foice. Certa vez, esse homem arrumou confusão e o juiz mandou prendê-lo em pleno carnaval. Correu a notícia em Belo Horizonte - ‘Quem não quiser morrer nunca, vai pro Serro! Lá a morte está presa na cadeia’”.

“Para mim, fantasma é ilusão de ótica, sabe? Mas tinha um ourives aqui que morria de medo de subir a ladeira do cemitério à noite. Uma vez ele precisava passar por aquele caminho, viu uma senhora subindo e resolveu ir junto com ela. Chegando lá em cima, ele perguntou: ‘A senhora não

Terremoto

tem medo de andar aqui a essa hora não?’, e ela respon-

“Em 1926 teve um tremor de terra forte aqui. Eu era

deu: ‘Quando eu era viva eu tinha’. Ele saiu correndo”.

menino, lembro que não morreu ninguém, mas deu muito prejuízo”.

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Fantasma

Avião “Em janeiro de 1937 passou o primeiro avião por aqui.

Promessa

Lembro que o piloto tinha apostado que conseguia sair

“Antigamente, para ir a Belo Horizonte tinha que ser

de Belém do Pará e chegar ao Rio de Janeiro. Quando o

a cavalo. Para cumprir uma promessa, resolvi ir a pé.

bichão passou no céu, teve beata achando que era castigo

Levei quatro dias e meio. Acabei voltando de ônibus

divino e agarrou o terço para rezar. Teve gente esconden-

porque minha sobrinha teimou de comprar uma pas-

do debaixo da cama, outro apontando espingarda”.

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Por ele os sinos dobram

Antônio Farnesi é o verdadeiro boa praça. Cheio de amizades, ele está entre os mais estimados na velha guarda serrana. Com 65 anos, ele viu a cidade crescer. “Para mim, o Serro hoje é uma capital. Antigamente só tinha uma farmácia. Se você dava o calote, pronto! Ficava sem remédio”, conta entre risadas. Sem nunca ter passado mais do que três dias longe da cidade, ele conta algumas das histórias que ouviu e viveu pelas ruas do Serro.

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Antônio Farnesi

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Luz

Igreja às 19h30, tinha uma beata que antes de

“Nos idos dos anos 1900 a iluminação era a

ir embora passava as mãos em todas as imagens

carbureto. Um rapaz passava acendendo as

e depois no corpo dela. Às 19 horas eu já co-

tochas com óleo uma a uma. Depois veio o

meçava a fazer barulho na porta para ela ir se

motor a diesel, com uma luz feito prata, mas

apressando para que eu pudesse fechar a igreja

que apagava todos os dias às 22 horas. O pessoal

na hora certa”.

ficava batendo papo e dizia: Nossa Senhora, 21h45! Tenho que correr pra casa”.

Lenda “Na Praça Dom Epaminondas tinha a chama-

Atalhos

da Igreja da Purificação. Saiu uma ordem para

“Os mais velhos contam que a cidade era toda

derrubá-la e chamaram um senhor de nome

cortada por becos. Dizem que tinha o beco dos

João Clides para fazer o serviço. Diz que quan-

velhacos. O pessoal que não queria pagar a dí-

do ele deu duas marteladas na parede, uma voz

vida atalhava por lá para evitar passar na frente

clamou com tristeza: Ô João Clides, até você

das vendas. Depois os becos foram vendidos”.

desmanchando a minha casa? Ele saiu correndo e foi no padre contar o que tinha aconteci-

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do. O padre falou que devia ser brincadeira de

“O Serro era de um catolicismo pouco comum.

alguém e fez ele voltar para o trabalho. Quan-

Quando eu era sacristão e tinha que fechar a

do ele voltou e deu a primeira martelada, a voz

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falou de novo: ‘Ô João, até você desmanchan-

Por exemplo: João do Açougue, Paulo Mecâ-

do a minha casa?’. Ele nunca mais voltou para

nico, Antônio da Rodoviária. Se for mulher e

terminar a obra”.

casada, fica Esposa do João do Açougue. Teve uma vez que uma senhora separou do marido

Merenda

e foi pagar a conta em um supermercado. O

“No meu tempo, os que tinham mais condição

rapaz não achou a ficha dela e o dono gritou:

levavam café com pão de casa para comer na es-

Tá aí sim, é Fulana do José. Ela ficou brava e

cola. Os que não tinham, chamados meninos da

saiu sem pagar, dizendo que não era de ho-

caixa, ganhavam um copo de mingau da hora

mem nenhum”.

do lanche. O mingau cheirava bem demais. Às vezes eu propunha trocar meu pãozinho com

Cadeia

queijo e café pelo mingau de um deles. Eles to-

“Onde hoje é o Fórum, funcionava a cadeia.

pavam na hora! Eu ficava no prejuízo, mas ma-

As grades estão lá até hoje. Os presos me-

tava meu desejo. Tinha até uma canelinha por

xiam com as pessoas na rua, pediam para

cima, gostoso mesmo”.

comprar coisas para eles. Tinha um menino tão magrinho com a cabeça fininha que ele

Apelidos

entrava e saía das selas passando pelas grades

“Aqui no Serro todo mundo tem apelido.

para levar as encomendas”.

É tradição chamar as pessoas pela profissão.

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Linha do Tempo 1702 –Antonio Soares Ferreira e seu filho

1938 – Em 8 de abril, Serro se torna a pri-

João Soares fundam dois arraiais próximos

meira cidade do país tombada pelo Instituto

à região.

do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

1714 – É criada a Vila do Príncipe, com a união dos arraiais, pelo governador da Ca-

1975 – Em 29 de janeiro, começa campa-

pitania dom Braz Balthazar da Silveira.

nha para preservar o patrimônio cultural. Urna com documentos é enterrada aos pés

1720 –Vila do Príncipe se torna sede da Co-

da escadaria da Igreja de Nossa Senhora do

marca do Serro Frio.

Carmo.

1838 –Em 6 de março, a Vila do Príncipe é elevada à categoria de cidade por lei provincial.

2014 –Em 29 de janeiro, cidade comemora 300 anos de elevação a vila. Urna é aberta e documentos serão restaurados e expostos em museu. fonte: Prefeitura de Serro

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Vocação católica:

conheça as igrejas do Serro

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1. Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição

2. Igreja Nossa Senhora do Carmo

Uma das maiores igrejas barrocas do período

É marcada por altares em estilo rococó banhados

colonial brasileiro possui torres em madeira

a ouro, representativos da arquitetura do fim do

entre as mais altas do estado.

século 18.

Localização: Praça Getúlio Vargas (antigo

Localização: Praça João Pinheiro, tel: (38)

Largo do Pelourinho), tel: (38) 3541-1221.

3541-1272.

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3. Igreja Bom Jesus de Matozinhos

4. Igreja de Santa Rita Localizada no ponto mais alto do Centro His-

Também do século 18, tem como destaque o

tórico, proporciona vista panorâmica da cidade.

forro, pano de fundo do altar-mor e painéis la-

É uma das igrejas mais antigas, com fachada

terais da principal capela. Local onde é celebra-

poligonal, uma única torre central e um gran-

da anualmente a Festa do Divino.

de relógio, que dita a hora para a população da

Localização: Praça Cristiano Ottoni, tel: (38) 3541-1440.

cidade. Localização: Praça João Pinheiro; tel: (38) 3541-1221.

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5. Igreja Nossa Senhora do Rosário

6. Capela de São Miguel Construção em estilo neogótico, com uma só

Construção da primeira metade do século 18,

torre. Data do início do século 20, quando a

sedia a Festa do Rosário, a maior manifestação

população buscou por fim ao hábito de se-

de fé e folclore da cidade, sempre realizada no

pultamentos no interior das igrejas. Merecem

primeiro final de semana de julho.

destaque o altar esculpido em pedras, as longas

Localização: Praça do Rosário, tel: (38) 3541-1221.

muralhas que cercam o cemitério e vários jazigos, que guardam os sagrados restos mortais e uma grande parte da história do Serro. Localização: Alto do Cemitério

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De volta à mineração

Com o auge da mineração no início do século 18, o Serro se estabeleceu como importante vila. Três séculos depois, a cidade retoma sua vocação minerária. Em 2008, uma nova etapa na história da mineração na região teve início com a compra do Projeto Minas-Rio pela Anglo American. Com ele, está sendo iniciado um novo ciclo econômico, com a geração de empregos e o desenvolvimento da economia local. No entanto, como a própria História ensina, esse caminho nem sempre é fácil.

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Anglo American

Projeto Minas-Rio

Além do minério de ferro, a Anglo American

Extraído de uma mina em Conceição do

produz platina, diamante, cobre, níquel e car-

Mato Dentro, o minério de ferro vai viajar pe-

vão térmico e metalúrgico. O grupo está pre-

las montanhas mineiras até o litoral do Rio de

Em março de 2014, foi concluída a reforma

sente em muitos países e as operações seguem os

Janeiro. Passando por diversos municípios, seu

do Recanto José Antônio Salles Coelho, asilo

princípios de respeito e valorização da cultura

destino final é o Porto de Açu, localizado em

que atende 41 idosos no Serro. “As obras

local, buscando a relação de boa vizinhança. A

São João de Barra (RJ).

trouxeram mais conforto para os nossos

Reforma do Asilo José Antônio Salles Coelho

empresa está no Brasil há mais de 40 anos e tem

A chegada de milhares de empregados a ci-

internos. A contribuição da Anglo American,

unidades operacionais em Goiás, São Paulo e

dades pequenas e o tráfego de caminhões e

que representou cerca de 25% do custo total da

Minas Gerais.

máquinas pesadas estão entre os impactos da

reforma, foi muito importante e necessária” –

implantação desse tipo de empreendimento.

José Julião, diretor do asilo.

Para minimizar ou compensar esses impactos, a Anglo American realiza investimentos e parcerias que contribuam para o desenvolvimento da região. Municípios como o Serro, que são joias históricas de Minas Gerais, têm merecido atenção especial da empresa. Conheça algumas iniciativas feitas da Anglo American na cidade. 60

José Julião

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Turismo

Saúde

O Programa Circuitos do Conhecimento, da

O programa “Empoderamento – a força da

Anglo American, tem contribuído para o desen-

mudança para o sexo seguro”, realizado em par-

Educação Ambiental

volvimento do turismo. Cursos de atendimento

ceria com a ONG Reprolatina, a iniciativa tem

ao público, hospedagem, camareiro, técnicas de

realizado debates e dinâmicas sobre o fortaleci-

Educadores da rede municipal da região do

recepção, entre outros, são oferecidos para os mo-

mento social da mulher e informações sobre sexo

Serro se tornaram alunos para aprender como

radores da região do Serro.

seguro.

levar, de forma criativa e produtiva, temas rela-

“Já conclui quatro cursos e estou inscrita em ou-

“Participei de uma capacitação e estamos

cionados ao meio ambiente para a sala de aula.

tros três. Os professores são ótimos e as aulas muito

visitando as famílias para falar sobre métodos

“Eu passei a ter mais segurança para tratar o

dinâmicas. Aprovo e recomendo” – Wanessa Lu-

contraceptivos, principalmente para as meninas

assunto com meus alunos. Foi muito bom par-

ciana Castro, estudante.

que não tem muita experiência” – Waldirene Maria, agente de saúde da Unidade Básica de

ticipar porque moramos próximos a uma área de preservação que é o Pico do Itambé” - Eni

Anel Viário

Ribeiro, professora da Escola Municipal Desembargador Dario Lins (distrito de Capivari).

Saúde de Mato Grosso (distrito do Serro).

Está sendo construído o Anel Viário, que ligará o município a Conceição do Mato Dentro revitalizado e pavimentado, para retirar o tráfego de veículos pesados de dentro da cidade.

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Eni Ribeiro

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Incentivo à economia local Cerca de 30 pequenos empresários da região fazem parte do Programa de Empreendedorismo. O principal objetivo é que os empresários aproveitem o crescimento econômico da região da melhor forma, gerando renda e emprego para a cidade. “Tivemos um aumento de demanda e consequentemente con-

Reforma da Igreja de Nossa Senhora do Rosário

tratamos mais um funcionário fixo e outros eventuais. O Programa está contribuindo muito para a alavancagem da minha empresa”

A Igreja de Nossa Senhora do Rosário, no distrito de São Gonçalo do Rio das

– Jonan Ribeiro, empresário

Pedras, está sendo restaurada. “Corremos atrás de recursos durante seis anos. A torre da Igreja estava condenada, as paredes e o telhado caindo. O apoio da Anglo American foi um presente para a comunidade” – Aparecida Ribeiro, coordenadora da Paróquia de São Gonçalo do Rio das Pedras.

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Aparecida Ribeiro e Neusa de Jesus

Jonan Ribeiro

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Expediente Anglo American Unidade de Negócio Minério de Ferro Brasil

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Projeto Editorial e Gráfico: BH Press e Luciano Baêta Reportagem e Redação: Raquel Rosceli e Gustavo Ávila Fotografia: Ronaldo Guimarães, Gláucia Rodrigues e Danilo Fonseca Tiragem: 6000 unidades

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anĂşncio Anglo American

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