MONOGRAFIA - A distribuição de filmes independentes no Brasil e o streaming - Jorge de Souza

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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL RÁDIO, TV E INTERNET

Jorge de Souza Ferreira Filho

A distribuição de filmes independentes no Brasil e o streaming

SÃO PAULO 2020


Jorge de Souza Ferreira Filho / Rgm: 18347177

A distribuição de filmes independentes no Brasil e o streaming

Monografia apresentada ao curso de Rádio, TV e Internet como requisito parcial à obtenção do certificado de conclusão. Orientador: Prof ª. Dra. Maria Aparecida Ruiz Coorientador: Prof. Dr. Bruno Rogério Tavares

SÃO PAULO 2020


FOLHA DE APROVAÇÃO

Prof ª. Dra. Maria Aparecida Ruiz

Prof ª. Ms. Cristina Munhão

Prof. Alex Carolino Francisco


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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer aos meus pais por terem me apoiado, nĂŁo apenas nos estudos, como em praticamente todos os momentos da minha vida.


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FERREIRA FILHO, J. de S. A distribuição de filmes independentes no Brasil e o streaming. Monografia (Bacharel em Rádio, TV e Internet) – Universidade Cruzeiro do Sul, São Paulo, 2020.

RESUMO Esta monografia aborda a distribuição cinematográfica com enfoque nos filmes independentes brasileiros e como uma plataforma de streaming do tipo VoD (video on demand) pode favorecê-los nesse campo. Para a realização dessa monografia, ao longo do trabalho são analisadas questões referentes a mecânica da estrutura da distribuição cinematográfica no Brasil e dos serviços de streaming VoD, assim como também é feita a definição de um filme independente brasileiro. Por fim, são analisadas duas plataformas de streaming que disponibilizem esse tipo de filme e o que essa tecnologia favorece na sua distribuição. PALAVRAS-CHAVE: distribuição no Brasil; cinema brasileiro; filme independente brasileiro; streaming


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LISTA DE FIGURAS

Grรกfico I...........................................................................................................21 Grรกfico II..........................................................................................................27 Grรกfico III.........................................................................................................35 Grรกfico IV........................................................................................................63 Figura I............................................................................................................66 Figura II...........................................................................................................69


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SUMÁRIO CONSIDERAÇÕES INICIAIS.................................................................................8 CAPÍTULO 1: A DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL................10 1.2. Distribuição no Brasil....................................................................................14 1.2.1. Embrafilme.................................................................................................14 1.2.2. RioFilme.....................................................................................................16 1.2.3. Majors........................................................................................................18 1.2.4. Netflix: uma “major” da distribuição digital.................................................22 1.2.5. Codistribuição............................................................................................26 1.2.6. Distribuidoras independentes.....................................................................28 1.3. O processo de distribuição no Brasil hoje.....................................................31 CAPÍTULO 2: FILMES INDEPENDENTES NO BRASIL.....................................39 2.1. Cinema popular brasileiro.............................................................................39 2.2. Definindo o cinema independente brasileiro.................................................43 2.3. Cinema independente no Brasil ao longo da história...................................44 2.3.1. Cinema industrial e Rio, 40 Graus.............................................................45 2.3.2. Cinema Novo.............................................................................................47 2.3.3. Cinema Marginal........................................................................................50 2.4. Política do autor no cinema independente....................................................56 CAPÍTULO 3: STREAMING E O FILME INDEPENDENTE.................................61 3.1. Sobre o streaming.........................................................................................61 3.1.2. Video on demand (VoD).............................................................................61 3.2. Video on Demand (VoD) no Brasil................................................................62 3.3. Libreflix..........................................................................................................65 3.4. Spcine Play...................................................................................................72 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................78 REFERÊNCIAS....................................................................................................80 APÊNDICES.........................................................................................................92


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APÊNDICE A – Entrevista realizada por e-mail com Guilmour Rossi, fundador do Libreflix, na data 16/09/2020................................................................................92 APÊNDICE B – Entrevista realizada por e-mail com Dilson Neto, coordenador de difusão da Spcine, na data 13/10/2020................................................................96


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CONSIDERAÇÕES INICIAIS Nessa monografia temos como objetivo responder como a distribuição do cinema independente brasileiro é beneficiada pelo streaming, particularmente o VoD (video on demand), além de pesquisar a presença de serviços de streaming VoD e do cinema independente e a mecânica da distribuição de filmes no Brasil. No primeiro capítulo veremos como se configura a distribuição cinematográfica no Brasil, as principais distribuidoras do cinema e o papel das estatais Embrafilme e RioFilme nesse setor. No segundo capítulo analisaremos os significados do cinema popular e independente brasileiro e no terceiro abordaremos o principal problema de pesquisa desse trabalho. Levando em conta o fato de 74% da população brasileira possuir acesso à internet, segundo o estudo TIC Domicílios (ESTADÃO CONTEÚDO, 2020) e o fato do Brasil ter uma taxa de penetração de serviços VoD entre os internautas de 32% (SEBRAE NACIONAL, 2017), esse trabalho busca compreender que papel o streaming VoD, que vem se popularizando cada vez mais nos últimos anos, tanto entre consumidores quanto entre empresas do ramo da comunicação, é capaz de proporcionar ao encontro entre público e filme independente. Referente a parcela da população brasileira que possui acesso a internet, apenas 50% dos indivíduos da classe D e E fazem parte desse grupo e a maioria se concentra nas regiões sudeste e sul e em áreas urbanas. Grande parte desse grupo se identifica como parda, tem ensino superior, estão entre seus 16 e 24 anos e 74% já assistiu filmes ou séries pela internet. 95% estão na classe A, 93% na classe B e 78% na C. Além disso, a forma de conexão mais utilizada é a banda larga fixa. Todas essas informações foram obtidas através do TIC Domicílios (CETIC.BR, 2020). A hipótese levantada é referente as oportunidades de visibilidade e curadoria que os serviços de streaming de VoD oferecem. Como empresas responsáveis pelo serviço conhecem bem o perfil do seu público, podem introduzir seus clientes a filmes mais afinados em relação aos seus gostos, de um mercado de nicho, obras que no circuito comercial do cinema, poderiam passar despercebidas, e apresentarem menos impasses, sejam eles financeiros ou de outro caráter, na distribuição para os cineastas independentes, diferentemente do mercado de


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exibição das salas de cinema. Nessa monografia tem-se como métodos utilizados em sua execução, entrevistas, análise documental, e pesquisa exploratória, utilizando-se de fontes primárias. Livros, artigos e trabalhos acadêmicos pertinentes ao tema serão estudados. É importante salientar que a presença dessas plataformas digitais não é a mesma de meios como a televisão no Brasil, ou seja, a quantidade de brasileiros que assistem televisão é superior àquela que utiliza plataformas de streaming — mais de 96% dos brasileiros tem uma televisão em casa, segundo dados do IBGE (FIORE, 2018) — porém, ainda sim, por meio desse trabalho estudaremos de forma exploratória como essa relação pode ser benéfica.


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CAPÍTULO 1: A DISTRIBUIÇÃO CINEMATOGRÁFICA NO BRASIL Esse capítulo busca explorar algumas iniciativas governamentais que agem e agiam diretamente na distribuição cinematográfica no Brasil, analisar o atual funcionamento dessa parte da cadeia produtiva da indústria do cinema brasileiro, levando em consideração a grande relevância que as distribuidoras estrangeiras tem no nosso mercado e o tipo de filmes com que elas trabalham, as parcerias conhecidas como codistribuições, o advento da Netflix no setor e seu papel como distribuidora de filmes, o marketing na divulgação das produções, a aquisição de direitos autorais, obras de nicho1, entre outros pontos. Estudar a parte de distribuição do setor cinematográfico brasileiro é relevante para compreensão de como o streaming auxilia na distribuição do cinema independente nacional e em como diferentes empresas desse ramo trabalham na indústria de filmes no Brasil. Atualmente, o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA) 2 é um fundo que possui como objetivo o desenvolvimento articulado de toda a cadeia produtiva da atividade audiovisual no Brasil (BNDES, 2008?). Entre os anos de 2014 e 2017, 201 obras cinematográficas e comercializadas captaram recursos da ferramenta de incentivo (FSA, 2018). Em um país com um histórico de instabilidade no setor audiovisual, como censuras em tempos de ditadura e crises financeiras, quaisquer estímulos como, editais, leis de incentivos, isenções fiscais, por parte de iniciativas do poder público são importantes para o desenvolvimento do mercado cinematográfico brasileiro, que embora venha se expandindo desde as primeiras décadas do século XX, ainda não alcançou um estado de completa auto sustentabilidade. Essa ocorrência não é exclusiva do nosso país, pois é algo que também pode ser observado em demais nações latino-americanas, tais como a Argentina, onde também pode se enxergar um histórico de transtornos na indústria cinematográfica, fortemente relacionados as instabilidades políticas/econômicas do país. Na

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Pode-se compreender como filmes de nicho aqueles que, ao contrário dos filmes produzidos para o público de massa, são direcionados a um grupo específico e menor de espectadores. Costumam serem produções independentes ou de gênero, ou seja, filmes que seguem certas características e convenções relacionadas ao seu gênero, como faroestes, comédias policiais, musicais, ficções cientificas, terror, entre outros (SOUZA, 2018). 2

Regulamentado em 2007, pelo Decreto nº 6.299, de 12.12.2007.


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Argentina a implementação da Ley de Cine (ou lei de cinema, em português), permite ao Instituto Nacional de Cine y Artes Audiovisuales (INCAA) regular a distribuição e financiamento de filmes argentinos, incluindo os independentes, garantindo sua chegada as salas de cinema de shopping centers. Outra medida tomada pelo instituto é a criação dos Espaços INCAA, que são salas de exibição espalhadas por todo o país, com foco exclusivo na veiculação de produções cinematográficas argentinas (AUTRAN; GATTI, 2012), o que se trata de uma ação relevante para valorização do cinema nacional local, além de favorecer a distribuição de obras que muitas vezes não iriam atrair o interesse das grandes distribuidoras estrangeiras de filmes, por não combinarem com o perfil trabalhado por essas empresas. Todavia, segundo os dados demostrados pelo INCAA (2015 apud MENDES, 2018) os Espaços INCAA não aumentaram significantemente o número de ingressos vendidos para filmes argentinos no país. Uma iniciativa interessante relacionada a INCAA é o acordo realizado com a Ancine3, em 2004, que visa estimular o intercâmbio entre filmes argentinos e brasileiros nos territórios nacionais de cada país, beneficiando ambos os mercados cinematográficos. oito filmes brasileiros foram distribuídos na Argentina e sete argentinos no Brasil (RÉGIO, 2010). Nesse esquema, era de responsabilidade de cada país selecionar e indicar seus próprios filmes para serem distribuídos na outra nação. Os distribuidores brasileiros não deram continuidade ao acordo devido a questões de logística, como “problemas com a entrada das cópias, com os prazos de pagamento e com o lançamento concomitante das obras na televisão” da parte dos distribuidores argentinos (MEDEIROS, 2012, p.161). A falta de auto sustentabilidade na indústria cinematográfica brasileira é comum no mundo afora, pois são poucos os países em que esse setor é desenvolvido ao ponto de demandar pouca subvenção do governo. Como nações com indústrias de cinema consolidadas o bastante para se sustentar de forma mais independente, temos os E.U.A, Índia e Nigéria. Entretanto, mesmo com a presença de leis de incentivo4, a produção de filmes

A Agência Nacional de Cinema “é uma agência reguladora responsável pelo fomento (incentivo), pela fiscalização e pela regulação da atividade audiovisual” (MARTINS, 2019). 3

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Leis de incentivo são ferramentas criadas e administradas pelo poder público com a intenção de fomentar algum setor específico, como cultura, economia ou educação, para o melhor


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independentes no Brasil enfrenta ainda diversas dificuldades, uma delas a distribuição, pois mesmo quando essas obras conseguem sair dos festivais e chegar ao cinema, elas competem com filmes de maior escala e são distribuídas em uma menor quantidade de salas de exibição, muitas vezes, em cinemas de rua. O jornalista Gabriel Carneiro comenta sobre isso, Talvez o maior desafio de um filme independente seja o de chegar ao público, não importando o meio. Boa parte desses longas fica relegada apenas aos festivais, não conseguindo uma carreira comercial, seja no cinema, em home video, televisão ou streaming5. Novas formas têm aparecido, mas ainda é difícil. Dos 80 filmes brasileiros que estrearam comercialmente, pouco mais da metade teve menos de 10 mil espectadores (CARNEIRO, 2013).

Referente ao atual estado do mercado brasileiro de cinema, Guilmour Rossi, fundador da plataforma de streaming VoD6 nacional Libreflix, opina: O cinema brasileiro está em uma grande crise, infelizmente. Uma crise prática e simbólica que se agravou há alguns anos com os cortes e a maior perseguição ao meio artístico. Com a pandemia 7 (e a inação do governo) então, muitos colegas ficaram totalmente sem perspectiva. Um tímido aquecimento do setor começou a ocorrer com as grandes plataformas de streaming chegando por aqui, mas ainda assim muito poucos realizadores e trabalhadores da área conseguem ascender e chegar até a cultura de massa. O poder de distribuição apenas se diluiu entre os grandes players (ROSSI, 2020).

É possível traçar um ponto em comum nas falas de Carneiro e Rossi, já que ambos abordam a questão de cineastas brasileiros dificilmente conseguirem encontrar um grande número de espectadores com seus filmes, mesmo com a diversidade de canais disponíveis para sua veiculação como televisão, cinema e o streaming, esse último o foco principal dessa monografia. Nos cinemas, as empresas responsáveis pela distribuição dos filmes e que possuem grande domínio sob o mercado, as majors, visam trabalhar com filmes de entretenimento que apresentam potencial de lucratividade, algo que obras independentes, autorais, e de menor porte, muitas vezes não possuem: Os filmes da majors são os filmes de entretenimento. São aqueles filmes bons para rir e se descontrair. Elas trabalham praticamente com os filmes-

desenvolvimento dele. Essas leis podem ser aproveitadas tanto por pessoas físicas ou jurídicas. No setor cultural brasileiro, a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual são os principais exemplos. Se define streaming como: “[...] uma tecnologia de transmissão instantânea de dados (nomeadamente áudio e vídeo) por meio de conexão em redes.” (MUNGIOLI, IKEDA, PENNER, 2019, p.7). 5

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No streaming VoD (abreviação de Video on Demand), o usuário pode escolher livremente quais filmes assistir, no horário e dia que quiser, sendo capaz de pausar, avançar e retroceder o conteúdo. 7

Rossi se refere a pandemia provocada pelo coronavírus, causador da doença Covid-19, que teve início no final de 2019.


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pipoca, com raríssimas exceções, que acontecem quando algum grande nome de Hollywood lança um filme com uma proposta diferente (assistente de marketing da Downtown Filmes apud ARAÚJO; CHAUVEL, 2007, p.7).

No entanto, na televisão por assinatura brasileira, um total de 2.632 produções nacionais independentes foram exibidas durante todo o ano de 2019, segundo a Ancine (2020), muitos veiculados no Canal Brasil e Prime Box Brazil, que tem uma programação voltada a obras nacionais e independentes. Na televisão aberta, o canal TV Brasil foi o que mais exibiu conteúdo brasileiro de origem independente em 2016, tendo como base o Informe de Acompanhamento de Mercado de TV Aberta, publicado pela Ancine (2017). Considerando a grande concentração de cinemas no Brasil em shopping centers8, assim como os perfis das produções ali exibidas (comerciais e norteamericanas), a camada dos filmes independente pode não exatamente encontrar muito espaço nesses locais de exibição por apresentarem linguagens artísticas e narrativas diferentes das obras comerciais e populares e não arrecadarem tanto na bilheteria, o que as afasta de grande parte do mercado exibidor. Isso pode ser observado no comentário do geógrafo Eduardo Baider Stefani, em relação aos cinemas de shopping, comumente conhecidos como multiplex9, e a sua programação, Os cinemas do tipo multiplex localizam-se em ambientes fechados, em especial shopping-centers, apresentando várias salas com uma programação baseada em filmes tradicionais, cuja linguagem já é dominada pelo público consumidor, em geral hollywoodianos e, mais recentemente, filmes populares nacionais [...] (STEFANI, 2009, p.14).

Considerada parte das três etapas de maior importância do processo de realização de um filme (sendo elas, produção, distribuição e exibição)10, a distribuição de uma obra ocorre quando ela é levado a uma sala de cinema, ou a uma outra janela de exibição como canais por assinatura e plataformas de streaming. Empresas encarregadas de desempenhar essa função são chamadas de distribuidoras. O departamento de marketing de uma distribuidora é responsável pela divulgação de um filme, levando em consideração as características

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88,9% das salas de cinema no Brasil se encontram em shopping centers (ANCINE, 2018).

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Complexos de cinema, tipicamente encontrados em shopping centers, que contam com várias salas de exibição. 10

Que segundo a professora e cenógrafa, Maria Cristina Couto (2013), se trata de um modelo elaborado a partir do surgimento de estúdios de cinema norte-americano, e que foi exportado para outros estúdios ao redor do mundo.


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especificas dele, assim como o perfil do tipo de espectador que pretendem atrair. Todo esse processo de divulgação é semelhante a uma venda, minuciosa e planejada, com o intuito de identificar e conquistar o público-alvo do produto, no caso o filme, para maximização dos lucros assim que ele ingressar no mercado de exibição. Em alguns casos, as distribuidoras acompanham o processo de desenvolvimento de um filme desde sua concepção (COUTO, 2013), tipicamente em filmes populares de Hollywood, em que a produtora e a distribuidora fazem parte da mesma empresa. Em relação as formas de divulgação de um filme, o pesquisador Antônio Sanganha (2015, p.19) comenta que, “os meios divulgativos são constituídos por trailers, cartazes, outdoors, anúncios de imprensa, promoção através da Internet e estratégias de “word-of-mouth11.”’ São alguns exemplos de distribuidoras no Brasil, Downtown Filmes, Pandora Filmes e Imagem Filmes, e em Hollywood, Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), Sony Pictures e Warner Bros. Como iremos conferir no restante do trabalho, existem interferências vindas do governo com o intuito de favorecer à indústria de cinema brasileira, entretanto, as apresentadas são focadas no processo de distribuição, pois esse é o recorte principal. 1.2. Distribuição no Brasil 1.2.1. Embrafilme Para abordar a distribuição no Brasil hoje em dia, primeiro é preciso direcionar nosso olhar para o passado da indústria do cinema, especificamente para o papel de uma empresa pública que já foi considerada uma das maiores atuantes na área de distribuição cinematográfica. Devido a "carência de fortes indústrias cinematográficas locais" (SELONK, 2004, p.22), é comum ocorrer a interferência12 do estado no mercado audiovisual brasileiro. No final dos anos 60, mais especificamente no dia 12 de setembro de 1969, foi realizada a criação da Embrafilme, ou Empresa Brasileira de Filmes S.A,

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Termo em inglês, no contexto, usado para se referir ao marketing de boca a boca, quando clientes satisfeitos com um produto, falam positivamente do mesmo produto para outras pessoas, as influenciando ao consumo. 12

Por meio de editais, leis de incentivo e criação de órgãos e empresas públicas que administram a indústria cinematográfica nacional.


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que, segundo a produtora Aletéia Selonk (2004, p.94) se tratou da "[...] única participação efetiva do estado na atividade de distribuição cinematográfica de filmes brasileiros." Criada em pleno período de regime militar, e regulamentada pelo Concine13, a Embrafilme se manifestou como uma tentativa do Estado de “centralizar as produções cinematográficas de modo a exercer maior influência no setor." (CAMPOS, 2005, p.157). Como uma iniciativa do governo militar, a empresa trabalhava com obras consideradas aprovadas pela censura. inicialmente, seus objetivos incluíam ampliar a presença do cinema nacional fora do país, entretanto, com o decorrer dos anos, a Embrafilme adquiriu uma posição mais ampla no cinema, assumindo responsabilidades como financiadora, produtora e distribuidora (ALMEIDA; MENDES, 2017). Responsável pela inserção de diversos filmes nas salas de cinema pelo país durante as décadas de 70 e 80, tais como Eles Não Usam Black-tie (Leon Hirszman, 1981) e Dona Flor e Seus Dois Maridos14, a Embrafilme se mostrou eficiente em estimular a ocupação do público brasileiro no cinema na época, como informa o Centro Técnico Audiovisual, coordenação geral da Secretaria do Audiovisual: Em 1980, para se ter uma ideia dos sucessos da empresa, o público espectador de filmes brasileiros chegou a ocupar 35% do mercado nacional, e a média de espectadores por filme brasileiro alcançou a faixa de aproximadamente 239 mil – 30 mil a mais que o filme estrangeiro. (COMUNICAÇÃO CTAV, 2008)

Segundo o comentário do Centro Técnico Audiovisual, pode se dizer que o cinema brasileiro estava passando por uma verdadeira fase de auge, com grandes números de espectadores visitando as salas de exibição e o fortalecimento da identidade nacional na indústria. O viés comercial de muitas obras distribuídas pela Embrafilme era de grande agrado para o mercado exibidor, atitude que também gerava críticas negativas de alguns lados da indústria: Acusada de privilegiar certos grupos em detrimento de outros, de preferir

Conselho Nacional de Cinema, que a professora Anita Simis (2010, p.49) descreve como “[...] órgão forte do cinema nacional, responsável pela formulação, controle e cumprimento das normas e leis regentes do segmento cinematográfica, além da política de comercialização e regulamentação do mercado, incluindo filmes publicitários.” 13

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Dirigido por Bruno Barreto, conquistou recorde de espectadores (10,7 milhões de espectadores) no cinema brasileiro, feito que foi superado em 2010, após o lançamento de Tropa de Elite 2- O Inimigo Agora é Outro, de José Padilha (KREUTZ, 2019).


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filmes com forte apelo comercial e de manter dúvidas sobre a seleção dos filmes que seriam lançados, aos poucos a Embrafilme foi deixando de ser uma unanimidade nacional (SELONK, 2004, p.117).

A Embrafilme veio a passar por um período de crise nos anos 80, atribuída ao despreparo em lidar com inovações tecnológicas da época no campo da exibição e a concorrência do mercado internacional de Hollywood, com seus investimentos desmesurados em seus filmes, a empresa ainda contou com atribulações internas como a saída do diretor Roberto Farias e a crise econômica que assolou o país no período seguinte ao fim da ditadura (PUGLIA, 2016). No meio desse cenário desvantajoso, o professor Leonardo Puglia (2016) comenta que a redução de dinheiro levou a perca da capacidade de investimento da Embrafilme, que acabou sendo alvo frequente das críticas feitas por membros da imprensa, especialmente a Folha de São Paulo, cujos jornalistas, Paulo Francis e Matinas Suzuki, arquitetaram uma campanha contra a entidade. Em 17 de abril de 1990, a Embrafilme é oficialmente extinta, resultado das reformas políticas do então presidente, democraticamente eleito, Fernando Collor de Mello. Pouco tempo depois, no mesmo ano, o Concine também é desativado. O que segue é um período de dificuldades no setor cinematográfico, em que devido a imensa lacuna deixada pela Embrafilme, o mercado entra em crise e com dificuldades para encontrar financiamento, o número de longas-metragens nacionais produzidos é drasticamente reduzido. Esse período se estende até os anos 1990, quando mecanismos de fomento à indústria são implementados durante o governo de Itamar Franco (OLIVEIRA; PANNACCI, 2017). 1.2.2. RioFilme Criada no dia 25 de janeiro de 199115, pelo Município do Rio de Janeiro, a RioFilme ocupou o espaço deixado pela Embrafilme, cuja extinção gerou desemprego e impasses na distribuição do cinema brasileiro. A RioFilme se trata de uma empresa estatal que age na distribuição de filmes e fornece apoio a produção audiovisual carioca e ao desenvolvimento do mercado de exibição. Projetada por atores, advogados e ex-funcionários da Embrafilme, tem-se como razão, por trás da criação da distribuidora, a vontade de “querer transformar o Rio de Janeiro num

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Pela lei n. 1.672.


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efetivo e importante polo cultural, não apenas do Brasil, mas da América do Sul” (CHAIA, 1995, p.84). Embora seja comparada a Embrafilme, em seu papel na indústria brasileira, a RioFilme além de ser uma empresa municipal, com atuação focada no Rio de Janeiro, não age como censora do cinema por razões ideológicas. Embora tenha iniciado oferecendo fomento a toda indústria audiovisual brasileira e muitos de seus filmes apoiados foram produzidos em São Paulo, a RioFilme passou por uma mudança de gestão em 2008 e nos anos seguintes passou a se focar no desenvolvimento do audiovisual carioca (OLIVEIRA, 2013). De acordo com o autor Christian de Castro Oliveira (2013), isso se deu pela razão de que com a criação da Ancine, a inserção das distribuidoras norteamericanas no mercado cinematográfico brasileiro e a implementação da Lei de Incentivo à Cultura (também conhecida como Lei Rouanet) 16, havia mais alternativas de apoio à indústria de cinema nacional, além da RioFilme. Hoje a RioFilme, gerida pela Prefeitura do Rio de Janeiro, distribui exclusivamente filmes nacionais, e investe também, como pontua a pesquisadora Helyeney Souza Araújo (2010, p.53), "[...] em salas de cinema, [...] além de apoiar a finalização de coprodução17 e distribuição de filmes de curta, média e longasmetragens.” Uma das missões da empresa seria recuperar a presença nas salas de exibição que o cinema nacional tinha décadas atrás, sob a gestão da Embrafilme. O autor Rômulo Oliveira Chaia (1995), menciona que graças a RioFilme, obras há muitos anos já prontas, sem maneira de viabilizar sua exibição para o público, finalmente conseguiram sua distribuição. A RioFilme, alguns anos após sua fundação, veio a ganhar destaque no mercado, já que seu filme Central do Brasil (Walter Salles, 1998), se tornou um sucesso, em termos de bilheteria, além de ter conquistado um Urso de Ouro no 48° Festival de Cinema de Berlim e duas indicações ao Academy Awards18, nas

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Lei 8.313/1991, que proporciona a empresas e pessoas físicas o abatimento de impostos, contanto que essas invistam, financeiramente, em projetos culturais brasileiros. 17

A RioFilme apenas é autorizada a atuar na coprodução a partir da lei municipal n° 3553, de 13 de maio de 2003 (VIRGENS, 2014). 18

Possivelmente, a premiação mais popular do mundo do cinema. Também conhecida como Oscar.


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categorias Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz, para Fernanda Montenegro. Entre os anos de 1995 e 2000, o filme alcançou a quinta posição no ranking das 20 maiores bilheterias brasileiras desse mesmo período de cinco anos (GATTI, 2008). Segundo o professor e curador de cinema André Gatti (2003), a RioFilme lançou mais de 50% dos novos filmes brasileiros entre 1992 e 2000. Sendo assim, a empresa carregou papel de revitalizadora do cinema nacional, no período conhecido como Retomada, em que houve a volta do aumento da atividade na indústria cinematográfica brasileira, após uma forte crise no governo Collor. Segundo a jornalista Mônica Herculana, em 2014, a RioFilme alcançou a segunda posição, como maior investidora no audiovisual brasileiro, permanecendo atrás do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual), além de ter a sua receita de pouco mais de R$ 1 milhão em 2008, ampliada para mais de R$ 11 milhões em 2013, e contar com 378 lançamentos no cinema nesse mesmo ano (HERCULANA, 2014). Alguns dos filmes lançados pela empresa são, Policarpo Quaresma, Herói do Brasil (Paulo Thiago, 1998), Menino Maluquinho - O Filme (Helvécio Ratton, 1995) e Terra Estrangeira (Walter Salles, Daniela Thomas, 1995). 1.2.3. Majors São consideradas majors, as grandes produtoras e distribuidoras de cinema norte-americanas que como grandes conglomerados de mídia, exercem vasta influência na indústria cinematográfica dentro e fora dos Estados Unidos, e contam com filiais em várias regiões do mundo, distribuindo ou co-distribuindo filmes norteamericanos e estrangeiros no mercado. Elas, tipicamente, trabalham com a distribuição e produção de filmes com forte apelo comercial. São consideradas majors hoje no cinema, os estúdios Fox Film, Paramount Pictures, Sony Pictures, Universal Studios, Walt Disney Pictures e Warner Bros. Essas empresas bilionárias são responsáveis por muitos lançamentos no Brasil, cujos filmes populares estrangeiros, comumente dos gêneros super-heróis, ficção científica, ação, drama ou comédia, como as franquias de Guerra nas Estrelas, Marvel, Harry Potter, Jogos Vorazes, Senhor dos Anéis, 007, entre muitas outras, são muito bem recebidas pelo público nacional, o que fortalece seu monopólio no setor. Entretanto, sua participação no nosso país não se resume apenas a produções americanas, mas também muitos filmes brasileiros (Deus é


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Brasileiro; O Homem que Copiava; Carandiru, etc.). Com a Primeira Guerra Mundial, o mercado cinematográfico europeu que no começo do século XX ocupava uma posição de destaque no circuito exibidor brasileiro (entre os anos de 1913 e 1915 as produções francesas e italianas sobressaem as norte-americanas na ocupação do nosso mercado), é abalado pelos efeitos do conflito na região e tem sua produção de cinema fortemente fragilizada, o que abriu janela para a inserção da indústria americana no Brasil, que já era responsável por 83% da ocupação do nosso circuito em 1924, segundo dados da censura carioca, publicadas na revista Para Todos19 (SELONK, 2004). Inicialmente, na década de 1930, esses estúdios possuíam tamanho domínio do setor cinematográfico hollywoodiano, que formavam um oligopólio que era responsável pelo controle dos três principais eixos do desenvolvimento de um filme, produção, distribuição e exibição, sendo proprietários de salas de cinema e as empresas que processavam a película do filme, como uma maneira de maximizar o lucro de suas obras, além de serem detentores de contratos exclusivos com diretores e atores, seguindo um sistema de integração vertical. Um modelo caro de se manter para os estúdios, porém, lucrativo no período. Os maiores estúdios norte-americanos da época, entretanto, foram forçados a retirar sua presença no setor de exibição, devido a uma intervenção de combate ao oligopólio vinda da Suprema Corte americana, no final dos anos 40, o que, com o tempo, levou essas empresas a assimilarem o modelo produtivo horizontal em seu sistema, em que adquiriam e integravam diversas empresas que estavam produzindo no seu mesmo setor, no caso na área do cinema, em suas operações (DU GAY, 1997). Durante a gestão da Embrafilme, a influência das majors no nosso cinema foi reduzida, porém logo após a extinção da estatal, as empresas estrangeiras reassumiram seu domínio no setor, não de forma imediata, mas sim gradualmente, a partir do fim dos anos 90, com a distribuição de Tieta do Agreste (Cacá Diegues, 1996), pela Columbia Pictures.

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Revista brasileira de cinema, publicada nas primeiras décadas do século XX.


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Hoje essa influência ainda se mantém forte. Por se tratar de transnacionais de grande porte, há décadas ativas na competitiva indústria cinematográfica americana, e com mais conexões e recursos financeiros à disposição, o investimento na produção e distribuição de suas obras tendem a colocá-las em posição de privilégio no mercado. Os filmes distribuídos por essas empresas muitas vezes lideram o número de cópias no mercado, comparado com o desempenho de suas contrapartes nacionais, o que pode ser exemplificado pelo fato da Sony ter sido a maior distribuidora por número de cópias em 2007, com mais de 4.800, comparativamente, a brasileira Imagem Filmes, chegou a quarta posição no ranking, com 1.442 cópias, segundo dados da Ancine, publicados no site Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (2008). Também há uma preocupação em produzir uma linguagem narrativa e estética que possa ser compreensível e identificável, que procure, na medida do possível, transcender as barreiras culturais, específicas de uma região ou de um país, com propósito de abarcar o maior número possível de espectadores. As majors estão por trás dos lançamentos de muitos filmes brasileiros de destaque de bilheteria, tais como Tropa de Elite (José Padilha, 2010)20, Nosso Lar (Wagner de Assis, 2010)21, Se Eu Fosse Você 2 (Daniel Filho, 2009)22 e muitos outros. De acordo com os dados publicados em 2015, no Informe de Acompanhamento de Mercado, pelo Observatório Brasileiro do Cinema e Audiovisual, o desempenho dessas distribuidoras na bilheteria brasileira foi notável: [...] A Fox foi a distribuidora com melhor desempenho de bilheteria nas 13 primeiras semanas de 2015 (26,2%), seguida pela Universal (20,4%), Warner (10,1%), Disney (8,8%) e Paramount (8,5%), todas empresas internacionais. A Fox distribuiu quatro das dez maiores bilheterias do primeiro trimestre de 2015, e a Universal foi responsável pelo lançamento de Cinquenta Tons de Cinza, maior arrecadação do período, com R$ 87,1 milhões (Brasil, 2015a apud VIEIRA; GUSMÃO, 2017, p.39).

Já em 2017, o ranking das distribuidoras de maior participação na renda no Brasil, foi liderado pelas majors Disney, Universal e Warner, como o gráfico abaixo

20

Sétima maior bilheteria do cinema nacional, em 2007, e assistido por mais de um milhão de espectadores. 21

Vendeu 5 milhões de ingressos em 5 dias, e teve metade do valor de investimento de distribuição (R$ 20 milhões) arrecadado em menos de uma semana nos cinemas (SIMON, 2010). 22

Liderou a bilheteria brasileira por mais de três semanas, e chegou a desbancar indicados ao Oscar, como O Curioso Caso de Benjamin Button (David Fincher, 2008), no número de espectadores.


21

demostra: Gráfico I - Participação de Renda por Distribuidoras – Títulos Brasileiros e Estrangeiros Exibidos - 2017

5.00%

5.40% 19.10%

6.70%

8.20%

18.20%

9.30%

10.80% 17.30% Disney

Universal

Warner

Fox

Sony

Paris

Downtown/Paris

Paramount

Outras

Fonte: OCA - Ancine, 2018.

Um fator que contribui para a participação dessas empresas no país, foi a implementação da Lei do Audiovisual, que pode ser descrita, de maneira básica, como uma medida que estimula a produção do cinema brasileiro através do investimento financeiro, por parte de empresas ou pessoas físicas, e que proporciona o abatimento de imposto desses mesmos investidores, além de permitilos vincular sua imagem comercial com o conteúdo da obra, o que pode ampliar mais ainda o ganho financeiro. Explorando o 3° artigo23 dessa lei, as majors passam a investir 70% do imposto a pagar em produções audiovisuais brasileiras, o que, como idealiza a lei, favorece o crescimento da indústria brasileira e viabiliza uma distribuição mais ampla para as obras que recebem o investimento dessas distribuidoras internacionais. Porém, há críticas quanto a Lei do Audiovisual e aos demais incentivos fiscais disponibilizados pelo governo brasileiro para o fomento do cinema brasileiro.

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Em que existe a isenção de 70% do valor do imposto de renda devido para o investimento na coprodução de obras audiovisuais brasileiras de produção independente. Os 30% que sobram do imposto, são recolhidos para a Receita Federal (ZAVERUCHA, 1997 apud IKEDA, 2012).


22

Segundo a autora Denise Mota da Silva (2007 apud CESÁRIO, 2007), a implementação de renúncias fiscais para incentivar o investimento da parte do setor privado no cinema brasileiro, coloca nas mãos das equipes de marketing das empresas o papel de decidir em quais filmes investir, e elas acabam dando preferência a profissionais conhecidos do mercado, o que desfavorece a entrada de novos realizadores no cinema. Uma razão para que isso aconteça pode ser porque filmes estrelados/dirigidos por profissionais com as quais o público seja mais familiarizado podem atrair mais espectadores para as salas de exibição e passar maior segurança para os investidores, que irão por meio desses filmes, veicular a imagem de suas empresas, como é o caso da Lei do Audiovisual. Entre os blockbusters lançados por essas distribuidoras, temos Os Vingadores (Josh Whedon, 2012), Star Wars: Os Últimos Jedi (Rian Johnson, 2017), 007- Operação Skyfall (Sam Mendes, 2012) e Avatar (James Cameron, 2009), todos com alta arrecadação de bilheteria no Brasil. 1.2.4. Netflix: uma “major” da distribuição digital Embora não faça oficialmente parte das seis majors da distribuição cinematográfica, no mundo do streaming, temos como um player24 de notoriedade, a Netflix, uma distribuidora e produtora de filmes e séries fundada em 1997, a partir das elaborações dos empreendedores Reed Hastings e Marc Randolph, no estado americano da Califórnia. Hoje atuando como uma das plataformas de streaming VoD mais bem conhecidas do mundo, presente em cerca de 190 países, com exceção da Criméia, Síria e Coreia do Norte, a Netflix disponibiliza diferentes catálogos em cada nação, contando com milhares de filmes, séries, especiais de comédia, reality shows e outras produções audiovisuais, além de participar ativamente na produção de conteúdo original e exclusivo (também conhecidos como Netflix Originals25). Durante os seus primeiros anos de atividade, a empresa trabalhava com o

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Referente ao mercado, se trata de uma empresa que possui grande papel na indústria em que opera. 25

Entre essas produções estão obras criticamente aclamadas como O Irlandês (Martin Scorsese, 2019), Beasts of no Nation (Cary Fukunaga, 2015) e História de um Casamento (Noah Baumbach, 2019), todos indicados ao Academy Awards e distribuídos diretamente pela Netflix.


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aluguel e venda de filmes em DVD, que eram entregues por correio para o assinante. Embora essa seja uma opção atualmente menos conhecida por parte dos consumidores, se trata de um serviço que a Netflix ainda oferece nos Estados Unidos. Após a popularização do YouTube, os criadores da empresa decidiram investir no uso da tecnologia de streaming para fazer seus filmes chegarem aos clientes e então a Netflix se tornou uma das pioneiras em criar um serviço de VoD para distribuir filmes26. A plataforma permite o consumo de suas produções através de aparelhos conectados à internet, como smartTVs, celulares, tablets ou videogames, além de não conter quaisquer formas de anúncios ou comerciais em sua interface ou durante a apresentação de seu conteúdo. O licenciamento de suas produções ocorre mediante contratos fechados com outras produtoras e distribuidoras de cinema detentoras dos direitos autorais da obra. Dependendo do tipo de conteúdo, os contratos variam. No caso das séries é especificado quais temporadas, senão todas, serão disponibilizadas pela plataforma e por quanto tempo. Após o fim do período do contrato a Netflix e os criadores da obra, ou quem quer que tenha posse dos direitos da produção, decidem se irão dar procedimento ao negócio ou a empresa pode dispensar a obra de seu acervo, por razão de falta de acesso da parte dos assinantes (BEERS, 2020). Caso o acordo não seja de exclusividade, ou seja, não será apenas a Netflix que distribuirá e exibirá o conteúdo, o contrato é mais barato. No Brasil, a Netflix conta com mais de 17 milhões de assinantes (STYCER, 2020). Referente ao seu investimento em produções brasileiras e sua distribuição, a própria empresa, em uma matéria do jornal online Metrópoles, informa: Acreditamos que mais pessoas mereçam ver suas realidades refletidas nas telas e que boas histórias podem surgir de todos os lugares e serem amadas no mundo todo. Desde 2016 investimos em produções de conteúdo brasileiro para levar aos nossos assinantes aqui, e nos 190 países onde estamos presentes, histórias verdadeiramente brasileiras (NETFLIX apud PRISCO, 2019).

Como apontado pela própria Netflix, a partir de 2016 muitas séries brasileiras

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Uma tentativa, anterior a Netflix, de criar uma plataforma de VoD para distribuir filmes foi realizada em Hong Kong, no final dos anos 1990, pela empresa de telecomunicações Hongkong Telecom. Seu projeto chamado iTV era uma televisão interativa que, mediante uma assinatura paga, permitia aos seus clientes escolher quais filmes assistir em casa. Devido a problemas técnicos e financeiros (já que muitos usuários ficavam confusos com as opções disponíveis no iTV), o projeto foi descontinuado em 2002 (SMITH, 2017).


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produzidas pela empresa foram introduzidas no acervo da plataforma, entre elas Irmandade (2019), drama policial estrelado pelo cantor Seu Jorge; Sintonia (2019), série criada e dirigida pelo produtor musical KondZilla; Coisa Mais Linda (2019), drama ambientado no Rio de Janeiro dos anos 1950; e 3% (2016), ficção cientifica criada por estudantes da Universidade de São Paulo. Um impacto da Netflix no mercado audiovisual brasileiro foi o surgimento de outras plataformas de streaming VoD disponibilizadas por canais por assinatura, em uma tentativa de se reinventar para competir com a empresa norte-americana (DIAS; DALL’ORTO, 2016). Nessas plataformas os assinantes podem acessar o conteúdo exibido no canal quando quiserem. O Globoplay, um serviço de VoD que foi lançado no final de 2015 e pertence a emissora de televisão Globo, é um exemplo dessas novas plataformas que surgiram após a chegada da Netflix no Brasil. A Globoplay oferece aos seus usuários acesso as telenovelas já exibidas pela emissora, além de filmes, documentários e séries de origem nacional, estrangeira e que foram produzidas para terem sua distribuição exclusiva na plataforma. Embora existam vários filmes nacionais distribuídos pela Netflix, a grande maioria de seu acervo ainda é largamente composto por produções estrangeiras. Entre as obras brasileiras, temos o documentário Democracia em Vertigem (Petra Costa, 2019), que foi indicado ao Oscar dentro da categoria Melhor Documentário de Longa Metragem, e o qual a Netflix adquiriu os direitos de distribuição após sua primeira grande exibição, ocorrida no Festival de Sundance. Em 2019, se tornou um dos documentários mais vistos na plataforma no Brasil (PADIGLIONE, 2019), além de ter tido sua exibição globalizada. A representação do cinema independente e autoral brasileiro dentro da plataforma não é muito grande, entretanto, não chega a ser inexistente. Levando em consideração a abrangência global da Netflix existem nichos de filmes disponíveis em seu catálogo (obras de artes marciais, filmes artísticos europeus etc.) com o intuito de agradar os grupos com gostos mais específicos entre seu vasto número de assinantes mundialmente, e que incluem o cinema independente nacional. Em 2013, a empresa chegou a dar um prêmio a produção brasileira de baixíssimo orçamento, Apenas o Fim (Matheus Souza, 2008), conquistado através de votos realizados pela internet. O filme teve sua exibição expandida para todos os países em que a empresa atua, incluindo o Brasil, o que não apenas amplia a


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exposição da obra em si, mas também as oportunidades profissionais que podem surgir para os realizadores responsáveis pela produção (VILLALBA, 2013). Essa ação de premiar produções brasileiras independentes (conhecida como Prêmio Netflix) teve início em 2013 e almejava a promoção do conteúdo brasileiro na plataforma. A segunda, e, até então, última edição, ocorreu em 2016. Por meio de duas votações, uma realizada pelo povo e outra pelo júri composto por nomes do cinema brasileiro/latino-americano como Alice Braga, Fabrício Boliveira, Cesar Charlone, Fernanda Andrade, Adriana Dutra e influenciadores como Hugo Gloss e Lully de Verdade (COLETTI, 2016). Os filmes vencedores foram O Último Cine Drive-in (Iberê Carvalho, 2015) e Ventos de Agosto (Gabriel Mascaro, 2014). Embora não existam números dos acessos desses filmes na Netflix, dentro e fora do Brasil, Ted Sarandos, diretor executivo da empresa, em declaração publicada no portal de notícias online Terra, informa que: Desde que a Netflix chegou ao Brasil, há cinco anos, temos investido no país por meio de licenciamento de títulos brasileiros, assim como exportando talento local para o mundo em produções originais. Mais de 45% dos nossos assinantes fora da América Latina já assistiram a conteúdos da região, o que mostra como os talentos locais ganham exposição global através da Netflix. Temos certeza que o Prêmio Netflix vai ajudar o mundo a conhecer estas incríveis histórias selecionadas para o Prêmio Netflix (SARANDOS, 2016 apud ZANETTI, 2016).

A maneira que a Netflix distribui seus filmes (diretamente na casa do espectador, o permitindo assistir o conteúdo no ritmo que preferir, tudo isso na plataforma da empresa) dispensa a necessidade dela negociar com exibidores, um processo que embora seja um dos maiores atrativos da Netflix para os consumidores, já gerou polêmica entre alguns profissionais da indústria cinematográfica norte-americana. O cineasta Steven Spielberg já criticou negativamente a Netflix por não seguir o processo de distribuição tradicional que as demais players do mercado seguem, ou seja, exibir seus filmes nas salas de cinema por alguns meses/semanas e após isso permitir sua veiculação em outras janelas como TV, DVD e streaming. A opinião de Spielberg quanto a Netflix foi publicada em muitos portais de notícias pela internet por volta de 2019, o mesmo ano em que o filme Roma (Alfonso Cuarón, 2018) ganhou um Academy Awards, porém ao contrário dos demais indicados, Roma foi distribuído globalmente pela Netflix e não nas salas de cinema, o que é visto como algo injusto pelos estúdios de cinema dos E.U.A. e de acordo com Spielberg torna o filme mais aplicável para uma indicação


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ao Emmy, que é uma premiação direcionada a produções televisivas, do que ao Oscar (BATTAGLIA, 2019). O diretor chegou a comentar que, embora boas histórias são o que importam, independente da janela em que são veiculadas, ele busca preservar o hábito dos espectadores irem ao cinema, o reconhecendo como um evento de entretenimento que deve ser experienciado no coletivo (GAMA, 2019). Spielberg chegou a apresentar propostas que inviabilizassem a indicação ao Academy Awards das obras que apenas forem exibidas na Netflix, e de certa maneira suas críticas levaram a algumas alterações nas normas de elegibilidade das produções da Netflix ao prêmio, que ainda permitem a indicação das obras da plataforma ao mesmo, porém mediante uma exibição de no mínimo sete dias no Condado de Los Angeles, Califórnia (FRANCE, 2019). Essa questão da Netflix em premiações de cinema não chegou a reverberar tanto na indústria cinematográfica brasileira quanto na norte-americana, talvez pela razão de que Spielberg estava principalmente se referindo a presença dos filmes originais da Netflix em uma premiação norte-americana. Um outro motivo pode ser porque a Netflix possui um maior foco na produção de séries nacionais, como já apontado, ao invés de filmes. 1.2.5. Codistribuição A codistribuição no cinema ocorre quando duas ou mais empresas, em parceria, são responsáveis por distribuir um filme no mercado, assim como todas as outras funções que essa tarefa abrange. Conforme as análises do professor Fernando Antonio Prado Gimenez e a autora Daniela Torres da Rocha (2018), em 2009 o número de codistribuições era de 10 filmes, já em 2015, essa quantidade mais que dobrou, chegando a 28 obras. Até o primeiro semestre de 2013, através da codistribuição, as empresas alcançaram pouco mais de 70% do público nos cinemas. Entretanto a codistribuição do tipo nacional-internacional permanece pequena, em 2016, por exemplo, apenas o filme S.O.S. Mulheres ao Mar 2 (Cris D'Amato, 2016) foi lançado por meio dessa prática, no início do quarto trimestre de 2015 (ANCINE, 2016) e a situação se repetiu no ano seguinte, 2017, com um único título distribuído dessa forma.


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Um dos principais motivos que levam as distribuidoras a esse joint venture27, são as divisões dos custos referentes a comercialização do filme, que às vezes podem variar de milhares até milhões de reais, dependendo muito do porte das empresas atuantes e do tipo de obra com que se trabalha (filmes de nicho, comerciais, etc.). Essas separações são estipuladas em contratos. Entre as empresas que engajam nessa prática, temos desde as majors, até as estatais e as distribuidoras brasileiras de menor porte. A colaboração entre as distribuidoras independentes Paris e Downtown, é uma das mais bem-sucedidas em bilheteria no mercado. Essas duas sozinhas foram responsáveis pela codistribuição de obras como Minha Mãe é uma Peça 2 (César Rodrigues, 2016), Nada a Perder (Alexandre Avancini, 2018) e Os Dez Mandamentos - O Filme (Alexandre Avancini, 2016), os três maiores filmes nacionais em termos de renda, desde meados da década de 1990 até 2018. Segundo dados do site Filme B28, as codistribuições da Downtown/Paris Filmes constituíram 92,1% do market share29 de público no cinema nacional em 2018, e pouco mais de 90% em relação a renda: Gráfico II – Market share distribuidoras filme nacional

27

Uma união estratégica e temporária entre duas ou mais empresas, geralmente, para fins comerciais. 28 29

Portal de notícias online com foco no mercado de cinema brasileiro.

A fatia do mercado que uma empresa abrange, em termos de aquisição de lucros e clientes. O nível de participação que um negócio tem no mercado em que opera.


28

Fonte: Filme B Box Office Brasil, 2018.

Segundo o Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro 2018, elaborado pela Ancine (2019), até então o mais recente, as distribuidoras brasileiras que realizaram codistribuições em 2018 foram as listadas a seguir: •

Vitrine Filmes

Espaço Filmes

Downtown

Paris Filmes

Embaúba Filmes

Pique-Bandeira Filmes

Félix Filmes

Tucumán

California

Taturana

Bretz Filmes

Pagu Pictures

Muk Produções

Enkapothado

1.2.6. Distribuidoras independentes As empresas de distribuição independentes são aquelas de capital nacional, e que não possuem ligação com as grandes distribuidoras americanas do setor, as majors. Assim como toda distribuidora, as independentes obtém dinheiro através da bilheteria dos filmes que lançam no mercado exibidor ou das vendas em DVD e VoD. Muitos dos responsáveis por essas empresas são empresários com formações relacionadas a área de administração e/ou cinema, como é o caso de Silvia Cruz30 (Vitrine Filmes), dos cineastas Pedro Henrique Leite e Gracie P (Supo Mungam Filmes), Paula Cosenza31 (Pandora Filmes) e Sabrina Nudeliman Wagon32

30

Formada em Administração de Empresas com Ênfase em Marketing pela ESPM.

31

Produtora de cinema.

32

Formada em administração de empresas na FEA-USP / Florida International University (International Business).


29

(Elo Company). Apesar de hoje em dia serem capazes de lançar seus próprios filmes no mercado, algumas décadas atrás, com uma indústria cinematográfica mais frágil no Brasil, isso não era uma realidade, como aponta o professor Marcelo Ikeda: Em 1993, o mercado de salas de cinema estava quase exclusivamente ocupado pelo produto estrangeiro. [...] Diferentemente do que vemos hoje, praticamente não havia distribuidoras independentes que pudessem assumir o papel de colocação do filme brasileiro. Por isso, os primeiros filmes brasileiros produzidos a partir das leis de incentivo, ou a partir do Prêmio Resgate33, encontravam extremas dificuldades de posicionamento num mercado cada vez menor e mais concentrado. [...] (IKEDA, 2013, p. 59-60 apud RAMALHO, 2016, p.44)

Com os incentivos disponibilizados pelo Ministério da Cultura através da Ancine, as distribuidoras independentes encontram mais suporte, utilizando de mecanismos de fomento para aprimorar o seu desempenho como empresas na indústria. Entre esses incentivos temos o PAR (Prêmio Adicional de Renda), que premia empresas de audiovisual brasileiras com uma quantia financeira para ser investida apenas em mais projetos no setor, isso conforme a renda que seus filmes acumulam nas bilheterias; e o Funcine (Fundos de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional) que similarmente a Lei Rouanet, oferece a possibilidade de investimento, com dedução fiscal, por parte de pessoa física ou jurídica em um filme, mas com meta de retorno de todo o valor investido para o investidor. A implementação desse fundo, almeja também beneficiar a distribuição independente no país, como o trecho a seguir detalha: Nos projetos relativos à produção ou distribuição, a regra geral determina a distribuição das obras audiovisuais no Brasil por empresa brasileira independente. O objetivo da disposição é fortalecer o setor nacional de distribuição, permitindo a elaboração de estratégias de comercialização e exibição dos filmes de forma independente (ANCINE, 2008?).

Todos esses mecanismos se caracterizam como exclusivamente dedicados para empresas brasileiras de cinema e todos contribuem para a distribuição de filmes no setor, servindo de alternativa ao Artigo 3° da Lei do Audiovisual, usada frequentemente pelas distribuidoras americanas.

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O Prêmio Resgate do Cinema Brasileiro foi um incentivo ao mercado cinematográfico nacional implementado no governo de Itamar Franco e viabilizado por meio dos recursos que eram destinados a Embrafilme. As verbas do Prêmio Resgate foram distribuídas para 24 curtas-metragens e 17 longas-metragens (KELLY, 2019).


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Essas empresas, atualmente ocupam uma parcela significante no cinema brasileiro, sucedidas pelas distribuidoras americanas. Entre as independentes temos, Paris, Imagem, Downtown, NOSSA, Boulevard, Pandora, entre muitas outras. Nesse trabalho, as distribuidoras independentes são todas nacionais já que suas contrapartes estrangeiras são de pequeno porte, ao menos quando comparadas com as majors, portanto sua área de atuação não costuma abranger mais que o mercado cinematográfico de seus respectivos países. Um exemplo disso é o filme O Farol (Robert Eggers, 2019) distribuído nos Estados Unidos pela independente A2 Films, e no restante do mundo pela Universal. Algumas das distribuidoras independentes no Brasil abrangem sua atuação no mercado, conjuntamente com a exibição, por meio de salas de cinema já próprias da distribuidora, como a Playarte, por exemplo, que em 2017 tinha um total de 49 salas no circuito exibidor, quase todas em São Paulo (Ancine, 2018). Em 2010, foram responsáveis por arrecadar 26% da renda de bilheteria do cinema nacional, isso incluindo a quantia adquirida através das codistribuições com as majors. Dessa porcentagem, quase metade (45%) é atribuída ao que foi arrecadado com o lançamento de filmes brasileiros (Ancine, 2011). Entre as independentes, as empresas Paris e Downtown são as que aparecem com mais frequência nas 10 primeiras posições dos rankings anuais das maiores bilheterias de cinema no Brasil, disponibilizados pela Ancine, desde 2012 até 2019. A Paris apareceu um total de nove vezes nos rankings, incluindo, nessa parcela, suas cinco atuações como codistribuidora com a Downtown, que esteve cinco vezes nas classificações. As distribuidoras Imagem e Zazen34, apareceram apenas uma vez cada. Ao contrário das majors, as distribuidoras independentes brasileiras investem mais no chamado cinema de arte (termo referente a filmes artísticos, experimentais e independentes, que não tem muito apelo popular) e no Brasil foram responsáveis pela distribuição de filmes como A Câmera de Claire (Hong Sang-soo, 2018),

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A Zazen Produções, se trata de uma produtora de cinema, não distribuidora, porém assumiu essa função quando decidiu inserir o filme Tropa de Elite 2 – O Inimigo Agora é Outro (José Padilha, 2010) nas salas de cinema por conta própria, ou seja, sem entrar em acordo com uma empresa de distribuição.


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Ciganos da Ciambra (Jonas Carpignano, 2018), Tinta Bruta (Marcio Reolon e Filipe Matzembacher, 2018) e Norte, o Fim da História (Lav Diaz, 2013). Entretanto, isso não é uma regra, visto que a Paris Filmes e Downtown são duas distribuidoras independentes cujos filmes distribuídos são mais comerciais e atraem um maior número de espectadores nas salas de cinema. 1.3. O processo de distribuição no Brasil hoje Levando em consideração o fato de que filmes podem ser distribuídos para uma variedade de janelas de exibição (por vezes, algumas obras chegam ao espectador diretamente via DVD, Blu-ray35, TV aberta e por assinatura ou até mesmo por streaming, como é o caso das produções originais Netflix) esse subcapitulo apresenta uma explicação passo a passo de como se configura o processo de distribuição de um filme longa-metragem no Brasil, com enfoque a forma de distribuição digital direcionada às salas de cinema realizada por uma distribuidora independente nacional. O momento quando ocorre o primeiro encontro entre produtores e distribuidores varia de acordo com quem é responsável pela realização da obra. Nos filmes que contam com a produção das majors, antes mesmo de serem finalizados (às vezes, ainda na fase de roteiro) já existem planejamentos concretos para sua chegada aos cinemas, pois é comum essas empresas já contarem com suas próprias subsidiárias na distribuição. No caso das produções independentes, esse contato acontece após a finalização da obra, e de sua veiculação em outras janelas de exibição como em festivais de cinema. Durante essa fase, os produtores buscam vender o seu filme, na expectativa de conquistar um acordo de distribuição que possa levar a obra para um maior público. Os representantes das distribuidoras realizam um levantamento sobre em qual filme devem investir, mediante uma avaliação que leva em consideração diversos aspectos, entre eles, a recepção da produção pela crítica ou público; o quão reconhecido é o elenco e diretor; e até mesmo o número de prêmios de festivais conquistados, tudo para analisar o potencial lucrativo que o filme oferece. Também é levado em conta com que tipo de

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Filmes em DVD e Blu-ray são exemplos de home vídeo, termo em inglês usado para se referir a obras (previamente gravadas) que são vendidas ou alugadas para serem assistidas em casa, em mídias físicas.


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obra a distribuidora costuma trabalhar e o público-alvo que pretendem alcançar. Uma vez que os distribuidores e produtores entram em acordo, existe o processo de aquisição dos direitos de exibição do filme, que permite justamente sua veiculação nas salas de cinema. Em seguida, a distribuidora entra em negociações diretas com os exibidores. Nessa etapa, é estipulada a data de lançamento da obra, quanto tempo ela ficará em cartaz, e em quantas salas ela será exibida, o que também varia conforme o porte da empresa responsável pela distribuição, visto que, quanto maiores os recursos financeiros à disposição, mais ampla será a quantidade de salas alcançadas pela produção (CINEFILIA7ART, 2014). As obras de nicho comumente são exibidas em um menor número de salas, entre dez ou vinte, como, por exemplo, o caso do filme Sinfonia da Necrópole (Juliana Rojas, 2014) que foi distribuído em até dez salas no país, no seu ano de lançamento (Ancine, 2019). Existem dois tipos de acordos que possibilitam a aquisição e divisão dos lucros de bilheteria entre os distribuidores e exibidores, são esses os contratos de tipo preço fechado e de porcentagem. No primeiro modelo, o cinema paga um valor fixo para exibir a produção por uma determinada quantidade de semanas, entretanto não é um acordo muito utilizado devido ao alto risco de os exibidores não coletarem na bilheteria a quantia que investiram no filme para sua exibição. No segundo modelo, uma parte do valor do ingresso é direcionado para as distribuidoras, além de serem estipulados outros acordos, como uma determinada quantia que cubra as despesas básicas que o cinema teve ao exibir o filme; a porcentagem da bilheteria bruta e liquida (o valor que resta após a subtração do que é pago no reembolso) que será cedida para o cinema e distribuidor, e por quanto tempo valerá o contrato. Nesses dois tipos de acordo, a distribuidora sempre fica com a maior quantia (MACAUE, 2014). A etapa de divulgação começa em seguida. Dependendo do tipo de filme com que a distribuidora está trabalhando, é realizado um investimento maior na campanha, que abrange desde a confecção de cartazes, trailers, outdoors, até às vezes, a venda de produtos relacionados ao filme, como brinquedos e acessórios, o que ocorre com as animações americanas de grandes estúdios. Atualmente,


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teasers36, anúncios, e outros tipos de divulgação costumam serem veiculados na Internet, compartilhados primeiramente pelas próprias distribuidoras, nos seus perfis nas redes sociais. Em relação aos filmes de nicho, esse processo é realizado em menor escala, com menos investimento financeiro. Dentro de alguns dias para a estreia do filme nos cinemas, é realizado o envio das cópias para os exibidores em DCP, o digital cinema package, formato padrão em todo o mundo na exibição de filmes digitais. A responsável pelo estabelecimento das normas de qualidade do formato DCP, é a joint venture DCI, Digital Cinema Initiatives, atualmente composta pela Disney, Sony, Warner Bros, Paramount e Universal (GUIA FOLHA, 2012). Pode-se dizer que o principal fator na preferência das distribuidoras pelo formato digital é a redução de custos, visto que uma única cópia em película custa por volta de R$ 4 mil para ser produzida, comparativamente, por meio da digitalização, o valor desse processo é reduzido para R$ 400 (SICAV, 2014). No Brasil, estima-se que 100% das salas de cinema sejam digitais (ANCINE, 2018). Uma vez já estando em exibição nos cinemas, o lucro arrecadado na primeira semana de um filme em cartaz, é essencial para o seu futuro nas salas. O ex-diretor geral da Columbia TriStar Buena Vista Filmes do Brasil, Rodrigo Saturnino Braga, (apud RAMALHO, 2016), comenta que é nesse período que muitas vezes um filme realiza o seu melhor desempenho em bilheteria, chegando a 30% do resultado total, porém, diferentemente das obras hollywoodianas, as produções nacionais conquistam uma menor porcentagem, em torno de 15%, devido ao costume do espectador brasileiro em aguardar primeiro a recepção das pessoas sobre o filme, para, posteriormente, decidir se irá assisti-lo. No caso dos filmes de nicho, a distribuidora esquematiza, primeiramente, coloca-los em uma menor quantidade de salas, espalhadas pelo país, e prolongar a sua permanência em cartaz, a fim de maximizar a venda de ingressos. Após o fim de sua exibição nos cinemas, o que pode levar desde algumas semanas até alguns meses, as cópias retornam para a distribuidora, que já procura continuar a exibição de seu filme, planejando e negociando sua chegada em outros

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Um curto trecho de um filme, com menor duração que um trailer, cujo propósito é gerar interesse nos espectadores.


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canais, como emissoras de televisão ou serviços de streaming, embora esse processo dependa do desempenho da produção nas salas (CINEFILIA7ART, 2014). A seguir, é apresentado um infográfico que busca demostrar de forma clara e simplificada as principais etapas até aqui mencionadas:


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Gráfico III – O Processo de distribuição no Brasil

Fonte: Elaborado pelo autor com base em Cinefilia7art (2014).


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Com o advento da pandemia da doença COVID-19, no começo do ano de 2020, em praticamente todo o mundo o distanciamento social foi praticado e incentivado pelos órgãos governamentais locais. Nesse cenário, houve o fechamento de diversos estabelecimentos que tipicamente atraem grande concentração social, incluindo salas de cinema, com a intenção de reduzir a transmissão do vírus entre os cidadãos. Com a indústria cinematográfica brasileira (e global) agora lidando com os obstáculos surgidos nesse período, que afetam fortemente as etapas de produção, distribuição e exibição, a maneira que os filmes são distribuídos para que cheguem aos espectadores passou por significantes alterações. Com salas de cinema fechadas, as principais alternativas encontradas envolvem o uso de serviços de VoD (sejam eles já partes da produtora como Peacock37 e Disney + ou não) e também dos cinemas estilo drive-In, que durante a pandemia passaram por um verdadeiro revigoramento, tendo um aumento de popularidade entre os frequentadores de cinema, considerando que eram uma forma de exibição que teve seu auge no Brasil durante os anos 1970 até 1990. Entretanto, muitos filmes tiveram seus lançamentos adiantados para o ano de 2021, devido ao fato de que a arrecadação de lucros por VoD e drive-Ins não é a mesma daquelas de exibições realizadas em salas tradicionais de cinema. O processo de distribuição de um filme por uma plataforma de streaming VoD varia bastante conforme o canal em que ocorrerá sua veiculação. No Vimeo on Demand, por exemplo, o realizador/produtor tem um papel mais ativo na distribuição de seus filmes, pois além de necessitar ter uma conta Pro (que exige assinatura paga) e outra no serviço de pagamento online PayPal, é encarregado de selecionar qual tipo de produção está oferecendo (se é uma série ou filme), submeter uma descrição, trailer e pôster de sua obra na plataforma, escolher se ela poderá ser adquirida pelo usuário através de aluguel ou venda, o seu preço, além de ser responsável pelo processo de divulgação da produção nas redes sociais e fora delas. A quantia que o realizador/produtor recebe pela produção chega a 90% das vendas, tendo seu pagamento debitado em sua conta PayPal (VIMEO, 2019?).

“O Peacock é um novo serviço de streaming da NBCUniversal, empresa dona do estúdio Universal Studios e da rede de televisão americana NBC” (ALVES, 2020). 37


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Já uma opção muito utilizada por outras plataformas de streaming é obter novos conteúdos de audiovisual por meio de agregadores de VoD, que operam como elo entre o produtor e distribuidor. Um exemplo desse tipo de empresa é a Sofá Digital, a maior atuante nesse ramo na América Latina, fundada pelo empresário brasileiro Fabio Lima e colaboradora frequente do Now, YouTube, MUBI, Amazon, Google Play, Netflix e muitos outros. Para que um filme chegue ao Sofá Digital, o produtor responsável primeiramente entra em contato com a equipe com sua obra, o que é possível ser feito pelo próprio site do agregador. Caso houver interesse no filme, é necessário a realização de trailers e posters para divulgação, o que pode ser realizado por uma agência contratada. Assim que um filme faz parte da Sofá Digital ele é vendido para as operadoras e plataformas de VoD interessadas e pode ter sua distribuição ampliada por todo o país ou até fora dele. Nesse sentido, a Sofá Digital age como um canal que viabiliza a distribuição de um filme em outras plataformas, com as quais sua equipe mantém constante contato, as colocando nas "prateleiras do mercado". Já para que um filme chegue a um cinema drive-in legalizado, ou seja, aquele que é devidamente registrado na Ancine como um exibidor, é necessário permissão da distribuidora ou dos detentores dos direitos comerciais da produção para sua exibição. Como as salas de cinema tradicional estão fechadas durante a pandemia, muitos filmes estão sendo exibidos nesses cinemas ao ar livre, entretanto, são pouquíssimos os lançamentos inéditos nessa janela. A razão se dá por conta das restrições de acesso que os drive-In possuem, o que reduz o número de espectadores e venda de ingressos por sessão, o que não apresenta um bom prospecto de lucratividade para os distribuidores, além do fato de que um possível lançamento inédito apenas seria permitido em um drive-in legalizado. Outra forma (também por streaming) em que filmes encontram para chegar aos espectadores no Brasil é por meio do site Cinema Virtual (idealizado por Marcelo Spinassé Nunes), que como o próprio nome indica, oferece filmes pela internet, de maneira semelhante às salas de exibição, ou seja, cada sessão deve ser paga em um valor próximo de R$ 25,00, por meio do PicPay ou por um cartão de crédito. A atualização do conteúdo ocorre semanalmente, e mais de 10 filmes novos são adicionados ao catálogo do Cinema Virtual. O site distribui parte do lucro obtido com as exibições para proprietários de salas de cinema, profissionais muito


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prejudicados no período de pandemia. Em suma, podemos dizer que a distribuição cinematográfica no Brasil se alterou significantemente durante o ano de 2020, por conta da pandemia de Covid19, se adaptando as mudanças que visam o distanciamento social entre as pessoas. Ao decorrer do Capítulo 1, vimos um histórico da distribuição de filmes no Brasil, o papel que empresas estatais como Embrafilme e RioFilme tiveram no setor, a influência que as distribuidores estrangeiras tem no mercado de cinema brasileiro, como se configura a distribuição de um filme no Brasil, e outros aspectos referentes a esse processo. O capítulo a seguir intenta definir os significados que o cinema independente brasileiro teve ao longo dos anos.


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CAPÍTULO 2: FILMES INDEPENDENTES NO BRASIL O significado do que se constitui um filme independente, seja no Brasil ou em outro país, contém algumas similaridades, sendo a principal a rejeição aos modelos de produção e narrativa dos grandes estúdios/produtoras de seus respectivos países. Por exemplo, no Reino Unido, cinema independente pode ser compreendido como filmes produzidos por pequenas produtoras, que não seguem fórmulas como as usadas nos roteiros de grandes estúdios de cinema e apresentam variedade de gênero (BBC, c2020). E na Índia, esses filmes são definidos, pelo cineasta Ajay Bahl, como uma resposta as obras de Bollywood38, sem se conformar ao estilo dessas produções (SAKULA, 2015). Esse capítulo irá abordar o cinema independente brasileiro ao longo das décadas, a partir dos anos 1950 até a década de 2010, com o intuito de compreender as distintas definições que filmes desse tipo tiveram no país. 2.1. Cinema popular brasileiro Antes de embarcamos em um estudo relacionado aos filmes independentes brasileiros, buscamos direcionar nosso olhar acerca das características do que se considera cinema popular nacional. A razão de pesquisar essa categoria de cinema, é motivada pela observação de que em comentários referentes à definição de filmes independentes, é comum utilizar o termo cinema popular como antônimo. Portanto, se vê necessidade de conceitualizá-lo, para uma melhor compreensão. Embora as distinções entre os termos "filme" ou "fílmico" e "cinema" ou "cinematográfico" sejam ou utilizadas sem distinções entre si, ou empregadas como tópicos de debate dentro de contextos acadêmicos, nesse trabalho será usado a acepção da palavra "cinema" e suas variações, como referente à indústria cinematográfica como um todo. Já o termo "filme" e suas derivações semânticas, serão aceitas como pertinentes a uma obra fílmica específica, o produto audiovisual que se é consumido pelo público. Mais um termo que convém a ser definido é a palavra "popular", que segundo

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Nome usado para se referir a indústria do cinema mainstream indiano, a maior do ramo do entretenimento na Índia. Os filmes de Bollywood são muitas vezes produzidos na cidade de Mumbai e no idioma hindi e comumente tem romances, danças e canções em suas narrativas (KREUTZ, 2019).


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o minidicionário Aurélio, tem como uma de suas definições aquilo que é "[..] próprio do povo, ou feito por ele [...] Feito, distribuído ou adaptado para ser acessível ao uso ou consumo por grande número de indivíduos [...] aos com menor poder aquisitivo [...]" (FERREIRA, 2009). Já produtor Leonardo Mecchi define cinema popular como "aquele que atinge grandes números nas bilheterias do circuito comercial" (MECCHI, 2009?). Com essas informações em mente, logo pode-se compreender um filme popular, como obra com o principal intuito de conquistar o grande público, especialmente a parcela da população que não pertença as classes mais altas da sociedade, o que pode ser demonstrado pelo fato de que indivíduos da classe C39, constituem a maior parte do povo brasileiro40. Nesse trabalho, se tem como definição de cinema popular aquele que atrai o povo e que apresenta um retorno comercial, como os filmes da Globo Filmes (que terão mais foco no decorrer desse capitulo), com roteiros fortemente baseados nas narrativas televisivas e atores cuja fama teve origem em telenovelas (ZANIRATTI, 2010). O termo "popular" teve diversas conotações ao longo das décadas. Até os anos 1920, produções dessa categoria eram enxergadas como: [...] filmes mal produzidos, em condições adversas, exibidos em salas precárias e obscuras e assistidos pelas camadas mais pobres da população, como os operários de origem italiana (ABREU; MACEDO; ROSSINI, 2013, p. 6).

Nesse época, tendo como base o texto “Ir ao cinema em São Paulo nos anos 20” de Sheila Schvarzman (2005), havia uma descriminação quanto aos mais pobres que frequentavam o cinema, pois existia a preocupação de alguns críticos brasileiros da revista Cinearte41, como Otávio Gabus Mendes e Adhemar Gonzaga, em tornar o cinema uma atividade cultural mais elitizada, que as salas de exibição deixassem de ser frequentadas pelas classes mais baixas da sociedade da época, e que se tornassem estabelecimentos mais higienizados, preservados, e inseridos em bairros de classe média. A concentração dos filmes que eram considerados de qualidade, por esses cronistas, nos cinemas das regiões mais pobres de São Paulo,

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A classe C é formada por cidadãos brasileiros que possuem como renda mensal entre R$ 1.446,24 e R$ 4.427,35, segundo divisões do economista Marcelo Neri (TEIXEIRA, 2019). 40

Mais precisamente, 55,3% da população nacional pertenceu a classe C durante o ano de 2018, segundo dados da FGV Social, publicados pelo jornal de economia Valor (2019). 41

Revista brasileira sobre cinema, fundada em 1926 por Mário Behring e Adhemar Gonzaga, e encerrada em 1942.


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também não era vista de maneira positiva, pois inviabilizava o acesso da classe mais alta a essas produções (SCHVARZMAN, 2005). Na década de 1930, esse significado negativo passou a se despopularizar (ABREU; MACEDO; ROSSINI, 2013), visto que, a partir desse período, o conceito de popular no cinema passa a se referir a filmes que retratassem o povo brasileiro, seus costumes, vestimentas, ambientes e demais aspectos, como os filmes do cineasta Humberto Mauro (SILVA, 2014), diretor de Favela dos meus amores (1935), filme cujas cópias foram perdidas, que contava com trilha sonora composta por artistas populares como Ary Barroso e Orestes Barbosa, e o qual as professoras Stephanie Dennison, Lisa Shaw informam ter sido um “um tremendo sucesso de bilheteria e foi relançado no começo dos anos 1940” (DENNISON; SHAW, 2004, p.49, tradução nossa); e de Ademar Gonzaga realizador do musical Alô, Alô, Carnaval (1936), com a participação da cantora Carmen Miranda. Historicamente, filmes populares no Brasil podem ser traçados desde as chanchadas, comédias carnavalescas populares durante a década de 1940 e 1950, conhecidas por seus personagens astutos e de trejeitos relacionados ao povo brasileiro, marchinhas de carnaval, e suas paródias das produções norteamericanas da época. Elas eram produzidas durante o período de industrialização do setor cinematográfico brasileiro, pelo estúdio de cinema Atlântida42, aqui implementado tomando como base um modelo já seguido nos Estados Unidos, o sistema de estúdios, que começou nos anos 1920 no país norte-americano. Nesse modelo, os principais estúdios (MGM, Paramount, Warner Bros, FOX, RKO43 Universal, Colombia e United Artists44) tinha grande controle sob Hollywood, controlando a produção, exibição e distribuição de filmes (KREUTZ, 2019). Como exemplos desse tipo de comédia, temos Matar ou Morrer (1954), Nem Sansão Nem Dalila (1955) e O Homem do Sputnik (1959), todos dirigidos pelo cineasta Carlos

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Também conhecida como Atlântida Cinematográfica e fundada em 1941, a companhia contava com grande número de famosos atores da época, com os quais frequentemente trabalhava em suas produções. Um exemplo é o uso do ator e comediante, Grande Otelo, presença constante nos filmes cômicos da Atlântida. 43

Estúdio de cinema criado pela Radio Corporation of America, em 1928. É conhecido por ter produzido o filme Cidadão Kane (Orson Welles, 1941). Foi a falência em março de 1959. 44

Fundada pelas figuras do cinema Charlie Chaplin, Douglas Fairbanks, Mary Pickford e D. W. Griffith, em 1919, para competir e reduzir a dependência profissional que os atores tinham dos grandes estúdios da época.


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Manga. Entre as décadas de 1950 e 1980, havia as comédias protagonizadas pelo ator Amácio Mazzaropi, famoso por interpretar o personagem caipira Jeca Tatu em seus filmes. Nascido na cidade de São Paulo, Mazzaropi chegou no cinema após trabalhar em circos, rádios e na televisão. Embora “desprestigiado pela crítica” (PEREIRA; MARTINS; PRINCE, 2011, p.2) suas produções, nas quais além de ator, ele também trabalhava como roteirista e produtor, atraiam muitos espectadores aos cinemas45, e Mazzaropi se tornou um milionário com sua carreira. A respeito de seus filmes, os autores William Ferezi Biagioli e Rosane Beyer, comentam, Ao mesmo tempo, personagem e autor, Amácio Mazzaropi foi um dos mais bem-sucedidos cineastas brasileiros [...]. Os filmes, na esmagadora maioria, são comédias populares, com temáticas cotidianas e construídas a partir do ideal do caipira, tipo comum ao interior de São Paulo, que Mazzaropi eternizou (BIAGIOLI; BEYER, 2014, p.175. grifo do autor).

Durante os anos 1970, os filmes de maior apelo popular eram as pornochanchadas, obras do gênero comédia com inclinações eróticas na história, porém nunca muito explícitas em suas representações de relações sexuais. Com forte influência das produções humorísticas italianas também de teor sexual, conhecidas como commedia sexy all'italiana, esse gênero brasileiro embora tenha vivenciado seu auge durante pleno governo militar, às vezes passava sem cortes pela censura e em suas histórias apresentava a sexualização do corpo feminino e temas como travestismo, adultério e homossexualidade (TAVARES; SILVA, 2013) assuntos tidos como tabus pela sociedade conservadora da época. Já os filmes de comédia protagonizados pelo grupo de humor Os Trapalhões, como O Trapalhão no Planeta dos Macacos (J.B Tanko, 1976) e O Trapalhão na Ilha do Tesouro (J.B Tanko, 1975) e outros nomes da televisão brasileira, como a apresentadora de programas infantis Xuxa Meneghel, estrela dos filmes Lua de Cristal (Tizuka Yamasaki, 1990) e Xuxa Requebra (Tizuka Yamasaki, 1999), alcançaram seu momento de popularidade durante os anos 1970 e 1990 nos cinemas do país, com suas histórias leves e cômicas, que poderiam ser aproveitadas por todas as famílias.

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Durante toda sua carreira, seus filmes levaram mais de 160 milhões de pessoas aos cinemas (Almanaque Urupês, 2016).


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Desde o final dos anos 1990 até hoje, como cinema popular, temos as produções realizadas pela Globo Filmes, que é uma produtora nacional de destaque referente à suas produções de grande bilheteria, como Meu Passado Me Condena - O Filme (Julia Rezende, 2013), Até que a Sorte nos Separe (Roberto Santucci, 2012), De Pernas Pro Ar (Roberto Santucci, 2010) e muitas outras, todas obras populares que fazem parte do cenário mainstream46 do cinema brasileiro. A influência das telenovelas em alguns desses filmes (da Globo) principalmente os de humor, vai além da frequente presença dos atores de televisão, e engloba também a maneira que essas histórias são filmadas, atuadas e editadas, ou em outras palavras, sua estética. A pesquisadora e autora Melina Marson, comenta sobre essa influência: [...] nesses filmes a linguagem e a estética se aproximaram das telenovelas, graças à larga utilização de planos fechados, fotografia e interpretações naturalistas; pelo apego a fórmulas, já consagradas nas novelas, de humor e de romance; através da utilização de um maior número de cortes e cenas, lembrando a rapidez e agilidade da televisão; e por meio da construção de personagens baseados em estereótipos da teledramaturgia. E são essas mesmas características que fizeram com que esses filmes encontrassem forte aceitação do público, pois geraram um tipo de reconhecimento e, dessa forma, conseguiram a simpatia dos espectadores (MARSON, 2006, p. 157).

Então pode se dizer que a aceitação do público dos filmes da Globo é devido a usarem cinematografia, iluminação e, às vezes, roteiros, semelhantes as telenovelas, cuja estética já possui um maior reconhecimento do espectador brasileiro, o que cria uma sensação de familiaridade e simpatia do público com os filmes (MARSON, 2006). Isso acaba produzindo filmes estandardizados, ou seja, que seguem uma específica fórmula para criarem resultados comerciais parecidos. Em suma, o cinema popular nacional teve suas definições alteradas ao longo das décadas, desde comédias paródicas, à pornochanchadas e filmes para toda família. O subcapítulo a seguir tem como foco delimitar qual o significado do cinema independente nacional nessa monografia. 2.2. Definindo o cinema independente brasileiro Um filme independente, geralmente, pode ser entendido como aquele que,

Uma das definições de “mainstream”, de acordo com o dicionário Priberam, é: "Criado para ser vendido ou divulgado em grande escala [...] comercial." (MAINSTREAM, 2020). 46


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primeiramente, serve como alternativa aos filmes comerciais (BATISTA, 2016), apresentando padrões de estética, narrativa e produção distintos dos impostos pelas grandes produtoras de cinema ou redes de TV. No Brasil, essas produtoras podem ser comparadas as emissoras de televisão, que possuem grande influência no audiovisual que se é consumido no país, como a Globo, por exemplo, como comenta o jornalista Pedro Butcher, Todo o cinema brasileiro poderia ser considerado “independente” diante do poderio do cinema americano. Mas também é fato que a Globo concentra a hegemonia audiovisual do país (não por acaso, é chamada a “Hollywood brasileira”) e sua participação no cinema gerou uma diferenciação interna muito grande. Criou-se, em termos de resultado, um fosso entre os “filmes com Globo” e os “sem Globo”. Não seria absurdo, portanto, denominar-se o fluxo de filmes feito longe das asas da Globo, buscando alternativas ao seu modelo em termos de estrutura de produção e de linguagem, de um “cinema independente brasileiro” (BUTCHER, 2005, p. 80 apud SUPPIA, MELO, 2019, p.58).

Em conversa com o autor D.K. Holm, a diretora norte-americana Jill Sprecher, descreve um filme independente como: Se um filme quebra algumas regras, ou foca em assuntos que possam não parecerem óbvios, ou apresenta personagens que foram marginalizados – qualquer coisa que vá contra o que é considerado mainstream – essa é a marca da independência (HOLM, 2007, n.p, tradução nossa).

Portanto, levando essa definição em consideração, dentro do contexto desse trabalho, a categoria filme independente será delimitada como obras que seguem uma abordagem narrativa e estética oposta a comercial (que tem como prioridade a aquisição de lucros) no contra fluxo do que se é considerado mainstream na indústria cinematográfica, cujos realizadores exprimem “a sua visão artística sem a imposição de quaisquer limitações criativas ao seu trabalho” (TRYON, 2013, p.159 apud BATISTA, 2016, p.3). São produções de nicho, que não apresentam grande prospecto de retorno comercial, que segundo a pesquisadora Maria Rita Galvão, inclui características como: [...] temática brasileira, visão crítica da sociedade, aproximação da realidade cotidiana do homem brasileiro. Misturam-se aos problemas de produção questões de arte e cultura, de técnica e linguagem, de criação autoral, e a “brasilidade”47 (GALVÃO, 1980, p. 14 apud GERBASE; RUY, 2015, p.5).

2.3. Cinema independente no Brasil ao longo da história

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Entende-se como brasilidade, aquilo que é peculiar ao brasileiro; caráter daquilo que é brasileiro; sentimento de amor pelo Brasil.


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2.3.1. Cinema industrial e Rio, 40 Graus O cinema nacional passou por um período de industrialização, que envolveu uma parte dos anos 1940 e toda a década de 1950. Durante essa fase, empresários nacionais como Moacir Fenelon, Franco Zampari, Mário Audrá Júnior, entre outros, tomaram como exemplo a maneira que o setor cinematográfico norte-americano operava e decidiram aplicar uma estrutura semelhante no Brasil. As maiores produções da época (referente a escala de sua distribuição, orçamento e faturamento em bilheteria) eram oriundas de estúdios, sendo os mais conhecidos a Companhia Cinematográfica Vera Cruz48, Cinédia49 e Atlântida. Nesse contexto, os filmes independentes tinham origem fora desse esquema, se posicionando contra esse sistema vigente de se fazer cinema e tratando de temas mais pertinentes a realidade social do brasileiro, em contraste com as paródias e melodramas de popularidade na época. O filme Rio, 40 Graus (1955), de Nelson Pereira dos Santos, se tornou um dos principais exemplos desse tipo de produção durante o período, chegando até a ser chamado de o “primeiro filme independente do ponto de vista da produção", pelo autor Alexandre Figueirôa (2004, p.21 apud OLIVEIRA, 2016, p.25). Tido também como o percursor do movimento Cinema Novo, Rio, 40 Graus, teve sua estética fortemente influenciada pelo Neorrealismo italiano50, o que pode

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Também conhecida como Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Foi um estúdio de cinema brasileiro fundado pelo engenheiro italiano Franco Zampari e o industrial Francisco Matarazzo Sobrinho, que pretendiam criar uma espécie de Hollywood em terras brasileiras, oferecendo filmes nacionais de "qualidade". O terreno de 100 mil metros quadrados ocupado pela Vera Cruz se localizava em São Bernardo do Campo, onde entre os anos 1949 e 1954, foram produzidos 22 longas-metragens, como O Cangaceiro (Lima Barreto, 1953), que foi bem recebido pela crítica da época, conquistou o prêmio de Melhor Filme de Aventura no Festival de Cannes e arrecadou mais de R$1 milhão na bilheteria nacional, mas mesmo assim, o estúdio entrou em falência em 1954, pois a maior parte do lucro de seus filmes era direcionado para as distribuidoras norte-americanas com as quais a Vera Cruz trabalhava, como a Columbia Pictures. A pouca parcela obtida pelo estúdio não era o bastante para sustentá-lo (JORGE, 2004). 49

A Cinédia é uma companhia cinematográfica idealizada pelo jornalista Adhemar Gonzaga em 1930, com sede no Rio de Janeiro. Ao longo dos anos lançou mais de 50 longas-metragens e centenas de cinejornais no cinema. No Brasil foi pioneira no uso de maquetes, gruas, estúdios de gravação, captação de som, playback, e outras técnicas cinematográficas. Seus filmes lançaram diversos artistas como Grande Otelo, Carmen Miranda, Procópio Ferreira, Anselmo Duarte, entre outros. Seus estúdios serviram para a filmagem de várias temporadas da novela Malhação da TV Globo nos anos 1990 e no século XXI, a Cinédia auxilia na criação de projetos culturais e restaurações de filmes (AGÊNCIA CARTA MAIOR, 2004). 50

Movimento do cinema que surgiu na Itália, nos anos 1940, cujos filmes davam ênfase a personagens da classe operária e aos problemas financeiros e sociais que esses indivíduos


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ser evidenciado pelo seu enredo situado em ambientes pouco favoráveis (ITAU CULTURAL, 2016) e focado em personagens da classe baixa carioca, interpretados por atores não profissionais. Essa retratação da realidade árdua, sem fantasias e retoques, era incomum no cinema nacional até então, e chegou a ser vista como maculadora por alguns membros da sociedade. Rio, 40 Graus acabou censurado no seu mesmo ano de estreia, pelo Coronel Geraldo Menezes Corte, membro da polícia do Rio. O semanário Cine Reporter, publicou a declaração que Menezes deu a imprensa sobre sua ação controversa: Quando vetei a exibição estava pienamente convencido de que seria nociva a difusão do filme. E continuo firmemente certo disso, o de que acertei. Seria fácil, cortejando o público, recuar. Mas não estaria agindo honestamente. O filme é uma deturpação deliberada da realidade social. Enquanto fôr Chefe de Polícia a exibição não será permitida, porque contraria os interesses sociais (CINE REPORTER, 1955).

Como o próprio título indica, o filme se passa no Rio de Janeiro, em um quente dia de domingo. O enredo em si não é focado em um personagem específico, mas sim em uma variedade de indivíduos que possuem tramas separadas, porém interligadas dentro da história. Um grupo de meninos da favela, composto por Jorge, Sujinho, Zeca, Paulinho e Xerife, ganham a vida vendendo amendoins em baldes pelas ruas, orlas e pontos turísticos do Rio de Janeiro. Essa constante movimentação dos personagens pela cidade nos introduz a diversos outros núcleos na trama, como um jovem casal com incertezas no relacionamento, um rico coronel recém chegado em terras cariocas, e um jogador de futebol que possui o futuro de sua carreira decidido em uma partida no Maracanã. Além dos personagens supracitados, também temos o malandro Miro, que se aproveita de um dos meninos vendedores e toma posse de seus amendoins os quais vende na entrada do estádio. O filme, em geral, retrata o Rio de Janeiro como um lugar pouco amigável para os meninos da favela, que se arriscando trabalhando nas ruas, são expostos a uma variedade de situações problemáticas ou de extremo perigo, como é o caso de Jorge, cuja mãe doente e de cama, o motiva a vender amendoins para pagar os seus remédios, porém após ter seu balde derrubado no mar durante uma tentativa de vender na praia, ele recorre a mendicância, mas ao tentar escapar de um grupo de crianças que queriam roubar sua esmola, ele é acidentalmente atropelado por

enfrentavam após a Segunda Guerra Mundial na Itália (KREUTZ, 2018).


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um carro, e morre na rua. Sobre o lugar de Rio, 40 Graus no cinema independente brasileiro, a autora Maria Rita Galvão consolida sua importância: Falar em cinema independente é falar em “Rio, Quarenta Graus”. Porque foi o primeiro filme daquela fase que teve na sua origem mais um componente fundamental para a definição do que seja a independência na produção cinematográfica: o fato de se achar que vale a pena correr o risco de concretizar uma idéia (sic) sem que a coisa esteja de algum modo assegurada, sem que haja anteparos comerciais, industriais e financeiros garantindo o filme. (GALVÃO, 1981, p. 213 apud SUPPIA; MELO, 2019, p.51).

Tendo como base o pensamento de Galvão e o que foi demostrado até aqui, Rio 40 Graus se destacou como um filme que assumiu um risco, além de ter sido realizado fora dos estúdios de cinema, buscou apresentar uma história distinta das apresentadas nas produções mais populares de seu período, mesmo sem a garantia de um retorno comercial. 2.3.2. Cinema Novo Dando continuidade à temática que se foi anteriormente explorada por Nelson Pereira dos Santos com Rio, 40 Graus, um movimento cinematográfico brasileiro tomou forma a partir do final dos anos 1950 e iria perdurar até meados da década de 1970. Essa fase do cinema brasileiro é conhecida como Cinema Novo 51, um período protagonizado por cineastas que buscavam seguir em uma direção alternativa dos filmes populares que estreavam nas salas pelo Brasil, indo contra o modelo industrial de produzir filmes no país. Os filmes do Cinema Novo deram ênfase ao intelectualismo e eram mais sintonizados as mazelas sociais que atingiam a sociedade brasileira da época (ROSEBUD, 2020), além de possuírem um caráter mais politizado que os outros filmes, portanto, rompendo não apenas com o cinema industrial do período, como também com a sociedade brasileira como um todo, visto que durante os anos 1960, com o conservadorismo político vigente, os valores e temas apresentados por essa nova geração de cineastas por meio de seus filmes, viriam a entrar em choque com os valores da época, um exemplo disso, foi o caso

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Paralelamente, do outro lado do Atlântico, em Portugal nos anos 1960, surgia um movimento cinematográfico vanguardista de nome semelhante, que buscava romper com a ideologia do então governo do Estado Novo, o Novo Cinema. Semelhante ao movimento que estava ocorrendo no Brasil no mesmo período, também havia forte influência do Neorrealismo italiano.


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do filme Terra em Transe (Glauber Rocha, 1967), cuja trama aborda as tribulações políticas de um país latino-americano fictício sob o regime de um governante conservador, chegou a ser censurado por autoridades do governo brasileiro no ano de seu lançamento, sendo considerado “altamente subversivo” (MAGNOLO; BARBOSA; MUSSE, 2020, p.105). Contextualizando historicamente o surgimento do Cinema Novo, durante a década de 1950, o cinema nacional era dominado pelas produções estrangeiras e chanchadas. Em 1952. durante o I Congresso Nacional de Cinema Brasileiro, e o I Congresso Paulista, os cineastas insatisfeitos com esses filmes populares, discutiam maneiras de trazer mudanças ao cenário cinematográfico brasileiro. Por meio dessas discussões, teve origem o movimento que viria ser denominado Cinema Novo, em que havia uma maior preocupação em produzir filmes ricos em conteúdo e baixos em custos financeiros. Adotando o lema, "uma câmera na mão e uma ideia na cabeça", criado pelo diretor Glauber Rocha, que aponta “a necessidade de se criar arte, independente das condições adversas para produzir cinema no Brasil” (SIRINO; PINHEIRO, 2014, p.83) mesmo fora do modelo industrial, seguido pelos estúdios cinematográficos brasileiros e hollywoodianos, esses cineastas com poucos recursos à disposição, buscavam criar histórias que se aproximassem da realidade social dos brasileiros menos favorecidos. Os filmes do Cinema Novo eram por vezes, violentos, protagonizados por personagens comuns, trabalhadores modestos e indivíduos vivendo na miséria, todos membros das classes mais baixas da sociedade que não possuíam visibilidade dentro do mundo da ficção e do cinema em geral. Em sua tese-manifesto titulada “Estétyka da Fome”, Glauber Rocha consolida um aspecto marcante da geração Cinema Novo, um pensamento que traça associações entre o status de colônia do Brasil, a maneira que o setor cinematográfico nacional e latino americano como um todo é visto pelos olhos europeus e a libertação que os realizadores do Cinema Novo buscavam trazer ao país, culturalmente. Rocha define a "fome" como um ponto em comum entre o povo latino-americano, simultaneamente, concedendo ao termo uma ampla definição que abrange todos os aspectos, sejam eles culturais, religiosos, econômicos ou sociais, de uma nação subdesenvolvida. Ainda segundo a ideia de Rocha, a violência é enxergada como uma poderosa manifestação da fome, e mantendo em mente a natureza realista e


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bruta que o Cinema Novo tecia em suas histórias, Rocha pretendia exibir essa realidade do brasileiro aos cinéfilos do chamado Primeiro Mundo, como europeus, por exemplo, com o intuito de romper com a maneira que esses povos enxergavam o Brasil, como um local exótico. Algumas produções do Cinema Novo conquistaram certo prestigio fora do Brasil, como Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964) que ganhou prêmios no Festival de Berlim e no Festival de Acapulco e Como Era Gostoso o Meu Francês (Nelson Pereira dos Santos, 1971) que chegou a ser indicado ao Urso de Ouro, também no Festival de Berlim. Entretanto, os filmes do Cinema Novo, em geral, tinham dificuldade em alcançarem e conquistarem o grande público brasileiro, pois, além da censura, essas produções apresentavam histórias que pretendiam desafiar e questionar seu espectador, exigindo reflexões acerca de seus temas, algo que poderia dificultar sua compreensão entre muitos brasileiros, inclusive as classes mais baixas da sociedade que eram justamente retratadas pelos filmes do Cinema Novo. O longa Cinco Vezes Favela (Cacá Diegues, Marcos Faria, Miguel Borges, Joaquim Pedro de Andrade e Leon Hirszman, 1961), que apresenta uma trama episódica focada no dia-a-dia de habitantes da favela e as dificuldades que vivenciam, é mais um filme tido como percursor do Cinema Novo e um exemplo da primeira fase do movimento, que abrange o período anterior a implementação do regime militar, entre 1960 e 1964, e fazendo jus a estética da fome, as produções mais notáveis dessa fase lidam com temas envolvendo miséria financeira, escassez de alimentos e outros sofrimentos da vida no sertão nordestino, assuntos que viriam a ser abordados em Deus e o Diabo na Terra do Sol (Glauber Rocha, 1964), Vidas Secas (Nelson Pereira dos Santos, 1963) e Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964) (KREUTZ, 2018). A segunda fase do movimento teve origem a partir da retirada de João Goulart da presidência, o golpe de estado que iniciou a ditadura militar. Nesse cenário, a opressão executada pelo governo influenciou no rumo em que os cinemanovistas52 levariam suas produções. Abandonando a estética da fome, no movimento surgiu uma maior preocupação com o lucro financeiro de suas produções, e o medo de

52

Termo usado para se referir aos cineastas do Cinema Novo.


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represálias por conta de quaisquer ideologias contrárias às do governo, desincentivaram os cineastas a seguir com histórias explicitamente desafiadoras e controversas. Durante esse período, alguns cineastas do movimento, e de demais círculos artísticos, se exilaram para fora do Brasil, como Glauber Rocha. A terceira fase, entre 1968 e 1972, se caracterizou pelas influências do Tropicalismo53, com elementos remetentes a natureza brasileira, aos animais e frutas originários ou característicos do país. Nesses anos menos produções foram realizadas, e alguns cineastas criticaram a maneira que o movimento se distanciou de seus ideais iniciais. Um filme representativo dessa fase é Macunaíma (Joaquim Pedro de Andrade, 1969). Com o endurecimento da repressão cultural, o Cinema Novo terminou. Entretanto, o seu legado continuou no movimento de cinema independente conhecido como Terceiro Cinema, que já existia durante o fim do Cinema Novo e foi formado por cineastas latino-americanos, africanos e asiáticos (de países subdesenvolvidos). Os filmes do Terceiro Cinema carregavam mensagens antihollywoodianas, anticapitalistas e políticas, com o intuito de conscientizar socialmente seus espectadores (KREUTZ, 2018). 2.3.3. Cinema Marginal Com o Cinema Novo se aproximando de seu fim, a repressão no setor cinematográfico se expandia e a liberdade artística permanecia severamente ameaçada. Alguns cineastas, para sobreviver no seu terreno profissional, decidiram fazer filmes menos cerebrais e que apresentassem um maior apelo popular, longe dos ideais ditos revolucionários do início do Cinema Novo. Entretanto, não eram todos os cineastas que seguiram essa direção. Alguns como Rogério Sganzerla, Andrea Tonacci e João Batista de Andrade resistiram e mesmo num ambiente propenso a censuras e a outros perigos, continuavam defendendo e realizando obras de teor subversivo e vanguardista, fundamentadas no radicalismo e na contracultura.

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Movimento cultural vanguardista brasileiro sessentista com estéticas radicais remetentes as artes psicodélicas. Influenciado pela cultura popular nacional e estrangeira, tinha o intuito de se distanciar do intelectualismo. Foi marcante no mundo da música brasileira, tendo como alguns representantes os cantores Caetano Veloso e Gilberto Gil (TODA MATÉRIA, 2018).


51

O Cinema Marginal se formou a partir desse momento, iniciando no fim dos anos 1960 e terminando no começo dos anos 1970. Os filmes desse movimento apresentam histórias com temas surrealistas, pornográficos, cômicos, violentos, e sobre quaisquer outros assuntos considerados imorais/inapropriados pela sociedade, contestando o intelectualismo do Cinema Novo. Os orçamentos eram baixíssimos, o que contribuía para uma qualidade técnica de produção modesta. Se tratava de produções de estética trash, uma espécie de filmes B54 do cinema nacional, com tom debochado e despretensioso. O cineasta Glauber Rocha chegou a denominar o movimento de “Udigrúdi”, um abrasileiramento da palavra da língua inglesa “undergroud”, em referência aos ideais vanguardistas dos filmes marginais. Entre os realizadores e obras do Cinema Marginal, temos Rogério Sganzerla (O Bandido da Luz Vermelha, 1969), Andrea Tonacci (Bang Bang, 1971), Carlos Reichembach (As Libertinas, 1968), Ozualdo Candeias (A Margem, 1967), Júlio Bressane (Matou a Família e foi ao Cinema, 1968), e muitos outros. Em relação a nomenclatura “marginal”, para se referir aos filmes produzidos durante esse período pelos diretores supracitados, o crítico, e roteirista, Jean-Claude Bernardet aponta: Já na época Bressane e Sganzerla discordavam da expressão cinema marginal, uma vez que eles não faziam um cinema que queria ficar à margem dos circuitos exibidores [...], mas um cinema que, com raras exceções ("O Bandido da Luz Vermelha"), foi marginalizado pelos circuitos -e pela censura (BERNARDET, 2001).

Incorporando a política do autor, um pensamento representativo da Nouvelle Vague55, no Cinema Marginal, a visão artística dos diretores era a mais influente de toda a obra, tornando-a caracteristicamente deles. Devido a repressão por parte do governo, o Cinema Marginal acabava tendo sua exibição restringida a festivais fora do Brasil ou outros círculos alternativos longe das salas comerciais, o que os

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Um filme B é um termo que se refere a filmes baratos com elenco amador ou em final de carreira. Tradicionalmente um filme B pertence aos gêneros de ficção científica, faroeste, terror ou crime, e, embora isso seja fruto de debate, apresentam qualidade técnica/artística duvidosa. 55

Nouvelle Vague ("nova onda", em português) foi um movimento do cinema francês que ocorreu entre os anos 1950 e 1960, cujo nome foi criado por críticos na revista de cinema francesa Cahiers du Cinéma. Os cineastas do Nouvelle Vague, tinham em torno de 20 e 30 anos de idade, eram cinéfilos, e buscavam renovar o cinema francês da época, criando filmes que rompiam com os padrões narrativos estabelecidos pela indústria hollywoodiana, que seguiam uma narrativa linear e cortes de edição "invisíveis", que não fossem abruptos e, sim, imperceptíveis ao espectador. Os filmes desse movimento tinham certos traços em comum, como diálogos improvisados, baixos orçamentos, falta de continuidade, abordagem de temas existenciais, personagens que se dirigiam diretamente ao espectador e jump cuts (cortes abruptos na edição) (KREUTZ, 2018).


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tornava produções de difícil acesso por parte do grande público. Embora muito próximos um do outro, até mesmo dividindo os mesmos cineastas, os movimentos Cinema Novo e o Marginal tinham suas distinções entre si, visto que, enquanto ambos possuíam preocupações de cunho social, político, e cultural, o Cinema Marginal demostrava um caráter mais satírico, erótico, apresentando enredos inspirados em filmes policiais e de terror norte-americanos. Enquanto os últimos cinemanovistas encontravam incentivos na Embrafilme, os filmes marginais procuravam recursos na região paulistana conhecida como Boca de Lixo. Isso porque ainda nos anos 1960, alguns cineastas do Cinema Novo buscaram fazer filmes mais comerciais, industriais, e nisso encontraram apoio financeiro da Embrafilme, diferente do Cinema Marginal, que seguia com os ideais subversivos e críticas sociais representativos do início do Cinema Novo, se opondo aos tipos de filmes da estatal, aprovados pela censura. A Boca de Lixo foi um polo cinematográfico de destaque no período do Cinema Marginal, situava-se em São Paulo no bairro da Luz, próxima da estação ferroviária do mesmo nome. O centro atraiu diversos cineastas do cinema independente em busca de meios para financiar seus projetos, visto que, na região encontravam-se diversas distribuidoras e produtores do setor, uma concentração que teria tido origem entre as décadas de 1920 e 1930. Os filmes eram realizados sem muita demora e com investimentos baixos (SILVEIRA; CARVALHO, 2015). Além dos já mencionados, outro diretor conhecido do Cinema Marginal, foi José Mojica Marins, mais popularmente conhecido pela sua alcunha Zé do Caixão, o nome de um personagem vampiresco e de má índole que criou e interpretou em muitos de seus filmes. Suas produções muitas vezes pertenciam ao gênero de terror, no qual José se tornou percursor no Brasil, além disso, devido a incorporar alguns elementos religiosos em seus filmes, o diretor teve seu trabalho muitas vezes alvo de censura. Entre suas obras temos, À Meia-Noite Levarei Sua Alma (1964), Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967) e O Despertar da Besta (1969). Sobre o trabalho de José no cinema, o crítico e cineasta, Jairo Ferreira, comenta: Cada fotograma filmado por José Mojica Marins respira cinema e somente cinema. Tudo é inseguro, pode explodir a qualquer instante, a exasperação domina. Ele ameaça as relações normais entre os atores, entre a câmera e o décor, o diálogo e a realidade. Mojica nunca elege: o melhor ator, o melhor enquadramento, melhor diálogo, o melhor momento de filmagem


53

[...] (FERREIRA, 1986, p.97-98 apud PACOLA; BISCAIA FILHO, 2014, p.38).

Similarmente ao Cinema Novo, em 1973, o Cinema Marginal também teve seu fim relacionado a censura e perseguição política da época, o que levou alguns membros do movimento ou a serem presos ou a saírem do país. 2.3.4. Novíssimo Cinema Brasileiro Um momento no país que merece destaque é o Novíssimo Cinema Brasileiro, surgido no começo da década de 2010. Se trata de um grupo formado por cineastas relativamente jovens, por volta dos 30 e 40 anos, geralmente com poucos recursos financeiros à disposição, que nasceram ou foram criados no centro-oeste ou nordeste do Brasil, cinéfilos e que tenham completado, ou no mínimo frequentado, uma universidade. O diretor de fotografia Ivo Lopes Araújo56 estudou cinema no Rio de Janeiro; a montadora Clarissa Campolina57 é pósgraduada em Artes Plásticas em Belo Horizonte e o cineasta Marcelo Lordello58 tem em seu currículo, uma graduação em Comunicação Social/Publicidade pela Universidade Federal de Pernambuco. Seus trabalhos são muitas vezes exibidos em festivais, como a Mostra de Cinema Tiradentes, que serve como principal vitrine para esses filmes e sobre a qual o autor e crítico Raul Lemos Arthuso, comenta a significância para esses cineastas: A Mostra Tiradentes é, nesse sentido, como o espaço físico referencial desse território simbólico e não por acaso a nova geração vira e mexe é associada com ao festival como o cinema de Tiradentes. Essa delimitação faz algum sentido na prática, pois um bom número dos novos cineastas da década passou pelo festival, como os coletivos Alumbramento e Teia ou cineastas mais jovens como Gabriel Mascaro, Marcelo Pedroso, Gustavo Pizzi, Felipe Bragança, Tiago Mata Machado, André Novais de Oliveira (ARTHUSO, 2016, p. 13).

Assim como praticamente toda geração de cineastas, como Mumblecore59,

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Nascido em Fortaleza e diretor do documentário Sábado à Noite (2007).

Membra do coletivo Teia, um “centro de produção audiovisual” (OLIVEIRA, 2017, p.84) formado em Belo Horizonte. Tem em seu currículo as obras Notas Flanantes (Clarissa Campolina, 2009) e Samba Canção (Rafael Conde, 2002). 57

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Nascido em Brasília e diretor do filme Eles Voltam (2012).

59Movimento

do cinema independente estadunidense, surgido em 2002. Traços representativos do Mumblecore são orçamentos baixíssimos (às vezes, financiados pelos familiares dos cineastas), improvisos no roteiro, elenco composto por atores não profissionais, e temas despretensiosos, com histórias focadas em amizades ou relacionamentos amorosos entre jovens na faixa dos vinte anos (CURADORIA DE AUDIOVISUAL DO CCSP, 2011).


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Nouvelle Vague, entre outras, seus participantes costumam colaborar uns com os outros, em um intercâmbio de profissionais entre uma produção e outra, por compatibilidade nos ideais artísticos e/ou razões afetivas. Essa afinidade com o outro, se trata de um fator significante na atuação profissional desses realizadores, como mais um exemplo de rejeição ao modelo profissional de se trabalhar, em que há distinções entre a vida privada e profissional do indivíduo. Embora alguns considerem isso como uma característica do amadorismo, entre os realizadores do Novíssimo Cinema, isso se trata de um aspecto que é abraçado com orgulho, como o cineasta Guto Parente fala sobre: [...] Os filmes que vemos aqui são um cinema artesanal, não estão tão comprometidos com ‘resultados’. E isso não é um estágio para virar indústria [...] aliás, para mim, essa é a desgraça do artesanato, quando ele começa a se inspirar num modelo industrial. Ao contrário, isso é uma opção mesmo. [...] Eu não quero a lógica de profissionalismo do cinema industrial. [...] Eu prefiro a lógica do amadorismo, porque se trata realmente de fazer algo que eu amo. (Guto Parente, do Alumbramento, in Mostra de Cinema de Tiradentes, 2013ª apud OLIVEIRA, 2017, p.97-98, grifo da autora).

Mais um aspecto dessa geração é que, ao contrário das anteriores, dos tempos do Cinema Novo e Boca de Lixo, devido aos progressos tecnológicos ao longo dos anos, ela possui acesso mais fácil e democratizado a equipamentos de gravação e quaisquer outras tecnologias que os auxiliem no desenvolvimento e divulgação dos seus projetos, como redes sociais e sites que possibilitam a arrecadação de dinheiro online, ação conhecida como crowdfunding. Esse contato com a tecnologia e outros meios de comunicação, proporciona a esses cineastas, além do que já foi mencionado, a vantagem de poder realizar suas obras sem a necessidade de migrarem para grandes centros econômicos e socioculturais, como as capitais (frequentemente restringidas ao eixo São Paulo Rio de Janeiro) e metrópoles, uma verdadeira "descentralização do espaço" (OLIVEIRA, 2017, p.45), além de possibilitar a realização de suas obras mesmo com um baixo orçamento. Maria Carolina Vasconcelos Oliveira, em seu livro titulado “’Novíssimo’

cinema

brasileiro:

práticas,

representações

e

circuitos

de

independência”, comenta sobre esse fenômeno da desconcentração regional do fazer cinema independente no Brasil: O que vem se chamando de “novíssimo” cinema não é um movimento situado num determinado contexto espacial, mas uma produção pulverizada em algumas cidades brasileira [...] e isso aponta também para o início de um processo de desconcentração da atividade das cidades de São Paulo e Rio de Janeiro (OLIVEIRA, 2017, p.46).


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Os realizadores do Novíssimo Cinema Brasileiro rejeitam os modelos industriais60, pois buscam produzir filmes de uma maneira mais colaborativa e menos hierarquizada, como ocorre nos sets de filmagem de muitas produtoras profissionais, em que o diretor/produtor comanda toda uma equipe, cujos membros possuem funções mais divididas (IKEDA, 2012). Com a criação da Ancine no começo dos anos 2000, pode-se reconhecer como preocupação do governo a industrialização do setor, como coloca Oliveira: [...] a agência teria como objetivo primeiro estimular e regular o cinema no Brasil a fim de desenvolver e consolidar uma indústria e um mercado de cinema brasileiro. O filme seria assim um produto que deveria ser inserido nos preceitos industriais (BAHIA, 2012, p. 83 apud OLIVEIRA, 2017, p.42).

A origem do termo “Novíssimo Cinema” pode ser encontrada nas observações dos curadores Eduardo Valente e Lis Kogan, que decidiram criar uma sessão mensal no Rio de Janeiro que exibia e discutia produções cinematográficas que possuíam pouco prospecto de penetração no mercado comercial. Esse evento foi chamado de Cinema Novíssimo. Com a adoção do termo por críticos de cinema, sua popularização foi concretizada (OLIVEIRA, 2017). Oliveira (2017) argumenta que as produções dessa geração possuem como um laço mais forte entre si as dimensões sociais envolvendo seus realizadores (ou seja, sua faixa etária, terem frequentado uma instituição de ensino superior, viverem fora de São Paulo e Rio de Janeiro, etc.) do que quaisquer tendências artísticas ou estéticas. A geração do Novíssimo Cinema, se posiciona oposta a visão comercial que o setor cinematográfico tem no Brasil, principalmente as produções da Globo Filmes. Algumas produtoras partes desse momento do cinema independente são a mineira Teia, a cearense Alumbramento, e a pernambucana Trincheira (pode se observar pelo local de origem e atuação dessas produtoras a presença dessa nova geração além dos polos São Paulo e Rio). Algumas produções do Novíssimo

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Por industrial, nos referimos ao modo de fazer cinema que é aplicado no Brasil com o início da chamada Retomada, período que começou por volta de 1995 com o retorno de mecanismos por parte do poder público com o propósito de fornecer fomento à indústria cinematográfica nacional fortemente fragilizada após a extinção da Embrafilme e cortes de incentivos ao setor durante o governo Collor. Na Retomada, o número de produções no nosso cinema aumenta e o mercado reaquece. O período teve seu fim por volta de 2003. Temos como marco do final do período o lançamento do filme Cidade de Deus (Fernando Meirelles, Kátia Lund, 2002).


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Cinema são Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar (Marcelo Gomes, 2019), O Lobo Atrás da Porta (Fernando Coimbra, 2013), Era o Hotel Cambridge (Eliane Caffé, 2017), A Vizinhança do Tigre (Affonso Uchoa, 2016), entre outros. 2.4. Política do autor no cinema independente A política do autor é um conceito relacionado ao estilo de direção de alguns cineastas do cinema independente como um todo, seja ele brasileiro ou estrangeiro, e que valoriza o estilo próprio de cada realizador. Influenciou a carreira de Glauber Rocha e demais cineastas independentes brasileiros do Cinema Novo e de gerações atuais, portanto, é algo essencial na compreensão do que o cinema independente é, no sentido de como esses realizadores se posicionam como artistas, cada um com sua própria identidade, e usam seus filmes para auto expressão. A política do autor (ou la politique des auteurs, em francês) se trata de uma expressão empregada para se referir a filmes sob o qual o diretor possui vasto controle criativo, tornando a produção uma espécie de reflexão de sua personalidade como artista, a atribuindo elementos estilísticos e temáticos característicos do próprio diretor (KUHN; WESTWELL, 2012). Uma das maiores conquistas de um autor no cinema seria transmitir sua visão criativa em tamanha maneira que capacite a identificação de determinada obra como sua. O pensamento se popularizou nos anos 1950, a partir das elaborações dos críticos e cineastas envolvidos com a Nouvelle Vague e escritores da estimada revista de cinema Cahiers du Cinema, na qual foi publicado o primeiro artigo sobre o conceito, autoria do diretor francês François Truffaut. Foi apenas nos trabalhos do crítico Andrew Sarris, em 1962, que o termo "teoria do autor" passou a ser usado. Ainda sobre o conceito, os professores Michael Peixoto e Tânia Siqueira Montoro, comentam: Na base da política dos autores está a defesa de um estilo próprio de cada cineasta, uma marca autoral. O estilo seria a personalidade reconhecível do diretor, independente do gênero abordado, mas que está evidente no tratamento do enredo, na abordagem e complexidade dos personagens, numa metáfora que persiste nas obras, num tema, uma intenção recorrente que utiliza da técnica para se mostrar, mas se sobrepõe a ela (MONTORO; PEIXOTO, 2009, n.p.).

Influenciados pelas ideias dos escritores e teóricos Alexandre Astruc e André Bazin, os cineastas franceses passaram a enxergar o cinema através de um prisma


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literário do que significa ser autor (KUHN; WESTWELL, 2012). Segundo a política do autor, não era todo filme que se classificava como obra autoral, portanto, havia uma distinção entre diretores que simplesmente conduziam uma produção e aqueles que produziam arte através do cinema. O termo metteur en scene, era atribuído aos cineastas que apenas recebiam o roteiro e traduziam o escrito para o audiovisual, posicionando os atores e os enquadramentos, sem exercer sua visão criativa sob a obra, não apresentando métodos criativos inovadores e agindo como um "mero diretor/reprodutor" (MONTORO; PEIXOTO, 2009). Nesse sentido, os metteurs en scene podiam ser vistos como profissionais em direta oposição ao autor. Dentro da política do autor, se desvalorizava o diretor que se colocava como "anônimo” em seus filmes, sem demostrar um traço característico em suas obras, o que se trata de uma forma de fazer cinema relacionada ao método produtivo industrializado empregado pelos grandes estúdios norte-americanos, em tentativa de criar filmes mais formulares que possam ser assistidos e facilmente compreendidos pelo maior número de espectadores, sem correr o risco de alienação que uma produção mais autoral possa causar. Por ser tratar de uma perspectiva que valoriza a arte no cinema acima de seu potencial lucrativo, o conceito de um diretor como autor é mais identificado em filmes independentes, do que nos produzidos seguindo os parâmetros tradicionais da indústria de como se conduzir uma história. Entretanto, existem exceções, visto que há quem considere diretores conhecidos por suas obras de caráter mais comercial, como George Lucas, Zack Snyder e Michael Bay como autores, por terem desenvolvido um estilo cinematográfico visual próprio ou tratarem de temáticas semelhantes em seus filmes, o que talvez signifique que seja possível um cineasta demostrar sua autoria através de sua obra mesmo em um âmbito que valoriza a padronização. O autor Matheus Batista Massias (2015) comenta sobre os diversos cineastas que são relacionados com a ideia de autoria no cinema, O cinema de autor internacional pode ser facilmente debatido com grandes nomes, como D. W. Griffith (considerado o primeiro grande diretor, no que concerne o valor semântico que atribuímos à palavra hoje em dia), Eric von Stroheim, F. W. Murnau, Carl Theodor Dreyer, Charlie Chaplin, Jean Cocteau, Fritz Lang, John Ford, Josef von Sternberg, Jean Renoir, Howard Hawks, Sergei Eisenstein, Kenji Mizoguchi, Alfred Hitchcock, Luis Buñuel, Robert Bresson, Max Öphuls, Yasujiro Ozu, Jean Vigo, Luchino Visconti, Roberto Rossellini, Akira Kurosawa, Nicholas Ray, Samuel Fuller, Orson


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Welles, Ingmar Bergman, Federico Fellini, Stanley Kubrick. A lista é imensa e pode ser bem diferente de acordo com o gosto e demanda do crítico [...] (MASSIAS, 2015, p.2).

No Brasil, o conceito foi formulado pelos cineastas do Cinema Novo, mais especificamente Glauber Rocha. Como Massias (2015) discorre, anterior aos anos 1950, no Brasil são pouquíssimos os filmes que possam serem classificados como obras autorais. Notavelmente, entre as exceções, temos o filme mudo Limite (Mário Peixoto, 1931). Os próprios cineastas do cinema pernambucano dão continuidade aos filmes independentes autorais no Brasil, trazendo variedade ao cenário cinematográfico nacional contemporâneo e lidando com temas próximos de suas realidades sociais e pessoais. Um outro exemplo da recuperação do conceito de autor de cinema no cenário contemporâneo está na defesa de um grupo de cineastas nordestinos que se autointitulam “autores” de cinema. O grupo formado por Lírio Ferreira; Karim Aïnouz; Cláudio Assis; Marcelo Gomes e Sérgio Machado define seus trabalhos como coletivos no fazer, mas singulares no pensar, caracterizando assim uma perspectiva autoral. A proposta deste grupo também serve para ilustrar a possibilidade de diálogo amistoso entre realismo e autoria [...] pois é facilmente verificável, nos filmes destes cineastas, a preocupação em retratar temáticas sociais próprias do país (MONTORO; PEIXOTO, 2009, n.p.)

A respeito do estilo de cada realizador, o diretor pernambucano Kleber Mendonça Filho, que a escritora Maria Carolina Vasconcelos Oliveira descreve como uma referência no cinema “de cunho mais autoral” (2016, p.154) tem como traço característico trabalhar em seus filmes temas sociais relacionados as classes econômicas brasileiras, principalmente a classe média. Essas questões podem ser observadas no curta-metragem Recife Frio (2009), por exemplo, cuja trama aborda a cidade de Recife após uma misteriosa mudança climática, que torna a região fria e constantemente nublada. Durante uma cena, um membro de uma família de classe média força sua empregada a trocar de quarto com ele, já que o dela é mais quente, por ser menor e não ter uma grande janela, o oposto do seu (ENCICLOPÉDIA ITAU CULTURAL, 2020). O diretor também usa dos cenários retratados em seus filmes para estudar a relação do brasileiro com os seus arredores, como a grades das janelas e muros salientam as divisões sociais entre os personagens, perspectiva que pode ser observada em algumas obras do cineasta como Eletrodoméstica (2005) e O Som ao Redor (2012) e como símbolo de memória e relações interpessoais, caso de Aquarius (2016), em que a protagonista de classe média alta, a última moradora de um edifício antigo em


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Recife, tem sua residência ameaçada por uma construtora que pretende realizar outra construção no local, porém a personagem principal resiste a vender seu apartamento, onde viveu por muitos anos e formou muitas memórias (ENCICLOPÉDIA ITAÚ CULTURAL, 2020). O diretor Cláudio Assis, também de Pernambuco, e que é referido pela autora Daiane Stefane Lima Antunes (2018) como um autor no cinema, apresenta em seus filmes representações naturalistas e viscerais do mundo que os personagens habitam e deles próprios, focando suas histórias nas camadas mais marginalizadas da sociedade. Seus personagens costumam ter comportamento, por vezes, criminoso e depravado como é o caso de Baixio das Bestas (2006) e a cidade em que vivem, comumente Recife, é retratada de tal maneira que a sujeira física que a permeia seja destacada, como em Amarelo Manga (2002). Porém, há quem rejeite o conceito de autoria no cinema, pois enxerga o ato de fazer filmes como um processo colaborativo demais, principalmente em produções com menos recursos, o que é frequentemente o caso dos filmes independentes, em que embora cada papel seja definido existe um grande intercâmbio de funções dentro da equipe (o responsável pela câmera interfere no áudio, os atores alteram o roteiro e auxiliam na filmagem, os assistentes dirigem uma cena, etc.) e a centralidade do diretor como realizador singular e agente criativo de maior importância diminui, como é o caso de alguns cineastas do Novíssimo Cinema que se articulam de maneira menos hierarquizada e se referem a suas produtoras como “coletivos”, se opondo a noção do diretor como "chefe" durante a produção. Isso pode ser notado no comentário de Denilson Lopes, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ): Os coletivos, marcados por uma maior fluidez nas diversas competências e ou quebra de hierarquias, são um ponto interessante. Me parece que o que vem chamando mais atenção no debate não é a figura do indivíduo que concentra em si todas as possibilidades de realização – que ainda está associada a um modelo de cinema que é o de autor, em que o diretor (autor) dominará as etapas do processo, desde o roteiro até a edição, pelo menos. E é claro que esse modelo de cinema de autor se contrapõe ao modelo que seria o do cinema industrial, onde a gente poderia pensar na figura do produtor como algo central – é ele que muitas vezes escolhe e contrata o próprio diretor; e você têm pessoas contratadas especificamente para as etapas do processo. Então se você tem o cinema de autor e cinema de produtor, talvez essa questão do coletivo apareça aí como um dado intermediário (Denilson Lopes in Mostra de Cinema de Tiradentes, 2014a, apud OLIVEIRA, 2016, p.127).


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Com os significados do cinema independente brasileiro definidos, o próximo capítulo aborda o principal problema de pesquisa dessa monografia, a questão de como as plataformas de streaming podem favorecer esses tipos de filmes em sua distribuição.


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CAPÍTULO 3: STREAMING E O FILME INDEPENDENTE Serviços de streaming há décadas vem permitindo a transmissão instantânea de dados de vídeo e áudio por toda a Internet. Plataformas como Netflix e YouTube são um dos mais conhecidos exemplos do uso do streaming para transmitir vídeos online, e outra tentativas anteriores já ocorreram na Ásia. Além disso, essa tecnologia abriu uma nova janela para que o cinema brasileiro encontre um público, inclusive o cinema independente, sobre o qual já estudamos no Capítulo 2. 3.1. Sobre o streaming Tecnologia utilizada para transmissão contínua de mídia digital por todo o mundo, o streaming permite a exibição e distribuição instantânea de dados (áudios ou vídeos) diretamente no dispositivo do usuário (PCs, tablets, smartphones) quando conectado na internet, sem a necessidade da descarga de arquivos, prática conhecida como download (COUTINHO, 2014). A qualidade das transmissões é muito dependente da velocidade da internet utilizada. Devido a melhor capacidade de processamento dos computadores que os avanços tecnológicos trouxeram com o tempo, o primeiro uso da tecnologia foi na década de 1980, com um simples teste de áudio. Nos anos 1990 ocorreram mais usos da tecnologia, como o caso da empresa Progressive Networks que disponibilizou a transmissão de áudio por meio de streaming na internet através do software Real Audio, além da exibição de uma partida de beisebol e um concerto de rock, um feito até então inédito no mundo da informática, realizados pela RealNetworks61 (ZOEWEB, 2018). Atualmente, o streaming é usado por diversos canais/estações pela internet, televisão e rádio. 3.1.2. Video on demand (VoD) Por se tratar de uma tecnologia de amplo uso, existem diversas formas de streaming, como transmissões lives (que possibilitam o consumo de áudio e vídeo no momento em que ocorrem, ao vivo) e os serviços VoD (video on demand), que

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A RealNetworks é o nome que a Progressive Networks assumiu nos anos 1990, portanto, são a mesma empresa.


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tendo como base a apresentação “Panorama do VoD no Brasil Perspectivas do VoD no Brasil e no mundo” da Superintendente de Análise de Mercado da Ancine, Dra. Luana Maíra Rufino Alves da Silva (2018), contam com muitas variações, como o SVoD (subscription video on demand) em que uma plataforma disponibiliza um conteúdo para ser consumido por um determinado tempo, levando em consideração a demanda pelo mesmo e exigindo um valor mensal a ser pago para que o usuário tenha acesso a ele. Temos como serviços SVoD, Netflix, Hulu, Amazon Prime Vídeo, MUBI, etc. Outro tipo de VoD é o AVoD (advertisement video on demand), que pode ser definido como um modelo em que, por meio da veiculação de anúncios exibidos durante os vídeos ou na interface da plataforma, a empresa responsável consegue faturar o suficiente para sustentar a plataforma, portanto descartando a necessidade de uma assinatura paga do usuário. Temos como principal exemplo, o YouTube e Hulu. É importante salientar que para que um anunciante esteja disposto a pagar pela publicidade é necessário um grande tráfico de usuários na plataforma. No modelo TVoD (transactional video on demand), o consumidor não necessita pagar quantia alguma para criar uma conta ou acessar a plataforma, porém é exigido uma assinatura paga por cada conteúdo individual que deseja consumir, como um filme ou séries de televisão, semelhante ao pay-per-view. É um modelo utilizado pelo iTunes, Telecine Play e Google Play. No catch up TV, as emissoras de televisão disponibilizam seus conteúdos para os espectadores assistirem a qualquer momento posterior a sua exibição original na grade de programação, como exemplos temos a Globoplay e Fox Play. O Libreflix, uma das plataformas foco desse trabalho, pode ser definido como um FVoD (free video on demand), entretanto, existe a opção de contribuir financeiramente para o site. A Spcine Play, no entanto, segue o modelo TVoD. Todas as opções supracitadas se encaixam na definição de serviços OTT (over-the-top), um termo guarda-chuva usado para se referir a transmissões de vídeos pela internet que dispensam o uso da televisão por assinatura (FORT, 2018). 3.2. Video on Demand (VoD) no Brasil A proliferação do uso de serviços on demand teve início no Brasil no começo


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da década de 2010. Temos como os exemplos mais utilizados pelo brasileiro, o YouTube e Netflix. Segundo dados obtidos através do RBC Capital Markets e eMarketer e demostrados pela autora Diandra Carolina de Oliveira Vieira da Rocha (2017), o serviço de VoD mais acessado no Brasil no ano de 2017 era o YouTube com 84% dos internautas visitando o site, seguido pela Netflix e Globo, com 71% e 50% da parcela dos usuários, respectivamente. De toda a América Latina, o Brasil é o maior mercado para o VoD, tendo gerado, em receita, 1.51 bilhão de dólares, segundo o site Statista e ilustrado no gráfico a seguir: Gráfico IV – Receita do mercado VoD na América Latina, por país, em 2020.

Receita do mercado VoD na América Latina, por país, em 2020. 2%

Brasil

2%

Mexico

3% 4% 4% 8%

Colombia Argentina

43%

8%

Chile Peru Republica Dominicana

26%

Guatemala Equador

Fonte: Adaptado de Statista (2020).

Além disso, no segundo trimestre de 2018 foram registradas 7,1 milhões de contas pagas de serviços VoD OTT no nosso país, de acordo com dados do Dataxis (ABOTTS, 2018). Comparativamente, o número de assinantes de televisão por assinatura no Brasil continua maior que os de serviços VoD — segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em junho de 2020, havia 15,2 milhões de residências no país com acesso a canais fechados (SANTANA, 2020) — porém, entre os primeiros semestres de 2019 e 2020, a Tv a cabo perdeu cerca de 10,9% de seus clientes (BRANDÃO, 2020).


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Entre os muitos serviços de VoD no Brasil, temos Globoplay, Play TV, Netflix, MUBI, Spcine play, Canal Brasil Play, Fox Play, HBO Go, Now, Philos, Darkflix, Afroflix, Libreflix, Amazon Prime Video, Vivo Play, entre diversos outros exemplos. Levando em conta os números apresentados pelo Dataxis, é possível enxergar que esse tipo de streaming apresenta uma presença significativa no país e que diversas produtoras de cinema e canais de televisão vem usando dessa tecnologia para fazer com que seus filmes cheguem aos seus espectadores. Com o advento e subsequente popularidade da internacional Netflix no Brasil, um novo mercado para distribuição de filmes foi ampliado. As vantagens como catálogos variados, que oferecem produções além dos habituais blockbusters que possuem domínio nas principais salas de cinema e deixam pouco espaço para obras mais diversas; a capacidade de um realizador de encontrar seu público alvo ou descobrir outro nicho no mercado; maior liberdade da parte do usuário em selecionar quando e onde pretende consumir o conteúdo, além de poder pausa-lo, voltar e avançar quando quiser na história; mais outros serviços interativos e personalizados oferecidos na interface com o intuito de tornar a experiência do espectador o quão confortável possível são aspectos que contribuem para a preferência em investir em plataformas de VoD. Essa inovação no modelo de distribuição e exibição também toma proveito do crescente uso da internet tanto no nosso país quanto no mundo em geral, e do fortalecimento da qualidade de conexão, algo que não seria possível cerca de duas décadas atrás. Sobre o aumento do uso da web, o autor Magno Lima Gomes (2016, p.36) discorre, “a propagação da internet, acessada, diariamente, por usuários de todo o planeta, tem papel fundamental na construção dos novos modelos de relação entre clientes e empresas”. Do ponto de vista de um realizador independente, distribuir seus filmes por meio de uma plataforma VoD pode significar maior economia financeira, devido ao fato de que acordos com distribuidoras tradicionais, quando fechados, costumam oferecer um melhor prospecto de lucro para os distribuidores ao invés dos produtores e diretores; uma ampla visibilidade, pois obras independentes, além de terem campanhas de marketing pequenas, não costumam alcançar um grande número de salas de cinema devido à alta competitividade nessa janela comercial.


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Sobre a preferência por investir em um canal de streaming para a distribuição de filmes, Guilmour Rossi, fundador da plataforma VoD chamada Libreflix, comenta: O principal motivo, sem dúvida, é sua comodidade de uso. Para além das outras funcionalidades que as plataformas de vídeo incorporaram hoje em dia, o próprio streaming se destaca pela sua premissa: O espectador pode escolher o que, onde e quando assistir, tudo sob demanda, além de não precisar baixar o conteúdo por completo para começar a assistir (ROSSI, 2020).

Como mencionado por Rossi, não há a necessidade da parte de um usuário de realizar o download completo de arquivos para consumir o conteúdo disponível pelo streaming VoD62, diferentemente de um site de torrent63, por exemplo, uma outra maneira de se distribuir filmes online para um grande número de espectadores, mas que constantemente desafia conceitos de legalidade e direitos autorais e quando tem intuito de lucro direto ou indireto, é ser classificada como pirataria (tendo como base o artigo 184 do Código Penal). Segundo informações adquiridas pelo site chamado iknowwhatyoudownload, em 2020, o número de computadores no Brasil que compartilhavam arquivos torrent foi de 1,36 milhão e a média da quantidade de downloads chegou a 3,7 milhões no dia 21 de março, época em que a disseminação da doença Covid-19 se intensificou no nosso país (VENTURA, 2020). Entretanto, mesmo com todas as vantagens supracitadas, algumas plataformas do mercado não tem o cinema independente brasileiro como prioridade, especialmente as mais populares como Netflix e Amazon. Algumas alternativas, no entanto, providenciam um canal mais direcionado a veiculação de obras independentes nacionais. Como um exemplo, temos o Libreflix, um serviço de streaming nacional. 3.3. Libreflix Criado em agosto de 2017 pelo estudante curitibano de engenharia, Guilmour Rossi, o Libreflix se trata de uma plataforma de streaming nacional que permite o

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Embora a opção exista em alguns serviços como Netflix e Globoplay, para quando o usuário desejar assistir uma série ou filme mesmo quando não possuir acesso à internet. “[...] extensão de arquivos utilizados por um protocolo de transferência do tipo P2P (Peer to Peer). Essa transferência acontece da seguinte maneira: os arquivos transferidos são divididos em partes e cada pessoa que tem tal arquivo ajuda a fazer o upload a outros usuários. Isso reduz significantemente o consumo de banda do distribuidor original do arquivo, não sendo necessário que o mesmo fique armazenado em um servidor.” (PEREIRA, 2012). 63


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acesso gratuito aos usuários a longas, médias e curtas metragens brasileiros e estrangeiros independentes, sem anúncios e necessidade obrigatória de cadastro, mas para o envio de sugestão de filmes para a plataforma é preciso a realização de um login. Figura I: Tela inicial do Libreflix

Fonte: Captura de tela (2020).

De acordo com a ideia do software livre, em que um programa de computador permite a sua manipulação, redistribuição, cópia e modificação de usuários que não sejam proprietários do software, o Libreflix é definido como uma plataforma colaborativa que se demostra convidativa a quaisquer desenvolvedores ou interessados com intuito de se juntar à equipe responsável pela manutenção e desenvolvimento do site. A plataforma também conta com aplicativos disponíveis para os sistemas operacionais do Windows e Android. Desde sua fundação em 2017, a plataforma já foi apresentada em diversas publicações jornalísticas realizadas por portais de notícias como Estadão, UOL, Vice, Diário do Nordeste, Canaltech, Radio Mix, Diário de Pernambuco, entre muitos outros. Em geral, as matérias apresentadas por esses sites tem o intuito de introduzir o leitor ao Libreflix, explicar como funciona, quais filmes disponíveis, e enfatizar a gratuidade da plataforma, um aspecto que pode atrair novos usuários. Entre o catálogo de produções disponíveis, temos os nacionais Limite (Mario Peixoto, 1931), Vida de Balconista (Cavi Borges, Pedro Monteiro, 2009), Quem Matou Eloá? (Lívia Perez, 2015), Eu Não Quero Voltar Sozinho (Daniel Ribeiro,


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2010), Palhaços Anônimos (Gabriel do Valle, Edu Camargo, 2015) e os estrangeiros Metropoles (Fritz Lang, 1927), Viagem à Lua (Georges Méliès, 1902), Tempos Modernos (Charlie Chaplin, 1936), A Noite dos Mortos Vivos (George A. Romero, 1968) e Sita Sings the Blues (Nina Paley, 2008). Rossi discorre a respeito da razão por trás da criação da plataforma, e menciona a preocupação em oferecer conteúdo de forma gratuita e completamente legalizada, Em 2017, quando o Libreflix foi criado, a oferta de filmes em plataformas na internet era basicamente de obras com todos os direitos reservados e que estão distribuídas entre serviços pagos de streaming ou sites com conteúdo "pirata". A ideia do Libreflix surgiu pela necessidade de um canal que reunisse, de forma simples e amigável ao usuário comum, produções audiovisuais, que, no mínimo, pudessem ser transmitidas gratuitamente pela web sem ferir nenhum direito autoral (ROSSI, 2020).

Rossi (2020) comenta que a relevância cultural que o Libreflix tem se encontra no suporte que a plataforma oferece a prática de streaming livre, possível devido à natureza colaborativa do software e do uso do código aberto, o que, como já apontado, garante a seus usuários uma maior liberdade quanto sua modificação64. Outro ponto na relevância cultural do Libreflix está no apoio as ideias relacionadas a Cultura Livre (teoria que, em oposição ao conceito da propriedade de bens culturais e da cultura da permissão65 , assume um posicionamento contra direitos autorais) buscando apresentar conteúdos audiovisuais com licenças Creative Commons mais permissivas, que pelo menos concedam sua livre exibição online de forma gratuita e legal, Nós defendemos novas formas de compartilhamento da cultura. Formas que atinjam todas as pessoas, principalmente as que não podem pagar por ela. Formas que conectem os artistas direto com os fãs. E até formas que permitam que artistas criem algo novo à partir do trabalho de outros artistas. Cultura é ciência, é poesia e é de todo mundo (LIBREFLIX, 2017).

Esse ideal defendido pelo site de uma cultura livre, gratuita, disponível a todos (ou pelo menos ao maior número possível de pessoas que o Libreflix possa alcançar) uma ação que promove a conectividade entre artistas e tem sua importância na ampliação do acesso à produções independentes nacionais, já que

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Tendo como base os conceitos de software livre definidos pelo programador e ativista norteamericano Richard Stallman. “Uma cultura na qual os criadores podem criar apenas com a permissão dos poderosos ou dos criadores do passado” (LESSIG, 2004, p.14). 65


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no Brasil, devido a concentração das salas de cinema em 10% dos municípios, segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 2019 (UOL, 2019), e os preços dos ingressos serem, às vezes, inacessíveis à grande parte da população (tendo como base o levantamento realizado pelo banco de dados Numbeo, a média do valor de um ingresso de cinema no Brasil, em 2019, era de R$ 30,00 (LEAL, 2020)), nas ocasiões em que as pessoas vão ao cinema, os filmes comerciais, norte-americanos, costumam ser os mais assistidos, pois entre a população brasileira há uma certa desvalorização de produções nacionais, e como comentam os autores Mateus Brum de Armas e Felipe de Andrade Nunes Pereira Zamana: Em detrimento da exposição extrema a tantos filmes norte-americanos, o espectador acaba criando certa ideologia “romantizada” da cultura norteamericana, esquecendo-se ou até desvalorizando a arte nacional, justamente por apenas ter contato com o mesmo tipo de filme norteamericano (ARMAS, ZAMANA, 2019, p.5).

Nesse cenário são desfavorecidas principalmente as que possuem menos recursos de divulgação e atores famosos da televisão, como muito ocorre no cinema independente brasileiro. Remover a necessidade de pagar para que os filmes do Libreflix sejam assistidos, abre espaço para que mais pessoas os acessem. Como exemplo de um realizador que tem um pensamento relacionado a cultura livre, temos Nina Parley, a diretora da animação Rita Sings the Blues, que está disponível na plataforma. Em seu site pessoal, Parley publicou o seguinte texto, Eu por meio deste entrego Rita Sings the Blues para vocês [...] Por favor distribuam, copiem, compartilhem, arquivem e exibam Rita Sings the Blues. Da cultura do compartilhamento ela veio, e de volta para a cultura do compartilhamento ela irá. A sabedoria convencional me incentiva a exigir um pagamento para cada uso do filme, mas então como pessoas sem dinheiro iriam conseguir vê-lo? O quão amplamente o filme seria disseminado se ele fosse limitado por permissões e taxas? Controle oferece uma falsa sensação de segurança. A única segurança verdadeira que eu tenho é confiando em vocês, confiando na cultura, e confiando na liberdade (PARLEY, 2009, apud JENKINS; FORD; GREEN, 2013, p.229, tradução nossa).

Também em seu site, Parley disponibiliza meios para que os fãs de seu trabalho realizem contribuições financeiras para ela, os quais ela indica que servem para cobrir os gastos na produção da animação. Com o intuito de favorecer os realizadores, o Libreflix também disponibiliza a opção para que seus usuários possam contribuir financeiramente para cada produção registrada na plataforma. O valor da quantia pode ser livremente selecionado pelo contribuinte e a transação é


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realizada através dos serviços de pagamento online PayPal e Pagli (ROSSI; GOMES-JR, 2019).

Figura II: Espaço dedicado a retribuição financeira a obra

Fonte: Captura de Tela (2020).

Segundo a pesquisa realizada pela autora Luana Fabíola Brescovitz (2019), os diretores Rubens Passaro, Bruno Graziano, Pedro Ekman, Pedro Fávero, Arthur Moura, Richardson Nicola Pontone e Livia Perez, cujas obras estão disponíveis no Libreflix, citam como razões por terem escolhido o site para distribuir seus filmes, se identificarem com a sua proposta (conteúdo com curadoria, função social e livre de publicidade), sua gratuidade e a ampliação da visibilidade. Os documentários, por exemplo, produções geralmente não muito assistidas nos cinemas — embora tenham constituído pouco mais de 14% de todos os filmes brasileiros lançados no Brasil entre 2009 e 2017, não chegaram a atrair nem 1% de todo o público que foi ao cinema durante esse mesmo período (ANCINE – OCA, 2018) — são mais de sessenta no catálogo do Libreflix, e nele não competem com os filmes populares brasileiros e blockbusters norte-americanos.


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Com base nas informações obtidas por Brescovitz, pode-se observar que os diretores cujos trabalhos estão no Libreflix, não têm a questão do ganho financeiro adquirido por meio da plataforma como prioridade. Um possível motivo para isso é concordarem com os ideais defendidos pelo site, de disponibilizar obras de licenças autorais mais permissivas, que permitem sua reprodução sem a necessidade de pagamentos para os autores. Como o número de acessos mensais da plataforma fica em torno de 85 mil (BRESCOVITZ, 2019), e o site tem presença nas principais redes sociais, por exemplo, sua página no Facebook (onde ocorre a divulgação dos conteúdos da plataforma) conta com mais de 5 mil curtidas e seu perfil no Twitter soma mais de 3 mil seguidores, podemos dizer que o Libreflix proporciona um canal acessível para que produções independentes nacionais encontrem um público, que não teriam alcançado em uma distribuição visada para as salas tradicionais de cinema. Embora não existam dados disponíveis das visualizações desse filme no Libreflix para comparações, Um Filme Francês (Cavi Borges, 2015) quando lançado nas salas de cinema no Brasil (em uma única sala de exibição, no caso) teve um público total de 146 espectadores (ANCINE, 2016). Como o filme hoje faz parte do catálogo do Libreflix onde poderá estar disponível por muito mais tempo que estaria em uma sala de cinema (isso caso os realizadores não solicitem sua retirada), e levando em conta o número de acessos à plataforma, é possível que a quantidade de espectadores que assistam Um Filme Francês no Libreflix supere o número alcançado nas salas de cinema. A curadoria realizada pela equipe demonstra a valorização do conteúdo independente nacional, que ao contrário de muitas plataformas de maior porte, é um dos focos do Libreflix. O que é levado em consideração no processo de seleção dos filmes que entrarão no Libreflix é se essas obras contam com licenças autorais que permitam que sejam exibidas gratuitamente pela internet, que não apresentem discurso de ódio (ANTUNES, 2018), e que, de certa forma, se encaixem em “temáticas críticas e reflexivas” (BRESCOVITZ, 2019, p.53). A vantagem para um cineasta de distribuir seu filme em uma plataforma de streaming em que há uma curadoria, ou seja, uma seleção de quais tipos específicos de obras ingressam no catálogo, como, por exemplo, apenas filmes independentes ou de um único gênero, é que normalmente um dos fatores que atraem os usuários a esse tipo de plataforma


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(de nicho) é justamente ela se especializar na distribuição de filmes que sejam de seu interesse, como é o caso de fãs do cinema de terror ou cinéfilos, por exemplo. Isso cria um espaço para que o filme encontre uma melhor aceitação entre os usuários, pois é de se esperar que eles já possuam interesse nas produções do catálogo. Sobre isso, autor André Ramos Santos Sarmento Batista comenta, [...] as plataformas de streaming com curadoria possuem um conjunto específico de critérios para a escolha dos filmes que decidem oferecer nos seus serviços de forma a que possam apelar a determinados grupos de indivíduos. Caso estas infraestruturas digitais tenham boa reputação junto do público poderão tornar-se úteis para os cineastas independentes que queiram alcançar o público-alvo das suas obras [...] (BATISTA, 2016, p.28).

Rossi quando questionado quanto a importância das plataformas de streaming na distribuição e visibilidade do cinema independente brasileiro, elabora que, dentro desse grupo, apesar de os serviços que mais colaborem para essa categoria de filmes serem as plataformas como YouTube, Vimeo e também o Libreflix, ao invés das alternativas de maior porte e que demandam assinaturas pagas, salienta que é por meio da internet como um todo, incluindo blogs e redes sociais, que existe uma grande contribuição para o cinema independente do Brasil. Ele informa que isso acontece porque se trata de um espaço que proporciona uma comunicação direta entre os criadores e expectadores, facilitando ações como organizações de festivais, financiamentos coletivos (crowdfunding ou "vaquinhas" online), downloads e compartilhamentos de conteúdo, etc. Essas contribuições podem ser observadas no festival Curta Taquary, de Taquaritinga do Norte, em Pernambuco, que foi realizado virtualmente em 2020, devido a pandemia do Covid-19, e promove os curtas-metragens independentes brasileiros; no financiamento coletivo realizado por meio da plataforma Catarse, para fomentar a produção do curta O Afeto e a Rua (Thiago Köche, 2020); em sites dedicados ao compartilhamento de filmes independentes por meio de torrents, como é o caso do Acervo MakingOff; e no canal no YouTube da produtora mineira Filmes de Plástico, por onde disponibilizam gratuitamente alguns filmes de seus realizadores para exibição. Levando essas informações em conta, a importância da internet como um todo, na produção, exibição e distribuição do cinema brasileiro independente não pode ser ignorada. Em suma, como uma plataforma de streaming, o Libreflix disponibiliza um espaço importante para exibição e distribuição do cinema independente nacional,


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que oferece a possibilidade de contribuições financeiras para realizadores e dissemina o acesso a produções que não são apenas independentes, mas também possuem licenças de Creative Commons mais permissíveis. Por conta de apresentar um catálogo mais segmentado, composto por obras independentes e menos conhecidas, com temáticas relacionadas ao ativismo66, e, apesar dos números apresentados anteriormente (quando comparado a plataformas maiores como Netflix, MUBI e Amazon Prime Vídeo) não possuir uma divulgação forte nas redes sociais, o Libreflix se aproxima mais de um canal de nicho do que de um serviço de amplo acesso e popularidade entre a população brasileira de 209 milhões de habitantes. 3.4. Spcine Play Como já apontado, nos últimos anos vimos o surgimento de diversas plataformas de streaming no mercado, e agora esse é um meio com popularidade em ascensão. Levando isso em conta, a Spcine, a empresa estatal de cinema e audiovisual de São Paulo e fundada durante a gestão de Fernando Haddad, lançou uma plataforma de streaming on demand (ou sob demanda) em 2017, em parceria com a O2 Play, Hacklab e o Looke, chamada Spcine Play, a única iniciativa pública desse tipo no Brasil. Contando com uma página incorporada no serviço de streaming Looke, os usuários podem acessar o conteúdo também nas smartTVs e smartphones. Temporariamente, durante o ano de 2020, por conta da pandemia da doença Covid-19, todo o conteúdo da plataforma foi disponibilizado de maneira gratuita, com a intenção de incentivar a permanência das pessoas em casa, mas o padrão é que os usuários aluguem as produções que desejam por um preço popular. Segundo Dilson Neto (2020), coordenador de difusão da Spcine, por meio de entrevista concedida para o autor, a razão para escolher o streaming para distribuir os filmes da plataforma ocorre justamente pelo fácil acesso proporcionado pela tecnologia. A respeito do perfil das obras da Spcine Play, André Sturm, ex-secretário

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"Ativismo" está presente entre muitas das tags usadas para a categorização dos filmes na plataforma. Esse ativismo se refere a movimentos estudantis, cultura livre, ocupações urbanas e feminismo.


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municipal da cultura, comenta, Spcine Play aposta em um catálogo diversificado, com filmes de diferentes gêneros e formatos, para estimular o público a consumir produções brasileiras, dando acesso a títulos muitas vezes restritos ao circuito de salas de grandes cidades (STURM, 2017 apud SÃO PAULO SÃO, 2017).

Dando continuidade ao que Sturm cita, o catálogo da plataforma é majoritariamente focado em filmes brasileiros, muitos deles fora do cinema mainstream, o que pode ser observado pela inclusão de categorias dedicadas a Mostra do Audiovisual Negro, Mostra Ecofalante de Cinema, Festival Internacional de Curtas e os documentários musicais In-Edit. Além disso, existem diversos conteúdos direcionados ao público infantil, bate-papos com artistas, séries e categorias dedicadas a cineastas independentes como Andrea Tonaci, José Mojica Marins e Rogério Sganzela. Neto (2020) acredita que é no fato da Spcine Play se dedicar a prover o acesso a obras que não são facilmente encontradas na internet e não estão disponíveis em demais plataformas, como os filmes clássicos67 do cinema brasileiro e aos de festivais que acontecem em São Paulo, que, enquanto nesse circuito, tem sua exibição de difícil acesso aos habitantes de outras regiões do país, que se encontra a importância cultural da plataforma. Isso se trata de uma ação que democratiza o acesso a esses produtos da cultura nacional (DILSON NETO, 2020). Levando essas informações em conta, podemos dizer que a celebração do cinema nacional é o ponto principal da Spcine Play. Em uma indústria cujos players mais populares do mundo do streaming como Netflix e Amazon e as majors da distribuição cinematográfica se concentram em distribuir produções estrangeiras, preferencialmente blockbusters, ou nacionais mas de caráter mais comercial, uma alternativa mais receptiva ao cinema brasileiro, que não necessariamente se encaixe nessas categorias supracitadas, o independente, autoral, cuja primeira janela de exibição é muitas vezes em um festival de cinema, se trata de algo que além de culturalmente relevante, como aponta Neto, também é benéfico para os cineastas dessas obras e para próprio público, que pode por meio desse canal se familiarizar mais com o audiovisual que é produzido em seu país.

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Neto (2020) cita como filmes clássicos, aqueles realizados por cineastas considerados consagrados como Zé do Caixão, Ana Carolina, Helena Ignez, entre outros.


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Para que um filme chegue a Spcine Play, ou a equipe da empresa entra em contato com a distribuidora ou produtora para solicitar o licenciamento da obra ou vice-versa, os próprios responsáveis pelos direitos da produção já entram em contato para apresentar possíveis adições ao acervo da Spcine Play. A cada semestre é definido o orçamento dos licenciamentos e assim que as negociações são concluídas, levando em conta questões como valores e a validade do licenciamento, a Spcine assina o contrato, define a data de estreia do(s) filme(s) e recebe os materiais (DILSON NETO, 2020). Nisso pode se observar que existe um apoio financeiro garantido aos cineastas cujas produções são veiculadas na Spcine Play, por meio do que se é pago pelos licenciamentos, o que provê uma vantagem para plataforma sobre o Libreflix. Embora ligada a Prefeitura, a Spcine possui autonomia em relação a escolha de filmes, função que é realizada por uma equipe específica, portanto mudanças de gestão públicas em São Paulo não tem influência nessa parte da Spcine (DILSON NETO, 2020) garantindo uma maior segurança aos cineastas de que suas produções não serão retiradas do catálogo ou rejeitadas com a posse de um novo prefeito, por exemplo. Um exemplo de obra distribuída pela Spcine Play é o média-metragem Vaga Carne (Grace Passô e Ricardo Alves Jr, 2020) que teve sua estreia realizada na plataforma, isso sem ter passado pelos cinemas antes, algo inédito até então. Segundo o site Revista de Cinema (2020), o filme permanece na Spcine Play até alcançar duas mil visualizações ou cumprir um prazo de trinta dias de disponibilidade na plataforma. Não foi cobrado dos usuários qualquer pagamento para assistir ao filme. Pouco se sabe sobre o impacto da veiculação de Vaga Carne na Spcine Play, porém no final de maio de 2020, o filme já havia ultrapassado dois mil acessos na plataforma (CAMPOS, 2020). Vale notar que o filme é baseado em uma peça de teatro premiada com um Cesgranrio 2016 e Shell RJ 2016 ambos de Melhor Texto, e que foi apresentada em Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, e outras cidades do Brasil (MITSP, 2018) o que pode ter contribuído para que mais usuários o assistissem. Uma outra forma que produções independentes podem chegar no Spcine Play é por meio de projetos com intuito de fomento ao audiovisual brasileiro. Um exemplo disso é o Projeto Curta em Casa de 2020, que em sua primeira fase


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ofereceu uma bolsa de três mil reais para os realizadores dos curtas-metragens escolhidos. Após isso, os dez projetos que mais receberem votos em uma votação popular realizada pela internet, foram veiculados na Spcine Play e exibidos no cine Drive-In Paradiso (Instituto Criar, 2020). Outra iniciativa da Spcine, envolvendo a Spcine Play, é o Cineclube Spcine – Virtual que, assim como todo cineclube, promove debates sobre diversas produções do cinema, no caso, o brasileiro, e suas relações com temas sociais atuais. As obras que são discutidas no Cineclube ficaram disponibilizadas na Spcine Play para fácil acesso dos usuários e aqueles que já estavam inscritos poderiam ver o debate por meio de um link enviado diretamente para eles. Em um comentário publicado no site Cinem(ação), Laís Bodanzky, presidente da Spcine e cineasta, fala sobre o projeto, Este projeto mantém a concepção dos 16 espaços cineclubistas da Spcine que tiveram a programação suspensas no último mês de março em decorrência da Covid –19. Nosso principal objetivo é continuar a oferecer conteúdo de qualidade e que estimule a reflexão neste período de isolamento social (BODANZKY, 2020).

Podemos dizer que a Spcine Play promove o cinema brasileiro, incluindo os filmes menos comerciais. Essa promoção ocorre pelo incentivo a debates críticos com realizadores da indústria do cinema e projetos, como o exemplo mencionado do Projeto Curta em Casa, que visam a produção de filmes feitos por cineastas de menor porte, muitas vezes estudantes, como o grupo Abelha Produções, cujos membros são alunos de Rádio e TV da universidade privada Cruzeiro do Sul (o que incentiva a produção de novos realizadores, ou seja aqueles que ainda não ingressaram no mercado) e também por meio da veiculação dessas obras em sua plataforma, incentivando o público a consumir filmes brasileiros, o que abre caminho para uma potencial futura exibição em demais canais/plataformas de streaming, como comenta Neto: A ideia é que a Spcine Play possa servir de vitrine ou de porta de entrada para que esses filmes despertem o interesse de outras plataformas e tenham uma carreira mais longa no streaming (DILSON NETO, 2020)

Assim como o Libreflix, a Spcine Play é uma alternativa de distribuição que elimina a necessidade de fechamentos de acordos com distribuidores de cinema, pois a própria produtora responsável pela obra pode entrar em contato diretamente com a Spcine para discutir a entrada de seu projeto no catálogo da plataforma. Batista (2016) afirma que isso colabora para a diversidade artística no cinema, pois


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evita a interferência criativa da parte dos distribuidores, e permite que os realizadores entreguem seus filmes da maneira idealizada. Financeiramente, também há um auxílio aos cineastas independentes brasileiros, visto que eles são pagos pelo licenciamento de seus filmes quando chegam na Spcine Play. Em um momento tão desfavorável ao setor audiovisual como o de uma pandemia, a relevância de apoios como esse apenas se dilata. A Spcine Play, Libreflix e demais plataformas de streaming VoD, em geral, fornecem espaços que permitam uma permanência mais longa dos filmes independentes disponíveis, diferente de caso fossem veiculados em uma sala tradicional de cinema, por exemplo, onde questões como os acordos realizados entre os distribuidores e exibidores e a bilheteria arrecadada pelo filme são decisivas no tempo em que ele permanece em cartaz. Em suma, por mais que plataformas de streaming contribuam para a distribuição de filmes independentes brasileiros, disponibilizando um meio relativamente acessível para os espectadores, em que seus filmes poderão estar disponíveis por meses/anos para exibição a qualquer hora do dia, e em alguns casos

fornecendo

também

uma

contribuição

financeira

para

os

cineastas/produtores, não há garantia de que seus filmes terão uma visibilidade desejada na plataforma, principalmente nos casos em que há pouca divulgação dele nas redes sociais ou em outros meios. A importância do marketing de filmes é algo que não pode ser ignorado, visto que quando uma obra se encontra no catálogo de uma plataforma de streaming VoD, ela ainda estará competindo com outras produções (mesmo que independentes) com as quais o espectador possa estar mais familiarizado, seja por já ter visualizado um trailer, cartaz, entrevista ou ouvido sobre o filme em uma conversa dentro ou fora da internet, o que tende a fazê-lo preferir assistir esse filme ao invés de outro sobre o qual pouco conhece. Em relação a isso, o autor André Ramos Santos Sarmento Batista (2016), menciona que os filmes que mais recebem destaque das plataformas de streaming são justamente aqueles que tiveram um melhor desempenho nas bilheterias e que investiram consideravelmente em campanhas de divulgação, ou seja, filmes comerciais, mas esse caso não se aplica tanto as plataformas Libreflix e Spcine Play, que devido ao perfil de seus respectivos catálogos (com foco em filmes de licenças autorais permissivas e obras brasileiras de festivais e com pouca presença em outros


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serviços de streaming) essa não é a categoria de cinema priorizada. Para um realizador investir na distribuição de seus filmes em múltiplas plataformas de streaming, caso possível, também é uma opção interessante quanto a ampliação de sua visibilidade e arrecadação de lucros. O streaming se apresenta como uma tecnologia amplamente utilizada por diversas plataformas online, e dado o surgimento nos últimos cinco anos de serviços brasileiros de streaming VoD como Oldflix68, Afroflix69, Libreflix, Spcine Play, Darkflix70, Univer Vídeo71, Filme Filme72, entre outros, no futuro, o uso da tecnologia pode ser mais disseminado entre a população com acesso à internet no Brasil, o que abre mais janelas para os cineastas independentes (e de todos os tipos) de viabilizaram o encontro de seus filmes com os espectadores, seja ele um público amplo ou segmentado.

68

Cujo catálogo é focado em séries e filmes antigos, considerados clássicos e produzidos até os anos 1990 (CANAL TECH, 2016). 69

Plataforma direcionada a exibição do audiovisual feito por pessoas negras, seja na área técnica ou artística. 70

Plataforma de streaming brasileira focada em filmes de terror nacionais e estrangeiros.

71

Plataforma pertencente a Igreja Universal do Reino de Deus e ligada a TV Record, que disponibiliza conteúdo audiovisual para o público cristão. 72

Plataforma que permite o aluguel de filmes nacionais e estrangeiros pelo preço de R$ 6,00. Sua curadoria é feita por diretores e atores do cinema brasileiro (IZEL, 2020).


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CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho tinha como intenção responder como a distribuição de filmes independentes brasileiros é favorecida pelas plataformas digitais de streaming VoD (Video on demand) no Brasil, sejam elas pagas ou gratuitas. Como proposto pela hipótese levantada, as plataformas digitais que usam dessa tecnologia permitem que essas produções encontrem um público mais segmentado, cujos gostos se alinham mais com o conteúdo que é oferecido a ele nessas plataformas, portanto, a aceitação dos filmes independentes entre os espectadores pode ser maior do que seria em uma sala de cinema, por exemplo. Além disso, a veiculação dessas obras em canais de streaming pode ampliar as oportunidades profissionais para seus realizadores e a sua visibilidade tendo seu acesso disponibilizado até mesmo para usuários fora do Brasil. Comparados às distribuidoras de cinema, os serviços de streaming estudados nesse trabalho apresentam certas vantagens para os cineastas ou produtores independentes. No caso do Libreflix, a acessibilidade para os realizadores é um ponto positivo, visto que, apenas pela internet, nas redes sociais da plataforma ou em seu próprio site, eles já podem encaminhar/sugerir seus filmes para que entrem no catálogo do Libreflix, dispensando a necessidade do realizamento de acordos ou pagamentos para a veiculação da obra na plataforma. Como vimos ao decorrer da monografia, na Spcine Play os filmes já chegam na plataforma por meio de negociações realizadas entre a Spcine e a distribuidora ou a produtora responsável pela obra. Devido a questão de fechamento de contratos, ao contrário do Libreflix, o processo de inserir um filme no catálogo da Spcine Play não é tão simples, porém o aspecto do ganho financeiro para os realizadores é um fator vantajoso para eles. Mais um ponto positivo para as plataformas de streaming é o fato de estarem cada vez mais se popularizando entre os espectadores73 e que durante o período de pandemia, com mais pessoas em casa, se tornaram uma alternativa para o

73

Houve um aumento de 68% no número de brasileiros que assistem conteúdo audiovisual através de plataformas SVOD de 2018 para 2019, segundo o site de pesquisas Toluna (MEIO E MENSAGEM, 2018).


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consumo de filmes e para o mercado cinematográfico nacional se sustentar. Como mencionado por Rossi, a internet como um todo, além do streaming, se tornou um espaço para o fomento do cinema brasileiro, em produção, divulgação de obras e exibição. Embora o recorte principal dessa monografia seja a distribuição de filmes, é interessante reconhecer a importância do mundo virtual no cinema independente brasileiro além dessa etapa. A bibliografia consultada foi fundamental no desenvolvimento da monografia e uma grande quantidade de artigos, teses, e outros documentos relacionados ao tema foi encontrada, permitindo uma diversidade de pontos de vista. Embora as perguntas enviadas e respondidas para Guilmour Rossi (fundador do Libreflix) e Dilson Neto (coordenador de difusão da Spcine Play) nos permitiram obter mais conhecimento das plataformas Libreflix e Spcine Play, e, em parte, serviram como base para o desenvolvimento desse trabalho, para alcançarmos um resultado mais preciso, é necessário entrar em contato com cineastas independentes brasileiros, o que nos forneceria uma pluralidade de perspectivas acerca do papel das plataformas de streaming na distribuição dos filmes que produzem e um aprofundamento quanto ao problema proposto. São indicados os trabalhos da autora Luana Fabíola Brescovitz (“Distribuição e Exibição de Filmes Brasileiros: Um Estudo de Caso da Plataforma Libreflix”), Aletéia Selonk (“Distribuição Cinematográfica no Brasil e suas Repercussões Políticas e Sociais - Um Estudo Comparado da Distribuição da Cinematografia Nacional e Estrangeira”) e de André Ramos Santos Sarmento Batista (“O Papel das Plataformas de Streaming na Distribuição de Filmes Independentes”) para mais informações, com diferentes abordagens, referentes as questões apresentadas nessa monografia. Para o futuro da distribuição de filmes independentes no Brasil, embora muitas mudanças ainda possam ocorrer na indústria, espera-se que a competição no mercado do streaming leve a criação de mais plataformas de VoD com públicos segmentados, e que os filmes independentes brasileiros ganhem mais espaço nesses locais, e também em canais no YouTube, sites de exibições de filmes e na televisão aberta e por assinatura, para o benefício de seus realizadores e o incentivo do consumo desse tipo de cinema entre o público.


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APÊNDICES APÊNDICE A – Entrevista realizada por e-mail com Guilmour Rossi, fundador do Libreflix, na data 16/09/2020 1. Por que você criou a Libreflix? Em 2017, quando o Libreflix foi criado, a oferta de filmes em plataformas na internet era basicamente de obras com todos os direitos reservados e que estão distribuídas entre serviços pagos de streaming ou sites com conteúdo "pirata". A ideia do Libreflix surgiu pela necessidade de um canal que reunisse, de forma simples e amigável ao usuário comum, produções audiovisuais, que, no mínimo, pudessem ser transmitidas gratuitamente pela web sem ferir nenhum direito autoral. A etimologia do título foi um remix com o nome da já da consolidada e pioneira plataforma de streaming, com a ideia do software libre. (Libre Software: termo muitas vezes usado na comunidade de programadores para substituir o termo “free software” no inglês, que pode passar a ideia de software grátis, quando é sobre livre como em liberdade.) 2. Você possui alguma experiência anterior com cinema? Caso não tenha, pretende algum dia ter? Possuo muito pouca experiência. Por um curto período de tempo trabalhei com montagem e edição de vídeos comerciais como freelancer. Perto deste mesmo período participei da produção de alguns curtas experimentais. 3. Por que investir no streaming e não em outra plataforma/canal para fazer seus filmes chegarem ao espectador, como a televisão por assinatura, ou um site de torrent, por exemplo? O principal motivo, sem dúvida, é sua comodidade de uso. Para além das outras funcionalidades que as plataformas de vídeo incorporaram hoje em dia, o próprio streaming de destaca pela sua premissa: O espectador pode escolher o que, onde e quando assistir, tudo sob demanda, além de não precisar baixar o conteúdo por completo para começar a assistir. 4. Quais foram os desafios e lições ao decorrer da criação da Libreflix? Ver o artigo sobre o desenvolvimento do Libreflix: A Peer-to-Peer On-demand Video


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Platform for Free Streaming 5. Para você, qual é a importância cultural da Libreflix? Acho que a principal importância da plataforma está no fomento de um outro tipo de distribuição da arte por uso de softwares livres - o que chamamos de streaming livre. Essa ideia se dá pela junção de ideias políticas: do software livre e da cultura livre; e técnicas: do desenvolvimento de software colaborativamente e uso de códigoaberto. Esses conceitos se relacionam com o Libreflix já que qualquer um pode acessar o código do Libreflix e tem as liberdades (como defendidas inicialmente por Richard Stallman ao definir o software livre) de rodar, copiar, melhorar e distribuir o software por trás da instância oficial, disponível em Libreflix.org. Quando se trata sobre a Cultura Livre, a plataforma (e seu acervo) dialogam não no sentido pleno, mas na tentativa de fomento e apoio a ideias culturalivristas. Isso porque, segundo trabalhos de Lawrence Lessig e o movimento Creative Commons que ele ajudou a fundar, trabalhos artísticos que fazem parte da “cultura livre” seriam aqueles com maior permissividade em sua licença, ou seja, seriam trabalhos que apenas requerem o crédito ao autor da obra. Outras licenças Creative Commons, que insiram componentes de não permissão a distribuição das modificações ou a proibição da obra para uso comercial não são considerados “cultura livre”. Nesse ponto, o Libreflix garante o acesso a obra e sem custo, mas nem todas elas poderiam ser baixadas e copiadas pelos usuários ou, em ainda maior número, serem alteradas e remixadas em outros trabalhos artísticos. 6. Você acredita que no futuro, mais plataformas de streaming semelhantes a Libreflix, com foco no cinema brasileiro autoral, surgirão? Eu espero que sim. Com o consumo multimídia aumentando cada vez mais, seria triste se essa distribuição ficasse a cargo das grandes corporações que hoje já existem. Descentralização é sempre muito importante principalmente quando falamos de arte. 7. Como você enxerga o cinema brasileiro agora? Quais são suas expectativas para o futuro do setor? O cinema brasileiro está em uma grande crise, infelizmente. Uma crise prática e simbólica que se agravou há alguns anos com os cortes e a maior perseguição ao


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meio artístico. Com a pandemia (e a inação do governo) então, muitos colegas ficaram totalmente sem perspectiva. Um tímido aquecimento do setor começou a ocorrer com as grandes plataformas de streaming chegando por aqui, mas ainda assim muito poucos realizadores e trabalhadores da área conseguem ascender e chegar até a cultura de massa. O poder de distribuição apenas se diluiu entre os grandes players. E para o futuro, bem... Acho que tudo converge para a internet. Não necessariamente pelo ato de assistir, mas sim por aquela mobilização de financiamento, divulgação e o debate sobre as produções – contribuindo para o enriquecimento cultural como um todo. Contando com isso, a esperança, mesmo a médio prazo, é por um boom brasileiro na produção e no consumo audiovisual, seja de obras comerciais ou não. Um cinema cibernovo. Esse futuro passa pelo encontro de uma identidade nacional com o cinema, que fique menos dependente das produções hollywoodianas. Se falarmos na distribuição em um futuro não muito distante, acreditamos que haverá uma mistura do velho e do novo, entre salas de cinemas e plataformas de streaming. 8. O que você entende como um filme independente? Filme independente para mim é aquele feito com baixo orçamento e sem o financiamento de grandes empresas, ou apoiados por grandes estúdios comerciais. A maioria deles consegue nenhum ou pequenos valores via leis de incentivo. 9. Você acha que a indústria do cinema brasileiro oferece espaço para produções independentes, de menor porte? Muito pouco. A própria indústria mainstream encontra alguns problemas para se desenvolver, e os produtores independentes ficam dependentes de editais e leis de incentivo à cultura. 10. Você acredita que no Brasil, iniciativas governamentais são eficientes no incentivo do cinema nacional? Caso não acredite, que medidas você acha que poderiam ser tomadas para favorecer o setor? As iniciativas governamentais nesta área nunca foram as ideais, mas desde 2014 têm se mostrado extremamente ruins. A nível nacional um ponto importante seria uma mudança na lei de incentivo à cultura para que a escolha ou não do apoio não


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ficasse restrita as empresas, que limitam as obras que acessam o incentivo, pois tendem a escolher obras que se alinhem com seus interesses, optando por estúdios já consolidados e geralmente feitos na região sudeste. 11. O quão importante você julga serem as plataformas de streaming para a distribuição e visibilidade de filmes brasileiros independentes? O que tenho percebido, por enquanto, é que as grandes plataformas de streaming não tem significado grande ganho ao cinema independente diretamente. Nesse aspecto, as plataformas de vídeo genéricas como o YouTube e o Vimeo – e recentemente o próprio Libreflix -, é que têm um papel fundamental para a divulgação e distribuição dessas obras. A contribuição maior veio fora dos muros das plataformas de streaming pagas, se gerando na Internet como um todo, de forma mais “rebelde” também por meio de blogs e das redes sociais. Criou-se um maior diálogo entre criadores e expectadores e surgiram novas possibilidades de mobilização como as campanhas de financiamento coletivo, a organização de festivais e a maior oferta para o acesso e download das obras. 12. Qual é sua opinião em relação a filmes produzidos especificamente para plataformas de streaming? Algumas figuras do cinema mundial, como Steven Spielberg, por exemplo, já expressaram opiniões negativas quanto a essas produções, por não seguirem o processo tradicional de distribuição que as obras direcionadas ao cinema seguem. Você acha que existe distinção entre um filme feito diretamente para o streaming e um feito diretamente para o cinema? Concordo em parte com esse pensamento mais saudosista como o de Spielberg, afinal o cinema nasceu para a sala de cinema. Seja na indústria ou no cinema independente, acho que ainda devemos estimular as salas de cinema como um dever cultural. 13. Com o surgimento de plataformas de streaming nacionais de catálogos mais segmentados como a OldFlix (que disponibiliza só filmes antigos) e a Darkflix (que apenas oferece filmes de terror), você acredita que, do ponto de vista de um pequeno cineasta, vale a pena apostar nesses canais para


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distribuição de seus filmes? Acho que isso vai depender muito do objetivo de cada cineasta. No geral, se bem acordados os termos de distribuição e de retorno ao realizador, vale a pena usar destas plataformas sim. APÊNDICE B – Entrevista realizada por e-mail com Dilson Neto, coordenador de difusão da Spcine, na data 13/10/2020 1. Para você, qual é a importância cultural de uma plataforma de streaming como a Spcine Play? Considero que a Spcine Play é importante por dar acesso a conteúdos que dificilmente são encontrados online. Parte do nosso catálogo é dedicada a filmes clássicos brasileiros que não estão em outras plataformas, por exemplo. Outra parte é composta de filmes de festivais de cinema realizados em São Paulo, que dificilmente são acessíveis por moradores de outras partes do Brasil. Ao incluir esses filmes em sua programação, a Spcine Play contribui para democratizar o acesso a esses conteúdos culturais. 2. Por que a Spcine resolveu investir no streaming on demand? A principal razão foi facilitar o acesso a esses conteúdos que, como expliquei, não são facilmente encontrados. 3. Quais são os critérios utilizados para selecionar quais produções serão disponibilizadas (ou não) pela plataforma? Damos preferência a filmes que não estejam disponíveis em outras plataformas, pois queremos dar visibilidade a conteúdos menos conhecidos. Também valorizamos filmes que têm um histórico de participação em festivais ou que receberam premiações. Além disso, damos destaques a filmes clássicos de cineastas consagrados que também não encontraram espaço em outras plataformas, como Zé do Caixão, Ana Carolina, Helena Ignez, entre outros. 4. De que forma a Spcine Play contribui para os cineastas independentes brasileiros e seus filmes? A Spcine paga um valor de licenciamento para os filmes exibidos na plataforma e dá visibilidade a títulos desses cineastas. Um fator importante que levamos em consideração é a não exigência de exclusividade. A ideia é que a Spcine Play possa


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servir de vitrine ou de porta de entrada para que esses filmes despertem o interesse de outras plataformas e tenham uma carreira mais longa no streaming. 5. Como ocorre o processo de licenciamento de direitos das produções na Spcine Play? Há casos em que uma produtora ou distribuidora oferece opções de catálogo para a Spcine Play e há casos em que nós entramos em contato para solicitar o licenciamento.

O

orçamento

para

os

licenciamentos

tem

sido

definido

semestralmente. Uma vez fechada a negociação, incluindo valores e tempo de licenciamento, nós assinamos o contrato, definimos a data de estreia dos filmes na plataforma e recebemos os materiais. 6. Por se tratar de uma empresa pública, o quão influente é a Prefeitura nas escolhas de filmes da Spcine? Por exemplo, por meio de decisões da Prefeitura, o catálogo da Spcine poderia deixar de focar em filmes clássicos, de festivais e premiados, e se direcionar a uma outra categoria do cinema brasileiro, ou vocês possuem uma autonomia quanto a esse tipo de escolha? A Spcine tem autonomia para esse tipo de escolha. Trata-se de uma curadoria feita pela equipe de Difusão, então não sofremos influências da Prefeitura para a seleção de filmes.


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