Re
irEI
REVISTA VIRTUAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL No 1 - JAN/JUN - 2014
ENTREVISTA
Luciana Ostetto nos fala sobre o lugar da arte na Educação Infantil
VENDO E REVENDO
Diferentes olhares sobre o desenho da criança
SABERES DO COTIDIANO
Conheça a turma de crianças de 5 anos que criou sua própria obra inspirada em Antoni Gaudí
fique por dentro Conheça o livro “A Grande Roda de Histórias“.
I E ir
v e R Revista
Virtual de Educação Infantil
Dicas para sua leitura: use o modo de tela cheia e aproveite para clicar nos links. EXPEDIENTE Coordenação: Catarina Moro Edição: Ana Júlia Rodrigues Diagramação: Ana Júlia Rodrigues e Marina Feldman Colaboradores: Franciele Ferreira França, Ettiene B. L. Barbosa, Gioconda Gigghi. Revisão: Marina Feldman Fotografia: Paul Scott (foto criança) NEPIE - Núcleo de Pesquisas e Estudos em Educação Infantil Setor de Educação - UFPR UFPR - Universidade Federal do
Paraná
1
Editorial A RevirEI – Revista Virtual de Educação Infantil – surgiu da percepção de uma lacuna importante a ser ocupada e também de uma inspiração... O meio eletrônico como suporte perfeito, com vistas a tornar acessível, tanto pela ausência de custo àqueles que vieram a acessá-la quanto pela facilidade espaço-temporal, entre outras características. A partir desses primeiros planos, porque não pensar e escolher um nome para iniciar um projeto de extensão na UFPR que viesse ao encontro de tais intencionalidades? O nome deveria contemplar um tom lúdico, pessoal, relacionado com a identidade da Revista. A primeira ideia: REVELEI – Revista Eletrônica de Educação Infantil. Bom, indicava o entrelaçamento pensado. Contudo, “revelar” se articula menos ao protagonismo das crianças do que a seu papel de expectadora. Enfim... Pensa aqui, brinca ali e surge outro nome: RevirEI. Perfeito, traz implícito a ação traquina de se mexer, tirar do lugar, procurar, achar, brincar, descobrir, vir ao encontro; remete ao agir das crianças, ao desestabilizar e novamente equilibrar. É tudo isso e muito mais que queremos com a nossa revista. Que a RevirEI permita a você, leitor, mobilidade, desestabilização e reequilíbrio; encontros, prazer e descobertas. A cada trecho, buscamos conteúdos e imagens capazes de captar sua curiosidade, de se relacionar à sua experiência e ampliá-la. Nós viramos, desviramos e reviramos para você revirar também. Cada sessão da RevirEI reflete sobre as potencialidades dos bebês e crianças e sobre as muitas possibilidades em termos das práticas educativas cotidianas em creches e pré-escolas. Agradeço a todos que tornaram possível a RevirEI, em especial esse número inaugural.
CATARINA MORO Professora Coordenadora da Revista Virtual de Educação Infantil
Dúvidas? Pedidos? Sugestões? Críticas? Entre em contato conosco pelo e-mail revirei.ufpr@gmail.com
2
3
4 8 12 16 24
FIQUE DE OLHO: Indicações de livros, sites e revistas para enriquecer sua prática.
30
O QUE DIZ A LEI? Mudanças na LDB e suas implicações para a Educação Infantil.
34 36
FIQUE POR DENTRO: Leia a resenha do livro “A Grande Roda de Histórias”.
VIRANDO O MUNDO: O cuidado em jogo nas creches do norte da Itália. VENDO & REVENDO: Duas opiniões sobre o desenho na Educação Infantil. ENTREVISTA: Luciana Ostetto fala sobre as relações entre arte, infância e educação... SABERES DO COTIDIANO: O artista Antoni Gaudí foi a inspiração de um projeto com crianças de 5 anos.
VIREI O BAÚ: Memórias dos nosso brinquedos que ficaram em algum lugar do passado.
Fique de OlhO... 4
...nos livros
(para ler com os pequenos)
A PRINCESA QUE SALVAVA PRÍNCIPES Claudia Souza Um conto de fadas moderno com príncipes, princesas e uma pitada de feminismo. Nesta história a princesa é quem salva o príncipe, enfrenta os dragões e bruxas. A autora apresenta um ponto de vista diferente e divertido, contrariando os clássicos contos de fadas. Editora Callis
...nas canções
O BICHO AL Paulo Leminsk Uma divertida coletân Paulo Leminski com ilus Os 26 poemas foram se “Toda poesia” de Leminsk natureza, pelo humor e pe Editora Companh
BICHOS E BUCHICHOS Nélio Spréa Uma ótima mistura de poesia, literatura e música... O livro traz uma coletânea divertida, acompanhada de um CD, para uma bela viagem pelo universo das culturas infantis. Mas, atenção, as atividades do material não estão pensadas para a Educação Infantil. O que vale para os pequenos são mesmo as canções... Editora Parabolé
O p filmes com ê
O d discut histór neces crianç e os educa htt
5
LFABETO ki e Ziraldo nea de poemas de strações de Ziraldo. elecionados do livro ki. É um passeio pela ela linguagem. hia das Letras
FILMES QUE VOAM portal “Filmes que voam” disponibiliza s e desenhos com audiodescrição e libras, ênfase no público infantil. http://filmesquevoam.com.br/
MUITO ALÉM DO PESO (DOC) documentário “Muito Além do Peso” te o tema da obesidade infantil, com rias reais e alarmantes. Uma reflexão ssária sobre o número crescente de ças brasileiras com excesso de peso impactos desse problema na saúde, ação e lazer. ttp://www.muitoalemdopeso.com.br
...na internet TERRITÓRIO DO BRINCAR Valorizar e resgatar as experiências do brincar são alguns dos objetivos do Projeto Território do Brincar, que percorreu o Brasil nos mais diversos contextos (rurais, indígenas, quilombolas, litorâneos e de grandes metrópoles). A experiência fica registrada no site através de fotos, vídeos e relatos. É a partir desse material que a educadora Renata Meirelles e o documentarista David Reeks estão montando um longa-metragem. http://www.territoriodobrincar.com.br/
Fique de OlhO... 6
...no que acontece
NOTÍCIAS DO NEPIE/UFPR
CURSOS DE EXTENSÃO “Educação Infantil, Infâncias e Arte”
Fruto da parceria entre o MEC e a UFPR/NEPIE (Núcleo de Estudos e Pesquisas em
Infância e Educação Infantil), se destina a profissionais que estão diretamente vinculado
à educação infantil de seus municípios. O objetivo do Curso é propiciar aos participan oportunidades de estudo e discussão para ampliar, analisar e desenvolver propostas
trabalho pedagógico nas linguagens musical e visual, estabelecendo relações com as dem linguagens da arte no contexto da educação infantil.
EDIÇÕES DO CURS
2o semestre/2013 - Curitiba - 41 cursistas - Almirante Tamandaré, Araucária, Bocaiúva do S
Campo do Tenente, Campo Largo, Cerro Azul, Colombo, Fazenda Rio Grande, Itaperuçu, Pinha Piraquara, Quitandinha e São José dos Pinhais; 1º Semestre/2014 - Paranaguá - 36 cursistas - Matinhos e Morretes;
1º Semestre/2014 - Campo Mourão - 90 cursistas - Campina da Lagoa, Corumbataí do S Farol, Luiziana, Mamborê, Peabiru e Roncador;
2o semestre/2014 - Cambé - 43 cursistas - Alvorada do Sul, Bela Vista do Paraíso, Guara Ibiporã, Londrina, Pitangueiras, Porecatu, Prado Ferreira, Primeiro de Maio e Rolândia
MÓDULOS DO CURS
Infâncias, Arte e Estética; A Música na Educação Infantil e As Artes Visuais na Educação Infan
Como metodologia, os participantes se empenham na composição do “Caderno de Memór
de cada turma e elaboram individualmente ou em dupla um Portfólio referente a sua experiên
formativa. As turmas finalizadas também tiveram a experiência de uma aula-visita a espa
culturais, tendo acompanhado mostras no Museu Oscar Niemeyer, Casa Andrade Muricy, S
Cultural e Caixa Cultural. Além desses espaços a turma do Litoral também pode visitar o Mus do Mar (Aquário) em Paranaguá.
7
“Fórum de Debates sobre Educação Infantil” Criado a partir da parceria entre a UFPR/NEPIE (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Infância e Educação Infantil) e o FEIPAR (Fórum de Educação Infantil do Paraná), busca reunir pessoas e instituições voltadas para a questão dos direitos das crianças pequenas à uma educação de qualidade em estabelecimentos públicos. Constitui-se como espaço de debate visando promover a formação e integração
m
os
ntes de
mais
SO:
Sul,
ais,
Sul,
aci,
SO:
ntil.
ria”
ncia
aços
Sesi
seu
dos/as profissionais da área da Educação Infantil e membros do Fórum de Educação Infantil do Paraná. Em 2013 contamos com a colaboração dos seguintes professores: Maria Lucia Santos (APEI-Portugal), Giovanni Faedi (Itália), Bianca Cristina Correa (USP), Eloisa Acires Candal Rocha (UFSC) e - da UFPR - Adriana Dragone Silveira, Angela Coutinho, Catarina Moro, Gizele de Souza e Marynelma Garanhani. Neste ano acontece a segunda edição, em que já debatemos: “A pedagogia da infância e a formação dos professores” com a Profª Rosa Batista (UFSC); “O protagonismo infantil e o projeto educativo: a experiência de San Miniato” com Sr. Aldo Fortunati; “A Educação de 0 a 3 anos: tensões e possibilidades” com a Profª Angela Coutinho (UFPR); “A Educação Infantil como espaço de experiências com/na diversidade Étnico Racial” com a Profª Lucimar Rosa Dias (UFPR); “O Brincar e a cultura” com o Prof. Nélio Spréa (Parabolé). No 2º semestre seguimos com “O Corte Etário”, “As linguagens da arte” e “A leitura e a escrita”, além de um Seminário para compartilharmos experiências. Em 2014 as atividades acontecem uma vez por mês, na primeira terça-feira, das 19h00 às 22h00. INFORMAÇÕES: www.feipar.blogspot.com e-mail: feipar.mieib@gmail.com
virando o mundo
8
NORTE DA ITÁLIA: Brincar de Cuidar? O banheiro como contexto de expressão do protagonismo e autonomia
Texto originalmente publicado na revista italiana Bambini nº 1/2014 escrito por três autores da região da Toscana – Aldo Fortunati, Manuela Tanzini e Nadia Testi. Os autores relatam boas práticas educativas com crianças pequenas em contextos de cuidado, realçando o quanto diferentes situações no cotidiano das creches/pré-escolas podem ser formativas, ampliando o sentido de trabalho pedagógico. Nossos agradecimentos a Ferruccio Cremaschi, editor da Edizione Junior e diretor da Bambini, e a Aldo Fortunati pela mediação que possibilitou a publicação. Tradução: Gioconda Ghiggi
Revisão: Marina Feldman e Catarina Moro
No cotidiano das práticas educativas organizar um contexto que crie oportunidades foi necessário reconsiderar situações que interessantes para as crianças? Que atenção ocorrem no banheiro, o que nos trouxe destinamos aos contextos que dizem respeito importantes questionamentos: quais limites a atender as necessidades fisiológicas das existem entre brincadeira e situações de crianças? Que atenção destinamos aos cuidados? É possível pensar e realizar contextos relativos às atividades lúdicas contínuas experiências nas mais diversas brincadeiras livres ou jogos estruturados? situações,
mantendo
a
concepção
de Nossas experiências com as crianças nos
criança como construtora de conhecimentos ajudam a responder a tais questionamentos. dentro de um sistema de relações e, assim, De fato, nas suas atividades de exploração,
de descobertas e de brincadeiras, as crianças tomando cuidado para não interromper não colocam limites de tipo situacional. Observamos
como
as
uma situação importante que alguma delas
crianças parece estar vivenciando em outro espaço.
reinterpretam os momentos do cuidado E, neste caso, dando a possibilidade de levar e se apropriam dos espaços para criar até o banheiro uma brincadeira iniciada suas brincadeiras exploratórias e seus momentos lúdicos de tipo simbólico, dentro de um clima relacional. Com base nas observações das atitudes das crianças, às vezes imprevisíveis, podemos reorganizar os espaços e as experiências com base nos seus desejos e nas suas motivações à experiência e ao conhecimento. A partir disso, o adulto pode conceber e organizar os contextos relativos às situações de higiene e cuidados pessoais de modo a favorecer as
experiências
sociocognitivas
das
crianças. Isto significa – para começar – dar às situações que surgem no banheiro o mesmo valor que damos a qualquer outra situação vivenciada na creche. Nesse sentido, é importante dar atenção e refletir sobre o espaço, o tempo, os grupos e materiais; para interferir sobre estes e sobre as suas interconexões, de forma fluída, harmônica e contínua, assim como nas outras situações organizadas no cotidiano da creche. Por exemplo, na nossa experiência, lentamente, o adulto propõe para um grupo de crianças ir ao banheiro,
9
virando o mundo
10
em outro espaço, como forma de enriquecer e transformá-la em uma experiência lúdica e de relações novas e imprevistas. Enquanto a educadora está trocando as fraldas de Pedro (13 meses), Arianna (32 meses) entra no banheiro com uma boneca nos braços, seguida por Carolina (20 meses), que observa atentamente cada um dos gestos da educadora. Arianna se senta no vaso, coloca a boneca sobre a mesa e pede a Carolina para trazer uma fralda. Carolina acena, pega uma do trocador e entrega à Arianna. Juntas, giram e mexem
muitas vezes a boneca e as fraldas entre as mãos. Colaboram entre si procurando uma maneira justa de pôr e quando, depois de numerosas tentativas conseguem colocar corretamente a fralda na boneca, pulam contentes. O adulto favorece as relações, acolhendo os que desejam subir no trocador “somente” para observar aquilo que fazem as crianças
11
ali deitadas: assim criam-se outras trocas competências. Possam dar vida, transformar prazerosas e momentos de interações e enriquecer relações. Observar os gestos dos lúdicas. Como em qualquer situação que se maiores para poder aprender também pela realiza nas experiências cotidianas na creche, imitação, observar os comportamentos dos o cuidar durante as rotinas no banheiro nos menores para poder manifestar e desenvolver remete à questão do tempo.
as
próprias
competências
tutoriais
e
Precisamos de um tempo tranquilo, cooperativas. Devemos prestar atenção estendido, de dar-se tempo e dar tempo ao cuidado, dando escuta aos desejos e as às
crianças
para
que
estas
possam motivações das crianças. Acolhendo-as em
ampliar constantemente sua autonomia um tempo e um espaço capazes de oferecer e protagonismo, possam aprender dos soluções justas a todos e, sobretudo, a cada seus
erros,
manifestar
e
desenvolver um.
12
ENDO & ENDO
Vendo e Revendo: o desenho infantil O desenho e o universo infantil
Andréa Bertoletti
V
Crianças
adoram
desenhar!
Em âmbito escolar quase sempre permanece
RE
diferentes situações cotidianas traçam a crença sobre a natureza e o propósito da linhas
e
mundos
rabiscam, imaginários
materializando atividade artística como autoexpressão, que
se relacionada apenas às questões emotivas-
transformam em singulares modos de se em detrimento das reflexivas e interexpressar, se comunicar, se relacionar... O relacionais. Assim, desenhar no espaço desenho, dentro do rico universo infantil, da escola acaba sendo uma forma de é uma maneira de exprimir o que sentem entretenimento cujo processo, na maior e pensam sobre o mundo, sobre os outros parte das vezes, é totalmente livre e e sobre si mesmas. Com um lápis na mão espontâneo. Porém, o desenho deve ser desenham e, concomitantemente a este inserido no cotidiano escolar como uma ato, passam a entender melhor suas importante expressão gráfico-pictórico emoções, expressar seus sentimentos e se que deve basear-se em significativas relacionar com o entorno. Uma
das
principais
experiências sociais e estéticas. funções
do
Portanto,
aprimorar
a
criatividade
desenho no desenvolvimento infantil e a percepção de mundo através do é a possibilidade de representação da desenho ultrapassa o domínio técnico e a realidade vivida. Registrar através de linhas autoexpressão pois possibilita, junto a uma e formas situações vistas e vivenciadas poética pessoal, novas formas de ser e agir. é uma maneira criativa e sensível de Mas, para que efetivamente isso ocorra, lidar com os complexos elementos que é necessário que haja, junto ao fazer, o configuram o dia a dia da criança.
contato com o legado artístico e cultural. E
Porém, esse rico processo criativo é, neste caso, ao se tratar do desenho infantil, muitas vezes, apreendido como algo o contato com a produção em linguagem deslocado do entorno sócio cultural. No gráfica de diferentes tempos e espaços.
V
A percepção, a leitura e a interação com artístico, bem como os aspectos culturais
13
a diversidade estética de imagens amplia da sociedade em que estão inseridos. o repertório, alimenta a imaginação e A produção infantil, da mesma forma, desenvolve a criatividade para que a deve ser apreciada junto às crianças. O produção infantil passe a ser cada vez mais processo de criação e (re)significação do inventiva e autoral. Cabe ressaltar que a mundo é amplo, complexo e constante. apropriação crítica e sensível de produções As narrativas visuais se configuram ao imagéticas se faz no fruir, pensar, produzir, longo da vida escolar como um fecundo e brincar, construindo sentidos pessoais e aberto diálogo enquanto formas criativas alimentando a teia de percepções, relações de expressão e comunicação. O perceber, e ações. Para isso, considera-se o professor o vivenciar e o construir, suscitados pelo importante mediador no desenvolvimento universo cultural e artístico, propiciam
VENDO
do processo criativo das crianças, que a construção de conhecimentos através engloba
tantos
aspectos
emocionais do desenvolvimento da sensibilidade,
quanto racionais. Desenhar, como foi ampliando a percepção de mundo. É visto até aqui, não é simplesmente uma primordial, portanto, brincar e interagir questão de autoexpressão espontânea, frequentemente
com
diferentes
mas de apreensão, junto à singularidade produções gráficas para que ampliem seu expressiva, dos códigos que abarcam a repertório, sua sensibilidade e sua relação linguagem do desenho.
com esta linguagem tão presente em seu
Neste sentido é fundamental, para cotidiano. Assim podem, efetivamente, estimular as crianças a desenhar e se construir um mundo imagético com apropriar gradativamente de seu gesto liberdade e criatividade, alimentando gráfico, fornecer diversificados materiais incessantemente este jogo simbólico ao
REVENDO
e diferentes suportes. Mas também é longo de sua vida escolar. essencial que os pequenos entrem em contato com o universo representacional
do desenho. A apreensão da cultura através de suas manifestações artísticas contribui
efetivamente para o desenvolvimento cultural dos educandos, oportunizando conhecer as especificidades do universo
ANDRÉA BERTOLETTI é arteeducadora, com mestrado na área pela Udesc.
VENDO 14
15
Vendo e Revendo: o desenho para além do desenho
Experiências significativas com o desenho na turma de Pré do CMEI Liberdade, em Curitiba. FOTOS: Ana Júlia Rodrigues
REVENDO
16
Vendo e Revendo: Catarina Moroo desenho infantil
Refletir sobre o desenho no cotidiano acumulados historicamente.
O QUE CABE
educativo com crianças pequenas nos Assim, a criança é de um
>Selecionar e o
provoca algumas questões: o desenho é lado autônoma e de outro
qualidade (vários s
uma atividade espontânea das crianças sujeita às regulações das
>Preparar situaç
ou constitui-se socialmente, como fruto influências
repertório das cria
RE
V
ENDO & ENDO
DESENHO E PROCESSOS IMAGINATIVOS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
culturais
que
de aprendizado? O desenhar promove recebe. Ao desenhar, as
>Possibilitar que
o desenvolvimento psicomotor na crianças
contando
descubram respo
criando
dúvidas do proces
infância? A proposição do desenho suas
estão histórias,
pode sempre se basear na livre criação narrativas, mostrando suas
VENDO
>Realizar visitas
das crianças? O desenho é uma atividade compreensões, emoções e
oficinas e ateliês d
individual ou pode ser coletiva? Como percepções da sociedade.
>Testar as estratég
proporcionar às crianças experiências com
que for propor às
O universo das crianças
o desenho que agucem sua curiosidade, se distingue da realidade do
>Investir na sua ex
revelem suas diferentes formas de adulto: para a criança não compreensão e de relação com traçados, existe divisão entre a realidade visual e a cores, formas, ritmos, texturas?
emocional. O desenho infantil apresenta
Se entendemos o desenho como uma das o significado que as coisas têm para ela formas de expressão das crianças pequenas, e não relações de tamanho ou cor que vemos o desenho como linguagem e como elas veem. As crianças podem ter padrões arte. A representação pictográfica não é estéticos próprios diferentes daqueles espontânea no desenvolvimento. Não é dos adultos. Desenhar é um processo de resultado nem está a serviço exclusivo do reelaboração da relação com a realidade, desenvolvimento psicomotor. Desenhar é que integra cognição, afeto e imaginação. uma ação que se constitui socialmente, que Numa
perspectiva
histórico-cultural
se cultiva. O desenho sintetiza esquemas os desenhos infantis não podem ser de representação, que são construídos considerados códigos em si mesmos, pois pelas crianças em situações ativas de necessitam do diálogo da criança consigo busca de conhecimento e aproximação a mesma, com outras crianças e com o outros desenhos produzidos socialmente e adulto, podendo explicitar em palavras os
significados das figurações propostas.
favorece essa condição contribui para a
17
Na Educação Infantil é importante fluidez e para o entendimento de que o considerar o desenho como processo e desenho é uma atividade prazerosa, com não
E AO PROFESSOR?
organizar material de
suportes e riscantes);
ções que ampliem o
anças; as crianças tenham e
ostas às incertezas e
sso criativo; a mostras, museus,
de artistas locais;
gias, técnicas e materiais crianças;
xpressão artística.
como
produto. inúmeras possibilidades e desafios.
Assim, em grupo, a
Tais interações não atrapalham a
atividade de desenho concentração e dedicação das crianças. pode revelar formas Às vezes uma ou outra criança para de de
cooperação,
de desenhar e fica observando as outras
influência de uns na crianças desenhando. Depois aquela elaboração do desenho criança poderá aproveitar o momento de de
outros.
quando propõe
Mesmo “não-desenho” em suas criações. A pausa é
o
adulto necessária no momento de elaboração do
produções desenho, assim como ocorre na escrita. É a
individuais, acontecem pausa que muitas vezes oferece elementos interações
entre
as para a criação de outro desenho, ou para
criações das crianças, ampliar uma criação previamente iniciada. pois elas conversam Mas isso dependerá da maneira como o
entre si, perguntam o que irão desenhar, adulto conduz a atividade. compartilham dificuldades ou pedem sugestões.
Essas
trocas
Nesse sentido, para enriquecer a
provocam imaginação e criação das crianças é
mudanças nas crianças que desenham – importante que o desenho não tenha em seus modos de perceber, de lembrar e uma finalidade burocrática, psicomotora
REVENDO
de nominar - e no desenho em si – formas e ou preparatória. A intencionalidade do
figuras novas, mais detalhes, uso de cores desenho na Educação Infantil é fortalecer diferentes. Assim, desenhar no coletivo, e expandir os processos imaginativos
ainda que o desenho seja individual, deve das crianças, assim como fazem a arte, a ser uma ação acompanhada de conversas, literatura e o faz-de-conta... risos, discussões. Isso pode mobilizar
sentimentos e emoções importantes
*Agradeço à Joseth Antônia Oliveira Jardim Martins pela leitura crítica e pelas sugestões.
que, provavelmente, contribuirão para CATARINA MORO é professora da área de o desenvolvimento da imaginação e da Educação Infantil da Universidade Federal elaboração criativa. Um ambiente que do Paraná.
18
Luciana Ostetto: Nós e as crianças, de mãos dadas com a arte
ENTREVISTA
texto: marina feldman foto: daniele marques vieira
Luciana Esmeralda Ostetto é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense e, por essa e por outras, tem um olhar atento para a formação de professores. Tudo sempre pensando no bem estar e nas experiências que poderemos oportunizar às crianças. Nesta conversa com a RevirEI, Luciana não dá respostas prontas. Para dialogar com ela é preciso pensar na nossa prática, com outro olhar. Ela nos lembra dos (pequenos) sujeitos com quem trabalhamos, de nossa própria criança interior, do olhar que enxerga a beleza e faz um convite: que tal entrarmos nessa ciranda?
Aonde está a arte na Educação Infantil?
O que você olha quando entra em um
Eu diria que está no subsolo. Acontece CMEI? aqui e ali, mas não aparece como algo
Eu vejo a estética do espaço. Eu chego,
importante, de primeira grandeza. A arte eu já sinto. O espaço me fala como são as está no porão, escondida.
relações, como é compreendido o espaço
As diferentes linguagens estão nas da arte, como a criança é vista, como a Diretrizes Nacionais, mas, na prática, a brincadeira está inserida... Então, se você arte não é um elemento do currículo. chega e têm prateleiras altas, os brinquedos Ela aparece travestida no trabalhinho, na em caixas, você já consegue perceber que atividade para as datas comemorativas, é a professora quem diz a hora de brincar. um enfeite, um babadinho... Uma forma Se você entra em um espaço e não tem caricata. Não é compreender a arte mesas, materiais gráficos, canetinhas, lápis como conhecimento, como espaço de de cor, papéis de diferentes tamanhos, experimentar o mundo.
tintas, pincéis... Você já percebe que ali as
linguagens expressivas não são cotidianas. madeirinhas, dos toquinhos, das bolinhas, Depois disso, olho a decoração. O que das sementes, das folhas. Isso propõe pra tem de produções da criança? O que criança um desafio e não simplesmente tem de imagens da mídia, da indústria “pinte aqui”, “cole aqui”. cultural? Como é essa estética? Qual é a E o professor, sabe disso?
composição? E falar de arte na educação infantil é
O que eu tenho percebido, na formação
também falar da materialidade. O
de professores, é que o gosto do
que tem a disposição das
professor recai sobre a sua
crianças? Tem madeira?
prática. As imagens da
BIENAL INTERNACIONAL mídia, das produções de DE CURITBA, EM 2013 massa, também são do
Tem sementes? Tem areia? Tem coisas da
natureza?
Ou
gosto do professor. Ele
somente o plástico,
não vê problema em
o
TNT,
colocar ali dentro a
materiais
imagem das princesas
EVA,
esses frios,
o
pobres
de
da Disney porque as
ex p e r i m e n t a ç ã o,
crianças
que não colocam
ele acha bonitinho.
questões pra criança?
E não adianta dizer
Eu fico muito triste quando eu chego e tem
aquele
gostam
e
“olha, não é bom usar
obra de efigênia rolim
varalzinho
com desenhos prontos, murais
imagens da mídia” se isso não passar pela experiência do professor.
com imagens estereotipadas e com esses materiais pobres: papel crepom, EVA... Eu
E como o educador pode modificar o
digo que a Educação Infantil é um “reino do seu olhar e se tornar também sujeito da EVA”, que é tão pobre de experimentação, experiência estética? de sensação. Ele tá ali, liso e limpinho,
Defendo que na formação precisamos
e não problematiza a composição, o abrir espaço pra própria experiência. manuseio, a construção da criança.
E isso implica ir a outros espaços, que
Valeria mais você ter um canto das não só o da escola, da universidade. Ir
19
com quem luci
20
LORIS MALAGUZZI
ANA ANGÉLICA ALBANO
FRANCESCO TONUCCI
“...ele diz que a escola
“...o primeiro ateliê da
“...a criança aparece como
inteira tem que ser um ateliê.”
criança é a caixa de areia.
uma grande cabeça na escola.
Os bebês, na caixa de areia,
Só na hora do recreio está
precisa
interagindo com as pedrinhas
inteira. O professor esteve
estar com a criança, precisa
ou mesmo com brinquedos
tanto tempo nos bancos da
estar disponível a ela. Estar
compõem,
recompõem,
escola que se transformou
perto
desconstroem
só em cabeça. E o corpo é o
ENTREVISTA
“...o
acolher
professor
o e
suficiente
para
constroem,
dialogar,
mas
e
experimentam
a
longe o suficiente pra não ser
materialidade.
Agora,
se
intruso. Não conduzir todo
não tem caixa de areia, já
o processo da criança, mas
não tem espaço pra essa
também não abandoná-la.”
experimentação
lugar do órgão que capta a beleza, o coração.”
inicial.”
ao teatro, ir ao museu... Experimentar! criança, precisa se conectar com sua criança Realmente se colocar como um fruidor interna. É o polo da aventura. Esse que diz: e não simplesmente como aquele que por que você não vai? Experimenta! Viva o fala sobre. Perceber as mudanças que momento, olhe ao redor... acontecem no seu entorno. As estações do ano, o sol, a lua, as mudanças na natureza.
E o corpo do educador, onde fica?
Toda essa percepção do entorno depende
A repressão da beleza passa também pela
de uma sensibilização. É preciso abrir contenção do corpo. É preciso reconectar espaço para que o professor reencontre com essa inteireza que é também corpo, suas linguagens. Pra que ele vivifique esse movimento. ser da poesia que ficou preso em algum
Na minha pesquisa de doutorado,
lugar quando ele deixou de ser criança. que fala de formação de professores, O professor, pra estar com o outro que é eu trabalhei com as danças circulares
iana dialoga?
ANNE MARIE HOLMES
21
JAMES HILLMAN
FERNANDO PESSOA
“...não pode haver beleza
“...ele diz que a repressão
“...ele diz assim: ‘A criança
onde o professor não sabe
da beleza impera em todos
que fui chora na estrada.
captar o que a ela chama de
os lugares e é preciso superar
Deixei-a ali quando vim ser
sublime. O que é o sublime?
isso. Eu gosto muito dessa
quem sou. Mas hoje, vendo
É uma música que soa no
imagem dele e vejo que a
que o que sou é nada, quero
espaço, naquele momento
beleza tá reprimida no CMEI.
ir buscar quem fui onde
de infinita beleza. E se eu
É preciso libertá-la. Como?
ficou’. O adulto vem ser
não estiver conectado com o
Aí que entra a formação do
adulto e deixa a imaginação,
coração, eu não vou escutar.”
professor e a compreensão.”
a experimentação de lado.”
(falas de luciana ostetto sobre os autores)
obra de luis felipe noe
propondo justamente a vivência. É preciso
E o “como” fazer? Como trabalhar a
convidar o educador a entrar na roda arte na Educação Infantil? dessa ciranda que é de todos. Ele não pode
A gente sabe que não existe prática sem
ser apenas um espectador. Ele precisa teoria, que toda ação corresponde a uma captar a beleza, a poesia, ser modificado compreensão. Por isso que é difícil você na relação com a criança e com a arte. E fazer uma recomendação: “Ah, seria bom para isso é preciso revisitar todos os seus fazer isso”. Porque a ação destituída da sentidos, fazer com as próprias mãos. reflexão vira... Como eu diria? Como se Colocar-se o desafio de criar. E, por outro fosse um manual. O que se deve fazer é lado, sair a visitar. Fazer e contemplar são complexo, porque justamente envolve as duas partes que complementam essa esta compreensão da Educação Infantil, inteireza do professor.
da criança, de espaço, da arte... Acho que a primeira questão é olhar a
criança. Quem é essa criança? O que ela aparece no próprio visual da sala. tá fazendo? O que ela tá perguntando
Agora,
existem
situações
mais
sobre o mundo? E, em seguida, essa sistematizadas, que objetivamente você disponibilidade Precisamos
das
materialidades. coloca como momento de experimentação.
disponibilizar
materiais Uma forma de organizar esses momentos
pra que a criança possa criar. Como é o trabalho em pequenos grupos. pesquisa, como exploração, como Superando aquela ideia de que “agora
ENTREVISTA
22
experimentação. Esse desafio da todos vão fazer bolinhas”, “agora todos criação que se dá no diálogo com os vão usar massinha”. Assim, o professor materiais. Se você só tem papel A4, pode acompanhar o percurso investigativo lápis de cor e algumas vezes canetinha da criança. E não para mostrar como se é muito pouco desafio. Agora, se você faz. Para dialogar com as perguntas das disponibiliza cantos com diferentes crianças. materiais, possibilita à criança essa interação e esse ambiente para criar.
Outra maneira de construção é o ateliê. Não só num espaço, mas o ateliê como
É claro que estes materiais nem sempre um conceito: um espaço da criação, da estão disponíveis para o professor. Só exploração, da pesquisa, da apropriação que se o professor não conhece e não de novos repertórios. revindica, também não virá. A via é de
Como você faz pra trabalhar com tinta?
mão dupla. Além disso, há materiais que Ou argila? Você faz muita bagunça, sujeira também podem ser obtidos de outras e precisa ter um espaço receptivo a isso. formas. O papelão, por exemplo, é uma Os professores não podem ficar reféns alternativa ao papel A4. Uma forma de do pessoal da limpeza. É impossível um fazer diferente sem ficar preso à questão processo de criação que não faça sujeira, da disponibilidade.
que não tire as coisas do lugar. Na verdade
Mas ainda pensando no “como”, cabe a proposta é essa: que se tire as coisas do lembrar que arte, a educação estética, lugar pra colocar as coisas em um lugar envolve tudo que está no ambiente. Que diferente. Na apropriação da criança, na questões proponho pras crianças nesse sua cognição, no seu afeto, as coisas saem espaço? Há que se compreender que não do lugar e se recompõem. Tem esse jogo: existe a hora de ensinar a arte. Justamente desarruma no espaço pra arrumar no falamos de educação do olhar, o que corpo da criança.
E se não existe esse espaço específico, cognição. A razão e a emoção. Tudo isso você pode usar a própria sala ou outros está junto! espaços do CMEI. Se você tem o refeitório,
Hoje há repressão da beleza porque
uma sala, um espaço externo, pode jogar esse órgão não está sensibilizado, porque com isso. Um grupo pode trabalhar no o sujeito está preso. Eu estou preocupada refeitório enquanto os outros estão na com a alfabetização, com o sucesso que sala de referência.
a criança vai ter depois. É uma questão
Não sei se respondi a pergunta. Mas o racionalista,
cognitivista.
Porque
eu
importante é compreender o que você tenho que ensinar, eu não permito esse está propondo pra criança. Que não é contemplar, esse ser da poesia. uma atividade pra colocar na pasta de
A criança é um poeta, como diz Carlos
obra de luis felipe noe
trabalhinhos. É um processo feito com Drummond. Por que ela exprime, ela tem tempo, onde a criança vai se modificar na ideias, ela experimenta, ela imagina... Mas relação como sujeito. A criança, quando o processo repressor da beleza vai dizendo mexe com os materiais, tá pensando, que ela não pode isso, não pode aquilo. sentindo, imaginando, expandindo seu Só pode a regra, só pode o controle. E contato com o mundo. Essa é a base: que o professor acaba se perdendo nessa a experimentação, a fantasia, o projetar história. são mais importantes do que o produzir.
Então, o professor precisa recuperar essa dimensão estética pra poder viver a beleza
Pensando nisso tudo, qual deve ser o nos mínimos atos sublimes da criança. lugar da beleza, da poesia, na Educação Precisa estar sensibilizado pra poder se Infantil?
admirar e qualificar o momento em que a
Eu diria que a beleza precisa estar música soa e aí você diz: “eis aqui a criação, presente, ela que deve ser o motor da eis aqui o sublime”, a criança sendo, na prática. E qual é o órgão que capta a sua inteireza, e sentindo a beleza. A gente beleza? É o coração. A menos que façamos precisa cultivar isso. esse movimento de um pensamento que passa pelo coração, vamos continuar
Para esse processo é necessária uma
reprimindo a beleza. É preciso juntar o que, suspensão do olhar, um tempo. Como contemporaneamente,
fragmentaram. inserir isso na rotina do CMEI?
O pensar e o fazer. O sentimento e a
A questão do tempo é uma questão
23
de escolha. Se você compreende que é
Se o princípio hoje está cada vez mais
preciso experimentação com os materiais, colocado, de que a criança é sujeito com as linguagens expressivas, você vai de direitos, uma criança que imagina, organizar o tempo em função disso. E que joga, que brinca, que tem ideias e não o contrário, as crianças se adaptarem proposições... Pra que essa criança tenha a um tempo relacionado às questões espaço, eu preciso redefinir o tempo. administrativas, a hora que almoça, a hora E é o tempo em função de que? Das
ENTREVISTA
24
que lancha... Um tempo que escraviza.
necessidades do adulto? Ou é um tempo
Ora, é por isso que a arte tá no porão. em função das necessidades das crianças?
Porque pra que as linguagens expressivas
A instituição de Educação Infantil existe
estejam presentes como um elemento com as crianças, para as crianças e não do currículo é preciso tempo. É preciso sem as crianças ou apesar delas. Na tempo de espera, de contemplação, do verdade todo o tempo do cuidado, da processo. Não é “vamos começar um alimentação, é o tempo do fazer com a trabalhinho que precisamos terminar criança. Isso precisa ser alargado. Falar
daqui a 20 minutos”. Eu posso começar em experiências estéticas envolve todos um experimento com a criança em que os tempos e espaços. As crianças estão hoje ela faz um pouco e amanhã ela pode criando quando estão no espaço, na retomar, rever, problematizar. Essa ideia brincadeira, na areia... do processo. Numa organização onde tudo é pra já, você não faz esse percurso de
Em relação ao refletir sobre a prática, o
pensar, de repensar, de revisitar. Porque que é essa ideia de “atividade didática” justamente você pensa só no produto e que você nega? não no processo.
Quanto eu falo em atividade didática é
De um modo geral penso que os tempos num sentido de que eu já sei aonde eu precisam ser redimensionados e colocados quero chegar. Eu faço perguntas didáticas a favor da experiência, e não a favor da pra que a criança me responda algo. E aí lição ou da aula. O grande desafio do eu digo “Ah, é isso mesmo! Muito bem!” professor de Educação Infantil é esse: ser ou “Não, você está enganado!”. Assim o professor sem dar aula. Sem aquela ideia professor não entra realmente na corrente do ensino tradicional de que eu tenho que de interlocução verbal. passar um conteúdo.
Se eu digo que a criança é capaz de ter
ideias próprias, de fazer considerações que as mãos para as crianças. Para a criança escapam ao meu controle, devo conversar interna e a criança externa. Escutar e de verdade com a criança. Entrar na sua parar para sentir mais que dizer como se lógica, estar verdadeiramente interessado faz. É preciso que o professor recupere a no que a criança tem a dizer, no que ela sua capacidade de sonhar, recupere a sua revela. E não ser apenas um caminho para inteireza. introduzir um assunto, um objetivo.
Acho que a imagem é essa: entre na
Sobre o papel do professor, tenho roda, dê as mãos a sua criança interna e começado a pensar que, mais do que um as crianças externas e comece a romper mediador, é preciso que o professor seja o que sempre foi assim, ouvindo mais as um interlocutor. Quando você diz que é crianças e arriscando caminhos. um mediador dá a impressão de que “eu tenho aqui o saber, a verdade, e vou fazer uma mediação pra que você chegue nele”. Agora, se eu sou um interlocutor, eu me coloco disponível pra te ver, pra te ouvir, pra compreender. Para, na relação, se revelar
Artigos de Luciana Ostetto Disponíveis ONLINE Educação Infantil e Arte: Sentidos e Práticas Possíveis
o saber. Uma relação que é dialógica.
Planejamento na Educação Infantil... Mais
O professor precisa estar imbuído da
que a atividade, a criança em foco
possibilidade de se surpreender, de se maravilhar com o que a criança diz e faz, mais do que controlar todo o processo. E, como uma palavra final, como podemos plantar uma sementinha de poesia no dia a dia da Educação Infantil? Difícil dizer, mas penso que um caminho poderia ser acreditar. Acredite em si e na criança. Se coloque aberto para novas experiências. A ideia de sair do cais para se jogar ao mar. Sair do lugar onde eu estou só observando e entrar na ciranda. Dar
alguns livros publicados (clique neles)
25
26
Antoni Gaudí: um artista como inspiração para a criação das crianças
A professora Laís realizou um projeto com um grupo de 4 e 5 anos usando o arquiteto modernista Antoni Gaudí como objeto de pesquisa. As crianças conheceram diversos aspectos de sua vida e obra, através da pesquisa e da discussão no momento da roda. Além disso, a produção do artista serviu de inspiração para alguns produtos criados pelas crianças, em grupos ou individualmente. O último destes trabalhos, com muito esforço da turma, acabou resultando em uma releitura em
SABERES DO COTIDIANO
tamanho real da iguana/dragão que fica no Parque Güell, em Barcelona. Confira aqui o relato desse processo, nas palavras da professora Laís...
Antes de começar um trabalho de estrutura do dragão com jornal e fita crepe e pesquisa sempre “plantamos” a temática depois colamos varias camadas de pequenos escolhida, conversando a respeito e pedaços de jornal para dar firmeza à peça. levantando os conhecimentos prévios
Decidir o tamanho, o comprimento e a
que as crianças trazem. Para introduzir largura da escultura também foi uma árdua este projeto apresentei às crianças tarefa! Estes conceitos foram discutidos imagens e fotografias das obras mais e experimentados muitas vezes, antes e conhecidas do artista como “A Sagrada durante o processo de construção da iguana. Família” e o “Parque Güell”. Pude Para isso, deixava sempre á disposição das observar que o Parque Güell gerou maior crianças réguas e fitas métricas com as quais interesse, possivelmente pelas estruturas íamos calculando o tamanho que o dragão ia desalinhadas, a imensa variedade de ganhando.
cores, a luminosidade dos mosaicos de
Para uma maior organização, a turma foi
azulejo e principalmente o enorme Dragão divida em pequenos grupos. Cada um deles no eixo central das escadas do parque.
tinha a responsabilidade pela construção de
Foi daí que surgiu a ideia de reproduzir o uma parte do corpo, para depois realizarmos dragão em tamanho real, utilizando a técnica juntos a montagem do todo. Ao finalizar de modelagem em jornal (confira as imagens a construção, para o nosso assombro, na próxima página). Já tínhamos trabalhado descobrimos que o lagarto tinha chegado a 3 com esta técnica ao longo do ano e as crianças metros de comprimento! tinham alguma experiência. Montamos a
O próximo passo era a pintura base, que
as crianças fizeram com tinta guache branca. pais puderam perceber o porquê da utilização Em seguida, a finalização: colar pequenos dos materiais escolhidos e apreciar o olhar pedaços de papel laminado, criando a ilusão das crianças sobre o artista pesquisado. de que eram azulejos quebrados, como na Desta forma a exposição mostrou como esse obra original.
percurso influenciou fortemente o grupo.
Durante todo o processo de construção, meu Ampliaram seu interesse pela arte, o gosto papel foi apenas de orientar e documentar os pelo trabalho em ateliê e a valorização de passos do processo. Acredito que, durante o materiais descartáveis- que eles conseguiram processo criativo, as crianças não precisam transformar em verdadeiras obras de arte! de mais que isso. E esse olhar, acaba alí? Hora de mostrar o que fizemos...
Posso dizer que não! Quando a Revirei
Enquanto as crianças construíam o dragão, me pediu para relatar uma de minhas trabalho que durou aproximadamente um experiências logo pensei neste trabalho, que mês, também iam desenvolvendo outros já havia realizado de maneira semelhante trabalhos de artes: autorretrato com tinta alguns anos antes. Poucos dias depois um guache em capa de disco, reprodução ex-aluno, agora com oito anos, chegou à da “Sagrada Família” com tinta nanquim minha sala com um presente que havia me em laminas de plástico, “La Pedrera” em trazido de sua viagem à Espanha. O presente banner de vinil com tinta guache... Toda essa era uma réplica da iguana do Parque Güell! produção artística faria parte do produto final Porque, depois destes anos todos, ele ainda do projeto, uma exposição para os pais e toda lembrava-se daquele trabalho? a comunidade escolar.
Possivelmente porque um trabalho de arte
Alguns dias antes da exposição, organizados planejado, onde se garante a participação das em roda, conversamos sobre o que sabíamos crianças durante todo o processo de pesquisa sobre o artista e que seria importante e construção das obras, proporciona à criança compartilhar com os pais. Queríamos também uma descoberta. Descoberta que ajuda a falar sobre as técnicas utilizadas e como foi o desenvolver a
capacidade de apreciar a
processo dessas produções todas. Com estas linguagem artística e ser impactado por ela. anotações, cada criança escolheu a sua fala. Inauguramos
a
exposição
com
uma
pequena apresentação das crianças. Assim os
LAÍS SANTOS DUARTE
27
28
Construindo, planejando e papeando...
Conversas das crianças ao longo do processo de construção da iguana.
Gente, vamos começar pelo esqueleto do dragone, né!? (IZABEL)
fita e t n basta eixar as e d cisar jornal e d er, com e r p Vamos forrar o , quer diz para bem gorda dele HEUS) (MAT
Pode ser. Vai ficar bem comprido, porque o dragone tem que ficar igualzinho ao do parque do Gaudí. (MARIA LUIZA)
crepe costas . volume
Isabel pega a fita métrica e Maria Luiza uma régua.
Olha já tá bem comprida! Tem 183...de tamanho! (IZABEL) Maria Luiza pega várias réguas...
Preciso de muitas réguas de 30 para cobrir. (MARIA LUIZA)
É, g e mede. nte, depo is V do d amos faze a gent ragon e e, po r os braç né? os rqu Vai demor e são 4, ar m (MAT uito! HEUS) O braço que eu to fazendo tá quase pronto. Manu, você segura para mim? Vou passar a fita crepe em volta do jornal.(ALANA)
Nesse momento, as crianças pegam a estrutura e colocam em cima da mesa.
. os.. d e 5 d RIEL) tem (GAB e on rag D O
Não! Vai ser mais que 10 dedos. Porque ele vai ter 4 pernas. 2 na frente e 2 atrás. (RENATO)
29
Agora, em cima da mesa, vai ser mais fácil fazer os dedos e a cabeça. (DANIEL)
Na verdade 10 dedos, né? Porque as duas pernas, uma de cada lado. E 5 mais 5 é 10! (MATHEUS)
Então vai ser 20 dedos no total. Porque 5 mais 5 mais 5 mais 5... Dá 20! (KENZO)
No dia seguinte, havia vários potes espalhados nas mesas, com cores diferentes de papel laminado previamente cortado. As crianças começam a colar aleatoriamente o papel no dragão.
André e Gabriel vão até a escultura e observam bem de perto.
O Dani tem razão...Vamos fazer igual ao Dani. (ANDRÉ)
Gente, tá errado! Olha a fotografia e a mini escultura do dragone.... Não é essas cores! (DANIEL)
Já sei! Vamos pegar a escultura e colocar perto da gente. Vamos fazer a cabeça igualzinho... Vamos, Gabriel e André? (DANIEL)
É, gente... Vamos demorar alguns dias para terminar de colar ‘tudinho’ o nosso dragone. Só falta saber como a profe vai fazer para sair água da boca dele sem molhar o jornal!
SABERES DO COTIDIANO 30
GALERIA DE FOTOS
31
Acompanhe um pouco do processo da turma, na produção do Dragão...
LAÍS SANTOS DUARTE é professora de G3 (4-5 anos) na Escola Palmares/Projeto 21.
32
Sobre a Lei 12.796/2013 e imp Desde a Emenda Constitucional 59 (2009), que anunciou a obrigatoriedade de matrícula na Educação Básica dos 4 aos 17 anos de idade, a Educação Infantil tem sido exposta à fragilidade de sua constituição como etapa no sistema educacional brasileiro. Primeiramente pela divisão que distingue o atendimento por faixa etária: de 0 a 3 anos de idade na creche (gratuito, porém não obrigatório) e de 4 a 5 anos de idade na préescola (gratuito e obrigatório). Por um lado o direito está preservado pois, a partir da opção familiar, a criança pode ou não frequentar a instituição
O que diz a lei?
educativa. Por outro, a não obrigatoriedade permite
mudanças na lei...
que esta etapa não seja vista como prioridade pelo poder público. O foco acaba sendo posto na oferta
Constituição Federal 1988
de vagas para crianças a partir de 4 anos, uma vez que a obrigatoriedade de matrícula requer
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia
a
oferta
desse
atendimento nas redes municipais de ensino. Outra questão central
de: I- ensino fundamental, obrigatório e gratuito,
é da qualidade da oferta e as condições destas vagas
inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
atenderem às Diretrizes Curriculares
II- progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; III- atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV- atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade;
inadiável
Nacionais para a
33
plicações à Educação Infantil Daniele Marques Vieira Educação Infantil (DCNEI, 2009). Nesse âmbito podemos destacar que a garantia de oferta da educação infantil - creche e pré-escola - para todas as crianças brasileiras, constitui-se em uma obrigação do estado que deve corresponder aos Parâmetros Nacionais de Qualidade para a Educação Infantil (2006), o que implica em atender às especificidades que caracterizam essa etapa. Isso também implica estar de acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação Infantil (2006). Pensando na questão da adequação das redes municipais e o desafio da universalização da matricula na pré-escola até 2016, podemos destacar o Programa ProInfância, criado em 2007 para prestar auxílio financeiro aos municípios para a construção de equipamentos de ensino - instituições de educação infantil – em acordo com os parâmetros
de
qualidade
acima ressaltados. que
atribuição
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
Ressalva-se, contudo,
Emenda Constitucional 59/2009
é
I- educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada
do
inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não
município
tiveram acesso na idade própria; II- progressiva universalização do ensino médio gratuito; III- atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV- educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;
LDB (9394/1996)
34
proporcionar as condições
Art. 4º. O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: I- ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II- progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
essa faixa etária. Atendimento este que, levando em conta o Art. 5º das DCNEI, se dê em instituições que se “caracterizam como espaços institucionais
não
domésticos
que
constituem estabelecimentos educacionais
[...] IV- atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;
básicas de atendimento a
públicos ou privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle social”. Em se tratando da
Proposta Pedagógica, esta deve estar de acordo com o Art. 9º das DCNEI, que indica que esses espaços devem proporcionar as condições para as crianças vivenciarem seu tempo de vida, a sua infância, por meio dos eixos Interações e Brincadeira. Isso requer a constituição de um ambiente em que a criança possa se relacionar com seus pares e realizar suas atividades de brincadeira, por meio da diversificação do contexto lúdico e acesso à experiências diversas. Contudo, o que vemos, em grande parte dos municípios brasileiros, revela a fragilidade da concepção de educação infantil. Infelizmente, tal fragilidade é permissiva ao equívoco de antecipação da escolarização, como ideia de preparação das crianças na pré-escola para a entrada no ensino fundamental. Com isso, vemos a invasão de conteúdos sistematizados, sobrepondo as possibilidades de construção de conhecimentos significativos aos grupos de crianças, que ficam à mercê do arbítrio adulto. Ou ainda, a falta de estrutura em escolas que passam a atender a faixa etária pré-escolar, em salas formatadas para ensino fundamental - carteiras enfileiradas e quadro negro. Não há adequação do mobiliário ou quaisquer possibilidades de diversificação do ambiente, além da ausência de espaço externo. Faltam elementos que propiciem vivências próprias à educação infantil, por meio do eixo Interações e Brincadeira. A obrigatoriedade, fato consumado na política nacional para a Educação Básica, não
LEI 12.793/2013 (altera LDB)
pode inibir as conquistas
35
Art. 4º. O dever do Estado com a educação escolar pública
realizadas em prol do direito
será efetivado mediante a garantia de:
à educação de qualidade, por
I - educação básica obrigatória e gratuita dos
todas as crianças brasileiras de 0
4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade,
a 5 anos, conforme a LDB 9394/96,
organizada da seguinte forma:
alterada pela Lei 12.796/2013.
a) pré-escola;
Para o enfrentamento dessa questão, no
b) ensino fundamental;
entanto, será fundamental ao poder público
c) ensino médio;
rever o financiamento destinado à Educação
II - educação infantil gratuita às
Básica, em especial à Educação Infantil. Essa etapa
crianças de até 5 (cinco) anos de
requer profissionais especialistas, sob condições
idade;
de trabalho que permitam o atendimento que a faixa etária demanda, bem como um espaço-ambiente com equipamento adequado aos parâmetros de qualidade para a Educação Infantil- a fim de favorecer as Interações e a Brincadeira.
E, não menos importante para pensarmos uma oferta de qualidade, cabe aos dirigentes municipais promover a discussão e reflexão, por parte de todos os atores envolvidos, acerca das concepções de criança, infância e Educação Infantil, que alicerçam as práticas pedagógicas nesse âmbito educacional.
DANIELE
MARQUES
(COEDI-MEC)
e
VIEIRA doutoranda
é
pedagoga, na
área
consultora de
do
educação
ProInfância na
UFPR.
RESENHA DO LIVRO
36
A
grande roda histórias
de
Escrito e oganizado por Milton Karam e Nélio Spréa
“Para começar, vamos formar uma roda. Uma história vou contar...”
Fruto de um projeto idealizado pela Parabolé Educação e Cultura, o livro é
Não é preciso repetir esse convite para composto por 12
narrativas
que a roda logo esteja pronta. Para que, inspiradas em 17 numa ansiedade crescente, ouvidos sejam histórias. As histórias, apurados e o silêncio logo se instaure em selecionadas dentre expectativa.
as
mais
de
100
Um costume tão simples de tradição contadas a Nilton oral que perpassa tempos e lugares, mas Nascimento
FIQUE POR DENTRO
que aproxima contador e ouvintes num muitas
e
em diversas
envolvimento social e afetivo. Uma rodas, fazem muito tradição que ora se sustenta naquilo mais do que nos que “se ouviu dizer”, ora naquilo envolver,
como
que “salta” de algumas páginas afirmam os escritores. impressas. E por que não juntar as Afirmo isso porque, duas coisas? Formar uma roda para ao iniciar a leitura dos se encantar com histórias que foram textos, senti-me em meio escutadas, mas que agora emergem a uma roda com várias pessoas das páginas de um livro?
junto a mim. Por todo o tempo em
É o que nos provoca a fazer que tive o livro em minhas mãos não mais a
recém-lançada
publicação
da lia, apenas ouvia.
Editora Parabolé, A Grande Roda de
Escutava personagens contando seu
Histórias, escrita e organizada por conto, sua história ou seu depoimento Milton Karan e Nélio Spréa. Ela nos e me emocionava, me comprazia e me faz querer sentar numa roda e ouvir, entristecia também. Partilhei das emoções, contar e ler.
dos sentimentos, aprendi e recordei.
O livro fez-me recordar: rememorar preocupe, deixe-se levar. Afinal, você foi as histórias contadas por minha avó, contagiado... rememorar situações semelhantes às contadas, rememorar as rodas das quais participei. O encanto da obra está na simplicidade
IMAGENS DA GRANDE RODA DE HISTÓRIAS... LIVRO E PROJETO: PARABOLÉ EDUCAÇÃO E CULTURA
das histórias que misturam fantasia e realidade. No cuidado com os detalhes, na possibilidade de
“passear”
pelos
recantos
do
Paraná.
Na
sequência
das
narrativas
que,
aparentemente, não apresenta um propósito. impede
Nada que
se
comece a leitura pelo último conto e alterne-se entre um e outro dos 12 escolhidos. Porém, não se surpreenda se só descobrir quem são os passageiros mencionados pelo taxista – personagem da oitava história – ao fim da leitura de todo o livro.
Sendo assim, reforço e amplio o
convite dos autores: mais do que se sentir em casa, sinta-se à vontade para recontar essas e muitas outras histórias por aí. E, se um ponto você aumentar, não se
Resenha de FRANCIELE FERREIRA FRANÇA, mestre em história da Educação pela UFPR.
37
38
VIREI O BAÚ
memórias da educação infantil
OS MEUS, OS SEUS, OS NOSSOS BRINQUEDOS No movimento de revirar o baú das minhas o artigo sobre os memórias em busca dos brinquedos que brinquedos
relembra
por mim passaram, lembrei-me da poesia com saudosismo os objetos de Manoel de Barros. Especialmente do utilizados “há sessenta anos atrás”: boneca trecho em que diz: “sou hoje um caçador de pano, carneiro de papelão e algodão, de achadouros da infância. Vou meio galos, cães felpudos e cigarras. As novidades dementado e enxada às costas cavar no meu industrializadas eram a “boneca parisiense” quintal vestígio dos meninos que fomos”. (louça, biscuit, madeira, borracha, pelica), Ao pegar a enxada da memória, lembro os brinquedos de metal (soldados, trens, do meu videogame Odyssey, dos bonecos estradas de ferro, aparelhos de cozinha), os da Playmobil, da boneca de pano (do meu de chumbo (espingardas, pistolas, soldados) tamanho) feita pela minha avó materna.
e os de madeira (carrinhos, bonecos e bichos,
Amplio a escavação para o quintal alheio e tambores). Essa divisão entre o brinquedo de me deparo com jornais e revistas no Paraná, antes e o de agora acaba por demonstrar uma entre meados do século XIX ao XX. Eles me ampliação do mercado iniciada no século XIX, informam, por exemplo, que “o brinquedo com a entrada de uma indústria especializada é agora negócio vasto, importante, em um território antes dominado pela
VIREI O BAÚ
avultado e tem armazéns que são fabricação artesanal das miniaturas. Pode templos, e fábricas que são grandes não ter sido uma relação harmoniosa, mas os indústrias”. Tal afirmativa, que para nós brinquedos artesanais há tempos coexistem pode parecer atual devido ao apelo com os industrializados, mesmo que em midiático que caracteriza o comércio do menor escala de produção. brinquedo como um negócio rendoso no
Desvio a enxada para o lado e encontro
século XXI, foi publicada em setembro de “uma casa de brinquedo” entre o número 1888 no jornal paranaense O Dezenove de comércios e serviços em Curitiba, no ano de Dezembro. O interessante é que de 1906 (Revista Almanach do Paraná).
Meu faro de caçador se aguça. Desejo mais. de 1980 começou a fazer parte do mundo dos Anseio por imagens dos brinquedos. E eis brinquedos. Que sensações o manuseio de que encontro a fotografia a seguir.
tais materiais eletrônicos e sintéticos podem
Paraná, Revista do Povo, 10/03/1917. Fábrica de Brinquedos Gravina.
Uma menina com os brinquedos ao seu despertar nas crianças? Questionamento que redor. Cena que poderia se passar tanto em já rondava nossos antepassados, no século um ambiente familiar quanto no educativo, XIX e que ainda é atual. Deixo o convite para se considerarmos a criança pequena na cada um escavar suas memórias e realizar educação infantil. Imagem que nos possibilita individualmente a comparação dos seus demarcar o brinquedo como objeto e o brinquedos com os meus, para pensarmos brincar como a ação da criança sobre o juntos o futuro dos nossos brinquedos. mesmo. A foto ainda permite a comparação entre os brinquedos representados com os
QUER SABER MAIS?
que nós utilizamos na infância e com os que disponibilizamos para as nossas crianças, seja na família ou na escola. Algumas permanências são evidentes: ainda temos carrinhos, barquinhos, cavalos, e
u iq
cl
mesmo que em outros formatos e modelos. As
ui
aq
diferenças são gritantes quando nos voltamos para a tecnologia utilizada atualmente, principalmente o uso do plástico e materiais sintéticos e a eletrônica, que desde a década
Etienne B.L. Barbosa é doutoranda em História da Educação no PPGE-UFPR
39
Contribua para a RevirEI ficar cada vez melhor: participe da nossa pesquisa de opinião.
são apenas algumas perguntas para sabermos o que você achou da nossa 1a edição... CLIQUE AQUI!