RevirEI Nº3 - Jul./Dez. 2015

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ReVirEI

REVISTA VIRTUAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL No 3 - JUL/DEZ - 2015

Fique de olho!

ENTREVISTA

Indicações de livros, filmes e contos.

Um rico diálogo com Rosa Batista sobre a rotina na Educação Infantil.

VENDO E REVENDO

Dois textos para pensar sobre o planejamento: datas comemorativas e o papel do professor.

virando o mundo

O jogo livre em uma experiência espanhola.


No aeroporto o menino perguntou: - E se o avião tropicar num passarinho? O pai ficou torto e não respondeu. O menino perguntou de novo: - E se o avião tropicar num passarinho triste? A mãe teve ternuras e pensou: Será que os absurdos não são as maiores virtudes da poesia? Será que os despropósitos não são mais carregados de poesia do que o bom senso? Ao sair do sufoco o pai refletiu:

Com certeza, a liberdade e a poesia a gente aprende com as crianças. E ficou sendo.

Manoel de Barros

I E r i v e R

Revista Virtual de Educação Infantil Dicas para sua leitura: use o modo de tela cheia e aproveite para clicar nos links. EXPEDIENTE Coordenação: Catarina Moro Edição e diagramação: Ana Júlia Rodrigues Colaboradores: Etienne B. L. Barbosa, Franciele Ferreira França, Gioconda Gigghi, Marina Feldman. Ilustrações: Daniel Garson Cabral NEPIE - Núcleo de Pesquisas e Estudos em Educação Infantil Setor de Educação - UFPR UFPR - Universidade Federal do

Paraná


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Editorial Acaba de sair o terceiro número da ReVirEI. Nesse número trazemos temas distintos como o planejamento, a avaliação, o trabalho com a fotografia com as crianças, entre outros. Contamos com o apoio de muitos e queridos colaboradores aos quais somos sempre gratas. Rosa Batista participou da

Entrevista, na qual trata sobre a rotina na

Educação Infantil, para que ela não seja rotineira. A seção Vendo&Revendo expõe ideias relacionadas ao planejamento: o papel do professor, de um lado e o trabalho ou não sobre as datas comemorativas, de outro. No Saberes

do Cotidiano

acompanhamos

dois relatos: o das professoras Patrícia e Roberta, do CMEI OsnyDacol, e o das pedagogas Julice, também professora da UDESC, e Josiane. Fique por Dentro comenta o livro de Rosy Greca “A canção para criança”; enquanto Virei o Baú instiga nossa curiosidade sobre a história da nossa instituição ou rede. Nas seções O que diz a lei? e O que propõe a política! (reviramos o título dessa seção para que tivesse mais apropriação ao seu conteúdo) está tematizada a avaliação em educação infantil e os planos - nacional, estadual e municipal - de educação e também a ANEI. Virando o Mundo se refere o trabalho e as ideias espanholas que recolocam a importância do

jogo livre no planejamento e no currículo da educação infantil. As subseções da Fique de olho mostram um pouco do que se tem feito e daquilo que podemos acessar para ampliar nossos olhares, escutas e fazeres em diferentes frentes relativas ao cuidado e a educação das crianças pequenas. Fechando esse número da Revista, na seção Vi(r)agens e Vir-ações Poéticas, um trecho da poesia do fantástico Gianni Rodari, autor italiano que revira,reaviva, reinventa a relação da criança com o texto. A todos os participantes dessa Edição nosso agradecimento pela parceria e pelo trabalho aqui dedicado. Depois da ReVirEI número 3, estamos já antenados para o número seguinte.

CATARINA MORO Dúvidas? Pedidos? Sugestões? Críticas? Entre em contato conosco pelo e-mail revirei.ufpr@gmail.com


Nossos Col

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A Patrícia Teixeira atua na educação infantil há 9 anos. É formada em Pedagogia pela UFPR e pós-graduada em Educação Especial. Adora viajar e registrar os momentos vividos através da fotografia. O que mais a emociona é viajar pelo universo infantil! A Roberta Portela é professora de Educação Infantil há 10 anos, tem como formação o magistério pelo Instituto de Educação do Paraná e atualmente cursa Pedagogia. Ela nos conta que: “A educação infantil é algo que me encanta por sua riqueza e simplicidade!” A Julice Dias é doutora em Educação e professora do Departamento de Pedagogia e do PPGE da Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC. Trabalha com formação de professores e assessoria as Prefeituras do Estado de Santa Catarina, com ênfase na educação de crianças de 0 5 anos.

Josiane Chiminelli é pedagoga, especialista em Leitura e Literatura, professora concursada do município de Gaspar. Atualmente atua como Diretora de Educação Infantil na Secretaria Municipal de Educação da Gaspar. Todas elas contribuiram com seus

saberes para o nosso Saberes

do Cotidiano.

e p i u q a e A Catarina Moro, a Ana Júlia Rodrigues, a Marina Feldman, a Gioconda Ghiggi, a Franciele França e a Etienne Barbosa, todas apaixonadas pelas crianças e defensoras de uma Educação Infantil de qualidade, reviram ideias em todas as edições para construir uma RevirEI rica, bonita e interessante!


laboradores

o ã ç i d a E s s e N

A Angela Coutinho é pedagoga e estudiosa dos bebês. É professora e coordenadora do curso de Pedagogia da UFPR, pesquisadora do NEPIE e membro do FEIPAR/MIEIB. Da sua infância guarda as lembranças das andanças de bicicleta, que até hoje a inspiram a pensar esse tempo de vida como um tempo de liberdade, o que também marca a sua militância pelos direitos das crianças a uma infância plena e a uma educação infantil de qualidade. Elas duas contribuiram para o nosso Vendo e Revendo desta edição. A Heloísa Saito é professora do Departamento de Teoria e Prática da Educação da Universidade Estadual de Maringá. Mestre em educação pela mesma universidade e doutora em educação pela Universidade de São Paulo. Pesquisadora do CIEI-USP e GENTEE-UEM. É coordenadora do subprojeto PIBID Pedagogia sede do foco Educação Infantil e membro do FEIPAR/MIEIB. Ticiane B. Marassi é pedagoga e doutora em educação pela UFSC. Pesquisadora Tecnologista em Informações e Avaliações Educacionais no INEP, pesquisa e executa avaliações em larga escala para a educação básica. Nessa edição, ela contibuiu com a O que dizem as políticas? O Daniel Cabral é ilustrador de livros infantis há muitos anos e já ilustrou mais de uma centena de livros. No seu trabalho tem o prazer de acompanhar a leitura de uma história, de um poema ou de uma letra de música buscando “imagens desse lugar tão elástico que é nossa imaginação, um lugar muito distante e muito próximo ao mesmo tempo, um lugar só meu e ao mesmo tempo de todo mundo, onde o possível e o impossível caminham de mãos dadas”. Tem dois livros publicados, Arapuca e O balão. Nessa edição da RevirEI estão algumas ilustrações que fazem parte desses livros.

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CAPA E SUMÁRIO: ILUSTRAÇÃO DE DANIEL CABRAL, DO LIVRO ARAPUCA, EDITORA POSITIVO.


6 10 14 24 32 42 44 46 48

FIQUE DE OLHO: Notícias da

UFPR e indicações culturais para enriquecer a sua prática. VIRANDO O MUNDO: O jogo livre e o planejamento sob um olhar espanhol. VENDO E REVENDO: Dois textos

para

pensarmos

no

planejamento. ENTREVISTA: Rosa Batista dialoga conosco sobre a rotina na Educação Infantil. SABERES DO COTIDIANO: as instituições de Gaspar-SC e uma experiência de fotografia. O QUE DIZ A LEI: Os planos de educação e a avaliação da Educação Infantil. O QUE PROPÕE A POLÍTICA: Saiba mais sobre a Avaliação Nacional da Educação Infantil. FIQUE POR DENTRO: Resenha do

livro

“A

Canção

para

Crianças”, de Rosy Greca. VIREI O BAÚ: A constiuição da rede municipal de Educação Infantil de Curitiba.

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Fique de OlhO... 6

...nos livros

(para ler com os pequenos) COZINHANDO NO QUINTAL Renata Meirelles Fazer comidinha com folhas, sementes, lama... a brincadeira favorita de muitas crianças retratada com belas imagens.

O Lucia Hiratsuka Com lindas ilustrações, e menina Orie e seus pais barque já publicou vários livros par prêmios, como o Jabuti de ilu mais sobre o trabalho dela n Aqui você tambem encont

As fotos dos pratos das crianças são acompanhadas de informações sobre os

MARIA GRALHA E ZÉ PINHÃO EM BU

ingredientes e o modo de preparo. O livro

SETE CORES Audrey Farah Depois da história que Vó do Ma Gralha chama seus amigos - Zé Pinhã o Quati, o Canário, sua cobra de estim - para viverem uma grande aventura: de sete cores. Um livro com belas ilus Luiz Rettamozo e Mateus Rettamoz

é resultado do projeto Território do Brincar. Editora Terceiro Nome.

...na internet DOBRAS DE LEITURA Peter O`Sagae Para seguir em frente e mais a fundo na literatura infantil, sugerimos uma visita no blog Dobras de Leitura. Neste espaço, Peter O’Sagae apresenta e comenta diversos livros para os pequenos.Ele é doutor em letras pela USP, tradutor, professor de literatura infantil e pesquisa as relações entre palavra e imagem.


ORIE (textos e ilustrações) este livro conta as aventuras da eiros pelos rios do Japão. A autora ra crianças, recebendo diversos ustração. Editora ZAHAR. Conheça no: www.luciahiratsuka.com.br. tra um depoimento da autora.

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USCA DO PEIXE DE

ato contou, Maria ão, o Lobo Guará, mação e a Perereca encontrar o peixe strações em 3D de zo. Editora Arte. PALAVRA CANTADA CANTIGAS DE RODA O DVD contém diversos clipes produzidos a partir das músicas do CD Cantiga de Roda (de 1996). São diversas cantigas folclóricas, mostrando o rico e importante repertório cultural do Brasil. Cada clipe do DVD foi feito por um artista. palavracantada.com.br

...nos filmes CORA CORALINA TODAS AS VIDAS Uma mistura de realidade e ficção: um documentário sobre os principais períodos da vida de Anna Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas, a poeta Cora Coralina. Filme dirigido por Renato Barbieiri, com participação especial de Camila Salles, que interpreta a sua trisavó aos 5 anos de idade. Confira o trailer.

GIOCONDA GHIGGI


Fique de OlhO... 8

...no que acontece

NOTÍCIAS DO NEPIE/UFPR

O Seminário Nacional sobre Avaliação de Contexto realizado em agosto deste ano foi organizado pela equipe do projeto “Formação da Rede de Infantil: avaliação de contexto” desenvolvido em parceria entre a UFPR, a UFRJ, UFMG, Udesc, MEC e as pesquisadoras italianas Anna Bondioli e Donatella Savio. A pesquisa dedicou-se ao desenvolvimento de metodologia de avaliação de contexto da educação infantil em uma perspectiva formativa e participativa. E, ao final do evento, os participantes aprovaram uma moção de apoio a Publicação da Portaria que Institui a ANEI – Avaliação Nacional da Educação Infantil, apresentada pelo INEP no encontro. Na seção “O que dizem as Políticas?” tem mais ifnromações sobre a ANEI!


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O NEPIE promoveu e organizou no fim do mês de novembro o I Colóquio História

da

Educação,

Cultura

Material:

Infância

Estudos

e

produzidos

por grupos de pesquisa da UDESC, UFPR e UNICAMP. Pensado como um grande encontro entre professores e alunos que compõem os três grupos de pesquisa, o evento teve como objetivo estreitar a comunicação e ampliar as discussões sobre temáticas de investigação da História da Educação, ao socializar os trabalhos produzidos no interior dos grupos. O encontro reuniu estudantes e professores do grupo coordenado pela professora Gizele de Souza (também coordenadora do NEPIE/UFPR), do grupo da professora Vera Lucia Gaspar da Silva provindo da UDESC e também do grupo tutelado pela professora Heloisa Helena Pimenta Rocha sediado na UNICAMP. O evento contou ainda com o lançamento de um E-book, organizado por três doutorandas pertencentes aos grupos de pesquisa, o qual é composto pelos textos produzidos pelos demais orientandos e pelas professoras para apresentação durante o colóquio. O destaque a ser dado é a participação da professora Cynthia Greive Veiga, importante pesquisadora da área de História da Educação, convidada a proferir uma conferência sobre a temática geral do encontro. Não deixe de acessar o e-book!

Clique aqui! E também em todas as outras palavras em azul espalhadas pela revista!


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Virando o mundo

Observar a transformação cotidiana do jogo livre Teresa Godall A experiência educativa de uma pedagogia mais humanista nos fala diretamente sobre a importância do jogo livre no planejamento e no currículo da educação infantil. No diálogo com as imagens, este artigo nos traz esta reflexão a partir da prática de uma instituição de Barcelona - Espanha. Apresentamos uma série de imagens extraídas da Escola Bressol Municipal El Gargot, na qual se torna visível esta transformação dos espaços, valorizando os momentos de cuidado e oferecendo às crianças uma continuidade em suas brincadeiras e atividades. Fotografias: Elisabet Tapias Tradução: Ana Júlia Rodrigues

Revisão: Catarina Moro e Daniele Vieira

As instituições de educação dos espaços que permita o jogo

infantil estão muito focadas na livre, para que as crianças possam conduta instrumental, ou seja, em aprender da forma como realmente atividades

de

aprendizagem coletiva de

e execução

individual,

na

qual todo o grupo realiza a mesma tarefa – variando, quando o

muito,

momento,

a

duração e o nível de exigência.

É

preciso

mudar

essa

motivação

para

uma

organização


necessitam.

uns jogam espontaneamente, outros

A pedagogia mais humanista podem ser atendidos individualmente.

acredita no bem-estar e na interação

Haverá mudança nas nossas

entre os sistemas: o contexto, o adulto, rotinas se pudermos observar e os materiais e a infância, com sua identificar os detalhes das ações curiosidade e iniciativas genuínas!

espontâneas dos pequenos. Estas

Esta curiosidade é o que gera ações não são sempre ordenadas.

os jogos de relação e os de encontro Por isso devemos distinguir quando o com o outro. O que vemos é que o material é abandonado. O que exige jogo e a atividade espontânea são uma reorganização para que possa tão necessários como os momentos ser valorizado de novo com alguma de cuidado! E apesar desta evidência, atividade intencional ou intensa. a escola muda pouco, ou muito lentamente.

Propomos

Uma ordenação excessiva rompe

a continuidade do jogo das maiorias simplesmente das crianças, porque assim elas têm

organizar os materiais para regular que recomeçar tudo de novo. Ordenar a relação individualizada. Enquanto e guardar materiais torna o jogo superficial.

Colocar

ordem não significa guardar,

mas

sim

reordenar e preparar o

material

de

um

modo sugestivo. Desta forma, as crianças são convidadas para a ação e a curiosidade e o adulto pode participar quando elas pedirem sua atenção.

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12

Virando o mundo

O

valor

da

continuidade

das os jogos baseados

atividades das crianças e dos adultos na

criatividade,

outros, entretanto, A

organização

cotidiana se

permite a continuidade da atividade a

inclinam ações

mais

espontânea das crianças, oferecendo- repetitivas.

Um

lhes livre acesso a materiais e espaços aporta a necessária com características e possibilidades criatividade diante de manipulação e para o jogo. dos Sabemos que, com liberdade e se

tempos

que

aproximam

uma boa distribuição dos materiais e o outro, uma segurança efetiva, selecionados, as crianças se mostram também igualmente importante em mais criativas, aventurando-se em um mundo repleto de incertezas.

insuspeitáveis propostas criativas e

O estudo de David e Apell

complexas. São igualmente válidos (2009) sobre a organização da vida das crianças em uma instituição concebida pela pediatra Emmi Pikler nos apresenta o perfil de um profissional que assume o cuidado de cada criança como a atividade principal.

Constrói-se

assim

uma rotina afetiva, contínua e


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privilegiada, em

uma

baseada estrutura

organizada e iniciada pelo adulto. O profissional assume o papel de transmitir os valores sociais e culturais durante os momentos de cuidado. Frequentemente

esta

qualidade

da relação cotidiana preocupa os profissionais, já que o resto do grupo pode ficar desatendido se os jogos e as brincadeiras não tiverem sido organizados de uma maneira regular e contínua.


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ENDO & ENDO

Vendo e Revendo: planejamento

RE

V

AS DATAS COMEMORATIVAS E AS PROPOSTAS PEDAGÓGICAS NAS INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL Angela Scalabrin Coutinho

Esse texto tem o objetivo de

Qual

a

relevância

das

datas

apresentar algumas questões para comemorativas para as crianças? É

provocar o debate e a reflexão sobre possível considerar a atuação das crianças as datas comemorativas nas propostas no planejamento e desenvolvimento pedagógicas

e

no

cotidiano

das das situações que envolvam as datas

instituições de educação infantil. Esta comemorativas? Que implicações - éticas, forma de organizar o trabalho tem uma políticas e estéticas - há no tratamento a história na área: durante algum tempo e/ estas datas? Para as famílias, é fundamental ou em algumas instituições, o modo de que as datas sejam trabalhadas? Por quê? organização do trabalho se dava mediante as datas comemorativas.

As respostas a essas questões podem dar pistas sobre a importância, ou não,

Contudo, atualmente temos alguns de considerar as datas comemorativas indicativos do porquê não organizar o nos planejamentos. Também devem ser trabalho pedagógico tomando por base observados os princípios do artigo 6º das essas festividades. São eles:

Diretrizes Curriculares Nacionais para

- elas seguem um calendário marcado a Educação infantil (2009): “I – Éticos: principalmente religiosas,

por

vinculadas

comemorações da quase

VENDO exclusivamente a uma única religião;

autonomia,

da

responsabilidade,

que da solidariedade e do respeito ao bem comum, ao meio ambiente e às diferentes

- a proposta normalmente parte culturas, identidades e singularidades.

exclusivamente dos adultos;

II – Políticos: dos direitos de cidadania,

- e não há continuidade entre as do exercício da criticidade e do respeito

atividades propostas.

à ordem democrática. III – Estéticos:


da sensibilidade, da criatividade, da não se faz possível. Portanto, se essas

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ludicidade e da liberdade de expressão “comemorações” forem feitas de forma nas diferentes manifestações artísticas e desarticulada de uma proposta de longo culturais” (BRASIL, 2009, p. 2). Nessa

perspectiva,

como

prazo, provavelmente não terão significado garantir para as crianças. Assim, também não terão

o respeito ao bem comum, quando significados o desenho pintado, o cartaz comemoramos, por exemplo, o dia dos confeccionado ou qualquer outro produto pais com crianças que não partilham dessa resultante da proposta do/a professor/a.

REVENDO

figura familiar, ou a páscoa com quem não Ou seja, trabalhar o Dia do índio, a Semana tem crenças religiosas que a concebam? Ou da Árvore, da Pátria, etc, terá muito mais ainda, quando se propõe “lembrancinhas” sentido para os adultos do que para as

que homogeneízam papéis e ritos sociais crianças, as quais passarão todo o tempo que são heterogêneos?

da educação infantil vivendo de forma

Quanto ao exercício da criticidade, os repetitiva as mesmas propostas. mesmos exemplos utilizados acima, e

Por fim, chegamos ao princípio estético

vários outros, servem para a reflexão. da criatividade. Ao remeter ao que Presente para o dia dos pais, para a páscoa, geralmente se produz com as crianças para o dia das crianças, para o natal... e nas datas comemorativas, identificamos e a sociedade capitalista tão bem fazem: instigamos as crianças a consumir. E o que dizer das comemorações que fazem vistas grossas às verdadeiras condições históricas sociais do que se comemora, como: Dia do Índio, Dia do Trabalhador, dentre tantos outros. Ao se tratar da educação e cuidado de crianças de 0 até 6 anos, sabe-se da imprevisibilidade dos desdobramentos das propostas: por vezes conseguimos tratar de assuntos de forma mais profunda e crítica e em outros momentos isto

ilustração de daniel cabral, arapuca, editora positivo

assim reproduzimos aquilo que a mídia o quanto essas propostas podem ser


VENDO 16

limitadoras da criatividade humana. Fazer clareza dos objetivos da educação que camisa de papéis coloridos com uma queremos realizar. Além de ponderar frase da criança, porta lápis, flanela com a que diante das produções teóricas e dos “mãozinha” para entregar ao pai (quando conhecimentos produzidos na instituição tem a sua presença), corações e rosas de já é possível perceber que os modelos papel, ou um avental ou pano de prato homogêneos não cabem mais à educação. para as mães (quando também se tem a

Trabalhamos com atores sociais, que

sua presença)... Alguém perguntou o que diferem quanto a sua religião, sua etnia, as crianças acham disso? Ou ainda: quem classe social, bem como, trazem marcas de indicou que elas gostariam de dar esses seu gênero e cultura, então como entregar presentes?

camisas com gravatas - ainda que de papel

Se a resposta for “as famílias esperam!”, - a todas as crianças para que as levem a então será necessário identificar tudo o que seus pais? as famílias esperam e que as instituições não julgam interessante. Verificamos com

POR ONDE PODEMOS CAMINHAR?

isso que há práticas possíveis e outras não, e que mediante o diálogo constante com

Embora não se defenda um planejamento

as famílias é possível ouvi-las e argumentar baseado

em

datas

comemorativas

sobre nossas escolhas. Veremos também seria um tanto ilusório pensar que uma ilustração de daniel cabral, arapuca, editora positivo

que temos que ter, enquanto profissionais, instituição educativa poderá passar alheia as datas que constituem a vida dos sujeitos. As crianças provavelmente trarão em seus repertórios

informações

e

demandas voltadas às datas comemorativas e por isto, elas não poderão ser negadas. A questão é: de que modo podem ser selecionadas e que encaminhamentos podem ser dados às datas consideradas no planejamento?


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Para buscar pistas para esta questão planejamento baseado em alguma data, há de se partir da história da instituição, deve-se partir dos princípios apresentados da comunidade onde ela se encontra no

início

deste

texto,

bem

como

e ponderar se as datas selecionadas compreender a instituição como uma são importantes para o pertencimento “comunidade de aprendizes” (BRUNER, cultural da instituição e para aproximá-la 1986 apud GANDINI; GOLDHABER, 2003, da comunidade. Há de se ter também um p. 154). Nela, a troca de informações e o olhar atento e uma escuta aguçada das diálogo entre os/as profissionais a partir crianças, bem como a análise no coletivo das observações e registros das crianças dos registros de cada grupo, pois só assim impulsionam o desenvolvimento de um se poderá compreender o sentido que trabalho pedagógico de qualidade, no terá uma festa de carnaval na instituição qual as dimensões humanas são a égide ou a produção de algum presente no dia de uma Pedagogia da Infância. dos pais, etc.

REVENDO

Outro elemento a ter atenção é a fragmentação que pode caracterizar as

Para saber mais:

propostas com datas comemorativas, pois

BONOMI, Antonio. O relacionamento

há um entorno que alimenta o desejo de entre educadores e pais. In: BONDIOLI, tratar do assunto no período previsto. Ou Anna; MANTOVANI, Susanna. Manual seja, tratar do folclore só em agosto,; ou de educação infantil de 0 a 3 anos. Trad.

dos povos indígenas só em abril, quando Rosana Severino Di Leone e Alba OlmiPorto eles são assunto na TV, nas revistas, nos Alegre: ArtMed, 1999, p. 161-172. jornais. Sem contar os assuntos que são

BRASIL. RESOLUÇÃO Nº 5, DE 17

esporádicos, como Olimpíadas ou Copa DE

DEZEMBRO

DE

2009.

Diretrizes

do Mundo. Também não faz sentido Curriculares Nacionais para a Educação presentear os pais no mês de agosto ou Infantil, 2009. as mães no mês de maio e não ter outra

GANDINI, Lella; GOLDHABER, Jeanne.

forma de comunicação com eles durante Duas reflexões sobre a documentação. os outros momentos do ano. O

fato

é

acontecimentos

que

In: GANDINI, Lella; EDWARDS, Carolyn.

desconsiderar

torna-se

os Bambini: a abordagem italiana à educação

impossível, infantil. Trad. Daniel Etcheverry Burguño.

contudo ao optar por desenvolver um Porto Alegre: ArtMed, p. 150-169, 2003.


VENDO 18

“Um olhar que não esteja

naturalizado pela mesmice da r

“Práticas que não limitem a criatividade humana.”


“Cultivar a sensibilidade.”

19

rotina.” “Um trabalho pedagógico de qualidade, no qual as dimensões humanas são a égide de uma Pedagogia da Infância.”

“Olhar para a especificidade da criança pequena.”

REVENDO


20

Vendo e Revendo: planejamento

ENDO & ENDO

O ato de planejar na educação infantil: conhecimentos e sensibilidade Heloisa Toshie Irie Saito

PLANEJAR... aparentemente uma longo da história da humanidade por

palavra fácil de compreender, mas uma meio da mediação do mais experiente, ação complexa de se efetivar! Apesar da no caso o professor (VIGOTSKI, 2001).

V

complexidade, devemos entender que Subsidiados nessa defesa, defendemos

RE

é possível atingir patamares esperados que discutir sobre o planejamento impõe por meio do ato de planejar. Quando a necessidade do professor se enxergar pensamos nessa tarefa, devemos sempre como alguém relevante para o processo

ter em mente um objetivo a ser alcançado de ensino e aprendizagem, como alguém e uma proposta de percurso para se atingir que direcionará uma ação que é educativa tal objetivo.

e sistematizada.

O planejamento é uma postura

Para que isso se efetive de modo

que permite uma maior organização profícuo, sustentamos a ideia de que refletir das diferentes proposições educativas acerca do planejamento para a educação e que subsidia uma prática pedagógica infantil exige do professor um olhar para mais consciente e direcionada para a especificidade da criança pequena. Um que a mediação docente se efetive da olhar que entenda a criança como um melhor maneira possível para alcançar ser em desenvolvimento e que a perceba a aprendizagem e o desenvolvimento como um sujeito histórico e social que humano. Em última instância, o ato de pode aprender desde que tenha situações

VENDO

planejar é uma escolha que pode ou não para agir e refletir, produzindo assim contribuir para uma formação humana cultura. Um olhar que perceba a criança emancipatória.

no espaço educativo como alguém que

Partimos do princípio de que a merece nosso respeito e profissionalismo.

prática pedagógica é condição para o Um olhar que não esteja naturalizado pela processo de humanização e que por mesmice da rotina imposta sem reflexão isso necessita ser organizada de modo sobre o cotidiano das instituições de adequado e cuidadoso para que a criança educação infantil. Um olhar que consiga se aproprie da cultura elaborada ao articular o cuidar e o educar. Um olhar


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que consiga entender que cada criança é de idade. única e ao mesmo tempo diversa... Enfim, • saber o que trabalhará com as crianças: um olhar que seja sensível e pensante de nada adianta conhecer acerca do (WEFFORT, 1995)!

desenvolvimento infantil, a historicidade

Para o desenvolvimento desse olhar, e os documentos legais voltados para

dessa postura profissional, acreditamos a educação infantil se o professor não ser necessário ao professor que atua na tiver clara a compreensão de quais

REVENDO

educação infantil:

aprendizagens ele deverá proporcionar

• conhecer e compreender as crianças de para as crianças. Isso significa que 0 a 6 anos: o professor que planeja um o

professor

deve

compreender

as

trabalho pedagógico para a especificidade diferentes áreas do currículo desse da educação infantil deve saber acerca nível de ensino e, além disso, necessita

do desenvolvimento infantil do grupo ampliar seu conhecimento por meio de no qual atua para melhor entender estudos constantes acerca delas, pois suas necessidades. Assim, ele consegue só desenvolvemos no outro aquilo que planejar ações que realmente contribuam possuímos! para o processo de reflexão das crianças, • conhecer propostas metodológicas de oportunizando, um adequado processo de sucesso no espaço da educação infantil: aprendizagem e desenvolvimento.

saber que é possível desenvolver práticas

• conhecer a história e os documentos legais pertinentes da área de atuação: para

desenvolver

uma

atuação

mais consciente se faz necessário o professor entender a história de constituição do nível de ensino em que atua e as compreensões que nortearam a ação docente no decorrer da história. Também precisa conhecer os documentos que direcionam a prática pedagógica e as legislações que respaldam a ação com as crianças de até 6 anos

ilustração de daniel cabral, arapuca, editora positivo


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diferenciadas que permitem a emancipação divulgado pela mídia como sendo positivo.

VENDO

das crianças por meio de uma educação • planejada e que existem experiências de um

compreender processo

sucesso é algo que instiga o desejo do planejamento: professor de buscar alternativas diferentes diferentes

de

a

avaliação

como

ressignificação

defendemos

propostas

que

realizadas

do as com

para ressignificar suas práticas. De modo as crianças só se ampliam a partir do que ele se perceba como alguém capaz de momento que os professores possuem instigar e possibilitar aprendizagens.

oportunidades para refletir sobre elas. É

• desenvolver um repertório cultural: nesse sentido que defendemos a avaliação para o professor poder trazer ao espaço como uma maneira de redimensionar da educação infantil propostas que a atuação docente, pois ela deve se emancipem, é fundamental que tenha constituir como um momento em que o para si uma cultura ampliada que lhe professor analisa sua atuação e a de sua permita pensar em formas diferenciadas turma, bem como a compreensão que de expressão artística e que lhe garanta foi elaborada por suas crianças. Somente apreciar o belo, o mais elaborado. Caso então é possível propor ou não novas contrário suas proposições sempre ficarão reflexões acerca do trabalho desenvolvido. à mercê do que aparentemente é bom e

A partir de tais compreensões é

ilustração de daniel cabral, arapuca, editora positivo

possível que o professor construa para si o entendimento de que o planejamento é algo crucial no espaço da educação infantil. E de que ele garante a efetivação de uma prática pedagógica emancipadora a partir do momento que desenvolve apropriações da cultura constituída ao longo da história da humanidade através de uma ação planejada, consciente e que possibilita diferentes mediações por parte do professor. Vale ressaltar que o planejamento só servirá para isso se, enquanto profissionais, tivermos um


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comprometimento social com as crianças Ostetto (2000, p. 177) afirma que: “[...] da educação infantil e acreditarmos na Planejamento pedagógico é atitude crítica ideia de que por meio de nossas ações do educador diante de seu trabalho. conseguimos propor uma prática que [...] permite ao educador repensar, priorize a necessária articulação entre o revisando, buscando novos significados cuidar e o educar por meio dos dois eixos para sua prática pedagógica”. Assim, norteadores (interações e brincadeiras). se o professor da educação infantil Além de acreditarmos em uma prática que possuir tais características conseguirá permita a emancipação humana através de atribuir essa dimensão crítica ao seu uma proposição que desenvolva diferentes planejamento, tornando-o instrumento de linguagens, leituras e compreensões do emancipação humana e de reflexão para o mundo.

aprimoramento de sua ação pedagógica.

Somado a isso: é preciso cultivar

a sensibilidade! Sensibilidade no olhar,

Para saber mais:

sensibilidade nas ações, sensibilidade nas OSTETTO, L. Planejamento na educação relações humanas! É urgente enxergarmos infantil: mais que a atividade, a criança as crianças a partir de um sentimento em foco. In: OSTETTO, L. (org.) Encontros de proximidade! Somente conseguimos e encantamentos na Educação infantil: planejar ações de qualidade quando nos partilhando

experiências

de

estágio.

colocamos no lugar do outro e avaliamos Campinas, SP: Papirus, 2000. se determinada proposta nos causaria VIGOTSKII,

L.

S.

Aprendizagem

e

benefícios. Isso significa considerar a desenvolvimento intelectual na idade criança como alguém importante no escolar. In: VIGOTSKII, L. S.; LURIA,

REVENDO

espaço educativo. Em outras palavras, é A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, ter empatia!

Diversos

sensibilidade

desenvolvimento e aprendizagem. São

conhecimentos são

e Paulo: Ícone, 2001. p. 103-119.

características WEFFORT, M. F. Educando o olhar da

prementes num professor, pois auxiliam observação. In: WEFFORT, M. F. (Org.) enormemente para a constituição de um Observação

-

Registro

-

Reflexão:

planejamento de qualidade bem como instrumentos metodológicos I. São Paulo: para sua efetivação e sua avaliação. Espaço Pedagógico, 1995.


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ROSA BATISTA: sujeitos crianças e a rotina texto: marina feldman ilustrações: francesco tonucci

Quando a gente conhece a Rosa Batista pode ver logo que, além de catarinense, ela

ENTREVISTA

é professora de Educação Infantil até a alma. Está no jeito que ela fala, no modo que pensa e em seu olhar bem atento para as instituições… Mas, além disso, ela também já foi professora da UFSC e é pesquisadora do NUPEIN – Núcleo de Estudos e Pesquisa da Educação na Pequena Infância. Hoje em dia está fazendo um Pós-Doutorado sobre a História da Educação Infantil, mas com a RevirEI ela conversou mesmo sobre o que percebeu quando fazia sua pesquisa de mestrado. Na época, o estudo sobre a rotina estava apenas começando a surgir, os pesquisadores do NUPEIN discutiam o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil e começavam a se aproximar da sociologia da infância. Aí… Bom, vamos deixar a própria Rosa nos contar?

Como foi essa sua descoberta da “lei da educação infantil, a indissociabilidade rotina”?

entre educar-cuidar, a criança como sujeito

Na década de 1990 eu era professora de direito e a infância como categoria da pré-escola e já vivia na minha prática social,

heterogênea,

produtora

cotidiana um embate com essa lógica de cultura. Entendíamos que era organizacional do tempo e do espaço, necessário pesquisar os modos como porque percebia uma semelhança com se organiza o cotidiano da educação a lógica organizacional da escola, onde infantil. os alunos realizam as mesmas atividades

Já no início da pesquisa começamos a

ao mesmo tempo e no mesmo lugar, a perceber que não era possível olhar só professora é o centro e as crianças são pros adultos. Se a gente estava dizendo alunos receptores de conteúdo. Era que a criança é um sujeito de direitos preciso problematizar essa proximidade da que produz uma cultura infantil, Educação Infantil com o modelo escolar: então era preciso olhar para elas para o processo de seriação, sequenciação, compreender os modos como usam o hierarquização e uniformização. Ao mesmo tempo, no NUPEIN, iniciamos

tempo – espaço da creche. A pesquisa foi realizada numa

estudos referentes a especificidade da creche de Florianópolis, num grupo de

TON


crianças de 3 e 4 anos, que permaneciam de outro jeito. Se as minhas crianças não na creche 10 a 12 horas diárias, com uma dormirem elas vão acordar os outros, que professora e uma auxiliar. A professora estão nas outras salas. Essa professora também vivia um conflito em relação a vivia um conflito entre a ideia do direito da rotina estabelecida, pois estava fazendo o criança e a lógica imposta pela instituição, exercício de ouvir as crianças e respeitá-las atrelada muito mais ao controle do que a nas suas temporalidades, mas ao mesmo atenção às crianças. tempo se sentia impotente diante daquela

É nesse sentido que muitos professores

lógica de organização. Ouvir as crianças me perguntam: Rosa, mas onde é que demandava muito mais tempo.

eu vou pra mudar a lei da rotina? Em

Outra questão que incomodava a todas as instituições que eu trabalhei é professora era que se fazia tudo no a mesma rotina e a gente não consegue mesmo tempo e no mesmo lugar. E a mudar, porque isso já está estabelecido. professora dizia: eu sei que nem todas A lógica organizacional dos tempos e as crianças estão com sono ou com fome espaços estabelecida na forma de rotinas neste horário, mas eu não posso fazer não pode ser modificada a partir de

NUCCI - FRATO, 40 anos com olhos de criança - Artmed

uma vontade individual, mas a partir de um projeto da instituição que precisa compreender a criança a partir de outra perspectiva e a instituição como lugar de experiências infantis diversificadas, pautadas nas linguagens, na brincadeira e nas interações. Pensando nisso, queria ler uma frase tirada de um texto seu e te mostrar uma imagem. “Nessa perspectiva, educar tem como objetivo frear a imaginação, a fantasia, controlar o movimento, regular as múltiplas manifestações infantis, uniformizar suas temporalidades, desejos e sonhos.”

25


A imagem mostra o que se passa no

Fala mais pra gente dessa diferença

pensamento das crianças, mas quando entre lidar com o sujeito-criança e o o cotidiano está organizado na lógica da sujeito-aluno, e das potencialidades de atividade ela só pode fazer uma coisa repensarmos essa relação. de cada vez. As crianças criam enredos,

Ainda ouvimos profissionais falarem dos

imaginam e fantasiam, brincam a seus aluninhos. O que isso significa? A

ENTREVISTA

26

partir do que conhecem. Quando uma palavra não muda nada? Quando a criança criança desenha ela inventa, recria, é colocada na condição de aluno, ela precisa troca ideias com seus pares sobre a se portar com determinadas atitudes sua produção, amplia seus repertórios e comportamentos que são esperados e isso exige muito mais tempo. A pelos adultos. Pode ser uma estratégia fantasia, a imaginação e a brincadeira de controle, uma vez que o bom aluno é são dimensões que exigem outra sempre aquele que é ordeiro, que termina temporalidade e outra espacialidade.

A

temporalidade

que

ainda

as atividades na hora certa, que acata

está as regras, que não chora, não faz birra...

estabelecida é aquela do produto. Era Isso é tão sério que nos leva a dizer que muito comum o cotidiano ser planejado por crianças de cinco datas comemorativas. Então, você tinha anos de idade já são 15 crianças que desenhavam o mesmo grandes. Criança de Papai Noel, as vezes com as mesmas cores. 5 anos não chora Nessa lógica temporal, 40 minutos é o mais. Como você tá suficiente. A lógica da atividade é também fazendo isso, você já uma estratégia de controle. Se você define é grande! Mas são o tempo da atividade, tem mais condições crianças que estão de prever o que vem depois. Essa forma no mundo há cinco de organizar o cotidiano acaba por reduzir anos. as possibilidades. O tempo da criação, da

Na

perspectiva

imaginação, da fantasia e da experiência da “alunancia” a é mais alargado, envolve interação entre gente fica muito as crianças, entre elas e os adultos, mais próximo da continuidades

e

descontinuidades, homogeneidade,

simultaneidade e imprevisibilidade.

pois

pretende-se

TONUCCI - Com olhos d


que os alunos se comportem a partir da pois as crianças não são tão previsíveis. uniformidade. A partir do momento em Elas criam situações inesperadas e, por que você toma como referência a infância, vezes, inusitadas. As crianças, vivem as crianças de carne e osso que possuem experiências temporais diversas porque experiências diversas, a possibilidade de seus tempos próprios não são instituídos, viver a heterogeneidade se amplia. Às mas vividos e, dependendo do contexto vezes, o professor precisa tomar distância em que se encontram, conseguem vivêdesse cotidiano pra olhar e ver aquilo que los de forma mais ou menos intensa. já é tão conhecido e rotineiro que já não vê, não sente. Não é fácil! Aparentemente

E acabam acontecendo muito mais

é tão organizado dentro dessa lógica que coisas no âmbito educativo do que a dita “atividade pedagógica”...

mudar isso significa pensar no caos.

Parece, ainda, que o auge do dia é Pois é, parece que funciona tão bem “atividade assim.

pedagógica”.

Em

outros

momentos do cotidiano, como no espaço

Há sempre uma rotina, mas as ações e do parque, existem relações de controle

de criança - Artmed

reações das crianças dos adultos sobre as crianças que não são frente ao que lhes é consideradas educativas. proposto

Assim como

indicam essa lógica temporal e espacial também

o descompasso de não é. Mas o modo como se organiza os intencionalidades, espaços, os tempos e o que se propõe para sentidos, desejos e as crianças pode educar para submissão, necessidades

que mas também para emancipação. Como

se manifestam em as crianças reagem frente a isso? Não são movimentos

de poucos os professores que terminam o dia

ruptura, resistência de trabalho com as crianças exaustos em e acomodação. A decorrência do esforço em controlar as linearidade

que crianças. É uma tarefa difícil tentar colocar

caracteriza a rotina as crianças no ritmo da rotina. não

se

realiza

harmonicamente como

Acho que isso tem a ver com esta outra

pretendido, imagem do Tonucci.

27


É, porque sempre há uma vigilância outro temos uma rotina de cuidado que permanente. Não que não tenha que também é muito padronizada. haver atenção, proteção e cuidado. Mas a

Veja que quanto menos idade tem a

vigilância está muito mais no sentido do criança, mais difícil pra ela viver a rotina controle. A imagem reflete um modelo de instituída. Um bebê chora e não dorme na organização do cotidiano fundamentado mesma hora que todos dormem. Só que, na perspectiva da fragilidade das ao passo que ele está indo todos os dias

ENTREVISTA

28

crianças. As crianças são vistas como pra essa instituição, e que há uma rotina objeto de tutela que precisa ser guiado, que os professores vão instituindo, com conduzido e vigiado pelo sujeito mais 2, 3 anos essa criança já está dormindo, experiente.

comendo e brincando na mesma hora que

Partimos do pressuposto de que os outros. Essa é a lógica institucional,

são sujeitos que não conseguem se fazer com que todos se adaptem àquela organizar e que precisam o tempo organização. A criança se adapta à creche todo ser organizados pelos adultos. Se e não o contrário.

Nós vemos ainda

três crianças estão brincando, o adulto diz resquícios de uma pedagogia médicoque elas estão sozinhas. Será que elas não higiênica em relação às crianças de 0 a se protegem umas às outras? Precisam 3 anos, e uma perspectiva muito mais sempre de um adulto para vigiá-las? Temos instrucional para as crianças de 4 e 5. que pensar, que sim num espaço seguro, planejado, organizado e condizente com

E a impressão que dá é que no meio disso

suas necessidades e possibilidades das tudo praticamente não sobre tempo. crianças. Que os adultos estejam sempre

Os professores também cansam dentro

atentos às ações e reações das crianças, dessa lógica. Porque essa forma de mas que elas sejam respeitadas nos organização do cotidiano também vai momentos em que desejam ficar entre sustentando algumas práticas que não são seus pares, sem a vigilância “desconfiada” solidárias. Eu sou responsável pelo meu dos adultos.

grupo de crianças, você é responsável pelo seu. Muitas vezes os professores reclamam

Agora, vamos falar um pouco sobre que gostariam de viver práticas mais as crianças bem pequenas. Se por um solidária entre eles, para que pudessem lado temos a escolarização precoce, por ajudar um ao outro.


organização

pautada

29

na

ilustração de daniel cabral,o balão, editora positivo

Numa

perspectiva da homogeneidade, sobra muito pouco tempo para os professores e para as crianças. Isso que você estava falando: quando vê o dia já acabou. Se eu estou contando uma história para 15 crianças eu parto do pressuposto de que todas estão ouvindo aquela história e não qualifico duas crianças que estão sentadas juntas, lendo outro livro de histórias. O que eu qualifico é aquele momento em que eu me coloco como professor, em que sou o centro. As crianças precisam começar a comer na mesma hora e terminar na mesma hora para não atrapalhar a próxima atividade. É uma relação que reduz as possibilidades de interações e experiências com alimentação, além de constituir uma educação muito mais para submissão do que para ampliação dos sujeitos-crianças. A partir disso, como é possível repensar o planejamento?

Eu acho que pra repensar o

planejamento e o currículo, a gente tem que levar em conta a observação e a atenção às crianças e pensar que esse espaço precisa se constituir como lócus de experiência, de vivência da infância. Agora, eu acho que pensar o planejamento das instituições infantis requer, primeiro, ter mais confiança nas crianças, de que

elas são capazes de organizarem espaços e tempos. Talvez isso já esteja muito dito, mas é preciso continuar dizendo: é preciso ouvir as crianças, mas é preciso saber ouvir as crianças. O que vai muito além do chavão de planejar a partir do interesse da criança. Nesse período da pesquisa eu fui percebendo

uma

característica

das

crianças que é a simultaneidade. Elas fazem muitas coisas ao mesmo tempo. Eu acho que temos que lidar com isso, não como algo que representa um atraso ou uma desorganização, mas como uma lógica característica desse período de vida. E também a provisoriedade: as crianças começam uma brincadeira, a gente acha que aquela brincadeira é muito interessante, mas dois minutos depois ela não está mais brincando daquilo. Portanto, pensar o planejamento nessa perspectiva exige compreender que as crianças têm uma forma de organização que é diferente da nossa, nem pior nem melhor. Se a


brincadeira é, por excelência, uma das universo infantil? As crianças têm acesso atividades principais das crianças, eu não aos objetos, brinquedos, livros e podem consigo imaginar o planejamento que não circular pelos ambientes com autonomia? a tenha como eixo central.

As crianças participam da organização

Então, eu preciso pensar: qual é o espaço dos espaços? Pensar o planejamento mesmo que ela tem pra produzir cultura? na Educação Infantil inclui pensar nesse Vai ser nas produções de desenhos, sujeito que produz e reproduz cultura. Para

ENTREVISTA

30

pintura? Nas brincadeiras? Mesmo tanto é necessário diversificar e ampliar as que no planejamento se organize os relações sociais e culturais, as relações com tais cantinhos, o que acontece? As a natureza, as manifestações das diversas crianças usam simultaneamente estes linguagens, em espaços também diversos, espaços, elas não ficam só no cantinho que promovam essas relações a partir das da leitura, porque em vários lugares crianças. Precisamos romper com a ideia há possibilidade de leitura. Elas vão de que a criança é expectadora da estética trazendo objetos de um lugar para dos adultos, como mostra a imagem.

o outro, vão criando outros ambientes. É importante que a organização dos espaços expresse os saberes e fazeres da criança. Essa imagem aqui também fala sobre isso. Pois é, o espaço diz, às vezes, muito mais dos adultos do que das crianças que estão ali. O que se privilegia na decoração

dos

ambientes?

Na organização dos espaços? Os espaços revelam o que as crianças dizem, pensam, vivem? A estética expressa o TONUCCI - FRATO, 40 anos com olhos de criança - Artmed


Para finalizar, conta pra gente: o que incerto, ao imprevisível, ao inesperado, você gostaria de ver quando entra em um sem perder de vista o sujeito-criança, que CMEI?

tem direito ao cuidado e à educação de

Primeiro eu gostaria de encontrar qualidade, a um universo rico de fantasia,

mais solidariedade entre os profissionais, imaginação,

brincadeira,

aventura,

mais compartilhamento de ideias acerca a f e t i v i d a d e , das crianças, dos projetos; encontrar amorosidade, uma lógica organizacional que respeite os bem-estar...

A

tempos das crianças para brincar imaginar, um processo de sonhar, fantasiar.

humanização

Viver esse processo de humanização, digno

de

entre os adultos e as crianças, de uma ser

vivido.

forma mais solidária; que os adultos aprendam

a

consultar

as

ROSA BATISTA

crianças,

organizar o cotidiano temporal e espacial a partir do respeito a elas; que as decisões compartilhadas entre adultos e crianças.

Artigos do Autor Disponíveis ONLINE

Portanto, se queremos trabalhar a partir

Cotidiano da Educação Infantil: espaço

da criança como sujeito de direitos,

acolhedor de emancipação das crianças.

sobre o que fazer nesse espaço sejam

precisamos ter o cuidado para desconstruir

A rotina no dia-a-dia da creche:

a lógica da linearidade, fragmentação,

entre o proposto e o vivido.

hierarquização, homogeneidade e da centralidade do professor no processo educacional-pedagógico Se lidar com a incerteza nos conduz pelo caminho das buscas, como desfazer

O caráter educativo da creche: um

QUE)

(CLI

estudo e caso a partir da rotina.

com quem ela dialoga?

o que já estava feito, quando ainda não

O espaço da creche: que lugar é esse?

sabemos bem o que pôr no lugar? Nesse

Notas sobre a experiência e o saber da

sentido, precisamos aprender a lidar com

experiência.

rupturas, conflitos, incertezas e medos,

O espaço físico como um dos elementos

sem sucumbir. Avançar em direção ao

fundamentais para uma pedagogia da educação infantil.

31


32

O dia a dia educativo como laboratório de construções:a experiência curricular da educação infantil no município de Gaspar Julice Dias e Josiane Chiminelli

1

Na parte 1 desta seção, a Julice, pedagoga e professora da UDESC, e a Josiane, diretora de Educação Infantil na secretaria de educação de Gaspar (SC), nos contam sobre um percurso intenso de discussões curriculares que este município vive desde 2002 junto aos

SABERES DO COTIDIANO

docentes da educação infantil do municipio. Essa experiência traz uma perspectiva sobre os desdobramentos da formação continuada em serviço em que há comprometimento com a qualidade da Educação Infantil e traz novas perspectivas no trabalho com as crianças.

Desde 2002, a Rede Municipal de reconfigurar o ambiente da creche e de Educação de Gaspar (SC), tem pré-escola, trazendo equilíbrio entre a construído um patrimônio relacional produção dos adultos e a produção das no que diz respeito à organização do crianças. Demandou também o estudo trabalho pedagógico com crianças de e a compreensão da indissociabilidade 0 a 5 anos e à formação continuada entre

planejamento,

observação,

em serviço das professoras que atuam registro e documentação. em creches e pré-escolas públicas.

Tudo isto num movimento cíclico de

A primeira pauta que a Rede tomou planejar-fazer-rever-replanejar.

Ou

seja,

como unidade referência para instaurar a nos encontros de formação as professoras formação continuada foi o estudo amplo e e diretoras traziam seus planos, seus detalhado das diferentes formas de organizar registros e as propostas de atividades que o currículo na Educação Infantil. Paralelo a isso, ofereciam às crianças. Então, ancoradas em em encontros sistemáticos com professoras bases conceituais da Pedagogia da Infância e diretoras de Centros de Desenvolvimento e das Diretrizes Curriculares Nacionais Infantil da Rede (CDIs), foram também para Educação Infantil (DCNEI), refletiam realizados estudos em torno das rotinas diárias, criticamente sobre que faziam, buscando dos espaços e ambientes das instituições. responder com argumentação pedagógica o Este estudo manifestou a necessidade porquê faziam daquele e não de outro jeito.


Ao

mesmo

tempo,

colocávamos

na pesquisa em torno de uma curiosidade, de

roda de conversa formativa proposições uma indagação, de um percurso já vivido de trabalho pedagógico mais coerentes e que suscitou interesse do grupo, de uma com

os

estéticos

princípios

éticos,

estabelecidos

políticos

pelas

e criança, da professora ou dos familiares.

DCNEI.

A experiência com os projetos e a recriação

Uma das primeiras decisões tomadas constante

dos

espaços

demandou

às

coletivamente foi organizar o trabalho professoras da Rede e ao percurso formativo, pedagógico por projetos, construir rotinas o aprofundamento do conhecimento e do heterogêneas e organizar o espaço em cantos hábito do trabalho com a documentação temáticos e áreas de interesse.Em se tratando pedagógica. Na Rede, tem-se investido dos projetos, a Rede tem adotado duas sistematicamente na conexão de sentido tipologias distintas: os projetos de construção entre as variadas formas de registro são aqueles que resultam num produto final, (manuscritos, aúdio, vídeo, produções das como, por exemplo, a construção de uma crianças, entre outros) do que as crianças casa na árvore. Em geral são trabalhados com dizem, fazem, pensam, sentem, constroem, as crianças de até 3 anos, com a parceria de brincam e seus modos de interação para e turmas de crianças maiores ou dos familiares. com as propostas engendradas pelos adultos. Outra tipologia refere-se aos projetos de

Todo

esse

aparato

pedagógico

tem

investigação, realizados com as crianças exigido espírito de equipe na construção, com mais de 3 anos, eles se voltam para a exercício

e

consolidação

de

um

33


34

planejamento

coletivo,

bem

como

na que se diz e o que

centralidade das interações e brincadeiras se faz. Também como

eixos

do

trabalho

pedagógico. tem

A Rede entende que o protagonismo no dia o

mostrado quanto

a

a dia educativo não deve ser só da criança. profissionalização Em uma pedagogia relacional, o adulto da professora de também precisa assumir seu protagonismo Educação

Infantil

na medida em que precisa ser autor da e a superação de prática pedagógica. Visto que sem isso não alguns paradigmas consegue criar tempos, espaços, materiais, e m b l e m á t i c o s brinquedos,

interações,

experiências

desafiadoras

brincadeiras que

e nessa trajetória são passíveis

possam de

serem

resolvidos,

desde

ampliar o repertório cultural das crianças que se tenha trabalho rigoroso no que tange ao conhecimento científico, de

acompanhamento

tecnológico, ambiental, cultural e artístico. supervisão Assim,

outro

aspecto

reiteradamente no

trabalhado na formação é a visibilidade do

do

interior

que

das

se

e faz

instituições.

Isto exige muita negociação,

que se faz. Nesse sentido, os espaços das sentimento de pertença à Rede, instituições são repletos de produções das paciência e tolerância com as crianças, que contam com sensibilidade aprendizagens humanas. Implica estética dos adultos. As rotinas diárias estão também

no

equilíbrio

entre

visíveis nos espaços das salas referência, os rigorosidade e amorosidade com registros que compõem a documentação o que se faz, com o ato político pedagógica, os planejamentos individuais e da profissão, com o respeito e o coletivos também. As paredes das instituições zelo pelo percurso aprendente das crianças. falam, expõem narrativas do cotidiano

Nosso maior compromisso tem sido

vivido, na teia relacional entre adultos, oferecer às crianças condições para que crianças, conhecimento, cultura, famílias. possam viver, na creche e na pré-escola, Esse percurso completa 13 anos de trabalho seus modos diferentes de viver as infâncias, intenso, sistemático e complexo de formação explorando e inventando muitas linguagens continuada e retrata o quanto é possível em

variados

ambientes

desafiadores,

buscar conexão e coerência interna entre o convidativos, repletos de vida e cultura.


35


36

O mundo através do nosso olhar Um projeto de fotografia que levou em conta a autonomia das crianças e permitiu que elas explorassem individualmente e com seus pares diversas formas de se comunicar através das imagens. Escrito por Ana Júlia Rodrigues e pelas professoras Roberta Portela e Patrícia Arantes a partir desta experiência vivida por elas com as crianças.

Tudo começou através da leitura de o mundo que as rodeia a partir de imagens e da escuta atenta das crianças. novos

SABERES DO COTIDIANO

2

Elas falaram muito sobre fotografia e

enfoques

e

enquadramentos.

Na primeira parte do projeto as crianças

pediram para tirar fotos e manusear as circularam pelos diferentes espaços da câmeras fotográficas. As professoras instituição e fotografaram naqueles lugares Roberta e Patrícia registraram as aquilo que mais chamava sua atenção. Em vozes das crianças e desenvolveram seguida, conversaram sobre o processo de junto com elas este projeto que fotografar e sobre o que aqueles lugares, durou aproximadamente três meses. pessoas e objetos representavam. Foi um Assim,

o

projeto

de

fotografia momento em que as professoras puderam

desenvolvido pelas professoras com compreender o que as crianças já sabiam uma turma de Pré em um Centro sobre a fotografia e, assim, desenvolver Municipal de Educação Infantil (CMEI) o projeto e propor o diálogo a partir disso. de Curitiba surgiu a partir da ideia

Na continuação o grupo recebeu

de oferecer novas possibilidades de a visita de uma fotógrafa profissional. expressão para as crianças. A fotografia Ela

conversou

com

eles

e

mostrou

como linguagem foi o ponto de partida alguns de seus equipamentos: lentes,

para que as professoras desenvolvessem rebatedores, tripé e livros. Além disso um planejamento que desse liberdade às as professoras trouxeram uma câmera crianças durante o processo criativo e que antiga de filme para mostrar às crianças. permitiu que elas fossem autoras de seu Sempre com muito diálogo e escuta atenta. próprio percurso na arte de fotografar,

A

próxima

etapa

envolveu

uma

expressando suas ideias e sentimentos. discussão sobre o que as crianças entendiam Este projeto também criou novas e por “belo” e “feio”. Elas circularam pela ricas oportunidades para que as crianças instituição em grupos pequenos, cada um diversificassem

seus

repertórios

sobre com uma câmera digital ou celular. Depois


37

também sortearam alguns sentimentos: fotos das mais diversas, da pista de skate “amor”,

“amizade”,

“tristeza”,

“raiva”, ao ponto de ônibus na frente do CMEI.

e os dramatizaram através do faz de

O encerramento foi feito com a

conta, explorando a linguagem corporal e montagem de uma exposição das fotografias: fotografando. As professoras relatam que as crianças escolheram quais fotos queriam, as crianças estavam muito interessadas e como as organizariam na exposição e em envolvidas durante todo o projeto e que qual espaço da instituição ela seria montada. puderam perceber como as suas falas sobre

Se

o espaço e a forma como fotografavam ampliação

este do

projeto

proporcionou

repertório

das

a

crianças

foram mudando ao longo do tempo. através da fotografia, ele também permitiu

Elas ainda tiveram outros dois grandes que

momentos para fotografar. O primeiro deles as

as

professoras

individualidades

foi com a releitura de poemas: elas puderam aprofundassem

a

reconhecessem

dos

pequenos

e

sua

compreensão

montar o cenário e dramatizar o poema, sobre o papel mediador do professor. Ele escolhendo o que iriam fotografar e também significou, tanto para professoras quanto registrando os seus colegas. Os poemas crianças, uma ampliação cultural por meio escolhidos foram “O Colar de Carolina”, “Ou das

aprendizagens

Isto ou Aquilo” e “Bolhas”, todos de Cecília vividas e do contato Meireles. O segundo momento foi mais livre com e cada criança foi individualmente desafiada a fotografar o que e quem quisesse dentro da instituição e no espaço ao redor: surgiram

a

fotografia.


38

Fotografando e papeando... Conversas e fotos das crianças

O abraço é belo porque ele mostra o amor. Thaila

Eu quero aprender muito sobre fotografia para tirar bastante foto legal. Hendriws

a pose! Cada um faz um Gabriel

Belo para mim é a grama verdinha. Leonardo Henrique


39

ĂŠ a chuva Para mim, bela Victor Hugo

Belo para mim ĂŠ o ceu azul. Enzo Felipe

Eu qu er azul o tirar um a na fr ente foto daqu el da no ssa j a casa anela! Kauan e


40

A implantação da Avaliação da Educação Infantil Planos nacionais, estaduais e municipais Catarina Moro A partir de 2014, com a revisão

realizada a cada dois anos, com base em

do Plano Nacional de Educação (PNE),

parâmetros nacionais de qualidade, a fim

todos os planos dos estados e municípios

de aferir a infraestrutura física, o quadro

passaram a ser discutidos e revistos. O

de pessoal, as condições de gestão, os

mês de julho de 2015 era a data máxima

recursos pedagógicos, a situação de

para a aprovação das leis estaduais e

acessibilidade, além de outros indicadores

municipais referentes à homologação dos

necessários e relevantes.”

O que diz a lei?

novos planos. É importante lembrar que os planos – municipal, estadual ou nacional –

Tal explicitação tem, a princípio,

duas implicações:

tratam da oferta educacional a todos os

- demarcar uma concepção de avaliação

cidadãos, não se atendo exclusivamente

que reconhece a importância de avaliar

às redes públicas.

a oferta formativa/educativa às crianças

Ou seja, a oferta educacional do

segmento

privado

está

considerada

nos planos, uma vez que instituições particulares

e

conveniadas

e não avaliar o desempenho das crianças independentemente ou não articulado ao que a elas é disponibilizado;

ofertam

- e a de convocar responsabilidades, por

educação a uma parte da população e

meio de órgãos públicos – MEC, INEP –

compõem as estatísticas tanto do censo

para assumir tal tarefa.

escolar quanto dos índices demográficos e sócio-econômicos.

No estado do Paraná, em 2015, se instituiu o Plano Estadual de Educação

Em 2014, foi votado o PNE – Lei nº

(PEE - PR), por intermédio da Lei nº

13.005/14 – no qual consta uma estratégia

18.492/15. No PEE-PR encontramos uma

(1.6, da Meta 1) referente a :“implantação

replicação da estratégia 1.15, da Meta

da avaliação da Educação Infantil, a ser

1 proposta no PNE, segundo a qual o


41

Estado irá acompanhar, em regime de

a 6 (seis) anos de idade, por meio de

colcaboração, a implantação da avaliação

questionários, testes, provas e quaisquer

da Educação Infantil.

outros instrumentos”;

Assim,

o

estado

marca

seu

- e a partir do 1º

ano de vigência

papel como sendo o de acompanhar a

do plano, iniciar a discussão sobre “o

implantação da avaliação da Educação

estabelecimento de uma avaliação de

Infantil, em colaboração com a União e

sistema, abrangendo toda a educação

os municípios. Certamente, é de extrema

infantil do município.”

importância para a maioria dos municípios

É importante conhecer e ficar de olho na

paranaenses compreender como se dará

implementação dos planos

esse acompanhamento. Sobretudo se

em nossos municípios

poderá significar algo além de fiscalização

para

e ausência de colaboração efetiva, para

modo,

que assim se implemente de fato, em

participar

âmbito municipal, alguma ação relativa à

lutar por mais

avaliação da oferta de Educação Infantil.

qualidade na

No Plano Municipal de Educação

(PME) de Curitiba, Lei nº 14.681/15, o tema

que,

deste

possamos e

Educação Infantil.

mereceu alguns detalhamentos, tendo se desdobrado em três estratégias: 1.7, 1.8 e 1.9, da Meta 1. Nas estratégias explicitase o compromisso de: implementar, até o 2º ano de vigência do PME: - “a avaliação institucional da educação infantil, a ser realizada pelo menos a cada 2 (dois) anos, com base em parâmetros nacionais e/ou municipais de qualidade para essa etapa de educação”; -“rejeitar

a

adoção

de

políticas

públicas de avaliação, em larga escala, do desempenho da criança de 0 (zero) DANIEL CABRAL: O BALÃO, EDITORA POSITIVO


42

ANEI Por uma Avaliação Nacional da Educação Infantil Ticiane Bombassaro Marassi

O que propõe a Política!

Há muito a área de Educação

Infantil tem discutido os direitos

qualidade da educação básica.

A proposta de Avaliação Nacional

educacionais de crianças de 0 a 5

da Educação Infantil (ANEI), desenvolvida

anos de idade. A necessidade de

pelo Inep em parceira com várias entidades

garantir a qualidade da educação

e especialistas em âmbito nacional,

oferecida nessa etapa de ensino está

diferentemente do que se executa em

demonstrada no Plano Nacional de

outras etapas da Educação Básica, visa o

Educação (LEI 13.005/2014), no qual

acompanhamento e aferição da qualidade

estão previstos padrões nacionais

dos serviços prestados às crianças de 0 a 5

de qualidade e sua aferição por

anos, que se traduza na garantia dos seus

meio de uma avaliação nacional. A

direitos básicos.

avaliação, conforme previsto no PNE,

A

ANEI

visa

a

aferição

das

precisa ocorrer em 2016 e compor

características do atendimento oferecido

um conjunto de indicadores sobre a

às crianças nas redes públicas do País, nas instituições que ofereçam vagas em educação infantil e possuam financiamento público. A fim de compor maiores estratos de análise, seriam avaliadas instituições da rede privada, em caráter amostral.

Está ausente desta proposta

de avaliação externa a medida do desenvolvimento da criança. Compreende-se

que

uma

avaliação de educação infantil que respeite a concepção da área não deve contemplar uma DANIEL CABRAL: O BALÃO, EDITORA POSITIVO


43

dimensão que resulte em diagnóstico da aprendizagem ou da aquisição de habilidades pela criança. Considera-se que a avaliação do desenvolvimento infantil deva ser gerenciada pela instituição e definida a partir de uma concepção de desenvolvimento integrado. Sendo assim processual e acontecendo de forma sistemática e contínua.

Destinada

à

intervenção

no

processo de desenvolvimento da criança, a avaliação na educação infantil deve ser realizada pelo professor responsável e é de responsabilidade da instituição que atende as crianças de 0 a 5 anos.

A ANEI possui também outro

objetivo: garantir que o atendimento às crianças seja efetuado com a qualidade determinada

pelos

parâmetros

nacionais. Avaliar a ampliação da oferta, a acessibilidade, a gestão da instituição e dos sistemas de ensino, os recursos disponíveis e a formação docente pode auxiliar os gestores e formuladores de políticas educacionais a implementar ações de saneamento de deficiências e de incremento da qualidade nas instituições sob sua responsabilidade.

Todos os esforços dedicados ao

aprimoramento nessas dimensões gera indubitável impacto no desenvolvimento infantil.

No site da Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação), podemos encontrar uma notícia e o material da apresentação sobre a

ANEI. Segue uma parte aqui: Um momento histórico. Essa é a análise que o diretor de Avaliação da Educação Básica do INEP, Alexandre André dos Santos, faz da proposta de avaliação nacional da educação infantil. Segundo ele, o INEP fez um esforço considerável de pensar junto a outras esferas de governo, Undime e organizações da sociedade civil-, em um processo de avaliação que considerasse as especificidades inerentes a essa etapa educacional. Após a elaboração da proposta, o passo seguinte é a preparação do instrumento normativo, o qual dará forma e registro legal à ideia, “agora é uma questão de nós e o MEC elaborarmos a portaria”, disse e completou: “Nosso objetivo é que a primeira coleta já seja realizada em 2016”, afirmou.


44

RESENHA DO LIVRO

A CANÇÃO PARA CRIANÇAS: UMA CONTRIBUIÇÃO AO REENCANTAMENTO DA INFÂNCIA Rosy Greca

“Ri aos borbotões ao descobrir que a infância nunca morre na alma daquele que logra trazer à tona seus afetos infantis através do ato criativo”

O livro escolhido para ser explorado

FIQUE POR DENTRO

nesta edição me levou para o mundo da música, especificamente

da inserção da música no trabalho com as crianças. Isso porque a autora propõe que

para o universo das

você seja aquele que

canções

dentre

para

as

tantos

outros

crianças. Mas não

possibilite e promova

desanime se você é

o reencantamento no

gente já crescida, ele

olhar das crianças para

foi escrito para você.

coisas

Para é pelo

você

que

sua

perseguido bichinho

simples. escrita

Com

gostosa

e sensível, cheia de

da

pedacinhos de canções,

para

com uma discussão que

alterna e alia teoria e

rodeado de crianças

experiências práticas, o

curiosidade, você

que

se

cotidianamente,

para

você

que

reencantamento volta ao nosso olhar. E

considera a música como meio de

possuir esse olhar resulta na reação da

comunicação, mas também para

descoberta da qual a epígrafe escolhida

você que desconhece a importância

fala...


45

Partindo

de

uma

Em um último verso de canção, deixo um

inquietação em relação

“lembrete” emprestado de Rosy Greca:

às experiências infantis

“A canção para crianças, arte que alia o

contemporâneas,

a

poder espiritual da música com a força

autora problematiza o

existencial da literatura, pode influenciar

papel da arte na vida das

de forma vital a criança em todos os

crianças, voltando-se especificamente

aspectos

para a canção. Assim, apresenta aspectos

(p.25).

do

seu

desenvolvimento.”

conceituais e uma perspectiva também histórica sobre a infância e a ideia de musicalização para as crianças. Traz em seus escritos discussões acerca dos elementos

artísticos

que

para ouvir melhor

compõem

as canções, seu uso nas escolas e nas instituições de educação infantil e fala um pouquinho de como são produzidas, divulgadas e acessadas pelo público.

Em meio às muitas palavras, você

Ta

Terra d o

encontra, reencontra e conhece grandes autores de canções infantis, se descobre cantando músicas que lhe são familiares. E numa linguagem leve, como numa canção, passa se não a compreender, a considerar o porquê da convivência cotidiana das crianças com as canções feitas e pensadas para elas. Provoca,

propõe,

alerta,

a

h n i l o tu B

i e aqu u q i l c ixe o de r ã n e a xplor de e e! o sit

O

r

Sempre

do a i v A

Pinha P Pinheiirnhão o

ilumina,

emociona e encanta! Tudo isso e mais um pouco está salpicado no decorrer do livro lido, relido e cantado, que dessa vez os convido a ler e cantar...

Franciele Ferreira França ILUSTRAÇÃO PÁSSARO - DANIEL CABRAL: ARAPUCA, EDITORA POSITIVO


46

VIREI O BAÚ

memórias da educação infantil

PESQUISANDO E TECENDO A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL: um esforço conjunto e contínuo A Educação Infantil é a primeira etapa

Educação, etc.) e estudos diversos (teses,

da Educação Básica e direito da criança

artigos, dissertações). Historicamente,

(LDB 9.394/96) . Essa afirmação legal, já

o primeiro jardim de infância foi criado

tão difundida entre nós, foi construída

em 1875, no Rio de Janeiro, pelo médico

por uma história de avanços, retrocessos,

Joaquim Menezes Vieira. Desde então é

movimentos sociais, debates acadêmicos

possível acompanhar que o debate das

e políticos. Poderíamos escrever muitas

finalidades e organização de tal espaço

páginas sobre a constituição da Educação

se mantém na pauta dos responsáveis

Infantil

Brasil.

pelo ensino e pela

Todavia, convido você,

formulação das leis

que trabalha com a

há 140 anos.

educação

infantil, sobre

a

Como

aqui

o

como

convite inicial foi

ela se constituiu e

cada um pensar no

como eram chamados

seu município, volto

esses espaços que

então o meu olhar

ofereciam educação

para Curitiba, no

VIREI O BAÚ

pensar

no

e cuidado para a criança pequena no seu município.

Segundo Jardim de Infância público de Curitiba, junto ao Grupo Escolar Xavier da Silva. Fonte: Relatório de Governo (1916).

Paraná. Os jardins de infância públicos paranaenses

Na busca por essa história, podemos

surgiram anexos aos Grupos Escolares e

escolher diversos caminhos, como a

Escolas Normais, sendo que o primeiro

leitura de livros, documentos oficiais

foi associado ao Ginásio Paranaense e

(leis nacionais e municipais, ofícios,

inaugurado em 1906.

publicações do Conselho Municipal de

A

historiografia

aponta

uma


diferenciação no que seria

foram inauguradas as 4 primeiras creches

função de um Jardim de Infância,

municipais em Curitiba, com funcionários

de uma Creche e de uma Escola

contratados, sendo o concurso público

Maternal ao longo do período

específico realizado em 1985. Atualmente

de organização e constituição

a creche comparece na documentação

desse atendimento voltado para

oficial como o lugar ideal para aliar o

a criança pequena. O primeiro

desenvolvimento físico, intelectual e

era apresentado com uma

afetivo da criança.

função mais educacional, enquanto os

Uma breve cronologia, mas que nos

outros dois compareciam com uma prática

instiga a conhecer um pouco mais da

de assistência ou de guarda. Contudo,

história da educação infantil também em

os estudos apontam que tal divisão não

outros locais. Para isso, precisamos de

era uma regra sem exceções, ocorrendo

sua ajuda. Boas reviradas em seus baús e

iniciativas educativas e assistenciais de

ótimos debates a todos!

forma intercalada, em ambos os casos. i

Com o passar dos anos a configuração

aqu que

cli

e normatização desses espaços passaram por reformas. Avançando um pouco, encontramos o Anteprojeto da Lei Orgânica do Paraná (1949), com a indicação de que a educação escolar pré-primária (3 a 7 anos) tivesse as características da casa da criança (com salas de estar, refeição, dormir, etc.). A classe pré-primária englobava, a princípio, somente o Jardim de Infância e a Escola Maternal, sendo agregada posteriormente a Creche (resolução 76). Na década de 1960 foi extinto o curso pré-primário mantendo-se, de forma diferenciada, os jardins de infância, creches, escolas maternais. Em 1977

QUER SABER MAIS? Prescrições para os jardins-deinfância paranaenses. Educar a Infância Políticas Públicas para a Educação Infantil no Município de Curitiba (1997-2004) Instrução, o talher para o banquete da civilização

Etienne B.L. Barbosa

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O PAÍS DOS MENTIROSOS

Vi(r)agens e Vir-Ações Poéticas

Era uma vez, lá pros lados do Sei lá, o país dos mentirosos. Naquele país, ninguém dizia a verdade, não chamavam pelo seu nome nem mesmo a chicória: a mentira era obrigatória. Quando surgia o sol tinha logo alguém pronto a dizer: “Que belo pôr do sol!” À noite, se a lua clareasse mais que um farol, as pessoas reclamavam: “Mas que noite mais escura, não se enxerga nada.” Se você ria, tinham dó: “Coitado, que pena, que mal será que lhe acometeu?” Se você chorava: “Que cara original, sempre alegre, sempre comemorando. Deve ter os milhões na cabeça”. Chamavam de água ao vinho, de cadeirinha a mesinha e a todas as palavras invertiam bem direitinho. Fazer diferente não era permitido, mas estavam tão habituados que mesmo assim ficava tudo entendido.

Gianni Rodari

A poesia continua, clique aqui para ler em português a poesia completa


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