4 minute read
capa. a arte social de Sebastião Salgado
RetRatos em bRanco e pReto
Advertisement
A Arte sociAl do fotógrAfo sebAstião sAlgAdo é umA declArAção de Amor à vidA e Ao plAnetA
Quando em Serra Pelada, Sebastião Salgado vivia como garimpeiro. Dormia e acordava junto e, assim, teve autorização para fotografá-los. Entre os índios, era um deles. Caminhou passos angustiados ao lado de refugiados do mundo todo. Sentiu o medo deles e a esperança. Aprendeu a viver o tempo dos homens e também o tempo da natureza para desvendar recantos intocados. Sempre de corpo e alma. Suor, cãibras e cansaço. Emoção e vibração. Paciência para achar a luz perfeita. “Não é todo mundo que pode ser fotógrafo. Há de se ter prazer em fotografar.’’
Aos 77 anos, Sebastião Salgado continua produzindo. Suas longas e extenuantes jornadas rareiam, afinal, seus registros dependem de tempo, planejamento, disposição, vigor físico e mental. Mas hoje, ele, que se divide entre o Brasil, onde nasceu, e a França, onde mora, se mostra um ser até mais social e político, quando apenas atrás de suas lentes. Desde 1998, quando em companhia da mulher, Lélia Salgado, criou o Instituto Terra e recuperou uma área de Mata Atlântica que era da família, passou a ativista pela natureza e pela sustentabilidade do planeta.
Neste ano, fez sua mais recente incursão pela Amazônia, de modo a finalizar o novo trabalho, lançado já em Paris, e que começa a ganhar o mundo: a mostra “Amazônia”, fruto de sua viagem de sete anos pelas entranhas da maior floresta tropical do mundo. Vai viajar para Londres, Roma, São Paulo e Rio de Janeiro, entre outras cidades, da mesma forma que “Gênesis” deu a volta ao mundo para mostrar os lugares mais bonitos e remotos do planeta.
“Amazônia” é seu trabalho mais pessoal e político. Tinha planos de convidar para a inauguração lideranças indígenas com o objetivo de fazer ouvir essas vozes contra a destruição de seu habitat e das consequências disso para o planeta. A pandemia ainda não deixou. A exposição é como uma expedição na selva, acompanhada pela trilha composta pelo francês Jean-Michel Jarre. Além da natureza exuberante, Salgado apresenta 10 grupos indígenas, com os quais conviveu durante sua jornada de sete anos, que foram fotografados no estúdio feito de lençol pendurado nas árvores. Ianomâmis, marubos, iauanauás se preparavam para as sessões, pintando o corpo e usando cocares.
“Queremos que as pessoas que forem ver a exposição to-
mem ciência do que é a Amazônia. Não é só uma grande planície com grandes rios no centro. Também é a montanha, um sistema de água, os ‘rios voadores’, que chegam a quase todas as regiões do mundo, e as comunidades indígenas. Portanto, é uma tentativa de apresentar a Amazônia”, comenta o fotógrafo, ressaltando as ameaças que pesam sobre esse ecossistema. “A grande esperança é que juntos conseguiremos frear a destruição dos biomas amazônicos, que conseguiremos protegê-los, e proteger também as comunidades indígenas. Não só para preservá-los, mas porque precisamos deles para o planeta. A Amazônia garante uma grande distribuição de umidade no planeta, além de sequestrar o carbono graças a essas milhões de árvores que se ocupam de transformá-lo e liberar o oxigênio que respiramos.”
“Não podemos construir nosso futuro – o futuro da humanidade – com base apenas na tecnologia”, acrescenta. “Devemos olhar para o nosso passado, devemos levar em consideração tudo o que fizemos em nossa história. O ser humano tem uma grande oportunidade: a pré-história da humanidade está na Amazônia agora.”
Nobel das artes
Salgado, famoso por suas intensas fotos em preto e branco, é um dos ganhadores deste ano do Praemium Imperiale do Japão, considerado o “Nobel das artes”. O anúncio foi feito agora em setembro em Berlim pelo ex-presidente do Instituto Goethe e conselheiro da Associação Japonesa de Arte Klaus-Dieter Lehmann. O fotógrafo foi distinguido na categoria pintura pelas imagens em que retrata “com grande sentido estético o estado dos mais pobres e a degradação do meio ambiente”. Seu último projeto, “Amazônia”, mostra a exploração do ecossistema amazônico e da vida de seus povos indígenas durante sete anos. Os outros brasileiros a receber o prêmio foram os arquitetos Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha.
Ainda este ano, Sebastião Salgado foi homenageado durante a cerimônia de abertura do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, com o 27th Annual Crystal Award, premiação que reconhece a contribuição do trabalho de artistas, das mais diferentes áreas, para a sociedade. Salgado foi escolhido por sua liderança na abordagem da desigualdade social e sustentabilidade.