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COLUNA SUSPECT DEVICE - HENRIKE BALIÚ
by comlimone
Por Henrike Baliú SUSPECT DEVICE DESCULPE MÃE, ESQUECI DE LEVAR O LIXO PARA FORA
De todos os lançamentos de 2021, o que me deixou mais ansioso, e na expectativa, foi o glorioso box set do clássico primeiro álbum de 1981 dos americanos The Replacements, “Sorry Ma, Forgot to Take out the Trash”, pela gravadora Rhino. O box, que me surpreendeu pelo cuidado e capricho, contém um LP e quatro CDs com o álbum remasterizado, faixas demo, outtakes, versões alternativas e um show inédito. O LP é uma versão alternativa do disco original. A coleção ainda conta com um livro de 24 páginas com fotos e a história da banda. Os Replacements nunca se consideraram uma banda punk, mas você certamente vai encontrar esse álbum em várias listas de “melhores discos punks americanos dos anos 80”. Bom, pelo menos ele está minha lista, lá no topo, entre os cinco melhores. Depois desse disco, soltaram o mini álbum “Stink”, com pérolas punks como “Fuck School”, o hino de qualquer garoto no ensino médio. Aliás, tenho um amigo que desencanou da escola após escutar essa música. Voltando aos Replacements: entre 1981 e 1984, gravaram quatro discos pela independente Twin Tone. Em 1985, assinaram com a major Sire Records e, liderados pelo talentoso frontman Paul Westerberg, deixaram a sonoridade punk rock de lado, porém a atitude permaneceu com os integrantes até o fim. O lendário guitarrista, Bob Stinson, foi expulso da banda em 1986 e morreu em 1995. Acabaram em 1991, sem nunca terem alcançado o merecido sucesso. Hoje, são praticamente uma banda cult entre os apreciadores de um verdadeiro rock ‘n’ roll. O baixista, Tommy Stinson, irmão do Bob, tocou baixo com o Guns n’ Roses no final dos anos 90, enquanto Paul Westerberg seguiu uma interessante carreira solo. Se você quiser saber mais, indico o livro “Trouble Boys”, uma biografia surpreendente.
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Meu pai, Paulo Afonso, que apesar de ter seguido uma carreira militar e hoje ser Capitão de Mar-e-Guerra da Marinha do Brasil, é um grande fã de punk rock e teve a sorte de testemunhar um show do The Replacements quando morávamos nos Estados Unidos. Quando eu era moleque, ele me gravou uma fita K7 com o primeiro álbum da banda. Eu escutava “I Hate Music”, “Customer”, e “Johnny’s Gonna Die” enquanto brincava com meus bonecos do G.I. Joe no quarto. Preferi que ele mesmo descrevesse a experiencia privilegiada de estar em um show do Replacements naquela época.
CRUISIN’ ANN ARBOR
Considero-me privilegiado, por ter residido, com minha esposa e nossos quatro filhos, entre 1982 e 1985, na bela cidade de Ann Arbor, localizada no estado de Michigan, nos EUA. A referida cidade, que dentro de dois anos deve completar 200 anos de existência, é sede da renomada Universidade de Michigan, da qual, durante o período acima citado, participei, pela Marinha do Brasil, como aluno de pós-graduação em engenharia nuclear, de um programa de estudos, que me demandou muita atividade intelectual e esforço mental.
Com uma população por volta de 115 mil habitantes, dos quais aproximadamente 40 mil são estudantes da Universidade de Michigan, Ann Arbor possui uma atividade artística muito intensa, especialmente na área musical. O principal e maior teatro da cidade é o Hill Auditorium, construído em 1913, que pertence à universidade. Ali já se apresentaram não só grandes nomes da música clássica, como Rachmaninoff, Leonard Bernstein e as orquestras filarmônicas de Viena e de Nova York, como também alguns dos principais expoentes da música popular internacional, como Elton John, Bruce Springsteen, Bob Marley and the Wailers, Ray Charles, Bob Dylan, The Grateful Dead, Lou Reed, Elvis Costelo, e muitos outros. Também pertencente à universidade, há uma arena, construída em 1967, normalmente utilizada para jogos de basquetebol, com capacidade para 12.707 pessoas, denominada Crisler Center, onde já se apresentaram, entre outros, Elvis Presley e John Lennon. Além do Michigan Theater, com 1.610 assentos, onde os Replacements se apresentaram por três vezes, a cidade também é famosa pela grande quantidade de bares e casas noturnas, com música ao vivo, onde costumeiramente atuam tanto artistas locais, como nomes expressivos da música norte-americana, como Ramones, REM, Bo Diddley, David Crosby etc.
Por conta do meu necessário engajamento nas atividades acadêmicas, sobrava-me pouco tempo para o lazer, o qual eu aproveitava prioritariamente para estar e passear com a família, e para ouvir música, principalmente rock, que se tornara o meu gênero musical preferido desde quando eu tinha dez anos de idade. Devo dizer que, quando viajei para Ann Arbor, em agosto de 1982, eu já dispunha de mais de 1.200 LPs, a maioria de rock, os quais deixei no Brasil. No entanto, nas minhas duas primeiras semanas na cidade, antes do início das aulas e das minhas atividades escolares, conheci as principais lojas de discos da cidade, e a que mais me interessou foi a Schoolkids’ Records, que os entendidos no assunto consideravam como uma das vinte melhores lojas de discos dos Estados Unidos.
A partir de então, criei o hábito de, uma vez por semana, normalmente nos fins de tarde das sextas-feiras, antes de ir para casa, dar uma passada na Schoolkids’, para espairecer. Aproveitava para ver se havia chegado alguma novidade em termos de reedições de LPs de rock dos anos 50 ou 60. Com o tempo, fiz amizade com o dono da loja, Steve Bergman, e com alguns vendedores, os quais, sabendo também do meu interesse por bandas novas de rock, me indicavam alguns LPs de nomes que eu ainda não conhecia. Foi assim, e também por intuição, que adquiri discos dos Replacements, Hüsker Dü, Dogmatics, e outros grupos de rock. E foi também na Schoolkids’ Records que tomei conhecimento dos shows de música que haveria na cidade.
O primeiro show em Ann Arbor a que pude comparecer, foi o da lenda do rock Bo Diddley, no Rick’s American Café, em
1983. Foi sensacional, e cheguei a obter um autógrafo dele. Depois desse, assisti a alguns espetáculos musicais no Hill Auditorium, com grandes nomes, como Ray Charles, Joan Baez, Elvis Costello e Lou Reed. No início da primavera de 1984, assisti a um show de David Crosby no Nectarine Ballroom, local este que anteriormente foi denominado Second Chance, no qual os Ramones haviam se apresentado algumas vezes.
O último show a que assisti em Ann Arbor, e o mais impactante, foi do Replacements, no Joe’s Star Lounge, no domingo 2 de dezembro de 1984, a quinta apresentação da banda na cidade, e terceira deles no Joe’s Star Lounge. Na abertura, tocou uma banda local chamada Map of the World. Enquanto se apresentavam, os integrantes do Replacements circulavam pelo salão. Devo dizer que, convidado por um vendedor da Schoolkids’ que fazia parte de uma banda de ska local, denominada SLK, participei de uma roda de conversa com o guitarrista Bob Stinson, dos Replacements. Vale ressaltar que os Replacements, embora fossem de Minneapolis, no estado de Minessota, tinham criado um vínculo com Ann Arbor e com a Schoolkids’ Records, já que o vocalista da banda, Paul Westerberg, namorava uma moça que trabalhava lá.
O repertório do show constou, principalmente, de faixas do LP “Let it Be”, que fora lançado pela Twin Tone em outubro daquele ano. As ótimas interpretações ao vivo do Replacements me fizeram crer que eu estava diante de uma banda que em breve alcançaria grande fama. Correspondendo às minhas expectativas, no ano seguinte eles foram contratados pela Sire Records e seus discos chegaram a ser vendidos no Brasil. Até pouco tempo, eu não conseguia entender por que o sucesso da banda ficou, de certo modo, limitado. Hoje, sei que foi por causa da pouca seriedade com que eles encararam suas obrigações profissionais, o que lamento que tenha ocorrido, diante do enorme potencial e talento que possuíam.
Quanto ao Joe’s Star Lounge, bar que fora inaugurado em janeiro de 1982, suas atividades vieram a ser encerradas no dia 13 de abril de 1985, devido à especulação imobiliária.
NOVAS AQUISIÇÕES
Como na última edição não consegui entregar minha coluna a tempo, algumas novas aquisições acumularam aqui. Então vou dar uma rápida passada por elas.
7 Seconds, “The Crew” LP, Trust
Records – No começo dos anos 90, eu só saía de casa com meu fiel walkman da Sony. A fita que tocava sem parar no meu aparelho portátil era uma K7 com o “The Crew” de um lado e o primeiro álbum do Pennywise do outro. Devo ter escutado essa fita um milhão de vezes. Originalmente lançado em 1984, esse álbum ganhou uma edição remasterizada de luxo com um livro de 20 páginas. Hardcore americano anos 80 da melhor qualidade. A produção do disco não é das melhores, mas a energia compensa. Clássico absoluto.
Circle Jerks, “Group Sex” LP, Trust Records – E a gravadora Trust Records me surpreende com o relançamento do álbum de estreia da lendária banda Circle Jerks. Livro de 20 páginas, disco remasterizado com faixas bônus gravadas em um ensaio de garagem, em 1980, fazem desse relançamento algo mais que especial. Em 1979, o vocalista Keith Morris gravou o maravilhoso EP “Nervous Breakdown” do Black Flag. No ano seguinte, saiu da banda e montou o Circle Jerks. “Group Sex” é absolutamente essencial em qualquer coleção. Talvez seja meu disco favorito do hardcore punk americano gravado nos anos 80 na ensolarada Califórnia. Ah, uma curiosidade, você sabe o que significa um circle jerk? Não? Então coloque no Google, faça um pequeno estoque de vaselina e divirta-se em casa com seus amigos nessa brincadeira saudável de autoconhecimento erótico.
The Clash, “Mohawk Revenge”
– Imagina se pegassem o “Cut the Crap”, último álbum do The Clash, isolassem a voz do Joe Strummer e regravassem os instrumentos sem aqueles efeitos eletrônicos bizarros, que fazem do disco uma confusão sonora? Foi o que fizeram nesse bootleg que vale cada centavo investido. As músicas soam como deveriam ter sido gravadas na época, só guitarra, baixo e bateria. Preciso admitir que sou fã do “Cut The Crap” original, mas essa versão aqui é outro disco, está surpreendentemente bom demais! Foram prensadas apenas 500 cópias, então boa sorte em encontrar uma.
2 Minutos, “Valentin Alsina” LP, Universal Musica Argentina – No começo dos anos 90, o Fralda, na época baixista do Blind Pigs, namorava a Val, uma argentina que era minha vizinha.
Ela foi passar férias em Buenos Aires e trouxe uma fita K7 desse álbum para ele. Resultado: o Blind Pigs viciou em 2 Minutos! Na sua próxima visita à Argentina, a Val trouxe algumas cópias do CD para a banda toda. Cada integrante do Blind Pigs ganhou um. Lembro de escutar as últimas duas faixas, “Arrebato” e “Ya no Sos Igual” no repeat. Punk rock direto, melódico, perfeito, com letras sobre o dia a dia no bairro operário de Valentin Alsina. “Ya no Sos Igual” me pegou de jeito. A letra é sobre um amigo dos integrantes da banda, que cresceu com eles, jogando bola no campinho de terra, bebendo no bar da esquina, e hoje patrulha as ruas da cidade com um bigode e uma pistola 9 mm. Virou um agente policial. Tive dois amigos que também viraram policiais civis. Lembro de apresentar essa banda para o Badauí, vocalista do CPM 22, quando eles estavam começando, e logo depois os vi tocarem “Ya no Sos Igual” em um show em Barueri. Considero “Valentin Alsina” um dos grandes clássicos do punk rock dos anos 90. Durante anos ficava pensando que alguém poderia lançá-lo em vinil. Pois bem, os deuses fonográficos ouviram minhas preces e a Universal o lançou em versão remasterizada, edição limitada, apenas na Argentina. Compre, mesmo se estiver caro, dá seus pulos, vende uns discos que você não escuta mais para ter essa pérola na sua estante. Vale cada centavo.
U.S. Bombs, “Road Case” LP, Slo-
pe Records – Por uma década, de 1996 a 2006, eu considerei a U.S. Bombs a melhor banda punk rock dos Estados Unidos. A banda era liderada por dois veteranos da cena: o vocalista Duane Peters, skatista velho de guerra, conhecido como “o mestre do desastre” e Kerry Martinez, ex-guitarrista da lendária banda hardcore Shaterred Faith. Que dupla! A voz do Duane com a guitarra do Kerry era algo mágico, tipo Strummer/Jones ou Jagger/Richards. O Blind Pigs teve a honra de dividir o palco com eles algumas vezes e viajar de ônibus com a banda, quando visitaram o Brasil em 2006. O Duane Peters até subiu no palco do Hangar 110 para cantar comigo “White Man in Hammersmith Palais”, do The Clash. Que noite! Era uma quarta-feira se não me engano, e devia ter no máximo umas 50 pessoas no Hangar. Mas 2006 já era o começo do fim da banda. Eles tinham acabado de lançar o disco “We Are the Problem” e estavam com vários problemas internos. Um ano depois, a banda toda se demitiu enquanto estavam em turnê na Europa. Titio Doente Peters ficou sozinho, se afundou cada vez mais nas drogas, chegou a gravar alguns ótimos discos com seus projetos The Great Unwashed, DP Gunfight e Die Hunns, e virou apoiador do Donald Trump. Em 2017, a Slope Records assinou com o tio, que já estava bem mal de saúde, com perigo de perder um pé por causa de uma ferida que não cicatrizava enquanto delirava de drogas e anestésicos no Instagram. O cara montou uma nova banda, mas manteve o nome U.S. Bombs. Bom, para mim, U.S. Bombs era ele e Kerry. Apesar de ficar com um pé atrás, fiquei curioso para escutar o que ele iria aprontar. Dois singles foram lançados em vinil. Um com dois covers do The Clash, o que considero meio irônico, já que, se Joe Strummer estivesse vivo, seria totalmente anti-Trump, mas enfim, os covers são decentes, gostei. O single com duas inéditas ficou um pouco aquém do eu estava esperando, então quando saiu esse LP em 2018, nem dei muita atenção, afinal titio Doente Peters já tava bem gagá e com delírios de perseguição nas redes sociais. Mas resolvi dar uma chance pro cara que me trouxe tantas alegrias sonoras um tempo atrás, mesmo ele tendo se tornado uma pessoa amarga, e comprei o LP esse ano. Olha, me desculpe os detratores do cara, mas esse disco é um soco na cara. Punk rock como apenas o mestre do desastre sabe fazer. E, se ser punk é incomodar até os próprios punks, então talvez não exista ninguém mais punk que a lenda viva Duane Peters. Que ele pare de falar besteira e grave mais discos assim.
Boots ‘n’ Booze, Graphic Novel,
Vol. 2, Pirates Press Records – Na boa, olha só que ideia simplesmente genial: alguns veteranos da cena oi!/ punk/mod de Santa Cruz na Califórnia, resolveram escrever e desenhar uma graphic novel contando suas lembranças sobre a cena local no final dos anos 80/começo dos anos 90. E, para deixar tudo ainda mais interessante, cada volume vem com um compacto em vinil. O Volume 1 veio com um single ao vivo, inédito, do Swingin Utters. Esse volume vem com um single da banda de ska The Liquidators. Os editores me garantiram que o terceiro volume está a caminho! Não vacile! Um dos lançamentos mais originais e divertidos dos últimos anos para quem gosta de quadrinhos e street punk.
The Slackers, “Redlight” LP, Pi-
rates Press Records – Originalmente lançado em 1997, a Pirates Press Records fez um lindo trabalho nesse relançamento com um vinil 180 gramas que brilha no escuro. Ska para ninguém colocar defeito.
The Slackers, “Love I Bring” sin-
gle, Pirates Press Records – Quando a vida parecer não ter mais sentido, quando você estiver deprimido, toque essa música bem alta no seu aparelho de som. Uma parceria do The Slackers com o artista japonês Papa B, que canta as estrofes na sua língua natal. O resultado é bizarro, porém lindo. Confie em mim, ouça essa música, compre esse single. Você será uma pessoa mais feliz, garanto.
The Slackers, “Windowland/I Al-
most Lost You” single duplo, Pirates Press Records – Mais um disco incrível da minha banda favorita de ska. São duas músicas em um picture disc de doze polegadas com a imagem impressa à laser no vinil, coisa de outro mundo.
Lars Frederiksen, “To Victory”
EP, Pirates Press Records – Quando o Lars não está em estúdio ou em turnê com o Rancid, ou com o Old Firm Casuals, ou com a banda alemã Stomper 98, ou com os ingleses do Last Resort, o cara não fica parado descansando ou coçando o saco. Ele não para! Nesse EP com cinco músicas, ele mostra como sua voz é poderosa e funciona muito bem em um disco solo que é quase um acústico, mas tem algumas guitarras elétricas aqui e ali. Essencial para fãs do Rancid.
Grade 2, “Graveyard Island: Acoustic Sessions” EP, Pirates Press
Records – Quando os ingleses do Grade 2 começaram a banda, logo se tornaram mascotes da cena street punk devido à idade do trio, formado por garotos adolescentes. Bom, os meninos cresceram e nesse EP, que aliás me surpreendeu, os caras mandam seis músicas acústicas boas demais. Olhando a contracapa do disco, vi que quatro delas tem o Tim Timebomb, do Rancid, como co-compositor. Tá explicado porque me surpreendi. Vou falar mais o quê? Tudo que o Tim toca vira ouro, o cara é o Midas do punk, e aqui nesse disco não foi diferente.
Suzi Moon, “Call The Shots” EP,
Pirates Press Records – Um dos discos que mais gostei da última leva que recebi da gravadora. Punk rock ‘n’ roll de primeira qualidade. As três músicas desse EP de estreia são mais grudentas que chiclete Ping-Pong no cabelo. Uma vez eu estava assistindo aula no Colégio Objetivo, mascando chiclete. Tinha uns quatro na boca, de tuti-fruti. A professora ainda não tinha percebido, senão ela teria me mandado cuspir no lixo. Aliás, que preconceito é esse que professor de escola tem com chiclete? Enfim, eu lá, me achando muito maneiro, fiz uma bola gigante, que acabou ficando maior do que eu esperava. Ela estourou na minha cara, o chiclete grudou todo no meu rosto. Fui mandado para a secretaria na hora. Bom, estou divagando demais, vamos voltar ao ótimo disco da senhorita Moon. A música de abertura, a minha favorita, já mostra que Suzi não está de brincadeira quando canta com sua voz rasgada: “There’s a special place in hell for you” (Tem um lugar especial no inferno para você). A música mal acaba, a agulha entra na segunda faixa e Suzi afirma, de maneira enfática: “I’m not a man and I don’t give a damn” (não sou um homem e não estou nem aí). Para fechar o EP, a banda, que aliás toca muito, solta o recado: “You mean nothing to me!” (você não significa nada para mim). Amigos e amigas, se vocês gostam de rock ‘n’ roll de alta velocidade, preparem-se para entrar para o fã clube da Suzi Moon! Eu já fiz a minha carteirinha. Assista os videoclipes das três músicas no YouTube.
American Oi!, “Skinhead Anthems” LP, Comandante Records – Coletânea não recomendada para os fracos de coração. Talvez você nem consiga dormir direito após escutar essa tijolada sonora. Talvez você tenha que dormir com a luz acessa e tomar um calmante à base de maracujá para se acalmar e não ter pesadelos. Aqui é Oi! de verdade, bruto. São quatro bandas americanas de peso. Peso pesado.
Patriot (de longe a melhor), Mob Mentality, Hardsell e Doug & The Slugz com três músicas cada. E ainda vem com um poster muito bacana. Se você for um bom menino e limpar sempre o sangue, lama e mijo dos seus coturnos antes de entrar em casa, talvez sua mãe deixe você pendurar o pôster com fita crepe na parede do seu quarto. Esse LP foi uma parceria de cinco selos, mas ganhei a minha cópia da Comandante Records.
Booze & Glory, “The Reggae Sessions Vol.2” EP, Pirates Press Re-
cords. Os ingleses do Booze & Glory tocaram aqui no Brasil uns anos atrás e depois voltaram para abrir o show do Dropkick Murphys. Nesse disco, eles transformam seus hits street punks em versões reggae muito bem executadas, com a ajuda das bandas de ska The Londonians e os poloneses da Vespa. Altamente recomendado. Música de festa. Festa boa. Procure também o volume 1.
Strike First, “Wolves” LP, LSM
Vinyl – O gênero street punk produz muita banda genérica, então é sempre uma grata surpresa quando cai em minhas mãos um LP como o de estreia dos americanos Strike First. Confesso que a capa ajudou. Uma arte chamativa sempre ajuda. O picture disc é lindo demais. De um lado é a arte da capa, do outro, uma foto antiga de um bombardeiro da Segunda Guerra Mundial atingido bem no nariz. O som é furioso, porém com melodia. E os caras ainda pegam “Bring it on Down”, do Oasis, e transformam ela em um hino punk rock. Se street punk é a sua praia, tá aqui sua nova banda favorita.
Sweat, “Gotta Give it up” LP, Pira-
tes Press Records – Seria essa banda de Los Angeles a nova cara do hardcore? Vocal feminino, agressividade na medida certa e músicas rápidas fazem desse LP de estreia um verdadeiro presente para os fãs do gênero.
The Gundown, “Dead End Alley” LP, Pirates Press Records – Punk rock direto da Catalunha, cantado em inglês. Adoro a arte desse LP, da capa até a cor do vinil. Design muito bem-feito, assim como as músicas aqui. Se você gosta de punk rock e quer escutar algo novo, esse LP é para você. A banda está na estrada há mais de uma década, vale a pena conhecer. Antes tarde do que nunca.
SESSÃO “NEM SÓ DE PUNK ROCK VIVE O HOMEM”:
Jade Jackson, “Wilderness” LP,
Anti – Segundo álbum da talentosa Jade Jackson, produzido por ninguém menos que Mike Ness, do Social Distortion. Country pop cantado com a alma. Ouça “Bottle it up” e saia cantarolando o refrão imediatamente. Meu filho de cinco anos faz isso. Toda vez que coloco essa música ele se anima e canta junto. Canta errado, mas canta. O menino tem bom gosto. A parte gráfica desse álbum também é um espetáculo. É quase um álbum duplo, mas o lado B não toca. Ao invés de faixas, ele tem umas flores e folhas desenhadas no vinil. Recomendo esse e o primeiro disco dela, “Gilded”, também produzido por Mr. Ness.
La Muchacha, “La Sentada” sin-
gle, Del Corazón Music – Mais um belo single de um dos meus selos favoritos. Na minha opinião, a melhor música está no lado B, “Ranchera Marijuanera”. Só sei que La Muchacha é colombiana, não sei mais nada sobre ela. Vou copiar parte do release da gravadora aqui: “sua música emana da longa tradição de dissidência como expressão de arte, e arte como expressão de vida”. Na boa, compre tudo que esse selo lançar, cada compacto é uma joia rara em vinil.
Por Fernando de Freitas
FORMAS DE OUVIR MÚSICA
FORMAS DE OUVIR MÚSICA
Nestes últimos meses, eu resgatei e reformei o aparelho de som que meus pais compraram no ano do casamento deles, ou seja, 1974. Já próximos de comemorarmos suas bodas de ouro, eu tenho o prazer de ouvir as músicas que mais amo em caixas de 8O mhs que fazem parecer que o artista está em minha sala. Mas saibam, eu tolero alguns ruídos decorrentes da idade do aparelho.
SER VINTAGE É UMA OPÇÃO
Não se iluda, os aparelhos de antigamente não são necessariamente “melhores do que os de hoje”. Aliás, alguns componentes, com o tempo, precisam ser trocados e alguns ruídos tolerados. Existe uma tendencia de se cobrar caro por aparelhos antigos que não necessariamente são tão incríveis assim, então, muito cuidado! Esse meu aparelho é um Gradiente Lab74, casado com uma vitrola Garrard. A gradiente comprou a marca inglesa em um determinado momento de sua história e produziu algumas das melhores vitrolas de que se tem notícia no Brasil. Com o tempo, passaram a produzir aparelhos 3 em 1 com nome próprio, por vezes, com componentes mais baratos, e nem sempre sendo felizes. Aliás, sempre desconfie dos aparelhos fabricados na segunda metade dos anos 80 até a primeira metade dos anos 90. Mesmo marcas de renome escorregaram quando a produção era feita na Zona Franca de Manaus, outras eram até apelidadas de Certeza que Comprei Errado. A parte boa de não querer ser vintage, é que, se você tiver dinheiro, alguns aparelhos no mercado de vitrolas são realmente muito bons, eles trazem o melhor de uma tecnologia que foi desenvolvida por quase um século, com bons discos (novos ou antigos, limpos e em boas condições). Os amantes do som analógico sentem o coração aquecer. As vitrolas de malinha são bonitinhas e pegam bem com o crush, mas nada de fazer a “palestrinha vergonha” alheia das qualidades do som analógico quando você coloca um disco nela.
SISTEMAS HÍBRIDOS
Presente em nossas vidas nas últimas décadas, bons aparelhos de home theater (já em desuso na era do streaming) têm a vantagem de apresentarem uma combinação de receiver com excelentes amplificadores e caixas de som de grande qualidade. Esses sistemas contam com múltiplas entradas e permitem a conexão com o computador, BluRay/DVD/CD, receptores de streaming (como Google Chrome Cast) e até sua vitrola. Vale a pena lembrar que as vitrolas mais antigas não contam com um pré-amplificador, então, se o som ficar muito baixo, é possível que você tenha que gastar alguns trocados para adaptá-la. Por outro lado, os pickups mais atuais conversam muito bem com esses aparelhos. O contrário também pode trazer bons resultados. Aqui em casa, após testes, eu achei mais interessante colocar meu ChromeCast Audio no Gradiente Lab-74. A combinação do streaming de alta qualidade com um aparelho de som desses deu novas cores às músicas. Mas eu não tinha nenhuma reclamação a respeito do som que se reproduzia a partir de meu home theatre Sony (que conta com um excelente subwoofer Yamaha). Por sinal, eu prefiro ouvir meus CD’s (sim, eu guardo toda minha coleção, mas outro dia falo disso) a partir do meu aparelho de BluRay ligado no home theatre. Mas isso só dá para saber testando e descobrindo nossa preferência pessoal.
PRATICIDADE DIGITAL
Você já escolheu seu serviço de streaming? Eu já testei todos os principais disponíveis no mercado (e até alguns meio alternativos). Eu adoro a praticidade de ter tudo à mão (contanto que eu tenha um acesso de qualidade à internet) e discordo de quem valoriza o romantismo de fazer descobertas em lojas de discos ou em círculos de amizade. Sim, era legal, mas acho um argumento elitista e segregacionista. Como produtor de conteúdo, meu prazer é ver aquilo que gosto ser admirado por mais gente tanto quanto possível e os artistas de que gosto tendo carreiras rentáveis. Quanto mais desconhecido, menos rentável é uma carreira. Se sua escolha for a diversidade absoluta (e não a qualidade sonora), não se avexe e aposte no próprio YouTube, é gratuito (se você aguentar os anúncios) e você encontrará tudo que um dia foi bootleg (gravações piratas e/ ou cópias não autorizadas). Por outro lado, se você estiver a fim de gastar mais um pouco para ter a mais alta fidelidade, você precisa conhecer o Tidal. Serviços como Spotify e Deezer se assemelham e têm bom custo-benefício, muda a interface. Se você lê a Revista 440Hz, provavelmente, você não ouve música no autofalante do celular (e se você faz isso, continue lendo essa matéria). Apesar de possível, os graves se perdem e os agudos sobram quando usamos nossos smartphones sozinhos. Também devemos lembrar que distorção é (me perdoem os mais técnicos) resultado do volume saturado de um amplificador e, em um celular, melhor que seja seu autofalante, sempre vai distorcer a música sem nunca atingir um volume considerável. Eles simplesmente não são feitos para isso. Nos últimos meses, tive o privilégio de testar caixas de som Bluetooth de diversas marcas e modelos. A Philips tem diversos modelos interessantes, até uma linha de design vintage que, além de lindos, têm um bom som e são portáteis. O único problema (e não importa a marca) é que as caixas menores podem até preencher bem um ambiente e agradar uma boa reunião de amigos, mas o som se perde numa festa. Outro dispositivo interessante (e de muita qualidade) é a Echo Dot, da Amazon. Além das múltiplas funções (agenda, previsão do tempo, alarme) é divertidíssimo pedir uma música em voz alta e ela começar a tocar. Mas nem sempre ela acerta. Tenho duas, adoro, mas é necessário que a Echodot esteja sempre conectada na tomada (e obviamente à internet).
FONES DE OUVIDO
Acredito que, em todo o mercado, nada é tão diverso quanto os fones de ouvido. Ainda que exista uma tendencia comercial ao Bluetooth, os fones com fio não perdem espaço, uma vez que a latência e conexão podem ser uma questão para os aficionados. “Mas aqueles fones que vieram com o meu celular são uma porcaria, certo?”. Não necessariamente. Algumas marcas comercializaram excelentes fones com seus celulares e tablets - os fones originais da Apple são fenomenais. A questão entre os in-ears e over-ears também causa algum debate, mas o melhor é considerar a atividade que você irá ter com eles. Os over-ears podem ser bastante incômodos na academia, por exemplo, ou para quem usa óculos. Mas há algo que ninguém te fala, o fator closed back e open back (ou simplesmente fones abertos e fechados). A tendencia de mercado são os closed backs, uma vez que isolam melhor do ambiente externo e têm baixos bem definidos. Isso combina com ouvir música em fones em lugares públicos.
Porém, os fones open back garantem mais definição no som e, ao logo do tempo, agridem bem menos sua saúde auditiva. Em geral, são esses os fones usados por profissionais de áudio. Eu venho usando, no último ano, o AKG K414P, por seu excelente custo-benefício. Porém, ele é pouco confortável e razoavelmente frágil. Seu visual não é dos mais atraentes e se assemelha bastante aos fones dos primeiros walkmans dos anos 80. Vale a pena dizer que ele tem a melhor definição de som de um fone razoavelmente barato. Na outra ponta, temos fones como o Sennheiser HD400 que, além de extremamente confortável, é o melhor áudio que já tive num fone. A sensação é a de ouvirmos o som ambiente e não algo reproduzido em seu ouvido. Em termos de fones para profissionais que trabalham com áudio, é uma escolha sem erro. Mas se prepare, custa caro! Menção honrosa aos fones Bluetooth da Philips, tenho tanto os over-ears quanto in-ear, ambos com excelente conexão e som. Fazem bonito no quesito custo-benefício e são fones para conectar seu celular, ou até mesmo a Smart TV (se não quiser incomodar seu parceiro que está dormindo, por exemplo). Os in-ears ainda têm a vantagem de virem em estojo com bateria própria que garante uma carga a mais nos fones se você não puder achar uma tomada. Enfim, as escolhas mais variadas para os mais diferentes usos. Cabe a você pensar qual é a melhor para você ou, talvez, testar todas.