Revista Atuação - Edição 13ª - Março de 2016

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UMA PUBLICAÇÃO DA FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO DO SUL

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ANO 7 | EDIÇÃO 13 | MARÇO 2016




EXPEDIENTE

WWW.FETEMS.ORG.BR Rua 26 de Agosto, 2.296, Bairro Amambaí. Campo Grande - MS CEP 79005-030. Fone: (67) 3382.0036. E-mail: fetems@fetems.org.br

Diretoria Presidente: Roberto Magno Botareli Cesar Vice-presidente: Sueli Veiga Melo Secretária-Geral: Deumeires Batista de Souza Rodrigues de Morais Secretário Adjunto: Marcos Antonio Paz Daz Silveira Secretário de Finanças: Jaime Teixeira Sec. Adjunto de Finanças: José Remijo Perecin Sec. de Formação Sindical: Joaquim Donizete de Matos Sec. para Assuntos Jurídicos: Amarildo do Prado Sec. de Assuntos Educacionais: Joscemir Josmar Moresco Sec. dos Func. Administrativos: Wilds Ovando Pereira Sec. de Comunicação: Ademir Cerri Sec. de Administração e Patrimônio: Paulo Antonio dos Santos Sec. de Política Municipal: Ademar Plácido da Rosa Sec. de Políticas Sociais: Iara Gutierrez Cuellar Sec. dos Aposentados e Assuntos Previdenciários: José Felix Filho Sec. dos Espec. em Ed. e Coordenadores Pedagógicos: Sebastião Serafim Garcia Sec. de Relações de Gênero: Cristiane de Fátima Pinheiro Sec. de Combate ao Racismo: Maria Laura Castro dos Santos Sec. da Saúde dos(as) Trabalhadores(as) em Educação: Maria Ildonei de Lima Pedra Departamento dos Trabalhadores na Educação no Campo: Leuslania Cruz de Matos Suplente 1: Nilson Francisco da Silva Suplente 2: Rejane Eurides Sichinel Silva Suplente 3: Idelcides Gutierres Dengue Suplente 4: Elizabeth Raimunda da Silva Sigarini Suplente 5: Ivarlete Pinheiro Suplente 6: Maria Suely Lima da Rocha Vice-presidentes regionais: Amambai: Olga Tobias Mariano e Valério Lopes Aquidauana: Jeferson de Pádua Melo e José de Ávila Ferraz Campo Grande: Paulo Cesar Lima e Renato Pires de Paula Corumbá: Luizio Wilson Espinosa e Antonio Celso M. dos Santos Coxim: Thereza Cristina Ferreira Pedro e Onivan de Lima Correia Dourados: Anderci Silva e Apolinário Candado Fátima do Sul: Maria Jorge Leite da Silva e Nilsa Maria Bolsanelo Sales Jardim: Ludemar Solis Nazareth Azambuja e Sandra Luiza da Silva Naviraí: Valdecir Roberto Mandalho e Margareti Macena de Lima Nova Andradina: Edson Granato e Izabel Silveira da Rosa Paranaíba: Tânia Mara de Morais Silva e Tânia Aparecida da Silva Marques Ponta Porã: Joel Aparecido Barbosa Pereira e Luiz Carlos Marques Valejo Tacuru: Jandir Carlos Dallabrida e Elizeu Gomes da Silva Três Lagoas: Maria Aparecida Diogo e Maria Inês Anselmo Costa Delegados de base à CNTE: Campo Grande: Idalina Silva Miranda: Robelsi Pereira Nova Andradina: Maurício dos Santos Conselho Fiscal da FETEMS: Anastácio: Rodney Custódio da Silva Campo Grande: Alceu Wanderley Lancine Dourados: José Aureliano da Silva Costa Rica: Rosely Cruz Machado Nova Alvorada do Sul: Irene do Carmo Assessoria de Imprensa da FETEMS: Karina Vilas Boas e Azael Júnior

Redação e Produção Íris Comunicação Integrada Rua Chafica Fatuche Abussafi, 200 Parque dos Poderes - 79036-112 Campo Grande/MS + 55 67 3025.6466 Publicações: [2006-2007] 2012Impressão: Idealiza Gráfica Editora e CTP Londrina (43) 3373-7879 www.idealizagraf.com.br Tiragem: 10 mil exemplares Os textos assinados são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, a opinião da revista.

Diretora de criação: Nanci Silva Diretor de arte: Rogério Castilho Jornalista responsável e editora: Laura Samudio Chudecki (DRT-MS 242) Revisão: Greice Maciel Colaboram nesta edição: Diego Silva Fotos Wilson Jr. Fabiana Pegoraro Isabela Lyrio - Marcha das Margaridas Ago/2011 Assessoria de Imprensa da Prefeitura Municipal de Figueirão


DESTAQUES

Interior .....................................................................................................................................................7 Merendeira participa de concurso de receitas, e torta de pequi destaca município de Figueirão/MS na gastronomia nacional e na produção de alimentos orgânicos

Libras .....................................................................................................................................................16 Centro Estadual de Atendimento ao Deficiente da Audiocomunicação (CEADA), em Campo Grande/MS, é referência no país no ensino de pessoas com surdez

Entrevista ...........................................................................................................................................24 Zezinho Prado, presidente de uma das maiores entidades sindicais do estado de São Paulo, fala sobre educação e movimento LGBTT

Capa ......................................................................................................................................................30 Sexualidade e gênero é um tema que ainda gera polêmica na comunidade escolar, e especialistas defendem a capacitação como meio de naturalizar a questão

Capacitação .......................................................................................................................................55 Cursos técnicos oferecidos na rede pública de ensino formam novos profissionais e ampliam o currículo de quem já está no mercado de trabalho

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EDITORIAL

Soltando as amarras da escola A Revista Atuação inicia 2016 com mais um debate sobre as temáticas que efervescem na sociedade e no ambiente escolar. Achamos o momento oportuno para abordar o tema sexualidade e gênero, uma vez que decisões políticas de âmbito nacional interferem nos núcleos familiares mais variados, censurando e discriminando parte da população. O tema “sexualidade e gênero” precisa ser contemplado pela escola de forma a dissipar o conceito equivocado que há em torno da questão, sem polêmicas, sem censuras ou, ainda, sem causar inquietação na comunidade escolar. É preciso uma abordagem que estimule a reflexão e a compreensão. Falar sobre sexualidade é falar sobre nós mesmos, sobre a história da humanidade, sobre política e cultura. É também uma ferramenta de combate a todas as formas de violência, preconceito e discriminação. Fatos recentes, como a polêmica em torno da frase da escritora francesa Simone de Beauvoir, em uma prova do ENEM, demonstram que o machismo ainda persiste em nossa sociedade e que a mulher continua minimizada em relação ao homem. É preciso soltar as amarradas que impedem a escola de navegar pelos mares da sexualidade e do gênero, desta forma, vamos garantir que a escola seja um espaço do livre pensamento, laico e democrático, responsável pela formação de cidadãos plenos e conscientes. Ainda nesta edição, você vai conhecer a receita da torta de pequi da Dona Ambrosina, merendeira do município de Figueirão/MS, que participou do concurso Melhores Receitas da Alimentação Escolar, do MEC, e apresentou o sabor da culinária sul-mato-grossense para o Brasil. Aproveitando a história da Dona Ambrosina, fica o convite para todos os municípios, bem como para todos os SIMTEDs afiliados da FETEMS, para que enviem à nossa editora histórias, projetos e ações realizadas na rede de ensino do estado, seja na rede municipal ou estadual. Nossa proposta é mostrar que a escola pública é atuante e que é possível construir uma sociedade melhor por meio da Educação. Gostaria de ressaltar que a Revista Educação é feita para os(as) educadores(as) que estão na base do ensino, por isso, a participação de todos(as) é tão importante na elaboração das nossas reportagens. Nesta edição, segue um anúncio com informações sobre o envio de comentários e sugestões de pautas para nossa editora. Desejamos um ano letivo de compromisso com a Educação e de luta pela valorização dos trabalhadores e das trabalhadoras. Continuamos com o nosso ideal de construir uma escola pública cada vez melhor!

Roberto Magno Botareli Cesar Presidente da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul


FIGUEIRÃO

Prato elaborado pela merendeira Ambrosina Crisóstomo representou o município de Figueirão/MS no prêmio nacional de Melhores Receitas da Alimentação Escolar do MEC Por Diego Silva

Fotos: Assessoria de Imprensa da Prefeitura Municipal de Figueirão

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“Meu maior prêmio é ver uma criança elogiar o prato do dia, esse não tem preço e me satisfaz mais do que qualquer outra coisa” Ambrosina Crisóstomo, merendeira e criadora da torta de pequi

N

a pequena cidade de Figueirão, 226 quilômetros da capital sul-mato-grossense, as histórias da merendeira Ambrosina Crisóstomo da Silva e do agricultor Gerônimo Rosa se encontram. Ambos trabalham cuidando, direta ou indiretamente, da saúde de 300 crianças matriculadas na Escola Municipal Professor Antônio Inácio Furtado, por meio de um merenda saudável. Uma vez por semana o senhor Gerônimo, com a ajuda de sua esposa, carrega o seu trator com alface, cenoura, couve, tomate, pequi e melancia, e percorre cerca de 10 quilômetros até o portão da escola, onde serão preparados alimentos para crianças do pré ao nono ano. Os produtos são orgânicos, desenvolvidos apenas com adubo de origem animal e vegetal. O recurso para aquisição de todos esses produtos são do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), repassados ao Programa Nacional

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de Alimentação Escolar (PNAE), beneficiando todas as escolas públicas e filantrópicas do país, da educação infantil ao ensino de jovens e adultos. Ele existe graças à Lei nº 11.947, determinante para que no mínimo 30% da merenda escolar seja comprada diretamente de agricultores familiares, sem licitação. No caso de Figueirão, 50% da merenda vem da agricultura familiar, com meta de superar este volume em 10% ainda em 2016, sendo todos agroecológicos. “São anos de dedicação à produção de verduras e frutas, mas com essa iniciativa, de produzir para as crianças da escola, vimos a necessidade de expandir e de melhorar. Hoje aumentamos a área dedicada às frutas, mas caso seja criada a feira municipal, como está previsto, teremos de aumentar ainda mais a produção”, comemora o senhor Gerônimo, que já comercializa 40% de toda sua produção para a escola de Figueirão. Mas onde mesmo que a his-

tória desse pequeno agricultor se esbarra na da merendeira Ambrosina? Com 39 anos, concursada na escola, Ambrosina e suas colegas de trabalho são responsáveis por dar um sabor a mais na produção do senhor Gerônimo, garantindo a aprovação das crianças na hora do recreio. Com apoio da nutricionista Ivete Coelho de Souza e da diretora da escola, Elenice Fátima Custódio da Silva, Ambrosina chegou a representar o município no prêmio nacional de Melhores Receitas da Alimentação Escolar, do Ministério da Educação. E o prato elaborado especialmente para as crianças e inscrito no concurso foi a torta de pequi. Elas contam que o pequi é muito comum na região e que a estratégia era conciliar um produto saudável, nutritivo e barato, em época de safra. “Entre os meses de novembro e fevereiro, o pequi se torna muito comum


nesta região e, além de possuir um óleo altamente nutritivo, antioxidante e anti-inflamatório, é um fruto que possui ácidos graxos monoinsaturados, que fazem bem ao coração, semelhante aos óleos encontrados em azeite e nozes. Nossas crianças merecem o melhor da alimentação e, com essa torta, ainda valorizamos nossa cultura”, avalia Ivete. Infelizmente a torta não foi finalista do concurso, mas para Ambrosina sua comemoração é garantida com os elogios dos alunos. “Meu maior prêmio é ver uma criança elogiar o prato do dia, esse não tem preço e me satisfaz mais do que qualquer outra coisa”, enfatiza a mulher que se dedica às cozinhas escolares há mais de uma década. “O investimento nos produtos da agricultura familiar incluídos na merenda escolar, além de fortalecer toda a cadeia da economia local, fornece um alimento muito mais saudável às crianças e jovens em nossas unidades escolares. Alimentos que a Ambrosina soube utilizar com maestria para elaborar a receita que concorreu no concurso do MEC”, pontuou a presidenta do Sindicato Municipal dos Trabalhadores em Educação (SIMTED) de Camapuã, Ivarlete Pinheiro. Outra ação local que contribui diretamente com a qualidade da alimentação escolar é desenvolvida pela Secretaria Municipal de Agricultura e Pecuária, o Programa Produzir Mais. Por meio dele, a Prefeitura Municipal de Figueirão subsidia ferramentas a favor da agricultura familiar, por meio de ações e investimentos voltados à produção leiteira, fornecimento de genética, estímulos à hortifruticultura e à produção

de mandioca. “Com este projeto, conseguimos acompanhar de perto a produção familiar do município, diagnosticando o potencial de cada uma e produzindo alimentos de qualidade, que posteriormente serão incluídos na merenda escolar, além de disponibilizado à população urbana”, apresenta o secretário Fernando Barbosa. Os produtores rurais do município são orientados a produzir de acordo com o cardápio escolar, com a finalidade de uma diversificação. Uma parceria para consultorias nas propriedades foi firmada com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Mato Grosso do Sul – Sebrae/ MS, o que contribuirá para o desenvolvimento do Produzir Mais. Inovador, o Programa em breve entregará nas escolas o leite produzido em uma comunidade quilombola Santa Tereza, em Figueirão. Lá 120 mil litros de leite são produzidos todo mês, por cerca de 64 moradores, de 28 propriedade, que formam a Associação de Moradores e Produtores Rurais da Comunidade Quilombola de Santa Tereza – Amprust. Segundo o prefeito de Figueirão, Rogério Rosalin, o Programa vai além. “Desenhamos um grupo de estratégias que nos possibilitará oferecer alimentos de qualidade, orgânicos, e que abrem uma janela para a valorização de um cardápio regional. Isso, além de impactar na saúde e na disposição dos alunos, aumenta a renda dos pequenos produtores e valoriza nossa terra com investimentos justos”.

O agricultor Gerônimo Rosa produz alface, cenoura, couve, tomate, pequi e melancia orgânicos. Uma vez por semana carrega seu trator e faz a entrega dos alimentos que serão utilizados na merenda escolar de mais de 300 alunos da Escola Municipal Professor Antônio Inácio Furtado, em Figueirão/MS

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Melhores receitas do MEC O concurso foi realizado pelo Ministério da Educação, em parceria com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), para marcar os 60 anos das primeiras iniciativas do governo federal na área de alimentação escolar. As inscrições ficaram abertas entre setembro e outubro do ano passado, e a etapa final aconteceu no dia 28 de janeiro de 2016, em Brasília/DF. No total foram 15 finalistas escolhidas entre mais de 2 mil receitas inscritas. Foi selecionada uma de cada região do país, que levou para casa um prêmio de R$ 5 mil e uma viagem internacional para o Chile, com direito a acompanhante.

Confira o nome das vencedoras por regiões: Sul Maria de Lurdes Fidélis – Matelândia (PR) Torta de Arroz Nutritiva Nordeste Djanira Souza – Salvador (BA) Abará de Carne Moída com Aipim Centro-Oeste Osmarina Pereira – Iporá (GO) Torta Saborosa de Batata-Doce com Peixe Norte Maria Alerte da Silva – Parauapebas (PA) Arroz de Cuxá com Charque Sudeste Anilda Berger – Santa Maria de Jetibá (ES) Bolo Salgado de Arroz da Anilda

As receitas finalistas estão na página oficial do concurso, no endereço: http://melhoresreceitas.mec.gov.br/

Fonte: Agência Brasil

Torta de pequi Ingredientes para o recheio:

Modo de preparo:

• • • • • • • •

Em uma panela coloque o óleo do recheio, frite o alho e a cebola. Coloque o frango desfiado, o sal e frite até dourar. Adicione o extrato de tomate, o tomate picado e cozinhe por três minutos. Coloque o pequi e deixe refogar junto com os demais ingredientes, reserve. Na batedeira, bata os ovos, o leite, o sal e o óleo. Adicione o trigo até dar o ponto de massa homogênea e adicione o fermento em pó. Em uma forma untada, coloque uma camada da massa, depois uma camada de recheio, adicione por cima do recheio o queijo e finalize com o restante da massa. Leve ao forno pré-aquecido e asse por 35 minutos. Retire do forno e decore com cheiro-verde ou como preferir. Sirva!

• •

300 g de peito de frango desfiado Alho a gosto 1 cebola média ralada 1 colher de sopa de óleo de soja 1 tomate grande picado Cheiro-verde a gosto 100 g de muçarela 6 colheres de sopa de pequi cozido e picado 2 colheres de sopa de extrato de tomate Sal a gosto

Ingredientes para a massa: • • • • • •

3 copos (de requeijão) de trigo copo de óleo 3 copos de leite 3 colheres de sopa de fermento em pó 2 ovos Uma pitada de sal

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ARTIGO

D

e acordo com a Constituição Federal de 1988 (CF/88), a educação no Brasil é um direito de todos e dever do Estado e da família (Art. 205), sua oferta pública é organizada por meio do “regime de colaboração” entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios (Art. 211). A legislação brasileira que trata da educação escolar reconhece dois níveis de ensino: a Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio) e a Educação Superior, articuladas por etapas e modalidades (EaD, EJA, Educação Profissional, Educação Escolar Indígena, Educação Especial, Educação do Campo, Educação Quilombola). A busca por um curso de pós-graduação lato e stricto sensu está vinculada à vontade de ampliar os anos de estudos, ter aprofundamento dos conhecimentos, prática de pesquisa, manejo dos aspectos conceituais e epistemológicos do conhecimento, forma-

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ção e atuação profissional. Essa escolha exige disposição e investimentos de recursos, tempo e energias. A valorização dessa etapa de formação está relacionada com as políticas e a gestão da educação, bem como com a perspectiva do Estado de bem público social e o direito humano universal. Em Mato Grosso do Sul, as informações sobre o objeto de pesquisa, a valorização, o papel e o perfil desse profissional da Educação no sistema de ensino básico são difusas. Quantos doutores trabalham na educação básica em MS? Qual é a importância desse tipo de formação para a escola e os discentes? São reconhecidos e incorporados pelo Estado aos interesses da Educação Pública, da promoção humanística, científica, cultural e tecnológica da sociedade? O que preconiza o Plano Estadual de Educação (PEE/MS 2014-2024) sobre as condições e a valorização desse profissional da Educação?

Segundo Viotti (2010), os programas de mestrado e doutorado no Brasil estruturaram-se e ganharam força, especialmente a partir dos anos de 1970, como política de Estado e como um importante instrumento para as políticas de desenvolvimento científico e tecnológico do país. O número de doutores e mestres representa uma parcela diminuta da população total do país, entretanto, houve avanços, ampliação e inovações nos programas de mestrado e doutorado. De acordo com os dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), referentes ao período de 1998 a 2014, há um crescimento surpreendente de alunos matriculados e titulados nos cursos de mestrado e doutorado, fato que corrobora para a ampliação demográfica da base técnica-científica brasileira e a difusão do conhecimento, ao longo dos últimos anos, como indica a tabela 01.


Tabela 01 – Brasil: Alunos matriculados e titulados nos cursos de mestrado e doutorado, ao final do ano, 1998-2014 Ano

Doutorado Matriculados

Doutorado Titulados

Mestrado acadêmico matriculados

Mestrado acadêmico titulados

Mestrado profissional matriculados

Mestrado profissional titulados

1998

26.697

3.915

49.387

12.351

-

-

1999

29.895

4.831

54.792

14.938

589

43

2000

32.900

5.318

60.425

17.611

1.131

210

2001

35.134

6.040

62.353

19.651

2.956

362

2002

37.728

6.894

63.990

23.457

4.350

987

2003

40.213

8.094

66.951

25.997

5.065

1.652

2004

41.261

8.093

69.190

24.755

5.809

1.903

2005

43.942

8.989

73.805

28.605

6.301

2.029

2006

46.572

9.366

79.050

29.742

6.798

2.519

2007

49.667

9.915

84.356

30.559

7.638

2.331

2008

52.750

10.711

88.295

33.360

9.073

2.654

2009

57.917

11.638

93.016

35.686

10.135

3.102

2010

64.588

11.314

98.611

36.247

10.213

3.343

2011

71.890

12.321

105.240

39.544

12.505

3.689

2012

79.478

13.912

109.515

42.878

14.724

4.260

2013

88.575

15.544

111.156

45.356

18.417

5.134

2014

94.850

16.745

115.558

44.502

21.973

5.727

Fonte: http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/6629.html.

Conforme Fernandes (2016), quase 80% dos doutores que lecionam no Ensino Fundamental no país atuam na rede pública, ainda são poucos os que alcançam a pós-graduação stricto sensu. De acordo com o Censo Escolar de 2010, há apenas 1.156 doutores atuando no Ensino Fundamental. De acordo com Foreque (2016), dos 2,1 milhões de professores que atuam em salas de

aulas nas escolas do Brasil, 682,3 mil continuaram seus estudos após a graduação. Três de cada dez docentes das redes pública e privada concluíram especialização, mestrado ou doutorado. A meta é que, até 2024, chegue ao patamar de 50%, como prevê o Plano Nacional de Educação (PNE). Segundo a autora supracitada, dos 524.315 docentes do Ensino Médio, 7% (36.994) não

têm Ensino Superior e 182 têm apenas o Ensino Fundamental. Dos níveis da Educação Básica, o Ensino Médio é o que concentra o maior número de docentes com título de doutor (ao todo, são pouco mais de 6.000). Um fenômeno de destaque é o crescimento do índice de professores com pós nos últimos anos: em 2008, o percentual era de 25,2%; em 2011, 27,18%, como indica o infográfico abaixo.

Infográfico: Professores com pós

2.190.743 professores em sala de aula, em 2014* Percentual de profissionais em sala de aula com pós

31,14% (682.319)

têm pós-graduação

639.916 têm especialização

36.343 têm mestrado

25,2%

27,2%

31,1%

2008

2011

2014

6.060 têm doutorado

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/ educacao/2015/05/1627427-mec-quer-acelerar-expansao-de-pos-entre-docentes-da-educacao-basica.shtml

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Conforme informações da Fundação de Apoio ao Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado (Fundect, 2016), com base em um levantamento realizado pela Secretaria de Estado de Administração, dos 48,1 mil servidores públicos do Estado de Mato Grosso do Sul, apenas 17 mil possuem curso superior; 12 mil cursaram pós-graduação, desse total, 401 têm doutorado e somente 64 fizeram pós-doutorado. O sistema educacional do Estado de Mato Grosso do Sul, no que tange ao docente do nível de Educação Básica, que desen-

volve suas atividades na etapa do Ensino Médio, com titulação de doutorado, não encontra guarida em regulamentações legais nem valorização financeira de acordo com sua formação. Segundo a Lei Complementar Estadual nº 87/2000, os níveis máximos de reconhecimento da formação de professores são: III, que compreende habilitação específica de pós-graduação obtida por curso com mais de 360 horas, e IV, o curso de mestrado. Em relação à remuneração, ambos estão no mesmo patamar salarial.

Conforme o Plano Estadual de Educação (PEE/MS, 2016), com base nos dados de 2010, o total de profissionais da Educação do Estado é de 16.654 mil, distribuídos nas diferentes etapas e modalidades da educação. Trinta e sete por cento dos docentes têm pós-graduação e 1,3% possui titulação de mestrado ou doutorado. Desse total, 5.830 estão lotados como professores no Ensino Médio. Com relação à formação, 5.748 docentes têm licenciatura e/ou graduação e 82 somente o Ensino Médio, como se observa na tabela 02.

Tabela 02: Funções docentes por modalidade e etapa de ensino – Rede Estadual de Ensino (2010) Etapa/Modalidade

Com Ensino Médio ou Magistério

Com Licenciatura e/ou Graduação

Sem Ensino Médio

Total

Creche

33

3

-

36

Pré-Escolar

20

2

-

22

Ens. Fundamental

8.527

252

2

8.781

Ensino Médio

5.748

82

-

5.830

EJA

1.950

35

-

1.985

TOTAL

16.278

374

2

16.654

Dados e Metas de Formação de Professores Dados Brasil

Dados MS

Meta PNE

Meta PEE-MS

Docentes com pós29% graduação (lato e stricto sensu)

37%

50%

60%

Docentes com mestrado 1,5% ou doutorado

1,3%

---

20%

O profissional da Educação com titulação de doutorado, a partir do PEE/MS 2014-2024, conforme estampado na meta 18 e nas estratégias 18.16 das novas proposições dos planos de cargos, carreira e remuneração do Magistério do Estado, passa a existir para a carreira docente, ganha guarida legal e materialização do seu direito, ainda que de forma insuficiente, mas é um avanço. Qual é a importância do doutorado para a educação, a escola, o discente e o próprio docente? Podemos indicar alguns aspectos como: a) qualificação do trabalho docente; b) ampliação dos 14 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

Fonte: Elaboração própria, com base no PEE/MS 2014-2024.

instrumentos do pensamento científico, como os conceitos, os fundamentos filosóficos, epistemológicos da educação, do processo de ensino-aprendizagem; c) atualização na área específica de atuação e/ou disciplina que leciona cada professor. Não é uma formação que se dá como um momento de atualização científica, pedagógica e cultural do professor, mas tem como cerne a formação de pesquisadores, o desenvolvimento de hábitos, tais como: sistematização do conhecimento, depreensão, a partir das teorias, de processos de produção do conhecimento, organização, fun-

damentação e revisão, estudo, leitura, pesquisa, produção de textos, participação e apresentação de trabalhos e capacidade de reflexão sobre a prática e sobre o entorno. O objeto científico do conhecimento da prática educativa não é simplesmente a questão das aquisições dos saberes escolares por um ser, mas sim suas relações. A complexidade de educar por meio de instrumentos teóricos e estimular a pesquisa em sala de aula como axioma educativo, considerando as representações e as dimensões das culturas da escola, da infância, da juventude, as experiências e os proble-


mas sociais, os dilemas da vida cotidiana, o escopo societal, bem como as expectativas do estado, do mercado e da sociedade com relação à prática docente, impõe-se como uma prática que exige uma perene reflexão e pesquisa. O corpus teórico das práticas, a sala de aula, a convivência vis-à-vis com o aluno, as relações entre professores e a estrutura de gestão da escola são campos de desafios e de transformação das “competências universitárias em competências didáticas e educativas” (SERRES, 2011, p. 426). Transformação que opera entre o conservadorismo dos re-

pertórios das práticas e uma tendência à inovação. O doutorado alimenta a “vontade de trabalhar a inteligibilidade do agir” e a capacidade de problematizar a prática, em uma realidade composta por “múltiplas dinâmicas simultaneamente em ação” (SERRES, 2011, p. 427428). Esse processo extrapola os limites da mera formação de saberes, que, segundo Serres (2011, p. 428), não possibilita uma “análise simultânea das múltiplas dinâmicas em ação”, como, entre outras, a dinâmica do desenvolvimento das potencialidades cognitivas

Referências BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 8 fev. 2016. BRASIL. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Brasil: Alunos matriculados e titulados nos cursos de mestrado e doutorado, ao final do ano, 1998-2014. Disponível em: <http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/6629.html>. Acesso em: 12 fev. 2016. FERNANDES, Elisângela. Professores doutores: eles são a exceção. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/professores-doutores-eles-sao-excecao-683015.shtml>. Acesso em: 10 fev. 2016. FOREQUE. Flávia. MEC quer acelerar expansão de pós entre docentes da educação básica. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/educacao/2015/05/1627427-mec-quer-acelerar-expansao-de-pos-entre-docentes-da-educacao-basica.shtml>. Acesso em: 9 fev. 2016. MATO GROSSO DO SUL. Fundação de Apoio ao Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado (Fundect). Fundect e Escolagov estudam criação de programa de mestrado

do professor, que, ao longo do seu processo de formação, amplia os saberes epistemológicos sobre os conhecimentos e a sociedade; a dinâmica da participação em uma comunidade de prática, que busca compreender e transformar a política de ensino, de defesa da qualidade, da escola pública e do saber científico, o envolvimento com o seu trabalho e com a escola; a dinâmica identitária do status coletivo do profissional da Educação, de sua importância social como profissional do ensino, de defesa de seus direitos e dos espaços políticos organizados.

e doutorado para servidores. Disponível em: <http://www.noticias.ms.gov.br/fundect-e-escolagov-estudam-criacao-de-programa-de-mestrado-e-doutorado-para-servidores/>. Acesso em: 8 fev. 2016. __________. Plano Estadual de Educação (PEE/MS). Disponível em: <http:// www.sed.ms.gov.br/wp-content/uploads/sites/67/2015/05/Plano-Estadual-de-Educa%C3%A7%C3%A3o-MS.pdf>. Acesso em: 15 fev. 2016. __________. Lei Complementar n. 87, de 31 de janeiro de 2000. Dispõe sobre o Estatuto do Magistério Estadual de Mato Grosso do Sul e dá outras providências. Disponível em: <http://aacpdappls.net.ms.gov.br/appls/legislacao/secoge/govato.nsf/66ecc3cfb5 3d53ff04256b140049444b/cc3aad25c09897f804256c0000561af3?OpenDocument>. Acesso em: 15 /fev. 2016. SERRES, Guillaume. Formação docente. In: ZANTEN, Agnès (Org.). Dicionário de educação. Petrópolis: Editora Vozes, 2011. VIOTTI, Eduardo Baumgratz. Doutores 2010: estudos da demografia da base técnico-científica brasileira. In: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). Doutores 2010: estudos da demografia da base técnico-científica brasileira. Brasília, DF: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010.

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LIBRAS

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A

viagem do estado do Pará até Mato Grosso do Sul foi longa, mas o cabeleireiro José Carlos Saraiva não se arrepende da mudança quando vê a filha ganhando autonomia e independência. Fernanda Coronel Saraiva, de 12 anos, nasceu surda. Os pais descobriram a deficiência quando ela tinha um pouco mais de um ano. Foi então que alguém disse que em Campo Grande/MS havia um local com atendimento especializado para crianças que nasciam com surdez. Com a informação, a família decidiu atravessar o país para que a pequena pudesse ter uma oportunidade melhor de vida. Desde que chegou ao Centro Estadual de Atendimento ao Deficiente da Audiocomunicação (CEADA), Fernanda aprende a Libras [Língua Brasileira de Sinais]. O mundo silencioso da menina ganhou interatividade e, no final de 2015, completou o 5º ano do Ensino Fundamental. “Agora ela está pronta para entrar em uma escola regular. Não tem outro lugar para alfabetizar uma criança surda me-

lhor do que aqui.”, afirma o pai, que também passou a estudar Libras para facilitar a convivência com a filha. A Libras é utilizada para comunicação entre pessoas com deficiência auditiva, e entre surdos e ouvintes. É uma língua como qualquer outra, com estruturas sintáticas, semânticas, morfológicas, etc. Tem origem da língua de sinais francesa. As linguagens de sinais não são universais, elas diferem de país para país e até mesmo de região para região. Aprender Libras é a mesma coisa que aprender outro idioma como inglês, francês ou italiano. “Existe um preconceito muito grande em relação à pessoa surda. Quando começamos a sinalizar com um surdo, as pessoas nos olham diferente. É preciso desmitificar a Libras. É preciso mostrar à sociedade que a Libras é uma língua oficial e é a única maneira de um surdo aprender. Graças à Libras, hoje temos surdos fazendo mestrado”, destaca a professora de Artes Visuais, Roselene Ricartes Guimarães.

Libras é Lei A Lei nº 10.436/2002, também denominada Lei de Libras, mudou a realidade da comunidade surda brasileira e garante o acesso aos direitos básicos, como saúde e educação, por meio da língua de sinais. O Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005, regulamentou a Lei nº 10.436/2002, tratando dos aspectos relativos à inclusão de Libras nos cursos superiores, à formação de professores para o ensino de Libras, à formação de tradutores e intérpretes de Libras, à atuação do Serviço Único de Saúde (SUS), à capacitação de servidores públicos para o uso da Libras ou sua interpretação e à dotação orçamentária para garantir as ações previstas no Decreto nº 5.626/2005. Fonte: UNIFENAS.

“Agora ela está pronta para entrar em uma escola regular. Não tem outro lugar para alfabetizar uma criança surda melhor do que aqui” José Carlos Saraiva, pai da aluna Fernanda Coronel Saraiva

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“Existe um preconceito muito grande em relação à pessoa surda. Quando começamos a sinalizar com um surdo, as pessoas nos olham diferente. É preciso desmitificar a Libras. É preciso mostrar à sociedade que a Libras é uma língua oficial e é a única maneira de um surdo aprender. Graças à Libras, hoje temos surdos fazendo mestrado” Roselene Ricartes Guimarães, professora de Artes Visuais no CEADA

O CEADA O CEADA existe há 30 anos e é referência na educação e no atendimento à pessoa com surdez. Está vinculado à Coordenadoria de Políticas para a Educação Especial da Secretaria de Educação (COPESP-SED), oferece Ensino Fundamental do 1º ao 5º ano, dispõe de equipe interdisciplinar de apoio pedagógico, professores especializados, e sua filosofia educacional bilíngue ensina a Libras como primeira língua e a Língua Portuguesa como segunda língua. Além do Ensino Fundamen-

tal, oferece outros programas como: Atendimento Educacional ao Surdocego, Sócio-Ocupacional, Empregabilidade da Pessoa Surda, Sala de Recursos Educação Infantil, Sala de Apoio Pedagógico de Língua Portuguesa Escrita, Sala de Recursos Multifuncionais e Curso de Libras. A professora Adelaide Prates de Souza Barbosa, que leciona no centro há mais de 25 anos, explica que o modo de ensinar alunos com surdez é muito diferente. “O professor precisa

ter sensibilidade. Por exemplo, como explicar para o surdo o sistema monetário, como cédulas, valores etc.? Não é fácil para eles entenderem todos esses processos. É preciso uma didática específica, com pesquisas e utilização de muitos materiais pedagógicos.” “O surdo precisa ver, tocar e vivenciar situações. Por isso, as artes são importantes no aprendizado do surdo. Usamos muita expressão corporal para explicar determinado conteúdo”, esclarece a professora Roselene.

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Programas do CEADA • Atendimento Educacional ao Surdocego – Tem como objetivo o desenvolvimento de habilidades educacionais, vocacionais e sociais voltadas para a melhoria da qualidade de vida do surdocego e seus familiares. • Sócio-Ocupacional – O programa dispõe de proposta curricular que visa contribuir de maneira efetiva para o desenvolvimento de potencialidades que envolvam atividades de vida autônoma, nos âmbitos domiciliares e sociais. • Empregabilidade da Pessoa Surda – Promove a inserção da pessoa surda no trabalho considerando suas potencialidades e aptidões, provendo o direito de cidadania. • Sala de Recursos Educação Infantil – Propicia o ensino da Libras para alunos de 2 a 5 anos, num ambiente linguístico interativo, com instrutor surdo dando suporte ao processo ensino-aprendizagem. • Sala de Apoio Pedagógico de Língua Portuguesa Escrita – Favorece o aprendizado da Língua Portuguesa escrita através da análise contrastiva com a Língua de Sinais.

• Sala de Recursos Multifuncionais – Dispõe de equipamentos audiovisuais, recursos pedagógicos e de acessibilidade, elaborados e organizados conforme as necessidades específicas do aluno, para a complementação dos conhecimentos específicos.

• Curso de Libras – Voltado para a comunidade escolar, empresas e instituições em geral. 20 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016


Mudando realidades A história do CEADA mudou a história de vida de muitas pessoas com surdez. É o caso de Clara e Aldenir, surdos de nascença, ambos chegaram ao centro para estudar e se tornaram funcionários no local. Aldenir Quirino de Souza é concursado, funcionário administrativo e estava na direção do CEADA até o final de 2015. Clara Ramos Pedrosa é formada em Pedagogia, está cursando Letras-Libras e exerce a função de coordenadora assistente. Na época em que começaram a estudar, a Libras não era uma língua regulamentada. Clara conta que teve muitas dificuldades para terminar os estudos. Sua mãe aprendeu Libras e foi trabalhar como intérprete voluntária na escola onde estudava para ajudá-la. Não existia Política de Educação Inclusiva, e os surdos não tinham direito a um intérprete em sala de aula. Quando Clara conseguiu chegar à faculdade, já havia intérpretes no Ensino Superior, direito garantido por meio da Lei da Libras [Lei nº 10.436/2002]. Para Clara, estudar Libras desde a primeira infância é fundamental para o desenvolvimento do surdo. “A criança ouvinte aprende escutando e vendo. Ela memoriza. A criança surda não faz a conexão

entre ouvir e ver. Ela só aprende vendo. Aprender Libras desde os primeiros anos assegura um futuro melhor para a criança e a família. O surdo que não aprende Libras desde pequeno sofre muito”, sinaliza. Para Aldenir Quirino, escolas como o CEADA são importantes para as pessoas com deficiência auditiva porque os sentimentos dos surdos são diferentes. “O surdo precisa ver e sentir para aprender e por isso precisa de uma didática específica.” A coordenadora pedagógica Doreni Ricartes Guimarães explica que no CEADA o aluno ganha autonomia. “Temos toda uma estrutura voltada para o ensino desses alunos. Dentro de cada sala tem um professor ouvinte e um assistente surdo. O assistente surdo faz o auxílio do professor. Em alguns momentos temos três profissionais dentro de sala de aula para atender um aluno. Também temos fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional e psicólogo. Nas escolas tradicionais, o atendimento dos alunos com surdez é diferente. Em geral, são muitos alunos, quase 50 em uma única sala, um professor regente e um intérprete.”

“A criança ouvinte aprende escutando e vendo. Ela memoriza. A criança surda não faz a conexão entre ouvir e ver. Ela só aprende vendo. Aprender Libras desde os primeiros anos assegura um futuro melhor para a criança e a família” Clara Ramos Pedrosa, coordenadora assistente no CEADA Revista ATUAÇÃO | Março 2016 |

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Inclusão Mesmo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva regulamentada desde 2008, a inclusão ainda é uma realidade distante em algumas regiões do Brasil. É o caso de Maria Eduarda Gonçalvez, de 10 anos, que veio do município de Ponta Porã/MS para estudar no CEADA. A mãe da menina, Roseli Rivas Gonçalves, conta que foi preciso entrar na Justiça para garantir uma vaga em uma es-

População de 4 a 17 anos com deficiência no Brasil. Fonte: IBGE, PNAD, 2009.

Total de crianças e jovens com deficiência, transtorno global de desenvolvimento ou altas habilidades/ superdotação matriculados em escolas públicas e privadas. Crescimento de 10% em relação a 2009, quando o número era de 640 mil.

cola da rede municipal. “Consegui, por meio de determinação judicial, matricular minha filha, mas as escolas não estão preparadas. Não existe inclusão no interior. Ela ficava sozinha em um canto da sala. Então resolvi vir embora para Campo Grande”. Dados do Censo Escolar do INEP, realizado em 2010, mostram que no Brasil há mais alunos com deficiência fora da escola regular do que em sala

2,5

milhões

703 mil

de aula. A cada 10 crianças ou adolescentes em idade escolar, apenas 4 delas têm aquilo que lhes é direito previsto nas leis nacionais. Constata-se que há mais de 1,5 milhão de pessoas com deficiência que não têm acesso aos bancos escolares. O levantamento oficial do INEP contabilizou 928 mil alunos com deficiência ou transtorno global de desenvolvimento matriculados e frequentando salas de aula regulares.

1,5

Pessoas com deficiência que não têm acesso aos bancos escolares.

milhão

928 mil

Alunos com deficiência ou transtorno global de desenvolvimento matriculados em sala de aula regular.

Fonte: Censo Escolar 2010 – INEP.

“Consegui, por meio de determinação judicial, matricular minha filha, mas as escolas não estão preparadas. Não existe inclusão no interior. Ela ficava sozinha em um canto da sala. Então resolvi vir embora para Campo Grande.” Roseli Rivas Gonçalves, mãe da aluna Maria Eduarda Gonçalvez 22 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016



ENTREVISTA ESCOLA PANTANEIRA


J

osé Carlos Bueno do Prado, mais conhecido como Zezinho Prado, é funcionário administrativo e atual presidente do Sindicato dos Funcionários e Servidores da Educação do Estado de São Paulo (AFUSE). Sua militância no movimento sindical da Educação teve início nos anos de 1980, em Junqueirópolis/SP. Além da bandeira em prol da Educação e da valorização dos profissionais, Zezinho carrega consigo a bandeira em defesa do movimento LGBTT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais]. O presidente da AFUSE, uma das maiores entidades representativas do estado de São Paulo, também divide suas atividades com a pasta da Secretaria de Direitos Humanos da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, onde é presidente da Câmara Técnica Permanente de Legislação e Normas do Conselho Nacional de Combate à Discriminação de LGBT (CNCD/LGBT). Seus posicionamentos em defesa do movimento LGBTT e dos direitos humanos são inteligíveis e já levaram Zezinho para além das fronteiras nacionais. Seu currículo coleciona países da Europa e Américas. Em uma das suas últimas viagens, ministrou palestra no congresso Olhares Internacionais, que aconteceu no Canadá. Também esteve, no final de 2015, em um congresso na Costa Rica. Para o militante, a homofobia decorre da falta de informação e do conservadorismo da sociedade. “(…) precisa ser combatida por todos nós, assim como qualquer outro tipo de preconceito”. Nesta entrevista, Zezinho Prado fala do desafio da Educação em seu papel de combater todas as formas de discriminação e promover uma sociedade mais justa e igualitária. Confira.

Atuação - Como você vê o preconceito e a homofobia no Brasil? Zezinho - O preconceito em nosso país possui raízes longas e fortes. Herança de uma colonização violenta baseada em relações de poder e hierarquia, alimentadas por discriminação de raça, cor e classe social. O preconceito está em nossa cultura, está presente em todas as classes e reproduzido, cotidianamente, em todos os espaços sociais: escola, igreja, família, trabalho. Apesar de todas as campanhas institucionais e do trabalho feito por entidades que lutam contra o preconceito, vimos aumentar no Brasil os casos de desrespeito às diferenças, de intolerância, de violência, principalmente contra gays, lésbicas, travestis e transexuais. A homofobia é resultado da falta de informação e do conservadorismo, mas que precisa ser combatida por todos nós, assim como qualquer outro tipo de preconceito. Atuação - Como você analisa a articulação do movimento de luta anti-homofobia no país? Tem sido eficaz no sentido de informar e conscientizar a sociedade sobre as causas que o orientam? Zezinho - Muito embora tenhamos fortes movimentos organizados por instituições ligadas à causa LGBTT [Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais] promovendo debates, produzindo ações e encaminhamentos, contribuindo sobremaneira com uma compreensão mais humanizada, os resultados apresentados pelas políticas públicas voltadas ao tema são insuficientes. Por outro lado, não podemos deixar de reconhecer os avanços trazidos por esses movimentos, que enfrentaram e enfrentam os preconceitos sociais e políticos com relação a toda e qualquer

“O educador precisa educar para a importância dos direitos humanos, para a tolerância crítica com os motivos que estão por trás da discriminação. Esse é o caminho para que formemos cidadãos que vão atuar na sociedade com o objetivo de transformá-la em um espaço coletivo mais justo, pacífico e igualitário” iniciativa que pressuponha versar sobre os direitos da população LGBTT. Ressalta-se que, não obstante as ações e iniciativas legais/legislativas de um ou outro governo estadual ou municipal, o Sistema Nacional de Promoção de Direitos Humanos e Enfrentamento à Violência contra Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais cumpre importante papel na orientação e na mediação desses impasses. Isso, por ser um sistema articulado, interativo e interdependente, com o firme propósito de incentivar a instalação de conselhos estaduais, distrital e municipais LGBTT e de primar pela criação de coordenadorias, concluindo um considerável esforço para a instalação de políticas públicas que promovam a cidadania e os direitos LGBTT. Revista ATUAÇÃO | Março 2016

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Atuação - Existe preconceito ou resistência aos grupos LGBTT dentro dos movimentos sindicais da educação? Zezinho - Diversas pesquisas de renomados institutos voltados para esse tema definem claramente a escola como um ambiente de brutais intolerâncias, concretizadas em violência verbal e, em muitos casos, física contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. Constatamos, nesse universo educacional, a dificuldade enfrentada pelos profissionais no tratamento dos problemas motivados pela intolerância. Consequentemente, o preconceito e a resistência presentes no ambiente escolar esbarram nos movimentos sindicais de educação que trabalham com ações voltadas aos grupos LGBTT. Porém, as iniciativas voltadas para promover e garantir o respeito à diversidade sexual têm se multiplicado e ganham espaço cada vez maior em nossa sociedade como um instrumento singular de conscientização sobre os direitos das pessoas LGBTT.

intolerâncias que ainda habitam o espaço educacional”. Como a comunidade escolar deve começar essa construção? Zezinho - A diversidade na educação requer atenção redobrada. Seus reflexos produzem realidades que atentam contra os princípios da igualdade e invertem a lógica que busca uma escola que não seja apenas um fio condutor das injustiças cometidas pela sociedade. Por isso, é preciso engajamento e políticas públicas para enfrentar essa triste realidade. A comunidade escolar deve estar presente nessa luta, trazer o tema para o debate, refletir sobre suas causas e consequências, propor ações positivas, para que a escola se aproxime cada dia mais daquilo que deveria ser a sua vocação: a responsabilidade de orientar e contribuir na formação do sujeito crítico e sintonizado com suas obrigações sociais.

Todos esses movimentos têm como foco a defesa dos direitos universais dos seres humanos e dos direitos básicos do cidadão. São imprescindíveis para a construção de uma sociedade justa, digna e igualitária

Atuação - Durante a 2ª Conferência Nacional de Educação (CONAE), você falou sobre “Educação e Diversidade Sexual” e disse que “a educação deve ultrapassar as barreiras da mera transmissão de conteúdos ou aquisições de certificações, e precisa assumir um caráter social e cidadão na construção de uma sociedade sem as diversas 26 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

Atuação - Em maio deste ano, a CNTE lançou a campanha “Diversidade é vida. Por uma escola livre de preconceitos”. Como foi a receptividade da campanha na Rede Pública de Ensino e nas entidades filiadas à Confederação? É possível fazer uma avaliação? Zezinho - A CNTE entende que a escola tem um papel fundamental para desconstruir a discriminação. Nesse sentido, a campanha busca conscientizar todos os profissionais da educação sobre a necessidade de ga-

rantir a inclusão, incentivando o respeito à diversidade e buscando ações que possam prevenir as diversas formas de violência que recaem sobre a população LGBTT. A campanha foi muito bem recebida e a expectativa é que os gestores escolares se eduquem sobre identidade de gênero e orientação sexual e assumam o compromisso de buscar a qualificação necessária para que todos – professores, secretários, funcionários e estudantes – saibam lidar com o tema no cotidiano escolar. Atuação - A Câmara Federal aprovou recentemente o Projeto de Lei nº 6.583/13, de autoria do deputado Anderson Ferreira (PR/PE), que dispõe sobre o Estatuto da Família. Qual sua avaliação sobre o projeto? Ele vai na contramão da atual realidade em que vive a sociedade brasileira? Zezinho - É um retrocesso e um desrespeito à sociedade brasileira. Ao definir a entidade familiar como o núcleo social formado a partir da união entre um homem e uma mulher, o Projeto de Lei nº 6.583/13 vai contra a realidade do Brasil caracterizada pela presença de diversas formações familiares, entre elas os casais homoafetivos, bem estruturados e capazes de garantir condições de vida dignas aos seus filhos, com respeito, amor e carinho, sem violação de direitos. O Estatuto da Família como está disposto nesse projeto é fruto de uma visão conservadora e excludente. Precisamos garantir e ampliar os direitos dos novos núcleos familiares e não restringi-los. Atuação - Como você analisa as declarações do deputado Marco Feliciano (PSC/SP), um dos titulares da Comissão dos Direitos Humanos, contra grupos LGBTT e negros, justificadas por ele com bases religiosas? Zezinho - É lamentável ver


um homem público, um parlamentar eleito pelo povo e que está à frente de um cargo que deveria zelar pelos direitos humanos, emitir declarações racistas e homofóbicas que ferem os direitos fundamentais do ser humano. Não existe justificativa para a discriminação de raça, cor, orientação sexual ou qualquer outra. Atitudes como essa demonstram como o preconceito é latente em nossa sociedade, presente em todos os níveis sociais e em todas as instâncias de poder, e por isso chama a atenção para a necessidade de avançarmos nos debates e nas ações, visando construir uma sociedade que promova de fato o respeito às diferenças e a igualdade de direitos para todos. Atuação - A CNTE e demais entidades ligadas à educação e direitos humanos, e até mesmo o Ministério da Educação, propõem uma escola plural e voltada para o enfrentamento de toda forma de violência e discriminação. Contudo, muitas escolas ainda limitam a abordagem do tema sexualidade às aulas de Biologia. Por que há essa resistência das instituições escolares em tratar a sexualidade como elemento que faz parte da vida, do indivíduo, e está presente em todos os segmentos da sociedade, especialmente na comunidade escolar onde a sexualidade está em evidência no comportamento de jovens e adolescentes? Zezinho - Identificamos inúmeras formas correlatas de discriminação aos homossexuais “sob o manto” da educação, o que nos resta concordar com a tese de que a grade curricular apresentada e formatada para a aplicação em longa escala é absurdamente falha nesse aspecto. Ainda assim, não podemos nos ater apenas a essa deficiência do sistema educacional, uma vez que os profissionais não estão

preparados para uma realidade cada vez mais presente em nossa sociedade, ou seja, a de famílias que têm em sua organização interna relações homoafetivas e são, definitivamente, negativadas em uma estrutura na qual deveriam ser acolhidas e incluídas como parte, e não à parte. Como forma de reprodução e cristalização dos costumes sociais, a educação transita no termo “homofobia”, embora não tenha consciência, de múltiplas maneiras: como violência simbólica da dominação masculina; como modo de organização e constituição do masculino; e como produção da cultura e dos saberes ocidentais que aparecem na discriminação afetiva, intelectual e política por lógicas heterossexuais. Com isso, homossexuais figuram no contexto educacional como seres humanos subalternos, uma espécie de sub-raça. Na sociedade atual, no âmbito educacional, não se trata de aspecto meramente retórico. Atuação - Que desafios podem ser apontados para o movimento LGBTT no século em que vivemos? Zezinho - Sabemos que o tema é complexo e que o caminho para a solução da demanda é mais ainda. Para o movimento LGBTT, o desafio maior é fazer com que a sociedade entenda que não é possível estabelecer relações humanas sem a elementar preservação do direito ao convívio social, com ameaças à integridade física e à estrutura psicológica das pessoas abaladas. Temos acompanhado nos últimos anos um crescimento considerável dos debates em torno da orientação sexual. Este é o caminho: ampliar os debates e acompanhar as discussões Revista ATUAÇÃO | Março 2016

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em todos os espaços sociais sobre o tema, conscientizar sobre os direitos das pessoas LGBTT e cobrar políticas públicas eficazes para atender, plenamente, as suas necessidades. Atuação - Qual o papel do educador diante da identidade sexual dos alunos? Zezinho - As políticas educacionais voltadas ao direito e ao reconhecimento à diversidade devem estar interligadas à garantia dos direitos sociais e humanos e à construção de uma educação inclusiva, em uma ação pactuada que necessitará de políticas e programas concretos e exequíveis. Tal condição só será possível por meio do reconhecimento da diversidade no desenvolvimento social, histórico, cultural, econômico e político da sociedade. Enquanto se perpetuar uma educação com traços que não acolham bem ao outro, que preserve um currículo oculto formado pela indiferença e pela discriminação, torna-se utópica a possibilidade de mudança. É imperativo o combate à violência simbólica presente na escola por meio da uniformidade de ideias. O educador precisa educar para a importância dos direitos humanos, para a tolerância crítica com os motivos que estão por trás da discriminação. Esse é o caminho para que formemos

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cidadãos que vão atuar na sociedade com o objetivo de transformá-la em um espaço coletivo mais justo, pacífico e igualitário. À medida que nos aprofundamos em teses firmadas nas ges-

“Constatamos, nesse universo educacional, a dificuldade enfrentada pelos profissionais no tratamento dos problemas motivados pela intolerância” tões educacionais, é mais latente a necessidade de uma nova compreensão do papel da educação no universo globalizado em que vivemos. Seu caráter universal, laico, otimista e humanista deve ser preservado, pois é o único caminho que levará à certeza de que a educação é um direito de todos. Para tanto, urgem as primícias necessárias para conjugarmos o termo “educação” com o termo “direito”. E isso não se sustenta apenas no direito de ir

e vir. É o direito de ir e vir com dignidade, respeitando a essência da pessoa humana. Atuação - Os movimentos de luta em defesa dos direitos da mulher, da diversidade sexual, no enfrentamento do preconceito contra raça e outras causas sociais devem caminhar juntos? Abraçar a causa uns dos outros? Isso acontece? Zezinho - Todos esses movimentos têm como foco a defesa dos direitos universais dos seres humanos e dos direitos básicos do cidadão. São imprescindíveis para a construção de uma sociedade justa, digna e igualitária. Embora tenham temáticas diferentes, elas convergem no que diz respeito aos direitos humanos. Ainda que existam, hoje no Brasil, movimentos com suas particularidades e alguns mais avançados que os outros, é preciso encontrar uma via comum para que suas lutas se fortaleçam, para que tenham como resultado a concretização de seus ideais. Mobilizações nesse sentido, com a articulação e a integração de movimentos diversos em prol de uma causa única, vêm acontecendo e se espalhando pelo país, haja vista as mobilizações em favor da redução da tarifa no transporte urbano em várias capitais, manifestações contra a violência e ato em apoio à diversidade sexual.


Dicas para uma boa leitura

Sexualidade, Gênero e Diferenças na Educação das Infâncias Organização: Constantina Xavier Filha Editora: Universidade Federal de Mato Grosso do Sul 375 páginas 611 páginas

O Segundo Sexo Autora: Simone de Beauvoir Editora: Nova Fronteira 936 páginas

O livro tem por objetivo dialogar com profissionais da educação que atuam com a infância ou demais pessoas que se interessam pelos temas sexualidade, gênero e diversidades/diferenças na educação das infâncias. O livro surgiu do interesse constante em produzir materiais pegagógicos que estimulem a reflexão de educadoras e educadores na formação inicial e continuada. Todos os artigos partem de problemas e situações cotidianas das relações pedagógicas, o que facilita o pensar a experiência de educadores/as no cotidiano educativo com crianças.

Publicado originalmente em 1949, este livro é uma obra pioneira dos estudos sobre as mulheres e referência para o movimento feminista dos anos 1970. Da biologia à psicanálise, passando pelo materialismo histórico, Simone de Beauvoir reflete sobre as construções sociais produzidas em torno da “figura feminina”. Traduzido para mais de 30 idiomas e publicado em diversos países, o tratado sobre a “questão da mulher” foi considerado por muitos um atentado à família. É a obra mais fundamental de uma das mais importantes intelectuais do século 20.


CAPA


Sexualidade e GĂŞnero: Esse debate precisa sair do armĂĄrio na escola Por Laura Samudio Chudecki


N

o universo das escolas brasileiras, cabe às disciplinas de Língua Portuguesa, Ciências e Biologia fazer as primeiras abordagens sobre sexualidade e gênero. Em Língua Portuguesa, os alunos aprendem que o gênero da palavra pode ser masculino ou feminino. Já em Ciências, o gênero é definido pela genitália de cada pessoa, ou seja, homens têm pênis e mulheres têm vulva. Em Biologia, a sexualidade é mais aprofundada dando ênfase aos aparelhos reprodutores masculino e feminino, métodos contraceptivos e doenças sexualmente transmissíveis. Sem dúvida, os conteúdos são imprescindíveis no currículo escolar. Entretanto, o reducionismo com o qual o tema “sexualidade e gênero” vem sendo abordado fez da escola um espaço distante da laicidade, onde circulam preconceitos e discriminação de classe, etnia, raça, sexo, gênero, orientação sexual, etc. Historicamente, a escola vem reprodu-

zindo parâmetros de comportamentos baseados na heteronormatividade e demais padrões estabelecidos pela sociedade a partir das suas matrizes de referências sociais, políticas, culturais e religiosas. Há um modelo de educação bem definido, no qual meninos devem agir de uma maneira e meninas de outra. A divisão entre feminino e masculino é vista como algo natural ou pré-determinado, certo ou errado, bonito ou feio, e há o conceito de que a heterossexualidade é a única possibilidade de expressão sexual e de gênero. “Quando alguém rompe com esses padrões comportamentais, surgem manifestações de violência e preconceito”, explica o professor de Ciências Sociais e doutor em Educação Getúlio Raimundo de Lima. Para a pós-doutora em Sexualidade e Gênero na Infância e autora de diversos livros sobre o tema, Constantina Xavier Filha, a instituição escolar e a sociedade precisam refletir sobre sexualidade a partir de uma ótica discursiva, social e histórica e não como sinônimo de sexo. “Quando se fala em sexualidade, imagina-se o tema no âmbito privado. Sexualidade é muito mais abrangente. É um campo minado de discussões políticas, sociais e culturais. Recentemente acompanhamos no cenário político nacional uma

“Quando se fala em sexualidade, imaginase o tema no âmbito privado. Sexualidade é muito mais abrangente. É um campo minado de discussões políticas, sociais e culturais. Recentemente acompanhamos no cenário político nacional uma ala conservadora e religiosa debatendo a questão” Constantina Xavier Filha, pós-doutora em Sexualidade e Gênero na Infância e autora de diversos livros sobre o tema 32 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

ala conservadora e religiosa debatendo a questão”, diz Constantina, referindo-se à polêmica do Estatuto da Família, aprovado em setembro do ano passado, pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal e também da votação do Plano Nacional de Educação e nos respectivos estados e cidades brasileiras. O projeto de lei do Estatuto da Família considera família a união única e exclusiva entre um homem e uma mulher. Famílias homoafetivas ou poliafetivas ficam de fora da lei. Entre os absurdos do texto, a vítima de estupro só poderá receber atendimento na rede de saúde se antes tiver passado pela polícia e se submetido a um exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal e, ainda, não poderá ter acesso à pílula do dia seguinte. Diante de decisões políticas que confrontam a realidade dos núcleos familiares mais diversos, vale lembrar que a escola, embora ainda seja a reprodução de velhos estereótipos, é também um espaço privilegiado, do livre pensamento, onde é possível promover reflexões, críticas e desconstruir paradigmas. Falar sobre gênero e sexualidade na escola é falar sobre direitos humanos, respeito, dignidade, é combater o machismo, a violência contra a mulher, o bullying e outras formas de intolerância.


BARREIRAS E O CONCEITO EQUIVOCADO Então, por que há a dificuldade em abordar essas temáticas dentro do ambiente escolar? Por que não se fomentam atividades pedagógicas de formação docente? A falta de capacitação e a desinformação são alguns dos motivos que contribuem para que as coordenações pedagógicas e os educadores recuem diante de conteúdos que compõem os temas transversais (Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo e Pluralidade Cultural). Além disso, as disciplinas universais ocupam a maior parte da programação anual, que é extensa e exige muito dos profissionais. É importante destacar que os temas transversais fazem parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), criados a partir do Plano Nacional de Educação (PNE), estabelecido em 1999. Esses temas não pertencem a nenhuma disciplina específica, mas atravessam todas elas como se em todas fossem pertinentes. São apenas propostas nas quais as secretarias e as unidades escolares poderão se basear para elaborar seus próprios planos de ensino. No entanto, os sistemas de ensino, por serem autônomos, podem incluir outros temas que julgarem de relevância social para sua comunidade. Para a supervisora escolar Célia de Jesus Alves, a escola está mais preocupada em cumprir com a grade curricular. “Isso não é uma característica específica de uma ou outra escola. É um posicionamento que vem desde as diretrizes escolares. Nossa formação ainda é muito incipiente para tratar em sala de aula questões como sexualidade e gênero. Precisamos de compreensão e capacitação profissional. É necessário desconstruir alguns

conceitos para entendermos que quando falamos de sexualidade estamos tratando de pessoas”, explica. Outro fator é o conceito equivocado que se faz do tema. “Quando citamos sexualidade, as pessoas imaginam que estamos falando prioritariamente de sexo, de como fazer sexo, ou que estamos ensinando sexo para os alunos. Essa é a visão do senso comum. Contudo, sexualidade faz parte do ser humano”, destaca a pós-doutora Constantina. A experiência da professora Charlene Silva Martins demonstra bem as dificuldades que os educadores têm para trabalhar temáticas dessa natureza. A professora, que leciona para alunos com idade entre 7 e 10 anos (Ensino Fundamental), achou pertinente trabalhar determinado filme com uma de suas turmas. O conteúdo falava sobre a história da humanidade e o objetivo era mostrar a evolução da linguagem. “Mas tinha uma cena de um beijo no filme, uma cena entre os homens da pré-história. Por conta dessa cena, no dia seguinte, uma mãe veio me questionar e disse que estávamos falando de sexo com os alunos”, conta. Para Charlene, falar sobre sexualidade com as famílias ainda é muito complexo. “Penso que é uma questão cultural. O aluno traz para dentro da sala de aula suas crenças e valores. Não sabemos de que forma o aluno vai interpretar o assunto e como essa informação vai chegar em casa”, diz. Segundo o

“ (…) Nossa formação ainda é muito incipiente para tratar em sala de aula questões como sexualidade e gênero. Precisamos de compreensão e capacitação profissional. É necessário desconstruir alguns conceitos para entendermos que quando falamos de sexualidade estamos tratando de pessoas” Célia de Jesus Alves, supervisora escolar

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doutor em Educação Getúlio Raimundo, as matrizes de referências (política, religião, cultura) da sociedade estão muito arraigadas nas pessoas e não mudam facilmente. Tanto os pais, como as coordenações pedagógicas e os educadores sofrem essa influência. “Quando discutimos sexualidade e gênero com os alunos, eles ainda associam o tema à anatomia humana, à biologia e à prática sexual. Surgem piadas e comentários de todos os tipos. Entretanto, precisamos entender que sexualidade e gênero extrapolam o determinismo biológico. Seria preciso um empenho muito grande de todas as áreas do conhecimento para mudar esse conceito. A compreensão está muito distante da prática”, pontua. Do ponto de vista da psicóloga e psicanalista Katiuscia Kintschev, para a sexualidade ser colocada em pauta em sala de aula, o educador precisa estar à vontade com o assunto. “É preciso que o professor demonstre naturalidade. Sexualidade é tão natural como comer e beber água. Faz parte de um corpo que existe. Não basta um ciclo de palestras ou cursos de formação se o professor não tiver intimidade com o tema”. “É um desafio fazer o profes-

sor procurar um curso de formação dessa natureza. A maioria vem pela inquietação que a prática em sala de aula causa. Nos cursos de formação, discutimos a desnaturalização e dessacralização que existe na sexualidade. Por isso, a formação especializada e continuada é tão importante”, afirma Constantina Xavier. Trabalhando na linha de frente das relações que envolvem a comunidade escolar, a supervisora Célia de Jesus Alves conta que “existe uma insegurança da parte do profissional que está em sala de aula, pois nem sempre ele tem a garantia que a equipe gestora vai dar o respaldo necessário caso os pais questionem a coordenação”. Ainda segundo ela, o tema é desenvolvido durante as aulas, mas de uma maneira muito tímida. “A escola precisa ser mais crítica. Esse assunto não é discutido entre pais, escola, Associação de Pais e Mestres (APM) nem nas reuniões dos conselhos escolares.” Todas essas situações mencionadas demonstram a fragilidade da escola em relação à “coação” dos pais e da sociedade no que diz respeito às atividades que envolvem a temática. Para Constantina, essa fragilidade decorre da falta de informação e de capacitação. “Exis-

“Penso que é uma questão cultural. O aluno traz para dentro da sala de aula suas crenças e valores. Não sabemos de que forma o aluno vai interpretar o assunto e como essa informação vai chegar em casa” Charlene Silva Martins, professora do Ensino Fundamental

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tem documentos legais que orientam a escola e os profissionais nessas abordagens e também servem de respaldo”, destaca Constantina. Ela defende que esses profissionais estejam munidos dessas informações, entre elas, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que, embora tenham sido questionados recentemente, ainda não foram revogados e servem de referência desde 1999. “Temos que promover a educação para a sexualidade como direito humano. Isso é fundamental. A escola é laica e é um espaço para discussão. Se as crianças querem discutir esses temas, a escola precisa mediar essa informação.” A pós-doutora cita o artigo treze da Convenção dos Direitos da Criança, o qual estabelece que a criança “tem direito à liberdade de expressão”. “Se estamos afirmando que a criança tem direito à liberdade de expressão, ela também tem liberdade de expressão com seus corpos e ideias. Ela pode dizer e perguntar o que quiser”, destaca.


INFORMAÇÃO, LEIS E DIREITOS A escola, sendo um espaço do livre pensamento, pode abordar além dos conteúdos universais, temas de diversas naturezas, desde que exerça seu papel fundamental que é o de promover por meio do conhecimento o desenvolvimento do aluno, formando cidadãos plenamente reconhecidos e conscientes de seu papel em sociedade. No que diz respeito ao tema sexualidade e gênero, fizemos uma relação de documentos, os quais servem de amparo legal diante de eventuais manifestações de “coação” ou “questionamentos” que possam ocorrer no espaço escolar,

sejam de âmbito religioso, cultural ou político. Os documentos são estes: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs); Convenção dos Direitos da Criança; Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes; Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); Lei Antibullying; Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM); Lei nº 11.525/2007, determinando a inclusão obrigatória, no currículo do Ensino Fundamental, de conteúdos que tratem dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo o ECA como diretriz.

CONFIRA: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) – Criados em 1997 pelo Governo Federal, os PCNs são referenciais de qualidade elaborados para nortear as equipes escolares na execução de seus trabalhos. Foram pensados procurando respeitar as diversidades regionais, culturais e políticas existentes no país, considerando a necessidade de construir referências nacionais comuns ao processo educativo em todas as regiões brasileiras. Fazem parte dos PCNs os temas transversais voltados para a compreensão e para a construção da realidade social e dos direitos e das responsabilidades relacionados com a vida pessoal e coletiva e com a afirmação do princípio da participação política. Isso significa que devem ser trabalhados de forma transversal nas áreas e/ou disciplinas já existentes. Os temas transversais correspondem a questões importantes, urgentes e presentes sob várias formas na vida cotidiana. Compreendem seis áreas: Ética (respeito mútuo, justiça, diálogo, solidariedade), Orientação Sexual (corpo: matriz da sexualidade, relações de gênero, prevenções das doenças sexualmente transmissíveis), Meio Ambiente (os ciclos da natureza, sociedade e meio ambiente, manejo e conservação ambiental), Saúde (autocuidado, vida coletiva), Pluralidade Cultural (pluralidade cultural e a vida das crianças no Brasil, constituição da pluralidade cultural no Brasil, o ser humano como agente social e produtor de cultura, pluralidade cultural e cidadania) e Trabalho e Consumo (relações de trabalho; trabalho, consumo, meio ambiente e saúde; consumo, meios de comunicação de massas, publicidade e vendas; direitos humanos, cidadania).

Convenção dos Direitos da Criança – A Convenção sobre os Direitos da Criança é um instrumento ratificado por 193 países, o qual visa à proteção de crianças e adolescentes de todo o mundo. Foi aprovado em Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989, e, no ano seguinte, o documento foi oficializado como lei internacional. Artigo 13 1. A criança tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de procurar, receber e expandir informações e ideias de toda a espécie, sem considerações de fronteiras, sob forma oral, escrita, impressa ou artística ou por qualquer outro meio à escolha da criança. Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes – Atualizado em 2013, o documento estabelece estratégias a serem implementadas pelo poder público e pela sociedade civil até 2020. As ações estão divididas nos eixos: prevenção; atenção à criança e ao adolescente, suas famílias e à pessoa que comete violência sexual; defesa e responsabilização; participação e protagonismo; estudos e pesquisas; e comunicação e mobilização social. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – O ECA (Lei nº 8.069/1990) é considerado um marco na proteção da infância e tem como base a doutrina de proteção integral, reforçando a ideia de “prioridade absoluta” da Constituição.

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Lei Antibullying – A Lei nº 13.185/2015 torna obrigatória a conduta antibullying por escolas e clubes, por meio de medidas de prevenção. No texto, a prática do bullying é caracterizada por atos de violência física ou moral, com o objetivo de intimidar ou agredir, causando danos às suas vítimas. Para evitar que isso aconteça no ambiente escolar, o texto propõe que os educadores recebam as orientações necessárias para agir ativamente contra essas práticas e coibir a violência. Também foi sugerido apoio aos familiares, para que saibam quando o bullying está acontecendo, sejam seus filhos as vítimas ou agressores. Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM) – É um marco no processo de consolidação e amadurecimento das políticas para as mulheres. O PNPM 2013-2015 reafirma os princípios orientadores da Política Nacional para as Mulheres: autonomia das mulheres em todas as dimensões da vida; busca da igualdade efetiva entre mulheres e homens, em todos os âmbitos; respeito à diversidade e combate a todas as for-

mas de discriminação; caráter laico do Estado; universalidade dos serviços e benefícios ofertados pelo Estado; participação ativa das mulheres em todas as fases das políticas públicas; e transversalidade como princípio orientador de todas as políticas públicas. Lei nº 11.525/2007 – A Lei nº 11.525, de 25 de setembro de 2007, entrou em vigor e alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), determinando a inclusão obrigatória, no currículo do Ensino Fundamental, de conteúdos que tratem dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo o ECA como diretriz. A ideia não é criar uma nova disciplina, e sim trabalhar a questão nas disciplinas que já existem, tornando o ECA presente no dia a dia da escola. Com isso, o ECA passa a fazer parte integrante do currículo obrigatório das escolas de ensino fundamental, estabelecendo ainda que deva ser produzido e distribuído material didático adequado ao tema, elevando a escola à condição de disseminadora obrigatória dos direitos da criança e do adolescente.

COMPREENDENDO SEXUALIDADE Em qualquer dicionário da Língua Portuguesa, a palavra sexualidade é definida como substantivo feminino, e, basicamente, qualidade do que é sexual e modo de ser próprio do que tem sexo. Entretanto, sexualidade é um termo muito mais abrangente, que envolve inúmeros fatores e dificilmente vamos encontrar uma definição única e absoluta. Faz parte do ser humano e está muito além da sua anatomia, da prática sexual e da reprodução. É construída ao longo da vida, a partir das experiências e vivências do indivíduo, e, ainda, está relacionada às sensações, aos sentimentos, às emoções e à psique, bem como aos processos históricos, sociais e culturais. Sigmund Freud, o pai da psicanálise, definiu sexualidade como uma energia motriz dos instintos da vida, inerente à pró36 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

pria condição humana. Em seus estudos acerca do tema, destacou que a sexualidade na infância é diferente da vivenciada na fase adulta. Os diferentes estágios da sexualidade na vida do ser humano é um dos fatores que causa “confusão” e distancia educadores da compreensão sobre o tema. No artigo Educação para as Sexualidades, a Igualdade de Gênero e as Diversidades/Diferenças na Educação das Infâncias – Questões a Problematizar, de Constantina Xavier Filha, publicado no livro Sexualidades, Gênero e Diferenças na Educação das Infâncias, organizado por ela mesma e publicado pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), a pós-doutora explica que “a criança que se expressa sexualmente é analisada sob a ótica do adulto, da sexualidade

adulta, que logo atribui àquelas ações sentidos e interpretações de adulto. A maioria dessas interpretações é que a criança está em um ambiente familiar muito sexualizado, possivelmente ouvindo e vendo o ato sexual do pai e da mãe, entre tantas outras crenças segundo as quais a criança é assexuada e sua sexualidade é despertada pelo meio em que vive. Outra representação é a influência ‘nefasta’ dos meios de comunicação social que, para muitas professoras e professores, estão exercendo influência negativa sobre as crianças, despertando nelas algo fora do desejável ao seu tempo de infância ou influenciando para o ato sexual”. Constantina explica que o primeiro passo para a compreensão de pais, professores e coordenações pedagógicas, no


que diz respeito à criança, é entender que ela é um ser sexuado e por isso vive sua sexualidade. Portanto, “quando duas crianças se tocam é uma expressão da sexualidade infantil em que ambas estão fazendo a exploração dos seus corpos. Não podemos rotular e entender essa expressão no mesmo formato com que dois adultos se tocam. E como o educador vai entender essa situação sem a perspectiva adulta? É aí que entra a formação continuada e a especialização”, completa. “Crianças sempre tiveram sexualidade. A relação com o corpo para uma criança não é sinônimo de sexo”, completa a psicanalista Katiuscia Kintschev. Ela diz, ainda, que é importante falar sobre o tema em sala de aula, com as devidas recomendações didáticas para cada idade. “É o momento de dissipar a fantasia dos alunos. Existe uma fantasia de que somos um corpo, quando na verdade nós temos um corpo. Assim, quando falamos com as/ os crianças/alunos, colocamos sentido na relação que aos poucos vamos construindo com o corpo.” Já na adolescência, outras expressões da sexualidade começam a ser vivenciadas, é a fase em que acontece o despertar do desejo sexual, os adolescentes/ alunos começam a desenvolver

outras manifestações da sexualidade. A relação com o corpo é diferente, vivenciam novas descobertas, sensações físicas e emocionais, e surgem, para uma maioria, as primeiras experiências sexuais. Nessa fase é importante orientar os adolescentes/ alunos a respeito da responsabilidade com seu próprio corpo e seu prazer e também com o prazer do outro, bem com as práticas de anticoncepção, de sexo seguro e responsável. Tanto a escola como os pais devem participar desse processo de orientação, propiciando espaço para o diálogo e discussão sobre temas que são comumente silenciados. Katiuscia Kintschev destaca que, mesmo orientando os adolescentes/alunos, as informações que eles recebem dos diversos meios não evita determinados comportamentos. “Os adolescentes sabem como uma mulher engravida, conhecem os métodos contraceptivos e, mesmo assim, o índice de gravidez não planejada no Brasil ainda é alto. A informação dá um empoderamento ao sujeito, mas não lhe dá garantias. De qualquer forma, pais e educadores não podem desistir de orientar seus filhos e alunos, pois a prática sexual sem maturidade pode gerar consequências ruins.”

“Quando discutimos sexualidade e gênero com os alunos, eles ainda associam o tema à anatomia humana, à biologia e à prática sexual. Surgem piadas e comentários de todos os tipos. Entretanto, precisamos entender que sexualidade e gênero extrapolam o determinismo biológico. Seria preciso um empenho muito grande de todas as áreas do conhecimento para mudar esse conceito. A compreensão está muito distante da prática” Getúlio Raimundo de Lima, doutor em Educação Revista ATUAÇÃO | Março 2016

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COMPREENDENDO GÊNERO, IDENTIDADE DE GÊNERO E IDENTIDADE SEXUAL

“Os adolescentes sabem como uma mulher engravida, conhecem os métodos contraceptivos e, mesmo assim, o índice de gravidez não planejada no Brasil ainda é alto. A informação dá um empoderamento ao sujeito, mas não lhe dá garantias. De qualquer forma, pais e educadores não podem desistir de orientar seus filhos e alunos, pois a prática sexual sem maturidade pode gerar consequências ruins” Katiuscia Kintschev, psicóloga e psicanalista 38 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

Sexualidade e gênero são temáticas naturalmente vinculadas, não é possível falar de uma sem entender a outra. Se sexualidade é inerente ao ser humano e, segundo a psicologia, está relacionada à psique, gênero “é a construção sociocultural de masculinidades e feminilidades”, esclarece mais uma vez Constantina Xavier. Abrimos um parêntese para explicar que existem três possibilidades de identidade biológica: nascer com vulva, pênis, ou com vulva e pênis, esse último é o que chamamos de intersexual, que no passado era conhecido como hermafrodita. A pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Guacira Lopes Louro, no seu texto Pedagogias da Sexualidade, afirma “que somos sujeitos de muitas identidades e que essas identidades são transitórias e inacabadas”. Dentre as identidades que nos compõem, podemos citar a identidade de gênero e a identidade sexual. Em geral, as pessoas fazem confusão entre identidade de gênero e identidade sexual. “Identidade de gênero é a forma de nos identificarmos como masculino ou feminino independentemente de possuirmos pênis ou vulva, apesar da influência cultural e educativa que nos ‘impõe’ o gênero relacionado à heteronormatividade”, complementa Constantina. No artigo Sexualidade na Infância: Dilemas da Formação Docente, de Jane Felipe, também publicado no livro Sexualidades, Gênero e Diferenças na Educação das Infâncias, organizado pela pós-doutora Constantina Xavier, publicado pela UFMS, a autora esclarece que “a identi-

dade sexual é a preferência no campo afetivo-sexual”. Podendo ser: “com pessoas de outro sexo (heterossexuais), com pessoas do mesmo sexo (homossexual) ou com ambos os sexos (bissexual)”. Na sequência do artigo, Jane Felipe discorre que há ainda identidades que estão assentadas não no corpo em primeiro lugar, mas em um sentir-se. “Refiro-me a transexuais, que nascem com um sexo biológico, mas se sentem emocionalmente pertencentes a outro sexo (pessoas que nasceram homens, mas se sentem mulheres ou vice-versa). Nesse caso, as transformações corporais que passam a empreender em si mesmos são uma mera consequência desse sentir-se”, destaca. A autora completa:“Em alguns casos, os sujeitos transexuais optam pela cirurgia de redesignação sexual, isto é, fazem a cirurgia para mudar de sexo. Ou podem ainda ‘permanecer na fronteira’, sem fazer a cirurgia”. No e-book Orientações sobre Identidade de Gênero: Conceitos e Termos – Guia técnico sobre pessoas transexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião, da pesquisadora Jaqueline Gomes de Jesus, da Universidade de Brasília (UNB), a autora inclui transexuais e travestis como parte de um grupo que alguns denominam de “transgênero”, mais popularmente conhecidos como trans. De acordo com Jaqueline, para compreendermos o termo transgênero, é preciso explicar o termo “cisgênero”, ou apenas cis, que são as pessoas que se identificam com o gênero no qual nasceram. As pessoas não


A pós-doutora Constantina Xavier Filha, em suas práticas de pesquisa em sala de aula, trabalha com bonecos genitalizados, o objetivo é dessacralizar a sexualidade de forma que seja encarada naturalmente, como algo que faz parte do ser humano

cisgênero são as que não se identificam com o gênero determinado pela biologia, são os transgêneros. Jaqueline Gomes explica que no Brasil não há um consenso sobre o termo. Há quem se considere transgênero, como uma categoria à parte das pessoas travestis e transexuais. “Existem ainda as pessoas que não

se identificam com nenhum gênero, não há consenso quanto a como denominá-las”, explica. Constantina Xavier destaca que a identidade sexual está relacionada ao desejo e só vai ser vivenciada como tal na adolescência. “Crianças não têm desejos sexuais, elas têm expressões de sexualidade e, por isso, não se pode afirmar que uma criança

de cinco anos tem uma orientação homossexual.” “No caso do intersexual, com genitalidade ambígua, no passado, essas pessoas sofriam uma intervenção cirúrgica ainda na infância. Nos dias atuais, isso não acontece mais. Não se pode determinar o desejo de alguém que ainda está em formação/ construção”, completa.

PAPÉIS DIFERENTES Historicamente, homens e mulheres desempenham papéis diferentes na sociedade. É importante destacar que os papéis desempenhados pelos gêneros não são apenas diferentes, mas também são desiguais. A mulher sempre esteve em desvantagem em relação ao homem, isso significa que elas passaram séculos subjugadas ao patriarcado, sem direito a ter direitos. Atualmente, ocupam o ranking mundial entre as vítimas de violência, ganham em média 30% menos em relação aos homens e têm menos oportunidades e poder de autorrealização.

Há pouco mais de 60 anos, a mulher era vista apenas como meio de procriação humana e não tinha autonomia sobre o próprio corpo. O advento da pílula anticoncepcional em 1951 marcou o direito feminino sobre a escolha de ter filhos ou não. A escola foi idealizada para reproduzir as matrizes e os moldes dessa determinação sociocultural entre o masculino e o feminino e, consequentemente, vem segregando meninos e meninas. Por exemplo, meninos usam azul e meninas usam rosa, meninas brincam de boneca e meninos jogam

bola, meninos são mais levados e meninas precisam ser comportadas, etc. Constantina Xavier defende que a escola pode ser um espaço mais democrático, “onde todos possam brincar juntos, sem diferenças e separações, conhecendo seus corpos, aprendendo a pensar seus direitos e deveres como seres humanos, independentemente do gênero. É possível uma proposta pedagógica muito mais libertadora, mas para isso é extremamente importante que a gestão escolar tenha essa compreensão”. Revista ATUAÇÃO | Março 2016 |

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DESCOBRINDO PAMELLA Pamella Yule é o nome social da transexual que é professora de Artes Visuais e leciona na rede pública e na rede privada de ensino. É formada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e divide as horas do seu dia entre as salas de aulas e as lentes da máquina fotográfica, um hobby que decidiu transformar em uma segunda profissão. A história de Pamella ilustra bem alguns conceitos que foram apresentados ao longo dessa reportagem e o despreparo da escola e da sociedade em relação ao tema sexualidade e gênero. Pamella recebeu uma educação que julga ser comum, longe da marginalização social ou discriminação da

família. “Digo comum porque considero que fui educada em uma família com estrutura, minha mãe me pegava na escola, fazia festas de aniversário, eu brincava com meus irmãos e primos. Uma vida normal, de uma família de classe média. Não me lembro de ser discriminada por ninguém lá de casa. Meus pais não sabiam ou talvez nunca quiseram perceber que o ‘filho’ não era como imaginavam.” Os primeiros questionamentos sobre sua sexualidade aconteceram quando assistia a um programa de TV com seu pai, no qual se contava a história da Roberta Close. “Eu queria entender tudo aquilo e perguntei ao meu pai o que tinha acontecido com ela. Ele me respondeu que ela havia nascido menino, mas ao longo da vida tornou-se menina. Eu pensei: Nossa, isso é possível? Acho que quando eu crescer vou ser assim também. Aquilo me chamou a atenção, mas logo esqueci porque era muito criança.” Já no Ensino Fundamental, com aproximadamente 12 anos, Pamella começou a perceber algumas diferenças de tratamento entre os colegas de sala. “Acho que começou a cair minha fi-

“A primeira vez que me olhei no espelho com uma peruca, me enxerguei mulher. Estava feliz, meu sorriso estava radiante. Aquela imagem ficou na minha cabeça. Comecei a entender que eu era mulher, pensava como mulher, mas tinha nascido em um corpo masculino. Nunca me senti um homem” Pamella Yule, professora de Artes Visuais e trans 40 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

cha”, conta. Certo dia, em uma brincadeira entre a gurizada, um colega a rejeitou e não quis mais brincar. “A brincadeira era de um sentar no colo do outro. Quando chegou a minha vez, ele disse: ‘sai fora, sai fora’. Eu não entendi aquela atitude. Não tínhamos malícia nenhuma. Estávamos apenas brincando. Mas, a partir da reação do meu colega, comecei a entender aos poucos que eu era diferente. Fui entendendo que eu era um menino, mas não me atraía por meninas e sim por outros meninos. Comecei a encarar de uma forma muito natural, não tive problemas comigo mesma. Também fui uma adolescente muito tardia, demorei para me relacionar com alguém.” Não fugindo à regra, no Ensino Médio, teve que encarar as piadinhas que vinham dos colegas, mas nada que considerava grave ou que tenha lhe causado algum trauma. Procurava se superar sendo boa aluna. “Com o tempo, os alunos que faziam chacota acabavam me procurando para fazer os trabalhos comigo. Sempre fui muito participativa, comunicativa, estudiosa e estava em todos os


projetos. Fiquei amiga de várias professoras com as quais tinha mais liberdade para conversar”, lembra. Quando entrou na faculdade, Pamella, que se julgava homossexual, descobriu-se transexual. “A primeira vez que me olhei no espelho com uma peruca, me enxerguei mulher. Estava feliz, meu sorriso estava radiante. Aquela imagem ficou na minha cabeça. Comecei a entender que eu era mulher, pensava como mulher, mas tinha nascido em um corpo masculino. Nunca me senti um homem.” Embora seja transexual, Pamella não sente necessidade de fazer a cirurgia de redesignação

de gênero, não tem rejeição pelo órgão sexual. “Eu acho que é um procedimento agressivo, mas eu entendo as trans que querem fazer a cirurgia. É muito pessoal, algumas têm necessidade da mudança. Eu me sinto bem no meu corpo. ‘Tô de boa’.” No período em que estudou o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, a transexual não se lembra de nenhuma aula específica que abordasse sexualidade, orientação sexual, identidade de gênero ou sexo. “Se teve alguma aula desse tipo, eu faltei no dia”, ironiza. De aluna para professora, Pamella diz que a escola não mudou em nada e continua fazendo

HOMOFOBIA NO BRASIL

50%

DADOS Assassinatos decorrentes de homofobia

dos assassinatos de pessoas trans no mundo acontecem no Brasil

59% GAYS

TRAVESTIS

326 312 338 2014

2012

2011

4%

2013

2012

VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS – DISQUE 100

VÍTIMAS

35%

vista grossa para temáticas que dizem respeito aos temas. Ela conta que os PCNs orientam escolas e professores para desenvolvimento de atividades em sala de aula, “mas quando há alguma proposta pedagógica sobre sexualidade, temos que pedir permissão aos pais”. Para a professora de Artes Visuais, “a instituição escola está falida e precisa ser reinventada. Há uma inversão de valores, com influência fundamentalista, uma intolerância e muitas formas de discriminação dentro do ambiente escolar. A escola é laica, não podemos deixar fatores externos intervirem nos processos educacionais”.

9.982

violações de direitos humanos foram cometidas contra

4.851

6.809

violações de direitos humanos foram cometidas contra

VÍTIMAS LGBT

VÍTIMAS LGBT

1.713

LÉSBICAS

47,3%

dos casos, os denunciantes não conheciam as vítimas.

71%

das vítimas são do sexo masculino e mais de 61% têm de 15 a 29 anos.

Fonte: Grupo Gay da Bahia e Secretaria Nacional de Direitos Humanos

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HOMOFOBIA NA ESCOLA Mais de 1/3 dos 15 mil alunos entrevistados para uma pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) procuram não chegar perto de homossexuais.

Mais de 40% dos homens homossexuais brasileiros já foram agredidos fisicamente durante a vida escolar.

40%

26%

dos entrevistados dizem não aceitar a homossexualidade.

21%

dos entrevistados acham que estudantes homossexuais não são normais. Fonte: Unesco e Fipe

HOMOFOBIA NAS ESCOLAS BRASILEIRAS

!

x 27%

13%

87%

39%

35%

60%

Dos homossexuais e bissexuais declaram sofrer ou ter sofrido preconceito no ambiente escolar

Deles afirmam que a escola foi o primeiro lugar onde sofreram discriminação

Da comunidade escolar (alunos professores e pais) têm algum grau de homofobia

Dos estudantes do sexo masculino não gostariam de ter um colega homossexual

Dos pais não gostariam que o filho estudasse com um homossexual

Dos professores admitem não ter base para lidar com a diversidade sexual

Fonte: FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO/FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E CONTABILIDADE DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (FEA-USP)UNESCO

O PRECONCEITO QUE OFUSCA O MEC Alvo de retaliações, críticas e enganos, o Ministério da Educação (MEC) passou a incluir nas pautas das suas deliberações a veiculação de notas justificando informações equivocadas ou a suspensão de conteúdos paradidáticos que supostamente agridem a família ‘doriana’ brasileira. Família feliz, com pai, mãe e filhos de olhos claros e cabelos louros, só existe nas propagandas de margarinas e na imaginação da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal, que, como já foi dito, aprovou o projeto de lei que propõe o novo Estatuto da Família, o qual considera família apenas a união entre homens e mulheres. O projeto, de autoria do deputado Anderson Ferreira (PR-PE), foi aprovado em caráter conclusivo, 42 | Revista ATUAÇÃO | Março 2016

e seguiu para o Senado Federal onde aguarda votação. No mês de janeiro, o órgão máximo da Educação no país retirou do ar um vídeo sobre educação sexual. A aula sobre diversidade estava hospedada no Portal do Professor desde março de 2009 e voltou a ser compartilhada nas redes sociais após a publicação de uma gravação do deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ). O MEC também emitiu nota informando que não produziu e nem adquiriu ou distribuiu o livro Aparelho Sexual e Cia, também alvo das críticas de Bolsonaro. Segundo o deputado, o livro seria inadequado para crianças e jovens brasileiros. De acordo com o MEC, o livro é uma publicação da editora Cia

das Letras e já vendeu 1,5 milhão de exemplares em todo o mundo, sendo publicado em 10 idiomas. No Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) de 2015, a célebre frase da escritora e filósofa francesa Simone de Beauvoir “Não se nasce mulher, torna-se mulher”, citada em uma questão sobre as lutas feministas da metade do século XX, na prova de Ciências Humanas, estremeceu as bases da sociedade brasileira e cutucou os conservadores e fundamentalistas que compõem as cadeiras do parlamento brasileiro. Os deputados Jair Bolsonaro (PP-RJ) e Marcos Feliciano (PSC-SP) usaram as redes sociais para acusar o ENEM de doutrinação. O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, precisou rebater


as críticas dos deputados em coletiva à imprensa. Segundo o ministro, as publicações de Simone de Beauvoir contribuíram no que diz respeito à condição da mulher na sociedade. Ele lembrou que, no passado, as mulheres não podiam votar e eram consideradas incapazes, sem direitos. “Esse é o contexto do debate. Pessoas podem divergir. Na educação, tem de estar aberto a discutir, a aceitar”, declarou. Mercadante disse, ainda, que a prova é elaborada em sigilo e feita por pesquisadores, professores universitários de competências reconhecidas nas suas áreas. Em 2014, durante a tramitação no Congresso Nacional do Plano Nacional de Educação (PNE), que

dita as diretrizes e metas da educação para os próximos dez anos (até 2024), a questão de gênero foi retirada do texto. O texto vetado colocava como meta “a superação de desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual”. Na ocasião, as bancadas religiosas, com respaldo das igrejas evangélicas e católica, afirmaram que a meta valorizava uma “ideologia de gênero”, corrente que deturparia os conceitos de homem e mulher, destruindo o modelo tradicional de família. O Plano Nacional de Educação (PNE) foi sancionado pela Presidência da República com a ressalva de que estados e municípios

deveriam legislar sobre o tema, incluindo-o ou não em seus planos regionais. Desde então, as metas relacionadas ao combate à discriminação e à desigualdade de gênero têm provocado intenso debate público em todo o país. Alguns estados e municípios vetaram em seus projetos os textos que fazem referência à questão, outros aprovaram parcialmente e outros aprovaram sem vetos. É importante destacar que tanto a Constituição Federal quanto os tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário, fundamentam e possibilitam a presença da igualdade de gênero nas políticas educacionais e no cotidiano da escola.

ALGUNS TRATADOS INTERNACIONAIS • • • • •

Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

PROJETO EPT/AIDS - MUDANDO ATITUDE Se a abordagem da escola ainda é tímida no que diz respeito à sexualidade, entidades ligadas à educação, que estão fora dos limites escolares, conseguem promover ações que, aos poucos, mudam paradigmas. O projeto “Educação para Todos (EPT) e AIDS” foi criado pela Internacional da Educação (IEL) com a proposta de disseminar uma educação livre de preconceitos ou discriminação, em que a saúde e o sexo seguro são prioridades. O EPT/AIDS é desenvolvido desde 2006 em países da América Latina, África, Ásia e Caribe. A iniciativa tem hoje o apoio de mais de 50 nações que criaram juntas uma rede de multiplicadores capazes de despertar consciências e mudanças de atitudes de milhares de pessoas. No Brasil, o projeto foi colocado em prática em 2007 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). As ações do EPT/AIDS capacitam os profissionais em Educação para que se tornem propagadores de conceitos e valores relacionados à valorização e ao respeito ao corpo, desejos individuais, consciência da sexualidade, combate à banalização do sexo, combate à homofobia, prevenção com o uso da camisinha, exploração sexual do corpo da mulher e outros temas. O objetivo principal do EPT/AIDS é fortalecer a ideia de que às Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs) e a AIDS não escolhem sexo, cor, idade, classe social nem orientação sexual. Revista ATUAÇÃO | Março 2016 |

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ARTIGO

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uando me formei no curso de licenciatura em Artes Visuais, recebi a missão de meus professores e professoras da universidade de levar sensibilidade para a sala de aula. De fazer crianças, jovens e adultos estudantes a enxergar o mundo de outras formas, para se expressar, aprender a ler imagens, entender o nosso passado e como as sociedades guiavam sua linha de pensamento. Estava disposta a esse desafio e cheia de ideias para que esses objetivos se cumprissem. Demorei um pouco para adentrar as salas de aula, pois fui me aventurar em outra cidade por um tempo. Cerca de pouco mais de um ano depois de formada, peguei minhas primeiras aulas em uma escola pequena aqui de Campo Grande, apenas cobrindo licenças médicas de professores que estavam afastados por atestados médicos. Por aí foram quatro ou cinco escolas, de perfis e desafios distintos, mas em todas sempre uma problemática-base: a presença de uma pessoa educadora aparentemente sem gênero. Eu sou uma pessoa transgê-

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nero, ou seja, de alguma forma eu caminho entre o meu sexo biológico (masculino) para a minha identidade de gênero (feminino). Eu costumo falar que sou transexual, mas ainda não comecei nenhum acompanhamento psicológico e não tenho ainda nenhum laudo sobre isso, mas o que importa é que nunca me identifiquei com coisas, vestimentas, hobbies, desenhos animados ou gostos que os outros meninos costumavam gostar. Para mim, isso nunca foi um problema, pois sempre acreditei que isso era natural, afinal, dentro de mim é natural, o problema é que não soa natural para alguns grupos de pessoas que compõem a nossa sociedade e, por isso, precisamos lidar com o preconceito, a discriminação. Com o passar do tempo, fui entendendo que, para conseguir ser na sociedade o que eu sentia dentro de mim, teria que fazer algumas escolhas e uma delas seria esperar o momento certo – diga-se, estabilidade financeira – para fazer essa transição de vez. No momento, ainda não gozo facilidade, mas ao

mesmo tempo, como todo ser humano, tenho minha válvula de escape. Meus amigos próximos sabem da minha condição, além de alguns poucos familiares. Além disso, tenho um trabalho consolidado com o meu nome social, mas a minha profissão, pelo menos aqui em Campo Grande, ainda está longe de abraçar a minha causa, comprar a minha briga e a de outras pessoas que passam pela mesma situação. Não vou inventar histórias de que fui discriminada por ser trans na Rede Municipal de Educação de Campo Grande, mas é inegável que um preconceito velado acontece o tempo todo, mesmo sem que pais e colegas se deem conta disso. Em apenas uma escola tive oportunidade de conversar sobre o assunto com uma das minhas coordenadoras. Ela leu uma matéria que fiz para uma revista que circula entre escolas, na qual eu falava de inclusão de travestis e transexuais nesse meio. Lá tinha uma foto minha, e a coordenadora resolveu me puxar para conversar. Expliquei. Ela mesma se disse curiosa


com o assunto, pois não entendia o que era, não sabia como chamar, como funcionava ou como trabalhar isso na escola. E pasmem, ou não, essa coordenadora em questão tem mais de vinte anos de experiência na educação. Não é culpa dela, ela foi um amor comigo tentando entender tudo. A culpa é que insistimos em não encarar os nossos problemas. Insistimos em uma sociedade linda, branca, de olhos azuis, em que todos os alunos vão ser futuros médicos, engenheiros e bailarinas. Sim, alguns pais acreditam que bailarinas ganham dinheiro na nossa cidade! Essa coordenadora, que também é professora, é mais uma vítima da grande problemática que nós, professores e professoras, estamos enfrentando todos os dias, que é o “emburrecimento”. Emburrecimento dos pais dos nossos alunos, emburrecimento dos nossos alunos, emburrecimento dos nossos governantes, estamos vivendo uma fase crítica de emburrecimento coletivo, o imediatismo. Não estamos acostumados a ver pessoas trans em escolas, nem como alunos e alunas, nem como professores e professoras. Muito menos como diretores ou diretoras. Para muitos, o lugar delas é na rua, prostituindo-se, marginalizadas e alguns ousam dizer que estão nessa vida porque querem. Ninguém se pergunta quem são os pais daquela pessoa, se ao menos tem família e, além disso, quais foram as condições que a levaram a estar nessa situação. Por que não a instigaram aos estudos e a conseguir dessa forma um trabalho formal, “normal”, aceito pela sociedade? Onde estão as travestis? Para o nosso mercado elas não servem nem para embalar a nossa compra de supermercado, pois podem incomodar e

espantar os clientes. Emburrecimento e imediatismo. Apontar, julgar, jogar na cara das pessoas os dogmas de moral e religião e nunca, jamais estender a mão para essas pessoas. Essas são atitudes comuns dispensadas às trans, mas não só a elas. Essa mesma sociedade costuma tratar da mesma forma gays, idosos, deficientes, negros, mulheres e uma infinidade de pessoas que sofrem algum tipo de discriminação e falta de oportunidade. No caso das trans, torna-se mais grave quando vemos nosso ex-prefeito e vereadores votando contra e/ou vetando nossos direitos, como o de ser chamada pelo nome social em ambientes de atendimento público, o uso do banheiro adequado, a criação de um ambulatório específico para atender essas pessoas que precisam de acompanhamento psicológico e hormonal, entre outras questões que poderiam garantir o mínimo de dignidade para os que há anos estão abandonadas pelo poder público e, porque não dizer, pela sociedade. Alguns lugares até respeitam essa problemática, mas é tudo na base do bom senso. E o discurso deles é que a “família” venceu. Qual família venceu? A que nunca precisou de um atendimento específico? A que sempre se enquadrou nos estereótipos e se nega a pensar na possibilidade de existirem problemas? A família da travesti que está na rua não ganhou. A travesti não ganhou! Como educadora, revisito os meus objetivos de transformar a sociedade e, mais do que nunca, sei que essa missão ainda não está morta, mas desgastada por ver que pessoas como eu parecem invisíveis e sem voz. Ainda é complicado discutir sobre esse e outros assuntos em sala de aula, pois sofremos resistência da direção que é

pressionada pelos pais. Imaginem vocês que uma professora de Ciências pede autorização dos pais dos alunos de oitavo e nono anos de certa escola para falar sobre educação sexual. Recentemente teve um caso de um pai que permitiu falar em educação sexual, mas não poderia falar sobre homossexualidade. O aluno em questão não conseguia falar em voz alta a palavra pênis! Enfim, este é apenas um dos casos que conheço e, por isso, procuro ensinar junto à Arte a importância de respeitar não apenas o espaço, mas o outro em si. Se alguém faz algo diferente do comum, devemos entender que aquela pessoa é livre, assim como você. Não a magoe dizendo que ela está errada só porque para você é errado ou talvez não entenda. Deixe-a escrever a história dela. Para os mais jovens, essa lição é ainda mais fácil de absorver, mas a educação não fica só sob a responsabilidade da escola. A criança ouve ideias transgressoras, mas chega em casa, ouve piadas que o pai ou a mãe faz do professor efeminado que tem cabelo comprido e tingido. Enquanto isso, quando meus alunos menores perguntam se sou menino ou menina, fico lisonjeada, pois eles conseguem enxergar a mulher que existe em mim. E para resolver esse problema, com um sorriso no rosto e esperança no coração, respondo: podem me chamar pelo meu nome! Pamella Yule é transexual, professora de Artes Visuais formada pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

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ESPECIAL MULHER

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Escritora permanece atual como nunca e continua despertando a fúria com suas reflexões sobre ‘o tornar-se mulher’

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uem foi a mulher que causou um “deus nos acuda” na edição de 2015 do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM)? Simone de Beauvoir é a causadora da confusão que ganhou as redes sociais e provocou a fúria machista e sexista que impera no século XXI e habita terras brasileiras. Por outro lado, a iniciativa do Ministério da Educação (MEC) de citar uma das frases da escritora e filósofa francesa em uma prova de âmbito nacional foi aclamada pelo movimento feminista, por entidades, grupos e pessoas que lutam pela igualdade de gênero e pelo fim da violência contra a mulher. Simone de Beauvoir vem polemizando há gerações. Podemos dizer que o auge da sua “provocação” foi no ano de 1949, quando lançou a obra O Segundo Sexo, que passou a ser considerada a bíblia do feminismo. E foi

desse livro que a questão da prova de Ciências Humanas do ENEM foi retirada. “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino.” Se uma frase causou bafafá em 2016, imaginem o que provocou o conteúdo inteiro do livro há 67 anos. A sociedade francesa ficou escandalizada com o conjunto de ideias de Beauvoir que expressam a luta contra a discriminação da mulher e questionam a formação da identidade feminina. A filósofa tirou a mulher das amarras da invisibilidade e a colocou no centro do debate. Para ela, o ‘tornar-se mulher’ está relacionado e é influenciado, desde o nascimento de uma meni-

na, por parâmetros históricos, sociais e culturais que determinam a postura da mulher na sociedade e criam uma expectativa em relação ao seu comportamento. Em O Segundo Sexo, a escritora analisa o contexto feminino desde as antigas civilizações até a época contemporânea. Ao longo dos textos, ela faz comparações com suas experiências pessoais. Mas o que diria Beauvoir ao ver a chuva de comentários que surgiram nas primeiras horas após a prova do ENEM? O que diria a célebre escritora sobre as estatísticas da violência doméstica no Brasil e em outros países? Certamente lamentaria e diria que sua obra continua atual, pois a sociedade ainda não conseguiu superar as diferenças entre os sexos.


História Simone de Beauvoir nasceu em Paris, em 9 de janeiro de 1908. Ao contrário das meninas de sua época, que seguiam as regras de uma educação conservadora, cujo objetivo era prepará-las para um bom casamento e para ter filhos, Beauvoir queria sua emancipação, sua liberdade e o direito de compartilhar com os homens o mesmo lugar em sociedade. Aos 21 anos foi estudar Filosofia na Universidade de Sorbonne, em Paris. No final da sua graduação, no ano de 1929, conheceu o fi-

lósofo Jean-Paul Sartre e começaram uma relação amorosa bastante peculiar, que até hoje é estudada e discutida. O casal vivia além de seu tempo, sem casamento e avesso à monogamia. Como os dois eram filósofos, amigos e amantes, também havia uma troca intelectual grandiosa. Pode-se dizer que Beauvoir influenciou o trabalho de Sartre e vice-versa.

Durante toda a vida, Simone de Beauvoir lutou pelo direito à independência feminina. Negou-se a casar, ser dona de casa e a ter filhos. No livro Memórias de uma Moça Bem Comportada, publicado em 1958, a escritora descreve bem sua negação às imposições sociais a que são submetidas as que nascem mulheres.

Compreender Simone de Beauvoir é enfrentar a violência contra a mulher Compreender as reflexões filosóficas de Simone de Beauvoir é entender que todos nós somos responsáveis pelo enfrentamento da violência feminina, é lutar por uma sociedade de igualdade, sem discriminação, com respeito aos direitos humanos, com políticas públicas capazes de promover à autonomia da mulher, é mudar paradigmas e construir uma sociedade onde homens e mulheres convivam em prefeita harmonia, vencendo definitivamente o machismo. Não só Beauvoir, mas outros tantos pensadores posicionaram-se a favor da igualdade de gênero. O francês Charles Fourier disse a impactante frase: “O

grau de civilização de uma sociedade se mede pelo grau de liberdade da mulher.” Ou seja, quanto mais direitos, respeito e dignidade as mulheres tiverem na sociedade, mais desenvolvida e democrática a sociedade será. Outra intelectual que antecedeu Beauvoir e confrontou a sociedade quebrando “regras morais” foi Lou Andreas-Salomé, alemã que nasceu em Louise Von Salomé, na Rússia. Conviveu com Sigmund Freud, Friedrich Nietzsche, Rainer Maria Rilke, Paul Rée, e outros grandes ho-

mens. Entre suas obras, destacam-se os livros A Humanidade da Mulher e Reflexões sobre o Problema do Amor.


Violência contra a mulher no Brasil

No Brasil, infelizmente, estamos longe de gozar da plena democracia ou de igualdade entre os gêneros. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada ano, mais de um milhão de mulheres são vítimas de violência doméstica no país. Um balanço da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), demonstrou que de janeiro a outubro de 2015, a central recebeu

63.090 denúncias de violência contra a mulher. Desse total, 31.432 corresponderam a denúncias de violência física (49,82%), 19.182 de violência psicológica (30,40%), 4.627 de violência moral (7,33%), 1.382 de violência patrimonial (2,19%), 3.064 de violência sexual (4,86%), 3.071 de cárcere privado (1,76%) e 332 envolvendo tráfico (0,53%). Em 67,36% dos relatos, as violências foram cometidas por homens com quem as vítimas tinham ou já tiveram algum vínculo afetivo: companheiros,

cônjuges, namorados ou amantes, ex-companheiros, ex-cônjuges, ex-namorados ou ex-amantes das vítimas. Já em cerca de 27% dos casos, o agressor era um familiar, amigo, vizinho ou conhecido. Os atendimentos registrados pelo Ligue 180 revelaram que 77,83% das vítimas possuem filhos e que 80,42% desses filhos presenciaram ou sofreram a violência.

Fonte: www.compromissoeatitude.org.br.

Feminicídio Dos 4.762 homicídios de mulheres registrados em 2013, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo a maioria desses crimes, ou seja, 33,2% cometidos por parceiros ou ex-parceiros. Isso significa que a cada sete feminicídios, quatro foram praticados por pessoas que tiveram ou tinham relações íntimas de afeto com a mulher. A estimativa feita pelo Mapa da Violência 2015: homicídio de mulheres no Brasil, com base em dados de 2013 do Ministério da Saúde, alerta para o fato de ser a violência doméstica e familiar a principal forma de violência letal praticada contra as mulheres no Brasil.

Mulheres negras morrem mais O Mapa da Violência 2015 também mostra que o número de mortes violentas de mulheres negras aumentou 54% em dez anos, passando de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. No mesmo período, a quantidade anual de homicídios de mulheres brancas diminuiu 9,8%, caindo de 1.747, em 2003, para 1.576, em 2013. Já a pesquisa Avaliando a Efetividade da Lei Maria da Penha (Ipea, março/2015) apontou que a Lei nº 11.340/2006 fez diminuir em cerca de 10% a taxa de homicídios contra mulheres praticados dentro da residência das vítimas, o que “implica dizer que a LMP foi responsável por evitar milhares de casos de violência doméstica no país”. Fonte: www.compromissoeatitude.org.br.


Mulheres Indígenas também são vítimas de violência Em 2012, no município de Iguatemi, em uma área de retomada, uma indígena sofreu estupro coletivo cometido por jagunços. Um ato de violência caracterizado pela represália às retomadas dos territórios tradicionais. Como essas populações vivem afastadas das áreas urbanas, geralmente a denúncia

não chega até os órgãos competentes. Por isso, pela falta de denúncias, é impossível fazer um levantamento do número de mulheres indígenas agredidas e assassinadas anualmente em Mato Grosso do Sul e em outros estados brasileiros. São vítimas que morrem em silêncio, ignoradas pelo poder público, sem justiça, sem cidadania e sem respeito.

Fonte: Secretaria da Mulher Trabalhadora CUT/MS

Estatísticas Brasil é 7º país com maior número de assassinatos de mulheres Mais de 1 milhão de mulheres são vítimas de violência todos os anos no Brasil Denúncias do Ligue 180 de janeiro a outubro de 2015 0,53% - Violência envolvendo tráfico

63.090

1,76% - Cárcere privado 2,19% - Violência patrimonial

Número de denúncias de violência contra a mulher

4,86% - Violência sexual 7,33% - Violência moral 30,40% - Violência psicológica 49,82% - Violência física Fontes: IBGE, SPM-PR e ONU


10 anos com Maria da Penha A mulher que fez da sua história uma lei

Casa da Mulher Brasileira completa um ano em MS

Maria da Penha Maia Fernandes é brasileira, cearense, farmacêutica bioquímica e foi vítima de violência doméstica durante 23 anos. Em 1983, dentro da própria casa, enquanto dormia, Maria da Penha recebeu um tiro disparado pelo marido, o professor universitário Marco Antônio Heredia. Com sequelas, ficou paraplégica e passou a viver com a ajuda de uma cadeira de rodas. O marido, não satisfeito, voltou a agredi-la. Diante das circunstâncias, Maria da Penha pediu ajuda aos familiares e conseguiu sair de casa. Logo depois, começou sua jornada em busca de justiça e segurança. O autor das agressões passou por dois julgamentos, um deles foi anulado. Maria da Penha só conseguiu fazer justiça em 1996, quando o ex-marido foi condenado a 10 anos de prisão, dos quais apenas dois foram cumpri-

dos em regime fechado. A vontade de fazer justiça não se resumia à prisão do ex-marido. Significava ampliar o direito de proteção a todas as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Direito que foi assegurado com a promulgação da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), que protege e garante direitos a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Em 2016, a Lei Maria da Penha completa 10 anos, sendo reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (ONU) como uma das três melhores legislações do mundo no enfrentamento da violência contra as mulheres. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, 2015), a lei contribuiu para diminuição de cerca de 10% na taxa de homicídios contra mulheres praticados dentro da residência das vítimas.

A Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande/ MS comemorou um ano no dia 3 de fevereiro. Trata-se de um espaço que agrega um conjunto articulado de ações voltadas para atendimento de mulheres vítimas de violência. O projeto da Casa da Mulher Brasileira faz parte do programa revolucionário “Mulher: Viver sem Violência”, da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, e representa a concretização de uma política de tolerância zero contra quaisquer formas de violência. Em um ano de funcionamento, a Casa atendeu 11.070 mulheres e realizou 63.836 procedimentos entre acolhimento, triagem com psicólogas e assistentes sociais, boletins de ocorrência, prisões, medidas protetivas, orientações jurídicas, encaminhamentos ao mercado de trabalho e outros.


Coisas que você precisa saber sobre a Lei Maria da Penha •

Segundo a pesquisa Violência e Assassinatos de Mulheres (Data Popular/Instituto Patrícia Galvão, 2013), apenas 2% dos brasileiros nunca ouviram falar da Lei Maria da Penha, ou seja, 98% da população conhece a legislação. Para 86% dos entrevistados, as mulheres passaram a denunciar mais os casos de violência.

A lei garante o mesmo atendimento para mulheres que estejam em relacionamento com outras mulheres. Além disso, recentemente, o Tribunal de Justiça de São Paulo garantiu a aplicação da lei para transexuais que se identificam como mulheres em sua identidade de gênero.

Depois que a mulher apresenta queixa à delegacia de polícia ou à Justiça, o magistrado tem o prazo de até 48 horas para analisar a concessão de proteção. A urgência da lei corresponde à urgência dos problemas de violência contra a mulher.

Poucas pessoas sabem, mas a Lei Maria da Penha também existe para casos que independem do parentesco. O agressor pode ser o padrasto/madrasta, sogro/sogra, cunhado/ cunhada ou agregados, desde que a vítima seja mulher.

Mulheres do campo também terão proteção A Secretaria de Políticas para as Mulheres criou em 2015, por meio de portaria, a Patrulha Maria da Penha Rural, atendendo as reivindicações da Marcha das Margaridas por mais segurança para as mulheres que vivem no campo, na floresta e nas águas. A Patrulha Maria da Penha Rural será composta por policiais mulheres, especializadas no atendimento a vítimas de violência doméstica e sexual. Além da Secretaria de Política para as Mulheres, o grupo será composto por representantes da Marcha das Margaridas, do Ministério da Justiça e do Ministério da Saúde. As patrulhas prestarão atendimentos diários e passarão nos lugares onde há indício de violência. Também servem para verificar se a medida protetiva determinada por um juiz está sendo eficiente.

Foto: Isabela Lyrio - Marcha das Margaridas Ago/2011

Marcha das Margaridas A Marcha das Margaridas é uma ação estratégica das mulheres do campo e da floresta para conquistar visibilidade, reconhecimento social, político e cidadania. É coordenada pela Confederação Nacional de Trabalhadores na Agricultura (Contag), suas 27 federações e mais 4 mil sindicatos filiados. Também conta com ampla rede de parcerias. Mulheres trabalhadoras rurais, extrativistas, indígenas e quilombolas saem às ruas para reivindicar o acesso a terra, a valorização da agroecologia, o acesso à educação, o fim da violência, o acesso à saúde e a autonomia econômica. Fonte: Portal Brasil


Escola Estadual Hércules Maymone coloca violência contra a mulher no centro do debate escolar Os alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Hércules Maymone, em Campo Grande/MS, não se espantaram com a frase da escritora francesa Simone de Beauvoir, que compôs a questão da prova de Ciências Humanas do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), e na sequência o tema da redação: “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”. Isso porque, durante o segundo semestre de 2015, a violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (13.104/2015) foram temas das aulas da professora e mestre em Linguística Maria de Lourdes Bodnar, que leciona a disciplina Produções Interativas. Segundo Maria de Lourdes, além da violência contra a mulher, os temas escassez de água em São Paulo e maioridade penal também eram assuntos relevantes e possíveis de

serem abordados na redação do ENEM. “Eu comecei a estudar esses três temas e percebi que eram potenciais. Entretanto, os índices de violência contra a mulher me chamaram a atenção, tanto em âmbito regional, como nacional e internacional. Aliada às minhas pesquisas, a escola fez uma parceria e durante uma semana tivemos palestras sobre o tema. Recebemos a visita da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM). Também tinha o fato de a primeira Casa da Mulher Brasileira ter sido inaugurada aqui em Mato Grosso do Sul. Depois de vários levantamentos, comecei a elaborar textos para trabalhar em sala de aula. Surgiram diversos depoimentos dos próprios alunos, casos de violência dentro de suas casas ou próximos deles. Os alunos foram bem participativos. Comecei a perceber

que esse era um bom tema para a redação”, conta a professora. De acordo com o diretor e mestre em Educação Edilmar Galeano Marques, faz parte da política educacional da Escola Hércules Maymone a realização de parcerias para o desenvolvimento de projetos que têm como objetivo o benefício da comunidade escolar, bem como a promoção do conhecimento. As parcerias são feitas com universidades públicas, privadas e órgãos públicos. No segundo semestre de 2015, a escola fez uma parceria com a Subsecretaria de Políticas Públicas para as Mulheres, vinculada à Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Assistência Social e Trabalho, que possibilitou a realização


“No que diz respeito a problemas familiares, e isso inclui a violência, uma característica bem comum é o bom aluno sumir das aulas ou ter faltas frequentes” Edilmar Galeano Marques, diretor e mestre em Educação da Escola Estadual Hércules Maymone

de palestras durante uma semana do mês de agosto, tendo como tema principal a violência contra a mulher. A coordenação pedagógica deixou que a professora Maria de Lourdes trabalhasse dentro da sua disciplina com os temas que julgasse mais pertinentes. “Nós fomos muito felizes com tudo isto, com a parceria com a subsecretaria, com a visita da DEAM e com a experiência e dedicação da professora”, destaca o diretor. Para a professora Maria de Lourdes, que ouviu vários depoimentos dos alunos ao longo das aulas, a violência contra a mulher ou a violência familiar decorre de fatores como o desemprego, o uso de drogas e/ou bebidas e a separação dos pais. “Nossa preocupação como educadores era mostrar aos alunos que a

“Nossa preocupação como educadores era mostrar aos alunos que a violência, qualquer que seja sua origem, pode ser combatida por meio da informação e da consciência” Maria de Lourdes Bodnar, professora e mestre em Linguística da Escola Estadual Hércules Maymone

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violência, qualquer que seja sua origem, pode ser combatida por meio da informação e da consciência.” O diretor Edilmar diz que existe um número significativo de alunos, especialmente do sexo feminino, que procura a coordenação pedagógica para fazer denúncias de violência. Para atender a demanda, a escola conseguiu, por meio das parcerias de que dispõe, um profissional da assistência social para orientar alunos vítimas de violência doméstica, que é um dos fatores que contribui para a evasão escolar. “No que diz respeito a problemas familiares, e isso inclui a violência, uma característica bem comum é o bom aluno sumir das aulas ou ter faltas frequentes”, conta Edilmar.


CAPACITAÇÃO

Cursos técnicos promovem a autonomia de jovens profissionais e mudam realidades de quem já está no mercado de trabalho

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ngressar no mercado de trabalho, reciclar os conhecimentos e até mesmo mudar de área é um desafio que pode ser superado com o diploma de um curso técnico. A Escola Estadual Hércules Maymone, em Campo Grande/MS, oferece várias opções de cursos técnicos para quem está buscando uma oportunidade de emprego ou para quem já está no mercado e precisa dar um upgrade no currículo. O jovem Mauro Alexandre da Conceição veio do município de Bodoquena, no interior do esta-

do, para especializar-se na área de Meio Ambiente. Mauro, que já trabalhou no Parque Nacional da Serra da Bodoquena, está fazendo o curso Técnico em Meio Ambiente, uma das capacitações oferecidas pela escola Hércules Maymone. Depois de concluir o curso, ele quer continuar estudando. “Eu fui criado em fazenda e resolvi vir estudar porque lá a cultura é diferente. As pessoas acabam praticando atividades inadequadas com o meio ambiente por falta de conhecimento. Quero terminar este curso

aqui e depois fazer uma faculdade de Tecnologia em Gestão Ambiental. Na região onde moro tem poucas pessoas formadas na área de Meio Ambiente. Quero voltar para trabalhar”, diz. O curso Técnico em Meio Ambiente prepara o profissional para trabalhar em instituições públicas ou privadas e, ainda, no terceiro setor (ONGs, associações, cooperativas, etc.). Em 2015, cem alunos estavam matriculados nas modalidades oferecidas para quem já concluiu o Ensino Médio, para quem está


concluindo o Ensino Médio e também na opção integrada ao Ensino Médio. Nas duas primeiras modalidades, o curso tem duração de um ano e três meses e na última tem duração de três anos porque o aluno faz as disciplinas ao longo do Ensino Médio. A coordenadora técnica e engenheira sanitarista ambiental, Lívia Carvalho dos Santos, explica que a grade pedagógica inclui disciplinas como Técnicas de Laboratório, Química Ambiental, Ecologia, Poluição Ambiental, Legislação Ambiental e Sistemas de Água e Esgoto. “É um curso bem específico. Temos uma lista de espera de pessoas interessadas. Nós temos ainda um convênio com o Imasul [Instituto de

“Eu fui criado em fazenda e resolvi vir estudar porque lá a cultura é diferente. As pessoas acabam praticando atividades inadequadas com o meio ambiente por falta de conhecimento. Quero terminar este curso aqui e depois fazer uma faculdade de Tecnologia em Gestão Ambiental”

Mauro Alexandre da Conceição, aluno do curso Técnico em Meio Ambiente

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Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul], que permite que os nossos alunos façam estágios. Tudo dentro do que permite a legislação, uma vez que a maioria dos alunos ainda é menor de idade”. Ainda segundo a coordenadora Lívia, o mercado de trabalho absorve bem esses profissionais. “É um profissional que está em alta devido às exigências da legislação ambiental. A média salarial é de R$ 2.900,00. E esse profissional pode também ter um registro no CREA [Conselho Regional de Engenharia e Agronomia].” O estágio no Imasul tem carga horária de 100 horas e é supervisionado por profissionais que trabalham nos setores do órgão.

Projeto Vendas O Projeto Vendas foi criado em 2013 e funciona como um laboratório do curso Técnico em Meio Ambiente, em que o aluno coloca em prática o que aprende em sala de aula. O objeto de estudo é o Córrego Vendas, localizado nas proximidades da escola, um dos 33 córregos que passam por Campo Grande e pertencente à microbacia urbana do Córrego Prosa. Durante as aulas práticas, os estudantes fazem o monitoramento da qualidade da água do córrego seguindo os parâmetros do Índice de Qualidade de Água

Alunos do curso Técnico em Meio Ambiente da Escola Estadual Hércules Maymone produzem durante as aulas práticas móveis reciclados a partir de pneus descartados

(IQA) adaptado pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB), realizam estudos da fauna e da flora e diversas outras atividades práticas. As análises de água são realizadas no laboratório da escola e no laboratório cedido pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). O engenheiro químico Jonas de Sousa Correa, responsável pelo projeto, diz que o desempenho dos alunos melhorou com as práticas de campo. “Eles começaram a entender as disciplinas e estão desenvolvendo


o conceito de responsabilidade social. Eu sempre digo para meus alunos que não é só ter um emprego com horário e saída. Temos que fazer parte de um processo e ter compromisso com o meio ambiente. Os alunos do curso são multiplicadores de informações e formadores de opinião no meio onde vivem e na sociedade.” O Projeto Vendas foi inscrito no 28º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Am-

biental, que aconteceu em outubro de 2015, no Rio de Janeiro. O projeto foi aprovado para ser apresentado no evento, mas nem estudantes, nem professores puderam comparecer ao encontro por falta de patrocínio. “Nós perdemos a chance de mostrar nosso trabalho. Tudo que realizamos é com muita dificuldade. Precisamos e contamos com voluntários e parcerias para realizar as nossas ações e atividades”, conta Lívia Carvalho.

Transações Imobiliárias Outro curso bem procurado pelo público é o Técnico em Transações Imobiliárias que tem duração de 12 meses, com carga horária de 813 horas-aula. Mais de 75 alunos estavam matriculados nesta modalidade em 2015. “A maioria dos nossos alunos são pessoas com idade entre 35 e 60 anos. “Essa é uma profissão que não ocupa espaço. Você pode exercê-la em qualquer lugar do país e com qualquer idade. O diploma é reconhecido nacionalmente, e o aluno pode tirar o registro no CRECI [Conselho Regional de Corretores de Imóveis]”, explica a coordenadora do curso, Maria Abadia Torres Tinoco. Aos 53 anos, o vendedor Jeferson Cersosimo resolveu fazer o curso de Transações Imobiliárias para melhorar o currículo e ampliar as oportunidades. “As empresas valorizam as pessoas mais jovens. Com a idade, vamos ficando de lado. Não adianta lamentar. Temos que procurar alternativas para nos mantermos no mercado de trabalho. Por isso, resolvi fazer um curso técnico.”

Outros cursos A Escola Hércules Maymone oferece ainda os cursos de Técnico em Administração e Técnico em Informática. O material é apostilado, e a pré-matrícula pode ser feita pelo site www.eehm.com.br

“É um profissional que está em alta devido às exigências da legislação ambiental. A média salarial é de R$ 2.900,00. E esse profissional pode também ter um registro no CREA” Lívia Carvalho dos Santos, engenheira sanitarista ambiental e coordenadora do curso

“Eu sempre digo para meus alunos que não é só ter um emprego com horário e saída. Temos que fazer parte de um processo e ter compromisso com o meio ambiente. Os alunos do curso são multiplicadores de informações e formadores de opinião no meio onde vivem e na sociedade” Jonas de Sousa Correa, engenheiro químico e responsável pelo Projeto Vendas Revista ATUAÇÃO | Março 2016

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