Revista Giropop Edição 20

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EDITORIAL Como uma surpresa descobrimos o número de gaúchos na região das cidades de Itapoá e Guaratuba. O gosto por chimarrão, churrasco, bailes, cavalos e até rodeios nos mostrou como uma cultura pode ser tão forte, resistir a modas e ultrapassar as fronteiras de uma região. Diante disso, não seria justo deixa-la de fora, até pela importância que ganha neste período do ano. Em setembro os gaúchos brindam a integração de povos na Semana Farroupilha e, no dia 20, comemoram o seu dia com a força da tradição. Sim, tradição foi a palavra que moveu esta edição. Em eventos, lares e CTGs nós presenciamos o amor das pessoas a esta cultura, o gosto em preservá-la e o desejo em mantê-la viva nas próximas gerações. Assim, parabenizamos a todos os gaúchos da região que, com muita paixão e respeito, tornam esta cultura tão forte e rica em Itapoá e Guaratuba. Também aproveitamos para agradecer a todas as famílias que com muito entusiasmo nos receberam e compartilharam suas histórias de amor com essa cultura. Além dos gaúchos, conhecemos também o resgate da cultura ucraniana na cidade itapoaense e demos continuidade às séries de artesanato, música, viagem e turismo rural, que a cada edição nos surpreendem com novidades. Uma ótima leitura!

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AGRADECIMENTOS Foto de capa: Priscila Pohl As fotos foram feitas na chácara da família Smanioto, nosso agradecimento especial ao seo Inácio Braz Smanioto, ao casal Inácio Braz Smanioto Jr e Edinéia Nascimento Rosa Smanioto e suas filhas Graziela e Gabriela. Aos fotógrafos Priscila Pohl de Itapoá e AHM Foto e Filmagem de Guaratuba.


A saga de um povo “A maior leva imigratória da década muda à cara do país plantando soja no Nordeste, uvas no Centro-Oeste e arroz na Amazônia” (Veja, 1996).

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iz o senador Pedro Simon que no Rio Grande do Sul, ocorreu um fenômeno sem precedentes na história recente do País. Acontecimento que denominou “diáspora do povo gaúcho”, uma saga que perdura a mais de século. Movimento que espalhou o povo sul-rio-grandense por todo Brasil. Algo semelhante à dispersão do povo judaico, que ao longo dos séculos, mantiveram e preservaram seus costumes e cultura. Estima-se que mais de 1,2 milhões de gaúchos, - não considerando os seus descendentes - vivem fora do Rio Grande do Sul, ou seja, um em cada nove gaúchos vive fora do lugar em que nasceu. Diáspora, explica o senador, é o termo utilizado para caracterizar a dispersão de um povo em consequência de preconceitos, perseguições políticas, religiosas ou étnicas. No caso do Rio Grande do Sul, o motivo da migração foi de natureza econômica. Tem a ver com a questão agrária. Os migrantes, em sua maioria agricultores, foram em busca de terras mais em conta, em lugares onde pudessem ter propriedades maiores. Nas décadas de 1970 e 1980 era comum o pequeno produtor gaúcho vender seus poucos hectares e, com o resultado apurado, comprar grandes extensões no Centro e Nordeste do país. Para o senador, a esse aspecto relevante da economia brasileira não foi dada a devida importância, pois os grandes superávits da economia nas últimas décadas foram obtidos com a exportação dos produtos agrícolas, pecuários ou da agroindústria, gerados, principalmente, pelos agricultores gaúchos espalhados pelo Brasil. Os Estados exportadores, em um ou outro momento, receberam contingentes de gaúchos ou de seus descendentes, nascidos em outros Estados. Foram eles que colonizaram o Oeste de Santa Catarina e o Oeste do Paraná e, seus filhos, o Mato Grosso e Amazônia. No século XIX, o Rio Grande do Sul recebeu dois grandes fluxos imigratórios, oriundos da Europa. O Pampa gaúcho, região plana e

apropriada para a agricultura, estava ocupado desde o século XVIII, sobrando para os imigrantes europeus, alemães e italianos na grande maioria, as florestas e serras situadas ao norte do Estado. Os alemães chegaram a partir de 1824 e os italianos, meio século depois, em 1875. A característica comum entre as duas etnias era a pequena propriedade agrícola, onde produziam para consumo próprio e comercializavam apenas os eventuais excedentes. Os alemães ocuparam as terras às margens dos rios, o que explica a rápida ascensão econômica de muitos deles, especialmente os que passaram a vender a produção da colônia aos comerciantes de Porto Alegre. Aos italianos restaram as serras íngremes, tomadas por florestas. Foram obrigados a enfrentar uma natureza desconhecida, de matas cerradas, com clima diferente daquele a que estavam acostumados. Muitos tiveram de se proteger do assalto dos índios que reagiam ao avanço dos brancos. Sem o apoio prometido pelas autoridades e desconhecendo a língua local, os imigrantes desenvolveram um forte senso de vida comunitária. Em torno da igreja, luterana ou católica, alemães e italianos construíram escolas e hospitais. Unidos pela necessidade comum, criaram associações de mutuo socorro, santas casas, escolas e clubes. Dai a adesão dos gaúchos pelo cooperativismo, traço marcante das comunidades que constituíram pelo Brasil. No inicio do século XX, as terras do norte e nordeste do Rio Grande do Sul estavam ocupadas. Cerca de 12% da população do Estado era composta por estrangeiros. A primeira geração, nascida na nova terra, começava a ficar adulta. Os imigrantes envelheciam e com a morte dos idosos, foi preciso dividir a propriedade. As famílias eram numerosas, pois os pais precisavam de braços para ajudá-los na lida do campo. As doenças dizimavam um grande número de recém-nascidos e crianças. Era comum que, de uma dezena de filhos, apenas metade ou menos chegasse à idade adulta. Em média, a propriedade tinha 25 hectares e a sua divisão entre vários filhos inviabilizava a sustentação econômica de qualquer um deles. Tradicionalmente, entre os europeus, a propriedade era herdada pelo primogênito. Os demais filhos tinham que buscar novos hori-

zontes. Isso desencadeou a migração dos agricultores gaúchos para os então disponíveis e ainda por explorar campos do Oeste de Santa Catarina. Na virada do século, a economia daquela região catarinense, estava estruturada na extração da erva-mate e da madeira. Entre 1912 e 1916, na região limítrofe entre o Paraná e Santa Catarina surgiu um conflito de grandes proporções, conhecido como a Guerra do Contestado, com aspectos similares a Guerra de Canudos, mas que, - poucos sabem - fez um número maior de vitimas: cerca de 20 mil. Terminado o conflito, tem inicio a migração gaúcha. Chapecó, a maior cidade do oeste catarinense, foi fundada por um sul-rio-grandense em 1917. Concórdia, Xanxerê, São Miguel do Oeste e outros tantos municípios surgiram de modo semelhante. Quando os gaúchos chegaram a maior parte das florestas catarinenses já tinha sido derrubada por madeireiras estrangeiras que exploravam as terras às margens da Ferrovia São Paulo-Rio Grande do Sul. Replicou-se então, a colonização tradicional estruturada nas pequenas propriedades. Isso garantiu ao Estado de Santa Catarina a condição de ser a unidade da federação com a melhor distribuição de renda no País. A diáspora do povo gaúcho é tema que carece de exame mais aprofundado. Deve ser contada em detalhes e analisada com abrangência. Os gaúchos, em realidade, são os bandeirantes do século XX. As bandeiras paulistas estenderam as fronteiras do Brasil; a migração dos gaúchos assegurou a posse de vastas extensões de terras devolutas. Foram eles que alargaram e consolidaram as fronteiras agrícolas do País e contribuíram para transformá-lo no celeiro mundial de alimentos. Portanto, o Brasil muito deve aos migrantes gaúchos. Ao trabalho e perseverança dessa gente que deixou para trás o que possuía para sair em busca de um sonho de progresso. Na Semana Farroupilha, a simbologia da Chama Crioula é a homenagem prestada a esse povo amante dos seus costumes, da liberdade e das suas raízes. (Ensaio baseado no livro “A Diáspora do Povo Gaúcho”, de autoria do senador gaúcho Pedro Simon, editado pelo Senado Federal em 2009).

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ESPECIAL: TRADIÇÃO GAÚCHA

Cultura que ultrapassa as fronteiras do Rio Grande do Sul

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Augusta Gern chimarrão, o churrasco, os bailes, o amor por cavalos e até a participação em rodeios são costumes da tradição gaúcha quase tão fortes nas cidades de Itapoá e Guaratuba como a rotina de se caminhar pela beira mar ou preparar um peixe fresco. Grupos de amigos e famílias cultuam e preservam uma tradição que iniciou há anos e, ao contrário do que muitos pensam, não se limita às fronteiras do Rio Grande do Sul. Para conhecer essa cultura, a primeira lição é saber que quem nasce no estado do Rio Grande do Sul é rio-grandense, e o gaúcho, por sua vez, é quem cultua a tradição. Assim, há gaúchos em diferentes locais, principalmente nos estados do sul do Brasil (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), e regiões da Argentina e Uruguai. Pesquisas

apontam que a expressão “gaúcho” surgiu antes de 1800 com as pessoas que habitavam o pampa, com uma vida marcada no campo e pela criação de gado. Hoje o termo está um pouco diferente: comerciantes, empresários, aposentados ou pessoas de qualquer profissão, de qualquer região, também se consideram gaúchos, afinal, vivem a tradição. A principal marca dessa cultura é o respeito; para qualquer gaúcho que se pergunte a resposta é certeira: “é a melhor cultura para se criar os filhos”. Conforme Celso Antônio Gomes, gaúcho desde criança e morador de Itapoá desde 1980, esta tradição tem uma grande estrutura familiar: “o filho aprende a cuidar do cavalo, te respeitar e respeitar o próximo”. Além do respeito, César Cotia, empresário de Itapoá e amante da tradição desde 2001, também destaca a

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igualdade: “quando as pessoas colocam a bombacha e o chapéu, são todos iguais, o respeito deve ser o mesmo para todos”. Junto com valores tradicionais, a cultura gaúcha também proporciona grandes momentos de descontração, tanto em família como entre amigos. As rodas de conversa embaladas pela cuia de chimarrão, os bailes de sábado à noite, a costela aos domingos, passeios de cavalo, mesmo à beira bar, e viagens para rodeios são alguns costumes que colaboram na manutenção dessa tradição, são costumes repassados de geração para geração. Tanto em Itapoá, como em Guaratuba, esta é uma cultura relativamente nova. No município itapoaense surgiu por volta de 1980, quando gaúchos de diferentes regiões, do oeste de Santa Catarina e do Paraná, se encontraram e

resolveram mantê-la também no litoral. Com um grupo formado, começaram a participar de rodeios e resolveram montar um Centro de Tradições Gaúchas (CTG).

Local de confraternização

Os Centros de Tradições Gaúchas (CTG) são sociedades que buscam divulgar e preservar a tradição e folclore gaúcho, além de ser um espaço de integração dos tradicionalistas. Nestes Centros, convivem pessoas de diferentes etnias, religiões, gerações e classes sociais, o que vale é ter uma coisa em comum: respeitar e gostar da tradição. Itapoá conta atualmente com dois CTGs: Estância Herdeiros da Tradição e Fronteira do Litoral. O primeiro começou suas atividades em 1998. Conforme Miguel Carnei-


Nivaldo Zimmermman, patrão do CTG Fronteira do Litoral de Itapoá e a esposa Vera Lucia Wiggers dos Santos, Jairo Aparecido de Souza, patrão do CTG Estância Guaratubana de Guaratuba com suas filhas e Rogério da Costa Silveira, patrão do CTG Herdeiros da Tradição de Itapoá. ro Braz, este CTG já contava com toda a documentação, mas estava irregular: “estava com a anuidade atrasada há seis anos, então acertamos tudo e reativamos”. Já o CTG Fronteira do Litoral é mais recente. A partir do gosto do casal Nivaldo Carlos Zimmermann e Vera Lucia Wiggers dos Santos, junto com outros amantes da tradição, resolveram montar um espaço para proporcionar eventos e atividades em Itapoá. Conforme Nivaldo, patrão do CTG, o projeto de construção do espaço é de cinco anos e o carro-chefe será a ecoterapia, que irá liderar a parte social do Centro. Todo

CTG conta com um patrão, como é denominado o responsável geral, além da patronagem, que são as pessoas responsáveis por cada área da tradição. “O CTG é divido em três áreas: campeira, artística e social”, explica Nivaldo. A primeira área é responsável pelo esporte e cuidado dos animais, como a organização de competições e participação em rodeios. Já a área artística é responsável pela dança, música, declamações e outras expressões. A área social, por sua vez, visa contribuir para a comunidade que está inserida. Segundo o casal, toda e qualquer pessoa que gosta e respeita

a tradição gaúcha pode participar das atividades do CTG. No último mês já realizaram um almoço com costela fogo de chão e mais eventos estão por vir: no dia 20 de setembro, no encerramento da Semana Farroupilha e comemoração do Dia do Gaúcho, será realizado um baile no Shopping Expoverão. Para o ano que vem a expectativa é de promover o 1º rodeio de Itapoá. O maior evento do ramo realizado até hoje na cidade foi a Mateada, realizada por quatro anos com vaca mecânica. Os dois CTGs da cidade são filiados ao MTG – Movimento Tradicionalista Gaúcho de Santa Ca-

tarina e fazem parte da 9ª região do estado. Guaratuba também conta com a tradição. Conforme Jairo Aparecido de Souza, empresário e tradicionalista, o CTG Estância Guaratubana foi fundado em 1997, porém não conta com um espaço específico. O Centro é mais voltado para a área campeira e, no ano de inauguração, promoveram um grande rodeio na cidade litorânea paranaense. Infelizmente, pela falta de um espaço na cidade, este foi o único evento próprio. Porém, o grupo que cultua a tradição participa frequentemente de eventos em outras cidades.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

Apaixonados por rodeios

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Augusta Gern m grande evento onde as diferentes manifestações culturais da tradição gaúcha se unem, talvez assim possa ser definido o rodeio crioulo, muito cobiçado por quem mantém a tradição nas cidades de Itapoá e Guaratuba. Mesmo sem a realização de rodeios nas duas cidades, quem gosta geralmente é assíduo: marca presença em pelo menos um rodeio por mês. Assim, fazem um verdadeiro acampamento: com um trailer, caminhão ou barracas organizam o espaço para dormir, levam todos os utensílios, uma boa carne, chimarrão e claro, os cavalos. O espaço do rodeio torna-se uma cidade crioula: os representantes de cada município formam uma família e a festa é garantida. Conforme a Cartilha para a Realização de Rodeios Crioulos orga-

nizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, a palavra rodeio surgiu com os rodeios country, que iniciaram nos Estados Unidos em meados de 1800. No Brasil esta forma de rodeio surgiu em 1956, na cidade paulista de Barretos, onde a principal atração era a disputa entre o homem e o animal. Diferente do estilo country, o Rodeio Crioulo surgiu no Rio Grande do Sul na década de 50 a partir dos torneios de tiro de laço competitivos, com o objetivo de resgatar manifestações das tradições do campo. O primeiro rodeio crioulo foi em Vacaria (RS), e a partir de então se proliferou e motivou mais pessoas a poder vivenciar os costumes tradicionais gaúchos. Nos rodeios é possível vivenciar diferentes manifestações culturais: a dança, a chula (sapateio característico e exclusivo de peões), a declamação, a trova (criação e improviso de versos cantados), as vestimentas típicas, exposição de

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Inácio Braz Smanioto com o filho Inácio Braz Smanioto Jr, a nora Edinéia Nascimento Rosa Smanioto e as netas Graziela e Gabriela. animais como gado campeiro e cavalos crioulos e o esporte, como competições de laço, gineteadas e rédea. A prova de laço é a preferida da maioria: realizada em uma cancha onde o laçador, montado a cavalo, busca laçar o boi conforme os limites de tempo e espaço estipulados. A gineteada consiste em conseguir ficar o máximo de tempo montado

em um cavalo mal domado ou xucro (ainda não domesticado). Já na prova de rédea deve-se fazer o percurso e obstáculos estipulados em menor tempo possível. A maioria dos gaúchos de Itapoá e Guaratuba praticam a prova de laço. Alguns participam de rodeios apenas entre amigos, outros organizam toda uma estrutura para carregar a família inteira.


Programa de família

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possibilidade de unir toda a família é o que motiva os cunhados Jairo Aparecido de Souza e Inácio Braz Smanioto Jr., de Guaratuba, à tradição gaúcha. Nos rodeios todos estão presentes: pais, mães, filhos, sobrinhos e até quem ainda está por vir. Nesta família a cultura gaúcha não veio do berço, mas é mantida e admirada como se fosse. Tudo começou com o pai de Edinéia Nascimento Rosa Smanioto, mulher de Inácio. “Como meu tio morava em Joinville e participava de rodeios, meu pai começou a se interessar e trouxe a cultura para Guaratuba”, conta Edinéia. Quando o pai

faleceu, Inácio seguiu em frente. O veterinário já havia laçado quando criança, mas conheceu a cultura melhor realmente com o sogro. Com o tempo incentivou também o cunhado Jairo, empresário, e não teve outro jeito: virou paixão de família. Os dois laçam e participam de pelo menos um rodeio por mês. “Quando você vai vivenciando, toma gosto pela cultura”, afirma Jairo que, para participar das provas de laço, teve que antes que aprender a andar a cavalo. Com tudo isso, absorveu também o gosto pelo chimarrão, vestimentas e contagiou esposa e filha. Para Inácio não é diferente: além da esposa, as filhas de nove e dez anos e o pequeno que deve chegar ao mundo pelos próximos meses também não ficam de fora. Nas fotos da gravidez, por exemplo, uma bombachinha não ficará fora

Inácio Braz Smanioto Jr.

do cenário. “Ao absorver esta tradição conseguimos unir o esporte com a família, envolvendo diferentes gerações”, afirma Jairo. Inácio complementa que “para quem gosta, não há nada melhor”. Conforme os laçadores, os rodeios na região acontecem mais fortemente entre os meses de abril

e agosto, em virtude do clima. E, além de propiciar bons momentos de família reunida e prática de esporte, Jairo afirma que o rodeio fomenta muitas outras atividades: “Muita coisa está envolvida, não apenas a tradição. Tem os cavalos, o transporte, a estrutura do espaço... uma cadeia de exigências”.

Jairo Aparecido de Souza.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

Amor pela tradição Augusta Gern

Para Rogério da Costa Silveira, o rodeio é programação para pelo menos um final de semana por mês. Natural de Itapoá, tudo começou pelo amor por animais na infância: como se criou na roça, sempre quis um cavalo. Em 1999, por influência de amigos foi ao primeiro Rodeio, começou a laçar e de lá pra cá não parou mais.

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m sua chácara, seu refúgio, construiu uma cancha, passou a treinar com mais frequência e já conquistou vários troféus. “É muito emocionante você representar a sua cidade em um evento desses”, afirma. “A adrenalina é muito grande e sempre dá um frio na barriga”. O gosto pelo esporte se uniu à afinidade que já tinha à

cultura gaúcha: sempre gostou muito de bailes e da música tradicionalista; durante um tempo até fez aulas de gaita. “Sou apaixonado pela tradição gaúcha”, afirma. E toda essa paixão também contagiou outras gerações da família. O sobrinho Robson e o filho Ramon também laçam, já a filha Milena, não vê a hora de aprender. “Ela gosta muito de cavalos e tem até um ves-

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Rogério com a esposa Edilene e os filhos Milena e Ramon em sua chácara no Saí Mirim. tido de prenda, mas ela ainda é muito novinha para participar de competições de laço”, fala o pai. Com tanto amor, Rogério hoje é patrão do CTG Herdeiros da Tradição e, neste ano, está coordenando a Semana Farroupilha.


Sobrinho, Robson Ruan Silveira

Desde a infância

O amor do pai pela tradição também incentivou a pequena Milena Batista Silveira, 10 anos. Filha de Rogério, a pequena sempre teve contato com animais, ama cavalos e sonha em ser veterinária. Segundo ela, tudo começou há quatro anos quando estava em um rodeio, acabou dormindo em cima de um cavalo e o animal disparou assustado. Mesmo com todo o susto, ela tomou gosto. O melhor programa de família é quando visitam os cavalos aos domingos. Ela adora passear com o seu cavalo e, segundo o pai, tem um ciúmes danado do animal. “Eu ainda não consigo colocar a cela nele, mas sempre o escovo, gosto muito dele”, afirma. Seu sonho é aprender a laçar e poder participar de competições.

O filho Ramon Silveira.

Rogério e Ramon na prova de laço, na categoria pai e filho.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

Melhor cultura para se criar os filhos

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Ricardo em prova de laço no rodeio de Joinville.

Augusta Gern utro apaixonado pela tradição em Itapoá é Ricardo Kessin. De Canoinhas, nasceu com a cultura gaúcha e há 15 anos a exerce em Itapoá. Além de cultivar e incentivar a tradição em casa, Ricardo também é assíduo em rodeios, gosta mesmo é de laçar: “Este é o meu futebol”. Para ele, a “cidade de lonas”, como define um rodeio, é a prova de como o respeito está acima de tudo nesta tradição. “Este é um esporte que agrega pessoas de dife-

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rentes classes e prêmios grandes, ao mesmo tempo, todos os gaúchos usam uma faca na roupa e nunca aconteceu nada”, conta. Ao comparar o esporte com um jogo de futebol, onde há brigas e outras coisas, afirma que este é o melhor esporte e tradição para se criar os filhos. O filho mais velho, Douglas, participa dos eventos desde pequeno. Começou com vaca parada, passou para vaca mecânica e hoje laça junto com o pai. “Foi uma emoção muito forte quando o vi laçando pela primeira vez ao meu

Seu filho Douglas também participa dos rodeios. lado na cancha”, conta. Em relação aos cavalos, Ricardo explica que é como um automó-

vel: “você sempre fica de olho em um melhor, sempre quer um mais ágil ou habilidoso”.



TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

De pai para filha Miguel Carneiro Braz e Juliana Carneiro Braz. Augusta Gern

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ubir em um cavalo, não ter medo de obstáculos e ainda ganhar muitas provas não é para qualquer um, ainda mais quando se trata de uma moça, ou melhor, uma prenda. Há cerca de 15 anos, quando ainda era difícil ver meninas deixando os vestidos e participando junto aos homens nas provas de rodeio, Itapoá já tinha uma grande representante: Juliana Carneiro Braz. Sua trajetória pelas provas de rédea e laço iniciou cedo e foi um pouco curta: participou dos 11 a 14 anos, porém, foi o suficiente para deixar grandes marcas na tradição do município itapoaense. Juliana competia as provas com meninos e era difícil quando não ficava nas primeiras colocações, conta o pai Miguel Carneiro Braz, orgulhoso e grande incentivador. Tudo começou pela paixão do pai à tradição. Do Paraná, Miguel sempre gostou da cultura gaúcha e quando chegou a Itapoá resolveu comprar um cavalo. Ele foi um dos fundadores do CTG Herdeiros da Tradição, fez parte do primeiro grupo de pessoas da cidade que participavam de rodeios e, junto com César Cotia, ajudou na organização das quatro edições da Mateada em Itapoá, evento realizado com vaca mecânica. Pelo seu gosto, incenti-

vou a filha mais nova, que correspondeu com grande habilidade. A primeira grande cavalgada de Juliana foi aos 11 anos, quando junto ao grupo de amigos do pai, percorreu o trecho de Itapoá à Guaratuba à cavalgadas. Tomou gosto e começou a treinar todas as tardes, era como uma segunda escola: o pai era o professor, a sala de aula eram as ruas de Itapoá e, as provas, as competições de rodeios. A boa notícia era que as notas sempre foram altas. “Às vezes ela era a única menina do rodeio, mas sempre garantia uma boa colocação e troféu”, lembra o pai. Até por este motivo, a família se desdobrava e sempre dava um jeitinho de marcar presença nos eventos para a jovem poder competir.

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Para Juliana, aquilo era uma diversão; tinha uma coragem que espantava a mãe e irmã mais velha. “Uma vez ela caiu do cavalo e quebrou a clavícula, mas mesmo assim, com o braço e o tronco todo engessado, continuava cavalgando e treinando escondida”, conta a irmã Patrícia. Junto à coragem, havia a segurança ao seu fiel companheiro, ela amava o seu cavalo. “O Castelhano era muito bom e tínhamos uma sincronia muito grande”, lembra Juliana. Por ganhar muitas provas, vários competidores assediaram o seu cavalo e grandes clubes de Joinville a convidaram para a equipe, porém o investimento era maior do que o disponível. Conforme Miguel, a região sem-

pre foi muito boa nas provas de rédea e laço, talvez a mais forte de todo o estado catarinense. “E a Juliana ganhava todas por aqui, com certeza chegaria a uma decisão nacional, estava treinando para ela ser uma campeã brasileira”, conta o pai. Porém, seu sonho acabou quando a filha entrou na adolescência. “Quando cresci comecei a me interessar por outras coisas e acabei deixando toda essa atividade de lado”, explica a jovem. A falta de companhia feminina e a vontade de trocar os treinos pelas festinhas à noite foram alguns dos fatores que fizeram sua carreira estacionar aos 14 anos. Com isso, a família toda deixou de participar tanto de rodeios e, pelo aumento de gastos, o cavalo


De marido para mulher: Mais do que cultuar um evento Nivaldo Carlos Zimmermann e Vera Lucia Wiggers dos Santos

ganhou outro dono. “Mas eu tinha muito ciúmes dele e sempre estava de olho, até ele infelizmente falecer”, conta Juliana. Contudo, boas lembranças não faltam. A família recorda que Juliana já até venceu uma gineteada, competição para ver a pessoa que consegue ficar montada mais tempo em um animal “xucro”, que não é treinado. Na ocasião era uma mula arisca, tão famosa por não deixar ninguém montar que havia até aparecido no programa do Ratinho, segundo eles. “A Juliana foi a primeira mulher a tentar montar na mula e foi quem venceu, ficou famosa em todo o rodeio”, lembra Miguel. E assim, com cabelos claros e traje a rigor, as fotos revelam o talento e gosto pelo esporte. Hoje, junto às lembranças e saudades do cavalo, preserva o costume de tomar um bom chimarrão com o pai e jogar conversa fora em um bom almoço de domingo em família.

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casal Nivaldo Carlos Zimmermann e Vera Lucia Wiggers dos Santos dão uma aula quando o assunto é tradição gaúcha. Há sete anos em Itapoá, o casal já cultuava a tradição em Joinville, ou melhor, ela vem do berço: fotos antigas já revelam o amor pelos cavalos desde criança. Junto com um grupo de pessoas da cidade, eles estão organizando o CTG Fronteira do Litoral e até parece que respiram a tradição. A casa, as roupas e, principalmente, o brilho nos olhos quando tratam do assunto, são as revelações disso. Para eles, o principal chamariz da tradição gaúcha é o respeito pela estrutura familiar. Os dois têm cavalos, participam de rodeios e até laçam. Vera começou o esporte há três anos quando Nivaldo se machucou e sua dupla ficou sem parceiro. Mesmo com medo ela foi, não caiu e se apaixonou. “É o melhor esporte que eu já fiz na minha vida e onde você tem

a melhor adrenalina”, afirma. Hoje, além de laçar também se formou como juíza de rodeio. Para eles, o que mais conta nisso tudo é a sintonia com o cavalo. Nivaldo explica que para cada modalidade e atividade existe um tipo de cavalo, é preciso saber o que e para que você quer. Para os laçadores, por exemplo, o sonho é um cavalo crioulo, que pode variar de

5 mil a 1 milhão de reais. “O valor varia de acordo com a afinidade que você tem o cavalo. Para mim o meu vale muito, talvez para você não seja tanto”, fala. Ainda em relação aos animais, o casal conta que eles sempre escolhem alguém da família para ter afinidade e, como um ser humano, querem e precisam de carinho, de atenção.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

Amor que se transformou em coleção Augusta Gern

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ara Maria Eduarda Tulik, 7 anos, de Guaratuba, o amor por cavalos foi além da admiração ou impulso para a tradição, tornou-se também uma coleção. A menina conta com mais de 30 pôneis de brinquedo, entre plástico, pelúcia e borracha. Conforme os pais, Sueli Maria de Oliveira e Edson Mario Tulik, desde bebê Maria Eduarda teve contato com animais: parte da família mora na área rural e em todas as viagens o destino é um hotel fazenda. Assim, além de um gato e dois cachorros, na casa de uma tia ela tem um pintinho, em outra tia tem um coelhi-

Maria Eduarda Tulik nho e assim o universo de animais só cresce. Porém, o maior xodó é o cavalo de sua irmã mais velha que mora em Curitiba; o sonho de Maria Eduarda é ter um também. “Ela sempre escreve cartinhas para o Papai Noel e Coelhinho da Páscoa pedindo um cavalo ou um pônei de

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verdade”, conta a mãe. Como para outras pessoas, o cavalo foi que incentivou à cuLtura gaúcha na família. Sueli e Edson se conheceram em um rodeio e sempre gostaram de participar, mas para festar, não para competir. Como a filha mais velha de Edson ganhou um cavalo e começou a participar de provas, não teve jeito: Maria Eduarda também quis e mostrou o seu talento. A primeira prova que participou foi no 23º Rodeio Crioulo Pontal do Paraná (PR) – CTG Desgarrados do Pago, no último mês. Até a hora da prova era nunca havia treinado e nem montado naquele cavalo, e mesmo assim conquistou o 2º lugar na prova de rédeas, categoria

prenda mirim. “A sua irmã participa de provas de laço e ela foi junto para auxiliar, mas não imaginávamos que teria coragem. Quando vimos já estava inscrita e pronta para a prova”, lembra a mãe. Hoje, além de ter um cavalo, o sonho de Maria Eduarda é poder laçar como a irmã. Mas além de incentivar a tradição na família, este amor por cavalos também invadiu suas brincadeiras. Segundo os pais, Maria Eduarda nunca gostou muito de brincar de boneca, sua preferência sempre foi a coleção de pôneis. Ela os tem de todas as cores e tamanhos, e cada um tem um nome, são como uma grande família. E mesmo que nem todos caibam em seu quarto, é o que sempre pede de brinquedo. “Ela passa as tardes brincando com os pôneis e sua gatinha Marie, sua fiel companheira”, afirma a mãe.


TRADIÇÕES GAÚCHAS: RODEIOS

Diversão e união garantida

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Augusta Gern odeio é sinônimo de alegria e união para o casal Zeferino Balsanelli e Ivone Balsanelli, mais conhecida como Branca. A tradição gaúcha faz parte da vida dos dois desde pequenos e se uniu no casamento: há 35 anos se conheceram em um baile. Assim, seria difícil se não a cultuassem e repassassem O casal Zeferino Balsanelli e Ivone Balsanelli. aos filhos, que também gostam bastante. vários casais e filhos e todo mundo Há 18 anos em Itapoá, foi aqui fica em perfeita harmonia”, conta. que cultura ganhou mais corpo. São alguns dias em que diferentes “Quando morávamos em Jaraguá famílias se tornam uma só, comnão tínhamos como ter cavalos ou partilhando alimento, chimarrão e participar de muitos eventos, mas boas conversas. aqui as coisas mudaram”, conta Zeferino fala que para quem Zeferino. gosta de cavalo e natureza, não há Segundo ele, a família hoje tem nada melhor. “Até porque lá somos dois cavalos e sempre que podem todos iguais e esquecemos os proparticipam de rodeios, são cerca blemas daqui, o assunto é um só: de sete por ano. “Há alguns rodeios cavalos”, afirma. E apesar de saber na região que sempre marcamos laçar, não gosta muito das compepresença junto com um grupo de tições, participa de rodeios mais Itapoá”, afirmam. pela união e alegria mesmo. Conforme Branca, rodeios são O negócio de Zeferino são as uma boa opção para unir os ami- cavalgadas. Para ele, a melhor gos e família. “No nosso grupo to- coisa de se ter um cavalo é sentir dos cuidam de tudo e de todos, há o prazer de um bom passeio. Por

este motivo, ele já organizou duas cavalgadas interestaduais: uma que reuniu 23 cavalos e outra 19. Zeferino também já foi coordenador da terceira Semana Farroupilha e faz parte do CTG Fronteira da Tradição, onde marca presença todos os finais de semana: “Estamos trabalhando bastan-

te para organizar o primeiro rodeio aqui na cidade”. Segundo ele, há um grupo de pessoas divulgando o evento em outros rodeios em todos os finais de semana e a expectativa é boa: “Acreditamos que teremos a inscrição de cerca de 200 equipes, que equivale a mais ou menos 800 pessoas e cavalos”, fala. Além de fazer um bem danado para quem gosta da tradição, o casal afirma que rodeios envolvem diferentes setores da economia de uma cidade: são precisos veterinários, agropecuárias, ferradores e até domadores.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS: SEMANA FARROUPILHA

Confraternização de povos e preservação de uma tradição Augusta Gern

O maior evento de resgate à tradição gaúcha também acontece em Itapoá e já está em sua sexta edição: a Semana Farroupilha. Com o objetivo de comemorar a paz a partir da Revolução Farroupilha, o evento acontece do dia 14 a 20 de setembro. O evento chegou à cidade através do casal Nivaldo Carlos Zimmermann e Vera Lucia Wiggers dos Santos, que já faziam parte das comemorações na cidade vizinha joinvilense. Conforme Nivaldo, o evento não comemora a Revolução Farroupilha, e sim a paz, através da chama crioula. Esta festa cívica surgiu em 1947, em Porto Alegre, quando jovens realizaram a primeira “ronda crioula”. Da mesma forma como é realizado em outros lugares, seguindo a tradição de décadas, o evento em Itapoá tem um único objetivo: a confraternização de povos. É um evento que prega a liberdade, igualdade e fraternidade. Segundo Vera, quando sugeriram o evento, em 2009, foi muito bem aceito. “A

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Organizadores acendendo a chama crioula no início do evento. ideia era fazer alguma diferente em Itapoá, que não tem muitas opções fora da temporada”, conta. E com isso, a primeira Semana aconteceu com apenas 13 cavaleiros. Com o tempo o número de participantes aumentou, mas maneira como é realizado continua a mesma. A cada ano uma pessoa diferente é responsável pela coordenação do evento, com o objetivo de sempre agregar novas ideias. Neste ano, a coordenação é responsabilidade de Rogério da Costa Silveira, patrão do CTG Herdeiros da Tradição. A chama e as bandeiras percor-

Participantes percorrem diferentes pontos da cidade com a chama crioula, que simboliza a paz.

Cinco dos seis coordenadores da Semana Farroupilha: Rogério, Celso, Zeferino, Ricardo e Nivaldo


rem diferentes regiões da cidade, permanecendo durante a noite em um ponto de encontro. “Todos os anos os pontos são quase os mesmos, onde as pessoas se dispõem a fazer uma janta campeira para os participantes”, explica Vera. Segundo o casal, a festa é só até meia noite, afinal, todos tem os afazeres no outro dia. Assim, são sete dias em que pessoas de diferentes idades, costumes e etnias tornam-se um só povo. A chama crioula, símbolo da paz, vem todos os anos do Rio Grande do Sul. Ao final da Semana, no encerramento que acontece no Dia do Gaúcho, 20 de setembro, ela é acalmada até o próximo ano, nunca apagada. Conforme o casal, existe um tabu que só pode participar da Semana quem tem cavalo ou é filiado ao CTG, o que não é verdade: “Qualquer pessoa que gosta da tradição é muito bem vindo”. 4Além disso, os participantes estão tentando resgatar ainda mais a tradição através de gaiteiros, dançarinos ou pessoas que a cultuam de alguma forma. Para incentivar e divulgar, também gostariam de levar o conhecimento da Semana Farroupilha e da Guerra dos Farrapos para as escolas. “Muitos não conhecem ou confundem esta história com outros movimentos do restante do país”, contam. Vera explica que já foi atrás de algumas escolas, mas a burocra-

Sete pontos diferentes fazem parte das paradas da Semana Farroupilha, envolvendo diferentes comunidades da cidade em uma integração de povos.

Diferentes gerações marcam presença para não deixar a cultura morrer.

Cada ponto é responsável por servir uma janta campeira aos participantes

cia ainda é muito grande. Dessa forma, talvez pela falta de conhecimento ou interesse, para algumas pessoas o evento passa de forma até despercebida, desperdiçando a rica história e costumes preservados pelos participantes. O número de participantes do evento aumenta a cada ano, agregando novas pessoas à cultura gaúcha, amor por animais e integração de povos

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TRADIÇÕES GAÚCHAS

Das histórias para o dia a dia Augusta Gern

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lém do chimarrão e churrasco no domingo, muitos outros símbolos fazem parte da história da cultura gaúcha. Para a maioria das pessoas alguns ficaram apenas nas recordações de família, mas não para Celso Antônio Gomes, morador do balneário Pontal, em Itapoá. Alguns costumes são vivenciados desde a infância. Celso, natural

de Rio Negro (SC) tinha mãe gaúcha e pai mineiro, mas todos sempre cultivaram a tradição. Como nasceu na lavoura, desde pequeno foi obrigado a andar a cavalo, até porque a única condução que passava perto de sua casa era o trem, por ali não existia carro e muito menos ônibus. Assim, cresceu tratando dos cavalos e tomando um forte chimarrão com a família. Casou-se com Iani Maria Gomes, gaúcha, então não poderia ser diferente: logo no casamento já tiveram que seguir a tradição gaúcha, onde o homem deveria ter um terreno e a mulher comprava todos os móveis. De Rio Negro mudaram-se para Itapoá Celso Antônio Gomes e Iani Maria Gomes, na em 1980. Celso solenidade de abertura da Semana Farroupilha. sempre foi muito

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aventureiro e veio para trabalhar na construção de um grande condomínio. O empreendimento não saiu, mas ele ficou e manteve a sua tradição. “Naquela época não havia tradicionalistas aqui, aos poucos é que foram chegando e formamos um grupo”, lembra. Hoje Celso faz parte do CTG, marca presença nos rodeios e recepciona a abertura da Semana Farroupilha em sua chácara na Vila da Glória. Porém, não é só isso: “passo todas as alquimias da cultura gaúcha que aprendi com o meu avô para a minha família”. Para ele, um dos símbolos da cultura não pode faltar em casa: a Macela. Esta é uma planta tradicional nos lares gaúchos e muito uti-

lizada na medicina popular. Além da recordação de criança do cheiro da planta no travesseiro, ele afirma ser imbatível no combate à trovoadas. A esposa Iani explica que para acalmar tempestades, deve-se colocar o terço dentro de um copo de água e queimar um ramo de Macela ao lado. “É tira e queda, a trovoada logo passa”, afirma. Outro aprendizado de família vem a partir de um copo de madeira que seu avô fez. “É só colocar água quente e beber neste copo, passa qualquer problema de barriga que possa existir”, conta Celso. Além desses, outros símbolos são presentes na cultura, como a erva mate, o cavalo crioulo, o pássaro quero-quero, a gaita e a flor brinco de princesa.


Os trajes

A vestimenta típica também é um símbolo da cultura gaúcha. Conforme o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), usar a pilcha corretamente é uma forma de preservar o patrimônio social e, para isso, estabeleceu diretrizes para a vestimenta em diversas ocasiões. Há três tipos de indumentárias igualmente para peões e prendas: pilcha para atividades artísticas e sociais, pilcha campeira e pilcha para a prática de esportes. Em geral, a pilcha masculina é formada por bombachas, camisa (que não seja de cetim e não tenha estampas), colete ou paletó (dependendo da situação), cinto (guaiaca), botas, chapéu e lenço. São de uso opcional, e podem ser obrigatórios ou proibidos (dependendo do local e momento): faixa, esporas, pala e faca. Já a pilcha feminina procura não contrastar com o recato da mulher gaúcha, tendo recomendações quanto a mangas, decotes, cabelos e maquiagens. O traje é formado pelo vestido, a saia de armação, a bombachinha, as meias e sapatos. São permitidos acessórios como chale, brincos e anéis discretos e broches. Já relógios e pulseiras, sombras, batons ou unhas muito coloridas e sapatilhas amarradas nas pernas não combinam com esta vestimenta. Também, por não fazer parte da indumentária gaúcha é vedado para todas as situações o uso de bonés e boinas, chapéus de palha e botas de borracha.

A tragédia e o milagre

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credito que a Tragédia de Guaratuba foi a primeira que veio com um milagre. O paradoxo aqui é uma coisa certa. É verdade que a tragédia tocou muito mais que o milagre, pois foi ela que mais chocou a todos, e com muita razão. Ninguém poderia mesmo ficar insensível a um fenômeno desses. Uma coisa que parecia sonho e de repente vira a realidade doída. E sempre a tragédia marca mais do que um milagre. A tragédia fere o homem, o milagre o deixa surpreso e assusta. O milagre a que me refiro é o fato de não ter havido qualquer vítima fatal em Guaratuba. Nem apenas um arranhão. Mas, o milagre que veio com o afundamento de 35 casas fez com que ninguém ao menos se machucasse. É claro que o fato deixou marcas profundas, especialmente às famílias prejudicadas que ficaram apenas com as roupas do corpo, pois quando fugiam em desespero, a única bagagem eram as roupas, porque tudo o resto a água engoliu. O milagre salvou todos os donos das casas destruídas. Cuidou da vida deles a mando de Deus. As casas são construídas pelos homens, por isso desapareceram. As vidas são obras de Deus e por isso não foram danificadas. Eis o gran-

de milagre que Guaratuba presenciou naquele primeiro dia de primavera em data de 22 para 23 de setembro de 1968. 46 anos já se passaram, e todos que até hoje estão ainda inconformados com as perdas materiais que sofreram com a catástrofe de 1968 pensaram, agiram e estavam conscientes que tinham à frente toda uma vida ainda. E uma vida bem dirigida, pode fazer milagres que nem o homem conhece. Uma das virtudes do ser humano é a vontade de querer fazer algo sempre novo no mundo em que vive. E essa vontade foi aproveitada por aqueles que perderam tudo, reconstruindo uma nova vida junto aos seus. O fato de ninguém ter morrido naquela tragédia, significou que tudo deveria ser reerguido novamente. A vida que é o milagre de Deus, ainda está com os homens. Fora isso o que se sentiu com o tempo foi a falta daquela rua quieta onde teve início esta abençoada cidade, que ficava defronte à baia. Aquela rua que deu lugar a mais um pedaço de baia. Aquela rua que foi feita em cima do barranco da antiga Guaratuba, onde o velho Patriarca passeava com as mãos para trás e com a boca se mexendo com liberdade por onde os dentes já não existiam.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS | DANÇA

Nos salões, passos que dançam a tradição Augusta Gern Dois pra lá, dois pra cá. Com este movimento universal muitas pessoas embalam e se divertem nos bailes gaúchos das cidades de Itapoá e Guaratuba, que não são poucos. Diferentes casas noturnas apostam no ritmo gauchesco e público não falta. Alguns frequentadores são tradicionalistas e seguem os passos à risca, outros nunca tomaram um chimarrão e nem sabem como é uma vestimenta típica gaúcha, mas a diversão é

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a mesma, o segredo é dançar. “Dançar é uma felicidade que não custa nada, a não ser a entrada para o baile”, afirma o professor de dança gaúcha Adilson Basso, mais conhecido como Chiquinho. Coordenador do Grupo Raízes da Tradição, de Guaratuba, Chiquinho explica que a dança é uma válvula de escape para a timidez e uma grande porta de entrada para integração. Porém, um dos maiores erros, segundo ele, é achar que se nasce com o gene da dança.

“Ninguém nasce sabendo, é preciso aprender na escola, é preciso compartilhar os erros e acertos”, afirma. Assim, apesar de algumas pessoas terem mais ritmo do que outras, todo mundo pode aprender, só é preciso ter vontade e persistência. Natural de Curitiba e há 30 anos em Guaratuba, Chiquinho cresceu vendo os pais gaúchos dançando e se encantou. Apesar de não seguir como carreira profissional, fez vários cursos e há 11

anos ministra aulas voluntariamente. Até hoje cerca de duas mil pessoas já se formaram no curso que tem duração de três meses e um custo total de uma cesta básica. Conforme Chiquinho, durante quatro anos deram aula apenas para adultos, até que resolveram abrir o curso também para a criançada. Foram três anos com a experiência e só em uma edição do curso chegaram a participar mais de 120 crianças. “Foi uma experiência muito bacana, unimos crianças de


Se você tem interesse em aprender a dançar, fique ligado: uma nova turma inicia no próximo dia 14 de setembro. O curso acontece aos domingos à tarde na Casa Rosada, em Guaratuba.

diferentes classes e trabalhamos também a disciplina, conseguimos resgatar algumas do mau caminho”, lembra. O curso também já teve alunos da APAE que, mesmo com algumas limitações, chegaram até a formatura com muita concentração, sem errar um único passo. O Grupo Raízes da Tradição surgiu através dessas aulas. A partir do destaque e amizade de nove casais da primeira turma, surgiu o grupo, hoje com 12 casais, que esbanja talento em uma sincronia de passos invejável. Conforme Chiqui-

nho, o grupo recebe muitos convites para apresentações, mas tomam cuidado em aceitar quando o objetivo da apresentação não condiz às premissas dos participantes. “Até porque todo mundo trabalha e é difícil fazer muitos ensaios”, conta. Mesmo assim, o grupo já se apresentou em algumas edições da Festa do Divino e já mostrou o talento em outras cidades da região. Junto com Chiquinho, os casais participantes também colaboram no repasse de passos durante o curso. Marcos Rodrigo Pereira, por exemplo, começou a dançar há 11 anos, na primeira turma do curso e nunca mais parou. Incentivado

pela esposa, tomou gosto pela atividade e sempre marca presença nas aulas de domingo para auxiliar os alunos. “Queremos incentivar o gosto por esta dança, por esta tradição”, afirma. O incentivo por parte dele é tão grande que a filha de um aninho já tem até um vestidinho de prenda. Segundo Chiquinho, na dança gaúcha existem nove ritmos, mas para dança-los é preciso aprender apenas quatro passos. O maior problema nisso tudo é ter a paciência e persistência, não se pode desistir na primeira dificuldade. Até porque, para Chiquinho, “são poucas as coisas na vida que dão prazer e a dança é uma delas”.

Itapoá também dança Como os bailes também são grande atração em Itapoá, o CTG Fronteira do Litoral está promovendo um curso de dança aos interessados. As aulas também acontecem aos domingos, no período da noite, e a formatura ocorrerá no próximo dia 20 de setembro, no baile de encerramento da Semana Farroupilha e comemoração ao Dia do Gaúcho. Conforme Cesar Cotia, Itapoá tem grandes talentos da dança, mas em virtude de outras atividades e falta de tempo, tiveram que buscar um grupo de Joinville para ministrar as aulas. O curso tem a duração de dois meses e irá formar mais de 100 pessoas só nesta edição. Para este ano não estão previstas novas turmas, mas ano que vem novas atividades devem ser organizadas.

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TRADIÇÕES GAÚCHAS | MÚSICA

O som da gaita em Itapoá

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Augusta Gern

om um ritmo marcante, a música gaúcha também é um dos grandes símbolos da tradição: presente nos bailes, festas e rodas de amigos. Embora seu ritmo tenha ganhado novos instrumentos e melodias com o passar dos anos, alguns instrumentos são marcas registradas, como a gaita, por exemplo. É difícil ver um grupo musical tradicionalista em que ela não esteja presente. Seu som é forte e foi o que instigou o jovem Jackson Ramon Fernandes, 17 anos, à cultura gaúcha. Conforme ele, a família sempre gostou da tradição, mas nunca seguiu nenhum costume específico. Hoje o estudante do ensino médio toca todas as semanas em bailes de Itapoá e faz freelance com

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Jackson Ramon Fernandes

diferentes bandas. Para ele, a gaita sempre foi uma paixão. Quando criança o instrumento era feito de papelão e aos 11 anos ganhou a primeira gaita, ainda de plástico e brinquedo. Foi neste objeto que começou a arranhar as primeiras melodias, até que foi realmente inspirado a buscar alguém que o ensinasse a tocar: há quatro anos seu irmão levou para casa um DVD do Grupo Tradição e ele se encantou ainda mais com a habilidade e ritmo do instrumento. O único problema foi encontrar alguém que o ensinasse. Na época, Jackson fazia aula de música no antigo Projeto Segundo Tempo, hoje

Ampliação da Jornada Escolar e, mesmo sem ter o instrumento no curso, começou a entender melhor de partituras através do violão. “O meu professor também sempre me ajudava a transformar aquilo para a gaita”, lembra. Assim, sua primeira música foi Asa Branca, que tocou em uma apresentação do projeto. A partir de então as coisas começaram a melhorar. Jackson encontrou um professor específico do instrumento, ganhou uma gaita de verdade e começou a tocar em lanchonetes da cidade. Das lanchonetes passou para festas, barzinhos e hoje são bailes. O jovem já tocou também em cidades como Joinville e Rio Negrinho e já participou do Festival das Nações em Itapoá. Hoje o gosto e sonho pela música tornaram-se realidade: pelo menos todas as sextas e domingo o compromisso com a gaita está marcado. Um gosto que também preserva a cultura gaúcha, afinal, é difícil encontrar músicos que a toquem na cidade litorânea, ainda mais, jovens.


TRADIÇÕES GAÚCHAS | GASTRONOMIA

Do berço para as panelas Augusta Gern

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om um cheiro inconfundível aos domingos e uma paixão mais do que nacional, o churrasco sem dúvida é o prato mais lembrado e apreciado da gastronomia gaúcha e, junto com ele, o fogo de chão também é grande personagem dessa tradição. Há tempos essa culinária ultrapassou as fronteiras do Rio Grande do Sul e pode ser muito bem apreciada em outras regiões. Em Itapoá, por exemplo, ficou famosa pelos deliciosos almoços do Marcão. É difícil quem não o conheça pela boa fama da costela fogo de chão. Marco Tavares, mais conhecido como Marcão, trouxe a tradição de berço e consegue preservá-la muito bem, principalmente nas panelas. Castelhano, natural da divisa entre o Brasil e o Uruguai, está

há 23 anos em Itapoá e trabalha com a culinária gaúcha. Sua especialidade, a costela fogo de chão, é muito cobiçada em eventos familiares, empresariais e até públicos. Conforme ele, já chegou a fazer um evento para mais de 4 mil pessoas e assou 108 costelas de uma única vez. Marcão explica que para o preparo da costela fogo de chão é preciso realizar todo um ritual, até porque, segundo ele, assar uma costela por oito horas é desculpa de assador: “Em 3 ou 4 horas é possível deixá-la pronta, macia e muito saborosa”, afirma com seus segredos da tradição. Além da costela, Marcão também prepara outros tipos de carne e, nos rodeios, lidera a cozinha com a comida campeira. Mais do que profissionalmente, Marcão afirma que vive a tradição

Marco Tavares, o Marcão em seu dia a dia: toma um chimarrão, gosta de cavalos, vai a bailes e também participa do Centro de Tradições Gaúchas. “Faz pelo menos 35 nos que faço parte do CTG em Itapoá”, afirma. Rodeio também é a sua praia: gosta de participar com frequência. “É uma integração entre famílias e o melhor de tudo é que nesses eventos todas as pessoas se tornam iguais”, conta. Outras delícias típicas Além do famoso churrasco ou costela fogo de chão, outros pratos também fazem parte da culinária gaúcha, conhecida pelo rico sabor e diversidade. Esta culinária contou na sua formação com a influência de diversos povos, entre europeus, índios, tropeiros vindos de São Paulo e Minas Gerais, uruguaios e argentinos.

A tradição do churrasco surgiu principalmente porque o estado do Rio Grande do Sul foi um dos primeiros a ter maios área de criação bovina no país, afinal, o gado faz parte da região desde a colonização. Outro prato famoso no cardápio gaúcho é o carreteiro, que surgiu na mistura entre a comida indígena, portuguesa e espanhola: os peões que conduziam os rebanham levavam nas viagens o charque (carne salgada) como alimento e, junto com o arroz, criaram o prato. Além disso, outras refeições famosas são: feijão mexido (feijão misturado com farinha de mandioca), puchero (cozido de carne com legumes) e quibebe (purê de moranga), uma típica culinária calórica para regiões frias.

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ANIMAIS | CAVALOS

Estímulo para a tradição Augusta Gern

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resentes na vida dos homens há muitos e muitos anos, os cavalos sem dúvida são grandes companheiros. Às vezes ganham a função e adjetivo de transporte, outras vezes auxiliam nos trabalhos agrícolas e há ainda os para a prática de esportes. Na cultura gaúcha, este é o animal símbolo, principalmente o cavalo crioulo, de raça crioula, chamado até de “orgulho do Rio Grande”.

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Independente da raça, os cavalos ganham um espaço especial na vida da maioria dos gaúchos, até porque, muitas vezes foram eles que estimularam a pessoa à tradição. Este foi o caso de César Cotia, empresário de Itapoá. Desde pequeno na cidade litorânea, ele afirma que sempre gostou de cavalo e quando tinha oito anos de idade começou a ir para a escola com o animal, da Barra do Saí até Itapema do Norte, na Escola Nereu Ramos.

“Eu e meu amigos íamos pela praia e, quando ventava muito, amarrava uma corda na bicicleta deles e todos iam ao embalo do cavalo”, lembra. Aos 16 anos até frequentou alguns rodeios, mas nada ali o interessava além do cavalo. Porém, por tanto amor e interesse aos animais, começou a conhecer um pouco mais da cultura gaúcha com os amigos e, quando viu, estava vestindo a bombacha pela primeira vez. “Me senti um pouco estranho

pela primeira vez que coloquei a roupa, até então eu era surfista, ganhei campeonatos de futebol, mas nada relacionado à tradição”, conta. O que era estranho logo acostumou e hoje se tornou paixão. Além de César, a família toda vive a cultura gaúcha: “Eu comecei a admirar a cultura ainda mais com a criação das minhas filhas, pois há um respeito muito grande”, afirma. E o cavalo continua ao seu lado: além de passeios pela cida-


César Cotia e a família toda vive a cultura gaúcha. de, para relembrar fatos da infância, também o acompanha em rodeios e provas de laço. Dessa mesma forma foi que Ricardo Ribas do Vale conheceu a tradição. O cavalo sempre foi uma paixão de criança: lembra-se de ter dez anos e já estar andando a cavalo pelas ruas de Itapoá. Seu avô foi tropeiro, mas a família não seguiu a tradição, então o gosto por cavalo seguiu o rumo do hipismo, que começou a praticar aos 12 anos.Porém, como o cavalo traz muitos amigos, não foi difícil se aproximar da tradição. Ao conviver com alguns gaúchos da cidade, o hipismo logo passou para as provas de laço e Ricardo tornou-se um típico tradicionalista. “Comecei a gostar da música, tomar chimarrão e quando vi já estava até usando bombacha”,

Ricardo Ribas do Vale é apaixonado por cavalo desde criança. conta. Ele participou de muitos rodeios, mas hoje está um pouco afastado, pois o esporte demanda muito tempo e estrutura. De qualquer forma, o cavalo continua sendo uma companhia diária: com horário marcado para trata-lo e tudo mais. Desde sua infância, Ricardo já teve seis cavalos diferentes, o atual, chamado Tordilho, está com ele há seis anos, é craque em seus cuidados e manias. “Com a convivência a gente vai aprendendo a cuidar do cavalo do jeito que ele gosta, tanto na ração, como o cuidado com casco... e tudo precisa de uma rotina, ele se acostuma com horários”, conta. Conforme Ricardo, um dos passeios preferidos de seu cavalo é um banho de mar. “Ele adora nadar, vai até sozinho, mas só vou quando a praia está vazia”, afirma.

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QUEM É | MAURÍCIO

O gaúcho pernambucano

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Augusta Gern

ssa é uma prova de que gaúcho é quem gosta da tradição, independente de sua região. Conhecido por andar pelas ruas itapoaenses com sua moderna carroça, Cícero Maurício Alves Filho, mais conhecido apenas como Maurício, é um legítimo gaúcho pernambucano. Em todas as manhãs o sotaque ainda marcado do nordeste é presenteado com goles do tradicional chimarrão do sul e, pelas ruas, o carro é trocado pela sua companheira Nega, uma esbelta égua. Morador do balneário Pontal, na cidade itapoaense, Maurício conta que sempre gostou de animais e andou a cavalo. “Em Pernambuco o evento com animais é a Vaquejada, onde o objetivo é derrubar o boi”, explica. Ele sempre gostou de participar: lá também acampava, mas era tudo muito diferente.

Deixou o nordeste há 25 anos para viajar e conhecer outras regiões: morou oito anos no Paraná, então em uma temporada escolheu Itapoá para passar as férias e, como de praxe, gostou e ficou. Por aqui sempre trabalhou por conta, limpando e cercando lotes. Foi por isso que surgiu a carroça: inicialmente apenas para trabalho; mas não demorou muito tempo para o seu xodó ganhar outras funções. Com caixas de som, cobertura, lonas nas laterais e muito capricho na pintura, a carroça é transporte para eventos gaúchos, para passeios pela cidade e até já foi utilizada por casamentos e papai noel. Puxada pela bela e tranquila Nega, a carroça chama a atenção por onde passa. Conforme Neuci Fátima de Souza, compaMaurício com sua esposa Neuci.

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nheira de Maurício, é difícil sair de carroça durante o verão, pois o assédio é grande. “É gente querendo tirar foto, gente que quer passear e gente que quer passar a mão na Nega”, conta. Segundo Maurício, já até ofertaram um carro pela sua carroça, mas não quis trocar. “Carro eu tenho, mas uso muito mais ela, é muito melhor”, afirma. O carro só se torna a primeira opção quando o tempo não está muito bom ou quando a carga é pesada, para não judiar da égua. E mais do que carroça e cavalo, outros pontos da cultura gaúcha também fazem parte de sua vida. Segundo Maurício, conheceu a esposa há nove anos em um baile em Itapoá. Neuci Fátima segue a tradição gaúcha desde pequena e incentiva a cultura: é uma das poucas mulheres que gosta de ir trajada aos bailes. O casal fez curso de dança e sempre marca presença nos bailes da cidade. Pelas manhãs, o chimarrão é sagrado. Para Maurício, além de

ser muito bom, faz um bem danado para a saúde: “Eu tinha problema de pressão baixa e, depois que comecei a tomar chimarrão, nunca mais tive nada”. Maurício ainda afirma que não há cura melhor para ressaca. Além disso, o pernambucano também é um grande apreciador de rodeios. Apesar de não participar das provas, gosta de acompanhar os amigos nos eventos. O grande contraste de seu dia a dia acontece quando visita a sua terra natal uma vez por ano. Conforme ele, lá não existe nenhum vestígio da cultura gaúcha: a música é diferente, os trajes gaúchos são vistos até com ar engraçado e o chimarrão não se encontra. “Tenho que levar erva daqui, porque se pedi erva por lá eles entendem outra coisa”, brinca. Assim, alguns utensílios são exigência na mala: música para ouvir na viagem, a cuia e muito, muito chimarrão. Tudo para não sentir saudade da cultura que escolheu e busca preservar todos os dias.


ARTESANATO| GUARATUBA

Da fibra de vidro para as paredes Augusta Gern

Animais marinhos, objetos e até símbolos gaúchos, tudo feito à base de fibra de vidro, resina e pó de mármore. Este é o trabalho de Manuel Pioli, engenheiro de estradas aposentado que há um ano dedica o seu tempo ao artesanato. Tudo é feito por ele: desde o molde até a venda. O seu ateliê é como um portal: “Da porta para dentro esquece todo o mundo lá fora”. No espaço o número de peças e variedades é grande, nem parece fruto de apenas duas mãos. Golfinhos, peixes, aves, cabeças de boi e cavalo, porta-chaves e outros utensílios são encontrados em diferentes estágios de produção. Conforme Manuel, tudo começa no molde. É aí que sua criatividade e dom artístico sobressaem: com o lápis, desenha e redimensiona objetos na borracha. Com o modelo pronto, inicia o trabalho pesado: faz o corte com a resina, depois passa massa corrida para o

acabamento, lixa e, por fim, pinta cada peça. Com tudo pronto, o aposentado enche o carro e sai para vender. “Minhas peças vão para o Brasil inteiro”, afirma. Sua vontade é de sempre inovar. Casas de passarinho, diferentes enfeites para as paredes e até uma fonte especialmente para os gaúchos devem sair em breve. Segundo Manuel, a fonte ficará derrubando água o tempo todo dentro de uma cuia, simbolizando a tradição do gaúcho.

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ITAPOÁ | ASSOCIAÇÃO DE UCRANIANOS

Para não deixar a cultura morrer Augusta Gern

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cultura ucraniana está viva em Itapoá. Apesar de o município contar com descendentes das mais variadas nacionalidades, os ucranianos são os únicos que organizaram uma Associação para preservar e perpetuar sua cultura e costumes. No dia 9 de setembro completam dois anos dessa rica conquista, a qual reúne diferentes famílias mensalmente com o único objetivo de não deixar a tradição morrer. Conforme Ricardo Ribeiro Haponiuck, neto de ucraniano, a história de reunir os descendentes dessa nacionalidade é longa: “ainda recordo do meu pai comentando sobre o assunto”. Seu pai já faleceu há oito anos, mas a ideia seguiu em frente. Com o tempo, Ricardo começou a relembrar a conversa com Antônio Zakaluk, também neto de ucranianos, e receberam uma ajuda quase que divina. “O Padre Josafat Gaudeda foi o grande catalisador desse

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processo, quando ficou sabendo de nossa intenção ficou muito entusiasmado e deu o empurrão que precisávamos para sair apenas daquela intenção”, lembra Ricardo. Com o empurrãozinho, fizeram um apanhado geral dos possíveis descendentes de ucranianos na cidade através dos sobrenomes da lista telefônica. Segundo Antônio, ligaram para todos e convidaram as famílias para a primeira reunião. Ao todo foram catalogadas 120 pessoas, mas a associação conta apenas com 12 membros. Porém, a quantidade aqui já é grande, afinal, são pessoas que deixam suas atividades para se dedicar apenas à tradição de suas famílias. As reuniões da Associação acontecem em toda a primeira segunda-feira do mês, às 19h, na Pousada Zakaluk. Nesses encontros, temas históricos, culturais e até atualidades ucranianas entram na pauta. Para eles, os atuais conflitos do país com a Rússia, por exemplo, não ficaram presos apenas nos telejornais. Além da parte cultural, outra vertente muito tradicional dos

Antônio Zakaluk é um dos idealizadores da Associação. ucranianos é a religiosidade. Dessa forma, Ricardo explica que desde o princípio focaram a intenção de trazer missas típicas para a cidade, que acontecem até hoje no segundo domingo do mês, às 19 horas. A partir de outubro, as celebrações serão realizadas na igreja Nossa Senhora do Bom Parto. E a associação não para por aí. Conforme Ricardo, mais ideias buscam valorizar e divulgar a cultura, como desenvolver oficinas da língua e o artesanato e participar


das Festas das Nações com uma barraca com a culinária típica, por exemplo. São atividades e ideias como essas que serão brindadas no jantar de comemoração de dois anos da Associação, que ocorrerá no dia 7 de setembro, às 19h, na Pousada Zakaluk. Lembranças As reuniões também são bons momentos para se recordar das antigas tradições de família. Alguns ainda falam a língua, outros apenas entendem; alguns vivenciaram os costumes, outros apenas ouviram histórias de família, mas todos enchem os olhos ao remexer a memória. Antônio Zakaluk é visivelmente o mais entendido da tradição. Neto de ucranianos, nasceu em Prudentópolis em uma família muito tradicional: quando criança falava apenas ucraniano, o português aprendeu na escola. Hoje ele lê e entende 90% da língua, mas pratica com frequência. Antônio assina um jornal ucraniano e mostra uma das características marcantes do país: tem um alfabeto próprio. Entre símbolos e algumas letras, é difícil para leigos imaginarem as mensagens ali impressas. Alice Michlczyszyin Zakaluk,

esposa de Antônio, também é neta de ucranianos. Assim, o casal busca repassar a tradição à família e divulgar na cidade. Em sua pousada e restaurante, por exemplo, servem a culinária típica, marcada principalmente pelo pierogi. Outro casal descendente de ucranianos em Itapoá é Paulo e Romilda Gula. O pai de Paulo, por exemplo, chegou ao Brasil aos nove anos de idade e teve os costumes

repassados na família. Já Romilda estudou durante seis anos em uma escola de freiras típica da tradição. Para Saul e Marilene Marco, também descendentes e casados, a tradição ficou apenas na infância. Saul acompanhou a cultura até a primeira comunhão, perdeu com o tempo, mas ainda consegue acompanhar toda a missa típica. Já Marilene nunca conseguiu conversar na língua ucraniana, apenas via os avós que vieram do país.

Para Eugênia Adamiyk, a tradição sempre foi forte nas festividades de família. Apesar de falar poucas palavras, ainda lembra como pintar os famosos ovos de páscoa, chamados de pêssanka. Assim, entre uma lembrança e outra, os descendentes recordam tradiçõesa como se jogar trigo em frente as casas no Ano Novo para desejar fartura ou os três dias de festa que acompanhavam as comemorações do Natal e Páscoa.

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POR AÍ | UCRÂNIA

Conhecendo de perto a cultura dos ancestrais

Augusta Gern “Impressionante imaginar como a cultura pode atravessar um oceano, superar significativos milhares de quilômetros e ainda permanecer intacta”. Com esta afirmação não é difícil imaginar como foi a viagem de Ricardo Ribeiro Haponiuk à Ucrânia. Neto de ucraniano e apaixonado pelas tradições, ele visitou o país em janeiro e conseguiu compreender toda a devoção de seu avô pela cultura, mesmo quando estava aqui no Brasil. A viagem surgiu de forma inusitada. Oceanógrafo, arqueólogo subaquático e mestrando em planejamento do espaço marinho, Ricardo está há algum tempo na Europa estudando e lá teve a sorte de ter um colega de classe ucraniano. “Naturalmente ficamos bem próximos. Trocamos muitas experiências e sempre comentei com ele sobre o meu sonho de conhecer o país, já que não tive a oportunidade de ir com o meu pai em 2004”, conta. Assim, o convite de visitar o

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país de origem da família logo surgiu, durante as férias escolares. Com isso, Ricardo até conseguiu pegar o Natal ucraniano, que é realizado no dia 7 de janeiro. “Existe essa diferença nas datas, pois a maior parte da Ucrânia, que é oficialmente ortodoxa, ainda segue o calendário juliano, de Júlio César”,

explica. O período no país foi curto, apenas nove dias, mas deu para sentir o grande frio do pico do inverno. Ricardo conta que ficou hospedado em Kiev, capital do país, na casa de seu amigo, uma genuína família ucraniana, seguidora das mais típicas tradições. “Uma das

coisas mais legais que aconteceu foi eu acompanhar o meu colega com seus amigos numa tradicional serenata”, fala. Conforme o oceanógrafo, nesta serenata eles percorreram a vizinhança para tocar e cantar músicas natalinas para os vizinhos. “As pessoas os recebiam com muita honra e ao final do espetáculo, eles sempre recebiam uns mimos dos vizinhos. Muito linda a interação”. Apesar de não ser a melhor época do ano para visitar o país, pois lá o frio é um fator muito limitante, Ricardo visitou vários pontos turísticos da cidade. Conforme ele, Kiev é uma cidade conhecida pela sua arquitetura monumental, uma mistura de edificações milenares com obras contemporâneas. “As igrejas ortodoxas são um ‘q’ a parte, belíssimas e aos montes”, conta. Na região sul há o Mar Negro com locais paradisíacos e, no oeste serras alucinantes na divisa com a Polônia, segundo ele. O que mais chamou a sua atenção, pelo esplendor e história associada, foi o Monastério “Pecherska Lavra”. Segundo Ricardo,


este é o monastério mais antigo do país, com quase 1000 anos de existência e um dos lugares santos da religião ortodoxa oriental. Em 1990 foi declarado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, junto com a Catedral de Santa Sofia, que também visitou. Além disso, este monastério também foi eleito uma das Sete Maravilhas da Ucrânia. Outro ponto marcante foi a Praça da Independência: “o principal

cartão postal de Kiev e palco de um cenário que eu não gostaria de ter visto”. Em decorrência aos conflitos civis entre a Ucrânia e a Rússia, no início do ano esta praça ganhou uma base de resistência que se opunha ao então governo do presidente Viktor Yanukovich. Para Ricardo, aquilo foi um verdadeiro cenário de guerra. “Confesso que senti um mix de medo e surpresa em ver tudo aquilo, principalmente ao avistar o semblante dos revolucionários com muita dor e cansaço pelo longo tempo que já lutavam e pelas condições do local

em que se encontravam”, lembra. Sem dúvida, esta foi uma experiência muito forte: poder enxergar a determinação e esperança em um povo já esgotado. Porém, mais do que conhecer o país dos ancestrais, a viagem também possibilitou avanços em uma pesquisa pessoal de Ricardo. Há algum tempo o oceanógrafo está trabalhando na árvore genealógica da família e tenta encontrar mais informações sobre os antigos parentes. Apesar de não conseguir muitos resultados, pelo frio e falta de tempo, conseguiu fazer alguns contatos que continuam o ajudando na busca de informações e vestígios.

Conforme documentos antigos, Ricardo acredita que seu avô é originário do oeste da Ucrânia e, assim, espera voltar em breve ao país, com tempo e no verão. “Quero conhecer mais lugares e, logicamente, circular pela região oeste vasculhando, principalmente, igrejas e cemitérios que, apesar de mórbidos, são excelentes fontes de informação”, afirma.

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TURISMO | ITAPOÁ COMUNIDADE SAÍ GUAÇU

A Itapoá do outro lado do rio Augusta Gern Um pedacinho de Itapoá perdido entre as duas cidades vizinhas. É assim que podemos definir a comunidade rural Saí Guaçu, mais conhecida como “do outro lado do rio”. Mesmo centenária e guardando uma bela fatia da história da cidade, esta comunidade é pouco conhecida pelos moradores do município itapoaense. Para se chegar até lá é preciso atravessar as fronteiras da cidade: pegar a estrada Cornelsen, atravessar o Posto da Polícia Rodoviária Estadual e, sentido Guaratuba à Garuva, andar cerca de 4,5 kms pela rodovia SC 412. Do lado esquerdo da via, uma tímida e não sinalizada entrada indica para uma estrada de chão; são mais 2 kms até chegar ao destino. A recepção logo mostra suas belezas naturais. Para entrar na comunidade é preciso atravessar o rio Saí Guaçu, que divide os es-

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tados catarinense e paranaese, as cidades de Itapoá e Guaratuba. Depois da ponte, são poucas as construções: a igreja centenária Sagrado Coração de Jesus, o galpão da igreja, o cemitério, uma casa e uma chácara aos fundos.

Hoje apenas essas cinco construções preenchem o espaço que há alguns anos contava com 33 famílias moradoras. Natural da comunidade, Izabel Maciel dos Santos, 76 anos, é a única que ainda permanece no local. Apesar de não morar mais no Saí Guaçu, é responsável pela igreja e passa a semana cuidando do espaço junto com o marido Vicente dos Santos, 77 anos. Conforme ela, a comunidade foi fundada por portugueses, que chegaram ao local há mais de 150 anos. “As famílias vieram todas juntas e desembarcaram no rio Palmital”, conta Izabel, neta de portugueses. Ali sempre viveram da pesca e mandioca: “Tínhamos 16 engenhos de farinha aqui na comunidade”, afirma. Hoje, não há nem vestígio de construções. Da mesma forma não há vestígios de todas as casas lembradas por Izabel, apenas o cemitério registra todas as

famílias que já passaram por ali. “Com o tempo as novas gerações foram escolhendo outros lugares para morar, com mais infraestrutura”, afirma. A energia elétrica, por exemplo, chegou ao local há apenas dois anos. E com toda essa falta de estrutura, a comunidade ficou abandonada por 36 anos. Só ganhou vida novamente há 20 anos, quando Izabel e o marido resolveram cuidar do espaço em função da igreja. “Tudo que faço é por Deus e por esse paraíso, amo este lugar”, afirma Izabel. O principal passo para dar vida à comunidade foi recomeçar a tradicional e centenária festa do padroeiro, realizada em todo o primeiro domingo de junho. Izabel conta que a festa já ultrapassa os 150 anos e só não aconteceu durante os 36 anos que a comunidade ficou abandonada, fora isso, é uma data sagrada e reúne cente-


Içá-Mirim, primeiro turista brasileiro... de Itapoá ou São Francisco?

nas de pessoas. “Neste ano a festa estava muito cheia, muito bonita”, conta. Tainha recheada, galinha assada, churrasco e muita cuca foram o chamariz do evento. A festa é a data onde mais reúne pessoas na comunidade, fora isso são alguns visitantes esporádicos ao cemitério ou alguns turistas que procuram o refúgio para encher o balde com peixes do rio Saí Guaçu. Conforme Izabel, a falta de interesse, recursos e conhecimento da região a fazem uma comunidade muito pacata, mas há muito para se encantar por lá, como ela chama de “seu paraíso”.

Registra-se que até 1963 São Francisco do Sul, Garuva e Itapoá formavam um só bloco territorial e político. Geologicamente os moradores dessas localidades habitam um espaço físico diferenciado, ou seja, o micro continente Itapoá – São Francisco. Essa junção político- administrativa perdurou até 1963 quando Garuva foi desmembrada de São Francisco, levando consigo Itapoá. Mais tarde, no ano de 1989, também Itapoá tornou-se município ao separar-se de Garuva. Ao comentar a criação dos dois novos municípios o ex-prefeito de Garuva, João Romão, classificou Garuva, no grau de parentesco, como filho de São Francisco do Sul e Itapoá seu neto. Entende-se que até ganharem autonomia todos os fatos ocorridos nas três localidades eram tidos como eventos do município de São Francisco do Sul, em cujo território encontra-se a quarta cidade mais antiga do Brasil, com sua arquitetura cuidadosamente preservada. Conta-nos a história, conforme relato extraído das notas sobre a Baía da Babitonga de autoria de Mario Bernstorff que uma expedição francesa comandada por Binot Palmier de Goneville com seu veleiro L’Espoir visitou em 1504, provavelmente pelas descrições da viagem, as terras da Ilha de São Francisco do Sul, as quais incorporavam também Garuva e Itapoá. Binot fez boas relações com os nativos, os índios Carijós, a ponto de conseguir levar para a França o

filho do cacique, Arosca, de nome Içá-Mirim (Formiga Pequena), ainda garoto, com a promessa de instruí-lo no manejo das armas de fogo, pelas quais os índios estavam maravilhados e com o compromisso de trazê-lo de volta após 20 luas, isto é, um mês. Os Carijós foram muito amáveis e hospitaleiros com os franceses abastecendo-os com víveres frescos da terra. Goneville, após três meses de permanência, retornou levando também um velho guerreiro de confiança de Arosca para a guarda de Içá-Mirim. Esse índio, chamado Namoa, por ter idade avançada, não resistiu à viagem, vindo a falecer em alto mar. Binot Pnalmier de Goneville não mais voltou, tendo porém dado a Essomeric (corruptela francesa de Içá-Mirim) o seu nome e a sua honra, educando-o com o melhor em França e casando-se mais tarde com Suzanne, uma sua sobrinha. Talvez tenha sido Içá-Mirim o primeiro brasileiro a ir para a Europa. Ressalta-se que a hospitalidade dos carijós, antigos habitantes desta região, deixaram vibrações positivas, as quais refletem-se com grande intensidade na índole humilde, bondosa e amiga do povo “carijuano” destas plagas. Vitorino Paese é professor, economista e historiador. Lançou em 2012 o livro Memórias Históricas de Itapoá e Garuva.

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MÚSICA | LUCIANO E RENATO

De diferentes ritmos ao sertanejo Augusta Gern

E

les já passaram por diferentes ritmos, mas há dois anos embalam as noites de Guaratuba com o tão badalado sertanejo. Luciano G. Da Silva e Renato Prigoli, mais conhecidos como a dupla Luciano e Renato, são amigos de longa data, filhos da terra guaratubense e ícones da música local. Pela cidade estão nos cartazes das maiorias festas e para quem se pergunta, casa cheia é com eles mesmo. O companheirismo junto com a música iniciou há mais de 15 anos, quando participavam de uma banda de pagode. Do gingado e suingue desse ritmo, passaram para o pop rock, depois ficaram um tempo separados até surgir a ideia de montar uma dupla sertaneja. Mas a experiência musical já os acompanha desde a infância. O cantor Luciano iniciou seu talento na igreja, incentivado pela mãe que também cantava. Da igreja passou para festivais musicais locais e regionais. “No início não ganhava nada, até que um dia decidi perder uma prova na escola e tentar pela última vez, foi então que comecei a ganhar”, lembra. Segundo ele, já participou e ganhou muitos festivais, até que vetaram a sua participação para outros concorrentes também terem a chance de levar

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a premiação. Ele afirma que já cantou de tudo: depois da banda de pop rock cantou um tempo em uma banda show até seguir para o sertanejo. Renato, hoje responsável pelo violão e segunda voz, também tem uma história antiga com a música. Tudo começou aos 14 anos na bateria, inspirado pelo pai que tocava instrumentos. Durante boa parte de sua carreira se dedicou ao rock, mas passou pelo pagode, pop e hoje optou pelo sertanejo. “Hoje o auge é mesmo o sertanejo, então nos adequamos ao gosto do público”, afirma. Porém não é apenas o gosto do público, a dupla também é movida por referências como Chitãozinho e Chororó e outras duplas conhe-

cidas pelo sertanejo mais tradicional. Mas o show vai além da dupla: logo que começaram a definir o repertório já contavam com uma banda, que os acompanha até hoje nas apresentações. “Não existia nenhuma banda aqui na cidade, então nunca pensamos que iria dar tão certo”, afirma Luciano. Renato explica que nada resolvem sozinhos, tudo tem a participação da banda, uma família de amigos. E junto com esta família é que aprendem a cada erro e apresentação. Os dois nunca fizeram aula, e a cada dia buscam lapidar o talento. Nos shows fazem diferentes blocos de música: desde as mais badaladas, mais tradicionais até músicas próprias. A dupla já tem duas músicas gravadas e até o fi-

nal desse ano pretendem ter um material próprio para divulgação. “O pessoal já conhece as nossas músicas e até pedem nas apresentações, é muito gratificante”, conta Luciano. Assim, numa mistura de diferentes músicas e referências, mas com talento próprio, a dupla contagia as noites da cidade. Durante três sextas-feiras do mês tocam no Porto Iguana, dois sábados por mês marcam presença na Casa Rosada e um sábado tocam na Praia de Leste. Durante o verão já abriram alguns shows nacionais no Café Curação e há três anos tocam na Festa do Divino. A meta agora é começar a fazer shows também em outras cidades da região.


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EMPREENDEDOR | ITAPOÁ

Estética: um trabalho que vai muito além da beleza Augusta Gern Cada vez mais as pessoas estão preocupadas em se cuidar, em se sentir bem. Para isso, nada melhor do que ter um bom profissional, principalmente quando o assunto também é saúde. É assim, com responsabilidade e muito conhecimento na área que Luana Gnata Viana, dermaticista em Itapoá, trabalha. Conforme pesquisas divulgadas, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking mundial da indústria da beleza, atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão. Durante os anos de 2007 e 2012, por exemplo, houve um crescimento de 87% do faturamento no setor. Resultados como esses só confirmam o aumento na preocupação com os cuidados com o corpo, rosto e cabelo, ou melhor, com a beleza e o bem-estar. Porém, Luana afirma que estética é mais do que isso: está muito ligada à saúde da pele e trabalha de forma multidisciplinar. É um complemento de coisas como exercício físico, alimentação e medicina. Assim, além de fazer tratamentos, a dermaticista também se preocupa em tornar as pessoas mais conscientes no uso de cosméticos e na união de práticas saudáveis no dia a dia. “Aqui não vendemos milagre e sou muito sincera ao dizer que não se pode depender apenas da estética”, fala. Conforme ela, para um tratamento

Luana Gnata Viana, dermaticista em Itapoá. estético eficaz é preciso aliar à boa alimentação e prática de atividades físicas. Mas independente da consciência do paciente, resultado a estética sempre oferece. Luana explica que para cada intenção existe um tratamento específico e por isso é muito importante uma avaliação corporal no início do tratamento. “Muitas vezes as pessoas chegam pedindo um determinado tratamento, mas outro é muito mais eficaz para o que ela deseja”, explica. Luana trabalha com estética há seis anos e há quatro anos atua em uma clínica, no início os atendimentos eram feitos em casa. De

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Curitiba, chegou à cidade cheia de ideias e inovações, e as mantém até hoje. O carro chefe sempre foi a limpeza de pele, mas são muitos os tratamentos que oferece: peelings químicos para o tratamento de manchas e rejuvenescimento, rejuvenescimento cutâneo para o estímulo de colágeno e amenização de rugas, redução de medidas e tratamento para gordura localizada, drenagem linfática, depilação a laser, entre outros. Conforme Luana, para uma pele saudável, é importante fazer limpeza de pele todos os meses e, principalmente no período pré e pós-verão, fazer boas hidratações.

Em relação à depilação a laser, pode ser feita em qualquer pessoa, mas quanto mais escuro e grosso for o pelo, melhor. Este tratamento só é oferecido durante alguns meses do ano e muito recomendável para quem tem problemas com a cera. Algumas novidades em sua clínica são o tratamento com Luz Pulsada Starlux, que auxilia bastante no tratamento de manchas e acne, com um resultado mais imediato, visível logo nas primeiras sessões; e o Kavix, excelente para redução das indesejáveis gordurinhas localizadas. Uma boa recomendação são as terapias combinadas. “Se a pessoa quiser potencializar o efeito da luz pulsada, por exemplo, tem como fazer também um tratamento com peelings químicos ao mesmo tempo”. Além disso, diferentes tratamentos para rejuvenescimento ou celulite também podem ser aliados, acelerando os resultados. Junto a todos esses serviços, mais inovações devem chegar à cidade nos próximos meses e boas ideias é o que não faltam. Luana conta que um de seus grandes desejos é abrir um SPA cidade, unindo diferentes tratamentos e cuidados em um só lugar.


Nascimento de Luís Ghedin Sperandio.

Inácio e Edinéia.

Nicóli Voltolini. Vinycius e Luysa, filhos de Cris Halaiko.

Aniversário surpresa para Nice.

Carol e Jean à espera de Juju.

Daniela, 4 meses.

Marina, filha de Vanessa e Jerry Sperandio.

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Aguida Carvalho Luz, formada pela UTFPR em 1992 hoje é uma das mais conceituadas profissionais do ramo imobiliário da região. Com olhos voltados para o futuro arquitetônico de nossa cidade, tem buscado no mundo moderno, novas técnicas no universo da construção civil, com o objetivo de trazer para Itapoá tecnologias que visam o início e término de obra de forma satisfatória aos seus clientes. Num longo e descontraído bate-papo, colocamos sobre rascunhos e projetos a visão leiga sobre assunto buscando transparecer os grandes mitos de pequenas ou grandes obras. Em algumas questões fui franco como cliente de outro Engenheiro, e direto nas posições reais quais eu deveria ter consultado antes de iniciar meu projeto. Ponto de Vista – Algumas pessoas procuram um engenheiro ou engenheira para executar seu projeto levando breves rascunhos e rabiscos, claro que tornar esse sonho em realidade não é tão fácil assim. Onde você encontra as maiores barreiras entre a realidade estrutural e o sonho? Águida – Olha! Oque eu mais gosto dessa profissão é realmente transformar o sonho em realidade,

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Ponto de Vista – Onde começa a aparecer os problemas que causam transtorno a um construtor? Águida – Seria muito bom! Se todos os projetos fossem feitos por um profissional, elétrica, hidráulica... Pois, planejar é um fator que vai influenciar financeiramente na obra. Temos exemplo de clientes que gastam 30% a mais numa obra somente refazendo detalhes, tirando tomadas, encanamentos, cobrindo ou descobrindo e por ai vai...

mas essa realidade tem que estar baseada nos parâmetros técnicos que possibilitam desde a aprovação desse projeto até mesmo uma possível venda desse imóvel no futuro. Ponto de Vista – É importante fazer uma maquete? Para que os detalhes sejam vistos com antecedência antes do projeto final? Águida – Com certeza, a imagem 3D é primordial fazer o cliente ver parte do sonho dele em uma maquete para que não haja duvidas nesse sonho e que não venha trazer problema futuro.

Ponto de Vista – O Pedreiro é um grande parceiro do engenheiro? Ele pode ajudar nos detalhes ou na economia de materiais evitando um susto no final da obras? Águida – O profissional que vai executar a obra é a peça ”X”l, ele vai interpretar o projeto e fazer valer cada detalhe desenhado.Infelizmente encontramos proprietários insatisfeitos com esses, digamos “profissionais” alguns deles não sabem interpretar um projeto e claro, tudo esta relacionado ao custo/beneficio, e nem sempre o barato sinônimo de economia, e às vezes encontramos desses profissionais aparentemente caros, que provam a economia no fim da obra. Ponto de Vista – O Engenheiro ou Engenheira que assina o projeto é o responsável por ela, claro! Tem como economizar? Reduzir produtos? Pouco concreto, pouco ferro, cimento...? Águida – Economizar onde é possível economizar! O profissional também deve acompanhar a obra, eu por exemplo, eu não fico o tempo todo no local, mas acompanho os detalhes, e sempre procuro mostrar aos meus clientes onde é possível fazer economia, mas como eu já disse, o profissional que vai executar o projeto é a chave da economia.

Ponto de Vista – Vejo você conectada ao novo, sempre estudando e se atualizando. Um bom profissional esta sempre se atualizando? Águida – (risos) Não só eu! Todo profissional tem que estar atualizado, hoje tem muitas forma e ferramentas para executar um projeto, e temos que apresentar essas novidades para os clientes, um profissional desconectado gera dúvidas aos seus clientes pois o mundo exibe as novidades muito rápido, internet, televisão...A comunicação é imediata ou seja, nossos clientes sabem oque querem por isso precisam de um apoio sobre tudo que eles encontram nos canais de comunicação. Ponto de Vista – E o pré-moldado? Veio pra ficar? Águida – Sim, veio pra ficar, são técnicas aplicadas ha algum tempo no Brasil, mas ainda é pouco, tem muita maquina e equipamentos que estão chegando que estão revolucionando a construção civil com objetivo de acelerar o processo garantindo qualidade, economia e segurança. Ponto de Vista – Águida, vejo que as perguntas são muitas, ainda tenho minhas duvidas e meus leitores também. Eu vou ficar aqui mais um tempo, e nossos leitores que tiverem alguma dúvida podem procurar você? Águida – Sim sem duvida, sempre falo, não inicie uma construção sem antes tirar as duvidas e questionar muito. Estou sempre à disposição para poder sanar as duvidas dos meus clientes e amigos, nosso escritório está aberto para atender desde pequenas obras a grandes estruturas, estamos sobre loja da Caixa Econômica em Itapema do Norte e vamos estar sempre esperando os cliente. Esperamos estar sempre levando informações aos leitores Giro Pop, que essas seja forma clara e objetiva.




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