China, o guia dos emergentes

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ISSN 2179-1538

número 2 ano 2

gl cal Painel de Geopolítica, Meio Ambiente e Cultura

R$ 14,90

China, o guia dos emergentes Sozinho, o país tem usado sua economia para fortalecer a relação entre todos os demais membros do BRICS

Neo-golpismo em Honduras Um olhar para o novo modelo ditatorial que se instaurou em 2009 e pode afetar toda América Latina

O fenômeno Wikileaks

Política nos estádios

Entenda como a globalização tornou a espionagem virtual e em tempo real, e como isso influencia nossa vida

O futebol europeu é exemplo de como as torcidas organizadas podem defender não só seus times, mas também suas ideologias

Davi Aquino Leonardo Boff Helissa Grüdemann Roger Waters Iara Vicente Juliana de Araújo Mateus Prado Nara Carreira Tádzio Peters Coelho Marina Silva Érika Veloso Igor Barreto Rose Edison da Creatinina Ricardo Alvarez Diana Borges dos Santos Paulo Sobreira Felipe Brasil Luiz Gabriel Cotrim Larissa Arruda Renato Ramos Samantha Pinotti Nelson Bacic


Seu autêntico plano de estudos.

516s. pág

31

s fascículo

(11)

4513-8660

(11) 9 9423-1131

guiaenem.org.br

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Materiais didáticos


edit rial Prof. Fernando de Souza Coelho

Mateus Prado

Caro Leitor, Olá, amigos leitores da Revista Glocal. Nesta edição você poderá ter um maior panorama sobre um dos assuntos mais relevantes para a geopolítica internacional, principalmente nesse momento em que a crise dos países desenvolvidos tem permitido maior destaque aos países emergentes. No artigo “A bússola China: um pivô para a integração do BRICS”, de Érika Veloso, você poderá entender como os chineses, com sua forte e estável economia, tem sido o principal e elo entre os demais países do BRICS – Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul –, uma vez que esse grupo só tinha como real similaridade o fato de serem países emergentes. Com as relações comerciais com a China se estreitando, todos os demais países acabaram por se integrar mais intensamente, e graças a isso o BRICS se fortaleceu e tem se tornado, cada vez mais, um expoente. Questões políticas de destaque também são abordadas no artigo “Honduras é aqui, Honduras não aqui”, de Tádzio Peters Coelho, em que é relatado e analisado o processo em que Honduras, nosso vizinho latino-american, viu sua democracia ameaçada devido a um golpe constitucional. Em 28 de junho de 2009, Manuel Zelaya, então presidente do país, foi destituído de seu posto e enviado para a Costa Rica sob a acusação de que a nova Constituição que ele submeteria a aprovação pública estava garantindo a ele o privilégio de se reeleger – o que era uma falácia. Como nós podemos usar esse exemplo para proteger a nossa própria democracia? O artigo “Globalização de dados e o fenômeno Wikileaks” , de Igor Barreto Rose, que

explicará a você como a internet e o mundo globalizado se relaciona com o vazamento de dados sigilosos ocorrido por Julian Assange e o Wikileaks, além de explicitar que a espionagem feita no por meios virtuais pode ser muito mais arriscada para a segurança dos dados que nós divulgamos em nossas contas pessoais na internet. Política e futebol é debatido no debatido no artigo “Torcidas organizadas: (In)Consciência política em campo”, de Renato Ramos, em que se pode ver o quanto o futebol europeu está muito mais envolvido com debates políticos, com torcedores e jogadores brigando dentro e fora de campo não apenas por seus times, mas por suas ideologias, enquanto no Brasil as brigas entre torcidas se limitam a motivos banais. Outros tantos artigos poderão ser conferidos em nossas páginas, com autores de grande nome como Marina Silva, Leonardo Boff e Nelson Bacic. Além da Carta de Lyon do cantor Roger Waters (ex Pink Floyd) sobre a situação palestina. Desejamos uma boa leitura e esperamos que, nas próximas edições, a revista possa contar também com um texto seu. Quem quiser colaborar pode encontrar o edital, com os detalhes de como fazer e mandar um texto para a seleção, em nosso site (www.revistaglocal.org.br).

Dos editores, Prof. Fernando de Souza Coelho e Mateus Prado.

glocal

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sumário

por Davi Aquino

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Novas sacolas de supermercado: ecologicamente corretas? por Leonardo Boff

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Pessimismo capitalista e Darwinismo social

por Tádzio Peters Coelho

Expediente: Editores: Fernando Coelho e Mateus Prado Conselho Editoral: Renato Eliseu, Wagner Iglesias, Pedro Ivo Batista e Paulo de Tarso Gestora de Educação e Ensino: Ana Paula Dibbern Revisão: Patrícia Bernardes Estagiária - Gestão Pedagógica: Caroline Ramos Diretor de Arte: José Geraldo S. Junior Projeto Gráfico: Lucas Paiva Designer: Daniel Paiva

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Honduras é aqui, Honduras não é aqui


por Érika Veloso

10 Patrimônio cultural imaterial: para saber mais Por Helissa Renata Gründemann

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12 A bússola China: um pivô para a integração do BRICS por Igor Barreto Rose

Rio de Janeiro Wednesday 28th March 2012 por Roger Water

18 A importância do Modernismo por Nara Lasevicius Carreira

22 Atrás de uma borboleta azul por Marina Silva

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32

Globalizacão de dados e fenômeno Wikileaks

Um novo eixo de poder do mundo? por Ricardo Alvarez

42 por Renato Ramos

Índice de desenvolvimento humano por Larissa Rodrigues Vacari de Arruda

44

40

A matemática do futebol

Torcidas organizadas: (In)Consciência política em campo

Por Luiz Gabriel Fernandes Cotrim

48 Matrizes energéticas: uma visão panorâmica Por Nelson Bacic


Escreva o mundo de hoje. Envie seu artigo e colabore para o debate da sociedade sobre os temas do momento.

Pensamentos globais, acões locais A Revista Glocal - Painel de Geopolítica, Meio Ambiente, Cultura e Matemática Cotidiana é uma publicação de atualidades do Instituto Henfil Educação e Sustentabilidade, que tem como objetivo divulgar informações qualificadas sobre arte, cultura, política nacional e internacional, meio-ambiente, geopolítica, economia, questões sociais, ciência e matemática. O formato colaborativo abre espaço em suas páginas para que estudantes de graduação e pós-graduação, pesquisadores, professores e especialistas em diversas áreas publiquem seus artigos em português, inglês ou espanhol.


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Painel de Geopolítica, Meio Ambiente, Cultura e Matemática Cotidiana


natureza 06

Novas sacolas de supermercado: ecologicamente corretas?


Os benefícios das sacolas feitas com plástico oxibiodegradável são contestáveis e a melhor solução é a redução do consumo das famosas sacolinhas de supermercado

S

omos a cada dia alvos de uma grande quantidade de informações acerca do meio ambiente e dos cuidados que devemos ter para com ele. Atualmente, um dos maiores vilões ambientais são as sacolas plásticas utilizadas em supermercados. Para este vilão, já foram propostos alguns heróis, sendo um deles (talvez o principal) as sacolas feitas com plástico oxibiodegradável, também chamadas de sacolas ecologicamente corretas, com um apelativo marketing ambiental. Segundo seus fabricantes, estas sacolas são degradadas em até 18 meses em condições ótimas de calor e umidade, enquanto as sacolas convencionais têm sua degradação estimada em 400 anos. Você poderia então concluir que, se estas sacolas são chamadas de ecologicamente corretas e demoram menos tempo para se degradar, são uma excelente opção. Porém, a conclusão desse problema não é assim tão simples e depende ainda de muitas discussões e pesquisas pautadas na ética ambiental, e não apenas em interesses comerciais de expansão das vendas de novos produtos. Para começo de conversa, vale ressaltar que este tempo de degradação (18 meses) é obtido em condições ótimas, não sendo frequente que elas aconteçam em ambientes naturais. Porém, o cerne da questão é a contestável degradabilidade deste material. Vamos exemplificar e comparar para melhor entendermos: você joga no solo uma casca de banana e nota que depois de três meses (tempo médio de decomposição de cascas de frutas) ela se degradou por completo. Isto ocorre porque reações bioquímicas transformam a matéria da casca de banana em produtos como água e gás carbônico, além de disponibilizar matéria orgânica e nutrientes para serem consumidos por micro-organismos. Como se trata de um material orgânico, os produtos podem ser assimilados sem grandes problemas pelo ambiente. O plástico continua no ambiente – E com as sacolas oxibiodegradáveis? Será que as bactérias conseguem degradar os componentes, assim como o fazem com a casca da banana? A resposta é preocupante: este tipo de plástico é “esfarelado” por reações químicas por intermédio principalmente de fatores físicos, não sendo seus produtos assimilados em sua totalidade pelos micro-organismos.

Isto é, o plástico continua no ambiente, porém de uma forma bastante fragmentada. Se compararmos ainda com o impacto ambiental das sacolas de plástico convencionais, teremos outro problema: o tipo de poluição causada, uma vez que com o esfarelamento do plástico oxibiodegradável a poluição passa a ser difusa, ou seja, não concentrada num determinado local e, além disso, não visível. Note: você consegue observar um plástico convencional anos depois de ele ter sido disposto no solo. Porém, em se tratando dos oxibiodegradáveis, depois de seu relativo curto tempo de degradação ele não mais fica visível, mas seus componentes ainda continuam no solo (lembre-se de que plástico não é consumido por bactérias nem assimilado pelo ambiente). Resumidamente, os impactos ambientais das novas sacolas podem ser maiores do que os impactos das convencionais, em caso de inadequada disposição final destes resíduos, o que ocorre frequentemente no Brasil. Conscientização ambiental é a solução. Diante deste fato, precisamos ponderar acerca do uso das sacolinhas de supermercado. É sabido que a utilização de materiais descartáveis ou de curto tempo de vida útil é extremamente danosa ao meio ambiente. Mas o que devemos fazer se estas sacolas oxibiodegradáveis parecem ser uma opção ruim? A melhor resposta é velha conhecida nossa, porém ainda pouco praticada: diminuir o consumo. Isto é possível transportando nossas compras em bolsas ou sacolas reutilizáveis (chamadas atualmente de ecobags) ou até mesmo levando de casa a nossa própria sacola plástica, seja ela oxibiodegradável ou não. Urge evitar pensar que, utilizando as novas sacolas, os problemas ambientais do uso deste tipo de material já estariam sanados. Como bem sabemos, a solução é a conscientização ambiental de cada um de nós, gerando menos impactos ambientais pela redução do consumo e não pela substituição do tipo de resíduo gerado.

A substituição de materiais fabricados em plástico (sacolas de supermercado, copos descartáveis, etc) por outros reutilizáveis é uma prática que, além de diminuir a contaminação do ambiente, é uma atitude sustentável e ética.

400 anos é o tempo de degradação das sacolas convencionais na natureza.

Davi Aquino Engenheiro Ambiental pela Universidade Federal de Viçosa e mestrando em Saneamento Ambiental pela mesma Instituição.

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Patrimônio Cultural Imaterial: para saber mais Uma breve explicação sobre o conceito, trajetória e exemplos de registros de Patrimônio Imaterial no Brasil

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O

conceito de Patrimônio Imaterial ainda é um conceito recente. É considerado Patrimônio Cultural Imaterial as formas de expressão, modos de fazer, lugares sagrados, rituais e festas, entre outros, que façam parte da cultura e representem a identidade de certo grupo social. São aspectos que passam de geração em geração através da oralidade, preservando a cultura e a história de um povo. É diferente do Patrimônio Material, pois leva em consideração aspectos da cultura que não são visíveis no sentido material, como seria um edifício, mas que são de grande importância no nosso dia-a-dia, pois faz parte da nossa cultura, nosso modo de enxergar e interagir com mundo. Podemos então nos perguntar: de onde surgiu esse conceito? Quando foi implantado no Brasil? O nosso país é pioneiro quando tratamos desse assunto. Ele começou a ser discutido na década de 1920, com as preocupações expressas pelo Modernismo, exemplificadas na proposta de implantação de políticas de preservação do patrimônio cultural brasileiro por Mário de Andrade em 1936, que já incluía aspectos próximos do conceito de Patrimônio Imaterial. O resultado foi a criação do SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em 1937, que, entretanto, dava prioridade ao aspecto material do nosso Patrimônio. Em 1970, este é transformado em IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico), órgão que atualmente preza pelo Patrimônio Cultural do Brasil. Assim, o conceito de Patrimônio Cultural foi pensado e reelaborado ao longo dos anos e finalmente definido de forma ampla no art. 216 da Constituição Federal de 1988, já contendo o conceito de Patrimônio Imaterial. Porém, foi apenas com o Decreto 3.551 de 2000 que os bens imateriais considerados patrimônio passaram a ser beneficiados com políticas públicas que garantem sua salvaguarda. Em escala mundial, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a educação, ciência e cultura) desde o fim da Segunda Guerra Mundial discute a necessidade de preservação da diversidade cultural; mas foi em 2003 que organizou uma Convenção para a salvaguarda do patrimônio cultural imaterial em Paris, incentivando seus países membros na criação de políticas públicas que salvaguardem seus Patrimônios Imateriais. Mas, afinal, para que serve o reconhecimento de um bem como Patrimônio Cultural Imaterial do Bra-

sil? Tendo em vista os processos de globalização e desigualdade econômica que vivenciamos, assim como o crescente número de formas de intolerância e preconceito, percebe-se que essas formas de expressão, modos de fazer e referências identitárias das comunidades estão em vias de extinção. Assim, este reconhecimento é de muita importância, pois protege e incentiva a permanência destes aspectos que fazem parte das nossas vidas, promovendo a inclusão social e a melhoria das condições de vida dos detentores destes saberes. Com o registro no IPHAN, o Patrimônio Imaterial é salvaguardado, ou seja, passa a ser responsabilidade do órgão e de toda nação, assim, temos que zelar por este patrimônio, promovendo seu desenvolvimento, incentivando a pesquisa e também sendo responsável pela ampla divulgação deste bem. Sabendo disto, podemos melhor compreender os aspectos culturais brasileiros já registrados como Patrimônio Imaterial (até agora são 22). Alguns exemplos são: • Círio de Nossa Senhora de Nazaré – festa religiosa que ocorre há mais de 200 anos no Pará; • Samba de Roda do Recôncavo Baiano – que identifica e salvaguarda a música, dança, poesia e festa que fazem parte do Samba de Roda na Bahia; • Modo artesanal de fazer Queijo de Minas – modo de fazer que é parte de uma agricultura familiar e existe há mais de 200 anos; • Cachoeira de Iauaretê – lugar sagrado dos povos indígenas dos Rios Uaupés e Papuri na Amazônia.

Integração econômica, social, cultural e política entre os países, impulsionada pela dinâmica do capitalismo, sempre em busca de expandir o mercado consumidor dos bens de produção dos países considerados “desenvolvidos”.

90% da cultura humana, ou seja, dos produtos das interações humanas, é a porcentagem que deve ser abrangida pelo o que chamamos de cultura imaterial.

Percebe-se que o que chamamos de cultura imaterial deve abranger mais de 90% da cultura humana, ou seja, dos produtos das interações humanas, também permeando a cultura material. Assim, salvaguardar o Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil é proteger e valorizar nossa cultura, aquilo que aprendemos com nossos pais, avós e bisavós e que faz com que o Brasil seja um país tão rico e único, e que também define nossa identidade.

Helissa Renata Gründemann Bolsista de extensão e aluna do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande – RS

O processo de registro de um bem imaterial acontece através de uma metodologia chamada de “Inventário”. Ao desenvolver um inventário de um bem cultural, o IPHAN identifica e registra as características deste bem, utilizando-se de entrevistas, fotografias, vídeos, ou qualquer outra forma que ajude a melhor compreender e registrar o bem a ser inventariado.

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A poesia

marginal A poesia ganha mais leveza com sua linguagem mais coloquial e engajada 16


A

poesia marginal, fruto do ambiente de medo e vazio que o sufoco da censura e da repressão militar promovia, pode ser definida como um acontecimento cultural que teve um significativo impacto, conseguindo reunir, ao redor da poesia, jovens antes mais ligados a outros circuitos artísticos. Os primeiros sinais desta poesia surgiram com os folhetos mimeografados Travessa Bertalha, de Charles, e Muito prazer, de Chacal, ambos de 1971. O termo marginal é ambíguo desde o início. Marginais da vida política do Brasil, marginais do mercado editorial, e, sobretudo, do cânone literário. Na literatura, livrinhos mimeografados começam a surgir, enfatizando o caráter artesanal de suas experiências e subvertendo as bases da produção cultural em voga. Vai se criando uma espécie de circuito semimarginal de edição e distribuição, resposta política ao conjunto de adversidades reinantes, marcando um compromisso de viver poeticamente, o que resulta numa série de publicações desafiadoras naquele momento histórico. Os jovens poetas estavam determinados a não deixar o silêncio se instalar, defendiam uma poesia com nítidos traços antiliterários que se chocava com as experimentações eruditas das vanguardas. Os livros começam a se multiplicar. São os próprios escritores que acompanham de perto sua montagem, vão às gráficas, assistem à impressão e, por fim, vendem-nos de porta em porta, estabelecendo-se uma relação íntima, afetiva com o leitor, uma relação que abarca a própria linguagem da poesia. A literatura cria um novo circuito e um novo público leitor. A poesia ganha mais leveza com sua linguagem, a princípio, mais coloquial e engajada, que fala da experiência comum, com um perfil despretensioso e aparentemente superficial, mas que colocava em pauta o ethos de uma geração traumatizada pelo cerceamento de suas possibilidades de expressão. Tudo isso encurta a distância entre escritor e leitor, que não precisa mais ser um entendido de poesia para apreender seu significado. O poema apresenta uma dicção coloquial – processo que vinha desde Mário de Andrade –, em um registro cotidiano quase em estado bruto. Literatura e vida se casam e originam os famosos poemas marginais. Como bem dizia Cacaso: “A vida não está aí para ser escrita, mas a poesia sim está aí para ser vivida...”. Charles expressa no poema “Olha a passarinhada/ Onde?/ Passou.” poetização da experiência do

cotidiano. Viver poeticamente. Surge uma nova forma de representar o mundo, diferente da intelectualista defendida pelas universidades. As mudanças agora se dão não com o intuito de tomar o poder, mas de questioná-lo. Através da leitura poetizada da vida cotidiana, o poeta reforça o caráter transitório do dia-a-dia, ressaltando sua momentaneidade. Encontramos nestes poemas uma pressa de viver, viver a mil, viver tudo – “A verdade é que vivo a mil/ sonhando a morte em azul anil” (Isabel Câmara). Uma poesia conquistadora, que buscava emoções, que vivia “tranquilamente todas as horas do fim” (Cogito de Torquato Neto). O cotidiano passa a ser a musa inspiradora dos poetas, transformando-se ele mesmo em matéria bruta da poesia. A geração mimeógrafo jogou para o ar os padrões estéticos estabelecidos, ela era, sobretudo, contra: contra as portas fechadas da ditadura, contra o discurso organizado, contra os formalismos da língua, contra a poesia tradicional. Na medida em que os poetas marginais constroem um antagonismo total em relação aos recursos poéticos tradicionais em voga e questionam o conceito de poesia, eles procuraram se aproximar da comunicação visual, explorando a palavra em várias dimensões: verbal, visual e vocal. Esta atitude dos artistas, retomada dos primeiros modernistas, fez descer a poesia de seu pedestal, levando-a ao público, assim como foi em relação à música, com o surgimento dos Festivais da Canção e do Tropicalismo. A desierarquização da poesia restabelece o elo entre poesia e vida. Foram lançados folhetos mimeografados, livros artesanais, livros-envelopes, pôsteres, cartões-postais, varais de poesias, muros e paredes escritos em versos. Os poetas marginais rompem fronteiras entre o que é mau e bom gosto, o que é erudito e popular, nacional e estrangeiro. Eles estavam em busca, em plena ditadura, de uma vida recheada de emoções, aventuras, conquistando corações e mentes por onde passavam, causando muito burburinho, como o que é novo provoca.

1971

é o marco de início das primeiras publicações de poesia marginal no Brasil

Juliana Carvalho de Araújo Mestranda em Literatura Brasileira na Universidade Estadual do Rio de Janeiro

Em meados dos anos 70, os filósofos franceses Félix Guattari e Gilles Deleuze mencionavam a literatura marginal também na Europa. Defendiam-na como uma alternativa à grande literatura (ou estabelecida). Para eles, a produção literária por minorias, a política e a desterritorialização do idioma num mesmo âmbito é capaz de criar uma “máquina de expressão coletiva”

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A matemática da

Audiência Você sabe o que é, e o que significa, em números, cada ponto no IBOPE?

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iariamente nos mais variados veículos de comunicação, somos informados sobre quantos pontos no IBOPE determinados programas televisivos alcançaram. Subidas e quedas no IBOPE estampam notícias na mídia e têm o poder de aumentar ou diminuir o valor do “aluguel” dos espaços de intervalos para veiculação de propagandas publicitárias: tudo depende de quantas pessoas estão assistindo a um determinado programa, num determinado horário e local. Desde 1942, quando foi realizada a primeira pesquisa de audiência, o “IBOPE” se transformou em diversos significados no vocabulário popular e, de um instituto de pesquisa, passou a designar um sinônimo para se referir à “audiência”, “atenção” ou “popularidade”. Não é incomum ouvirmos a frase: “Está querendo IBOPE?” para dizer que alguém está querendo atenção ou “Seu IBOPE está alto” para se referir à alta popularidade. Mas você sabe o que é, e o que significa, em números, cada ponto no IBOPE? Sabe o que é um “share” e a diferença dele para o que pesquisa o IBOPE? Este pequeno artigo tem como objetivo demostrar, matematicamente, como os dados de “share” e do IBOPE são feitos e o que eles significam em números. Antes de comparar os resultados de seus dados, vamos trabalhar com cada um deles, individualmente. O “share” é um índice comparativo, que se baseia na relação de um indicador em uma situação específica com seu total. Mais especificamente, ele mostra a quantidade de televisores ligados, comparado ao total de televisores existentes e, a partir desse dado, mostra qual a porcentagem de audiência que cada dos canais disponíveis têm em um determinado momento do dia. Matematicamente, definir o “share” implica em trabalhar em algumas fases:

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1 - Em primeiro lugar temos que saber qual o total de televisores existentes em uma determinada região. Esse número equivale a 100%. 2 - O segundo passo é saber quantas televisões, dentro deste total de televisores existentes (100%) estão ligadas. Se soubermos que nosso Universo é de 1000 televisões, por exemplo, e que num determinado momento do dia e num lugar específico, 500 televisões estão ligadas, saberemos que o “share” de televisores ligados é de 50%, já que: 1000 televisores existentes = 100% 500 televisores ligados = x%.

1000x = 50000 x = 50%

Este dado é importante para saber, num primeiro momento, quantas televisões estão ligadas numa determinada hora do dia, independente de estarem ligadas ao canal A, B, C ou D. O dado mostrará somente o número da audiência total da mídia televisiva em geral. 3 - O terceiro passo é extremamente importante para aferir como estão divididos esses 500 televisores ligados entre os canais disponíveis. Vamos trabalhar com um cenário hipotético onde existam quatro canais possíveis: CANAL A – 270 TELEVISÕES LIGADAS CANAL C – 80 TELEVISÕES LIGADAS

CANAL B – 30 TELEVISÕES LIGADAS CANAL D – 120 TELEVISÕES LIGADAS

Neste cenário, as 500 televisões ligadas equivalem a 100%, já que não se mede audiência de televisões desligadas. Assim, cada canal tem seu número de audiência dividido pelo total de televisores ligados, mostrando que, nesta região e para o momento analisado, o CANAL A consegue um pico de 54% da audiência. Isso porque: 500 televisores ligados = 100% de audiência total 500x=27000 270 televisores CANAL A = x% de audiência do canal A x = 54% de audiência CANAL A

Analisando estes dados hipotéticos, o canal A conseguiria ter mais audiência que todos os outros canais juntos. Diferente do share que evidencia a relação do total de pessoas assistindo um canal com o total que estão com televisores ligados, existe outro dado resultante deste tipo de pesquisa de audiência. Ela leva em conta a proporção de pessoas assistindo a um programa em relação ao número de participantes de uma pesquisa específica, como faz o IBOPE. A primeira característica do IBOPE é a forma como constrói sua metodologia de pesquisa. O IBOPE é feito a partir de amostras que representem a população nacional, ou de algum município em específico. Em cada cidade onde é realizada a medição de audiência de TV, o IBOPE escolhe um conjunto de domicílios que representem, que tentem se aproximar ao máximo da população total, levando em consideração a representatividade das classes sociais, regiões mais populosas e outros dados fornecidos pelo IBGE. É através da análise desses dados que o IBOPE passou a utilizar como média geral o valor de 3,3 pessoas por televisores. Para alcançar 1,0 ponto no IBOPE, no caso de São Paulo, por exemplo, um determinado canal precisa estar sendo assistido em cerca de 60.000 domicílios. Note que se trata aqui de 60.000 televisões e não de 60.000 pessoas. Aplicando o valor médio de 3,3 pessoas por televisores, cada ponto no IBOPE de São Paulo significa atingir 198 mil telespectadores.

Trazendo esses mesmos dados para o nível nacional, 1,0 ponto no IBOPE é proporcional a cerca de 188.000 domicílios e, baseado na mesma regra de 3,3 pessoas por televisor, chegamos a um total de 620.400 telespectadores. Quando ouvimos que um determinado programa, ou final de novela alcançou média nacional de 54 pontos no IBOPE, estamos dizendo que aproximadamente 33.501.600 pessoas no Brasil inteiro estavam assistindo, num determinado momento, a esse programa. Assim, vimos que share e IBOPE avaliam a audiência com metodologias distintas e, portanto produzem dois indicadores diferentes entre si. Enquanto o share trabalha com relação entre televisores existentes e televisores ligados, para então dividir os televisores ligados entre os canais possíveis, o IBOPE trabalha com amostras estatísticas nas quais médias de números de pessoas por televisor e média de domicílios por ponto de IBOPE são elaborados para, então, fornecer dados de audiência.

198 mil telespectadores representam 1,0 ponto no IBOPE em São Paulo.

Felipe Brasil Bacharel em Gestão de Políticas Públicas pela EACH – USP e mestrando em Ciência Política pela UFSCar. Trabalha com elitismo, democracia e engenharia institucional.

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