Painel de Geopolítica, Meio Ambiente e Cultura
ISSN 2179-1538
número 2 maio/2011 ano 1
gl c cal
R$ 14,90
Década de ouro para a exportação brasileira Aziz Ab’Saber
Fomos a São Luiz do Paraitinga com o renomado geógrafo
A Democracia Corinthiana Futebol e Identidade Nacional
Mateus Lourenco Lucas Garcez Rosângela Fedoce Nara Cabral Renata Duarte Caio Penko Lucas Passos Henrique Cunha Verônica Ramos Rafael Mucinhato Vera Rodrigues Jorge Valdés Elizabeth Seno Mateus Prado Nelson Olic Luiza Erundina Lucas Menezes Leandro Marubayashi José Santos Felipe Andrade Paula Penko
edit rial Prof. Fernando de Souza Coelho
Mateus Prado
Caro Leitor, Chegamos ao segundo número da revista de atualidades GLOCAL, Painel de Geopolítica, Meio ambiente e Cultura . A revista do ano passado foi um sucesso e surpreendeu positivamente seu público, em especial os alunos do Cursinho Henfil. Seu projeto gráfico inovador, o fato de ser colaborativa, em consonância com uma sociedade que se organiza cada vez mais em redes, a alta qualidade dos textos e a forma com que eles integram questões globais e locais, reconhecendo sua interdependência, fez com que a GLOCAL recebesse elogios dos mais variados setores da Academia e da Sociedade Civil. Apesar desse reconhecimento, ainda não estávamos totalmente satisfeitos com a primeira edição e, por isto, adiamos o lançamento da segunda. No primeiro Editorial, já anunciávamos que a GLOCAL teria a missão de ser uma revista que representasse “uma abordagem que emerge na educação básica nacional e que, no futuro, tende a ser um dos princípios do nosso processo educacional”. Para tanto, e depois de ouvir muitas pessoas, chegamos à conclusão que para fazer uma revista que possibilitasse aos leitores ter um contato com os pilares da educação da ONU (aprender a aprender, a fazer, a ser e a conviver) teríamos que incluir, já nesta edição, e de forma mais clara, as quatro áreas da produção intelectual. Nossa primeira edição incluía apropriadamente as áreas de Ciências Humanas e Ciências da Natureza, mas ainda era tímida na área de Linguagens e Códigos e nula na área de Matemática e suas Tecnologias. Também percebemos que nossa rede colaborativa estava muito concentrada em São Paulo, em especial na Universidade de São Paulo, e que precisávamos ampliar a divulgação da GLOCAL para todo o país. Este número traz mudanças que atendem às necessidades percebidas pela nossa equipe editorial. O grupo de colaboradores foi composto por pessoas de todo Brasil e inclui até textos de brasileiros que hoje fazem sua carreira fora do país. A área de Linguagens ganhou mais importância. A partir desta edição,
a Revista terá ao menos um texto escrito em cada uma das duas principais línguas estrangeiras modernas ensinadas no Brasil (Inglês e Espanhol), pretendendo contribuir com o ensino de língua estrangeira de forma instrumental. A área de Matemática e suas Tecnologias continua sendo um grande desafio. Ainda são poucos os textos que, dentre as centenas que recebemos todos os meses, pertencem a essa área. Apesar disso, esta publicação traz quatro textos que são destinados ao desenvolvimento de competências matemáticas e nossa capa, que trata de questões ligadas ao comércio exterior brasileiro, é dedicada ao desenvolvimento das competências de análise e extrapolação de gráficos e tabelas. Além dessas mudanças, esta publicação também inaugura a campanha de assinatura da GLOCAL para escolas públicas e particulares. Dentro de nossa estratégia de divulgação está o envio de revistas para algumas das maiores escolas de Ensino Médio do país e a participação de feiras como a EDUCAR e a Bienal do Livro, que neste ano será no Rio de Janeiro. Um dos diferenciais da GLOCAL continua sendo sua construção em rede; enquanto alguns textos são escritos por renomados intelectuais e prestigiados técnicos convidados pelo conselho editorial, outros são enviados por universitários de todo o país e passam por um processo de seleção inclusivo. Assim, acreditamos entregar ao leitor um instrumento de luta contra a atual educação bancária, que coloca o professor como “dono do saber” e impositor deste saber ao aluno. A GLOCAL se reafirma atenta à reforma do Ensino Médio no país e apresenta uma linha editorial condizente com a proposta do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), que propõe uma avaliação das competências e habilidades adquiridas pelos alunos na Educação Básica, suplantando os vestibulares que, convencionalmente, avaliam os conteúdos programáticos. Dos editores, Professor Fernando de Souza Coelho e Educador Mateus Prado
glocal glo
03
sumário
por Renata Duarte
14
O meio ambiente na globalizacão hegemônica por Henrique Cunha
20
Cidades travadas
por Jorge Valdés
Expediente: Editores: Fernando Coelho e Mateus Prado Conselho Editoral: Caio Penko, Renato Eliseu, Wagner Iglesias e Paulo de Tarso Gestora de Educação e Ensino: Ana Paula Dibbern Coordenadora Observatório Social: Bruna Ramos Equipe Observatório Social: Victor Biscaro, Ilane Lobato, Helton Simões Gomes Diretor de Arte: José Geraldo S. Junior Projeto Gráfico: Lucas Paiva Designers: Lucas Paiva e Daniel Paiva
28
Educación real
por Luiza Erundina
08 Do que eles estão falando mesmo? por Lucas Nogueira Garcez
38
16 As mulheres e o poder no Brasil
Futebol e identidade nacional por Elizabeth Seno
22 por Leandro Marubayashi
Do pincel ao pixel: a estética do digital por Verônica Ramos
24
42
O feminismo e o direito ao voto
Como os cassinos ganham dinheiro?
por Rafael Mucinhato
32 O banqueiro dos pobres por Mateus Prado
por Caio Teixeira
44 Possibilitando Aprendizagem: um sonho (im)possível? por José Douglas Santos
48
Índice Big Mac e iPod
46 Um novo cenário entre Bolívia e Brasil: a imigracão por Franz Gustav Buhr
Escreva o mundo de hoje. Envie seu artigo e colabore para o debate da sociedade sobre os temas do momento.
Pensamentos globais, acões locais A Revista Glocal - Painel de Geopolítica, Meio Ambiente, Cultura e Matemática Cotidiana é uma publicação de atualidades do Instituto Henfil Educação e Sustentabilidade, que tem como objetivo divulgar informações qualificadas sobre arte, cultura, política nacional e internacional, meio-ambiente, geopolítica, economia, questões sociais, ciência e matemática. O formato colaborativo abre espaço em suas páginas para que estudantes de graduação e pós-graduação, pesquisadores, professores e especialistas em diversas áreas publiquem seus artigos em português, inglês ou espanhol.
Conheca a Glocal, Revista de atualidades especializada em ENEM.
1
Envie seu Artigo
2
Artigo Selecionado
3
Artigo Publicado
4
Gratificacão
artigos@revistaglocal.org.br
Conheça o edital de seleção de textos em:
artigos
www.revistaglocal.org.br/
Painel de Geopolítica, Meio Ambiente, Cultura e Matemática Cotidiana
06
linguagens
Machado de Assis A originalidade machadiana distanciada dos clichês realistas
E
stamos acostumados a aprender desde as primeiras aulas de Realismo brasileiro que Machado de Assis é o seu símbolo maior, e não é à toa que o seu romance “Memórias póstumas de Brás Cubas”, publicado em 1881, é considerado o ponto de partida do Realismo no Brasil. Mas o interessante é ver que mesmo entre os realistas, Machado de Assis se distingue porque ele é um realista diferente. Enquanto grande parte dos realistas buscava uma descrição minuciosa dos detalhes dos espaços, das casas, das ruas, dando-nos quase sempre a ideia dos lugares retratados como numa fotografia, nas quais geralmente há uma intenção de mostrar o ambiente degradado, sujo, como uma metonímia do próprio homem em suas condições mais torpes e ao mesmo tempo como um fator que influencia o comportamento dos que vivem ali. Machado de Assis se detém menos na descrição dos ambientes, o que se destaca em seus romances da fase madura (que inclui toda sua literatura a partir de “Brás Cubas”) é a análise do interior das personagens, de seus pensamentos, daquilo que motiva suas ações. Os narradores de seus romances, e poderíamos supor que o próprio Machado, veem o mundo com olhos diferentes, enquanto todos viam as personagens dando ênfase ao que está por fora, seus livros mostram uma reflexão voltada para dentro, e sempre com muita ironia. Seu olhar se aprofunda com força nas profundezas das personagens, sem se deter muito tempo na superfície, pois ainda que haja a narração de um fato qualquer, ela é usada sempre como pretexto de uma reflexão mais demorada. Vejamos, por exemplo, Dom Casmurro: o enredo central trata de Bento Santiago, que pretende narrar a sua vida, centrada em sua adolescência, a partir de sua velhice, passando, como bem lembramos, pela questão da possível traição. Mas além da eterna dúvida do adultério de Capitu, o que impressiona é que, o que de fato acontece não é grandioso, as ações são quase sempre banais, puramente cotidianas, e mesmo quando há algo de trágico, como no momento em que Bentinho tem de honrar a promessa de sua mãe, ir para o seminário e se tornar padre, gerando um nó dramático que o parece levar a
uma precoce separação de Capitu, o nó se desfaz com uma solução que transforma a possível tragédia numa comédia de comportamento: Bentinho sai do seminário, e é substituído por um órfão, que será mantido por Dona Glória, “a promessa cumpre-se, não se perdendo o padre.” Mesmo o adultério que fica suposto por Bento, mas não pode ser comprovado, mostra que para Machado não é a traição em si que interessa, mas tudo o que se pensa dela. Importa “saber se a Capitu da praia da Glória já estava dentro da de Matacavalos, ou se esta foi mudada naquela por efeito de algum caso incidente. (…) uma estava dentro da outra, como a fruta dentro da casca.” É um realismo pelo avesso, de dentro pra fora, é a crítica ácida da sociedade feita não pela descrição de seus atos mais condenáveis, mas pela análise da consciência das personagens mesmo quando a aparência externa é louvável. Machado de Assis também difere de seus contemporâneos porque era contra o determinismo científico , tão comum na literatura do século 19, enquanto os seguidores dessa corrente de pensamento guiavam seus romances por uma linha que já deixava claro desde o início que o ambiente, a raça e a situação determinariam o fim das personagens, não deixando espaço para a influência do destino. Machado procura o oposto: em suas obras é o destino que comanda os acontecimentos, mesmo que as personagens não percebam, como ocorre no célebre conto “A Cartomante”, no qual elas são praticamente marionetes do “indiferente Destino.” No entanto, se Machado de Assis é tão particular quando comparado às convenções literárias da época, não podemos chegar à conclusão equivocada de que ele não se enquadra no Realismo, pois há também muitas semelhanças: a narração totalmente desprovida de idealizações; as hipocrisias reveladas sem rodeios; as famílias típicas, a época, em suma, seguem a mesma convenção. Tudo que há de diferente em Machado é instrumento na busca por um realismo ainda mais incisivo. E tudo nos leva a crer que Machado atingiu seu objetivo: suas obras, após mais de cem anos de publicação adquirem sempre novos significados, permitem sempre novas interpretações. São inegavelmente clássicos, porque são mais fortes que a própria força do tempo.
Determinismo científico: corrente filosófica segundo a qual o comportamento humano é resultado das influências do meio ambiente, do momento histórico e da hereditariedade física e psicológica.
Mateus Ramos Lourenço Bacharelando em Letras com habilitação em Português/Espanhol pela Universidade de São Paulo
glocal glo
07
natureza
O meio ambiente na globalizacão hegemônica Num clima de individualismo crescente, gerado pela competição econômica da era da globalização, o meio ambiente mostra-se uma nova oportunidade de reforçar laços de solidariedade entre povos
A expressão de origem americana Joint Venture designa uma forma de aliança entre duas ou mais entidades juridicamente independentes com o fim de partilharem o risco de negócio, os investimentos, as responsabilidades e os lucros associados a determinado projeto.
14
A
globalização, como entendida pelo expoente geógrafo Milton Santos, é o movimento de expansão do capitalismo para todas as partes do globo, em maior ou menor grau. As empresas transnacionais, um dos principais agentes deste processo, deslocam-se pelo mundo em busca de melhores condições para desenvolverem suas atividades, para diminuir custos de produção e aproximar-se de mercados consumidores. Esse movimento apresenta variações: as empresas, ao invés de apenas moverem fábricas inteiras para outros países, podem dividir a produção em diversos pontos do planeta, podem estabelecer joint-ventures com empresas
locais, ou abrir apenas escritórios de representação. Além de aproximar entre povos e encurtar distâncias, para ele, a globalização significa um processo de uniformização de relações entre indivíduos, governos e agentes privados, moldadas pelo principal objetivo das transnacionais: a maximização de lucros. Ela modifica o meio de apropriação do espaço, a forma de ligação tradicional das sociedades nas quais se implanta, formando novos costumes, acelerando o processo histórico. Neste sentido, a globalização atual – hegemônica, porque alcança a tudo e a todos -, nessa forma que se apresenta, mostra-se perversa, porque impõe a competitividade com único meio de ascensão, porque
destrói laços de solidariedade, porque gera pobreza estrutural, justificados, entre outros fatores, pela criação de mitos como a aldeia ou a cidadania globais, acessíveis apenas a poucos. No mundo globalizado, ligado direta ou indiretamente pelos agentes econômicos transnacionais, cada espaço é parte de um todo maior, conectando-se pela lógica do mercado e da economia. Talvez um dos únicos fatores que consigam ultrapassar tal perversidade da globalização, criando novos laços, novas formas de pensar e de buscar soluções, seja o meio ambiente. Há uma interdependência mundial nas questões ambientais, já que ele nos afeta diretamente (as conseqüências de mudanças climáticas ou o problema na camada de ozônio envolvem todo o planeta, sem limites de fronteiras estatais). A globalização atual e o encurtamento de distâncias, por meio da evolução dos transportes e das comunicações, tornam possível que acontecimentos em locais remotos possam vir a ser conhecidos em outros pontos do planeta, possibilitando maior mobilização e requisitando respostas mais enérgicas e eficientes, demandadas por uma opinião pública agora mundial (ainda que uma parcela da população tenha sua participação excluída). Seu caráter homogeneizante, aqui, proporciona também a reivindicação de ações mais uniformes, não no sentido de apenas transportar soluções, mas de requerer reações conjuntas de diferentes esferas aplicadas a condições específicas, determinadas localmente. É neste sentido que se coaduna a máxima ambientalista “pensar globalmente, agir localmente” com o fracionamento do global em espaços locais, apontado por Milton Santos.
As crises ambientais exigem respostas globais, na medida em que envolvem atores diversos em localidades diversas. Ao mesmo tempo, precisam de ações voltadas às especificidades de cada país ou região. Estados, Organizações Internacionais, empresas, organizações não-governamentais locais ou internacionais e indivíduos devem procurar delinear soluções em conjunto, para que haja resultados mais eficientes. Há, ainda, muitos pontos de estrangulamento. A resolução de problemas, em nível mundial, exige soluções políticas são dependentes do consentimento e vontade de cada Estado para implementá-las em seu território. Mesmo importantes organizações internacionais, como a ONU, são subordinadas ao voluntarismo do Estado. Assim, tanto a sociedade quanto as organizações têm como único meio a pressão sobre os governos por melhores respostas, já que são submetidas ao poder soberano do Estado. Este, contudo, ainda que conserve parcela de autonomia, tem sua soberania limitada pelos objetivos da globalização e não tem condições de dar as respostas necessárias. Surge daí um paradoxo: ao mesmo tempo em que a globalização gera pendências, ela cria uma opinião pública mundial mais engajada, que carece de respostas mais eficientes; contudo, a globalização coloca limites a tais respostas, tão-somente porque sua perpetuação exige uma lógica que se distancia da solidariedade e da ética e que se impõe hegemonicamente, tanto aos Estados, quanto aos demais atores. Renata Nunes Duarte Bacharel em Relações Internacionais pela UNESP e aspirante à diplomata.
Mais Milton Santos nasceu na Bahia em 1926. Formou-se em Direito, mas sua grande contribuição é no campo da Geografia. Após o Golpe Militar no Brasil, viveu no exílio por 13 anos, passando pela França, Canadá, EUA, Venezuela, Peru e Tanzânia, onde lecionou em muitas universidades, como a Sorbonne e o Massachusetz Institute of Technology. Seu último livro, “Por uma outra Globalização: do pensamento único à consciência universal”, de 2000, mostra uma abordagem crítica sobre o processo de globalização, em que o consumo e o avanço tecnológico servem apenas para perpetuar as desigualdades entre pobres e ricos.
glocal glo
15
38
humanas
As mulheres e o poder no Brasil A participação da mulher brasileira nas esferas de poder tem crescido nas duas últimas décadas, contudo ainda são necessárias políticas que permitam a sua inclusão e de outras minorias nestes espaços
A
democracia brasileira apresenta enorme déficit em termos de representação política, visto que mais de 50% da população, que são as mulheres, estão excluídas dos espaços institucionais de poder, além dos negros, dos jovens e dos índios. Segundo estudo da União Interparlamentar (UIP), o Brasil ocupa, num total de 189 países, 142º lugar em presença de mulheres no poder legislativo, com menos de 9% na Câmara dos Deputados. Na América Latina, fica à frente apenas do Haiti (4,1%) e da Colômbia (8,4%). Está longe de seus vizinhos Cuba (43%), Argentina (40%), Costa Rica (36,8%) e Peru (29,2%). Outro indicador da absurda exclusão das mulheres nos espaços de poder é que, em 185 anos do Poder Legislativo no Brasil, jamais uma deputada ocupou cargo de titular na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, que é o poder maior da Casa, mas apenas como suplente e lá pelos idos da década de 1980. Com vistas a mudar essa situação, foi aprovado um dispositivo na Lei das Eleições (nº 9.504/97) que prevê a presença de, no mínimo, 30% de mulheres nas chapas para eleição de deputados federais e estaduais e vereadores. Por mais de uma década, tal medida significou apenas uma conquista formal, visto que os partidos políticos não cumpriam a norma, sem que, por isso, sofressem qualquer sanção. Entretanto, em setembro de 2009, foi publicada a Lei dos Partidos Políticos (nº 12.034), conhecida como Minirreforma Eleitoral, que, em vez de estabelecer apenas que os partidos reservem 30% de vagas para mulheres, os obriga a preencher o referido percentual nas chapas para eleição daqueles cargos proporcionais, sob pena de sanção. Para dar efetividade a essa conquista, apresentei em 2002 projeto de lei (nº 6.216) que destina 30% dos recursos do Fundo Partidário à criação e manutenção de programas de promoção da participação política das mulheres, além de reservar 30% do tempo do programa partidário gratuito de rádio e televisão às mulheres, a fim de que saiam da invisibilidade e se capacitem para a disputa e o exercício do poder. Após muita luta, o máximo que conseguimos foi a aprovação, também na referida Minirreforma, de pequenas alterações na legislação que ainda estão
aquém daquilo que pretendemos e a que temos direito. Fixou-se em 5% a cota dos recursos do Fundo Partidário de cada partido, destinados à capacitação política das mulheres, e em 10% o tempo de rádio e televisão. É verdade que esse quadro vem melhorando, especialmente nas duas últimas décadas, graças à crescente organização das mulheres que tem contribuído para o fortalecimento de suas lutas em defesa dos seus direitos de cidadania, inclusive o de ocupar espaço nas esferas de poder. A eleição da primeira mulher, Dilma Rousseff, para presidente da República é também resultado dessa luta e representa importante conquista, embora não resolva a questão da subrepresentação das mulheres e de sua exclusão dos espaços de poder. Para tanto, faz-se necessária uma ampla e profunda reforma política, para além de mudanças pontuais nas regras eleitorais e normas partidárias, como tem sido feito. Precisamos sim de uma reforma política estrutural capaz de corrigir as graves distorções do sistema político brasileiro, inclusive a injusta exclusão das mulheres, dos negros, dos jovens e índios dos espaços públicos de poder. Ademais, as mulheres precisam tomar consciência do seu papel na sociedade, dos seus direitos enquanto cidadãs e da importância da sua participação política como condição para garantir esses direitos. Assim, são imprescindíveis sua formação e capacitação política, bem como lhes sejam propiciadas condições objetivas para que possam disputar em igualdade de condições com os homens os espaços de poder que, historicamente, têm sido quase que exclusivamente território masculino. Com a inclusão de mais da metade da população na vida política do país, a sociedade brasileira passaria a contar com a participação das mulheres na busca de soluções para os graves problemas econômicos e sociais, o que certamente contribuiria, não só para a consolidação e o aperfeiçoamento da democracia, mas também para elevar o nível de civilização da nação brasileira.
Mais Política masculina A política parece ser mesmo território masculino. Na Câmara dos Deputados, por exemplo, os homens dominam as bancadas. Dos 513 parlamentares que compõem a Casa, apenas 45 são mulheres.
51% da população brasileira são mulheres, segundo o Censo 2010
Luiza Erundina Assistente social, Mestre em Ciências Sociais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo e Dep. Federal reeleita pelo PSB-SP e foi a primeira prefeita em São Paulo
glocal glo
39
Como os cassinos ganham dinheiro? Entenda de onde vem o dinheiro que sustenta Las Vegas Mais O jogo lá e aqui No estado de Nevada onde fica Las Vegas, o jogo de azar foi liberado em 1931, para amenizar a crise causada pela Grande Depressão de 1929. No Brasil, o DecretoLei 3.688 de 1941, proibiu a prática. No entanto, mais de 60 anos depois, o empresário Sérgio Antônio Camargo acionou a Justiça para criar cassinos. O pedido foi negado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, por considerar as atividades realizadas no cassino, sim, jogos de azar, pois, “o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte”.
L
as Vegas! A cidade do pecado. A fama desta cidade não é à toa. Repleta de turistas, festas, luxo e, principalmente, DINHEIRO! Sim, milhões de dólares circulando pelas mesas de seus enormes cassinos, cartões postais da cidade. Mas como é possível garantir toda essa renda necessária para a construção desses palácios se o dinheiro entra por meio de “jogos de azar”? Não deixe essa expressão lhe enganar, existe toda uma matemática por trás desses jogos, e a verdade é: A banca nunca perde! Para explicar como isso é possível, precisamos deixar claro um pequeno conceito: o Expected Value (“valor esperado”), ou simplesmente EV. O EV nos diz o resultado que devemos obter se um evento se repetisse infinitas vezes (longo prazo). A fórmula para calcular o EV de uma situação é bem simples: EV = (Chances de sucesso x Resultado do sucesso) + (Chances de fracasso x Resultado do fracasso) Vamos supor a seguinte situação: “Uma pessoa paga 1 real para jogar um dado. Se a face sorteada for a correspondente ao numero 6 ela receberá 5 reais. Caso seja sorteada qualquer outra face, ela não recebe nada.” E agora? Essa é uma situação lucrativa para a pessoa? Podemos supor que uma pessoa de sorte poderá sortear a face do número 6 cinco vezes seguidas, tendo assim um grande lucro. Mas e a “banca”? Ela terá algum lucro? Vamos pensar em termos matemáticos agora. O dado tem 6 faces com seus números correspondentes (de 1 a 6). Para o número 6, a banca pagará 5 reais, mas como já tinha recebido 1 real para poder jogar o dado, ela terá um prejuízo de 4 reais. E, considerando um dado não viciado (todas as faces tem a mesma probabilidade de sair) o número 6 tem 1/6 de chances de sair (um dos seis resultados possíveis). Para todos os outros resultados (5 de 6 possíveis), a banca ganhará um real (R$ 1 de lucro líquido). Vamos colocar isso em linguagem matemática: EV da banca = 5/6 (chances de vitória) x R$ 1 + 1/6 (chances de derrota) x -R$ 4 = 5/6 – 4/6 = 1/6 R$ 0,16. Ou seja, a banca tem um lucro esperado de R$ 0,16 a cada rolada de dado. Claro que poderão aparecer jogadores muito sortudos que vão tirar vários 6 seguidos, mas como a banca repetirá o desafio infinitas vezes (consideramos que a banca tem uma reserva infinita de dinheiro), esse dinheiro irá retornar pelas outras pessoas que perderem o desafio. Não foram necessárias trapaças nem artima-
42
nhas para a banca sair vencedora, apenas um bom uso da matemática. Agora vamos ver onde ela se aplica nos cassinos. A Roleta
Existem dois tipos de roleta: a americana (foto acima) e a francesa (não possui a casa 00). Como podemos observar, elas são constituídas de 36 números mais os zeros, que podem ser agrupados em diversos quesitos: pares e ímpares, 1 – 18 e 19 – 36, preto e vermelho, por dúzias e assim adiante. Esses grupos são os alvos das apostas, assim como os números em si. Todos os prêmios são baseados na porção que o grupo é do total de 36 números. Exemplo: Os números pares (18 números no total) representam 50% dos 36 números, então o prêmio respectivo será de 1 pra 1 (1 real de lucro para cada real apostado). Seguindo a mesma lógica, caso apostemos num único número (o número 9, por exemplo), ele representará 1/36 dos números possíveis, logo receberemos 36 reais (1 real apostado + 35 reais de lucro). E como a casa ganha seu dinheiro? Vamos calcular o EV para uma aposta nos números pares na roleta americana: EV = 18/38 (18 números pares) x +R$1 + 20/38 (18 números ímpares mais 0 e 00) x – R$ 1 EV = 18/38 – 20/38 = -2/38 -R$ 0,05. Logo, o lucro esperado para a banca é de 5 centavos por rodada para cada real apostado no longo prazo. Esse valor parece pequeno, mas se pensarmos que as roletas ficam girando sem parar nos cassinos, pode chegar a cifras astronômicas. Dessa forma, todo o lucro da cidade está garantido contra a maré de sorte dos seus freqüentadores. Assim, Vegas estará sempre lá, repleta de luxo e glamour para realizar as maiores fantasias de pessoas de todos os lugares do mundo. Mas atenção! O que acontece em Vegas, fica em Vegas! Leandro Marubayashi Estudante de engenharia de Minas pela Universidade de São Paulo e jogador de poker desde 2009
matemรกtica glocal glo
43
Leia a Revista Glocal em seu smartphone, tablet ou computador. A única revista colaborativa de atualidades especializada em ENEM.
www.
revistaglocal.org.br
gl c cal Painel de Geopolítica, Meio Ambiente, Cultura e Matemática Cotidiana
Um projeto do