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Fabiana Rodrigues Carrijo
Fabiana Rodrigues Carrijo Catalão/GO A moça que aprendera na dor a psicografar o amor ou seria ao contrário a preleção?
Era evidente que sempre tivera uma afeição para a dor. Ainda se lembrava de uma infância remota em que ficara continuamente no lugar dos menos favorecidos e daqueles que por esta ou aquela razão pareciam sentir dor. Só tinha naquela ocasião seis anos. E, desde então, tinha uma aptidão para a nostalgia – sinalizada em todos os gostos e dissabores, mais nestes que naqueles. Ela queria poder percorrer a estrada outra, sem padecer tanto e tanto e tanto. Mas esta lição era impossibilíssima, mesmo para aquela que haveria consecutivamente de ser autodidata e deveras disciplinada. A preleção de ‘se doer menos’ não aprenderia!? Gostou daquela (de maneira singular) –certa vez – porque lhe pareceu poder amenizar o seu fado! Achou, prematuramente, que era triste fardo. Até no amor – na ímpar experiência do amor – também descobrira a preleção para a nostálgica e marcante dor! Os rascunhos de si, a escrita de si, a desdita de si exalando consternações por todos os lugares possíveis e improváveis! Adorou as músicas do Chopin –desde sempre – por lhe semelharem impregnadas de uma afeição cúmplice para a consternação. Gostou dos tristes textos de Van Gogh para o seu irmão (Théo), porque lhe pareceu já ter conhecido aquela história de uma longa e imprecisa viagem! Amou Emily Dickinson, porque sabiamente lembrara-se de já ter conhecido a ‘Branca voz da solidão’. Aliás, a branca voz da solidão inúmeras vezes lhe indicava seus gostos, seus caminhos, seus tristes e ermos caminhos. Pensara até que feito aquele poeta havia nascido com um ‘ermo dentro do olho’, por isso a tendência para a nostalgia de si, em si, nas coisas e seres do mundo/ (des)mundo. Era queria ter podido viver ‘o antes’ e esquecer. O ‘olvidar’ como lenitivo –para viver outra vez sem as enlaças da solidez de outras e distintas vidas. Ela queria tanto ‘o novamente’! Contudo, descobriu recentemente que para viver ‘o novamente’ teria que
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aprender a desaprender a lição/preleção ensinada habilmente de ser sempre um ser de distâncias, de ausências e acabrunhado pelas dores do mundo. Amou a história de Olga Benário Prestes; Se condoeu com os andarilhos de todos os tempos; amou os seres de muitas cinzas; apreciou a dança da solidão (‘dança eu, dança você, na dança da solidão’) de Paulinho da Viola. Contemplou a triste e trágica história de Camille Claudel e de Frida Kahlo e (se)reconheceu em dores difíceis de serem mitigadas. Pensou que por gostar da escrita e amar os livros e distinguir que possuía um estilo ancestral de ser, de se inscrever, de se escrever, esta seria a paga por eles! Haveria de ter uma desforra para os abismos de si. ‘A nostalgia’ premente em tudo até na contemplação do arco-íris, do nascer e do pôr-do-sol. Por que será que não via/lia as cores outras, os tons escancarados da alegria? Por que não distinguia a beleza até na contemplação da dor? Ela queria, pois, luarizar, ‘luarizar-se’ para a preleção sabida de cor e, se possível, viver as pequenas ternuras do dia a dia sem apiedar-se tanto, a ponto de ‘perder-se de si’. Só agora, recentemente, desvendara que sua alma anosa haveria de retribuir as preleções aprendidas em outras e distintas existências. Teria que psicografar o amor – amora de ser –(ou a romã – fruta que espera pelo tempo de amadurecer) para grafar uma escrita de outrem por mãos e traços seus. Descobrira que ‘os planos e os sonhos que ardem em nós’ não são nossos! Os sonhos são de outrem – que ora –terá que ser registrado com todos os matizes possíveis para escrever na antiga e confiada ‘escrita de si’, a escrita de outrem. Só assim, seria possível o lícito viver!? Sua mente de rolinha a cismar cismas e desditas teria que reaprender a conjugar o verbo desapegar e todos os seus correlatos e deixar partir aquela, feito ‘flor de ir embora’ como naquela canção: ‘Flor de ir embora: “È uma flor que se alimenta do que a gente chora/Rompe a terra decidida/Flor do meu desejo de correr o mundo afora/Flor de sentimento/Amadurecendo aos poucos a minha partida/Quando a flor abrir inteira/ Muda a minha vida/ Esperei o tempo certo/E lá vou eu/E lá vou eu...” Terá que aprender/compreender na lição ofertada pela escritora Lya Luft “que a vida é maravilhosa, mesmo quando dolorida”. No agora, a moça (uma mulher) terá que psicografar o amor, ainda que pela dor ou fosse/SERIA ‘ao revés’: psicografar a dor pelo amor!?