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Arthur Vieira

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LiteraAmigos

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Arthur Vieira

João Pessoa/PB

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A bondade é um ato de terrorismo

As chinelas rascavam o chão sujo de esgoto ressequido e poeira. A lua ocultava-se em pálidas nuvens de uma noite quente. Os grilos decidiram que não estridulariam então. O beco da Tapa decidiu ficar em um silêncio trêmulo. Boda Gaza abriu a porta se pedir e acordou o Irmão e a Irmã sem nenhuma cerimônia. — Pezin, amarra o Irmão. Irmã, senta na cama e sem pantin. Aqui vai ser jogo rápido, né Irmão?! — ... — Se ajudar a gente, a gente sai e vocês nem vão lembrar dessa história, né Irmã?! — ... — Vixe, Boda... são calado, né?! — Só quero saber onde tá amalocado o Cobal? Só isso, beleza?! As mãos de Boda Gaza estavam cruzadas e para trás. Pezin olhava ao redor e na cintura repousava um facão opaco e de fio bem limado que o fazia se sentir mais foda do que realmente o era. — A gente sabe que vocês sabe... Ele sabe que precisamos cruzar os bigodes... do jeito que a coisa tá... pra mim num funciona... - Tá falando do quê? — Aí... Boda, o Irmão fala também... — É... bom sabê... Boda Gaza finalmente mostrou nos braços e em sua mão foi possível ver um cutelo de 7 polegadas que reluziu sob a luz incandescente de uma lâmpada de 4 watts. Os olhos da Irmã faiscaram, os do Irmão arregalaram-se ao mesmo tempo em que Pezin soltou um direto de punho cerrado que o derrubou no chão, no que resultou num barulho abafado de queda. Ao olhar aquela cena, Boda reprovou Pezin apenas com o olhar e voltou a atenção para a Irmã. - Falei que não queria machucar ninguém, você viu... esse Pezin que é um feladaputa, desconsidera geral... O irmão gemia e se enrolava de dor no chão queimado de azul à Xadrez.

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Os outros dois sentiram certa excitação com o quadro que ajudaram a pintar. - Cobal! Cobal! Aparece! - Num adianta, Pezin... — Esse arrombado! Vai livrá o coro dele, Boda?! — Tu sabe que não.. tu sabe... Os olhos da Irmã inundaram, sua respiração se precipitara ofegante, a roupa de dormir denotava nitidamente seus predicados. Boda Gaza trocou respiração com ela ao se aproximar sua cara na da dela. Lentamente, para desespero dela, ele fez do cutelo um pente ao passeá-lo pela selva capilar negra. O coração da moça retumbava nos ouvidos, e logo se transformou em um som agudo que preencheu a sua audição. Ao recolher o cutelo, mostrou os dentes e voltou sua audiência para o Irmão que resfolegava no piso frio. — Pezin, já que ele não abre a boca... resolve isso... Ele foi com os pulmões cheios, e sem hesitação. Moeu a cara do Irmão com suas mãos ossudas. A Irmã sentia espasmos a cada murro, não aguentou muito tempo e fechou os olhos que deixaram vazar o líquido salobre. Pezin desengavetou uma iracúndia na pobre carne do Irmão. Aquele saiu de cima deste como se acabasse de devorar um prato de comida quente. — E aí, Pezin?! Só isso?! Essas fizeram Pezin reabrir o apetite, que livrou o Tramontina da cintura e partiu na direção do pacote flácido de carne que tomara o lugar do Irmão. Pôs um dos joelhos no pomo de adão, e com indicador e o polegar abriu a boca e com a pinça dos seus dedos puxou a língua boca à fora. E sem nenhum esforço por parte do facão, separou-a do resto do corpo. O sangue fugia do corpo ao passo que engasgava o Irmão que nem força pra gritar possuía. A Irmã sentia, e pressionava com mais violência as suas pálpebras. O Irmão convulsionava com os braços amarrados para trás e o sangue respingava a esmo em gordas gotas pelo cômodo. — Irmã... – segurou o queixo dela e virou na direção do corpo tingido de vermelho – só diz pra gente onde tá o nosso Cobal, e a gente sai daqui assim ó... Estalou os dedos sem fazer barulho. Ela batia os queixos e murmurava algo parecido com o pai nosso, só que não abria os olhos por nada, e seus

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dentes rangiam. Boda Gaza balançou a cabeça. — Pezin, passa o laço...

* Canal 17. Às 12:33:

- Rapaaaaaizz! - É! Não tem jeito! Não tem jeito mesmo! Traz a câmera aqui pra mim. Traz aqui, ó, Jatene! Esse Jatene... Esse Jatene... Tô sabendo... Hein... A câmera balança negativamente. — Esse Jatene queima! Um som mecânico faz: “Ueeeeeepa!” — Não fala isso! (Gargalhadas). Olha, agora vou contar pra vocês um caso que aconteceu na Comunidade do Beco da Tapa. Dois irmãos foram mortos, dizem que era do movimento, sabe... Tá aí... o destino são dois pra quem caminha por essa vida: ou é cana ou caixão. No caso deles, comer um capimzin pela raiz e depois dançar no tacho do Tinhoso! Né, não?! — ÔÔÔÔÔ se é! Deixa os bixos se matarem. — É! A polícia, nestes casos, só vai pra levar o saco preto. Deixa que esses papa-fígo se resolvam.... Quem é de bem não passa por essas coisa! Quem é de Deus num vive feito esses animal! Oí, ó, olhas essas imagens... Meu Deus que coisa mais triste, mas esse caminho foram eles mesmos que escolheram. Tô certo ou tô errado, Jatene? A câmera assente positivamente. — Claro que tô! A gente devia ter pena de morte, assim esses vagabundos iam aprender a seguir a lei... se não pelo amor, vai pela dor mesmo. Sonoplastia. — Agora, vamos falar de coisa boa! Chegaí, chegaí... olha Jatene, que morena linda. Tu num gosta... Ê, lá em casa! A Micheline tem um recadinho importante pra vocês! Manda tu, coisa linda! — Obrigada! Boa tarde a todos! Estamos aqui pra falar de segurança, e segurança é com a…

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