+ PERFIL
Uns fogem. Mas há quem faça fila por ele
+ JAPÃO
Um corinthiano conta o que aprontaram por lá
U 21 Ano 2 | fevereiro 2013 | www.meiaum.com.br
N°
Expansão improvisada A UnB levou sua marca para fora do Plano Piloto. Falta agora levar a tradição e a excelência de seus cursos
Desligue o celular. Se ligue no trânsito. Juntos vamos fazer o trânsito de Brasília sair na frente mais uma vez. Brasília é conhecida por ter um trânsito que é exemplo em muitas conquistas: o respeito à faixa de pedestre, a fiscalização de velocidade que reduziu os acidentes, o uso do cinto e muito mais. Chegou a hora de sair na frente mais uma vez. Os acidentes causados pela dispersão do motorista aumentam a cada dia, e o GDF quer estar junto de você para mudar esse comportamento e trazer mais esse orgulho para a nossa cidade. Não use o celular ao volante: não mande mensagens ou e-mails, não consulte suas redes sociais e nem mesmo atenda a uma simples ligação. Vamos fazer de Brasília, mais uma vez, exemplo para o Brasil.
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Papos da Cidade
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Brasília 61 visões
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DF–SE
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Fora do Plano
A cidade pela alma de seus habitantes
Os cinemas de rua que viraram história
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Revival
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Cultura
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Viagem
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Caixa-Preta
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Charges do Gougon
A forte relação entre a devastação ambiental e a miséria no Haiti
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Roteiro
Brasífra-me
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Banquetes e Botecos
Todo mundo já sabia que o estádio bilionário não seria entregue em 2012
Conto
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Perfil
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Capa
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Reflexões, análises e resmungos de quem vive em Brasília
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ÍNDICE
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Conselhos de uma guerreira brasiliense
Gilson Sobral não é só o que parece
Descentralizar a UnB parece politicamente correto, mas é eficiente?
Artigo
Os poemas-enigmas de Nicolas Behr
O brega voltou com tudo
O diretor Rodrigo Fischer fala da construção da peça Sexton
A festa corinthiana no Japão
A desconstrução de Dilma
Sabe como os brasileiros vão esperar pelo crescimento de 4%?
Os destaques da programação da cidade
Em cada edição, Marcela Benet visita um restaurante. E ninguém sabe quem ela é
Carta da editora
Fazer jornalismo é uma merda
S
er jornalista é uma merda. Isso porque não fazemos jornalismo só por amor. É nosso meio de vida também. E é aí que o romance vai por água abaixo. Como fazer jornalismo honesto, independente e inteligente e ainda assim pagar as contas? Leitores reclamam muito da qualidade do jornalismo e de jornalistas, mas parecem cada vez menos dispostos a pagar por conteúdo – é só ver a revolta que provocou a medida instituída pelo New York Times e adotada pela Folha de S. Paulo de restringir o conteúdo digital. Esquecem-se de que bons jornalistas são bons profissionais. E profissionais costumam ser remunerados. Como leitores não pagam as contas, o meio mais eficiente para sustentar um veículo geralmente é a publicidade. Se cada um ficasse no seu galho, o jornalismo informando e a publicidade promovendo
marcas e conceitos, estaria tudo certo, mas na prática é mais complicado. Veículos tratam seus leitores como idiotas que não percebem uma matéria paga – e será que eles percebem? E assim as revistas perdem cada vez mais seu caráter editorial para se tornarem produtos comerciais, catálogos mesmo. Aqui na meiaum vendemos espaços publicitários. A alma da nossa revista, jamais. Para anunciantes, é muito importante rotularmos nossos leitores. É natural, querem saber quem vão atingir para ver se quem lê a meiaum vai consumir o que eles têm a oferecer. Querem saber se são homens ou mulheres, jovens ou velhos, ricos ou pobres. Nossa resposta é sempre a mesma: “A meiaum é feita para quem gosta de ler”. Sustentar em um mercado como o de Brasília um produto editorial verdadeiro, sem rabo preso, feito só para os leitores, que não os subestime, é difícil. Ainda
mais um impresso, que é caro pra burro. É a resposta que temos de leitores e colegas de profissão que mantém acesa a chama do romance, nos mostrando que nem todo mundo quer a mesma coisa. Fazer jornalismo é uma merda, mas não tem jeito. Acreditamos que exista espaço na nossa cidade para essa prática tão antiquada e fora de moda. Vamos continuar insistindo, nos adaptando se necessário, para que esta revista se consolide no mercado, sem perder a essência que propusemos neste espaço na nossa primeira edição: fazer jornalismo sem apatia, sem esse papo de imparcialidade – mas com isenção, liberdade e muito prazer.
Anna Halley
( ) MEIA
U
(meiaum) é uma publicação mensal da Editora MEIAUM Conselho editorial: Anna Halley, Carlos Drumond, Hélio Doyle (coordenador), Luana Lleras, Noelle Oliveira e Paula Oliveira Diretora de Redação: Anna Halley Fotografia: Luana Lleras Projeto gráfico e diagramação: Carlos Drumond Assistente de Produção: Cristine Santos Publicidade Sucesso Mídia Comunicações – (61) 3328-8046 – barroncas@sucessototal.com.br TIRAGEM 12 mil exemplares Impressão Ediouro Gráfica Os textos assinados não expressam, necessariamente, a opinião da Editora Meiaum. | Contato: editora@meiaum.com.br
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Siga @revistameiaum | www.meiaum.com.br ISSN 2236-2274 CAPA | Por Pedro Ernesto
Anna Halley e Hélio Doyle (sócios) SHIN CA 1 Lote A Sala 351 Deck Norte Shopping – Lago Norte | Brasília-DF | (61) 3468-1466 www.editorameiaum.com.br
Desenho a lápis e pintura digital Designer gráfico, atua no mercado brasiliense, é autor de livro infantil e colabora na meiaum desde seu primeiro número. Faz parte do escritório Grande Circular. Veja os trabalhos da equipe em www.grandecircular.com.
Nilson Carvalho
Pedro Ernesto capa
Goiano de Jataí, vive desde 2006 em Brasília, quando veio estudar desenho industrial na Universidade de Brasília. Apaixonado por Dostoievski, pela Rússia, pelos Jogos Olímpicos e pelo Império Serrano, trabalha principalmente com design gráfico e com projetos para crianças.
Arquivo pessoal
Irvin Rodriguez pág. 44
Este artista e designer baseado em Nova York descobriu a meiaum e neste mês estreia nas nossas páginas. É bacharel em belas artes pelo Fashion Institute of Technology, com habilitação em ilustração. Estudou desenho e pintura na Grand Central Academy of Art. Em 2011, conquistou o ouro na 27ª edição do concurso L. Rob Hubbard´s Illustrators of the Future. Seu trabalho já saiu em publicações como Spectrum 17, Creative Quarterly, 3x3, CMYK Magazine e Digital Art Masters.
Luana Lleras
Moa Oliveira pág. 46
Paulistano, corinthiano, filho de Oxossi com Oxum, jornalista há 35 anos, fundador do Pacotão, apaixonado pela Aruc, Portela e Vai-Vai, já fez um pouco de tudo na profissão e na vida. Seu maior orgulho é saber que ajuda a escrever um pedaço da história da cidade que escolheu para viver e criar seus filhos e netos. Esteve no Japão no fim do ano e conta como foi ser campeão mundial.
Arquivo pessoal
Maria Júlia Manzi pág. 38
É jornalista formada pela UFSC. Esteve no Haiti a convite do Ministério da Defesa, realizando cobertura especial para a Associação dos Jornais do Interior de Santa Catarina. Atualmente, trabalha como repórter do Jornal Palavra Palhocense, em Palhoça (SC).
E mais...
Colaboradores
Thales Fernand0 pág. 7 Luiz Martins da Silva pág. 7 Hanna Xavier Ferreira pág. 8 Rachel Weber pág. 10 Bruno Bravo pág. 11 Gougon págs. 19, 50 e 51 João Pitella Junior pág. 20 Francisco Bronze pág. 20 Nicolas Behr pág. 40 André Cunha pág. 42 Mateus Zanon pág. 42 Gustavo Serrate pág. 44 Miguel Oliveira pág. 50 Priscila Praxedes pág. 52 Marcela Benet pág. 58 Rômulo Geraldino pág. 58
Papos da cidade } ilustrações Thales Fernando
thalesfernandob@gmail.com
O homem do disco Eu sabia que Antero não era cascateiro, pelo contrário, sujeito sério, na faculdade e, depois, no trabalho, aonde chegara antes, já admitido, eu é que era estagiário. Um dia, pedi-lhe detalhes sobre o homem do disco voador. Por acaso eu vou lá hoje, me disse. Posso ir junto? Quer ir, vamos, mas hoje estou indo só pra ver se ele avançou alguma coisa, tava muito parado. O homem fazia disco voador, mas não tinha telefone. O jeito era ir lá. Pedimos a Kombi do jornal e fomos ao Núcleo Bandeirante. Coincidência, chegamos no exato momento em que o artesão de óvni estava com a mão na massa, quero dizer, nos arames. Um “aramal” danado, uma quantidade enorme de hastes, ligando o meio da nave à cobertura, que era de lona. O homem estava lá em cima, atrepado, nos acabamentos. Camiseta, bermuda, sandália, uns 45 anos. Mas aquele jeitão dele, ali, naquela coisa, de certa maneira confirmou uma desconfiança que eu já levava no íntimo: maluqueira. Foi então que eu me lembrei, o Antero era ao mesmo tempo comunista e místico, ligado em leituras esotéricas. Mas era bom repórter, texto bom, faro perfeito, descobridor de boas histórias. Só que aquela tava parecendo boa demais. Àquela época, a cidade andava cheia de cascateiros. Na maior desfaçatez, “jornalistas”, assim, entre aspas, inventavam cada uma... Um tal de bebê anjo, que depois virou bebê diabo, deu até em romaria numa cidade-satélite, sem que ele existisse, de fato, era puríssima ficção. E uma dupla, repórter e fotógrafo, ia para a rua, na maior cara de pau, para registrar depoimentos, “povo fala”, se é que eles não inventavam também as conversas. O que não era ficção, pena que não fosse, a censura mandava pegar leve, o escabroso crime, o caso Ana Lídia, a menina loirinha, um anjinho de cabelos cacheados, vítima de um falso sequestro, o próprio irmão se prestou à farsa, mas depois que a gangue
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pegou o dinheiro eles se entupiram de drogas, abusaram, mataram, queimaram a menina e a enterraram num matagal. O bando era formado por “filhinhos de papai”, os papais eram ministros, senadores, só o irmão da criança é que estava mais pra pé-rapado, classe média baixa. Hoje, Ana Lídia é mártir, túmulo muito visitado, ex-votos, milagres... O crime prescreveu, talvez algum dia alguma comissão da verdade dê nomes oficiais aos bois, o vulgo sempre os soube. O Tropicalismo já era uma das páginas mais importantes na história da cultura brasileira, mas Caetano estava em Londres, gemendo versos do tipo go looking for flying saucers in the sky. E nós, na terra vermelha do Cerrado, testemunhando um cara ultimando retoques de um disco voador, que falava pouco, dizia que estava prestes a dar por encerrada a missão que recebera, botar o disco pra voar, aquilo era um conhecimento que lhe fora passado por seres outros, remanescentes dos Vímanas, dos Atlantes, algo assim. Tempos depois, fiquei sabendo, pelo próprio Antero, que o disco tinha voado, subira pouco mais de 50 metros, mas voara. Uma proeza bem mais pobre do que a de Santos Dumont, mas o autor dela se deu por descompromissado com as entidades desencarnadas que lhe haviam cobrado a obrigação. Não houve cobertura. O fato mais midiático do mundo, sem cobertura alguma, mas o homem não tinha o menor faro para notícia, não avisou a ninguém, nem ao fiel Antero, que o acompanhava, passo a passo. Houve testemunhas, poucas, sumidas, sem depoimentos. Não foi possível sequer reconstituir o fato, que hoje conto de memória. A preocupação daquele fabricante de disco voador não era sair na imprensa, mas se livrar de um encargo cármico, dívida finalmente resgatada. Luiz Martins da Silva
De volta às trevas No dia 8 de janeiro, o Centro Acadêmico (CA) de Direito da Universidade de Brasília amanheceu com pichações homofóbicas. Os dizeres “Ñ aos gays” e “Quem gosta de dar, gosta de apanhar” (sic) foram escritos na porta do CA. O assunto foi amplamente discutido na imprensa e provocou atos contra a homofobia dentro da universidade. Em novembro do ano passado, mais um caso de discriminação sexual, dessa vez na Escola Estadual Dona Hormezinda Maria Carneiro, em Bela Vista de Goiás. Uma menina de 15 anos foi agredida pela colega de classe, que teve a ajuda da mãe. O motivo da briga: a jovem teria “cantado” a outra menina. Como resposta, recebeu socos e chutes no rosto. Esses dois casos mostram como o preconceito continua, mesmo em locais em que a tolerância e o respeito deveriam ser aprendidos e debatidos. Em vez de progredir no respeito ao próximo, na tolerância, estamos regredindo. É absurdo pensar que em lugares em que se discute educação ainda haja comportamentos como esses. Ninguém é obrigado a concordar com as ideias ou a orientação sexual de ninguém. Mas devemos respeitar o próximo assim como esperamos ser respeitados por quem somos, pelo que gostamos ou pelo que fazemos. Hoje podemos dizer que a aceitação é maior do que antes, mas ainda há muito que melhorar. Já parou para pensar como seria a vida de um heterossexual que não pode assumir isso para a família e os amigos? Como seria se esconder de todos para não sofrer com olhares de repreensão, comentários maldosos ou mesmo violência física? Essa ainda é, para milhões de pessoas em todo o mundo, uma triste realidade. Afinal de contas, como a orientação sexual de uma pessoa influencia o caráter dela? Temos que tomar cuidado para não
voltarmos a viver como na Idade das Trevas, em que a intolerância era um dos aspectos determinantes da sociedade. Luana Lleras
Um amanhã, por favor! Começamos a vida sempre com o calor da euforia. Tantos lugares a descobrir, tantas outras pessoas a desvendar, tantas metas a cumprir. O começo sempre é expansivo. Voltado pra fora. Autoconfiante, apesar da timidez. No início, somos capazes de dizer que somos vividos, por mais que só tenhamos conhecido algumas pessoas muito próximas à nossa realidade social. Sabemos de tudo. Não temos que dar satisfação a ninguém, porque já sabemos demais das coisas do mundo. À medida que a vida vai se sedimentando, as dúvidas aparecem. As escolhas começam a fazer com que deixemos pela estrada tantas outras possibilidades. Acumulamos o ontem e deixamos escapar pessoas e situações provavelmente interessantes. Ao mesmo tempo em que alcançamos histórias que nos fizeram chegar até aqui, para caracterizar esse ser que se vê no espelho. No passado, projetávamos o futuro com olhos brilhantes. Nos víamos ajudando pessoas na África, depois de enfrentar a faculdade de medicina e ingressar no Médicos Sem Fronteiras. Nos víamos desbravando o universo e vendo a Terra lá do espaço. Nos víamos grandes seres humanos. Quiçá, poderíamos nos tornar uma Clarice Lispector, um Einstein, um Freud, um Machado de Assis. Porque quando éramos aquele ser seguro, tudo era possível. Não conhecíamos as fronteiras do que nos caracterizaria. Nem sabíamos que nunca chegaríamos a conhecer, ao certo, onde essa fronteira encontra o seu limite. Imaginávamos que a delimitação de toda a nossa maneira de ser estivesse presa
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aos nossos sonhos e que eles efetivamente se concretizariam. Saber que nem tudo virá a ser o que imaginávamos ser e que esses sonhos podem vir a se tornar outros é o passo para o outro lado da vida. A mística da juventude, diluímos na realidade. E passamos a compreender nos nossos sonhos parcela do que somos, porque a imaginação também nos caracteriza. Os lugares que desejávamos conhecer serão selecionados pelo quanto nossa carteira possa despender para chegar até eles. As pessoas que vêm e vão comporão esse emaranhado do que vamos nos tornando. Isso incrementado com uma pitada de felicidade e de dor, para cada qual que se
aproxima e se afasta. Há vezes em que os passos rumo à virada da juventude para a maturidade são interrompidos de forma abrupta e com dor vemos a impossibilidade de nos deparar com as incertezas, os tropeços, as alegrias que só a caminhada na vida proporciona. O desastre em Santa Maria, Rio Grande do Sul, expõe com lente de aumento a inviabilidade de se dar passos rumo a um futuro, que, por mais que incerto, era futuro. Como o ontem não volta, precisamos urgentemente do hoje, para corrigir falhas, a fim de que um amanhã não seja interrompido em chamas. Hanna Xavier Ferreira
O ilustre Cachoeira Para chegar ao destino de férias, Ilhéus, na Bahia, o voo que sai de Brasília faz conexão em Belo Horizonte (MG) e, somente após trocar de aeronave em terras mineiras, a viagem segue rumo a solo nordestino. São quase 1,4 mil quilômetros. O aeroporto de chegada é pequeno e cercado por água. De lá, com mais 140 quilômetros percorridos por terra, chega-se à cidade de Camamu, na região conhecida como Costa do Dendê. É do pequeno porto que saem lanchas rápidas e balsas para a Península de Maraú, destino que costuma receber muitos turistas. Já na lancha, conversando com os condutores dos barcos, é possível descobrir as últimas informações
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sobre o local, conhecido pelos corais, pelas águas transparentes e pelas piscinas naturais bem preservadas. O tempo foi de sol durante toda a primeira semana de janeiro, com fortes chuvas de verão, mas isoladas. A região, segundo os nativos, não é perigosa. Ao chegar ao destino, é possível andar pela praia, mesmo durante a noite e com a quase inexistente iluminação pública, à procura de um dos requintados e rústicos restaurantes instalados por ali. “Aqui não tem estuprador, nem sequestrador, pode andar tranquila”, adianta quem vive do turismo na região. Será mesmo? “Tem é gente famosa hospedada por aí esses dias”, conta o marinheiro. “Algum global? Músico? Quem é?” O rapaz faz cara de quem não sabe bem como explicar, mas se esforça para se lembrar o nome. “É um tal de Carlinhos Cachoeira, já ouvi falar esse nome no jornal, fiquei sabendo que tem um monte de gente pedindo autógrafo e tirando fotos com ele.” Por um tempo eu me calo. “Dizem que ele e a mulher estão sendo bem simpáticos e vieram passar a lua de mel”, complementa. Vejo-me na obrigação de explicar, no entanto, quem é o ilustre hóspede de um resort de luxo da região – um dos cinco melhores do Brasil. A diária, em alta temporada, pode chegar a cerca de R$ 3 mil. “Cachoeira é o bicheiro que foi investigado na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, ficou nove meses preso no ano passado e, agora, cumpre pena em regime semiaberto, sabia?” “Hummm!”, exclama o rapaz. “Mas nem reclamo de ver esses políticos aqui não, moça. Outro dia, um rapaz passou mal e foi graças a um político desses que conseguimos uma lancha para socorrer o homem e levá-lo para a cidade. Aqui não tem estrutura nenhuma e, em uma hora como aquela, ele ia acabar morrendo”, argumenta. A região é conhecida como refúgio para figuras com muito dinheiro. Vizinha ao resort em que Cachoeira se hospedou, em Taipus de Fora, está a mansão de Duda Mendonça.
Por lá já passaram também José Dirceu, Delúbio Soares e Antonio Palocci. O difícil acesso garante a privacidade dos hóspedes, que, para evitar o passo a passo do passeio, chegam ao destino em jatinhos próprios ou alugados no aeroporto internacional de Salvador ou no de Ilhéus. Já em terra, uma jovem da empresa de turismo, após ouvir nossa conversa, se ausenta por uns instantes e volta correndo, com um mapa publicitário nas mãos. “Ele está hospedado neste resort aqui, ó! [aponta]. Lá tem até pista para avião particular.” O condutor dos barcos completa. “À tardezinha, se você caminhar por essa praia aqui [mostra o trajeto], lá na parte mais tranquila, perto do resort, na praia de Bombaça, é capaz de você dar de cara com ele passeando por lá.” Agradeço a atenção, devolvo o mapa e me retiro do local, sem palavras. Sou interrompida, no entanto, logo após cruzar a porta, por um grito. “Ei, pode levar esse mapa para você achar o caminho”, diz a prestativa funcionária com um largo sorriso nos lábios. “Não precisa, mas obrigada”, resta-me exclamar. Noelle Oliveira
Devaneios etílicos de um bêbado qualquer “Em países desenvolvidos, as pessoas não podem beber depois de dirigir, pois são presas imediatamente quando flagradas”, disse alguém que discutia as falhas da Lei Seca no Brasil, enquanto bebia sua cerveja. E completou, enquanto rodava a chave do carro entre os dedos: “O Brasil é uma vergonha. Todo mundo dirige bêbado”. O fato é: ninguém deve pegar no volante após beber. É uma questão de responsabilidade. Mas, antes de discutir as falhas da lei, da fiscalização, é preciso discutir as falhas no
sistema brasileiro. Voltemos à discussão. Se beber, não dirija. Se não for dirigir, não saia de casa. Ou durma seja lá onde for beber. Claro. Vamos bater na mesma tecla. Não temos ônibus. “Pague um táxi”, argumentou o ser que iniciou a discussão. Mas, para pagar o táxi, algumas pessoas perderiam todo o dinheiro reservado para o lazer do fim de semana. E, se brincar, apenas em uma viagem. “Beba perto de casa e vá a pé”, indica, ainda com o copo de cerveja na mão. Lógico. Se hoje em dia a pessoa é assaltada facilmente em um local movimentado, imagine a festa que fariam os sequestradores da modalidade relâmpago com um bêbado, ou um grupo deles, trocando as pernas em plena madrugada. Eles ainda seriam obrigados a ouvir: “Quem mandou andar bêbado pela rua a essa hora?” Não está fácil pra ninguém. Talvez a indústria etílica se sensibilizasse e fechasse uma parceria com os governos para promover transporte e segurança para a população caso os brasileiros fizessem greve de álcool por apenas um fim de semana. Imagine os prejuízos de proporções astronômicas. A discussão seguiu até altas horas. Terminou somente com um: “Não tem jeito. Por isso o País é essa bagunça”. O promotor da discussão levantou-se, pagou a conta, deu alguns passos e tropeçou. Olhou para trás. Sorriu. Recusou a carona. Negou-se a deixar o carro no local e a pedir um táxi. “Tá louca? Pra eu chegar aqui e meu possante estar depenado? Jamais!” Voltou dirigindo pra casa. Por sorte, não tinha uma blitz no meio do caminho. Por sorte, chegou em casa sem provocar um arranhão a ele ou a qualquer outro passante inocente. Por falta de sorte, as reclamações dele não passavam de devaneios bêbados, os mesmos que acometem boa parte da população brasileira que acredita mais em palavras que em ações. Rachel Weber
Brasília 61 visões Bruno Bravo
bruno.recife@gmail.com
B
Josenaldo Araújo, 25 anos
rasília representa uma mudança revolucionária na história
Com três dias estava trabalhando como auxiliar de pedreiro. Com
de Josenaldo Araújo. Ele seguia viagem de Alagoas a Minas
três meses trouxe a mulher e a filha para morar com ele.
Gerais, onde trabalharia no corte de cana-de-açúcar, numa
Narra sua história de dentro do Estádio Nacional, onde se dedica
tentativa desesperada de mudar a vida de fome e humilhação
à obra para a Copa do Mundo de 2014. São 18 horas, o sol ainda
da família. Quando o ônibus parou em Brasília, ele perguntou à
não se pôs, e ele acabou de chegar para uma jornada de trabalho
passageira ao lado onde estavam. “DF”, ela respondeu. “DF? O que
madrugada adentro. Josenaldo é um sujeito alto, magro, a pele
é DF?” “Distrito Federal. Brasília, capital do Brasil!”, ela explicou.
de um tom duramente marcado pelo sol dos dias em que tirava
Nessa hora qualquer coisa que lhe tenha passado pela cabeça o fez
sua sobrevivência do asfalto, vendendo laranjas. Está encostado
pedir licença, pegar a mochila e descer. “Vou ficar aqui.” Era uma
ao lado dos galpões usados como vestiários pelos operários. O
manhã fria e, quando pôs os pés no Planalto Central e respirou o ar
cigarro pende apagado no canto da boca. A caixa de fósforos está
do Cerrado, soube que havia tomado a decisão certa.
nas mãos, mas acendê-lo torna-se um ato de pouca importância
Estava na Rodoferroviária, comia um lanche e memorizava o
durante a conversa, por isso constantemente adiado.
endereço de um quarto para alugar por R$ 250 em Samambaia.
“Não sei o que me fez descer do ônibus na metade da viagem. Mas
Era metade de tudo o que tinha, mas resolveu apostar. Deu certo.
Brasília salvou a minha vida.”
Este retrato é parte do projeto Brasília 61 visões. A intenção do fotógrafo é revelar a cidade pela cara das pessoas, anônimas ou não, e relatar sua relação com a capital.
12 df–se
m e m ó r i a s em
mm Texto e fotos Guilherme Assis * Ilustração Nillo Samyr jornalismo.assis@gmail.com
A cultura audiovisual substituída pelo comércio. O que antes era cine hoje é história. Um cinema de Niemeyer, um destombado, vários pornôs. A memória de um cinéfilo de Boquim. A história das histórias das salas de Brasília e de Aracaju
prêmio meiaum
para futuros
Jornalistas
A sala é escura. Uma tela matte white para projeção da película. Aos poucos as cadeiras são ocupadas. Casais se abraçam, viúvas observam os pombinhos como se lembrassem uma época em que isso era comum para elas. Ao fundo, os mais discretos ou os que sabem que, lá de trás, podem ver muito mais (até a nuca dos outros espectadores). Nas fileiras da frente, os atrasados. De pé, só o lanterninha. Depois de inúmeras propagandas do patrocinador, começa o filme. Tudo como em todas as outras salas. A quadra é a 106 Sul em Brasília e o projetor digital, caríssimo, em janeiro de 2012 apresenta um clássico do dinamarquês Lars Von Trier. O filme é o que menos importa agora.
Lá a sala também era escura. A tela era uma preocupação. Na verdade, não a tela, e sim o que era projetado sobre ela. As legendas eram transmitidas ao contrário, pois a “cabine” de projeção era atrás do grande tecido branco e não na frente, como é comum hoje. Além de prestar atenção nas cenas, o espectador tinha de inverter as traduções das falas do galã e da mocinha. Era em uma das ruas do centro comercial de Aracaju, Teatro Carlos Gomes. Numa noite quente de 1899, um filme num rolo de 18 metros, de título desconhecido ou perdido no tempo, foi o primeiro a ser apresentado para os sergipanos. Apenas quatro anos antes, alemães e franceses faziam as primeiras sessões no Velho Continente. Sergipe está na avant-garde.
14 O Cine Brasília ainda é conhecido por sediar o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro – agora está em obras. Com 607 (outrora) belas poltronas acolchoadas e em tom pastel, o local também atrai o público com circuitos internacionais de cinema de arte. Ocasionalmente traz algum crítico ou especialista e, em palestras, o espectador entende mais a linguagem do cineasta homenageado. A maioria das sessões é gratuita – as pagas custam R$ 6. O arquiteto da construção foi o imortal Oscar Niemeyer. O antigo Cine Rio Branco hoje é uma loja de móveis no centro comercial de Aracaju. Foi fundado em 1904 por Juca Barreto. Antes, levava o nome de Teatro Carlos Gomes. Lá, eram apresentados peças e filmes, mas, cinco anos depois, virou somente cinema. “Ô lugar pra ter viado”, relata Claudemir, taxista na capital desde 1990. “Eu era mais novo e ia às sessões pra adulto, sabe? Pornô.” Claudemir apresenta o quadro comum a vários cinemas no centro das cidades. Com o passar do tempo, a multiplicação dos multiplex, a TV a cabo, o DVD, a internet, talvez a única forma de atrair espectadores para os cinemas de rua fosse exibindo sexo nas telas. Às vezes, fora dela. O Cine Rio Branco virou ponto de encontro sexual. “Tu tava vendo o filme e o baitola colocava a mão no teu p...!”, embrutece o taxista. Em 1976, foi comprado um ar-condicionado para a sala de cinema isolada em meio aos prédios da Asa Sul. A partir daí, o público cresceu. “Parece que antes as sessões não tinham muita gente, quando colocaram o ar-condicionado o pessoal gostou”, conta o aposentado José Bandeira, frequentador do Cine Brasília desde aquele ano. O Cine Rio Branco ficava próximo ao Edifício Maria Feliciana, antigo maior prédio do Nordeste, com 26 andares. A partir de 1945, ocasionalmente, a sala era ocupada por membros de partidos políticos para reuniões. A cultura era substituída pela política. Outro detalhe interessante: o Rio Branco foi o primeiro monumento brasileiro destombado. Quem explica é Ivan Valença, de 59 anos, crítico de cinema e historiador da cidade. “A revogação de tom-
bamento foi requerida pelos proprietários em 1991. Queriam vender o imóvel.” O processo jurídico pedia que fosse retirado do prédio o título e, pelas palavras do proprietário, Luiz Barreto (filho do fundador), fosse preservada apenas a “memória do cinema” – não o local. De 18 de dezembro de 1991 a 26 de março de 1998 desenrolou-se, em Aracaju, um teatro jurídico. De um lado, segundo a peça cedida por Ivan, “o estado passava por sérias condições financeiras e não tinha interesse de adquirir o cinema”. Do outro, o comércio imobiliário gritava pelo retorno do prédio a quem queria vendê-lo imediatamente. Em 1998, saiu no Diário Oficial do Estado: “São expedidos ofícios aos proprietários do imóvel, encaminhando cópia do decreto e certidão que invalida o tombamento do Cine Rio Branco”. Sergipe perdia não apenas o cinema mais antigo do Brasil em funcionamento contínuo, mas a valorização cultural. Missão social Fui ao fundo do baú cultural para encontrar histórias sobre cinemas de Brasília. Fui também a Aracaju para mostrar um dos vários pedaços do Brasil que perderam completamente os tradicionais cinemas de rua. Boquim, município do interior de Sergipe, é outro palco de história neste texto. Aqui em Brasília, a maior renda per capita do País. Acolá, uma cidade nordestina até a raiz da macaxeira que vira farinha para o povo comer. Um povo que se agrada com quem se preocupa com essa cultura. Brasília tem mais de 70 salas de cinema. Aracaju, apenas 14. Aqui, um prédio no centro de Taguatinga, famoso por ser uma das primeiras construções de alvenaria da cidade, foi casa do Cine Paranoá. Lá era festa! Alunos saíam mais cedo do colégio e trocavam os uniformes por camisetas. Tudo para burlar a entrada, que era fiscalizada. O cinema contava com uma sala de espera ampla, com grandes sofás confortáveis revestidos em couro. Logo ao centro do salão principal, um platô com expositores e fotos dos filmes que seriam exibidos, segundo a administra-
ção da cidade. A primeira exibição no local, o filme Hércules de Tebas (Giorgio Ferroni, 1964, Mark Forest como Hércules). Anos depois, viraria ponto de encontro para quem procurava sexo. De Hércules a Dionísio. Mais tarde se tornou uma igreja. Ou melhor, duas. O prédio, que hoje se chama Paranoá Center, já foi palco para pastores da Igreja da Graça de Deus e da Igreja Mundial do Poder de Deus, ambas com relações indiretas com a Igreja Universal, conhecida por fechar vários cinemas e construir templos exuberantes. Acolá, no centro de Aracaju, próximo ao porto da Barra dos Coqueiros, havia o Cine Palace, considerado o mais luxuoso da cidade. A inauguração foi em 1º de janeiro de 1956. Os 850 lugares ficaram lotados de gente que queria conhecer a tecnologia do Cinemascope, à época um processo novo. Ivan Valença conta o fim do Palace. “Aracaju tem uma característica estranha: costuma queimar etapas no desenvolvimento, passar batido por fases que em cidades mais estruturadas são inevitáveis e servem para preparar o mercado. O fim do Cine Palace mostrou o que era futuro e já é o presente dos cinemas em todo o mundo: apenas partes de shopping centers, mais chamarizes de público para lojas e lanchonetes.” A última exibição no Palace, em 1996, foi Prazer de matar, com Antonio Banderas e Victoria Abril. Hoje é uma esquina chamada Center Palace onde funcionam salas comerciais. O Cine Drive-In, outro pioneiro na capital brasileira, é um cinema à moda norte-americana. Desde 1973 no Planalto Central, próximo à Esplanada dos Ministérios, mais precisamente numa área do Autódromo Nelson Piquet, mantém a tradição dos cinemas para carros. Recebia mais de 500 carros de estudantes da UnB, casais de idosos, cinéfilos e demais frequentadores do cinema ao ar livre, como é chamado. O detalhe? Esse cinema é o último no gênero do Brasil, segundo a Filme B. De volta a Aracaju, o Cine Vitória. Inaugurado em 1943 por João Moreira Lima com o filme E as luzes brilharão outra vez, o cinema ficava no Edifício Pio XI, na rua Itabaianinha – próximo
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ao mercado de artesanato. Tinha 1,2 mil poltronas e durou 40 anos. Em 1973 foi arrendado e passou a depender de donos que não faziam gestão alguma do local. Lima, o fundador, temia o fechamento. Em 1982 enviou uma carta ao presidente João Figueiredo. Em quinze parágrafos, Lima, que também dirigia o Cine Vera Cruz, recorreu, em súplicas, ao poder máximo do Executivo, na tentativa de manter na cidade uma sala histórica, onde rodaram filmes como Sansão e Dalila, Quo vadis, Ivanhoé, A roda da fortuna, Cantando na chuva. Trecho da carta dizia: “Senhor presidente, minhas dificuldades na direção dos cinemas começaram há uns dez anos. Eu completava 30 anos na direção destes cinemas que obedeciam orientação católica. Havia, no Brasil, quase uma centena de cinemas com esta mesma orientação. O primeiro impacto que ocorreu foi com o extinto Instituto Nacional do Cinema. O Cine Vitória foi multado porque não encontrava, no mercado, filmes nacionais próprios para os nossos cinemas. A Lei determinava 100 dias anuais para exibição obrigatória de produção brasileira. Recorri, mas não valeram as explicações [...] Não tive direito a voz, apesar de ir representando os exibidores de Sergipe, todos atingidos pelos filmes nacionais de péssimas qualidades”. Moreira Lima tentou, mas a sala foi vendida ao Banco do Nordeste por 150 milhões de cruzeiros em 1984.
não sabia falar sobre o patrimônio do pai, apenas a data de inauguração e o número de poltronas: 1960 e “350 acolchoadas com 100 de madeira”. Se era para falar do cinema, do glamour, dos filmes, Heró, “que mora na Rua dos Correios”. No interior de Sergipe e em grande parte do Nordeste é assim mesmo. Todo mundo se conhece e sabe onde mora. Atravesso a rua da casa de Luiz e encontro a tal Rua dos Correios. Heró não estava na casa, mas arrisquei perguntar para alguns jovens que jogavam dominó na calçada. “Seu Heró acabou de descer a rua de bicicleta, foi à casa de Miguel”, responde um deles. Desço a rua e encontro um senhor sentado numa cadeira de bambu ao lado de um amigo. Os óculos ao estilo Woody Allen já me deixaram com boas expectativas, apesar do abadá em contraste. Heró é sergipano simples em palavras e nível cultural imensurável. Começa a me contar suas experiências do Cine Santo Antônio. “Se me perguntarem qual o primeiro filme que vi, respondo que
Sapateiro e cinéfilo Nosso próximo personagem não é um cinema. Encontrei numa das ruas de paralelepípedo de Boquim o cinéfilo Heró Sapateiro. Antes de achar essa figura folclórica conversei com Luiz, filho de Antônio do Cinema. Antônio era o dono das antigas salas da cidade. Luiz
Aí o cabra diz: Meu fi, já chega. Precisa falar mais nada, não.” A mente decorou em versos os primeiros filmes. Dá uma gargalhada, orgulhoso das lembranças. Só nesse momento entendo que me deparei com um homem-memória, talvez a maior personalidade da cidade. Heró continua a me contar sobre suas ex-
‘O Cine Santo Antônio Foi inaugurado em dez de março de mil novecentos e sessenta O primeiro filme foi Torturado pela angústia O segundo, Em cada coração uma saudade Terceiro: A carrocinha com Mazzaroppi Quarto: Curuçu, o terror do Amazonas [...]’
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“meu filho, sabe o ator de planeta dos macaco? charlton heston.” Heró Sapateiro
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prêmio meiaum
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periências no lazer, considerado por ele, mais importante da cidade. Como é de praxe levar a paquera para assistir a um bom filme, no escurinho que só o cinema proporciona, pergunto: “Heró, e as namorada?”, sem plural mesmo, como é aceitável. Lembra com prazer não de uma, mas quatro namoradas. E, com vergonha, lembra quando as quatro foram ao cinema no mesmo dia. “Primeiro eu ia encontrar uma, né? Não sou besta. Quando vi a outra entrando, me enrolei na cortina. Vai dar problema. Nesse dia eu saí e não vi filme. Parece que adivinharam”, ri. “Nessa época tinha 27 anos.” Interrompe o assunto das namoradas para me fazer uma pergunta de que se envaidece de sempre saber a resposta: “Meu filho, sabe o ator de Planeta dos Macaco?”, agora é ele sem plural. “Essa eu pulo, Heró.” “Charlton Heston”, diz, enquanto aperta os olhos e abre um sorriso que quase encosta nas orelhas. Heró revela um repertório para mim ainda desconhecido. “Salomão e a Rainha de Sabá, com Yul Brynner e Gina Lollobrigida. Rômulo e Remo, com Steve Reeves...”, enumera, meneando a cabeça como se eu soubesse do que ele estava falando com sotaque sergipano carregado, que só entendi plenamente com a ajuda da minha mãe (sergipana) e do Google. “Mazzaroppi, o vendedor de linguiça, Conde Drácula, Guerra dos mundos...”, quando ia fazer uma lista de outros filmes que viu, pausa a voz, arregala o olho, fita meu gravador e me surpreende: “Você tá me entrevistando, é?”, questiona, aos 15 minutos de entrevista. Heró esbanja a pura simplicidade característica de seu povo nordestino. “Vai pra Recór?”, Miguel, o amigo banguela que o acompanha, me pergunta. Continuo sorridente. Voltando ao filme
do Drácula, pergunto: “O Drácula era o Bela Lugosi?” “Não, rapaz”, me repreende. “Era Christopher Lee”, corrige. Depois lembro que O Drácula de Lugosi foi feito em 1931. O Drácula de Lee, em 1958. Com 63 anos de experiência, Heró diz que um espaço para exibição de filmes na cidade faz muita falta. Os olhos se enchem de lágrimas ao explicar que, além de se divertir, fazia muitas amizades após as sessões. “Queria muito o cinema de volta. Queria muito.” “A morte comanda o cangaço, com Alberto Ruschel. A lei do sertão, com Maurício Morey. O cabeleira, com Milton Ribeiro. Arara vermelha, com Milton Ribeiro também. A lei do cão, com Paulo Frederico e Jece Valadão. Obsessão, Jece Valadão e Edson França. Bonitinha, mas ordinária, com Jece Valadão. Paixão de um homem, com Valdick Soriano. O poderoso garanhão, com Valdick Soriano...” Heró é enciclopédia oral de cinema brasileiro. E o apelido Heró não está ligado aos filmes eróticos, como meu preconceito achava. O homem é um amante do cinema. “Você sabe quem era o ator de Ben-Hur?”, lá vem o velho novamente com seu questionário, quase um Show do Milhão sobre filmes. “Ih, não sei, Heró.” “Charlton Heston”, sorri novamente. Heró menciona ainda as belas atrizes que venerava: “Brigitte Bardot, Sophia Loren, Gina Lollobrigida...” Ia continuar a lista, se lembra de algo importante e solta outra pergunta: “Já assistiu a Moscou contra 007, rapaz?” Imagino que o protagonista poderia ser mais uma vez o tal do Charlton Heston, mas algo me diz pra ficar calado. “Sean Connery”, revela. Alívio.
E as salas, onde estão? Boquim fica a 88 quilômetros da capital. Lá havia três cinemas. Todos do mesmo dono. Consultada, a Prefeitura de Boquim informou que um desses cinemas ainda existe. Na verdade o que existe é apenas um memorial feito para guardar algumas peças antigas do Cine Santo Antônio, onde, ocasionalmente, são apresentados alguns filmes. De fato existe o antigo prédio e, por insistência (12 e-mails e oito ligações), consegui autorização para fotografar o último projetor utilizado por Antônio do Cinema. Departamentos da Universidade Federal de Sergipe, contatos na Secretaria de Cultura, na prefeitura. Nenhuma informação. Lá é comum motorista não parar na faixa de pedestre, motoqueiro não usar capacete. É comum departamentos públicos não funcionarem na sexta-feira. É comum “essa gente” não responder a e-mail, afirma Pablo José, jornalista que conheci num ponto de ônibus. De volta a Aracaju, conversei com Isaac Galvão, diretor do Centro de Criatividade da capital. O órgão em que trabalha é responsável por organizar, direcionar e realizar metas para o ramo audiovisual na capital. “De Brasília, é? Pra qual jornal?” A pergunta só veio depois que ele percebeu que a entrevista não era por e-mail, mas ao vivo. É minha vez de questionar: “E as salas de cinema de rua que não funcionam mais?” “Pois é! Não tem nenhuma e talvez nem no estado todo. Só em shopping mesmo, e é caro”, assume. “A gente tem um projeto bom aqui, rapaz, deixa eu achar pra você.” Isaac encontra um folder na gaveta. O título do material é: Projeto Orlando Vieira, 80 anos. Existe de fato trabalho produzido naquele setor, mas nada de relevância em relação às poucas salas de cine-
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Muita grana, pouco investimento Existe um projeto do Ministério da Cultura chamado Cinema Perto de Você. Instituído pela Lei 12.599, de 2012, o programa oferece capital para os empreendedores. Esse projeto atenderá, prioritariamente, aos nada menos de 92% dos municípios brasileiros que não têm nenhuma sala de projeção. Boquim poderá ser uma delas. Aracaju, por ser capital, também será beneficiada. Brasília, provavelmente. O necessário para a instalação de uma nova sala é apenas um empresário interessado concorrer ao edital. O Cinema Perto de Você direcionará mais de R$ 500 milhões para abertura de salas em todo o território nacional. Isaac Galvão, o diretor, nunca tinha ouvido falar no assunto. O projeto tenta corrigir um paradoxo da indústria exibidora nacional. Segundo a Agência Nacional do Cinema (Ancine), a renda de bilheteria dos filmes estrangeiros exibidos no Brasil foi de R$ 1,27 bilhão em 2011. Há, sem
dúvida, crescimento do número de ingressos vendidos ano após ano. O problema é que grande parte desse dinheiro circula apenas nos grandes empreendimentos comerciais cinematográficos, como Severiano Ribeiro, Cinemark, Cinematográfica Araújo, Rede Arco-Íris, United Cinemas Internacional Brasil. De todo esse valor produzido, não há interesse para investimento em cidades do Nordeste e de outros recantos do País onde não há sequer projetor de filmes. Pedro Butcher, analista e especialista em cinema da agência Filme B, apresenta um quadro desproporcional aos valores altíssimos produzidos pela indústria audiovisual: “As salas de cinema no Brasil não são suficientes. O índice de habitantes por sala do País (uma sala para cada 82 mil habitantes) é considerado um dos mais baixos do mundo”. Butcher concorda que haja enorme desigualdade na localização de cinemas, mas aponta um futuro promissor. “Há também muita concentração no Sudeste (reproduzindo a concentração de renda do País) e, nos estados do Nordeste, os cinemas estão bastante concentrados nas capitais. No entanto, nos últimos dois anos começaram a ser abertos cinemas em cidades do interior (Feira de Santana, Caruaru) com resultados expressivos. E há
expectativa de crescimento em cidades de médio porte.” No mercado cinematográfico, o Brasil é um dos países mais importantes do mundo [apenas considerando fatores mercadológicos]. Porém, como é visível em outras estruturas socioculturais do País, existe contraste gritante a respeito de investimento onde ainda não há cinema. São 5.565 municípios. Apenas 445 têm salas de projeção. Vladimir Carvalho, cineasta paraibano, autor de 22 filmes, documentarista e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), opina sobre a tendência mercadológica predominante. “O cinema norte-americano domina os grandes complexos, o que tira o espaço dos cineastas brasileiros. Infelizmente essas empresas dão preferência ao grande circuito hollywoodiano.” Sobre o Cinema Perto de Você, ele vê como “um começo, porém um começo mal divulgado. Poucos empresários conhecem. Acima de tudo, poucos empresários gostariam de com) petir com a hegemonia dos shoppings”. )
ma além shopping. Ele me explica que há uma verba destinada para 2013 que será utilizada para reabrir um cinema na Rua do Turista, em Aracaju. “Agora, sim, serão sessões voltadas para cultura, e não comércio”, afirma, ao reforçar que as sessões serão gratuitas.
*Reportagem originalmente publicada em 2012 na Jenipapo, revista do curso de comunicação social da Universidade Católica de Brasília, sob orientação da professora Karina Barbosa.
Fora do Plano por NOELLE OLIVEIRA noelleoliveira@meiaum.com.br
Sem estádio, sem desculpa
Se a data de inauguração do Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha não se concretizou, não seria a quantia investida na construção que seguiria o caminho planejado e inicialmente divulgado. Tudo mudou, mas só oficialmente. Há exatamente um ano, nesta mesma coluna, a meiaum informava que o governador Agnelo Queiroz já estava ciente de que não seria possível inaugurar a obra no fim de 2012. Toda a cúpula do governo sabia disso. Com sorte, o estádio sairia a tempo da Copa das Confederações, mas, certamente, não em 2012, como havia sido acordado com a Fifa. Mesmo para o início de 2013, a tarefa era complicada. O então secretário-executivo do Comitê Organizador Brasília 2014, Cláudio Monteiro, não deu o braço a torcer. Manteve a inauguração e a entrega agendadas para o último dia do ano. Informou aos quatro cantos até mesmo o horário marcado: às 11 horas. Monteiro afastou-se do governo – acusado de envolvimento com a organização do bicheiro Carlinhos Cachoeira –, voltou cinco meses depois, nomeado secretário extraordinário da Copa de 2014, e confirmou o atrasado já esperado. O ano mudou, chegamos a janeiro de 2013 e a Fifa não ficou satisfeita. A inauguração foi remarcada para 21 de abril, no aniversário de 53 anos de Brasília. Dias antes, em 15 de abril, no entanto, a obra tem que ser entregue ao órgão internacional, completamente pronta.
Façam suas apostas O contrato do governo com o consórcio que executa a obra vai até julho de 2013. Além do que está em execução na estrutura, principalmente na cobertura do estádio, faltam a licitação e a contratação de serviços. Entre eles o tratamento acústico, a comunicação visual, a urbanização, o paisagismo, um heliporto, os mobiliários e o túnel entre o estádio e o Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Agnelo já está avisado, atrasos estão proibidos desta vez. Antes da abertura da Copa das Confederações, em 15 de junho – com o jogo entre o Brasil e o Japão –, o estádio ainda terá de ser testado.
A princípio, serão três partidas, que devem ocorrer em maio.
Tempo é dinheiro Além de a obra estar saindo quase 50% mais cara que o previsto, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) analisa irregularidades no uso do dinheiro público. O valor inicial do contrato passou de aproximadamente R$ 696 milhões para mais de R$ 1 bilhão, diferença de 48,43%. Foram 19 aditivos. Dentro do valor total do estádio, o tribunal identifica gastos de mais de R$ 112 milhões como resultado da prática de preços superiores aos do mer-
cado. O controle do TCDF já havia promovido economia de quase R$ 100 milhões na fase de licitação. O estádio brasiliense é a mais cara das 12 arenas da Copa do Mundo. Para Agnelo, isso se justifica por se tratar de uma obra totalmente sustentável. Não é o que diz o TCDF, que viu problemas como a escolha de materiais sem o devido estudo de reaproveitamento, duplicidade de custo de equipamentos, utilização inadequada de encargos trabalhistas, valor de vale-transporte superdimensionado e pagamento indevido de serviços. Seja como for, os ingressos para a abertura da Copa das Confederações em Brasília estão disputadíssimos.
Conto
Melhor sem eles
A mulher independente A solidão não assusta as guerreiras de Brasília Texto João Pitella Junior Ilustração francisco bronze pitellajr@globo.com
Amiga, preste atenção: se eles dizem que “todas têm um ponto fraco”, deveriam me conhecer. Sim, pode escutar os meus conselhos, aprenda com quem tem um pouco mais de experiência. Eu disse “um pouco”, viu? Há umas coisas sobre mim que você vai poder usar na sua vida. E que fique tudo entre nós, claro. É guerra. Vou começar do básico: não, você não precisa deles! Acorde, você está no século 21. São eles que precisam de nós. Parece que todos perderam a mãe, ou que nunca tiveram uma. No começo fingem que são adultos, sensíveis e responsáveis. Até conseguem te ouvir. E conversam de um jeito maduro. Entendem suas necessidades. Seguram a sua mão nos momentos difíceis. Tudo teatro. Acredite, todos só querem outra mãe. Mesmo quando não são órfãos, é só isso o que procuram, nas horas em que conseguem buscar alguma coisa além do sexo. A mãe ou o sexo. Se é que existe diferença... Foi Freud quem falou isso? Não, ele deve ter copiado de alguma mulher. Um homem não conseguiria ser tão perspicaz. Freud? Aposto que eles só ouviram falar no Fred, aquele jogador.
bronze@grandecircular.com
Agora, minha amiga, olhe para nós, veja quem você é. Eu sei quem sou — uma mulher independente da capital da República, bonita, segura, saudável, malhada, super profissional. Juventude e maturidade, aos 30 e poucos anos. Talvez um pouco mais. OK, não precisamos entrar nesse detalhe. Você e eu já entendemos. E eles, quem são? Será que eles seriam capazes de absorver alguma realidade fora do universo futebolístico, ou de fazer tantas coisas ao mesmo tempo? Calma, não ria tão alto. O pessoal aí da mesa ao lado vai achar que somos duas malucas. Então, vou te contar a história do último idiota que passou pela minha vida. Nós estávamos saindo há algum tempo e um dia resolvemos lanchar na praça de alimentação do shopping antes de ir ao cinema. Era um filme bobo, daqueles de herói. É ridículo, os caras não crescem. Juro, amiga, esse já passou dos quarenta e ainda tem aquelas frescuras de Batman, Homem-Aranha, Darth Vader. Só matando. No meio da conversa, eu falei alguma coisa sobre gostar de filmes em que aparecerem pessoas normais, sem superpoderes, com
famílias para criar. Foi só um comentário banal. E o imbecil quase engasgou com o canudinho do refrigerante. “Eu não quero me envolver” — ele falou, como se alguém tivesse perguntado alguma coisa. Que anta! Achou que eu estivesse dando uma indireta de casamento, de relação mais séria. Tanta burrice, que você sabe o que eu fiz? Eu me levantei na mesma hora. Deixei o débil mental falando sozinho, babando no copo de coca-cola. Imagine se vou perder tempo com um cara que não tem neurônios pra interpretar uma frase tão simples! Não, querida, eu já me cansei desses sujeitos sem futuro, desses eternos filhinhos de papai de Brasília. E o pior é quando insultam a minha inteligência. Pensam que vou esperar príncipe encantado? E, claro, todo babaca acha que ele é o cara certo pra você, aquele que finalmente vai “te salvar da solidão”, como se você não estivesse super bem sozinha. Dá vontade de mandar tomar... Eu sei. Não vou começar a falar igual a eles. Até posso dizer palavrão em mesa de bar com as minha amigas, e daí? Eu tenho
21 não pensa em coisa séria não consegue nem ser infeliz. Já tô viajando... Pois é, eu sei que você precisa ir agora. Também estou cansada do trabalho. Ainda tem isso, nós trabalhamos muito; mas amanhã começa o feriadão. Se vou ficar em casa? Não queria... Eu sei, não tem nada pra fazer em Brasília numa tarde de feriado. Fica meio triste no pôr do sol, quando olho da janela e vejo aquela quadra vazia e ouço os barulhos dos vizinhos. Criança chorando, casal brigando, a música do Caetano que vem do apartamento ao lado: “Gosto muito de você, leãozinho”. Deprimente, né? Não, amiga, eu falei deprimente no sentido figurado. Adoro o Caetano. Você não conhece essa música dele? Acho que era da minha infância. Aquela que entrega a idade... De uns tempos pra cá, comecei a achar que qualquer música pode estragar o seu dia. Sério, vai por mim: o negócio é escutar só notícia. Nada de lembranças. Não, não vou ficar mal se precisar passar o dia em casa amanhã. Talvez eu visite o meu sobrinho. Eu prometi uma “tarde com a tia”. Ele é um fofo, você precisa ver. Outro dia me perguntou por que só eu não tenho namorado. Aí eu falei: “Você é o meu namorado!” kkkkkkk E agora tenho o meu gatinho. Não, sua boba, é o gato bichinho! Você precisa ver, ele sempre me recebe todo carinhoso quando chego do trabalho. É a vantagem dos seres não humanos: eles gostam de você incondicionalmente. Sério, não tem problema mesmo. Juro que vou ficar bem. É como eu te falei, a mulher se recicla, se supera. Somos as guerreiras brasilienses. Sempre fortes. Aquela fase que você viu já passou há muito tempo. Eu sei, eu tinha ficado sozinha em casa, ouvindo todo aquele barulho dos vizinhos, e me distraí, comecei a pensar em alguma bobagem. A palma da minha mão só sangrou um pouco porque eu estava com as unhas enormes. E acho que eu mordi os lábios, mas era fome. Dietas, dietas. Foi por isso que eu chorei. Já passou, amiga, já passou. Pode deixar. Vai tranquila pra casa. Nem precisa deixar o celular ligado. Eu vou ficar ) bem. )
personalidade. Agora, baixaria não! Nós temos classe até na hora do barraco. E comece a falar um pouco mais alto, pra você ver. O cara fica apavorado. Olha pros lados, pede pra você não dar vexame. Se estiver dentro de casa, diz que o vizinho vai ouvir. Eles deveriam ter vergonha é de si mesmos, mas isso nunca rola. Simplesmente não rola, querida. A coisa de que eles mais têm medo é mulher com atitude. Só te digo o seguinte: eu queria ter a chance de me relacionar com UM cara maduro. Só um. Deve ser pedir demais. Ah, e daquele outro, já te falei? Tinha virado pai solteiro, ou sei lá o que, e queria que eu “adotasse” a família dele, os filhos, a ex-sogra, a ex-cunhada. Se tem uma coisa que eu aprendi, é: não existe ex-sogra nem ex-cunhada. Fuja disso, de homem com passado. Só vai te arrastar pra trás junto com ele. A vida é pra frente! Ele se esqueceu de um detalhe: EU POSSO ESCOLHER! Não é porque eu nunca me casei que vou ser menos feliz. Nós estamos no topo do mundo. Sempre estivemos. Só demorou um pouco pra ficha cair. O pior é o cara “com problemas”. Já tive alguns assim. Um era até mitômano, sabe o que é isso? Ele inventa a mentira e acredita nela pra poder te manipular melhor. Não entre nessa, pelo amor de Deus. Se o infeliz começar a te perseguir, chame a polícia. Tem muito caso de violência por aí. Você viu aquele professor aqui de Brasília que matou a aluna? Pois é, fiquei apavorada. Tô correndo de gente doida. Ai ai... Pois é, andei sofrendo com um cara assim. É como se ele sugasse a sua energia, te anulasse; mas aí é que vem a diferença: nós conseguimos fazer uma reciclagem, renovar as forças. Eles são sempre os mesmos, até nas roupas. Eu me sinto outra pessoa quando faço a unha, uso um vestido novo, mudo o cabelo. É uma forma de recomeçar. Agora vou fazer um curso de hebraico. E umas aulas de krav magá. A sua amiga vai ser uma nova mulher. Você vai ver: projeto verão 2013. Por que nós somos tão melhores e eles parecem ser mais felizes? É só ilusão, porque eles nem são felizes; são uns bobos alegres. Quem
Perfil
Nas noites de sexta-feira, as mulheres fazem fila para dançar com ele. No dia a dia, porém, há quem fuja deste colecionador de suspensórios
Texto Noelle Oliveira Fotos Luana Lleras noelleoliveira@meiaum.com.br
fotografia@meiaum.com.br
G
ilson Sobral é figura rara, erudito do tipo que não pode ser desvendado à primeira vista. Independentemente da circunstância em que o conheça, o outro lado – aquele de que você ainda não sabe – será suficiente para surpreender com a mesma curiosidade que a primeira versão despertou. O outro Sobral, seja qual for, não é daqueles que precisa de anos de convivência para ser descoberto. Pelo contrário, é instantâneo, por isso, inesperado. A ordem dos fatores, no entanto, poderá influenciar o resultado, fazendo com que muitos o amem primeiro para depois o temerem, ou vice-versa. São poucos aqueles que conhecem sua história completa, e menos ainda os que conseguem assimilar todo o senso crítico que Sobral, como ser uno, tem a oferecer. A meiaum o conheceu dançando. O interesse pela dança foi justamente um dos primeiros saberes que despertou a curiosidade de Sobral. A irmã mais velha foi quem o guiou nos passos estreantes, ainda na adolescência na cidade de Floriano, no Piauí, onde nasceu. Com ela Sobral ensaiou passos de forró e samba. O frevo o acompanhou durante todos os carnavais de sua infância nordestina. Salsa e bolero foram ritmos apresentados por “aventureiros” vindos do Caribe que se apresentavam na pequena cidade algumas vezes por ano. “Eles chegavam em caravanas e todos ficavam maravilhados, inclusive eu.” Os cerca de 50 mil habitantes paravam para admirar os passos, e o garoto Sobral fazia questão de acompanhar toda a movimentação. “Costumo dizer que minha cidade é tão boa que saí de lá quando a população era essa, e o número de habitantes é o mesmo agora”, brinca. Quando chegou a Brasília, em 1964 – época do Golpe de Estado –, Sobral passou a frequentar os forrós semanais no Clube da Imprensa. Hoje, é dançarino conhecido das noites de sexta-feira na capital federal. É ele quem maravilha muitos e chama a atenção de outros tantos. As várias figuras femininas que, em fila, o aguardam para dançar deixam Sobral em foco na casa noturna lotada, repleta de jo-
vens. Ali, muitos o observam e informam que é figura rotineira. Os passos executados pelos pés calçados com sapatos lustrados são rápidos. Ele gosta das danças enérgicas, por mais que os cabelos brancos não digam isso. Tudo com destreza, bem ensaiado e regado a água. “Só bebo água, água de coco, suco. Tem gente que acha que eu estou drogado, já me ofereceram drogas, bebidas. Eu disfarço e só respondo que já estou legal”, diverte-se. O homem de 66 anos, trajando roupa social devidamente alinhada e um característico suspensório, se inebria de dança. Se estiver irritado, dança. Para espairecer, também dança. Se o intuito for sobreviver ao mundo “anárquico” – como ele mesmo avalia o cenário econômico, político e social brasileiro –, mais dança. Frequenta aulas de salsa todos os fins de semana, mas sabe um pouco de zouk e de samba de gafieira. Com as duas filhas mais velhas, Virna e Danusa, também fez aulas de sapateado americano. “Elas ainda eram pequenas. Eu as buscava no colégio e, como tinha que esperá-las terminar a dança para levá-las para casa, aproveitava e fazia a aula. Mas um dia elas desistiram, e eu as levava direto para casa”, ressente-se Sobral, que hoje também é pai de David, de 2 anos. “Ninguém sabe como isso aconteceu a esta altura!”, brinca. Gosta um pouco de todos os ritmos, mas ainda com destaque para o frevo e todos os passos que exigem força muscular e elasticidade. “Tenho complexo de jovem. Em qualquer lugar aonde chego percebo que causo reações diferentes. Uns me olham e riem, outros ficam de cara fechada. Não ligo”, gargalha. É irônico, divertido, sarcástico e simpático. Tudo sem perder o senso crítico, o que acentua cada uma de suas características. Se algo o irrita e dançar não basta, ele escreve. Não gosta de se sentir incomodado. Em nenhuma ocasião. Por isso veste os suspensórios. “Isso começou há uns dez anos. Compro a calça dois números acima do meu tamanho e fico à vontade.” É pelo mesmo motivo que durante o dia troca os lustrados sapatos da dança,
25 com solado de couro, por calçados desenhados para diabéticos. “Não sou diabético, mas os sapatos são confortáveis e folgados, não me machucam.” São cerca de 50 suspensórios e uma grande coleção de sapatos de dança de todas as cores – dos mais coloridos até os quatro pares brancos. Tem 2 mil discos. Só de ópera e balé são 200 DVDs. Compra quase tudo pela internet, mas, tirando isso, está na “Idade Média”, diz. “Não tenho Facebook, nem Twitter, nem nada disso. Nada contra, mas não tenho tempo.” quem sobrevive ao sobral? O outro lado de Sobral é tão irritado com as mazelas brasileiras quanto o primeiro. O segundo Sobral, no entanto, não dança. Ele escreve, reflete e ensina. A história é contada em uma das salas de professores nos corredores do Instituto Central de Ciências, da Universidade de Brasília. Sobral é um dos professores mais temidos pelos universitários. Tem lugar cativo na lista de docentes “carrascos”. Tudo começa no período de férias. Antes do início das aulas, o professor do departamento de Letras espalha pelos murais listas de obras a ser lidas, que incluem de nove a vinte livros clássicos, como A República, de Platão, e Os Lusíadas, de Camões. O resultado é uma relação com os alunos que mistura amor e ódio e uma fama que afugenta calouros de suas disciplinas. “A maioria tem terror a mim e não quer me ver nem pintado de cor-de-rosa, eu sei bem disso.” Mas a fama de “carrasco” o incomoda. “Preferia não ter de dar nota nenhuma a aluno nenhum. Muitas vezes eles têm razão, as obras são extensas e complexas. Mas, se eu não cobrar, eles não vão ler”, resume. “Faço provas tolas, provas difíceis, de decoreba e os trato nessa ocasião como alunos de colegial. Depois vêm as provas de conteúdo, que são universitárias realmente”, explica. Quem é aprovado nas matérias comenta a façanha e dá dicas em um fórum na internet que leva o título “Eu sobrevivi ao Sobral”. Um colega mostrou a página para o professor certa vez. “Eles reclamam, mas no final dizem que sou o professor com quem mais
26 aprenderam no semestre. Dá para entender? Não dá.” Sobral lê em média 15 livros, em português, por semestre. Sem contar os textos em latim e grego, que “são trabalhosos” e demandam tempo. É graduado em letras – bacharel em francês e inglês e licenciado em português e latim – e cursou mestrado em teoria da literatura. Fez curso superior, ainda, em comunicação social e em filosofia. Todos pela UnB. Também já estudou italiano, alemão e atualmente se aventura pela língua árabe. Servidor de vários órgãos públicos, aposentou-se como consultor do Senado na área de Educação. Antes, tinha passado pelo cargo de assessor na Câmara dos Deputados, mas não gostou do trabalho. “Eu tinha que escrever discursos políticos e aquelas ideias me irritavam muito”, lembra. Há 12 anos fez a seleção para professor da UnB. Lá dentro, percebeu que tinha se realizado profissionalmente. Em sua coleção pessoal, além dos sapatos, suspensórios e discos, estão 3 mil livros. Quatro deles publicados por Sobral – há também os não publicados: uma gramática de alemão, o primeiro volume de uma gramática de grego e uma entrevista que o docente concedeu a si mesmo – e outros tantos títulos consagrados de outros autores. “Gostaria de ser menos disperso. Aliás, não, não gostaria. Se eu puder escrever 40 livros dançando será ótimo, senão eu vou continuar do jeito que está”, conclui para si mesmo. Economia de tempo O professor planeja chegar aos 100 anos. “Tenho muita coisa para fazer e não dá tempo”, queixa-se. Sonha em alcançar o que define como “poder cultural”. “Queria aprender mais rápido. Queria ouvir duas horas uma pessoa falando chinês e sair de lá entendendo e falando aquela língua. Queria assistir a um músico de qualidade tocando violino e, duas horas depois, ser capaz de tocar como ele”, imagina. Em busca de economia de tempo, desenvolveu uma metodologia por meio da qual, em quatro meses, um estudante é capaz de ler e
eu escrevo, por isso sobrevivo. Agora, quem não faz isso, não sei como consegue sobreviver neste mundo."
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não temos preocupação social intensa”, diz. O professor é inimigo radical de qualquer religião. Ele se diz um “politeísta grego esclarecido”. A expressão não tem definição. “Julgo as pessoas pelas ações, não pelo que elas dizem.” Sobral acredita na possibilidade da existência de um ser superior, mas, como não sabe se ele existe, faz a opção por agir corretamente, independentemente disso. Como todo literato, se diz “arrogante”. Sabe muito sobre vários assuntos, e quer tratar sobre todos eles. Em suas aulas utiliza-se de um roteiro para não se perder. “Eu sou professor de literatura, eu não quero pensar nessas coisas, mas eu tenho que pensar. A sociedade está muito desacreditada, o País está desorganizado, anárquico. Nós estamos aqui em uma violência institucional sem precedentes”, avalia. “Estou extremamente irritado. Todo mundo já
sabe o que precisa ser feito, mas ninguém faz.” Críticas à parte, suas outras obras literárias são frutos do conhecimento nas diversas áreas de formação. É o caso do Guia analítico de Cinco minutos, de José de Alencar e do livro de mitologia Mito e logos. “Eu danço, eu escrevo, por isso sobrevivo. Agora, quem não faz isso, não sei como consegue sobreviver neste mundo. Como vocês conseguem?” Apesar de toda a irritação, Gilson Sobral, professor-dançarino, é feliz? A resposta não é simples. “Aristóteles define felicidade como razoável possibilidade financeira e a convivência com bons amigos. Se for isso, sim. Mas não acredito que seja bem isso, não posso dizer que encontrei algo como a felicidade se eu não tenho a certeza do que ela é”, resume o politeísta grego esclarecido. Como ele mesmo brin) ca, “graças a Zeus!” )
traduzir inglês ou francês. “Só não fiz isso com o italiano porque não havia público”, diz. Ministrou aulas particulares dos seus métodos em tempos de alta inflação no Brasil e, por isso, cobrava em dólares. “Cobrava caro, 100 dólares por mês. Fiquei conhecido como o professor que cobrava em dólares e todos se indignavam comigo. Mas não havia padrões, eu tinha que me adaptar”, resume, afirmando que é capaz de, em oito meses, ensinar alguém a ler e a entender alemão. A parte oral não é trabalhada. Em um de seus livros, Sobral mostra a irritação constante com a atual organização dos tempos. Peças infames – Teatro pornográfico e anti-religioso é o típico livro fruto de sua ira. “Eu leio um livro sobre a Idade Média e me aborreço com a igreja para o resto da vida”, explica. “Nós somos um povo meio primitivo,
CIDADES
Multiplicada pela metade Texto Paula Oliveira
Fotos luana lleras
paulaoliveira@meiaum.com.br fotografia@meiaum.com.br
A UnB levou para longe do campus Darcy Ribeiro o seu nome, mas não a sua tradição
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É
muito difícil ouvir alguém questionar a divisão da Universidade de Brasília em quatro campi: o da Asa Norte, chamado de Darcy Ribeiro, o de Planaltina, o do Gama e o de Ceilândia. Aparentemente, os campi em cidades-satélites são politicamente corretos: democratizam o acesso à universidade pública, descentralizam o ensino universitário, permitem aos moradores estar perto dos locais de estudo. Além disso, se diz, contribuem para dar mais vigor econômico a essas cidades e melhoram a autoestima de suas populações. E, afinal, diversas universidades federais, como a UnB, têm inaugurado campi em regiões distantes de suas sedes. O problema é que nem tudo que parece politicamente correto é mesmo, nem tudo que é bom para um estado da Federação é bom para o Distrito Federal. É natural que universidades federais de São Paulo, de Goiás, de Minas Gerais ou da Paraíba, por exemplo, tenham campi em cidades além das capitais. As longas distâncias e as peculiaridades regionais, às vezes bem acentuadas – e inclusive as rivalidades entre cidades e regiões – justificam a abertura de campi e de outras universidades federais no interior desses e de outros estados. Outra realidade é a do Distrito Federal, pequeno retângulo de menos de 6 mil quilômetros quadrados. Planaltina está a 40 quilômetros do Plano Piloto. O Gama, a 30. Ceilândia, a 26 quilômetros. Campina Grande está a 130 quilômetros de João Pessoa, Bauru a 350 quilômetros de São Paulo e Macaé a 180 quilômetros do Rio de Janeiro. Seria muito mais lógico, racional, econômico, justo e inclusivo que, em vez de gastar até agora R$ 60 milhões nos campi nas cidades-satélites, a UnB aproveitasse a enorme
(3,9 milhões de metros quadrados) e ainda pouco ocupada área que tem o campus na Asa Norte para construir novos prédios, oferecer novos cursos e receber mais alunos de todo o Distrito Federal. Mesmo que tivesse de subsidiar o transporte de ida e volta das cidades-satélites para o Plano Piloto, sairia mais barato – e mais eficaz. A expansão O processo de expansão da UnB teve início em 2006, com a instalação da Faculdade UnB Planaltina, ainda que de modo improvisado, e ganhou força com a criação, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais. O Reuni foi instituído em 2007 para atender à meta, estabelecida no Plano Nacional de Educação, de aumentar o acesso à universidade e assegurar a permanência dos estudantes na educação superior. As universidades que aderem ao programa recebem recursos para construir prédios e contratar professores e funcionários, possibilitando a ampliação de vagas nos cursos existentes e a abertura de novos. A meta era aumentar em 20% o número de matrículas em cinco anos. O crescimento foi de 51% de 2007 a 2011. Esse aumento desenfreado traz consequências para a qualidade do ensino. Instalações inadequadas, professores contratados às pressas, tudo para atender a necessidades que não estavam previstas. Com o dinheiro do Reuni, algumas universidades federais abriram novos campi em cidades distantes das suas sedes. Distantes, é importante frisar. Não saíram duplicando campi em bairros próximos uns aos outros, como no DF. O Reuni dá as condições financeiras para o aumento das vagas, mas não as
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condiciona à descentralização física. As 59 universidades federais brasileiras requereram o recurso. Cada uma precisou elaborar um plano de reestruturação com estimativa dos recursos adicionais necessários para alcançar as metas. A UnB programou a construção de três campi descentralizados. Segundo informações da universidade, o campus de Planaltina está concluído. As obras das Faculdades UnB Ceilândia e Gama estão ainda em andamento. A primeira deveria ter ficado pronta em 2009 e a segunda, no início de 2012. Para as novas unidades, a UnB criou os cursos de farmácia, fisioterapia, gestão em saúde, terapia ocupacional, engenharia automotiva, engenharia de energia, engenharia de software, engenharia eletrônica, ciências naturais, educação do campo, gestão ambiental e gestão do agronegócio. O Guia Abril dos Estudantes – Melhores Universidades 2012 classificou 25 dos 65 cursos da UnB com cinco estrelas, o que significa avaliação excelente. Desses, somente um (farmácia) está na lista daqueles criados pela UnB para atender à meta de expansão da universidade. Do Reuni, a UnB recebeu R$ 25.610.200 para a construção de prédios de salas de aulas, laboratórios e toda a estrutura necessária para os alunos nessas três regiões administrativas. Recebeu também R$ 34,1 milhões provenientes de emendas parlamentares e da empresa pública Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O investimento é alto e se torna ainda maior considerando que cada um dos campi precisa de orçamento para manutenção, contratação de funcionários, transporte, luz, água, telefone. Os campi são temáticos. Saúde em Ceilândia. Engenharias no Gama. E questões rurais em Planaltina. “Se a gente fizer todos os cursos do Darcy Ribeiro em Ceilândia, vai
O campus do Gama fica na entrada da cidade e abriga cursos de engenharia. Deveria ter ficado pronto em 2012, mas ainda está em obras.
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ter de dobrar o número de professores”, diz Ivan Camargo, reitor da UnB. “Fazer o campus temático é uma prática para racionalizar os custos”, justifica. Dividir o curso de medicina não valeria a pena financeiramente e em termos de logística, segundo o reitor, embora seja o curso mais procurado entre os oferecidos pela instituição. Seria uma opção, reconhece. “Não sabíamos direito qual era a demanda pelos cursos criados, mas tínhamos a certeza da nossa capacidade para criá-los”, lembra Camargo, que era decano de ensino e graduação quando o conselho universitário se decidiu pela criação de cursos. A demanda pelo curso de medicina, portanto, não foi atendida com a expansão. “Se os professores dizem que não temos estrutura para ampliar consideravelmente o número de vagas, não dá para colocar na marra”, defende o reitor. Mas os recursos do Reuni poderiam ser investidos de maneira a viabilizar esse atendimento, na contratação de professores e na construção de mais estrutura física no próprio Darcy Ribeiro. Pirataria Os campi nas cidades-satélites levam o nome da UnB, mas não a sua tradição. Abrigam cursos pouco procurados e instalações deficientes. Uma UnB na segunda e na terceira divisões, enquanto os alunos do Darcy Ribeiro jogam na primeira. Os estudantes da Asa Norte têm uma biblioteca central com 1.504.000 volumes, um restaurante universitário que serve 5 mil refeições por dia (café da manhã, almoço e jantar), centros de vivência, centro olímpico, acesso fácil a palestras, atividades culturais e esportivas, lanchonetes, agências bancárias e até um beijódromo. Os campi em Ceilândia, no Gama e até em Planaltina, o mais antigo, estão muito, mas muito longe disso. E jamais chegarão perto do Darcy Ribeiro, onde os estudantes podem ter a importante convivência em um campus de verdade.
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Dizia-se que a chegada da UnB às satÊlites estimularia a economia. A falta de restaurante na unidade de Ceilândia incentiva os ambulantes.
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Mairon (à esq.) e Matheus moram no Plano Piloto, mas gostam de estudar no Gama. Acham que no Darcy Ribeiro a estrutura é velha.
E toda a lógica do estudo perto de casa se desfaz quando se veem alunos que moram em Sobradinho estudando no Gama, residentes de Brazlândia se deslocando para o campus de Planaltina. E estudantes que têm de ir do Plano Piloto para essas cidades e para Ceilândia – pelo menos vão e voltam no contrafluxo do trânsito. A tese da pujança econômica que essas cidades ganhariam com a UnB em seus territórios também não resiste. Há alunos que nem sequer conhecem a cidade onde estudam, e a economia mesmo movimenta-se apenas para os ambulantes e donos de quiosques que cercam os campi para suprir a falta de restaurante. Em Ceilândia, por exemplo, falta estrutura básica até mesmo para os alunos fazerem suas refeições. Na unidade, ainda improvisada em uma escola classe da cidade, não há restaurante. Alunos compram marmita de ambulantes. Para comer, é comum que os jovens se espalhem pelo chão dos corredores. A alternativa é o restaurante comunitário da cidade. Os amigos Matheus dos Anjos, aluno de engenharia de software, e Mairon Cruvinel, de engenharia de energia, estudam no campus do Gama desde 2009. Matheus mora na Asa Sul e Mairon, no Lago Sul. “No início, era ruim ter de conviver com obras, mas sei que isso tudo é um processo”, diz Matheus. Mas, para ele, vale a pena trocar o Darcy Ribeiro pelo Gama. “Aqui, a estrutura é toda novinha. Temos até salas com notebook”, defende. Ele faz uma matéria no campus do Plano Piloto porque perdeu o prazo para se inscrever na disciplina no Gama e compara: “Prefiro sair da Asa Sul todos os dias e vir para cá do que passar necessidade no Darcy”. Agora, pergunte se ele conhece o Gama. Muito pouco, é a resposta. Ele não consome por lá, não se diverte por lá nem mesmo pensa em trabalhar lá. O campus, na entrada do Gama, não o inseriu na cidade. Dos 13 cursos oferecidos nas UnBs de segunda categoria, só três – enfermagem, gestão do agronegócio e gestão em saúde – existem também na Asa Norte. Os estudantes de Planaltina, de Ceilândia e do Gama que quiserem estudar direito, medicina, sociologia, comunicação, psicologia e qualquer um dos demais 50 cursos de graduação do campus do Plano Piloto continuam tendo de se deslocar para a Asa Norte. E os que quiserem fazer um dos cursos oferecidos nas cidades-satélites têm de ir até lá. Se um jovem de Planaltina quiser estudar fisioterapia, tem de ir a Ceilândia. Se o do Gama quer estudar gestão ambiental, tem de ir a Planaltina.
35 Os campi nas cidades-satélites surgiram da união de uma estratégia política com um programa federal para ampliar as vagas nas universidades públicas. A estratégia política uniu o então deputado e depois governador José Roberto Arruda ao então reitor Timothy Mulholland. Os dois, por coincidência, perderam seus mandatos sob acusações de irregularidades em suas gestões. Arruda queria ser governador; Timothy, dizia-se, tinha pretensões eleitorais. Anunciar, construir e inaugurar campi da UnB em cidades-satélites certamente renderia votos. Os terrenos em que estão as unidades novas foram cedidos pelo governo do DF à UnB. Concorrência menor O investimento de R$ 60 milhões da UnB nos últimos cinco anos só na construção dos novos campi não se refletiu de maneira considerável no que diz respeito ao número de vagas – um dos grandes objetivos do Reuni. De acordo com boletim divulgado pela universidade sobre o segundo vestibular de 2007, foram 22.904 inscritos para concorrer a 2.094 vagas, sendo 80 para o campus de Planaltina (ciências naturais e gestão do agronegócio). No primeiro vestibular deste ano, foram 24.977 para 2.092 vagas. Ou seja, duas a menos. O fato é que toda a estrutura construída fora do Plano Piloto serve hoje para abrigar pouco mais de 4 mil alunos e 12 cursos criados para os novos campi, além de enfermagem, que já existia no Darcy Ribeiro. O objetivo é chegar a 12 mil alunos nas três unidades fora do Plano Piloto. No Darcy Ribeiro, estudam mais de 28 mil. A concorrência dos cursos dos campi em Ceilândia, em Planaltina e no Gama reflete a realidade de pouca mudança. É mais fácil passar no vestibular da UnB para qualquer um dos campi novos do que para o Darcy Ribeiro. O curso de enfermagem, que existe em Ceilândia e no Plano Piloto, pode ser usado como base. No primeiro vestibular de 2013, quem concorreu a uma vaga no campus central enfrentou 18,7 candidatos. Em Pla-
O original e as versões Campus Darcy Ribeiro É o principal. Tem 26 institutos e faculdades e 21 centros de pesquisa. São 28,5 mil alunos de graduação, 2,5 mil professores e 440 laboratórios. Além disso, abriga toda a parte administrativa, com sete decanatos e seis secretarias, e os sete órgãos complementares (Biblioteca Central, Centro de Informática, Editora Universidade de Brasília, Fazenda Água Limpa, UnBTV, Hospital Universitário de Brasília e Cespe). Ainda há um hospital veterinário com duas unidades: uma de pequeno e outra de grande porte, segundo informações da assessoria de imprensa. Faculdade UnB Planaltina Formada por três prédios, tem 6,5 mil metros quadrados de área construída e recebeu investimento de R$ 10.331.000. São 1,2 mil alunos distribuídos nos cursos de ciências naturais, educação do campo, gestão ambiental e gestão do agronegócio. Entre os três novos campi, é o mais antigo e foi inaugurado antes mesmo do Reuni, em 2006. O prédio original é o ponto de encontro dos alunos por ter disponível internet sem fio, mas as salas de aula ficam na construção ao lado. Para ir de um a outro, a distância é curta, alguns metros apenas, mas sem calçada. Faculdade UnB Ceilândia Os 1,7 mil alunos se dividem, pois não têm aulas só no campus. Há salas de aula também em uma escola classe da cidade. Os estudantes têm acesso aos ônibus intercampi para fazer o percurso. O que incomoda mesmo é a falta de livros na biblioteca, de insumos nos laboratórios e de um restaurante universitário – o almoço é vendido em marmitas por ambulantes no estacionamento. No campus funcionam os cursos de gestão em saúde, enfermagem, farmácia, fisioterapia e terapia ocupacional. Faculdade UnB Gama São 4,7 mil metros quadrados de área construída na entrada da cidade. Os 1.363 alunos dos cursos de engenharias automotiva, de energia, de software e eletrônica também convivem com a dificuldade de acesso a livros e com falta de infraestrutura básica para passar o dia na universidade. Em uma tarde de visita ao campus, o lanche mais comum era um copo de açaí. Da lanchonete, não. De novo, de um ambulante que fica no estacionamento sem asfalto em frente aos dois prédios do campus. Os laboratórios, dizem os alunos, são bem equipados.
36 naltina, o mesmo curso teve concorrência de 13,16 candidatos por vaga, sendo que oferecia cinco a mais. Enquanto isso, a demanda pelos cursos tradicionais cresce de maneira desproporcional ao que a universidade oferece. A disputa pelo curso de medicina, tradicionalmente o mais concorrido, é maior do que a de todo o campus de Planaltina, por exemplo. Se, no primeiro, foram oferecidas 18 vagas para 2.110 candidatos, no segundo, foram quatro cursos, dois turnos, 85 vagas e 310 candidatos, somando cotas e acesso universal. Em 2007, primeiro ano do campus de Planaltina, a concorrência para medicina era menor e o número de vagas, maior. Eram 36 vagas para 2.682 candidatos. Ou seja, 74,5 por vaga. Ainda assim, o acesso é estimulado a qualquer custo. Foi feito de tudo para facilitar a entrada de alunos que não teriam mesmo notas suficientes naquele primeiro ano. O boletim informativo de 2007, disponível no site do Cespe, avisava que os candidatos aos cursos de Planaltina classificados no processo seletivo que cursaram o ensino médio na região e se inscreveram no programa de inserção social da UnB tiveram acréscimo de 20% na nota final das provas objetivas. Até hoje essa diferenciação existe. O peso da marca Na realidade, o que se pode observar é que a universidade pouco influencia a vida da população ao redor. Fora o fato de que os moradores dessas regiões, e daquelas próximas também, têm a oportunidade de estudar mais perto de casa, não houve muita diferença. “O que mudou para a gente foi a qualidade de vida, por não precisar enfrentar horas de trânsito”, conta Marlúcia Pereira Dornelas, aluna do 2º semestre de ciências naturais, em Planaltina. “Comecei a fazer o curso para ter alguma formação e, se não fosse perto de casa, eu não poderia estudar, porque tenho marido e um filho e preciso cuidar deles”, diz a estudante, que mora em Planaltina, a poucos metros do campus. Quando questionada se vai
seguir a carreira, pondera: “O que importa é ter um curso superior, depois eu vejo o que faço com o diploma”. A UnB modificou a rotina dela, mas suas expectativas ainda não mudaram. Marlúcia, assim como outros estudantes entrevistados para a reportagem, aproveitou os cursos sem tradição, as notas de corte mais baixas no vestibular e a demanda pequena para entrar, sem critério, no ensino superior. E ela não está preocupada com isso. No fim das contas, o diploma universitário dela valerá tanto quanto o de um aluno de medicina, no campus Darcy Ribeiro, embora tenham pesos diferentes. “Imaginar que vai expandir a universidade pública de um ano para o outro e manter a qualidade é um engano”, reconhece Camargo. “É preciso ter a coragem de dar o passo e a determinação de não abrir mão da qualidade. E é isso que a gente vai tentar fazer nos próximos anos.” Segundo o reitor, o plano da UnB agora é consolidar o que já foi feito. “Não podemos imaginar que isso [a qualidade inferior] seja perene. O estudante que passou em Planaltina terá a mesma formação, a mesma qualidade do curso do estudante do Darcy Ribeiro”, diz. Elizabeth Carla Vasconcelos Barbosa, do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, acha que não adianta investir em obras se a expansão é feita de qualquer jeito, sem a estrutura necessária para apoiar o crescimento. Para ela, o problema não é a descentralização, mas a improvisação. “É lógico que escolher o curso pela demanda, e não pela aptidão, pode comprometer a qualidade da formação e isso traz para dentro da universidade pessoas que não estão interessadas propriamente no saber, na pesquisa, mas na oportunidade de ter um diploma de nível superior, independentemente da área”, avalia. No entanto, Elizabeth pondera, se houvesse a qualidade garantida, não importaria a nota no vestibular. “A formação seria a mesma para todos.” Mesmo para aqueles que estão no curso que escolheram como profissão, a situação
37 não é a ideal. “O campus de Ceilândia não parece fazer parte da UnB”, lamenta Raisa Duarte, aluna do 2º semestre de enfermagem. A falta de estrutura adequada, de livros suficientes na biblioteca e o fato de precisar dividir o campus improvisado em uma escola classe com alunos do ensino médio e fundamental levam Raisa e suas colegas de sala de aula Carolina Nandes e Caroline Ribeiro a pensarem assim. “Se fosse para escolher, eu preferiria estudar mais longe de casa a não ter tudo de que preciso para concluir meu curso universitário”, escolhe Carolina, moradora de Vicente Pires. Elas lamentam, ainda, não ter acesso a peças de anatomia real nos laboratórios. No curso de enfermagem do campus Darcy Ribeiro, os alunos trabalham com cadáveres. “Enquanto o pessoal do Plano Piloto tem cadáveres disponíveis, aprendemos com peças de plástico”, reclama Caroline. Os cursos de excelência e os mais disputados permanecem no Darcy Ribeiro, e optam pelos campi alternativos aqueles que julgam não conseguir nota suficiente para passar. É o caso de Rivania de Sousa, aluna do 3º semestre de gestão do agronegócio, em Planaltina. Ela queria agronomia, que só existe no Plano Piloto, mas viu que, pela nota que tinha no Enem, conseguiria a vaga no Gama. “Foi a maneira que encontrei de entrar para a UnB”, confessa. Icoana Laís Martins, do curso de engenharia de energia, no Gama, queria mesmo ser engenheira elétrica. “Mas estava difícil passar no vestibular.” Ela mora no Recanto das Emas e acha que a troca valeu a pena. “Faço algumas matérias de elétrica no Darcy e fica tudo certo”, garante. Pelo menos, Rivania e Icoana permaneceram nas áreas que consideram vocação. Escolher pela demanda, pela nota de corte ou pela proximidade de casa nem sempre se encaixa tão quase perfeitamente ao desejo original do aluno. Daniela Fernandes, que queria cursar letras, caiu em ciências naturais, em Planaltina. “Pelo menos terei meu diploma e vou lecionar em alguma área”, conforma-se. )
À esquerda, aulas de ensino médio. À direita, aulas universitárias. O improviso faz parte da realidade dos alunos de Ceilândia.
)
Artigo
Miséria e devastação ambiental no Haiti
O lixo faz parte da paisagem de Porto Príncipe e parece não incomodar os moradores, que simplesmente passam por cima dele Texto e foto Maria Júlia Lima Manzi juliamanzi@gmail.com
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alvez não seja possível mensurar até que ponto a devastação ambiental no Haiti seja responsável pela miséria de seus habitantes. Mas, certamente, é forte a relação de causa e efeito entre elas. A pobreza parece impulsionar a depredação; os problemas ambientais, por sua vez, agravam as péssimas condições em que vivem milhões de haitianos. Há tanto lixo em Porto Príncipe que se diria que ele faz parte da paisagem local. Há lixo nas ruas, nos campos de desabrigados, nas feiras e nos mercados. Montanhas, toneladas de lixo – sobre as quais crianças descalças buscam, lado a lado com porcos e cabras, qualquer coisa que lhes amortize a fome. O lixo parece já ter se incorporado ao cotidiano dos haitianos. Não lhes incomoda mais o cheiro pútrido. Simplesmente passam por cima dele, vestidos em roupas e meias admiravelmente brancas. O serviço de coleta ainda é novo – e tímido – no país e não pode contar com os bons hábitos da população. Por vários bairros, há “papa-entulhos” da ONU, o que não garante que eles sejam utilizados. O Exército brasileiro criou, para tentar amenizar esse problema, um projeto chamado Quarteirão Limpo. A cada mês, uma casa da quadra é responsável por manter o trecho organizado. Como recompensa, a família recebe pagamento de cerca de US$ 100, além de todos os materiais necessários para o serviço. O objetivo do projeto é muito simples, mas também muito sábio: inculcar nessas comunidades o gosto por ter e manter suas ruas limpas. O excesso de lixo aliado à falta de árvores provocou o assoreamento de quase 80% dos mananciais do país. É comum atravessar pontes com sulcos que denunciam que, outrora, por ali passaram rios caudalosos. Hoje, no entanto, a maior parte virou filetes d`água ou buracos entupidos de resíduos. As pessoas precisam percorrer longas distâncias em busca de água. Todas as semanas, centenas de famílias se amontoam em filas aguardando a água trazida e tratada pelo Exército brasileiro. O desespero é tão grande que as Forças Armadas tiveram que proibir a participação de homens nessas filas, para evitar brigas. A água que se tem, na maior parte das vezes, é de cor cinza escuro. Veem-se com frequência as pessoas utilizando esse líquido imundo para lavar louças, roupas e até mesmo para tomar banho. Como consequência da destruição dos rios, o litoral da capital está completamente poluído, matando uma
rica alternativa bastante utilizada pela vizinha República Dominicana: a pesca. Sem a força da água, também se dificulta a produção de energia elétrica, indispensável para a industrialização do país e para dar aos lares haitianos uma vida um pouco mais confortável. Com mais de 80% da população de Porto Príncipe sem energia elétrica, o carvão ainda é muito utilizado para cozinhar, especialmente nos campos de desabrigados. Por toda a cidade, se veem homens e mulheres vendendo-o nas ruas. O problema é que, para abastecer esse mercado, se tem recorrido à derrubada e à queima massiva de árvores, comprometendo os últimos 3% da vegetação original do país. A falta de vegetação castiga o solo haitiano – que já é bastante pedregoso e esgotado –, dificultando a plantação de gêneros alimentícios. Um dia, esse país já foi um importante exportador de cana-de-açúcar, e a fertilidade de seu solo gerou muitas riquezas para a França colonizadora. Sem florestas e rios e com o solo esgotado, fica difícil pensar opções rentáveis para levantar o Haiti, um dos países mais pobres do mundo. A poucos quilômetros dali, na mesma ilha, a República Dominicana prospera com resorts que atraem turistas do mundo inteiro para algumas das mais belas praias do mundo. O Haiti ainda tem belas e conservadas praias, só que longe da capital. Como forma de garantir sua preservação, a maioria delas é particular e o acesso é cobrado, chegando a custar US$ 50 por pessoa. É do senso comum a ideia de que a devastação ambiental seja condição para o progresso e a geração de riqueza. Seria então o Haiti exceção ou exemplo do que pode nos aguardar lá na frente se não mudarmos os hábitos?
O litoral da capital está completamente poluído, matando uma rica alternativa bastante utilizada pela vizinha República Dominicana: a pesca. Sem florestas e rios e com o solo esgotado, fica difícil pensar opções rentáveis para levantar o Haiti.
1* as avenidas têm nomes falsos
paubrasilia@paubrasilia.com.br
por Nicolas Behr
BRASÍFRA-ME
Personagens, lugares e episódios marcantes da história da nossa capital. Desvende estes poemas-enigmas.
as ruas têm nomes falsos as praças têm nomes falsos
3** mas ali a ganância é de verdade
2*
entre as colunas armar as redes que são o espaço entre as próprias colunas jk só queria um palácio
de taguatinga pela estrutural ao longe se avista uma cidade: branca, solar, mediterrânea antigo bairro gavião o velho novo samba nome de moeda navio grande no mar
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4* rir do poder até não poder mais o bloco pula o síndico não folião de carimbo na mão
5**
6* o mais corajoso entre os bravos
pra lá vai o nosso lixo pra lá vamos nós
duro, nome de país, e de madeira mole
(o que não queremos – o que temos de melhor)
todos o invejavam porque só ele podia usar o chicote
nossas ideias nossos ideais que nunca se decompõem Respostas: 1 Águas Claras – 2 Palácio da Alvorada – 3 Cruzeiro 4 Pacotão – 5 Lixão – 6 Israel Pinheiro
REvival
Brega e sem-vergonha Na noite do Plano Piloto, você não precisa mais se conter. A música popular cafona ascendeu com a classe C Texto André Cunha Ilustração Mateus Zanon andreluizrenato@yahoo.com.br moncaiozanon@gmail.com
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ara as damas, estampas coloridas, bolsas extravagantes, luvas, argolas, laços, perucas, penas, plumas, paetês e outros penduricalhos. Para os rapazes, blazers com ombreiras, gravatas chamativas, correntes douradas, chapéus, pochetes e muitos tipos e estilos diferentes de bigode. É o figurino de uma festa brega, fenômeno que vem crescendo na cidade e despertando o interesse dos jovens pela legítima música cafona. “O que eu mais curto na música brega é a liberdade, a simplicidade e muitas vezes a originalidade nas letras”, diz Fernando Cabral, vocalista da banda Brega & Rosas, projeto que surgiu em 2010. De lá para cá, o grupo já tocou em casas como Arena, Calaf e Velvet Pub, sempre para um público colorido e devidamente caracterizado, que não raro lança flores, calcinhas e sutiãs ao palco. O revival do brega, já descrito pelo crítico musical Silvio Essinger como “música de mau gosto, com exageros de dramaticidade e/ou letras de uma insuportável ingenuidade” coincide com ascensão da “classe C” ao mercado nos últimos anos. Artistas como Wando, Agnaldo Timóteo, Odair José e Reginaldo Rossi, que nas décadas de 1970 e 1980 faziam sucesso principalmente entre faxineiras, empregadas domésticas, porteiros e comerciários, voltam a ocupar espaço. Segundo Paulo César Araújo, no livro Eu não sou cachorro, não: música popular cafona e ditadura militar, lançado pela Record, o brega era consumido principalmente pela “ralé”, que o Dicionário Aurélio define como “a camada social constituída de indivíduos desclassificados, delinquentes; gentalha; escória”. Ocorre que a “ralé” voltou com tudo, e a música que se restringia à periferia chegou para abalar o Plano Piloto. “Tudo o que você sempre quis escutar, mas tinha vergonha de admitir – com o Brega & Rosas, não há motivo para ter vergonha” é a filosofia da banda, cuja agenda de shows cobre não só casas noturnas, mas festas de confraternização em empresas, casamentos e aniversários. A ingenuidade das letras, outrora descrita como “insuportável”, faz a alegria do público descolado: fossa, traição, dor de cotovelo. A atroz inocência delas é o grande barato. Um dos hits mais executados nas festas é justamente Eu vou tirar você desse lugar (veja a lista ao lado), já regravada até pelo titã Paulo Miklos. A música explora os sentimentos lancinantes e contraditórios que assolam os frequentadores de lupanares e prostíbulos e encanta pela determinação heroica do protagonista, que resolve tirar a amada do meretrício. Outra canção de lirismo brutal é Em plena lua de mel, que
narra as aventuras de uma adúltera logo após o casamento. A safadeza do eu lírico se dilui no coletivo, e todo mundo canta junto, se divertindo com o lado tragicômico do ser humano: “Toda vez que o seu namorado sai/Você vai ver outro rapaz...” Algo muito distante do adultério intelectualizado de um Chico, por exemplo: “Te perdoo/Por fazeres mil perguntas/ Que em vidas que andam juntas/Ninguém faz...” “Acho que essa onda do brega, misturada com outros elementos (visuais ou sonoros), tem sido bem aceita, mas isso não quer dizer que exista uma cena” diz Cabral, escaldado pela experiência de tocar em festas como o Baile do Chifre ou a Noite do Bigode. “Vejo o brega como algo mais simples, menos colorido, menos língua pra fora, menos auê em geral. O brega na minha visão é algo sem grandes ambições, algo mais cru.” Cru, vulgar, cafona, exagerado, chulo, grosseiro ou tosco. Seja como for, o brega voltou com tudo. No maior estilo. Abaixo, as músicas que não podem faltar em uma festa brega, por Vitor de Moraes, baterista da banda Brega & Rosas:
Feiticeira (Carlos Alexandre)
"Tem uma pegada muito próxima à da jovem guarda. A voz que o Carlos Alexandre faz na volta do refrão é sensacional."
Eu vou tirar você desse lugar (Odair José)
"Apesar de não gostar muito de tocar, foi uma das primeiras que eu ouvi com atenção. É um hino do brega."
Em plena lua de mel (Reginaldo Rossi)
"A introdução dessa música é demais. O que me prende a atenção é a caída de ânimo quando entra o refrão, sem perder a consistência."
Piranha (Alípio Martins)
"Outro clássico do brega. Alípio Martins se corrige no meio da música. Sem mais!"
Cultura
Silêncio intenso
O CCBB apresentou a peça Sexton, com texto de Julianna Gandolfe e Helena Machado, vencedor da 5ª edição do concurso de dramaturgia Seleção Brasil em Cena, etapa de Brasília. O espetáculo é livremente inspirado na vida e na obra da poetisa confessional Anne Sexton Texto Gustavo Serrate Ilustração Irvin Rodriguez jornalista81@gmail.com
Em 1928 nascia Anne Sexton, em Newton, pequena cidade de Massachusetts. Anne foi criada em um lar confortável de classe média. O pai era alcoólatra e a mãe, uma escritora frustrada. Na escola Anne fugia das expectativas familiares de que fosse uma moça comportada e tradicional. A personalidade de Anne Sexton era marcante. Entrou para o teatro, era popular e bonita, e aos 19 anos fugiu com um rapaz que estava noivo de outra mulher. Anne casou-se, teve duas filhas e sentiu-se frustrada com a vida doméstica. Talvez por isso tivesse alguns casos extraconjugais. As crises de depressão e o desejo suicida tornaram-se evidentes. O psiquiatra lhe recomendou escrever poesia para lidar com o sofrimento. E a poesia transformou algo de fundamental nas cerdas da
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personalidade de Anne: “Até então eu desconhecia se sabia fazer alguma coisa, além de molhos e de trocar fraldas. Era uma vítima do sonho americano”, escreveu. Parte do que define o espírito de Anne Sexton são os excessos, o desejo de viver a vida intensamente. Baseando-se nesse aspecto da vida da poetisa, o diretor Rodrigo Fischer conta como foi o trabalho de construção cênica da peça Sexton, apresentada em janeiro e no comecinho de fevereiro aqui em Brasília, no Centro Cultural Banco do Brasil: “A leitura que eu tinha de Anne, mesmo antes da montagem, era sobre o quanto ela lutou por viver intensamente e brigou pela vida. Até na morte ela buscou a intensidade. Isso é o que mais me fascina nela. Anne é uma pessoa tão complexa e transgressora, se pensar-
mos do ponto de vista moral e de valores familiares. Ela transgride a existência social. Muitas vezes não escutamos nossos impulsos. Quando escutamos somos capazes de fazer coisas terríveis. Ela é uma pessoa que respeita as próprias vontades. Ela fez isso desde que descobriu a poesia”, diz o diretor, que fala da poetisa assim mesmo, no presente. A morte de Anne foi cercada pelo romantismo poético. Ela tirou a vida em 1974, depois de ter tentado outras vezes. Conseguiu ao se trancar na garagem de casa com o carro ligado e se intoxicar. Anne era muito amiga da poetisa Sylvia Plath (1932–1963), que também se matou. Em uma das cenas da peça, as duas compartilham as pulsões suicidas e discutem qual seria o melhor método para se matar.
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A montagem Os longos silêncios da peça, os momentos de êxtase poético em oposição às espontâneas conversas do dia a dia quase sussurradas, são a marca da direção do teatro cinematográfico de Fischer. “Minha proposta de direção é uma insistência em algo muito raro no teatro. A insistência no silêncio. Com a intensidade, o que é imperceptível se torna perceptível”, diz Rodrigo Fischer. Ele conta ter ficado surpreso com a reação do público, pois acreditava que parte da plateia se cansaria dos silêncios, mas percebeu uma conexão das pessoas com a vida de Anne. “Ritmo é muito relativo e eu insisto na intensidade do silêncio, da suspensão.” Para o diretor, um grande desafio da montagem foi transportar os atores para o contexto de Anne Sexton dos anos 1960/1970, com personagens acima dos 30 anos, sendo que os atores estão na faixa dos 20 aos 25. “Precisávamos mostrar intensidade sem cair na ‘loucurinha’ superficial, porque o texto já é muito agressivo. A vida dela já era muito poluída, intensa e violenta. Então tentamos amenizar isso, deixar tudo mais brando para que a potência do texto viesse”, conta. A direção Rodrigo Fischer é um diretor ligado ao cinema. Em 2011 dirigiu a peça Festim diabólico, baseada no filme homônimo do mestre do cinema de suspense, Alfred Hitchcock. Faz doutorado na UnB com a tese Uma poética entre o teatral e o cinematográfico: O trabalho do ator nas obras de John Cassavetes. John Cassavetes é o “pai” do cinema independente americano. Para Cassavetes, que veio do teatro, o ator é a força mais importante de seus filmes. Dizia: “Se o trabalho do ator é bom, o filme é bom”. “Os primeiros filmes a que assisti dele [Cassavetes] mexeram muito comigo e me fizeram
repensar meu trabalho enquanto diretor de teatro. Pesquisei a fundo como era o processo dele, de trazer camadas de ambiguidade na interpretação”, diz Fischer. Para o diretor, o talento de Brasília sempre foi evidente, e a cidade é respeitada artisticamente fora daqui, apesar de considerar que boa parte de nosso teatro esteja calcada no besteirol, e que 90% da plateia considere essa a referência do que é teatro brasiliense. Mas não é apenas isso. “Brasília está aparecendo, porque essas pessoas [referindo-se aos colegas de faculdade Juliano Cazarré e Ellen Oléria] estão se colocando na mídia, mas Brasília sempre teve boas caras, pessoas que estão muito bem artisticamente.” Aos 18 anos Rodrigo saiu de casa para estudar teatro no Rio de Janeiro. Conta ter tido oportunidades de acompanhar o trabalho de pessoas que admira, como Antônio Abujamra e Gerald Thomas, mas diz ter se decepcionado com o caminho comercial de mão única. “O Rio de Janeiro é um mercado saturado. Por lá, a grande maioria do teatro é voltada para a produção da Globo e comercial. Tem uma galera muito boa, mas a maioria voltada para isso. A cidade é completamente sedutora, mas em termos de teatro me deixou um pouco decepcionado.” Provavelmente em razão dessa experiência, quando alguém da cidade diz que vai sair para estudar fora, ele recomenda: “Saia, aprenda, mas volte”. Muita gente talentosa vai embora de Brasília em vez de ficar para fortalecer. Rodrigo enxerga em Brasília um lugar muito mais propício em termos de criação e experimentação estética. “Aqui a gente tem um espaço de ousadia e risco bem maior do que em outros lugares, pode-se arriscar esteticamente de uma forma mais destemida, temos muitos espaços a ser ocupados”, acredita. Em março, a peça será exibida no Rio de Janeiro, no CCBB. Estão no elenco Gaivota Naves, Jeferson Alves, Jessica Cardoso, Karol Oliveira, Mário Luz e Paulo Wenceslau. O ) espetáculo dura 90 minutos. )
“Mas os suicidas têm uma linguagem especial” – dizia Anne no poema Wanting to die – “Como os carpinteiros, eles estão sempre procurando saber quais são as ferramentas. Eles nunca perguntam o porquê de construir.”
viagem
A epopeia do bando de loucos que invadiu o Japão e mostrou mais uma vez a força da Fiel
Texto e fotos Moacyr Oliveira Filho mof@uol.com.br
N
ão estranhe, leitor, o título deste texto. Ele está escrito em katakana, o alfabeto japonês usado para palavras e nomes estrangeiros, simplesmente porque não haveria título melhor para o que você vai ler a seguir. Esses caracteres em katakana são a tradução de uma expressão até então desconhecida dos japoneses, mas que, durante mais de dez dias, em dezembro de 2012, entrou definitivamente para o vocabulário nipônico, por ter sido insistentemente ouvida e repetida, como um mantra, em ruas, hotéis, lojas, bares, restaurantes, metrôs, trens, ônibus e até templos budistas de Tóquio, Nagoya, Toyota e Yokohama: Vai, Corinthians! A epopeia dos corinthianos rumo a Tóquio começou em São Paulo, em 6 de dezembro, no Aeroporto de Guarulhos, que mais parecia a Praça Charles Miller, entrada do Pacaembu, tal a quantidade de bandeiras, faixas e camisas do Corinthians que circulavam pelos balcões das companhias aéreas. O nosso grupo, formado por 31 pessoas, fez escala em Roma, num voo da Alitalia. Durante as 12 horas de viagem, bastava alguém gritar Vai, Corinthians para que o mantra se espalhasse pela aeronave, perturbando o sono dos poucos passageiros não corinthianos. Os dois dias em Roma serviram de aquecimento para o que viria pela frente e se transformaram em demonstrações de amor ao time pelas ruas e pelos monumentos da Cidade Eterna, com gente exibindo faixas e bandeiras
no Coliseu, na Fontana Di Trevi, no Vaticano, para espanto de romanos e turistas. Em 9 de dezembro, saímos do Aeroporto de Fuimicino, em Roma, rumo ao Aeroporto de Narita, em Tóquio. Foram mais 12 horas de voo. Na chegada a Narita, depois de passar pela rigorosa imigração japonesa, quando se viu no saguão externo do aeroporto, o bando de loucos explodiu em cânticos, gritos de Vai, Corinthians e tremular de faixas e bandeiras. Parecia um ensaio do que iria se repetir nos próximos dez dias pelas ruas de Tóquio. Euforia Nunca se saberá ao certo quantos corinthianos estiveram no Japão, entre os dias 6 e 17 de dezembro de 2012, para acompanhar os jogos do time no Campeonato Mundial de Clubes da Fifa: 20 mil, 30 mil, 40 mil? Pouco importa. A verdade é que uma multidão de corinthianos, vindos de diferentes partes do planeta, invadiu Tóquio, Nagoya, Toyota e Yokohama, conquistou o coração dos japoneses – que os receberam com alegria e entusiasmo – e vestiu de preto e branco os estádios de Toyota e Yokohama, transformando-os em filiais do Pacaembu. Os números oficiais dos dois jogos que o Corinthians disputou no Mundial de Clubes ajudam a calcular o tamanho da invasão. A primeira partida foi contra o campeão africano, o egípcio Al Ahly, no Toyota Stadium, distante 322 quilômetros de Tóquio. Mesmo à temperatura de 0 grau Celsius, teve público pagante de 31.417 pessoas
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– com mais de 90% de corinthianos. A final, contra o inglês Chelsea, campeão europeu, no Yokohama Stadium, a 42 quilômetros de Tóquio e 8 graus Celsius de temperatura, teve 68.275 pagantes. Naquele dia, mais da metade do estádio foi ocupada pelos corinthianos. Max Bareta é gaúcho de Caxias do Sul e dono de uma operadora de turismo que montou pacotes para o Mundial de Clubes de 2010, com o Internacional, de Porto Alegre; o de 2011, com o Santos; e agora, em 2012, com o Corinthians. “Essa é a terceira vez que eu venho, acompanhando os grupos. Em 2010, com o Inter, vieram, no máximo, 500 pessoas; no ano passado, com o Santos, umas 2 mil. Nada se compara com o que está acontecendo agora. Com certeza há mais de 30 mil corinthianos por aqui”, calculou. Um feito histórico para o futebol, que impressionou os japoneses e a Fifa. Os que previam problemas, conflitos e confusões com a invasão do bando de loucos ao Japão se decepcionaram. O clima nas ruas e nos estádios japoneses foi sempre de festa, alegria e confraternização. As autoridades policiais não registraram ocorrência grave, exceto casos de embriaguez e perda de passaportes. A verdade é que o Japão e os japoneses não só se renderam ao entusiasmo da torcida corinthiana como flexibilizaram alguns dos seus rígidos padrões de comportamento para se adaptar aos barulhentos e enlouquecidos visitantes. As lojas de equipamentos eletrônicos dos bairros de Akihabara e Ginza, em Tóquio, lotadas de brasileiros, tocavam o Hino do Corinthians para recepcionar os clientes, e o Vai, Corinthians! podia ser ouvido nos bares e nas boates de Roppongi, nas lojas do shopping Aquacity, em Odaiba, nas ruas, nos restaurantes, nas estações de trem e metrô, nos lobbies dos hotéis e até mesmo na Disneylândia de Tóquio, incorporando-se ao vocabulário dos moradores da capital japonesa. Bastava cruzar com alguém vestido com a camisa do Timão para o japonês disparar, num sotaque esquisito, seguido da tradicional risadinha nipônica: Vai, Curintchiá!
Foi só passar pela rigorosa imigração japonesa que o bando de loucos começou a festa que se repetiria nos próximos dias pelas ruas de Tóquio.
O sofisticado Nikko Tokyo Hotel, no elegante bairro de Odaiba, recebeu vários grupos de corinthianos, entre eles o ex-jogador Marcelinho Carioca, levado por uma operadora de turismo. O hotel, que teve janelas e sacadas de apartamentos enfeitadas com bandeiras do time, reservou um salão especial para o café da manhã dos corinthianos. Depois da final, recebeu seus hóspedes campeões do mundo com simpáticos cartazes afixados nas portas dos elevadores e nos corredores, parabenizando-os pela vitória e convidando-os para uma festa de confraternização num dos seus bares. Naquele noite, o Ocean Dining excepcionalmente ficaria aberto até a 1h30 da madrugada, com cerveja, vinho, água, refrigerantes e petiscos à vontade, por 3 mil ienes, cerca de R$ 70. Marcelinho Carioca, por sinal, foi responsável por uma das primeiras cenas de euforia coletiva no Nikko Tokyo Hotel naqueles dias da invasão corinthiana. No primeiro café da manhã no hotel, no dia seguinte ao da chegada da maioria dos grupos vindos do Brasil, Marcelinho entrou no salão especialmente destinado ao café da manhã dos corinthianos e foi recebido como se estivesse entrando em campo no Pacaembu: “Uh, Marcelinho, uh Marcelinho”, explodiu o coro no salão. Mal conseguiu tomar seu café da manhã, tantos foram os pedidos para fotos e autógrafos. O Nikko Tokyo é muito requisitado para festas de casamentos. Os japoneses que escolheram se casar lá naqueles dias de dezembro tiveram que se acostumar a dividir o amplo salão do lobby principal com as centenas de corinthianos que circulavam por lá diariamente. E, é claro, ver suas sessões de foto e recepção de convidados invadidas pelas bandeiras do Timão e, vez por outra, ouvir o mantra Vai, Corinthians! Outra cena que, certamente, ficará na memória de hóspedes, noivos, convidados de casamentos e funcionários do Nikko Tokyo
aconteceu no começo da tarde do domingo, 16 de dezembro, quando os corinthianos se preparavam para pegar os ônibus fretados que os levariam ao Yokohama Stadium para a final, contra o Chelsea. Nervosos, tensos e ansiosos, os torcedores se aglomeravam no saguão, à espera da saída dos ônibus, devidamente trajados com camisas, faixas e bandeiras, quando um deles começou a cantar o Hino do Corinthians. Foi a senha para que um coro de centenas de vozes ecoasse, para espanto de noivos e seus convidados. Momentos de tensão Nos estádios, principalmente na final, ninguém ficou sentado, como mandam as rígidas regras japonesas, ou deixou de fumar nos momentos mais tensos do jogo. A multidão de corinthianos cruzando um viaduto que ligava o estacionamento dos ônibus à entrada do Toyota Stadium, ou caminhando num alegre cortejo rumo ao Yokohama Stadium, agitando suas faixas e bandeiras, e entoando seus cânticos, foi emocionante. Fez cada um de nós sentir a sensação de estar entrando no Pacaembu, velho de guerra. Mas a epopeia dos corinthianos em Tóquio também teve momentos de tensão. Num deles, ainda em Roma, o grupo descobriu durante um passeio turístico que havia um infiltrado. A advogada Carina Ardito, que acompanhava o marido corinthiano, Marcos Ceneviva de Andrade, e a filha Duda, deixou escapar durante o trajeto no ônibus que era palmeirense. Foi o bastante para se instalar um mal-estar no grupo. Alguns reclamaram do marido, por ter levado a mulher palmeirense, outros cochicharam irritados e todos pensaram a mesma coisa: sai, zica! O mal- estar não foi adiante, a palmeirense infiltrada não falou
mais nada sobre suas preferências futebolísticas e a paz voltou a reinar no grupo, inclusive com a infiltrada usando um gorro do Corinthians. De qualquer forma, no dia da final, para alívio dos corinthianos mais supersticiosos, o casal decidiu ir para o Yokohama Stadium de trem-bala. E voltar! Por via das dúvidas, eu estava protegido. Usei nos dois jogos no Japão a velha e surrada gravata do Corinthians, a camisa listrada de preto e branco, réplica da de 1954, e a bandeira que me acompanha desde 1977 – o mesmo figurino com que assisti a todos os jogos da Libertadores da América. Outro momento de tensão aconteceu depois do primeiro jogo, contra os egípcios do Al Ahly. A vitória suada e sofrida por 1 a 0, com o time jogando menos do que se esperava, deixou o pessoal tenso e preocupado com o que poderia acontecer na final. O frio, o cansaço pela longa viagem de ônibus até Toyota, que durou mais de cinco horas, e a expectativa pela viagem de volta, que levaria outras cinco, entrando pela gélida madrugada japonesa, deixaram o ambiente pouco descontraído, apesar da vitória e da classificação para a final. Quando todos do grupo já estavam acomodados no ônibus, Gilmar Giani, o simpático e atencioso guia que nos acompanhava, se deu conta de que faltava alguém. Era Nixon Fernandes, curitibano boa-praça que passava o tempo todo tirando fotos. Passados alguns minutos, Gilmar já se preparava para voltar ao estádio à procura do desaparecido quando, de repente, surge Nixon, lívido, nervoso, visivelmente alterado. Ele se perdeu do grupo e demorou a achar o caminho de volta para o estacionamento onde estavam os ônibus. Aos gritos e palavrões, entrou no ônibus de dedo em riste e, ao ouvir um ensaio de vaia, tradicional sempre que alguém se atrasava, berrou: “Nin-
seguinte à final, quando a maioria dos corinthianos voltou ao Brasil, os funcionários do Nikko Tokyo Hotel se concentraram na porta de onde sairiam os ônibus fretados que levariam os hóspedes ao Aeroporto de Narita, despedindo-se com aplausos e entoando o tradicional Vai, Curintchiá! – uma cena que ficará para sempre guardada na memória e que sintetiza o carinho com que os japoneses receberam a invasão corinthiana. “Hijo de puta” Para fechar a viagem, campeão do mundo, decidi passar uns dias em Buenos Aires. Na verdade, com uma única intenção: tirar uma foto com a faixa de bicampeão mundial de clubes da Fifa na frente da Bombonera, o mítico estádio do Boca Juniors, de quem vencemos na final da Libertadores da América, carimbando o passaporte para Tóquio. Depois de tirar a foto rapidinho, com medo de ser incomodado por algum torcedor do Boca, fui visitar o Museu Boquense e a Bombonera. Para minha surpresa, eles ofereciam aos visitantes um serviço especial: tirar uma foto dentro do gramado da Bombonera segurando a Taça Libertadores da América e a bandeira do seu time do coração nas costas. O funcionário que oferecia esse serviço aos visitantes era corinthiano e ganhou de presente a faixa de bicampeão mundial, que trazia comigo. Tirei a foto, enrolado na bandeira do Corinthians, por coincidência na frente do gol em que Romarinho empatou o jogo contra o Boca, nos últimos minutos da primeira partida da final da Libertadores, abrindo o caminho para a inédita conquista e a disputa do campeonato mundial. Enquanto posava para a foto, ouvi um funcionário do Boca, que aparava a grama do estádio, passar por mim e praguejar a meia voz: “Romarinho, hijo de puta”. Foi o xingamento mais gostoso que ouvi ) na vida. )
Todos os dias, os corinthianos hospedados no Nikko Tokyo Hotel tinham um salão especialmente reservado para o café da manhã.
guém fala nada aqui. Eu me perdi, não falo inglês, não falo japonês”. Um gaiato ainda gracejou: “E não entende português também”. Por pouco o clima não chegou às vias de fato, obrigando a turma do deixa-disso a entrar em ação e serenar os ânimos para seguir a viagem de volta a Tóquio. Entre os corinthianos que invadiram o Japão havia gente de todos os níveis sociais, culturais e econômicos. De empresários acostumados a viagens internacionais; artistas globais, como Fábio Assunção e Dan Stulbach; jornalistas de prestígio, como Heraldo Pereira, da TV Globo, que viajou com a mulher e as duas filhas; o maluco beleza José Jatil Jacinto, que ganhou o concurso do CQC da Band, viajou patrocinado pelo programa e virou celebridade em Tóquio; até trabalhadores comuns, que nunca haviam saído de suas cidades, não falam nenhuma língua estrangeira, nem tinham dinheiro para as despesas extras da viagem, como alimentação, lazer e compras. No nosso grupo, dois Ricardos simbolizavam essas diferenças. O empresário Ricardo Alexandre Martins, dono de uma empresa distribuidora de produtos Nestlé, além do Corinthians, tinha apenas uma preocupação: fazer compras. Na maior parte do tempo, ele se desgarrou dos programas oficiais da viagem para percorrer shoppings e lojas, numa incansável maratona de consumo. No outro extremo, o auxiliar de escritório Ricardo da Silva viajou praticamente sem dinheiro, com apenas US$ 200, quantia insuficiente para a sua manutenção na cara Tóquio. Por isso mesmo, se esquivava dos passeios extras e das saídas noturnas, perambulando solitário pelos corredores do hotel e pelo shopping AquaCity, que ficava ao lado. Quando perceberam a situação do companheiro de viagem, algumas pessoas do grupo passaram a convidá-lo para almoços, jantares e passeios. Na segunda-feira, 17 de dezembro, o dia
Caixa-preta
por miguel oliveira carlosmigueldeoliveira@gmail.com
Desconstruindo Dilma
A grande imprensa brasileira, sempre em aliança com notórios empresários e banqueiros, está pegando no pé da presidente Dilma Rousseff e de seu governo. Quem lê, ouve e assiste ao que se diz imagina que o Brasil esteja no pior dos mundos. Afinal, o produto interno bruto está baixo demais e a inflação está aumentando; as contas públicas são maquiadas e o superávit primário é manipulado; o câmbio desvalorizado é perigoso; os investidores não querem investir, pois lhes falta segurança jurídica e o retorno de capital que consideram justo. Sem falar que há gasto público demais. Os que repetem isso diariamente são, de modo geral, os que reclamavam dos juros altíssimos e agora criticam os juros baixos. Os que diziam que as tarifas da energia elétrica estavam muito elevadas, mas agora são contra a redução delas. Protestavam contra os prejuízos da Petrobras e não perdoam o aumento do preço dos combustíveis. E, além das várias outras mazelas apontadas por esses críticos, o Brasil – que absurdo – não fez sucesso em Davos. É mesmo o fim de tudo. E a culpa por tudo isso é de Dilma e do governo, repetem todos os dias, por todos os muitos canais de que dispõem.
Nem Lula, nem Dilma Está mais do que claro aonde querem chegar esses críticos permanentes: às eleições de 2014. O objetivo é impedir que o PT eleja, mais uma vez, o presidente da República. As vertentes de ação são duas: convencer a opinião pública de que o ex-presidente Lula está envolvido com corrupção e de que a presidente Dilma Rousseff é, ao contrário do que se apregoou, péssima gestora. A desconstrução das imagens positivas que têm Lula e Dilma é imprescindível para que os eleitores derrotem o projeto político que representam e coloquem de volta, no Palácio do Planalto, o projeto representado pelo PSDB e, acessoriamente, pelo DEM. Para desconstruir Dilma, o melhor caminho é demonstrar que a economia vai mal, que a
política econômica está errada e que faltam ao governo planejamento e gestão. Ou seja, demonstrar que não é a gerentona competente que parecia ser, ou que o marketing vendeu como sendo. Aí o caminho estará aberto para a eleição do senador Aécio Neves ou, quem sabe, do governador Eduardo Campos – desde que, naturalmente, se acerte com os grupos econômicos e com os políticos que os representam.
Sem marquetices O possível desgaste de Dilma e de seu governo preocupa o PT e seus aliados. Mas em diferentes graus. Para o PMDB e as legendas menores, como PR, PRB, PTB, PP, é uma preocupação relativa, pois se Dilma estiver frágil eleitoralmente não terão a menor dificuldade de virar
a casaca e aderir aos tucanos. O que os une ao PT, hoje, é o usufruto das benesses do poder. O PSB pode articular a candidatura de Eduardo Campos e para o PDT não será difícil encontrar alternativa. Fica ruim mesmo é para o PT. Diante disso, políticos que não se consideram bem atendidos pelo Planalto se aproveitam para dizer que ao governo falta articulação política e se aproximar mais do povo. O que querem dizer, na verdade, é que falta atender com mais presteza e boa vontade a seus pleitos fisiológicos e clientelistas. Aproximar-se mais do povo sempre é bom para um governante. Mas não é preciso se dobrar ao ridículo de vestir gibão de couro ou se render às marquetices duvidosas que descaracterizam a personalidade de Dilma.
CHARGES DO GOUGON hgougon@gmail.com
roteiro
Priscila Praxedes
cultura@meiaum.com.br
Latifundiário de letras Luana Lleras
Foi um acervo de mais de 50 anos de papéis,
pretende fazer inúmeros “lançamentos
impressos e manuscritos que deu origem ao
imprevistos”, sem local, data e hora para
livro Minha moldura é o universo, de Heitor
acontecer, só com o autor, o livro e o público.
Humberto de Andrade. O quinto livro do autor
O jornalista e poeta deseja percorrer, ainda
baiano traz poemas inéditos, escritos de 1963
neste ano, Aracaju, Salvador, Rio de Janeiro e
a 1969, no início da sua produção literária.
São Paulo. “Quero espalhar o livro pelo Brasil,
Os textos remetem muitas vezes a fatos
inclusive pelo interior.”
históricos, como a morte de Che Guevara, em
O resto das anotações do poeta rende ainda
1967. “Minha arte é delirante, é esotérica”,
“uns 20 livros”. “As pessoas têm posses,
define Heitor.
terras. Eu sou um latifundiário de letras.”
H2A, como é conhecido pelos amigos,
Luana Lleras
CINEMA de arte. Na Rússia de 1874, Anna Karenina (Keira Knightley), jovem aristocrata casada com Karenin (Jude Law), alto funcionário do governo, envolve-se com o Conde Vronsky (Aaron Taylor-Johnson), oficial da cavalaria filho da Condessa Vronsky (Olivia Williams), chocando a alta sociedade de São Petersburgo.
Universal Pictures
Imagem Filmes
lançamentos
A HORA MAIS ESCURA
As aventuras de Tadeo
ANOS. CINEMARK E KINOPLEX EM 15 DE FEVEREI-
livre. Kinoplex em 8 de fevereiro. 90 min
KATHRYN BIGELOW. AÇÃO. CLASSIFICAÇÃO 14
Enrique Gato. Animação. Classificação
RO. 127 MIN
Cinco indicações ao Oscar, incluindo a de melhor filme. A década que desestruturou a sociedade americana entre os ataques de 11 de setembro de 2001 e a morte de Osama Bin Laden (Ricky Sekhon), em 2011. Maya (Jessica Chastain) e outros agentes da CIA (Jason Clarke e Mark Strong) foram responsáveis por transformar a caçada ao terrorista numa operação de grandes proporções.
Anna Karenina
Joe Wright. Drama. Classificação 14
anos. Kinoplex em 15 de fevereiro. 129 min
Indicado ao Oscar nas seguintes categorias: fotografia, figurino, trilha sonora e direção
Tadeo (Oscar Barberán) é um trabalhador que vive em Chicago. É confundido com um arqueólogo conhecido e, por isso, é enviado a uma expedição no Peru. Lá, precisa enfrentar uma organização criminosa que deseja saquear uma cidade inca recémdescoberta. Conta com a ajuda de seu cachorro Jeff, da professora de arqueologia Sara (Michelle Jenner) e do guia Freddy (Jose Mota). Em 3-D.
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Dezesseis luas
Richard LaGravenese. Drama. Classificação 10 anos. Cinemark em 13 de fevereiro e Kinoplex em 15 de fevereiro. 92 min
Ethan Wate (Alden Ehrenreich) é um estudante que fica enfeitiçado por Lena Duchannes (Emmy Rossum), que acaba de chegar de outro estado – e com quem ele estranhamente tinha pesadelos havia meses. Os dois se unem para enfrentar uma maldição que persegue a família dela há gerações. Emma Thompson, Viola Davis, J.D. Evermore e Jeremy Irons estão no elenco.
Duro de matar 5 um bom dia para morrer
John Moore. Ação. Classificação 18
anos. Cinemark e Kinoplex em 22 de fevereiro. 122 min
O policial John McClane (Bruce Willis) viaja à Rússia para resgatar seu filho Jack (Jai Courtney), mantido prisioneiro. Juntos, os dois terão de enfrentar um poderoso líder russo (Sebastian Koch) que passa a ser um perigo para a paz mundial.
INDOMÁVEL SONHADORA
BENH ZEITLIN. DRAMA. CLASSIFICAÇÃO 14
ANOS. CINEMARK EM 22 DE FEVEREIRO. 93 MIN
Com quatro indicações ao Oscar. Hushpuppy (Quvenzhané Wallis) é uma menina de 6 anos que vive com seu pai, Wink (Dwight Henry), às margens de um rio, em uma comunidade pobre. Um dia, ele descobre que está muito doente e decide que não quer ajuda médica. Wink passa a ensinar a menina a sobreviver quando ele não estiver mais presente.
Meu namorado é um zumbi Jonathan Levine. Romance.
Classificação 10 anos. Cinemark e Kinoplex em 8 de fevereiro. 97 min
Em um mundo pós-apocalíptico, o zumbi R. (Nicholas Hoult) faz amizade com a humana
Julie (Teresa Palmer), a namorada de uma de suas vítimas. O envolvimento dos dois acaba despertando uma reação em cadeia que o transformará, assim como outros mortos-vivos, todos perseguidos pelo general Grigio (John Malkovich).
O reino gelado
Maxim Sveshnikov e Vlad Barbe. Animação. Classificação livre.
Kinoplex em 22 de fevereiro. 115 min
Desejando criar um mundo no qual o vento polar esfrie as almas, a Rainha da Neve cobriu o planeta com gelo e ordenou a destruição de todas as artes. A última ameaça aos planos estaria no mestre-vidreiro Vegard, cujos espelhos refletem também a alma. Os servos da Rainha da Neve sequestram Vegard e sua mulher, Una, deixando seus filhos, Kai e Gerda, para trás. O tempo passa e capturam também Kai, acreditando que o garoto seja o Fox Film
Fogo contra fogo
David Barrett. Ação. Classificação 14
anos. Cinemark Kinoplex em 8 de fevereiro. 97 min
O bombeiro Jeremy Coleman (Josh Duhamel) sai para beber com os amigos, mas acaba presenciando um crime brutal. Ao auxiliar o detetive Mike Cella (Bruce Willis), concorda em identificar o agressor (Vincent D`Onofrio). Mas o assassino comprova que sabe quem ele é e ameaça matar a sua namorada (Rosario Dawson). Forçado a integrar o programa de proteção às testemunhas, Jeremy tenta reconstruir sua vida. Porém, uma virada judicial coloca o criminoso de volta nas ruas. O ex-bombeiro, então, une-se a uma gangue rival.
Hitchcock
Sacha Gervasi. Drama. Classificação 16 anos. Kinoplex em 8 de fevereiro. 98 min
O filme foi indicado ao Oscar na categoria maquiagem. Foi baseado no livro de Stephen Rebello Alfred Hitchcock and the making of Psycho. Conta os bastidores de Psicose, com Anthony Hopkins no papel de Hitchcock. Na época, mesmo no auge da carreira, o cineasta não conseguiu apoio para realizar a obra, porque os estúdios não queriam investir no gênero. O resultado foi uma produção praticamente independente, de baixo orçamento, rodada em preto e branco, que se tornou referência no cinema mundial. Helen Mirren vive a mulher de Hitchcock, Alma Reville. Scarlett Johansson, a atriz Janet Leigh, protagonista de Psicose. Jessica Biel interpreta Vera Miles, que viveu Lila Crane no filme.
Paramount Pictures
sucessor do pai. Mas Gerda vai encarar todos os obstáculos ao lado de novos amigos para salvar o irmão e os pais e voltar a aquecer os corações das pessoas. No original, vozes de Kristen Bell, Josh Gad, Idina Menzel, Jonathan Groff, James Pasierbowicz.
O voo
Robert Zemeckis. Drama. Classificação 14 anos. Kinoplex em 8 de fevereiro. 138 min
Whip (Denzel Washington, indicado pelo papel ao Oscar) é um piloto de aviação comercial que, com a queda iminente de um avião, consegue salvar quase todos os passageiros. Logo ele se torna um herói nacional, mas a investigação revela que ele estava voando sob o efeito de drogas e álcool. Tendo consciência disso, Whip não se sente bem com todas as homenagens que recebe, por não se considerar merecedor delas.
cultura@meiaum.com.br
Tainá 3 – a origem
Rosane Svartman. Aventura. Classifi-
cação livre. Cinemark e Kinoplex em 8 de fevereiro. 80 min
Piratas da biodiversidade invadem a área da floresta amazônica deixando órfã a bebê Tainá (Wiranu Tembé). A criança é salva e criada pelo pajé Tigê (Gracindo Jr.). Cinco anos depois, ele a leva à aldeia, onde está para ser escolhido o novo líder defensor da natureza. Tainá vai atrás do inimigo e encontra novas companhias,a menina da cidade Laurinha (Beatriz Noskoski) e o índio nerd Gobi (Igor Ozzy), desvendando o mistério de sua origem.
os 31 longas-metragens de Tarantino para o cinema (na foto, Bastardos Inglórios), além de episódios de seriados como CSI (2007) e Plantão médico (1995) dirigidos por ele para a televisão e filmes que influenciaram o cineasta norte-americano, como Sukiyaky Western Django (2007), Os bastardos inglórios (1978), Corrida contra o destino (1971), Coffy (1973) e Tóquio violenta (1966). Universal Pictures
roteiro
Priscila Praxedes
www.cinemark.com.br www.kinoplex.com.br Não informaram a programação a tempo: www.itaucinemas.com.br www.cinecultura.com.br
outros
Mondo Tarantino De 15 de fevereiro a 17 de março, de terça a domingo. Entrada franca. Programação e classificação em www.bb.com.br/cultura
A trajetória do cineasta Quentin Tarantino, suas influências e seu legado. Serão exibidos
Teste de audiência
26 de fevereiro, às 20 h, na Caixa Cultural. Entrada franca. Classificação 16 anos. 3206-9448
Filmes ainda em processo de finalização, apresentados gratuitamente em sessões surpresa. O espectador só fica sabendo ao que vai assistir momentos antes do início da exibição. Após a projeção, o público conversa sobre o filme na presença do diretor. O projeto é iniciativa dos cineastas Marcio Curi e Renato Barbieri.
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Música
Ano de Portugal no Brasil 19 de fevereiro, às 20 h, no Teatro
Nacional. Entrada franca e livre. 3325-6239
Banda UÓ in Gringoland 16 de fevereiro, às 22h30, na Victoria Haus.
Ingresso (inteira): R$ 25. Classificação 18 anos. 3340-3007
A banda de Goiás faz uma mistura de tecnobrega com música pop. No show, canções que fizeram sucesso na internet como Shake de amor, Faz UÓ, Malandro, Gringo e Vânia. A banda formada por Guto Goffi (bateria), Roberto Frejat (guitarra e voz), Peninha (percussão), Rodrigo Santos (baixo) e Fernando Magalhães (guitarra), além da participação especial do tecladista Maurício Barros, integrante da formação original, está em turnê pelo País para celebrar os 30 anos do lançamento de seu disco de estreia. A turnê +1 dose já passou pelo Rio de Janeiro, por São Paulo e Fortaleza. Um show com seus maiores sucessos.
Ellen Oléria
20 e 21 de fevereiro, às 20 h, no Teatro da Caixa. Ingresso (inteira): R$ 10. Classificação 16 anos. 3206-9448
A cantora e compositora brasiliense traz ao
palco um trabalho original, fruto de uma pesquisa musical que mistura vários estilos. São clássicos da MPB como Zumbi, de Jorge Ben Jor, e composições próprias como Senzala – a Feira da Ceilândia.
Monobloco
10 de fevereiro, às 21 h, na AABB. Ingresso (inteira): pista R$ 60; camarote R$ 100. Classificação 16 anos. 8121-0800
O repertório eclético vai das marchinhas tradicionais de João Roberto Kelly ao samba de Cartola e Clara Nunes, passa pelo xote de Alceu Valença, o forró de Luiz Gonzaga, o funk de MC Leonardo, até canções de Paralamas do Sucesso, Raul Seixas e Tim Maia.
clube do choro
Shows de quarta a sábado, a partir das 21 h. Ingresso (inteira): R$ 20.
Barão Vermelho
23 de fevereiro, às 22 h, no Ópera Hall. Ingresso (inteira): Pista R$ 70; Camarote R$ 100.
Classificação 16 anos. 2105-2000
Classificação 14 anos. 3324-0599 Grupo Salve: 8 de fevereiro | Orquestra JK: 15 e 16 de fevereiro | Os Seis Companheiros: 20 de fevereiro | Tex Quarteto : 21 de fevereiro | Túlio Borges: 22 de fevereiro | Geórgia W. Alo: 23 de fevereiro | Grupo Imagem: 26 de fevereiro | André Togni: 27 de fevereiro | Sheilami e Marcos Farias: 28 de fevereiro.
M ú s ic a
Gabriel Wickbold
A Embaixada de Portugal no Brasil e o Instituto Camões trazem a Brasília o pianista Pedro Burmester. Ele abre a temporada 2013 da Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Claudio Santoro, onde serão apresentadas três obras sob a regência do maestro Cláudio Cohen. São elas: O amor industrioso, de João de Sousa Carvalho, compositor e músico português do século 18; Concerto em lá menor op.54 (piano e orquestra), de Robert Schumann; e 3 episódios sinfônicos, de Ney Rosauro.
roteiro exposições
À luz da criação
Priscila Praxedes
cultura@meiaum.com.br
Darel de corpo inteiro
Até 10 de março, de terça a domingo, das
Até 10 de fevereiro, das 9 h às 18h30, no
9h às 21h, na Caixa Cultural. Entrada
3325-2589
A mostra traz 36 obras do artista pernambucano Darel Valença Lins. São pinturas, gravuras e desenhos produzidos em diversos períodos de sua carreira. A temática do trabalho percorre o mundo real e imaginário na representação de máquinas, cidades, lugares, figuras femininas impregnadas de erotismo.
Museu Nacional. Entrada franca e livre.
A exposição do venezuelano Armando Reverón (1889–1954) tem 174 peças, entre pinturas, desenhos, objetos e fotografias. A obra de Reverón é conhecida por ser repleta de imagens oníricas, desfocadas, com luz intensa e muitas cores.
franca e livre. 3206-9448
exposições
Simplesmente Lan
Até 10 de março, das 9h às 21h, na Caixa
Cultural. Entrada franca e livre. 3206-9448
O italiano Lanfranco Aldo Ricardo Vaselli Cortellini Rossi Rossini, ou simplesmente Lan, traz 40 ilustrações que representam o Rio de Janeiro com desenhos do carnaval, das curvas das mulatas e das célebres figuras da música, como Pixinguinha e Cartola. A exposição apresenta também um documentário sobre a vida e obra desse artista, que vive no Brasil desde 1950.
Cai Guo-Qiang – Da Vincis do povo
Até 31 de março, de terça a domingo,
das 9 h às 21h, no CCBB. Entrada franca e livre. 3108-7600
Obras como aeronaves, submarinos, discos voadores, robôs e porta-aviões artesanais. O artista chinês utiliza até pólvora como matéria-prima. Algumas áreas do CCBB Brasília ficam ocupadas por 29 robôs funcionais feitos à mão pelo inventor chinês Wu Yulu, que também vem ao Brasil. Outro espaço abriga uma instalação multimídia formada por 40 pipas de bambu e seda, presas ao chão por hastes animadas. Nelas, são projetados diferentes vídeos. A mostra conta com um espaço interativo, onde crianças serão estimuladas a desenvolver capacidades criativas. Eles produzirão seus próprios robôs, aviões, submarinos e discos voadores a partir de objetos do dia a dia.
Ramiro Bernabó
Até 24 de fevereiro, das 9 h às 17 h, na gale-
Sorte da arte
tados. Entrada franca e livre. 3215-8080
Cultural. Entrada franca e livre. 3206-
ria do Salão Nobre da Câmara dos Depu-
O artista apresenta 25 desenhos em impressão com tinta mineral sobre canvas, tecidos grossos utilizados para tendas e velas. A exposição tem trabalhos feitos de 2000 a 2012. As peças são inspiradas em artistas que conheceu na Bahia, como Pancetti, Jenner Augusto, Mário Cravo, Mirabeau Sampaio e Carybé.
Até 3 de março, das 9h às 21h, na Caixa 9448
Mostra comemorativa dos 50 anos das Loterias da Caixa, com 29 telas. Obras de importantes artistas brasileiros, como Djanira, Aldemir Martins, Carybé, Di Cavalcanti, Carlos Scliar e Francisco Rebolo compõem a mostra, que reúne obras desde a década de 1960.
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interior em alguma região não definida do Brasil, com seus moradores, valores e preconceitos. A montagem tem músicas tocadas e cantadas pelos próprios atores ao vivo. No elenco, Barbara Abi-Rihan, Celso Gayoso, Fabiano Raposo,Felipe Silcler, Marina Monteiro, Pedro Poema e Zé Wendell.
Concerto para crianças
Até 17 de fevereiro, sábados e domingos, às 16 h, no Banco do Brasil do
Shopping Iguatemi. Entrada franca e livre. 3577-5000
Aos nossos filhos
Até 24 de fevereiro, sextas e sábados, às 21h; domingos, às 20h, no CCBB.
Ingresso (inteira): R$ 6. Classificação 14 anos. 3108-7600
A relação complicada entre mãe e filha. Vera, a mãe, interpretada por Maria de Medeiros, é divorciada, tem dois filhos e três enteados. Lutou contra a ditadura no Brasil, pegou em armas, foi exilada e morou em diversas partes do mundo. A filha, Tânia, vivida por Laura Castro, é casada há 15 anos com outra mulher, que está grávida do primeiro filho do casal. O conflito acontece quando Tânia conta à mãe que terá um filho.
Arresolvido
De 21 de fevereiro a 17 de março, de
A vida e obra de Debussy (1862–1918), músico e compositor francês, é contada por meio de cenas que reportam a momentos marcantes na trajetória do artista. As obras do compositor são executadas ao vivo por um grupo de câmara: Francisca Aquino (piano), Beth Ernest Dias (flauta) e Janaína Salles (violoncelo). No elenco teatral, Cirila Targhetta, Luciano Porto e Micheli Santini, que se desdobram em diversos papéis ao longo da apresentação. Com 40 minutos de duração.
O trenzinho do caipira
De 22 a 24 de fevereiro, sexta, às 15h30; sábado e domingo, às 17h, no Teatro
da Caixa. Ingresso (inteira): R$ 10. Classificação livre. 3206-9448
O espetáculo infantil da Cia. do Abração apresenta uma história na qual a importância da música erudita e a beleza da diversidade cultural brasileira ganham vida. Sete personagens de diferentes regiões do Brasil recebem, simultaneamente, uma misteriosa carta do compositor Heitor Villa-Lobos, convidando-os para uma viagem mágica.
Você não é perfeita, tchau
Até 24 de fevereiro, sextas e sábados,
às 21 h; domingos, às 20 h, no Espaço
Cultural do Brasília Shopping. Ingresso (inteira): R$ 40. Classificação 14 anos. 2109-2122
Marina (Júlia Moraes) é uma mulher de classe média envolvida com questões ambientais e Valdemor (Abaetê Queiroz), um motorista de táxi. Os dois se conhecem em um forró na periferia. Valdenor não acredita em mulher que se sente bem e segura sem a companhia masculina, principalmente a dele. Marina não está disposta a aceitar as investidas de um homem que passe a noite insistindo em conquistá-la. Desse encontro surgem vários conflitos de opinião. Texto e direção de Alexandre Ribondi.
OUTROS
Em cena no Planalto
Até 7 de março de 2013, no Teatro Funarte. Classificação, preço e programação
quinta a domingo, às 20h, no CCBB.
em www.funarte.gov.br.
Ingresso (inteira): R$ 6. Classificação 12
Buquê: de 7 a 10 de fevereiro | Rainhas: de 14 a 17 de fevereiro | Curto-circuito no
anos. 3108-7600
andaime (teatro de rua): de 20 a 27 de fevereiro | Desesperar: de 28 de fevereiro a 3
A comédia de Érida Castello Branco traz o universo de um pequeno povoado do
de março | Seleção nacional da atriz protagonista do musical Cássia Eller: de 7 a 10 de março
Te a t r o
Bel Castro
Teatro
Banquetes e botecos } ilustração Rômulo Geraldino
Por Marcela Benet marcela.benet@gmail.com
romulog2000@yahoo.com.br
Quer comer num restaurante que é barzinho de tapas e pizzaria? Vá ao Dona Lenha
1 2 3,5 4 5 Dona Lenha é um restaurante que está em Brasília há 15 anos. Começou como pizzaria de sucesso na 201 Sul – tinha como carro-chefe as pizzas de massa fina, crocantes, com recheios diferentes, novidade na época. Hoje são seis lojas, dirigidas pelo chef de cozinha Paulo Mello, criador e consultor da rede. Estão no Lago Sul, na Asa Sul, na Octogonal, na Asa Norte e em Águas Claras. O conceito é de cozinha mediterrânea, na tradição gastronômica do velho mundo. Os ambientes são aconchegantes e descontraídos, com cores, texturas e mosaicos que lembram a atmosfera da Península Ibérica. A cozinha conta com o reforço do forno a lenha. Para começar, uma entradinha deliciosa: a porção de anéis de lula crocantes com molho de amêndoa tostada serve até três pessoas. Tem várias opções, mas essa, com certeza, é a melhor. Desde agosto, o Dona Lenha oferece um festival de tapas muito interessante. A partir das 18 horas, você escolhe as entradinhas que quiser, paga um valor estipulado por elas e ainda tem um menu de cervejas ou chopinho gostoso para acompanhar. Para desfrutar uma boa refeição, podemos abrir com uma salada Dona Lenha – alface americana, rúcula, agrião, tomate-cereja, muçarela de búfala e atum, temperados com molho Caesar (mostarda, limão, parmesão, alho e alici). É enorme e uma delícia. Depois, dois são meus pratos principais prediletos: o Pesce Amalfitano, filé de peixe fresco assado na lenha, azeite de limão siciliano, molho de alcachofras e arroz preto com perfume de anis-estrelado, leve e extremamente saboroso; e o Bife Ancho Black Angus Argentino grelhado, com vinagrete de hortelã e dois acompanhamentos à escolha. Normalmente opto pelo ratatouille, legumes assados na lenha, e a salada verde ao vinagrete de framboesa. Muito bom, mas um pouco gorduroso. Vale um comentário: o mais recente Dona Lenha, o da 202 Sul, ainda não está preparado para a grande demanda do almoço. Esperei minha comida durante uma hora e dez minutos. Todos os pedidos das mesas ao meu lado chegaram, menos o meu. E o bacalhau veio com espinhas! O Dona Lenha não se resume a restaurante e barzinho de tapas, é também uma bela pizzaria – onde tudo começou e que, pelo andar de carruagem, vai continuar por muito e muito tempo.
202 Sul, bloco C, loja 36 (61) 3322-1234 Domingo: 12h–23h Segunda a sábado: 12h–0h
NEM TUDO QUE VOCÊ
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