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Os rumos da dupla aptidão do Sindi
Técnicos e criadores debatem as perspectivas para a raça e o melhor aproveitamento de suas potencialidades para produção de carne e de leite
Adupla aptidão é uma característica peculiar de determinadas raças bovinas, incluindo algumas zebuínas, que vem sendo explorada na pecuária brasileira com bons resultados. Mas, dentro da história da seleção do zebu no país, cada raça tem trilhado um caminho diferente. No caso do Guzerá, a dupla aptidão é valorizada como um diferencial, porém, ao longo dos últimos anos, há uma tendência por selecionar linhagens de corte separada da de leite. Na raça Gir, que, no início da sua seleção no Brasil, foi usada largamente para a produção de carne, o direcionamento mudou nas últimas décadas, tornando-se referência em genética zebuína leiteira, porém há manutenção da dupla aptidão, com determinados rebanhos selecionando linhagens de corte.
A raça Sindi também trilha o caminho da dupla vocação. Com menos tempo de seleção no país do que Guzerá e Gir, o gado vermelho importado do Paquistão vem apresentando bons resultados nas duas vertentes. Os rumos da raça neste quesito ainda não é uma unanimidade, apesar de boa parte dos criadores defenderem a continuidade da dupla aptidão. “O Sindi exterioriza essa dupla aptidão de forma nata, com carcaça belíssima, ótimo úbere e uma produção a baixo custo de carne e de leite, esse em volume menor que outras raças, mas com sustentabilidade. Isso é muito salutar para a raça”, assegura o presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Sindi (ABCSindi), Orlando Procópio.
Segundo ele, a raça passa por um crescimento expressivo em todos os aspectos. As vendas de sêmen subiram 565% entre 2018 e 2022, saltando de 35.503 doses para 236.230. “O carro-chefe do Sindi é a dupla função”, garante.
É o que pensa também o médico-veterinário e membro do Colégio de Jurados das Raças Zebuínas, Antônio Carlos de Souza. “O Sindi apresenta resultados muito bons em cruzamentos, imprimindo uma padronização dos produtos, sem deixar de lado a produção de leite. Essa vocação da raça deve prevalecer”, destaca.
O criador Adaudio Castilho faz coro à preservação da dupla aptidão. “Assim como todas as raças zebuínas tiveram evolução, o Sindi também tem avançado e deve continuar sendo melhorada geneticamente tanto para corte quanto para leite. Ela conquistou espaço no mercado brasileiro justamente por essa particularidade”, opina Castilho.
Dupla aptidão na prática
O pecuarista Alberto Rodrigues da Cunha Júnior cria a raça há dois anos e meio em Três Lagoas/MS, onde está baseado seu criatório Sindi Aroeira. Como trabalha com engorda de gado a pasto na região do Chaco paraguaio, viu na rusticidade do zebuíno vermelho uma alternativa para melhorar o desempenho de seu rebanho comercial. O Chaco tem grandes oscilações de temperatura, com verões mais quentes e invernos bem frios, parecido com a região de origem do Sindi, no Paquistão. Por conta disso, o gado cruzado apresenta muita infestação de carrapatos.
No ano passado, o criador inseminou a vacada cruzada com Sindi para melhorar a rusticidade, a docilidade e a precocidade de abate. “A raça caiu como uma luva para o Chaco, pois lá é difícil de encontrar mão de obra qualificada para manejar animais que não tenham temperamento tão dócil como o Sindi”, explica.
Como também pretende atender a pecuária leiteira do Paraguai, Alberto está selecionando linhagens mais leitei- ras de Sindi. “O leite é um fator que vem a acrescentar na pecuária comercial de corte, mas é preciso saber como ele funciona a campo neste tipo de rebanho, ou seja, o que fazer com esse leite. Acredito ser desnecessário um gado direcionado ao corte com tanto leite ofertado pela mãe. Sem falar que exige funcionários preparados para manejar os animais de dupla aptidão. Vai chegar uma hora que o Sindi terá de separar as aptidões”, defende.
Melhoramento da dupla aptidão
A raça participa do PMGZ Corte e do PMGZ Leite e conta com vários touros avaliados para ambas as aptidões. O superintendente Técnico da ABCZ, Luiz Antonio Josahkian, explica que a dupla aptidão é um duplo desafio. “Se o criador sabe aonde quer chegar, o passo seguinte é definir como chegar lá, quais são os critérios de seleção. Na dupla aptidão, é preciso medir carne e leite. O melhoramento deve ocorrer de forma equilibrada. Além disso, é preciso entender que os ganhos genéticos são proporcionalmente menores quando as duas aptidões são trabalhadas juntas” diz Josahkian.
A gerente do PMGZ Leite, Mariana Alencar, defende a importância do controle leiteiro para a evolução da raça, pois gera dados oficiais de desempenho dos animais que podem contribuir para a seleção de exemplares de melhor produção leiteira. “Futuramente, se forem identificadas e selecionadas linhagens leiteiras, os criadores que quiserem atender o mercado de cruzamento para leite terão de se preocupar também com a conformação leiteira dos animais. Esse direcionamento da seleção deve ser dado pela associação”, alerta.
Fausto Pereira Lima, um dos nomes mais importantes da pesquisa pecuária, defende que, para produzir leite, o Sindi deve ser separado da seleção para corte. “Sindi para leite tem que modificar o sistema mamário e, com isso, o períneo ficará mais curto e o traseiro na sua parte interna ficará com pouca musculatura. Um trabalho de longo prazo, onde precisa escolher touros que transmitam esta característica. Achamos que o Sindi é A2A2 por natureza, sendo assim, o leite da vaca Sindi poderá ser muito valorizado. Seleção para gado de leite é diferente de seleção para corte”, atesta.
Segundo ele, o Sindi é um gado muito uniforme, com conformação definida, e os criadores não deveriam modificar essa característica. “O que queremos do Sindi agora, em um gesto mais profundo, não é o Sindi de cada um, mas o Sindi de todo mundo”, finaliza o pesquisador.
A dupla aptidão foi debatida durante o “Fórum e Encontro Técnico – Cenários e Perspectivas para a Raça Sindi”, realizado nos dias 2 e 3 de fevereiro, em Uberaba/MG.