Philos v.3 n°.13 (2017)

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Philos

PORTUGUÊS CATALÀ ESPAÑOL FRANÇAIS ITALIANO ROMÂNĂ REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA 13 fevereiro 2017 · REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA 13 febrero 2017


Philos

PORTUGUÊS CATALÀ ESPAÑOL FRANÇAIS ITALIANO ROMÂNĂ REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA 2 fevereiro 2017 · REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA 2 febrero 2017

FRANCISCO CARVALHO SOUZA PEREIRA ROMAN LOPES JOSÉ ANGELO RODRIGUES VICTORIA TULER VAGNER SILVA HELENA BARBAGELATA DAVID ORTEGA MAGDA FERNANDES & JOSÉ DOMINGOS CINTHIA KRIEMLER CAIO LOBO LEANDRO JARDIM ORIETTE D’ANGELO DIANA MONCADA KÁTIA GERLACH


PORTUGUÊS CATALÀ ESPAÑOL FRANÇAIS ITALIANO ROMÂNĂ REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA 13 fevereiro 2017 · REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA 13 febrero 2017

EXPEDIENTE

REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA

Souza Pereira

EDITOR CHEFE | EDITOR EN JEFE

Sylvia de Montarroyos

COMITÊ EDITORIAL | COMITÉ EDITORIAL

Lucrecia Welter

REVISÃO DE TEXTOS | SUPERVISIÓN DE TEXTOS

Maus Hábitos

DESENHO E DIAGRAMAÇÃO | DISEGÑO Y DIAGRAMACIÓN

Helena Barbagelata

ILUSTRADOR | DIBUJANTE

SOBRE A OBRA DESTA EDIÇÃO | SOBRE LA OBRA DE ESTA EDICIÓN

Publicado originalmente em fevereiro de 2017 com o título Philos, Revista de literatura da União latina. Os textos desta edição são copyright © de seus respectivos autores. As opiniões expressas e o conteúdo dos textos são de exclusiva responsabilidade de seus autores. Todos os esforços foram realizados para a obtenção das autorizações dos autores das citações ou fotografias reproduzidas nesta revista. Entretanto, não foi possível obter informações que levassem a encontrar alguns titulares. Mas os direitos lhes foram reservados. Philos, Revista de Literatura da União Latina é registrada sob o número SNIIC AG-20883 no Sistema Nacional de Informações e Indicadores Culturais com Certificado de Reserva outorgado pelo Instituto Nacional de Direitos do Autor sob o registro: 10-2015-032213473700-121. ISSN em trâmite. Revista Philos © 2017 Todos os direitos reservados. | Publicado originalmente en febrero de 2017 con el título Philos, Revista de literatura de la Unión latina. Los textos de esta edición son copyright © de sus respectivos autores. Todos los esfuerzos fueron hechos para la obtención de las autorizaciones de los autores de las citaciones o fotografías reproducidas en esta revista. Sin embargo, no fue posible obtener informaciones que llevaran a encontrar algunos titulares. Pero los derechos les fueron reservados. Philos, Revista de Literatura de la Unión Latina es registrada bajo el número SNIIC AG-20883 en el Sistema Nacional de Informaciones e Indicadores Culturales con Certificado de Reserva otorgado por el Instituto Nacional de Derechos del Autor bajo el registro: 10-2015-032213473700-121. ISSN en trámite. Revista Philos © 2017 Todos los derechos reservados.

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Philos, Revista Philos Revista de de Literatura Literatura da da União União Latina Latina || Revista Revista de de Literatura Literatura de de la la Unión Unión Latina. Latina.


EDITORIAL

REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA Cantando os frevos e os sambas, inauguramos a edição de número 13 da Philos. E assim como o ritmo agitado, dançante e convidativo dos carnavais saudosos, tomamos as ruas e avenidas para apresentarmos os nossos blocos literários. Entre fitas e confetes, rimas e cantigas, sorrisos e alegrias, desfilamos neste caderno os contos, poemas e textos experimentais de nossos autores e colaboradores. Todas as vozes e todas as cores se encontram nesta edição para tornar ainda mais multicultural a nossa latinidade. A temática desse editorial “O outro, o mesmo” é inspirada na tradução do título do livro de poemas El otro, el mismo (1969) de Jorge Luis Borges. Queremos com ele expandir nossas interferências sobre a arte, seja pelo ativismo ou pela metáfora, provocar reflexões sobre o nosso lugar no mundo. Nas páginas da Philos, contemplamos a obra artística de nossa colunista e curadora de literatura lusófona, Helena Barbagelata. As suas ilustrações de técnicas mistas, revelam a beleza e a delicadeza de sua percepção única sobre os textos que aqui se apresentam. Ao som dos tambores e alfaias de maracatu, a Philos se despede do carnaval e inaugura mais uma edição repleta de arte e plurilinguismo. Desejamos uma ótima leitura,

Souza Pereira

EDITOR CHEFE | EDITOR EN JEFE

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EDITORIAL

REVISTA DE LITERATURA DA UNIÃO LATINA REVISTA DE LITERATURA DE LA UNIÓN LATINA Cantando los frevos y los sambas, inauguramos la edición de número 13 de la Philos. Y así como el ritmo agitado, dançante y convidativo de los carnavales saudosos, tomamos las calles y avenidas para presentar nuestros bloques literarios. Entre cintas y confetes, rimas y cantigas, sonrisas y alegrías, desfilamos en este cuaderno los cuentos, poemas y textos experimentales de nuestros autores y colaboradores. Todas las voces y todos los colores se encuentran en esta edición para hacer aún más multicultural nuestra latinidad. La temática de este editorial El otro, el mismo es inspirada em el título del libro de poemas El otro, el mismo (1969) de Jorge Luis Borges. Queremos con él expandir nuestras interferencias sobre el arte, sea por el activismo o por la metáfora, provocar reflexiones sobre nuestro lugar en el mundo. En las páginas de la Philos, contemplamos la obra artística de nuestra columnista y curadora de literatura lusófona, Helena Barbagelata. Sus ilustraciones de técnicas mixtas, revelan la belleza y la delicadeza de su percepción única sobre los textos que aquí se presentan. Al sonido de los tambores y alfaias de maracatu, la Philos se despide del carnaval e inaugura más una edición repleta de arte y plurilinguismo. Deseamos una óptima lectura,

Souza Pereira

EDITOR CHEFE | EDITOR EN JEFE

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SUMÁRIO | SUMARIO CONTOS | COLUNAS | ARTIGOS CUENTOS | COLUMNAS | ARTÍCULOS

8 Os pés de

Bernadete,

por

FRANCISCO CARVALHO

11 Pássaros Azuis,

por SOUZA PEREIRA

15 O coro das oceânidas,

18 Blues por JOSÉ

ANGELO RODRIGUES

21 Ode ao

silêncio,

quanto (ao) tempo?, por VAGNER SILVA

25 La viralid

como fenómeno de masas, por DAVID

JARDIM

28 Imagem

D’ANGELO

latente,

por MAGDA

FERNANDES & JOSÉ DOMINGOS

29 Regras da casa,

por CINTHIA KRIEMLER

32 Cronos

alucinado,

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vida a cada 5 minutos, por LEANDRO

38 A mi profesora

por VICTORIA

TULER

34 Segredos da

ORTEGA

por

ROMAN LOPES

carnaval,

23 Distância e

por CAIO LOBO

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de literatura del colegio, por ORIETTE

41 Giovanna "no

seamos cómplices", por

DIANA MONCADA

44 Churros de saturno,

por KÁTIA GERLACH



LITERATURA BRASILEIRA

CONTOS

Rotas da lusofonia

OS PÉS DE BERNADETE

por

Francisco Carvalho1

Tinha 19 anos e acabado de me mudar pra Recife. Apaixonei-me pela minha nova rua

logo no primeiro mês. De domingo à quinta, o silêncio era quase sepulcral; às vezes rompido pelo saxofone de um senhor de 93 anos que morava no começo da rua e os gemidos da vizinha do andar de baixo. O meu apartamento ficava no quarto andar e, da varanda, era possível ver a casa 26 que, aos fins de semana, enchia toda a rua de música. Ninguém reclamava. Na verdade, o incomum seria alguém não descer até a casa 26 para dançar frevo e paquerar as meninas que ali apareciam. Foi numa dessas descidas até a casa 26 que conheci Bernadete. Ela era uma negra linda, tinha cabelos cacheados, cuidadosamente bagunçados, lábios carnudos, um belo nariz arrebitado e olhos castanhos escuros que pareciam enxergar minha alma e minhas intenções. Dançava frevo como nunca antes ou depois eu vira alguém dançar. Quando nos vimos pela primeira vez, ela me virou o rosto, me esnobou. Ouvi do dono da casa que ela não era dali. Que estava de passagem e tinha se hospedado na rua de cima, numa pousada entre a igreja e a delegacia. Uma semana havia se passado desde a primeira vez que a vi. Logo que a banda começou a chamar para o frevo, eu desci correndo as escadas do prédio. Sentei-me na calçada e esperei Bernadete aparecer. Não demorou, e ela apareceu de guarda-chuva de frevo na mão, saia rodada, pés descalços e um sorriso no rosto que, dessa vez, me contemplava. A música começou e os passos de Bernadete também. Logo procurei desviar o olhar de suas coxas que brilhavam sob a luz do sol, seus seios que começavam a suar na blusa amarela, sua saia que levantava a cada descida ao chão. Olhei para os pés, foquei ali minha atenção, eu era quase um devoto dos seus pés, pés firmes e belos que ignoravam o chão quente e a poeira. Após duas horas de tão belo balé, Bernadete entrou na casa, e eu, como um menino que espera um doce, acompanhei-a. Assim que ela pegou um copo de água no filtro de barro, eu lhe ofereci um lenço. - Eu conheço você? – ela me perguntou me encarando. - Não. Meu nome é Pedro, eu sou novo na cidade. – respondi. - Ah, eu sou Bernadete. - Você dança muito bem, Bernadete. - Você é um bom observador, Pedro. - Desculpa, não queria ser indiscreto. - Tudo bem. Pelo menos você olhou para os meus pés. – Ela disse, devolvendo-me o lenço e voltando para a rua. Tentando não parecer que a perseguia, esperei alguns minutos e saí para vê-la dançar. Não a encontrei. Pensei que, se esperasse, talvez ela aparecesse correndo, sorrindo e dançando; mas ela não apareceu mais naquele dia. Voltei pra casa no fim da noite, pensando no que teria acontecido com ela. Aquela noite, eu quase não dormi. Cheirava o lenço e pensava 8

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em Bernadete. Pensava no sábado, talvez no sábado ela aparecesse. No sábado, acordei cedo e, antes mesmo de a banda chamar, eu lá estava. Não demorou muito e a rua começou a se encher de gente, se encher de carro, se encher de música, se encher de um boato. Disseram que a menina que estava de passagem tinha ido embora e não voltaria mais. Tomado pelo desejo de que fosse apenas boato, corri até a rua de cima. Chegando ofegante à pousada, perguntei à senhora que era dona do lugar. - Uma moça chamada Bernadete? A senhora sabe se ela está aí? - Uma que dançava frevo com os pés descalços? - Sim, a senhora sabe dela? - Ih, menino! Ela foi embora ontem mesmo. Meu rosto vermelho do sol de repente ficou pálido. Como ela tinha ido embora assim do nada, se ainda ontem ela dançava frevo na rua de baixo? Nada fazia o menor sentido pra mim. Quando eu estava saindo da pousada e dentro de mim começando a odiar a rua nova, a senhora que antes fora a portadora de uma má noticia me chamou. - Ei, menino! - Sim. - Seu nome é Pedro, o observador? – ela perguntou enquanto segurava um envelope na mão. - Sim, por quê? - Ela deixou um envelope pra você. - Envelope? Pra mim? - Sim, aqui. – respondeu ela me entregando o tal envelope. Sentei-me na calçada da pousada e, respirando fundo, abri o envelope com o cuidado de um apicultor mexendo num ninho de vespas. Dentro tinha uma foto de Bernadete sorridente numa nudez tão bela quanto eu imaginava. No verso, uma mensagem: “Ao observador que olhou apenas para os meus pés enquanto sua alma pedia para olhar o meu corpo, ofereço minha nudez. Procure-me. Sua Bernadete.”

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Francisco Carvalho (Maceió, 1988). Poeta e contista, é também professor de história, graduando-se pela Universidade Federal de Alagoas. 1



LITERATURA BRASILEIRA

CONTOS

Rotas da lusofonia

PÁSSAROS AZUIS por

Souza Pereira1

Gunnar, Antes de iniciar para você um breve relato sobre minha vida nos últimos meses em que estive na ilha de Bali, quero que saiba que os anos em que vivi ao seu lado foram suficientemente construtores para mim, que me senti realizada como mulher e mãe. Mas quero que saiba também que o Amor é uma pequena gota de tinta que vez ou outra escapa das mãos de Deus e colore os nossos quadros brancos com um pouco mais de vida. Neste momento, escrevo em tom de despedida, mas também de gratidão, afeto e profunda admiração pelo homem que você é. Quando retornar à França, em uma ou duas semanas, irei vê-los, pois tenho saudades de você, de nossa casa, de nossos filhos. Mas, para lhe ser fiel e sincera, adianto-lhe que não existirá mais entre nós nenhuma ligação primordial de homem e mulher, apenas um sentimento de respeito e cumplicidade. E é por conhecer intimamente essa alma compreensiva, disfarçada de ser humano, existente em você, que lhe descrevo as sensações, amores e conexões com o divino, experimentados neste lugar maravilhoso. Tornarei a escrever em poucos dias, quando chegar ao Paquistão, pois a mim restaram apenas o dever e a necessidade de realizar os seus últimos desejos de vida. *** Existia, entre nós, algo menos metodológico e mais pluralizado em relação aos sentimentos que nos cercavam. No primeiro dia de sua chegada à ilha, contive-me em apenas elaborar um plano sucessivo de voyeurismo filosófico longe de qualquer óptica carnal e primária que fosse possível. Tinha, pela Ashna, um sentimento espontâneo de admiração em sua capacidade de permitir-se enxergar de outras formas, em outros olhares, pontos de vista, simétricas, parábolas. Desembarcara em meio às chuvas torrenciais que chegam ao arquipélago todos os meses de maio, e, junto com ela, havia um casal de ingleses e espanhóis, que aparentemente não se conheciam e tornaram-se companhias de viagem, o que é, para mim, um fato completamente normal, visto que eles seriam as únicas pessoas estrangeiras com as quais manteria contato por estes lados do Índico nas semanas seguintes. Ashna saiu por último, com seus cabelos esvoaçantes, frente ao vento sul que soprava forte; mas não foi isso que me chamou a atenção, não foi a sua beleza ou características físicas, e sim o pequeno baú chinês que carregava nas mãos e algumas telas em branco debaixo dos braços. A jovem paquistanesa, além de ser a primeira artista que eu conhecera pessoalmente na vida, foi também a primeira mulher que amei intensamente. Havia, entre nós duas, um espaço intransponível que ligava qualquer razão de sentimentalismo e racionalidade. O início dos exercícios de amor não veio à minha presença como algo premeditado ou arrebatador, eu sequer fui capaz de perceber a sua essência, a sua forma de manter-se vivo o ou de nascer dentro em mim. Tenho uma ideia fixa em minha mente: que o amor nasceu

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Carta de Herta Antipoff para Gunnar Seymour


às cinco horas da manhã de uma quarta-feira, bastante fria e perturbadora. Foi somente quando avistei, de minha janela, dois pássaros azuis voando baixinho por entre as flores tropicais, que ele brotou em minha alma. A partir daí, tive de conviver com esse pequeno deus das misérias que nos traz toda a sorte possível e deslumbre com o mundo e os seres que nele vivem. Fosse como fosse, inesperadamente ou não, o amor tinha dessas características mais sublimes de nos tomar o tempo de repente, e agir como se fôssemos pequenas peças de um quebra-cabeça onde tudo estava interligado. Tudo que Ashna pintava, desenhava, rabiscava em seu caderno de anotações, ou mesmo escrevia, era para mim como um retrato, uma fotografia, uma arte concreta de si mesma. Nunca fui capaz de entender os seus desejos de desvencilhar-se logo de suas obras, assim que elas estivessem prontas, não gastando mais do que dez ou quinze segundos para apreciar a sua magnitude. Foi assim também com as cartas que me escrevera um dia, foi assim com alguns pequenos textos e anotações de seu caderninho, foi assim comigo. Mas a sua presença ainda reverbera, isso eu não posso negar. Aliás, tudo que ela construiu ainda a contém, e por isso mantenho, sob meu alcance, seus desenhos, quadros e anotações desde o primeiro dia em que esteve em Bali. Se havia algo de resplandecente no sorriso da Ashna, era o fato de que ela havia se tornado uma das pessoas mais contraditórias que se pode imaginar. Não bastava apenas amar-me, mas também usar-me de inspiração para as suas mais tristes aquarelas, e escrever sobre mim como uma de suas divagações psicológicas no seu caderninho de anotações. A partir dela, comecei a perceber que algumas coisas eram mais simples e menos figurativas do que eu poderia imaginar. No dia em que nos encontramos, o céu era azul e as ondas ondeavam lentamente os mares do sul. Ashna mostrou-me um desenho que havia acabado de concluir enquanto esperava pelo café da manhã em uma das belas sacadas do prédio em que nos hospedamos. Na ocasião, vestia-se com um lindo vestido floral alaranjado e um chapéu com algumas flores pintadas. Hoje posso dizer, com toda certeza, que ela mesma foi responsável pelos desenhos no chapéu. Chamou-me para conversar e, sem receios, atendi ao seu convite, era o início de uma amizade de longos anos, que culminaria com um amor eterno e uma vida bastante curta. Conversamos sobre a sua viagem e sobre o seu trabalho. Ela me contou que voltara de uma exposição naturalista no Brasil, e que se sentia inspirada para trabalhar com algo semelhante ao que havia visto. Aparentemente, ela experimentava uma nova áurea pela pintura, um novo sentimento instigador e inspirador. Estava começando a criar um novo conceito para suas obras, e escolhera as remotas ilhas da Indonésia para momentos de paz e tranquilidade, enquanto depurava as doses extras de arte que recebera. Foi nesse mesmo dia que ela me fez outro convite irrecusável, mais formal que o primeiro. Depois de me presentear com o desenho de dois pássaros feito em nanquim e papel naquela mesma manhã, perguntou-me se eu estaria interessada em posar para algumas telas que ela estaria pronta para começar. Queria retratar algo mais natural e bruto das riquezas de Bali, e queria começar pela sua visão mais antropofágica e enaltecedora. Olhando bem em seus olhos, fui tocada pelo som de cada palavra emitida pela sua boca. Soavam como sinfonias delicadas e chamativas, fazendo-me aceitar o convite, como se as ninfas o tivessem feito ao pé do ouvido. Saímos juntas naquela manhã, e nunca mais voltei ao quarto do hotel onde me hospedara. Ashna me presenteou com os dois quadros que fizera nas duas semanas seguintes às que fi12

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camos juntas. No primeiro, apenas o meu rosto tomava conta de toda a extensão da tela. No segundo, havia uma floresta e algumas flores com insetos e pássaros azuis. Algo de surrealista permeava as suas pinturas e eu somente fui capaz de perceber essa essência particular quando já era um pouco tarde demais. Todas aquelas noites foram encantadoramente maravilhosas, assim como também os dias, as horas e todos os ternos segundos em que estive ao seu lado. Mas, foi ao final da pintura de uma série de sete quadros intitulados ‘ Divagações em Bali’, que Ashna adoeceu. A deusa da enfermidade transpassara a sua órbita universal e desposou o corpo dela. Seu olhar era doentio, sua boca era pálida, sua face amarelada; apenas o seu coração frutificava. No dia do ocaso, Ashna ainda estava bastante fraca, mas fez-me prometer que iria levá-la ao monte Gunung Agung, o ponto mais alto da ilha. Assim dizia ela: – “ Estarei o mais próximo possível de Deus e de toda a criação ”. E foi somente quando chegamos que ela me beijou ternamente; conversamos durante muito tempo sobre como fomos felizes em nos encontrar naqueles dias em Bali e sobre as armadilhas do destino. Juramos viver intensamente qualquer amor que nos fosse oferecido, desde que puro e gentil. Estava prestes a amanhecer o dia quando ela retirou do bolso de seu vestido um pequeno caderninho de anotações, que eu nunca vira. Havia em sua capa algumas inscrições em português. Imaginei que poderia se tratar de um poema, e que ela o trouxera de sua última viagem ao novo mundo. Em suas páginas, uma série de poesias intituladas “ Biografia da Esfinge”. Hoje, dias passados desde a sua morte, percebo que a Esfinge, a que ela se referia, estava muito mais próxima de mim do que eu poderia imaginar. Cada verso seu me ressoava. No final do caderno de anotações, havia um endereço da cidade de Lahore, próxima à divisa do Paquistão com a Índia. E é para lá que serei direcionada nas próximas horas, meu voo sairá em poucos minutos. Uso o tempo que me resta em Bali para redigir esta carta e avisar-lhe que nunca estive mais feliz em toda minha vida. Antes de enviar este correio eletrônico, vejo pela janela da cafeteria do aeroporto uma imagem arrebatadora. Está chovendo, assim como no dia em que nos conhecemos, e sou capaz de avistar dois pássaros azuis voando: eu e ela. Herta Antipoff, Bali, 2005

Souza Pereira (Recife, 1994). Escritor e editor da Philos, Revista de Literatura da União Latina. 1

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LITERATURA BRASILEIRA

ARTIGOS

Rotas da lusofonia

O CORO DAS OCEÂNIDAS

por

Roman Lopes1

Em um tempo onde o imperativo do teatro é trabalhar com imagens e a criação coletiva é quase uma obrigação politicamente correta, o texto teve de sair do lugar que antes ocupava e se reinventar, para não ser definitivamente exorcizado do universo teatral. Deixando de lado radicalismos passionais, o fato é que o texto virou artigo acessório; e o dramaturgo, uma figura quase ausente dos processos criativos, por mais que os nomes se mantenham em evidência, seja por vaidade ou por um corporativismo que tomou conta até do fazer artístico, coisa impensável para quem não corrobora dos valores da indústria cultural. Sem aprofundar esse debate, pois não é esse o objetivo dessa missiva, e sem nenhum tipo de saudosismo, não dá para esconder o prazer do autor dessas tortuosas linhas com a leitura de um texto teatral, principalmente quando o texto reflete todo esse processo de transformação que o fazer teatral vem sofrendo no decorrer do tempo. E esse prazer veio como uma enxurrada extática com a leitura das peças de José Manuel Lázaro. DÍPTICO – ALÉM DAS CINZAS, O OCASO DA PRIMAVERA e OS ÚLTIMOS OLHARES DE VLADIMIR formam uma trilogia não intencional, que mais parece um oceano, ora embalado pela leve brisa da poesia, ora revirado por altas ondas tempestuosas, mas sempre com a dose exata do mistério oceânico, que nos obriga o tempo todo a um navegar respeitoso e compartilhado, para não sermos tragados por suas múltiplas surpresas, o que, no caso dessas peças, às vezes, é uma inevitável alegria. OS ÚLTIMOS OLHARES DE VLADIMIR é a mais dramática das três peças. Com uma estrutura próxima da tradicional, dividida em atos e cenas, o texto está longe de ser conservador. Com um lirismo típico da linguagem poética, misturado com a forte carga simbólica do expressionismo, e com os gritos hiperbólicos característicos da própria linguagem do poeta russo, o texto nos coloca magistralmente diante do conflito entre o indivíduo que se move pelo amor e um sistema opressor que impede qualquer manifestação libertadora. É a melancolia solitária do Dr. Gachet de Van Gogh, misturada ao Grito excessivo de Edvard Munch, em um mundo onde, às vezes, é possível respirar e sorrir, mas que, quase o tempo todo, nos coloca diante de seus bufões-homens (sejam eles com gatos ou sem orelhas) para nos mostrar o vazio em que estamos mergulhados. O sacrifício final do poeta é redentor, sinalizando uma possibilidade de cores vivas nesse mundo cinza... Talvez o amor seja um pincel... Ou uma pena... O OCASO DA PRIMAVERA é um ato sem palavras, apesar de as palavras estarem presentes o tempo todo... Mas elas são apenas sons... Sussurros e delírios... Dividido em oito partes, as quatro estações do ano entremeadas por um ciclo de nascimento e morte, o texto tem a poesia angustiante de Beckett e a crueldade imagética de Jean Genet, isso só para ficar nos autores do Absurdo. Capulho foi estuprada? A Avó assassinou O Aparecido? Ou tudo é um projeto de vida, o desenrolar sarcástico da normalidade? Com alguns momentos do Ro-

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mantismo - no melhor estilo do - ou morrem os amantes ou morre o amor, o texto nos leva às ligações perigosas de Heiner Müller. Só não sabemos se são duas, três ou muitas pessoas que amam... Ou nenhuma... E o mundo continua rodando lá fora... DÍPTICO – ALÉM DAS CINZAS é um tratado indigesto da impossibilidade do amor. Um prólogo de névoas, uma interseção de fumaça e um epílogo de cinzas mostram os paradoxos inevitáveis e dolorosos que nos cercam, recheando duas cenas onde o amor é o centro e a periferia. Os dois calculadores despejam sem piedade o desespero de quem quer se libertar das paredes matemáticas das relações padronizadas. É um turbilhão cabalístico de quem tenta fugir das abstrações vazias que reinam no nosso mundo... E que acaba virando, ele mesmo, uma abstração... As duas portas se abrem para uma nova versão do universo de Ibsen, só que sem nenhuma esperança, nem para Nora, nem para Torvald. A secura maravilhosa dos roteiros-rubricas de Beckett se junta às feridas das carícias de Sergi Belbel... A faca é cravada no nosso coração e a lâmina fica rodando eternamente... Não temos descanso... Essas três peças de José Manuel são relíquias de uma dramaturgia que poderia estar sepultada na cova rasa do teatro contemporâneo, mas que, no sentido oposto, alimentam incrivelmente esse teatro, pois são verdadeiras fontes de imagens e ações densas e plenas... É o manifesto de uma narratividade líquida, difusa e multifacetada... A leitura dessa dramaturgia tão complexa e, ao mesmo tempo, tão simples e direta nos faz sentir o gosto amargo dos sentimentos improváveis em um mundo onde, para eles, não há espaço. A poesia nos traz a ilusão de que é possível cultivar esses sentimentos, apesar de o meio lutar contra (OS ÚLTIMOS OLHARES DE VLADIMIR). Quando a ilusão acaba, sobra a violência dessa luta (O OCASO DA PRIMAVERA). Quando a violência já se tornou parte do nosso organismo, restam apenas as cinzas do vazio (DÍPTICO – ALÉM DAS CINZAS)... Entretanto, a leitura traz também o alento de que a dramaturgia conseguiu reencontrar o seu espaço no teatro atual, com a palavra mais viva e vibrante do que nunca...

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Roman Lopes (Brasil, 1969). Brincante das palavras, que navega nas águas da poesia, da prosa ficcional, da dramaturgia e dos ensaios. Pesquisador acadêmico nas áreas de Artes e Educação. Premiado em concursos literários no Brasil e editor independente de suas obras, tendo publicado uma novela e dois textos teatrais. 1



LITERATURA BRASILEIRA Rotas da lusofonia

BLUES CARNAVAL por

José Angelo Rodrigues1

Em algum momento, aceitei a ideia de que passar o carnaval dentro de um iglu de concreto, num camping, à beira do mar, seria uma coisa boa. Não era uma escolha, mas uma prova de irresponsabilidade. Liguei meu Transglobe Philco, nove faixas de onda, e girei os botões em busca de ouvir um blues. Já não suportava o som de pandeiros, cuícas e tamborins; Zé Keti, Emilinha, Marlene, João Roberto Kelly. Não cheguei a achar. O rádio começou a largar uma fumaça malcheirosa de transistores queimados e, em poucos segundos, parou de funcionar. O cheiro acordou minha mulher que olhou em direção ao rádio e falou: “220”. Apenas isso. Puxei o fio da tomada e empurrei o rádio fumegante com um tabefe bem dado. Espatifou-se no chão, estava acabado. Não precisaria levá-lo de volta pra casa ao fim da viagem. Deixei o camping e fui à rua. O iglu era a coisa mais feia, quente, desconfortável e insalubre que eu havia experimentado, pior que uma sauna de homens peludos. Sentia-me irresponsável por ter caído naquela história toda sobre camping, praia, carnaval e iglus de concreto armado. Bem pintados e azuizinhos queriam parecer um grande bloco de gelo. Nos muros que cercavam o terreno, via ursos polares passeando, impressos numa paisagem glacial. Pinguins, morsas, mergulhões, um esguicho de baleia, um narval, orcas e um esquimó com um peixe espetado na ponta de um arpão. E ainda faltavam três dias para o carnaval terminar. Aquilo tudo me fazia aprender como as mulheres são boas no que fazem. A minha, suando em bicas dentro daquela fortaleza de cimento e vergalhões, continuava defendendo a ideia de que havíamos feito a coisa certa vindo ao camping descansar por quatro dias inteiros. Afinal, eram só quatro dias sob os sóis escaldantes de todos os fevereiros. E havia a praia, a água gelada da praia, o sal da praia, os barcos da praia, a areia da praia, a água de coco que eu não parava de beber querendo me hidratar a qualquer custo. Detesto sal, sol, areia, barcos, praia. Uma insanidade. E ela sabia o quanto eu detesto tudo isso. Estar ali, como palha ao sol, esperando a catástrofe de um incêndio. E a ouvia dizer como eu era teimoso e intransigente, incompreensivo, afetado demais por um calorzinho de merda como aquele. Quase um maricas, um veadinho. À noite, ela dormia pacificada pelos prazeres do dia. Submersa em sua poça de suor, estava no paraíso, pelo menos por quatro dias. Aquilo era sua forma de defender a ideia de que fizéramos a coisa certa indo parar dentro de uma bola de concreto com janelas que pareciam saídas de casinhas de cachorro. Às vezes, ela ressonava, roncava. Seria o canto da sua passiva tranquilidade, da boa escolha que fizera. Do lado de fora do camping, eu observava morcegos cruzarem a circunferência luminosa da lua. Outros homens, como eu, faziam a mesma coisa. Fumavam, outros bebiam cervejas geladas. Sabíamos que éramos todos uns tolos, e pelo mesmo motivo. “Calor, hein…” “Calor…” Não era apenas o calor. Era o preço de evitar uma desavença doméstica que duraria por algumas semanas. Quatro dias sempre seriam mais curtos que algumas sema-

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CONTOS


nas. Os números informavam da vantagem de estar ali. Quatro sempre será menor que sete, menor que quatorze, menor que vinte e um. A depender do humor de cada esposa. O bom era o silêncio e o blues que ouvia. Por algum tempo, imaginei que não ouvia, mas desejava estar ouvindo o blues que se frustrara com o incêndio do rádio. Depois me dei conta de que, em algum lugar, alguém achara a estação que eu procurava, e na voltagem certa. Não foi difícil encontrar um bar de calçada onde um rádio sintonizava uma Jam Session Blues. Elmore James, Robert Johnson, Buddy Guy, Waters e John Lee Hooker cantando Boom, boom, boom, boom. I'm gonna shoot you right down… Sentei e pedi uma cerveja bem gelada. Com o tempo, o bar começou a se encher com os caras que eu via caminhar desorientados pelo camping, dessorando sob coqueiros, bebendo uma cerveja atrás da outra ou se hidratando com água de coco, envolvidos numa procura insana por uma sombra.

1José

Angelo Rodrigues (Rio de Janeiro, 1954). Professor e escritor.

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LITERATURA BRASILEIRA

EXPERIM.

Rotas da lusofonia

ODE AO SILÊNCIO por

Victoria Tuler1

Desconheço o silêncio. Já ouvi falar da lenda de sua existência, e até já frequentamos as mesmas festas, mas ele nunca está realmente lá. No coração ansioso e ocioso, o privilégio da quietude não existe. Quando estávamos no seu carro às três da manhã, cansadas demais para trocar qualquer palavra durante a volta para casa, minha mente gritava. Eu queria todos os detalhes – o cheiro de fumaça e hortelã, a forma como seu cabelo estava preso, a embalagem de fast food no banco de trás, seu chaveiro de Los Angeles. Minha cabeça estava tão concentrada em cravar as unhas no momento e guardá-lo para sempre que nem estava realmente nele. A maldição é ainda pior durante silêncios desconfortáveis. Naquele dia em que você não falou comigo, quando nosso ônibus para Santa Catarina quebrou na estrada, só meu corpo estava na poltrona ao seu lado. Internamente, tudo se traduzia em palavras rudes e estilhaços de medo. Olhava para você e via um poema áspero e inacabado, sem rimas. Acho que é por isso que escrevo – porque antes do papel, minha ansiedade já dita o livro entre uma brecha e outra. O pior silêncio é o da solidão, porque, aí, não tenho nada para traduzir em verbos que não seja meu abismo. Olhar para dentro e confrontar a si mesmo é o maior pesadelo de quem nunca dorme. Nas madrugadas, o imperador está nu. Aperto os olhos na escuridão, e, nas sombras da sala, enxergo meus próprios defeitos. Abro a janela, acendo um cigarro, olho a cidade. Depois das duas e meia, quando durmo sozinha no sofá da sala, eu sou quem sou e quem quero ser. Se não escrevesse, enlouqueceria um pouco mais. Desconheço o silêncio, mas quero confrontá-lo. Meu maior sonho é que, entre uma tragada e outra, ele me encare com seus olhos cor de chocolate. Desejo que mostre sua face, e me envolva em uma meditação respeitosa. Prometo reverenciá-lo como o Deus que é e ambiciona ser. Então, vou enterrar meu rosto em seus ombros frios, e chorar tudo que ele me causou nesses vinte e poucos anos. Quando os soluços forem altos demais e o consumirem, seu corpo alto e esguio desaparecerá. Finalmente estarei livre.

1Victoria

Tuler (Curitiba, 1995). Redatora e roteirista freelancer. Se tivesse escolha, não escreveria.

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LITERATURA BRASILEIRA

EXPERIM.

Rotas da lusofonia

DISTÂNCIA E Vagner Silva QUANTO (AO) TEMPO? por

1

Tempo, diz pra distância que ela não é tão dura quanto pensa. Diz pra ela que, no mundo, há uma legião de fiéis amantes que não vão sucumbir. Diz pra ela que, na verdade, a saudade não mata. Mas deixa buracos, afugenta o sono e entorpece a sobriedade. Ó tempo, diz pra distância que não se brinca com o verdadeiro amor, pois, quando contrariado, ele é fogo consumidor. Diz pra ela que não se desafia o destino, pois ele é desatino quando quer fazer sofrer. Diz pra ela, tempo! Diz pra ela que o coração partido não pode ser combustível de tamanha maldade. Diz pra ela que, apesar do doloroso fim, a gente volta a sorrir; e o amor floresce novamente noutra estação. Diz pra ela que eu sinto muito, mas não tenho culpa do que aconteceu entre vocês. Ó tempo, diz pra mim, diz por mim, diz por nós. Diz pra ela, diz por ela... enquanto há tempo.

1Victoria

Tuler (Curitiba, 1995). Redatora e roteirista freelancer. Se tivesse escolha, não escreveria.

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LITERATURA ESPAÑOLA

COLUMNA

Rutas Literarias de Iberoamerica

LA VIRALIDAD COMO FENÓMENO DE MASAS David Ortega por

1

Fernando Pessoa consideraba que todo el conocimiento se basaba en una herramienta teórica de nuestra mente racional: la analogía (Del primer Fausto, 1908-1933). Una analogía es una forma de argumentación inductiva (se parte de lo particular para trasladar lo general) en la que se comparan y se relacionan estrechamente conceptos con características similares. Ésta es la herramienta psicológica que produce más conocimiento falaz, nos hace creer, por ejemplo, que dada la repetición de un caso podemos extrapolar su consecución en todo caso. En la psicología popular, a pie de calle, se hace de la manera más capciosa posible: no se implementan reglas bien definidas como en el método científico. Esta forma de interpretar la realidad está sujeta siempre a la tendencia que tenemos a la comparación, dado que estamos sometidos como humanos a pensar en base a la experiencia por contraste que tenemos de las cosas. Así pues, nuestro razonamiento analógico, inductivo, nos hace vulnerables a la propaganda y el marketing que realiza una “fuerza inductiva”. Por lo tanto, la problemática del argumento analógico reside en que podamos inferir algo no perceptible, partiendo de lo mundano y perceptible en la experiencia, y sin utilizar correctamente reglas formales de un sistema lógico. Lo que es seguro es que apenas especulamos, sino que inferimos. Especular supondría pensar y dudar sobre ello. Inferir es concluir mediante el razonamiento en sus diversas formas. La estrategia principal del marketing viral es el astroturfing, que se basa en presentar una mentira con revestimiento de verdad. El engaño se fundamenta en hacer creer que hay una base social espontánea detrás de una idea, marca, producto, partido político, etc. para conseguir arrastrar a la masa real hacia el objetivo. Los intoxicadores del virus (asesores, consultores, catalizadores, cierta clase de periodistas, influencers, celebreties, etc.) suelen estar al servicio de grandes empresas/marcas o partidos políticos. “Viral” viene de virus, aquí también hay una analogía entre la sociedad y un sistema biológico. El organismo se ve afectado por algo externo que trata de apoderarse de él; cuando se trata de un movimiento social, el virus es más fácil que se propague, ya que entran en juego factores dinámicos sin contrapeso. Un sistema bilógico tiene sus defensas, un grupo social no. Precisamente, por esa forma de inducir la realidad sin reglas formales que presenté al principio. Cuando se infiere falazmente es más fácil ser dirigido, sólo hace falta dar una referencia creando una falsa expectativa, el sentido o significado que lo auspicia queda relegado a un segundo plano. Las personas que piensan con cierta autonomía han sido educadas para ello, además de poseer un carácter conformado en una etapa temprana y condicionado genéticamente. Ahí está su contrapeso. Pero hay una gran mayoría, la que, al fin y al cabo, marca la dife25

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rencia, que no ha tenido esa llave con la que aprender a discernir correctamente y poder ser autónomo a la hora de elegir lo que verdaderamente quiere. Por eso, esa deriva a la que nos somete la multitud está diseñada por los intoxicadores, creadores de opinión que marcan la nueva tendencia a seguir. Nos pondremos a correr, escribir, a ser animalistas, fotógrafos, surfistas o viajeros; nos dejaremos barba, nos tatuaremos o llevaremos leggins, odiaremos el azúcar, nos compraremos un palo de selfie, estudiaremos criminología, neurociencia, psicología, ciencias políticas, leeremos tal best-seller, veremos tal película, o votaremos a un determinado partido político, si los intoxicadores quieren. No hay nada que escape a su empuje por dirigir a la multitud hacia el objetivo. Sólo una clase de librepensadores, con un carácter a prueba de balas, puede suponer un grupo marginal, nunca una resistencia. No se puede vencer el dominio del virus en la sociedad. Ya que ésta no es un cuerpo humano. Como ya dijimos. Todo cuerpo humano tiene defensas, si no está en condiciones terminales. Pero en la sociedad, las defensas hay que crearlas. Hay que tener presente que la multitud no tiene criterio, induce por contraste, y se embelesa por la novedad. Decidir qué libro leer, qué camiseta quieres vestir, qué quieres estudiar, etc. es un acto de valentía y de voluntad de poder contra todo lo que te somete para que no seas autónomo. El miedo es otro de sus señuelos. Los intoxicadores lo utilizan a menudo en los noticieros. También el recurso expresivo del eufemismo. Atenuar la verdad incómoda y enfatizar la mentira con revestimiento de verdad; ser políticamente correctos y mantener la política del terror. Y es que todos vivimos en una sociedad del espectáculo. Todo es un juego. Un reality-show. Nada ni nadie es lo que parece. Por eso, debemos ser conscientes de esto y asumirlo. Asumir no es entenderlo, sino interiorizarlo trabajando en nosotros, aceptarlo de tal manera que no nos puedan arrollar. La confusión y el miedo dejarán de apoderarse de nosotros. Seremos más firmes y autónomos. Esto se hace desobedeciendo y cultivando nuestro jardín, como decía Thoureau. Para eso, debemos de hacer algo de naturaleza radical, revolucionario. No en la sociedad, a macroescala, como decía Marx y persiguió el Che, sino en nosotros mismos. Debemos ser mejor individualmente para cambiar las cosas porque si no generaremos nuevos enfrentamientos productivamente negativos. Partiremos de la comprensión de la siguiente enseñanza: La vida no merece ser vivida sin autoexamen, como decía Sócrates. Marcar una distancia, apagar el televisor, desobedecer y no alimentarse de lo establecido, no beber del abrevadero que todos beben. El “examen de sí”, como decía Foucault, debe ser un ejercicio constante, y tras un tiempo (Thoureau estuvo en su cabaña sólo dos años) la siembra dará sus frutos. Lee buenos libros, documéntate, revisa tus ideas, tus prejuicios, sírvete de las mentes más brillantes de la humanidad, comunícate con ellas haciendo las valoraciones que surjan a cada momento, detente, haz una pausa, ten presente que el tiempo de Chronos no es el que trae consigo la verdad, deambula, pasea sin rumbo, contempla, olvídate del mundo, vagabundea, sal a la calle sin dinero, siéntate en un banco que nunca te has sentado, escucha el cantar de los pájaros, y escucha el silencio. Pronto, porque nunca es tarde, tras un trabajo arduo en tu persona, comenzará a nacer en ti un aplomo (pequeña transformación en el carácter), un sentido a la hora de hacer las cosas (librepensamiento)… por fin, tendrás un criterio para poder discernir cabalmente, elegir, y ser esa isla entre la multitud enferma del virus.

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David Ortega (Bilbao, España, 1981). Es licenciado en Filosofía con Master en Filosofía teórica y práctica, UNED. Ha escrito un libro de viajes autobiográfico: El último viaje, sobre Alaska (USA); una novela de ficción: El secreto de Nina; y una novela negra que pronto estará disponible: Casi héroes. Sus tres escritos están basados en hechos reales. También ha realizado un ensayo sobre los fundamentos ontológicos de la estética: Diaphainon, que obtuvo la máxima calificación en la carrera. 1



LITERATURA LUSÓFONA

COLUNAS

Rotas da lusofonia

IMAGEM LATENTE por

Magda Fernades1 e José Domingos2

Não, é incomum, ao perguntarmos a diversos fotógrafos o que os fez enveredar pela fotografia, obtermos uma mesma resposta: caíram de amores no momento exato em que, pupilas dilatadas pela escuridão, sob uma luz ténue e vermelha, testemunharam a lenta APARIÇÃO, sobre o branco imaculado de uma folha de papel, de uma fotografia anteriormente tirada. E nós encontramo-nos entre as fileiras destes apaixonados. Só que, apesar de todos sabermos apontar o momento exato em que a paixão nos queimou, por vezes não nos apercebemos que o laço amoroso foi lançado já no momento em que tirámos a fotografia, e que se foi apertando cada vez mais na ESPERA. A REVELAÇÃO da imagem constitui apenas o momento da consumação, de algo cuja génese vem de antes. Aquilo que temos, de uma ponta à outra do processo, que nos prende e escraviza é a imagem LATENTE. Ela existe nos sais de prata pela ação da luz sobre a superfície, mas é invisível, está escondida, é PARADOXAL. Este período de tempo, definido na espera, faz-nos andar no fio da navalha, entre a certeza racional da ciência, da física e da química, e a incerteza da ESPERANÇA. A presença da imagem latente é ainda responsável pela criação de uma MEMÓRIA orgânica, que da EMANAÇÃO do real cristalizada na matéria fotossensível, cria uma série de ficções que são independentes da imagem que poderá, eventualmente, aparecer. Produzimos uma imagem ILUSÓRIA e temporária, que pode ser tão ou mais importante, ou imponente, que a fotografia efetiva. Para nós, esta memória faz tanto parte da nossa obra quanto todas as imagens que não corresponderam à expectativa criada no seu estado de latência. É que o tal momento em que a imagem se materializa, nem sempre corresponde a um final feliz, e muitas (a maior parte) são as imagens que depois de aparecerem, ganham o seu lugar algures no fundo de um arquivo. Mas atenção, este arquivo existe, presente e contínuo desde que começamos a fotografar porque a experiência por que passamos ao criar as imagens nos impede de as deitar fora, como facilmente o faríamos com um simples clique sobre o ícone de um caixote do lixo quando se trata de imagens digitais. É assim que o TEMPO inscreve a sua importância neste processo. A “nãoinstantaneidade” recobre a fotografia analógica de um aspeto orgânico e humano, reforça a ideia da vivência consciente da experiência como fator relevante de criação: à medida que repetimos (revivemos) todo este processo, começamos a apelar à partida ao gozo da espera. Obtemos um prazer na expectativa que supera todas as desilusões. E se isto pode constituir para alguns um vício, para nós é um prazer que gozamos com cada vez mais parcimónia, saboreando cada momento, alargando o processo se possível, até chegar a altura de operarmos a MAGIA de fazer aparecer uma imagem.

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“…a imagem latente constitui para a fotografia a porta para a sua dimensão mágica: trata-se nem mais nem menos do primeiro estágio do contacto físico que a realidade e a sua representação estabelecem.”

1Magda

Fernandes (Porto, Portugal, 1981) e 2 José Domingos (Paris, França, 1974). Colunistas da Philos e fundadores da Imagerie, Casa de Imagens, criada em Lisboa.


LITERATURA BRASILEIRA Rotas da lusofonia

REGRAS DA CASA por

Cinthia Kriemler1

O

maço de cigarros quase vazio. O copo derramado sobre a mesa. A pinga forte

recendendo no quarto sujo, escorrendo até o cabo do 38. Melando tudo. O dedo longo, amarelado pela nicotina, rodando o tambor, roçando o gatilho. E então se desviando para mais um cigarro. A reprodução malfeita de um Van Gogh na parede, imitando uma noite brilhante. Desbotada. Mesmo assim mais brilhante do que o céu que se vê agora pela janela. A pintura conversando com ela. Agonizando beleza em meio às coisas feias. O banheiro rançoso. O barulho do ventilador. A cozinha sem comida. A mesa melada de pinga. O 38 melado de pinga. A vida melada de merda. O deboche do macho que foi embora na véspera. Gritando que ela não tem coragem. Que ela é um blefe. Mulher ameaça se matar para o homem ter pena e ficar com ela. Mulher nem sabe se matar direito. Toma comprimido que é para dar tempo de alguém encontrar, ter pena, levar para o hospital, fazer lavagem, salvar. Foi o que ele disse. Só se esqueceu de falar da terapia. Para encarar com os mesmos olhos os mesmos abismos, e repetir com a mesma pressa os mesmos erros. Um se curar para se ferir de novo. Sobrevida em ciclos. É para o que servem as terapias. Engodo. Não tem sobrevida no abandono. Ela quis conversar sobre essas coisas. Não deu. Ele saiu sem saber que ela não vai precisar de hospital, lavagem, terapia. Ela comprou uma arma. Que já matou antes. Alguém. Alguns. Uma arma safada, ungida de sangue. Velha e usada. Calejada como ela. Marcada por histórias recorrentes, por dores recorrentes. Recorrente foi um requisito que ela exigiu na hora de escolher a arma. Pessoas e coisas precisam se assemelhar para se unir. O estômago se agita em náuseas que não têm a decência de virar vômito. A tontura não dá trégua. O corpo dói. O corpo se revolta. O corpo luta. Desperdício. Tudo inútil. A alma não luta faz tempo. Cansada, cansada, cansada. De um cansaço que cresceu desde que ela cismou de amar. Não deveria. Nem ter cismado nem ter amado. Como se isso fosse possível. Besteira. Ninguém cisma ou ama com a razão. Balanço. Quantos homens estiveram dentro dela? Do corpo. Da cabeça. Cada um arrancando um pedaço do quebra-cabeças que ela montou de si mesma. Nenhum deles foi bom. Nenhum. Ela é ciclos repetidos de escolhas erradas. Fruta de tabuleiro que todo o mundo apalpa e deforma. Mas não leva. Apodrecendo sem viço, amassada e malcheirosa. Pazes feitas com a inveja de nunca ter sido um retrato roubado. Desses com risos e paisagens e tardes de sol e abraços de amor e outras mentiras. Ela não cabe em cenários felizes. Não combina com conselhos, rezas, doutrinas, fórmulas. Desfez-se de tudo isso.

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CONTOS


Mantras sem serventia. Ensinados por gente que não erra. Ou diz que não. Gente que não conhece a desistência. Que nunca partilhou de um desmonte. Desfez-se deles, também. Restam apenas ela e os demônios. Mas eles podem ficar. São hóspedes antigos. Conhecem as regras da casa. Sem hospital, sem salvação, sem terapia.

Cinthia Kriemler (Rio de Janeiro, 1957). Contista. Semifinalista do Prêmio Oceanos 2016 com o livro Na escuridão não existe corde-rosa. Publica pela Editora Patuá. Graduada e pós-graduada em Comunicação Social pela Universidade de Brasília (UnB). 1

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LITERATURA BRASILEIRA Rotas da lusofonia

CRONOS ALUCINADO por

Caio Lobo1

Desaprendi a vida. Mas a teria apre(e)ndido um dia? Talvez naquele estado iluminado de criança, em que a sensação do presente é bruta e inevitável. Quando não existe mente, mas só presença. O presente repetido todos os dias, sem virar futuro ou passado, sem acumular memórias ou esperar vitórias. Um mundo sem futuro porque sem cérebro. Um universo sem resquícios ou sonhos – o próprio sonho vivido, sem a necessidade de sua cópia paralela, que a mente vai criando à medida que se desenvolve. Quanto tempo durou esse idílio? Não sei. Mas foi rápido. Hoje o mundo exige que o consumamos, consumindo-nos a nós mesmos. Todo ele é apelo ao desgaste e ao acúmulo de estímulos. O mundo alardeia a falsa necessidade de uma ação voltada para sua absorção. Isso em todos os terrenos. Hoje é difícil escrever um texto curto como esse se eu não puser o celular no modo silencioso, porque a todo instante alguém se manifesta no WhatsApp, a todo momento alguém precisa de sua atenção, anseia por ela, por uma resposta, uma “curtida” no Facebook, uma aprovação implícita de suas postagens, como se o gesto representasse o reconhecimento numa realidade onde todos se encontram isolados, invisíveis. Agora não basta seus pensamentos a incomodar a vivência real: o pensamento dos outros atravessam o ar e te bombardeiam sem cessa. Se você gosta de dramas televisivos, te oferecem de tudo: canais a cabo, Now, Netflix e sabe-se lá mais o quê! Um vacilo e não se vive mais, a não ser grudado à TV como um zumbi, consumindo seriado após seriado, terminando um episódio de House of Cards – ou de Breaking Bad – e começando outro, perdendo aquela velha e boa sensação de esperar outra semana para saber o que vai acontecer na trama. A noção de tempo se perde: nós consumimos o tempo na velocidade dos tempos porque, afinal, ainda há aquela série tão comentada, ganhadora de Emmys, e também a volta do cambaleante Game of Thrones, sem contar, é claro, que em fevereiro volta The Walking Dead. O mundo anda muito (mais muiiiito!) mais rápido do que você, e ainda assim tentamos acompanhar seu ritmo alucinante. Se te dizem que é preciso praticar esportes, vá tentar escolher um! Só na sua academia, o leque é de perturbar a cabeça. E há tantas possibilidades do que você poderia ser, e tamanha é a inconstância da mente, que você termina se transformando num pseudomarombeiro-boxeador-lutador-de-jiu-jitsu-corredor-praticante-de-yoga-peladeiro-etc-e-tal cuja eficiência em alguma dessas modalidades é altamente suspeita. Esquece-se do ditado segundo o qual não é possível se servir a dois reis. E se você acha que esse pseudomarombeiro-boxeador-lutador-de-jiu-jitsu-corredor-praticante-de-yoga-peladeiro-etc-e-tal está satisfeito em ser um mero pseudo-marombeiro-boxeador-lutador-de-jiu-jitsucorredor-praticante-de-yoga-peladeiro-etc-e-tal, aí é que você se engana, porque o mundo tem sempre coisas novas a oferecer, e um pós-moderno não admite lealdade a quaisquer

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COLUNAS


delas. Há aplicativos de música que parecem um oásis para os amantes da arte (penso especificamente no Spotify), mas que se tornam, pela abrangência do seu conteúdo, motivo de angústia. Não se consegue, ao mesmo tempo, baixar todas as músicas, bandas, gêneros que você aprecia e ainda sentir o prazer tão simples de ouvir uma canção. Você já baixa um álbum pensando na playlist que pode fazer de um outro artista querido. Tempo para escutar as músicas, pra quê? O importante não é possuí-las? A mesma lógica se aplica aos livros, para os que amam Literatura: compra-se mais rápido do que se lê. Às vezes nem se lê e já se compra, como o que parece ser verdadeiro o dito de que o prazer não está na posse, mas na aquisição. A diversidade de tudo e a sensação de possibilidades infinitas tornam a escolha quase impossível, como diria Schwartz no seu Paradoxo da Escolha. Cada escolha tem seu custo de oportunidade, o que significa dizer que ao optar, também se “desopta”. Escolher A é não escolher B. Nem C, D, Etc. Então o reverso da moeda da escolha é a angústia de não ter vivido uma outra possibilidade que, nos momentos de baixa potência, claro, te aparece como sendo aquela que deveria ter sido escolhida. Não faz sentido? Se você sofre, é porque escolheu errado. Um universo tão variado só pode nos levar à exaustão ou à angústia. Você quase deseja renunciar à escolha para simplificar a vida. Nem amar é (mais) fácil. Porque amar significa renunciar às pseudo-opções que se apresentam em cada esquina, em cada sorriso, em cada curva feminina. Deixar-se sentir amor é se desconectar do ritmo da modernidade, que te incita a nada segurar, a nada se apegar, a trocar e trocar; que te impele à mudança constante, ao caminhar para frente. Mude tudo como se muda de camisa: mude de amantes, mude de canal, mude de ideias, mude de atividades. É a lógica da propaganda aplicada nos campos mais esdrúxulos da existência. Qualquer coisa hoje é, um segundo depois, obsoleta, como na série interminável de Iphones que se sucedem na velocidade da luz sem que você entenda a razão que motiva o lançamento do próximo. Mas não importa: o ritmo ditado há de ser obedecido e as filas nas lojas da Apple dão a volta no quarteirão nos dia de lançamento. E claro, a reflexão atenta não se faz presente; ela é contrária à vibe irrefletida que te impulsiona a simplesmente agir na direção e na velocidade da correnteza. Só a doença do corpo te alerta para a incoerência de se correr desse modo desenfreado. O corpo, que tem seus limites, começa a sussurrar aos ouvidos: “você vai pifar”. Já nem se respira direito, a incompreensão do mundo vira dor física, você come demais, você bebe demais. Decidido a ser mais um autômato do rebanho, você corre como se desejasse o precipício, a velha pulsão freudiana de destruição que subjaz aos comportamentos “normais” de nossa época. Desaprendi. As coisas não eram assim. Eu não precisava aceitar a todo instante os estímulos do mundo. Cada gesto peculiar demandava uma atenção que eu concedia a ele, com todo o sentido que havia em executá-lo. Comer era comer. Comer não era comer vendo filmes ou pensando no que tenho que fazer daqui a pouco. Ler um livro não era ler pensando no livro que ainda não terminei ou ler parando vez ou outra para responder às demandas do WhatsApp. A mente não se imiscuía na percepção da criança porque na criança mente não havia. Ainda. E se você perguntar ao outro por que a pressa, ele não saberá responder. Está pressuposto que a velocidade é predeterminada. Adote-a ou… ou… não se sabe. Dirão que não a adotar é ser um sujeito alheio a seu tempo, um “desconectado”… Nossa, onde é que eu puxo para “desplugar” esse fio?

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Caio Lobo (Recife, 1979). Colunista da Philos, é formado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. Leitor compulsivo e romancista. Lançou recentemente o seu livro Trôpegos Visionários pela editora Kazuá. 1


LITERATURA BRASILEIRA Rotas da lusofonia

SEGREDOS DA VIDA A CADA 5 MINUTOS por

Leandro Jardim1

Outro dia eu estava caminhando por Copacabana quando percebi uma movimentação curiosa na praça Serzedelo Correia. Algumas pessoas se aglomeravam ao redor de um homem incomum. De pé sobre o banco, muito magro, estava vestido como um personagem indiano de novela. Barba longa e grisalha, pele morena, turbante na cabeça. Segurava uma placa nas mãos. “Segredos da vida a cada 5 minutos”. Aos pés, tinha uma cestinha para doações. Algumas pessoas paravam para olhar, outras desistiam e seguiam seus rumos. O indiano continuava mudo, olhar sutilmente alegre. Se eu fosse um pouco mais cínico, talvez dissesse que seu ar era jocoso. De repente, ouço um grito. “Você aqui de novo? Essa não!”. Era um homem de terno preto, carregava uma maleta fina de couro. Aparentemente enfurecido, cruzou o pequeno aglomerado sem a menor delicadeza com a plateia, subiu no banco e se postou ali, de pé, na outra extremidade, igualmente em silêncio. Suas duas mãos seguravam a alça da maleta. Indiano e executivo se entreolharam por alguns segundos. Foi tudo tão sincronizado que suspeitei haver uma encenação ali. Repito as falas de memória, mas o que disseram foi mais ou menos o que segue. O indiano se voltou para a plateia e falou pausadamente: — O segredo da felicidade são os relacionamentos — e voltou a ficar em silêncio. Foi a deixa para o executivo iniciar uma curiosa bravata. — Ele diz isso, mas tomem cuidado. Eu acreditei e me dei mal. Relacionamento é sempre com o outro e o outro o não tá nem aí pra você. — O executivo parecia comovido. — Quer ver? Por que o outro não fez do jeito certo, então? Por que não considerou a minha situação? Afinal, não era uma situação qualquer, era eu, eu de tanto sofrimento, eu das sabidas dificuldades, eu justamente naquele dia. Se fosse em qualquer outro dia não tinha problema, eu nem ligava. Mas justamente naquele dia aquela pessoa escolheu aquela atitude que me obrigou a reagir daquela maneira. Não tive escolha. O que é que eu posso fazer? Pensar em si, ah, isso todo mundo pensa. Talvez só pensem nisso. Mas nos outros, ah não, nos outros ninguém pensa. Se o segredo da felicidade está nos relacionamentos, ah então só se vai colher tristeza por aí. — Havia uma intenção meio desesperada no tom de fala do executivo, a voz tremia um pouco, ele insistiu — E não venha alegar que não sabia, não tinha como saber, que eu não avisei, que tinha lá os seus motivos. Que motivos? Tinha como saber, sim. É óbvio o que os outros esperam de você. Não ouviram essa sobre o segredo da felicidade? Relacionamentos. O que me inclui, sabia? No que é que o outro estava pensando que não pensou na frustração que sua escolha geraria para mim? Estava pensando em si, o que é imperdoável. Não tem desculpa. O segredo da felicidade, diz esse bobão aqui, são os relacionamentos. Ah mas o meu relacionamento não, não o meu! — 34

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CONTOS


Finalmente ele parou. Tinha gesticulado muito. Olhei para o relógio, cerca de quatro minutos se passaram. Ao longo do discurso, o indiano não se abalou, seu sorriso permaneceu intacto. Então, após um pequeno hiato de silêncio, foi a vez do indiano, novamente. — O segredo dos relacionamentos é a humildade — e se calou, sereno, era como se estivesse sozinho. O alto do banco de concreto era o seu altar. Mas a realidade é que aquilo era apenas um banco público, tinha outro homem de pé ali ao lado dele, e disposto a contradizê-lo. O executivo voltou à carga. — Ah, ele veio me contar esse outro segredo também, ignorei. Que arrogância são essas fórmulas prontas. Meu querido, cadê a humildade dessa frase, então? E as particularidades de cada um? Não sejamos estúpidos. Não vê que essas generalizações são burras. O ser humano não é todo homogêneo, não. Não é massa de manobra desse seu raciocínio simplista e generalista, não. — Mesmo as palavras mais agressivas soavam com um tom aconselhador, o executivo agora palestrava, já era menos emotivo — Pensando bem, quer saber?, humildade pra mim é respeitar a particularidade alheia, só isso. Cada um faça o que quiser, eu não tenho nada a ver com isso. Ah, mas se vier me perguntar, aí eu digo, é bobagem, isso aí que você acredita não merece a menor consideração, não tem lógica. Mas eu é que não vou cair na burrice de querer mudar as pessoas que não pediram pra ser mudadas. Então, se o segredo dos relacionamentos é a humildade, talvez isso seja, sei lá, não tentar mudar aquela pessoa que está no erro. — A plateia se entreolhava o tempo todo, o clima geral era de constrangimento e curiosidade. O executivo prosseguia — Então, humildemente eu me permito refletir um pouco, me dou o benefício da dúvida. Isso sim é ser inteligentemente humilde. Devemos ter a humildade de deixar os outros se consumirem na própria ignorância egoísta. O que o bom velhinho aqui deve estar querendo dizer é, aposto, que a gente tem que reconhecer que nunca sabe de tudo. Eu sou assim. Tipo um Sócrates. Essa humildade é que me levou a saber tudo o que sei. Isso quer dizer que eu sei tudo? Claro que não. Ainda falta muito. Mas dá pra saber algumas coisas. Ouçam o que vou dizer. — Nesse momento ele apontou para a plateia, balançava o dedo indicador em riste. — Dá pra saber que tem muita coisa imatura, pessoas simplórias, muita gente que não estudou, muito maluco. — Não contive uma gargalhada quando disse isso, acho que ele percebeu, mas continuou. — Tem muito desavisado refastelando-se na ignorância. E ainda acham graça! Não dá pra entender isso. Coitados. Mas eu não tenho pena, não. Por que tem cada um, tem cada atitude, cada comportamento, que, ora, isso eu aprendi, eu posso até fingir, mas tolerar não dá. Não me venha pedir pra aceitar humildemente, não. Com gente irracional eu não consigo conviver! — E se calou, ofegante. Pensei ter visto uma lágrima, mas era suor. O sol rachava, a sombra das árvores não dava conta. O indiano ameaçou voltar a falar, mas soluçou uma gargalhada incontida. Pressenti algum segredo em seu olhar. Fingiu tossir. Olhou rapidamente para o executivo, que o encarava também, e retomou o olhar para a plateia. O clima agora era de expectativa. — O segredo da humildade é a autoconfiança — Dessa vez o indiano se dirigiu ao executivo assim que terminou. Queria ouvir a resposta. E ela veio. — Basta com esses segredos! Quem aguenta? Ser autoconfiante e humilde ao mesmo tempo?! Conta outra. Pois bem, senhor autoconfiança, se o senhor é tão autoconfiante assim, convenhamos, então o senhor também não é lá essa humildade toda, não. Não é mesmo?! E o pior, eu me pergunto, confia é? Se confia, confia no quê? Tá por cima da carne seca? Olha, tá bem vazia a sua cestinha de doações. Pô, vamos colaborar, gente. — Agora era puro sarcasmo o executivo — Tá achando, já sei, que não vai errar, que não po35

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de falhar, que já sabe das coisas. Quanta capacidade, quanta inteligência! Sinto lhe informar, o ministério da sanidade informa, não há garantias. Repita comigo, nada garante nada. Pode ser um novo mantra, olha aí! E não adianta dizer que confia no outro porque isso não tem nada a ver com autoconfiança. Autoconfiança é acreditar em si, na sua capacidade, na sua potencialidade apesar do destino. E apesar dos fracassos. Aí é que está o furo, se é pra confiar, confie nisso, os fracassos virão. Então autoconfiança é uma mentira, um desejo infantil de heroísmo! Então não me venha mais com essa felicidade vulgar de almanaque. E pare de enganar os outros! — o executivo se calou. Pegou a cestinha do indiano e mostrou para a plateia o conteúdo quase vazio. Como se quisessem contrariar o executivo, algumas pessoas aproveitaram esse momento para fazer suas doações ao indiano. O executivo botou a cesta de volta no lugar e aguardou a sua vez. O indiano tomou fôlego longamente antes de falar. — O segredo da autoconfiança é… Olhei o relógio e levei um susto, eu já estava bastante atrasado. E aquilo podia durar o dia todo. Saí apressado, mas me sentia bem. Copacabana nunca me decepcionava. Pelo menos isso.

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Leandro Jardim (Inglaterra, 1979). Formado em comunicação e pós-graduado em engenharia de produção. Professor na área de gestão, atualmente é mestrando em administração pela PUC-Rio. Publicou os livros ‘A angústia da relevância’ (Romance, 2016), ‘Peomas’ (poesia, 2014) e ‘Rubores’ (contos, 2012) pela Editora Oito e Meio; além de outros dois de poesia: ‘Os poemas que não gostamos de nossos poetas preferidos’ (Orpheu, 2010) e ‘Todas as vozes cantam’(7Letras, 2008). 1



LITERATURA ESPAÑOLA

COLUMNA

Rutas Literarias de Iberoamerica

A MI PROFESORA DE LITERATURA DEL COLEGIO Oriette D’Angelo por

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Estudié toda mi vida en el colegio Nuestra Señora de La Consolación, tanto en la sede que está en Caracas como en la sede de Barcelona, en Anzoátegui. A pesar de tener diferencias con algunas de las cosas que me enseñaban, siempre me asombró la capacidad que tuvo mi colegio de respetar a mi grupo de amigas rebeldes y a mí. Estudié en un colegio religioso, pero nunca sentí que no pertenecía a ese lugar. Puedo decir que fui afortunada, puedo decir que conté con una grandiosa educación, y entre esa grandiosa educación está mi profesora de literatura. En 4to año de bachillerato se enseña literatura universal, así que desde 3er año corrían los rumores de los monstruosos exámenes a los que nos iba a someter «esa» profesora que algunos odiaban y otros amaban. Oceanía, su nombre. Yo pensaba en lo curioso del asunto, en lo cerca que estábamos del mar, en lo bello de llamarse así. La veía de lejos y desde mi camisa azul sabía que «esa» era la materia en la que yo quería brillar. Tenía, en ese entonces, 16 años. Mi camisa beige venía entonces con el impulso de estar cerca del final, sí, pero también venía con la posibilidad de estudiar literatura de manera sistemática, de leer con orden. Así llegó el primer día, y lo primero que leeríamos sería a Homero. Parte de su primera clase fue explicarnos cómo no se sabía a ciencia cierta que el autor de los dos grandes libros que leeríamos era Homero, así como decirnos, fascinada, que se creía que el autor había sido ciego. “¡Ciego!”, decía. Ciego. Es un logro para la belleza lo que imaginan aquellos que no pueden ver. Luego reímos y lloramos con Don Quijote, inventamos odas para celebrar —o detestar— a Pablo Neruda, estudiamos la poética de Rubén Darío y cantamos con Mago de Oz para entender mejor la guerra de Troya —esto ya por culpa mía, la rockera del salón—. Detesté Las penas del joven Werther de Goethe con todas mis fuerzas, y se lo hice saber. “Profesora, es que Werther no puede ser tan estúpido. Si alguien no te quiere, no lo escribes ni lloras por ello, y mucho menos escribes un libro para contárselo a los demás”. Años más tarde la releí, y aunque sigo detestándola, entendí su belleza. Pensé que no, que no toda certeza a los 16 años es verdadera certeza. No toda certeza es completamente certeza. Oceanía amaba los libros, vivió sola en Caracas para poder estudiar en el Instituto Pedagógico y nunca se había casado a pesar de la insistencia familiar. Sola, siempre ella, con sus perros, sus alumnos y sus libros. Contaba, orgullosa, que no, que en realidad nunca había dormido sola, que del otro lado de la cama estaban Sor Juana Inés de la Cruz, Rubén Darío, Pablo Neruda. Sus tres pilares. En nuestro programa no estaba previsto leer a Sor Juana, pero ella se encargó de contarnos quién era y por qué la admiraba tanto. Se sabía sus poemas, los recitaba en clases, conectaba sus versos con otros. Conectaba su vida com la 28

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A Oceanía Reyes, mi profesora, a Paola Soto, mi cómplice


poesía. Ella soñaba y en sus sueños nos enseñó a sentir. Nunca nos dijo que teníamos que amar la literatura, nunca nos presionó ni nos dijo por qué lo que estábamos haciendo nos iba a servir para algo. Nos enseñó a sentir en el momento algo que se ha quedado conmigo durante años. Nos enseñó a fascinarnos, a cautivarnos por lo que leíamos, por el mundo. Un día nos habló del Decamerón de Boccaccio en secreto. “Ese es un libro que no podremos leer. Aquí no podríamos, en el colegio”. Yo, ante el secreto y la complicidad, conseguí un ejemplar en una venta de garaje. Apelando a la casualidad, opté por llevarlo el día siguiente al colegio. Mis amigas y yo nos reunimos en el baño y sentadas en el piso empezamos a leer en voz alta todas estas historias que en algún momento habían sido prohibidas. Era nuestro secreto. Ella lograba eso, ella nos hacía sentir curiosidad por el mundo que ella amaba. En 5to año volví a estudiar con ella. Ahora leeríamos a Arturo Uslar Pietri, nos fascinaríamos con los ensayos de Mariano Picón Salas y se quedaría en nuestro pecho por siempre la belleza de Cien años de soledad. Haríamos árboles genealógicos con colores, escribiríamos trabajos, nos fascinaríamos con Amaranta y las cartas que le llevó a los muertos. Siempre supe que quería escribir, pero leyendo lo supe aún más. Ella lo sabía y esa era nuestra conexión. Oceanía nunca me dijo que siguiera mis sueños, nunca me dijo que iba a lograr todo lo que me iba a proponer, que si quería ser escritora sería escritora sin que nada importara. Nunca me lo dijo, pero ella sabía que ese sería mi camino. Me enseñó que el esfuerzo sería la única forma de cumplir mis metas y por eso sigo aquí. No había vuelta atrás, y gran parte de lo que hago y siento por la literatura es gracias a ella. Un día, a meses de terminar mi 5to año de bachillerato, estaba con mi abuela visitando a un familiar en el Cementerio del Este. Mi abuela colocaba flores en la tumba de mi bisabuela, y mientras tanto yo paseabaentre muertos desconocidos. Veía nombres, fechas. Veía padres e hijos enterrados juntos. Decidí sentarme en la grama y tomar aire mientras mi abuela terminaba su visita. Estuve allí un largo rato, hasta que decidí mirar hacia abajo. A mi lado, la tumba de Arturo Uslar Pietri enterrado junto a su esposa. Llevaba una cámara conmigo, así que tomé una foto. Ahí estaba el hombre que «más amó y dio a su país el siglo pasado». Ahí estaba un hombre que también había leído en clases con Oceanía. La foto la imprimí y se la regalé. Le conté la casualidad, hablamos de su epitafio, hablamos del poder de las palabras. Siempre lo he sabido, pero tuve suerte. Tuve suerte de haber conocido a Oceanía, pero también tuve suerte de haber recibido las clases de literatura que recibí. Quisiera decirle que sigo amando todo lo que me enseñó, que sigo deslumbrándome cada vez que releo a Gabriel García Márquez, que ahora vivo para esto y que no puedo pensar en otra cosa que entregarle mi vida a la literatura en todas sus formas, en su escritura, en su producción, que quiero marcar la vida de otros de la misma forma que ella marcó la mía, que el mundo necesita más mujeres llamadas Oceanía, más mujeres que amen y enseñen como ella. Así que para ella esto, a ella lo que soy.

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Oriette D’Angelo (Caracas, Venezuela, 1990). Estudió Derecho en la Universidad Católica Andrés Bello (UCAB) y Maestría en Comunicaciones Digitales en DePaul University (Chicago). Autora del poemario Cardiopatías (Monte Ávila Editores, 2016; Premio para Obras de Autores Inéditos, 2014). Seleccionó y prologó la antología de poesía venezolana Amanecimos sobre la palabra (Team Poetero Ediciones, 2017). En 2015 obtuvo el segundo lugar en el I Concurso de Crónicas de la Fundación Seguros Caracas y en 2016 el tercer lugar en el Concurso Iberoamericano de Poesía “Letras de Libertad” de Un Mundo Sin Mordaza. 1



LITERATURA ESPAÑOLA Rutas Literarias de Iberoamerica

GIOVANNA “NO SEAMOS CÓMPLICES” por

Diana Moncada1

El mar está sucio y las flores claras enturbian la liviandad de tus ojos. Si de memoria se trata no seamos cómplices, Giovanna. Admite que los brazos se te entumecieron meciendo un adiós aletargado. Admite que el sofá quedo vacío, que las huellas se desintegraron ante el descuido, que somos escarcha arrinconada entre viejos trastos y que la memoria se esconde de nosotras para confundirnos. Tu cuerpo, apenas perforado por una mañana hambrienta y sin temor a besar los gusanos de la noche, aun no madura. Lo miro disuelto entre disparos azules, luminoso, a punto de saltar hacia los témpanos antiguos. Leo tu sexo como la cáscara suave de los temblores. Reprimes el grito, danzas atravesando la niebla andina, cantas un viejo blues para evadir los barcos que llegan incendiados a la orilla de tu desamparo, pero ambas sabemos que cierta forma de morir más ruda nos espera. Tu silencio se abre impúdico, estás como muerta en una cama ajena imaginando la guerra. Lavo tu boca con estupor, intento nombrar la ternura de tu desnudez mientras te ríes como loca burlando a los espejos. A ti pertenecen los aullidos vagabundos, los esputos de los viejos, el desorden de las resacas y una lengua extraña. No sabes a dónde ir Giovanna, los caminos son de agua y de agua los tormentos del futuro. Tu furia se hinchará obscena por toda la casa y lanzarás maldiciones hacia la inmundicia del cielo. Nadie podrá detener tu cabeza estallando contra todas las paredes. La cicatriz latirá fuerte contra la tierra, contra los hombres solos y temerosos que huyen de ti. Sé de tu abandono, sé que hundes tus entrañas en una habitación remota para ocultarlas de ti misma. Repites la trampa conmigo y me confundes, busco las migajas de tus palabras en las servilletas arrugadas pero tu mutismo ha erigido una catedral sin fondo. Creíamos que la costumbre de recordarlo todo / era razón suficiente / para lo indispensable. Agujas extranjeras empujan tus recuerdos hacia el sur. Tus manos, aun serenas, traman las historias de tus antepasados, arrastran suavemente la nostalgia blanca de los espectros y atraviesan los reflejos obstinados. Tus frutos aún no maduran Giovanna, estás tan lejos, tan sola. Tu sensualidad es un santuario mínimo, como la fruta que juega a caerse durante las mañanas de octubre. Frente a tu ventana las olas se baten cansadas, miras el horizonte y piensas en las cuatro estaciones del pasado abandonadas en una huída interminable. ¿Qué es lo que esperas Giovanna? ¿Qué venganza estúpida planeas en las faldas de una montaña innominada? Aquí no hay dioses, ni templos, ni pequeños ángeles revoloteando en la aurora. Aquí la calle es una sola, larga y marchita, llena de ojos y lenguas atroces. Tú 41

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COLUMNA


brillas indómita sin entender nada, vaciándote, vaciándome, vaciando este lugar enmohecido de secretos. Giovanna, tarde o temprano tus personajes aniquilarán tu imaginación y yo me extinguiré con ellos. Las ramas desnudas del norte te lanzarán mensajes de desamor. Todos dormiremos mientras persigues el ala carcomida de la belleza. Volveré a la fosa mientras descubres tu vulva rosada latiendo en una caja de regalo. Viajarás sin mí, sin nosotros, a través de un pasillo de claras protuberancias. Giovanna, desenvaina tu espada, el simulacro apenas levanta su telón.

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Diana Moncada (Caracas, Venezuela, 1989). Poeta y periodista cultural. Autora del poemario Cuerpo crepuscular, ganador em el Concurso de Autores Inéditos de Monte Ávila en el 2013. Prologuista del libro Al filo de Miyó Vestrini, Letra Muerta. Colaborada de la Revista Poesía de la Universidad de Carabobo. Investigadora en el proyecto Muestra de Valoración del Patrimonio Teatral Venezolano. Ganó mención publicación en el I Concurso Nacional Rafael Cadenas de poesía Joven. Ha ejercido el periodismo cultural en diversas publicaciones venezolanas como El Universal, Contrapunto y Correo del Orinoco, en las fuentes de literatura, artes visuales y artes escénicas. 1



LITERATURA BRASILEIRA

COLUNAS

Rotas da lusofonia

CHURROS DE SATURNO Kátia Gerlach por

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As minúsculas manchas metálicas na íris dos olhos cor de ocre de Apolônio irradiavam fios. Uma teia de aranha se formava sobre a Plaza Alfredo Jarry, uma lona de circo esburacada a cobrir o corpo moribundo recém explodido. Um policial chutou o morto três vezes para certificar-se de que estava abaixo do horizonte. Zumbido da sirena. Ronco de motores. Apolônio observava a barafunda, sentado em um banco, cara a cara com a carraspana que o espreitava do céu. Chegara ao povoado depois de percorrer a superfície inesgotável do caminho, a pele inteira do mundo, e, enquanto desfrutava de um churro recheado de doce de leite, ouvira o berro de “Allah uh akhbar”. Um disparo de bomba seguira. Apolônio era um homem caolho, extremamente comprido e ossudo e que tinha, à altura das espáduas, uma corcova, proteção adicional ao coração, nem à direita, nem à esquerda, que soprava para as costas, inflando-as. A dois passos de distância dele, naquele momento, uma anciã se curvara para resgatar a bengala tombada com o susto. Do rosto dela projetavam-se olhos inchados e remelosos, de cílios imensos, nariz bicudo e lábios descarnados. Uma velha guardiã de gatos e aves falastronas. Assumindo vida, a senhora Laurita soltou que “em Jalisco, estamos cansados das pregações dos lunáticos!”. Fez com os braços para pegar os quatro cantos da praça e dobrar como uma colcha para si. Apolônio mastigava o churro morosamente e conteve-se para não falar de boca cheia. O doce de leite derretido sobre a língua desfazia-se como sal na água. “Menos um para entregar cartas e pacotes”, queixou-se a senhora Laurita. “Você não imagina a dificuldade para encontrar-se sinaleiros, assistentes e mensageiros neste povoado. Uns morrem, outros matam-se, por fanatismo.” Laurita embrulhou a colcha e colocou-a dentro da bolsa. Vestia um xale de rendas brancas sobre o manto espanhol e ficava de pé com dificuldade apesar de confiar na bengala. Temeroso pelo doce que se fundia, Apolônio deu a última mordida no churro. O indiano, tão celebrado por Teofrasto, de turbante preso por uma pedra de rubi colada sobre o desenho da antiga suástica advertira-o sobre os perigos que o acometiam. Por dez pesos, o guru lera a fortuna indicada pelas bicadas de um periquito de penas verdes e cabeça e bico de amarelo solar. A tira de papel fisgada pela ave, replicava a mensagem de um biscoito da sorte chinês aberto no galpão da rodoviária quinze anos antes daquela viagem. Ambos os mistérios asiáticos vaticinavam: “Cuidado”. Na boca de Apolônio, a saliva perdia o doce. Apolônio acompanhou a velhota em lentidão reumática descer a rua estreita de pedestres até que a viu entrar numa casa em restauração, com um sinaleiro que segurava um anúncio em neon: Morales y Morales, investigadores. Voltando os olhos para a Plaza, Apolônio notou que os policiais e uma ambulância estacionavam os veículos próximos ao cadáver e recolheram-no. A euforia ficou suspensa até os lixeiros coletarem os destroços e os músi-

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Não posso evitar de dizer a todos que devemos nos acautelar de frequentar os mutilados ou com imperfeição em algum membro (…). Exemplo do que digo: aqueles que tem os olhos mutilados ou imperfeitos, o nariz, a boca, os pés, as mãos, com máformação ou que mancam de um dos pés, ou que sabemos serem saturninos.


cos dançantes subirem ao coreto. Cinco homens tocavam o “Tango 31” em acordeão e violinos. Uma “quinceañera” posava para fotos, com um buquê de rosas vermelhas para tapar o rosto maquiado. Uma hemorragia tingia as nuvens singradas no vácuo entre o povoado e um universo negro estelar arrancado de fábulas noturnas. Ainda era dia. Havia luz. Apolônio recordava as cores e fisionomias infernais dos painéis de Orosco, que vira em visita a casa de Las Cabañas; não teria estado o rosto da senhora Laurita naquelas estampas? Não seria de lá que ele a reconhecera? Uma grande romaria se organizava ao redor. Os camarotes dos engraxates permaneciam fixos em seus lugares, alguns fechados, outros a funcionar. Fora das igrejas, os ceguinhos ordenavam as coletas de dinheiro e o negócio das velas. Apolônio levantou-se do banco para sacudir os cristais de açúcar do churro e limpar a roupa. Após a publicação de seu último livro, ele tivera que fazer as malas e registrar-se num congresso de astronomia para iniciantes. Críticos e acadêmicos haviam massacrado a edição de “O Supermacho II, continuação patafísica” em que Apolônio trazia André Marcueil de volta. O personagem retorcido entre ferragens se entregava ao amor, do qual teria sido incapaz até julgar a amante morta. André casava-se afinal com a personagem Ellen. Um joalheiro criara pérolas a partir das lágrimas sólidas do Supermacho para adornar o pescoço da noiva. O coração rígido do protagonista fraquejara numa reviravolta absoluta e quebrara o ciclo de voltas sobre si mesmo, numa sacada considerada surpreendente por Apolônio. Durante a escrita do “Supermacho II”, Apolônio andou como se estivesse doente, quase não se alimentara, o corpo se resumindo em pele e osso apenas, e para que? Ao galgar os degraus que davam para o portão de entrada da casa azul, Apolônio sentiu uma leve tontura. Com a respiração ofegante à guisa de quem troca de órbita, encontrou uma mulher quase anã, atrás de um balcão de madeira tão alto que a fazia desaparecer. “O senhor tem hora marcada? A minha agenda está vazia para hoje”, irrompeu a voz escondida para rachar o silêncio ao meio. “Não, minha senhora, não tenho hora marcada mas se me fizesse a gentileza… “, retrucou Apolônio. A assistente explicou: “Vou ver se a Grande Investigadora, a senhora Laurita, pode atendê-lo.” Apolônio assentiu. Da rua, ouvia os autofalantes a replicarem sermões, santos e anjos conclamados por padres que empurravam os fiéis pelas testas e exorcizavam os maus pensamentos da soberba, da inveja e da fornicação. O churro o alimentara porém uma sensação de incompletude despontava nas vísceras, um desejo corporal, uma vontade de consumir o Demiurgo pela boca, morder a panturrilha de Jesus ou a orelha do Espírito Santo. Experimentava a conhecida fome da fé. O rosto feminino e envelhecido da senhora Laurita não desgrudava da memória de Apolônio. Viera até a casa azul trazido por uma curiosidade inusitada. É bem verdade que desde sempre admirara investigadores particulares, sendo aquela ocupação superior a de um escriba. Entretanto, não teria sido do seu conhecimento que a senhora Laurita era uma investigadora. Tinha a fisionomia de uma herbolária. Sem que se desse conta, Apolônio abriu o coração para a Grande Investigadora tão logo ela o recebeu na antessala. “Senhora Laurita, gostaria de lhe confidenciar sobre o meu sonho de tornar-me um detetive selvagem, destes que só a América Latina produz, um homem com poderes especiais, alguém que se esconde na Amazônia para descobrir coisas.” Laurita reagiu com uma gargalhada jovial. “Sou velha o suficiente para farejar disparates! Vamos direto ao ponto, Apolônio! Sei que aprecia churros de doce de leite e usa calças listradas por falta de opção. Preciso de um novo assistente, não me importo com o que ve-

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ste ou como se alimenta. O último não durou nem um mês na agência. Está no hospital, ligado aos tubos. Os médicos dizem que foi envenenado e perdeu o funcionamento dos órgãos vitais.” Ao terminar a frase, Laurita dissimulava a alma ou alguma outra coisa interior, ou inferior. Apolônio quis explicar-se, argumentar que um detetive latino-americano e selvagem aventura-se ao invés de esconder-se sob uma cortina de laudas e deixar-se imprimir a qualquer preço. A quantas não andava a sua coleção de atos de covardia? Relegara Lídia ao irmão mais velho e, em sua solidão miserável, obedecia a Silfo pela mão solitária. Detetives, por outro lado, usavam disfarces para uma finalidade racional, não preenchiam lacunas solucionadas pela imaginação. Os labirintos tinham centro e faziam sentido. Ao invés de livros, produziam relatórios com fotos e descrições. A América Latina precisava ser investigada. Apolônio queria independer-se da patafísica, entupir-se de churros recheados com doce de leite, aderir a uma religião e, sobretudo, assumir o posto de assistente investigativo da Grande Investigadora da agência Morales y Morales. A Senhora Laurita, apesar dos anos avançados, demonstrava energia. “Se estiver interessado em trabalhar para mim, posso levá-lo agora para ver a porta que encerra as tralhas abandonadas por Ernesto Garcia na cobertura desta casa. Garcia não passa de um astrônomo inescrupuloso cuja sala está trancada há trinta anos. Odiara a José Clemente Orosco, os dois havendo competido pela fama dos murais e por uma mulher. Desistindo da arte que o atraiçoava, assim como da tal mulher, Ernesto buscou abrigo no interior da província, na fazenda de uma antiga amante com sotaque francês e relacionada ao último tzar da Rússia. Ouvi que mantém um aviário lucrativo, dirige embriagado e apanha cornichos, um tipo de fungo crescido no centeio e conhecido como “ergot” , ou esporão de centeio distribuído nas panificadoras de aldeia em aldeia. Basta uma grama em cada quilo para a produção de sinais clínicos de intoxicação nos comensais. A formula algébrica de Leo Perutz estabelece os números exatos para o alucinógeno provocar o aumento do fervor religioso em humanos já que animais não aderem a religião, sequer conversam com Deus. A fé se instaura é por processo químico… está comprovado.” No topo da casa, encontraram o terraço escancarado para o céu e com uma construção aos fundos. “Apolônio, repare nesta porta podre por causa das infiltrações.” Apolônio, animado a abandonar a condição de escritor, tateou a porta coberta por vários dedos de tinta cinza e espessa. Cadeados impediam a entrada de estranhos embora a porta estivesse traumatizada por tentativas de arrombamento. “O que me espanta, senhora Laurita, é que esta não é uma porta forte, indestrutível. Com um bom pontapé, eu a derrubaria facilmente.” No canto esquerdo, uma pequena janela de vidro na lateral do quarto exibia mesas e cadeiras escolares, papéis soltos em alfabeto cirílico e uma lâmpada solitária pendurada no teto. O coração de Apolônio deu um pinote, era o sopro na corcova a vibrar. De volta a pensão onde se hospedavam ele e outros participantes do congresso de astronomia para iniciantes, Apolônio anotou num bloco os detalhes investigativos apreendidos e permaneceu horas na sala de estar, preparando-se para as palestras sobre buracos negros e novos planetas, a sua boca salivava por um churro de doce de leite e a sua fé o inflamava ao refletir sobre a imaterialidade cósmica. Cansado de estudar, colocou o chapéu do Panamá sobre o crânio e navegou pelos logradouros, entre a populaça miúda em reza e orações e as igrejas ebulientes. Comprou dois churros recheados e experimentou ter os sapatos engraxados num dos camarotes que rodeavam a Plaza. *** 46

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Na manhã seguinte, a Senhora Laurita estranhou que Apolônio não aparecesse na agência conforme combinado. Teria sido o seu primeiro dia de trabalho como sinaleiro. Ao meio dia, a velhota deu início a uma procura pelo antigo escriba que a levou ao hospital metropolitano. Encontrou Apolônio tão entubado quanto o assistente do mês anterior e sob os cuidados de enfermeiros encantados pela neve de São Pedro a cair pelo vidro das janelas da central de tratamento intensivo, um jogo caleidoscópico intenso de elevação divina que não deixou de transtornar a Grande Investigadora, cujo repasto da manhã incluíra um pãozinho de centeio. A decadência erótica de Jalisco não escapava aos espíritos entre milhares de demônios, jinns elusivos ou a audácia de Mefistófeles. Laurita abriu as pálpebras dos olhos dormentes de Apolônio e constatou que as manchas metálicas na íris se esparramaram pelos globos oculares, reproduzindo imagens das páginas escritas por ele em vitrines de livrarias fechadas, por onde os curiosos lamentariam a passagem de um escritor com ganas de ser detetive. A dona da pensão explicou a senhora Laurita que tudo se passara com a rapidez de um verso. Apolônio voltara do passeio noturno, reclinara-se em uma das poltronas e perdera consciência. Gritou com nervosismo, chamou por sereias, pássaros marinhos sobrenaturais. Parecia estar em transe. Implorou a Alá que lhe abrisse um postigo no paraíso. *** Mais tarde, numa fazenda perto dali, o Professor Garcia e Madame Petrósvska, agora sem a máscara postiça, comemoravam o sucesso de mais uma rendição. Os envenenamentos se propagavam e repercutiam. Laurita flanava de bengala em busca de eleitos, como convém à Circe.

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Kátia Gerlach (Rio de Janeiro, 1980). Radicada em Nova York, graduada em Direito pela UERJ. Mestre em Direito Internacional Privado pela Universidade de Londres e pela NYU School of Law. Professora de Direito na Fundação Getúlio Vargas e da Universidad Desconocida do Brooklyn sob a reitoria de Enrique VillaMatas. Autora de Colisões BESTIAIS (Particula)res pela Editora Oitoemeio, Forrageiras de Jade (2009) e Forasteiros (2013), editados pelo Projeto Dulcineia Catadora. Colunista da Philos e do Jornal Rascunho. 1


Philos

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