JUNHO DE 2016 // ANO 5 // NÚMERO 9 REVISTA-LABORATÓRIO DOS ALUNOS DO CURSO DE JORNALISMO DA ESPM
FAMA E ANONIMATO JOVENS CONCILIAM ROTINA ESTUDANTIL “NORMAL” COM CARREIRAS EM ASCENSÃO NA INTERNET VALE TUDO EM BUSCA DO SUCESSO, “SUBCELEBRIDADES” NÃO POUPAM ESFORÇOS PARA APARECER NA MÍDIA ENTREVISTA LUCIA SANTAELLA ANALISA RELAÇÃO SIMBIÓTICA ENTRE MEIOS DE COMUNICAÇÃO E CELEBRIDADES
CULTURA DO OLHAR Em uma sociedade narcisista, ser bem-sucedido é sinônimo de ser visto, e todos querem ser celebridades.
e
REVISTA-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA ESPM-SP Nº9 - 1º SEMESTRE DE 2016
Presidente J. Roberto Whitaker Penteado Vice-presidente Acadêmico Alexandre Gracioso Vice-presidente AdministrativoFinanceira Elisabeth Dau Corrêa Vice-presidente Corporativo Emmanuel Publio Dias Vice-presidente de Marketing e Comunicação José Francisco Queiroz Diretor de Graduação-SP Luiz Fernando Garcia Diretor Acadêmico-SP Ismael Rocha Júnior Coordenadora do curso de Jornalismo-SP Maria Elisabete Antonioli
EDITORIAL
EM BUSCA DA FAMA Qual a medida do sucesso de alguém? Eis a inquietação primeira que deu origem a esta edição da revista-laboratório Plural. O sucesso se mede pelo dinheiro, pela fama, pela imortalidade alcançada em uma obra que atravessa os tempos, pela lembrança dos nossos nomes – aquilo que o marketing chama de “recall de marca” –, pela felicidade pessoal? Ora, alguém terá dito, o sucesso, hoje, se mede pela quantidade de “views”, “likes”, “shares”, “followers” e “fans” que contabilizamos com nossas personas virtuais, os perfis de Facebook, Twitter, Instagram etc. Nunca a máxima “quem não é visto não é lembrado” teve tanto uso e tanta força entre nós, adeptos das redes sociais. Queremos ver, e, principalmen-
Revista Plural revistaplural-sp@espm.br
te, ser vistos. Queremos ser lembrados.
Editor Prof. Renato Essenfelder Revisão Profa. Maria Elisabete Antonioli Profa. Cicélia Pincer
so na cultura da “celebridização” de nossos tempos que esta edição reu-
E foi em torno de um questionamento sobre o que significa ter sucesniu 26 alunos do terceiro e do quarto semestres do curso de Jornalismo da ESPM-SP. Investigamos o que significa ser “famoso” e por que tanta gente quer ser famosa – seja porque escreveu um belo livro, seja porque veste seu gatinho de estimação com fantasias superelaboradas.
Reportagem (alunos do terceiro e do quarto semestres de Jornalismo) Alex Shim, Beatriz Consolin, Bianca Alves, Bianca Kachani, Carolina Brandileone, Charles Campos, Eduardo Pascoal, Felipe Capano, Fernanda Giachini, Gabriela Oliveira, Giovanna Lunardelli, Izabela Monaco, Julia Gianesi, Julia Leite, Kelly Cilento, Larissa Kazumi, Letícia Vilar, Luiza Capella, Mariana Yole, Paola Bonoldi, Rafael Simoes, Rafaela Andrade, Renata Carlini, Silvio Junior, Taísa Luna e Urssula Nobre
Como diz um de nossos entrevistados, o psicanalista Pedro De Santi, “os valores da nossa sociedade estão muito ligados à visibilidade e à representatividade”. Assim, a associação entre fama e virtude é automática. Pensamos, simplesmente: “Se uma pessoa é famosa, ela é boa”. Mas basta um passeio de 20 minutos pelo YouTube para colocarmos esse raciocínio em xeque. Tanta gente boa não é famosa, tanta gente famosa não é boa. Em certo momento, um aluno engajado na apuração da revista chegou a essa conclusão e veio me confidenciar, cabisbaixo: “Professor, é meio deprimente, isso. Acho que o mundo não é justo”. Referia-se, é claro, a alguma estrela em ascensão na internet cujas ideias enunciadas com invejável desenvoltura eram, em essência, preconceituosas e retrógradas. Confesso que me alegrei com sua indignação. Afinal, para qualquer jor-
Agência de Jornalismo ESPM-SP agenciadejornalismo-sp@espm.br Rua Dr. Álvaro Alvim, 123, Vila Mariana São Paulo, SP Tel. (11) 5085-6713 Projeto gráfico Márcio Freitas
nalista que se preze é preciso curiosidade, persistência e, claro, alguma indignação que nos mova para fora da cama – ou do conforto. “Se realmente acha isso, faça mais, seja melhor. Vire o jogo.” Plural chega agora ao seu quinto ano. Nossa proposta, ousada, sempre foi a de exercitar o jornalismo interpretativo, indo além do script básico de informações sobre um tema qualquer. Buscamos uma abordagem plural que desafie o senso comum e leve o leitor à reflexão.
A fonte Arauto, utilizada nesta publicação, foi gentilmente cedida pelo tipógrafo Fernando Caro.
As páginas a seguir podem ser lidas com alguma indignação, quando falamos de narcisismo, por exemplo, ou com alegria, quando mostramos os bastidores da vida de quem batalha para ficar famoso na internet brasileira. Podem, ainda, instigar o leitor, como faz Lucia Santaella, maior autoridade em semiótica no país, em entrevista exclusiva. Ao cabo, não oferecemos, é claro, receita para a fama. Apenas reiteramos nosso compromisso de sempre: trabalhar com afinco e honestidade, manter a cabeça aberta e o pensamento, afiado. Boa leitura! | RENATO ESSENFELDER, EDITOR DA PLURAL
ÍNDICE
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TODOS QUEREM SER FAMOSOS Em uma sociedade em que o sucesso é medido pelo número de “likes” ou “shares” que possuímos em redes sociais, visibilidade se confunde com virtude. Nesse contexto, todos querem se tornar celebridades, independentemente de talento ou esforço. Mas o que está por trás dessa “cultura de celebridades”, e por que ela pode ser tão nociva?
página 6 O ESPELHO DOS NARCISOS O mundo se tornou mais narcisista com a internet e a popularização das redes sociais, e o fenômeno norte-americano Kim Kardashian parece ser o símbolo perfeito destes novos tempos.
página 14 OS BASTIDORES DA REPORTAGEM Com cabeça aberta e muita disposição, alunos de jornalismo se lançaram ao desafio de entender melhor a cultura das celebridades no mundo moderno. Conheça os desafios enfrentados.
página 18 OS PERIGOS DA SUPEREXPOSIÇÃO Mais acessíveis do que nunca, celebridades do século 21 narram detalhes de suas vidas por meio de redes sociais, mas as consequências disso às vezes podem ser desastrosas.
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página 40
página 34
página 16
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ANDY WARHOL
ENTREVISTA
DAS TELAS AO PAPEL
Conheça mais da vida e da obra do polêmico artista norteamericano que profetizou “15 minutos de fama” para todos e influenciou gerações.
A especialista em semiótica Lucia Santaella fala sobre a relação entre as celebridades e a mídia – que, segundo ela, são como “irmãs siamesas”.
“Youtubers” famosos, como a curitibana Kéfera Buchmann, começam a se tornar figura fácil nas livrarias do país, mas suas obras recebem críticas.
página 20 QUANDO A FAMA VIRA TRAGÉDIA Amy Winehouse, Kurt Cobain, Michael Jackson. Cada qual à sua maneira, celebridades mundiais que tiveram dificuldades em lidar com a fama e terminaram suas vidas tragicamente. Por quê?
página 22 VIDA DUPLA EM BUSCA DO SUCESSO Eles não são nem famosos a ponto de lucrarem muito com isso nem tão desconhecidos que possam negligenciar os “fãs”. Conheça o cotidiano de quem se divide entre estudar e buscar a fama.
página 26 O MERCADO DAS SUBCELEBRIDADES Tirar a roupa em público, armar “flagras”, provocar “polêmicas”. As chamadas “subcelebridades” fazem de tudo para conseguir um lugar ao sol – com cobertura pela imprensa, é claro.
página 30 NO RASTRO DOS FAMOSOS O casamento entre o marketing e as celebridades é antigo, mas ganha nova roupagem na forma de posts patrocinados e outras formas de promover marcas por meio de “webcelebridades”.
OS NOVOS NARCISOS
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Apaixonados pela própria imagem nas redes sociais podem perder noção do real
O medo de sair do campo ilusório não BEATRIZ CONSOLIN CHARLES CAMPOS GIOVANNA LUNARDELLI URSSULA NOBRE
é algo meramente literário, tampouco se manifesta apenas em personagens míticos. O forte caráter narcísico que domina a sociedade atual faz com que
»»»Se, há algumas décadas, fosse
os indivíduos projetem uma imagem de
dito que em 2016 uma das principais
si mesmos que não condiz com a verda-
referências no mundo das celebrida-
de dos fatos. É nessa ilusão que as pesso-
des teria começado sua fama com um
as decidem acreditar e tentam se escon-
vídeo de sexo vazado na internet, pro-
der. Desse modo, a ideia de que ela possa
vavelmente achariam o fim dos tem-
não ser verdadeira assusta.
pos. Ainda mais se tratando de uma
A designer de moda e professora
figura que não se destacou por algum
do Centro Universitário Uninovafa-
talento ou trabalho específico. Mas
pi (Piauí), Cláudia Cyléia, explica que
essa celebridade existe e sua fama
“o sujeito narcisista entende e valoriza
aumenta a cada dia. Seu nome? Kim
bem mais a aparência de sucesso que o
Kardashian.
sucesso em si”.
Mas 2016 não é o fim dos tempos - tal-
O psicólogo e professor da Universi-
vez seja o início de uma era. Nela, nomes
dade Mackenzie Aurélio Melo comple-
como o de Kim e o de Paris Hilton, outra
menta que “na psicologia, o indivíduo
cuja fama veio após um vídeo caseiro de
narcísico não é aquele que ama muito a
sexo, representam um fenômeno. Kim
si mesmo. Na verdade o amor próprio é
consegue manter, junto de sua família,
uma coisa boa. A característica do nar-
um reality show de sucesso que está
cisismo é você amar uma imagem idea-
prestes a completar 10 anos no ar. Mas
lizada e se relacionar com ela”.
por que tanto fascínio e o que isso revela do mundo atual?
Quando uma sociedade com essas características elege suas personali-
A cultura das selfies e da autoexpo-
dades, suas referências, é natural que
sição nas mídias digitais transformou
essas figuras demonstrem semelhan-
a sociedade contemporânea. Faze-
ças com os indivíduos contemporâne-
mos parte de um mundo que cultua o
os. Os ídolos de uma sociedade narcísi-
aspecto visual, em que as pessoas ido-
ca são narcisistas.
latram a imagem que criam de si mes-
Mas esse comportamento às vezes
mas e necessitam de plateias cada vez
esconde inseguranças e fragilidades e
maiores. Esse fenômeno evidencia o
pode refletir uma grande necessidade
forte papel do narcisismo naquilo que
de aprovação. Na obra “Sobre o Beha-
o escritor peruano Mario Vargas Llosa
viorismo”, do psicólogo americano Fre-
caracterizou como uma “civilização do
deric Skinner, morto em 1990, o autor
espetáculo”.
afirma que “só quando o mundo privado
A palavra narcisista vem da mitologia
de uma pessoa se torna importante para
grega. É inspirada na história de Narci-
os demais é que ele se torna importante
so, jovem que é amaldiçoado e se apai-
para ela própria”. Por isso, a necessida-
xona pela própria imagem refletida em
de frenética de sentir que o outro tem
um lago. No entanto, não ultrapassa a
interesse sobre o que acontece em sua
barreira da contemplação visual, não
vida e o desejo compulsivo de possuir
toca naquilo pelo qual se enfeitiçara.
uma plateia exclusiva assolam celebri-
Sabe que o reflexo se desmancharia.
dades e pessoas comuns.
“Na psicologia, o indivíduo narcísico não é aquele que ama muito a si mesmo. Na verdade o amor próprio é uma coisa boa. A característica do narcisismo é você amar uma imagem idealizada e se relacionar com ela” Aurélio Melo, psicólogo
“Só quando o mundo privado de uma pessoa se torna importante para os demais é que ele se torna importante para ela própria” Frederic Skinner, influente psicólogo behaviorista morto em 1990
Cláudia Cyléia acredita que isso acontece porque existe um “esvaziamento do sentido de sucesso, isto é, ele não depende mais de esforço e disciplina, mas da aprovação de atributos pesso-
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ais e da aclamação pública”. Os novos olimpianos Um dos principais pensadores contemporâneos, o francês Edgar Morin relacionou as celebridades da atualidade com os deuses do Olimpo, presentes na mitologia grega. Para ele, essas figuras consideradas “divinas” e idolatradas séculos atrás hoje estão personificadas nas pessoas famosas, os novos “olimpianos”. São “heróis”, modelos de cultura, hábito e comportamento. As redes sociais potencializam esse processo, supervalorizando a estética em detrimento do conteúdo reflexivo. A psicóloga Natali Maia Marques expli-
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ca como esse processo se mostra prejudicial ao ser humano: “O indivíduo está sempre exigindo atenção, não consegue
Instagram é a que possui o quarto maior
enxergar o outro. Consequentemente,
número de seguidores no mundo, per-
não consegue estabelecer vínculo em uma relação saudável”. Aurélio Melo, psicólogo do Mackenzie, conta que até seu filho caçula já o
+
PLURAL NA INTERNET
dendo apenas para as cantoras Taylor Swift e Selena Gomez e para o perfil do próprio Instagram. O fenômeno Kardashian pode ser
questionou sobre o motivo de a capa do
classificado como paradigmático da
seu celular ser transparente:
cultura da autopromoção exagerada. O
- Essa capa é sem graça pai. Por que
público se identifica com o reality show
você não coloca uma capa colorida?
da família, em que a ideia de perfeição e
Ou seja: “O mundo tem que ser colori-
harmonia cede vez a escândalos e con-
do, tem que ser barulhento. O mundo tem
flitos constantes. O objetivo é atrair o
que estar em festa o tempo todo. Isso é uma característica do espetáculo”, reflete. No universo das Kardashians Kim Kardashian é um paradigma desta nova era. Ela se tornou famosa ao saber aliar um escândalo, o vazamento de
Use um leitor de QR Code e assista trecho de documentário do History Channel que apresenta o mito grego de Narciso e fala de narcisismo.
maior número de fãs, fazendo com que estes se sintam “íntimos” e próximos. Entretanto, como os fãs dos “olimpianos” do século 21 recebem esse fenômeno? Apesar do sucesso, críticas ferozes permeiam a família Kardashian, por exemplo. Constantemente chamadas
um vídeo de sexo com o ex-namorado,
de “fúteis” e acusadas de possuírem
o rapper Ray J, com seu narcisismo e a
fama sem ter feito nada de expressivo
vida de relativo luxo que já levava antes
- apesar dos empreendimentos monta-
da fama. Atualmente, sua conta no
dos após a fama -, elas não parecem se
FOTO BEATRIZ CONSOLIN
Ao lado, Paris Hilton, que se tornou célebre após vazamento de vídeo pornográfico; acima, a estudante Gabriela, fã das Kardashians
importar com julgamentos. Esse comportamento também alavanca seu sucesso e conquista segui-
pelas Kardashians. — Elas são muito fúteis, não fazem nada…
um top preto só, uma camisa xadrez e uma meia calça preta até metade da perna e o cabelo azul. Se não fosse a
dores. Gabriela Almeida tem 20 anos,
— Pai, elas são mulheres fortes,
faz economia e confessa que já pintou
fazem o que desejam e não ligam para
Ao chegar ao evento, porém, encon-
parte de seu cabelo de azul inspirada
o que os outros pensam. São empreen-
trou todos os convidados com rou-
em uma das irmãs Kardashians, Kylie.
dedoras e romperam com o padrão de
pas formais. Ela confessa que chegou
Vitória Di Marco tem 19, estuda admi-
beleza extremamente magro. Kim não
a se sentir “meio fora” dos padrões do
nistração e acha engraçados os confli-
se deixou abater com o vídeo vazado e
lugar, mas logo pensou que não deve-
tos do reality: “A Kim fez um escândalo
ficou famosa porque foi inteligente. Elas
ria se importar: “Ah, até parece que elas
porque perdeu seu brinco de diaman-
estão onde estão por elas mesmas. Eu
[Kardashians] iriam se sentir fora”. No
te na piscina. Eu também faria”, conta,
acho isso incrível. Elas me empoderam
meio da noite ainda escutou:
rindo. Ambas admiram o estilo Kar-
como mulher.
dashian de não se importar e de realmente “não estar nem aí”.
Mais do que isso, Gabriela ainda conta, com empolgação, as influências
Kylie, eu nunca teria coragem”.
— Nossa, você está parecendo a Kylie! — Yes! – pensou com um sorriso de orelha a orelha.
Gabriela vai mais fundo para respon-
positivas que as irmãs tiveram em sua
Apesar de tudo, ela admite que é
der os críticos. Em especial ao pai, que
vida. Um exemplo aconteceu em uma
necessário ter uma espécie de “filtro”
já a levou para visitar a cidade onde
festa do cursinho onde ela estudava. Ao
para segui-las constantemente. Notou
moram as Kardashians, separando um
se arrumar, pensou que as pessoas esta-
que estava “querendo demais” se encai-
dia inteiro para visitar o bairro da casa
riam vestidas em um estilo mais casu-
xar no perfil “quase perfeito” das irmãs
da família, na esperança de, “sem que-
al. Inspirada na caçula, Kylie Jenner,
norte-americanas. Então percebeu que
rer”, esbarrar com uma delas. O pai,
montou seu look com carinho. “Pus um
aquilo é inatingível e que é fundamen-
contudo, não aprova o interesse da filha
shorts rasgado, curto, de cintura alta,
tal se amar do jeito que se é.
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Sociedade contemporânea torna a visibilidade um valor, e todos podem ser celebridades
O FETICHE DA Schlepp, ambos com 20 anos de idade. A moça
BIANCA KACHANI JULIA GIANESI LETÍCIA VILAR RENATA CARLINI
desembolsou US$ 60 mil para se parecer com a
»»» Imagine-se com cerca de 20 anos de
hollywoodiano Brad Pitt.
socialite norte-americana Kim Kardashian. Os irmãos investiram para imitar o visual do ator
idade, com todas as inseguranças típicas
Esse tipo de comportamento faz parte de um
da fase. Cortava o cabelo com frequência?
fenômeno difuso, porém visível, presente em
Estava satisfeito com sua altura? E com seu
cada “like” ou “share” que perseguimos em
peso? Era feliz com seu corpo, em geral?
nossas redes sociais, em cada foto que posta-
Modificava seu estilo periodicamente?
mos na expectativa de projetar uma imagem
Agora presuma que você decidiu mudar.
favorável, de nos tornarmos mais populares. A
Mudar totalmente. Investiu US$ 60 mil em
cultura da celebridade – que é também uma
cirurgias plásticas. Ou quase US$ 25 mil em
cultura de superficialidade. Para muitos, uma
implantes no queixo e na bochecha. Bizarro?
cultura fútil e apocalíptica, que resultará em
Por que alguém faria isso? A resposta é sim-
um progressivo emburrecimento da sociedade.
ples: para parecer uma celebridade.
Por baixo dessa preocupação, contudo, jaz
Histórias como essas são reais e cada vez
uma outra, menos óbvia. A noção de que exis-
mais comuns, indo do singelo recorte de revis-
te uma cultura “alta”, que eleva o espírito, e
ta que se leva ao cabeleireiro, em busca de um
uma “baixa”, popular e popularesca, em que
corte fashion adotado por algum famoso, até
se enquadra o culto às celebridades.
as mesas de cirurgia. Os casos do parágrafo
O antropólogo Eduardo Benzatti, professor
acima aconteceram com a londrina Claire Lee-
da ESPM-SP, lembra que o tema da banalização
son, de 24 anos, e com os gêmeos Mike e Matt
da cultura tem sido assunto recorrente no Bra-
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poderia ter mais troca, a gente podia trocar mais, enriquecer mais, trocar conteúdo”, argumenta. Para ele, isso vale para todas as áreas da indústria cultural: música, cinema, programas de televisão etc. A antropóloga Laura Graziela Gomes concorda, afirmando que “a questão da banalização e da manipulação da cultura se torna evidente quando se constata que esta é, na maioria das vezes, a única opção que algumas populações possuem de acesso à cultura ou a formas de lazer”. Para ela, a “tragédia” da televisão brasileira reside justamente no fato de que os empresários universalizam apenas o que o próprio mercado define como entre-
A FAMA
tenimento para as massas. Nada disso é tão novo, historicamente. O psicanalista Pedro De Santi explica que cada geração tende a ver a próxima como se o mundo estivesse se degradando ou fosse muito mais superficial. “Porque eu não entendo a outra geração, acho que é maluca. Mas a gente não deve moralizar. Cada forma de funcionamento tem certos recursos e não tem outros”, diz.
sil, e reforça que a distinção entre alta e baixa
As gerações passadas não usufruíam das
cultura é mais complexa do que parece, e pode
tecnologias que existem hoje. Há prós e con-
ser mais uma questão de referências do que
tras nessa situação. Ao mesmo tempo em
de qualidade. “Talvez para uma geração mais
que essas pessoas conseguiam se aprofundar
jovem as referências sejam outras”, afirma.
mais em diversos temas, a geração atual está
Isso não impede, contudo, o reconhecimen-
sempre conectada e possui maior mobilida-
to de que há, sim, muita porcaria sendo veicu-
de. “Esses recursos do ambiente contempo-
lada por aí. “A qualidade [da cultura de massa]
râneo podem ser muito produtivos e ricos em
em determinados aspectos caiu”, reconhece.
algumas áreas e não em outras”, completa o
“Parece que é bacana fazer música com pala-
psicanalista, que acredita que uma das áreas
vrão, denegrindo a mulher, de duplo senti-
beneficiadas é a da comunicação.
do, chula. Tem quem goste, mas não é só isso Protagonismo
que deve ser mostrado”, exemplifica o professor. Mais do que censurar essa cultura, crucial seria, portanto, disponibilizar alternativas. Quem gosta de funk, ouve funk, quem gosta de ópera, ouve ópera, evitando moralizar a discussão. O antropólogo acrescenta que seria interessante se houvesse mais diálogo entre o que é consumido pelas periferias e na elite. “É uma questão de indústria. O rap, por exemplo, é de periferia e bomba em qualquer lugar. Mas
Esse tipo de comportamento faz parte de um fenômeno difuso, porém visível, presente em cada like ou share que perseguimos em nossas redes sociais
“Tudo o que é novo chega para somar. Temos preconceito com o que é novo porque não é habitual”, completa o estudante de relações internacionais Fernando Porto. Para o universitário, o novo modelo de fama associado à internet tem pontos positivos, porque “os jovens ganham mais espaço”. No entanto, ele considera a situação problemática quando o culto às celebridades vira uma espécie de doutrina inquestionável. “É ruim
CUIDADO COM O CATASTROFISMO: CADA GERAÇÃO TENDE A VER A PRÓXIMA COMO SE O MUNDO ESTIVESSE SE DEGRADANDO OU FOSSE MUITO MAIS SUPERFICIAL quando as pessoas seguem algo como verdade única”, pondera. Susan Lisenberg, que pesquisou em seu
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mestrado o fenômeno da “celebrificação”,
dos à visibilidade e à representatividade, o valor é dado por sua celebridade. Se a pessoa é famosa, ela é boa”, argumenta.
conta que as pessoas se tornam famosas hoje
Susan concorda com o psicanalista. Ela
“por captar mais a atenção do que as demais
explica que as celebridades nos conectam,
num dado contexto”. Simples assim. Douto-
nos ligam uns aos outros e se tornam assun-
randa em Comunicação e Práticas de Consu-
to em comum entre nós. “Elas nos congregam
mo na ESPM, ela faz relação direta entre a cir-
e refletem os nossos valores sociais. Por que
culação midiática e a conquista de um lugar
alguém se torna conhecido em determinada
de destaque no espaço público.
época? Isso diz muito a respeito de nós como
Embora o ambiente do mundo contemporâ-
sociedade, o que valorizamos, a que damos
neo seja propício para que blogueiros e you-
atenção, o que estamos discutindo”, argu-
tubers conquistem a fama, não há garantia
menta.
de sucesso. Ela compara a possibilidade de
“O que devemos nos perguntar hoje é qual
explodir nas mídias sociais com uma estrada
o peso que vida privada das celebridades deve
de duas vias, na qual a situação pode se rever-
ter diante de um mundo que enfrenta desa-
ter e o indivíduo voltar ao anonimato com a
fios como a urgência da sustentabilidade,
mesma velocidade com que ascendeu.
as migrações em massa e as desigualdades
Mesmo os jovens às vezes estranham essa velocidade toda. Renan Leite, 22 anos, aluno
sociais”, complementa a historiadora e jornalista Angela Ravazzolo.
de Produção Musical, lamenta que muitos
Atualmente, as redes sociais são a principal
famosos não agreguem nada à sociedade. E,
porta de entrada para o mundo das celebrida-
ainda por cima, “tiram o foco de outras pes-
des, afinal, alimentam e facilitam o interesse
soas que podiam estar em evidência”, critica.
pela vida alheia. O pesquisador João Matta,
O psicanalista Pedro De Santi até enten-
especializado em estudos etnográficos com
de que a sociedade poderia preferir que o
jovens, acredita que essas mídias são o palco
posto de “celebridade” fosse restrito a pesso-
perfeito para que cada um possa se tornar
as como o Papa Francisco ou o presidente dos
uma “minicelebridade” dentro de seu pró-
EUA, Barack Obama, figuras atreladas a valo-
prio mundo. “A partir do momento em que
res relevantes para a sociedade. No entanto,
você está olhando a vida do outro, o banal vira
não há muito a fazer, pois as pessoas estão
notório. O que era da vida cotidiana vira inte-
sempre em busca de modelos com os quais se
ressantíssimo”, pondera.
identifiquem. E, nesse sentido, talvez o papa não seja suficientemente pop.
Flávia Pavanelli e Vitória Moraes – esta última mais conhecida como Viih Tube – são exemplos de pessoas que ganharam a fama
O VALOR DA FAMA
na internet. Tratando de assuntos cotidianos
Partindo dessa ideia, De Santi compreende o
do mundo jovem e fazendo pegadinhas com o
motivo pelo qual as pessoas buscam suas refe-
namorado, Viih Tube, de apenas 15 anos, hoje
rências nos célebres. “Em um mundo com uma
tem mais de 2 milhões de inscritos em seu
cultura da mídia, o valor social que a gente
canal no Youtube.
mais tem hoje é o ser famoso”, diz. Ele explica
Já Flavia Pavanelli aos 18 anos conquistou
também que todos nós precisamos de referên-
milhares de fãs nas redes sociais. “Eu acho que
cias. “Buscamos referências culturais. A gente
ela ficou famosa primeiro pela beleza e por-
sempre vai atrás desses modelos de identifi-
que ela tem o tipo de vida que a maioria das
cação.”
meninas gostaria de ter”, comenta Michelle
Além disso, De Santi esclarece que “Em uma sociedade em que os valores estão muito liga-
Rodrigues, 22 anos, seguidora de Flávia em redes sociais.
tem o tempo inteiro esse consumo”, completa o pesquisador e publicitário João Matta. Ele acrescenta que “é mais fácil olhar para o outro do que para dentro da gente”. “Antes as obras eram mais interessantes que o autor, ao longo da história o autor fica mais importante que a obra. O autor vira a obra”, reflete. Flávia Pavanelli, que hoje tem 2,4 milhões de seguidores no Instagram, reconhece que ganhou a fama através da internet. “Eu sempre trabalhei como modelo quando era mais nova, mas as coisas só deram certo porque a
“O consumo da vida do outro é cada vez mais interessante. As redes sociais permitem o tempo inteiro esse consumo” João Matta, pesquisador
internet começou a vir muito forte e me ajudou no sentido de visibilidade. Se não fosse a internet tudo teria sido mais difícil.” Críticos não faltam. Mayara Lopes, estudante de administração, considera o culto às subcelebridades da internet um tipo de cultura inútil. “Eu acho que elas ficam famosas por qualquer coisa e o conteúdo que elas oferecem
No alto, Flávia Pavanelli; acima, Viih Tube
não é relevante”, critica. Lucas Gonçalves, de
| FOTOS REPRODUÇÃO
25 anos, também é ácido: “Não curto muito, e não acho muito merecedor ficar famoso por um blog ou qualquer coisa do tipo, acho que há artistas com muito mais potencial e que acabam não ficando famosos”. A antropológa Laura Graziela analisa a mudança de gosto entre as camadas populares. “Os mais pobres, mesmo sendo menos
Beatriz Goldenstein, 16 anos, acompa-
escolarizados, já apresentam um interesse
nha a vida de ambas. “A Flávia posta dicas de
notável pela rede, não apenas pelas formas
maquiagem e eu gosto”, conta. “Descobri a Viih
de relacionamento que ela proporciona, mas
Tube pelo Youtube”, completa. A estudante diz
também pelo conteúdo armazenado que cir-
que acredita que elas chamam atenção pela
cula nela e pode ser acessado gratuitamente.
beleza e pelos assuntos abordados.
O Youtube demonstra que a distinção e distância entre alta e baixa cultura podem ser bas-
QUEM NÃO É VISTO NÃO É LEMBRADO
tante amenizados”, diz.
Para Pedro De Santi, as postagens nas mídias
Com o tempo, valores se transformam. Há
sociais viraram hoje uma condição de existên-
diferenças entra ser celebridade hoje e anti-
cia. “Se eu não postei, não fui ao show”, brin-
gamente, Susan Lisenberg explica esse fenô-
ca. Ele acrescenta que, por causa disso, hoje
meno. “Antes era preciso atravessar o filtro
transformamos visibilidade em valor. “Se uma
seletivo dos veículos de comunicação, de lógi-
pessoa é famosa, ela é boa. Os valores da nossa
ca top-down [de cima para baixo], como TV,
sociedade estão muito ligados à visibilidade e
revistas, jornais, para aparecer nestes meios e
à representatividade”, diz.
ter a imagem projetada para um grande públi-
“O consumo da vida do outro é cada vez mais interessante. As redes sociais permi-
co. Hoje você pode ter essa projeção ao alcance de um clique.”
“A qualidade [da cultura de massa] em determinados aspectos caiu. Parece que é bacana fazer música com palavrão, denegrindo a mulher, de duplo sentido, chula. Tem quem goste, mas não é só isso.” Eduardo Benzatti, antropólogo
UM OLHAR SOBRE O PROCESSO DE REPORTAGEM
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BASTIDORES
DE CABEÇA ABERTA Em um tema cercado de estereótipos como o da cultura das celebridades, desafio é conseguir fugir dos chavões da do tema a partir de diversos ângulos. JULIA GIANESI LETÍCIA VILAR
Como em qualquer trabalho jornalístico, para a realização deste projeto os alu-
»»»O que torna alguém famoso? Por
nos tiveram que buscar fontes variadas e
que algumas pessoas servem de mode-
atentar à apuração e checagem de cada
lo a ser seguido? Quanto as novas tec-
informação obtida.
nologias de comunicação têm a ver
A estudante Bianca Kachani foi uma
com isso? Partindo dessas e de muitas
das responsáveis pela matéria principal
outras questões, esta edição da revis-
da edição. Ela confessou que foi traba-
ta Plural reflete sobre a chamada “cul-
lhoso conseguir as entrevistas. “Gasta-
tura das celebridades”.
mos bastante tempo indo atrás de fon-
Durante o primeiro semestre de 2016, uma equipe da Agência de Jornalismo,
tes”, explica. Ela fala também sobre a importân-
juntamente com alunos do 4º semes-
cia de saber lidar com os imprevistos
tre do curso, dedicou-se a produzir uma
que surgem, já que nem sempre tudo sai
revista que, além de informar, tenta levar
como o planejado. “Conseguimos uma
o leitor a uma análise mais aprofunda-
fonte de última hora, então tivemos que
Alunas da oficina da revista Plural na Agência de Jornalismo da ESPM-SP | FOTO BEATRIZ DIREITO
correr para escrever”, comenta. A jovem
dos portais IG e R7. Pascoal ainda disse
como a cantora Amy Winehouse. Ela teve
entrevistou a modelo Flávia Pavanelli
que ao longo de suas entrevistas perce-
a oportunidade de entrevistar um psi-
e também fontes acadêmicas, como o
beu o quão difícil é lidar com jornalismo
quiatra, João Maurício Maia, para enten-
antropólogo Eduardo Benzatti.
de entretenimento. “Muitos o veem como
der melhor os fatores que levam celebri-
A dificuldade não se limita à obten-
algo bobo, mas, assim como a cobertu-
dades globais ao suicídio.
ção de fontes: passa também por captar
ra de política e economia, ele exige um
Para os alunos envolvidos na revista,
o melhor que cada uma pode oferecer e, a
grande esforço dos repórteres”, pondera.
cuja elaboração tomou a maior parte do
partir disso, tecer um texto que faça sen-
Como era de se esperar, imprevis-
semestre, sob orientação do professor e
tido. “Um parágrafo tem que conversar
tos aconteceram ao longo desta edição.
editor Renato Essenfelder, a mensagem
com o outro, então a ordem do que que-
“Tive algumas pautas derrubadas”, rela-
que fica é sobre a importância do compro-
remos falar é bem importante”, explica.
ta Bianca Alves. Ela conta que faria uma
metimento com o duro e necessário tra-
A aluna Beatriz Consolin, do quar-
matéria sobre o trabalho dos paparazzi
balho jornalístico. Além disso, como sin-
to semestre, também enfrentou dificul-
brasileiros, mas encontrou dificuldades
tetiza a aluna-repórter Beatriz Consolin,
dades para conseguir seu objetivo: tor-
para conseguir fontes. Conseguiu conta-
fica uma lição a respeito do valor da curio-
nar complexa e humanizada a discussão
tos com editores e fotógrafos, mas, a des-
sidade, da humildade diante do que não
sobre celebridades. Para entender melhor
peito da insistência, ninguém quis con-
sabemos e da persistência. “É importan-
o assunto, pediu ajuda para professores
ceder entrevista sobre o tema.
te abrir a cabeça e falar com pessoas que
e leu artigos de teoria da comunicação. Ao focar no debate sobre o narcisismo
Bianca acabou escrevendo sobre celebridades que tiveram um fim trágico,
tenham pensamentos diferentes. Mostrar todos os lados envolvidos”, conclui.
e o egocentrismo, Beatriz diz ter aprendido muito sobre a sociedade contemporânea e o culto à visibilidade. Também aluno do quarto semestre,
ra. Felizmente, o esforço valeu a pena. Na
“É importante abrir a cabeça e falar com pessoas que tenham pensamentos diferentes. Mostrar todos os lados envolvidos”
execução de sua matéria ele teve a opor-
Beatriz Consolin, aluna do quarto semestre
Eduardo Pascoal escreveu sobre subcelebridades. “Falar com jornalistas que cobrem a área foi bastante difícil”, decla-
tunidade de conversar com jornalistas
RENATA CARLINI
»»»Andy Warhol explorou a arte em diferentes formatos, desde escrita e pintura até cinema e fotografia. Tudo
16/17
começou, no entanto, quando, aos oito anos, descobriu ser portador de um distúrbio neurológico raro que o obrigou a passar meses de cama. Foi nessa mesma época que sua mãe, também artista, deu-lhe as primeiras aulas de desenho. Além da pintura, ele foi o produtor de mais de sessenta filmes experimentais – dentre os mais famosos estão Sleep, que mostra o poeta John Giorno dormindo por seis horas, e Eat, que mostra um homem comendo por 45 minutos. Warhol também publicou três livros, apresentou programas de televisão e foi o financiador e mentor intelectual da banda The Velvet Underground. Foi, também, o autor da icônica frase “In the future, everyone will be famous for fifteen minutes” (no futuro, todos serão famosos por quinze minutos). Diante do atual contexto da cultura de celebridades, muitos acreditam que ele foi profético. “Não foi um precursor, mas foi talvez um dos primeiros a pensar isso”, pondera Tiago Mesquita, professor de história da arte da Fiam-Faam e crítico de arte. Mesquita ressalta também a complexidade da personalidade do artista. “O Warhol tem uma ambiguidade profunda porque começou a carreira como artista comercial, era desenhista de capa de disco, ilustrador de revista”, completa. Seu primeiro trabalho a se tornar
p PERFIL: ANDY WARHOL
ALÉM DOS 15 MINUTOS DE FAMA
mundialmente famoso foi o desenho para as latas de sopa Campbell’s. Outros trabalhos notáveis foram as pinturas de celebridades como Marylin Monroe e Elizabeth Taylor, em cores vívidas e exuberantes.
Um dos artistas mais importantes do movimento que ficou conhecido como pop art, Andy Warhol foi multimídia antes mesmo de o termo ser criado
Em 1994 foi inaugurado o The Andy Warhol Museum, em Pittsburgh, nos Estados Unidos, onde estão expostos os principais trabalhos do artista, incluindo novecentas pinturas, aproximadamente cem esculturas e 4.000 fotografias de sua autoria. Trajetória Nascido no dia 6 de agosto de 1928, em Pittsburgh, Andy Warhol foi um dos principais artistas da década de 1960. Logo após se formar em design no Instituto de Tecnologia de Carnegie, mudou-se para Nova York e começou a trabalhar como ilustrador de importantes revistas, como Vogue, Harper’s Bazaar e The New Yorker, além de fazer anúncios publicitários e displays para vitrines de lojas. Foi nessa época que começou a se tornar um artista gráfico de sucesso, ganhando diversos prêmios como diretor de arte. Abriu seu próprio estúdio em 1964 e o apelidou de “The Factory” (A fábrica). Em seguida, publicou seu primeiro Seu retrato “Eight Elvises” foi reven-
livro, Andy Warhol’s Index, em 1967. Em
dido por US$ 100 milhões em 2008, tor-
1968, no entanto, sua carreira – e vida
nando-se uma das pinturas mais valio-
– quase acabou, quando foi baleado por
sas da história. Para alguns, no entanto,
Valerie Solanis, uma escritora feminis-
Warhol não passava de um marqueteiro
ta radical. Valerie apareceu em um dos
que ficou famoso pelas ilustrações feitas
filmes de Warhol e estaria decepcionada
para grandes marcas. Mesquita discor-
por ele ter se recusado a usar um rotei-
da e vê um artista com legados impor-
ro que ela havia escrito. Warhol passou
tantes não só para a pintura, mas tam-
semanas no hospital até se recuperar.
bém para o cinema, a música e outras artes. “No caso dele, o que é novo em sua obra não é a criação do novo propriamente dita. É a criação do mesmo. O que diferencia uma obra da outra é como esse mesmo reaparece, como ele
Nascido em 1928, Andy Warhol foi polêmico durante toda a sua vida e criou obras que são, até hoje, mundialmente reconhecidas, como a serigrafia “Marilyn”, de 1967, e a série com estampas das sopas Campbell’s, de 1962 | FOTOS REPRODUÇÃO
Em 22 de fevereiro de 1987, Andy Warhol faleceu devido a complicações na recuperação de uma cirurgia na vesícula biliar, mas seu legado continua influenciando artistas ao redor do mundo todo. “Andy Warhol permanece
é seriado e ordenado”, afirma Mesquita.
não só como um ícone cultural fascinan-
Independentemente da opinião que
te, mas uma inspiração para as novas
se possa ter dele, artista ou publicitário,
gerações de artistas, curadores, cine-
é inegável que a fama de Andy Warhol
grafistas, designers e inovadores cul-
durou – e ainda dura – muito mais do
turais ao redor do mundo”, diz texto da
que quinze minutos.
The Andy Warhol Foundation.
18/19 O humorista Mendigo, do “Pânico na TV”, que já teve problemas por expor a vida privada na rede | FOTO REPRODUÇÃO
SUPEREXPOSIÇÃO Em tempos de internet, celebridades também perdem a medida do público e do privado nas redes sociais e acabam sofrendo prejuízos
IZABELA MONACO JULIA LEITE MARIANA CAFER
»»»Em uma atitude impensada, revol-
que fez. “Às vezes eu acho que vale a
tornei a situação diretamente com a mãe
pena eu colocar meu caráter em primei-
do meu filho, após algumas brigas na Jus-
ro lugar e expressar minhas vontades e
tiça, e hoje nós mantemos uma relação
desejos, do que ficar fingindo e fazendo
melhor”, conta.
papel de santo”, diz.
A história de Carlinhos é comum nas
tado com a situação que vivia, de não
O comediante usou o Twitter para
redes sociais, mas quando ocorre com
poder ver seu filho e ter que pagar uma
manifestar sua revolta, “Quero ver meu
celebridades e subcelebridades, os con-
pensão em um valor que não concorda-
filho, que saco!”, e a partir desse comentá-
teúdos tomam proporção totalmente dife-
va, Carlos Alberto da Silva, o “Mendigo”
rio a discussão se estendeu. A mãe e o avô
rente. Por isso é fundamental o cuidado
do “Pânico na TV”, publicou conteúdos
da criança também usaram a rede social
com a “persona virtual” e o trabalho de
em suas redes sociais que expuseram
para discutir o assunto.
assessores que ajudam na construção da
sua vida pessoal. Carlinhos tem 36 anos
Mendigo fala que seu advogado o aler-
e conta que, mesmo sendo um profissio-
tou e tentou controlar suas publicações
A assessora de imprensa e professora
nal que trabalha na televisão, que preza
nas redes sociais, e que o problema só foi
do curso de jornalismo da ESPM-SP Fran-
por sua imagem, não se arrepende do
resolvido mais tarde, na Justiça. “ Eu con-
cine Altheman explica que o trabalho de
imagem de seus clientes.
A VELOCIDADE COM QUE UM CONTEÚDO NOCIVO SE PROPAGA DIFICULTA A RECUPERAÇÃO DA IMAGEM. ÀS VEZES, A REPUTAÇÃO É QUEIMADA PARA SEMPRE um profissional que atua com políticos e
Hori, tem haters, mas diz que não se abala
seguir a “musa fitness” Gabriela Pugliesi
celebridades é dificultado pela batalha de
com isso. “Não tenho problema nenhum,
depois de um vídeo postado em seu Snap-
egos. “Quando eu assessorava um futu-
tanto com as críticas das pessoas maldo-
chat incentivando comportamentos que
ro candidato a deputado era muito difícil.
sas como com as críticas que nos ajudam
levam a distúrbios alimentares. “Ela fala-
Teve até um episódio em que ele tomou
porque são as construtivas. Ter a humil-
va pras seguidoras mandarem fotos pela-
uma atitude errada, sobre a qual nossa
dade de olhar para o lado certo é um negó-
das para amigas, enquanto seguia uma
equipe já tinha alertado, mas ele não escu-
cio bom”, pondera.
dieta, e se você comesse algo fora do regi-
tou”, lembra.
Rodrigo Capella, 34 anos, é comedian-
me essa amiga iria postar essa sua foto
Já sobre o trabalho com subcelebrida-
te e ganhou reconhecimento na mídia
des, Francine afirma que muitas vezes
após passar pela MTV. Atualmente divi-
Júlia ainda conta que depois do ocorri-
seus assessores têm que inventar pautas.
de o palco com Dinho Machado no stand
do a blogueira tentou se explicar, e disse
“Imagine um ex-BBB. Depois que pas-
up “Comédia Preto e Branco a Cores!” e
que era apenas uma brincadeira, mas
sou o tempo do programa ele não é mais
participa do Programa Sabrina Sato, na TV
mesmo assim ela não gostou. “Não con-
interessante para o público, ele não gera
Record, onde tem espaço para mostrar o
cordei com esse posicionamento e excluí
mais pauta. Por isso, a gente vê que algu-
que faz de melhor: comédia. “Os momen-
a Pugliesi de todas as minhas redes. Ela
mas histórias são inventadas, em conjun-
tos mais felizes que eu tenho nas redes são
tem que entender que muitos seguido-
to entre assessorado e assessor, como tér-
quando descubro um hater, mando algo
res se inspiram em suas atitudes”, critica.
minos e voltas de namoro.”
que o deixará bravo e antes que ele res-
Além disso, Francine conta que a velo-
ponda eu bloqueio”, conta.
sem roupa.”
Fofoca
cidade com que um conteúdo se torna
O comediante tem 159 mil seguidores
Além dos próprios perfis de celebrida-
viral e é propagado online é um fator que
no Instagram e em torno de 3.000 curti-
des nas redes sociais, há páginas especí-
dificulta a recuperação da imagem. Em
das por foto. Ele também utiliza o Face-
ficas para divulgar notícias e fofocas do
casos mais sérios a reputação do artista
book e o Twitter para expor o seu traba-
mundo dos famosos. O Tricotadas é um
pode nunca mais ser recuperada. “Quan-
lho e a sua vida privada.
desses perfis, que não revela a identidade
do é publicado um conteúdo que não seja
A carreira e a vida pessoal de uma
de seus administradores e possui mais de
verdade é muito mais fácil, o famoso só
figura pública, exposta pela rede social,
200 mil seguidores no Instagram. “Criei
tem que criar um plano com o assessor
influenciara seus seguidores. A estudan-
por ser apaixonada pelas celebridades,
de imprensa para desmentir aquilo. Mas
te de veterinária Julia Aruk deixou de
mas sem perceber foi crescendo muito
quando o fato realmente ocorreu, é um
rápido, até que virou minha ferramen-
trabalho mais complicado, tem que ser
ta de trabalho”, diz a dona do perfil, que
elaborado um pedido de desculpas ou
pediu para não ser identificada. Ela tam-
uma boa justificativa”, explica.
bém afirma que, apesar da predominância dos posts de exposição de celebridades,
Amor e Ódio
muitas vezes de forma negativa, nunca
Mas além de usarem as redes sociais para
teve o perfil tirado do ar.
expressarem suas opiniões, as celebrida-
Fabíola Reipert, polêmica jornalista
des utilizam essa conexão para criar uma
que tem um quadro no programa Balan-
proximidade com seu público e aumenta-
ço Geral, na TV Record, chamado “Hora da
rem seus “seguidores”. Mas nem sempre
Venenosa”, e que também possui um blog
isso acontece de forma positiva. É onde entram os “haters”, (do inglês “hate”, ódio). Eles são usuários das redes sociais que na maioria das vezes usam perfis falsos, ou anônimos, para propagar o ódio, com comentários ofensivos, agressivos, muitas vezes sem motivo aparente. Renan Augusto, ex-integrante da banda
“Tomo muito cuidado com o conteúdo que publico, pois as redes sociais podem ser um perigo” Fabíola Reipert, jornalista
sobre celebridades no R7, não se esconde atrás de perfis anônimos de fofocas quando dá suas alfinetadas. Experiente, ela diz que pouco comenta de sua vida, apenas coloca notas em seu blog e os vídeos no seu canal de YouTube. “Tomo muito cuidado com o conteúdo que publico, pois as redes sociais podem ser um perigo.”
20/21
O ÚLTIMO ESPETÁCULO Quando a fama – ou a perda dela – leva uma celebridade à loucura, o fim pode ser trágico
Já Amy Winehouse, além de ter reviBIANCA ALVES PINTO
talizado o soul com uma voz muito marcante, é lembrada como alguém que
»»» O auge da fama e do dinheiro pode
não queria – ou não soube lidar com – a
acabar em pesadelo. Já são diversas as
fama. Segundo o documentário “Amy”
celebridades que tiveram finais trági-
(2015), premiado com um Oscar, em 2016,
cos, mesmo estando no ponto máxi-
a causa da sua morte, em 2011, foi a inges-
mo de suas carreiras. O envolvimento
tão excessiva de álcool.
com drogas, as internações em clíni-
Amy era presença constante em bares
cas de reabilitação e as mortes viram
do bairro de Camden, na capital britâ-
pauta de jornal. Entre os casos mais
nica, sempre acompanhada de amigos,
conhecidos estão os do ex-vocalista
cigarro e muita bebida. Ela foi encontra-
da banda Nirvana, Kurt Cobain, o rei
da morta pela polícia em seu apartamen-
do pop, Michael Jackson, e a sensação
to, em Londres, no dia 23 de julho de 2011.
britânica Amy Winehouse.
Não se sabe ao certo como era a relação
Apesar de parecerem ter tudo, perde-
de Amy com a família e com o ex-mari-
ram-se para sempre. O psiquiatra e pro-
do, Blake Fielder-Civil. Entretanto, não
fessor da FMABC (Faculdade de Medicina
são raras as notícias que afirmam que o
do ABC) João Maurício Maia explica que
casamento era turbulento, apesar de ter
o envolvimento com drogas tem muito a
durado quase uma década.
ver com a vulnerabilidade das pessoas.
Após a morte, instaurou-se uma briga
“Não se pode saber ao certo o porquê,
entre o pai de Amy, Mitch Winehouse,
uma vez que são sempre suposições. Mas
e Fielder-Civil. Neste mesmo ano, o ex-
Michael Jackson, por exemplo, cresceu
-marido afirmou para o jornal britâni-
em uma rotina de ensaios e cobranças.”
co “The Sun” que se sentia aliviado por
Ele relembra o mistério do cantor que
saber que uma overdose não teria sido
vivia cercado de crianças, tinha um par-
a causa da morte, uma vez que ele era o
que de diversões na própria casa, sofria
responsável por trazer drogas à relação.
acusações graves sobre o seu comporta-
Três anos depois, Fielder-Civil disse que
mento, suspeito de pedofilia, e morreu
Mitch estava presente quando Amy inje-
no dia 25 de junho 2009 após uma parada
tou heroína pela primeira vez.
cardíaca. Segundo o documento divulga-
Para o professor João Maia, a sensa-
do à imprensa, Michael teve uma intoxi-
ção de poder das celebridades encobre
cação por uso abusivo de vários medica-
sua fragilidade. “Tem artista que atrasa
mentos de tarja preta.
horas para subir ao palco e, quando entra,
Michael Jackson, ídolo mundial, morreu aos 50 anos de idade | FOTO REPRODUÇÃO
Amy, morta aos 27 | FOTO REPRODUÇÃO
“O problema está no fato de que a fama não é para sempre e, quando perdida, a pessoa famosa não é sábia o suficiente para suportar o seu declínio” Suely Bichuet , psicóloga
deprimir”, declara Suely. Não é preciso ser uma celebridade mundial para sentir os efeitos nefastos da fama. Suely lembra que já aconteceu de atores da TV Globo perderem seus lugares na estratosfera da fama, por questões políticas, de idade e pelo fim da beleza física, e sofrerem. “Enlouquecer ou não com isso depende da formação familiar básica. Essas relações podem ser determinantes e podem salvar as pessoas dos seus infortúnios, das oscilações e das eventuais injustiças das nossas vidas.” Entre muitos finais trágicos, ainda há muitas vezes, não está em seu estado
coisas que possuem e o bem que elas dei-
aqueles que conseguem lidar com os
normal, perceptivelmente. Mesmo assim,
xam de fazer com o que o mundo lhes dá”,
altos e baixos da fama de forma positi-
vai ter uma multidão ali, feliz em vê-lo”,
reflete. Ela e Maia concordam no que diz
va. É o caso da cantora Demi Lovato, que
aponta o psiquiatra. É como se o dinhei-
respeito à propensão que algumas pesso-
hoje utiliza sua fama para promover o
ro e a fama trouxessem uma falta de limi-
as têm para desenvolver algum distúrbio
empoderamento e a autoconfiança para
tes, um conforto e o pensamento de ‘eu
mental devido a experiências passadas.
seu público. Ela chegou a recorrer a uma
posso tudo’.
“O que leva alguém à loucura pode ser a
clínica de reabilitação em 2010, quando
Outra explicação possível para tal
falta de um sentido para a vida ou de uma
sofria com distúrbios alimentares e psi-
envolvimento é a facilidade de acesso.
razão para se viver. É a maneira como ela
cológicos como bulimia, transtorno bipo-
“Uma pessoa que é famosa pode não só
se emaranhou e como as relações fami-
lar e automutilação.
conseguir as drogas de forma fácil, mas
liares as capturaram”, afirma Suely.
Demi desde criança sofreu bullying na escola, além de ter tido uma rela-
ela também tem acesso aos melhores O FIM DA FAMA
ção pouco amigável com seu pai, Patri-
Ainda assim, não se pode saber ao
O professor de psiquiatria e a psicóloga
ck Lovato, que morreu em dezembro de
certo o que leva estas pessoas ao extre-
também concordam que o fim da fama
2013. Apesar disso, o apoio da mãe, do
mo do suicídio. A psicóloga Suely Bichuet
pode levar os indivíduos à loucura. “O
padrasto e das irmãs foi essencial para
afirma que não é a fama e o dinheiro que
problema está no fato de que a fama
sua melhora.
tiram as pessoas de si, mas sim o que elas
não é para sempre e, quando perdida, a
Superada a fase de declínio, Demi res-
fazem com tudo isso. “O que adoece as
pessoa famosa não é sábia o suficiente
surgiu como sensação teen com músicas
pessoas é o que elas fazem de mal com as
para suportar o seu declínio. Ela pode se
reconfortantes para os fãs.
produtos”, diz Maia.
22/23
QUASE FAMOSOS Jovens tentam conciliar suas vidas de estudos e de trabalho “comum” com a carreira de celebridades emergentes
CAROLINA BRANDILEONE MARIANA YOLE RAFAEL SIMÕES
Ainda adolescentes, esses “famosos
até mesmo triplas de trabalho, estudo
da internet” são seguidos por multidões
e dedicação às redes sociais, até conse-
em redes sociais como Instagram, Snap-
guirem efetivamente “viver da fama”.
chat e Twitter e passam a ser conheci-
Apesar das redes sociais serem recen-
»»»Em um dia você é uma pessoa
dos como influenciadores digitais. Esse
tes, a questão da busca por popularida-
comum. No outro, não mais. É assim
título, porém, não é sinônimo apenas de
de e reconhecimento é antiga. “O dese-
que a fama acontece na vida de algu-
badalação e tratamento VIP. A transi-
jo pelo reconhecimento é o desejo pela
mas pessoas e, principalmente, dos
ção para a tão desejada vida de celebri-
aceitação coletiva, que valoriza o indiví-
jovens que hoje usam as redes sociais
dade pode ser mais difícil do que pare-
duo em suas escolhas, fazendo com que
para conquistar, mais do que likes, a
ce, e muitas dessas figuras que estão
ele se sinta integrado pela sociedade”,
popularidade.
em alta enfrentam jornadas duplas ou
enfatiza o sociólogo Rafael Carneiro.
Maju vive a vida dupla de estudante universitária e de celebridade em ascensão nas redes sociais | FOTOS RAFAEL SIMÕES
coisa é certa: assim como Aquiles, elas desejam ser lembradas. E para alcançar seus objetivos, como ter milhões de seguidores no Instagram, milhões de inscritos no Youtube ou até milhares de comentários nos textos de seus blogs, vale dividir o café da manhã, a aula de ginástica, o salão de beleza e os “jobs” com o maior número de pessoas possível. Pode-se chegar à exposição da intimidade sexual, como no caso da socialite americana Kim Kardashian, que foi parar nos tablóides após ter um vídeo de sexo “vazado”. Quanto mais, melhor. Não é à toa que, para a psicóloga Raquel Franco, não existe uma fórmula fixa fama e privacidade. Ela explica que é sempre preciso avaliar prós e contras da situação, e isso tem que ser Segundo ele, a aceitação pode render
feito de forma individual. “O que para
uma valorização pessoal, a eterniza-
um é invasão de privacidade, para outro
ção de um nome e até mesmo recom-
é reconhecimento da sua existência, é a
pensas materiais.
forma de viver”, afirma.
Na verdade, a história da busca pela
Embora o direito à privacidade seja
fama é tão antiga que remonta aos mitos
assegurado pela Constituição, na con-
gregos. É possível traçar um paralelo entre o herói Aquiles e a celebridade. Na obra de Homero, a glória seria morrer na Guerra de Troia, e a vida sem uma glória seria uma vida sem sentido. “Com o reconhecimento há a possibilidade de superar as limitações da própria morte”, conclui Carneiro. Fama x Privacidade Talvez as celebridades modernas não estejam tão preocupadas com as mensagens póstumas que deixarão, mas uma
“O desejo pelo reconhecimento é o desejo pela aceitação coletiva, que valoriza o indivíduo em suas escolhas, fazendo com que ele se sinta integrado pela sociedade” Rafael Carneiro, sociólogo
temporaneidade as fronteiras entre a vida pública e a vida privada são nebulosas, e isso não se dá somente pelo desenvolvimento das tecnologias de comunicação. “Com o processo de desencantamento do mundo, ocorre uma redefinição das ideias de ídolo”, explica Rafael Carneiro. Para ele, esses novos ídolos são próximos e reais, mundanos e palpáveis. Assim, produzem materiais físicos que podem ser reproduzidos, vendidos e consumidos. Isso justificaria então a
existência de pessoas que preferem transformar a vida particular em um Big Brother da vida real para se tornarem cada vez mais conhecidas. No Brasil, essa receita para a fama é quase certa, particularmente por conta
24/25
do comportamento nacional em redes sociais. A pesquisa “Futuro Digital em Foco - Brasil”, da consultoria comScore, confirma a importância da internet e das mídias sociais entre nós. No ano passado, os brasileiros foram o povo que mais gastou o seu tempo nesses sites, tendo uma média 60% maior do que a do resto do mundo. A pesquisa mostra que 67,9% dos acessos à internet no país são direcionados ao Facebook, maior rede social do mundo, contra 13% ao Youtube. Vida dupla Mas o que vem entre a fama e o anonimato? Faculdade, assessoria, trabalho, críticas, preconceitos e julgamentos. Esses são alguns desafios presentes no dia-a-dia de quem está entre os dois mundos. Famoso aos 13 anos por ter sido Colírio da revista Capricho, um concurso que escolhia toda semana um menino bonito, falava um pouco sobre a sua vida e postava fotos suas na internet, Leonardo Picon soube aproveitar as oportunidades que surgiram para não sair mais do topo. Com 15 anos, abriu sua empresa de roupas, chamada Approve, e possui hoje, aos 20, mais de um milhão de seguidores no Instagram. Vive na pele
Picon foi colírio da Capricho aos 13 anos e conseguiu manter os fãs | FOTO RAFAEL SIMÕES
NO ANO PASSADO, OS BRASILEIROS FORAM O POVO QUE MAIS GASTOU TEMPO EM REDES SOCIAIS, COM UMA MÉDIA 60% MAIOR DO QUE A DO RESTO DO MUNDO.
A ATIVIDADE DOS “HATERS” É HOJE EM DIA UM DESAFIO BANAL NA VIDA DE CELEBRIDADE, UMA ESPÉCIE DE PREÇO A SER PAGO PELA FAMA.
essa “vida dupla”.
relata a estudante.
aos poucos. Então parei para ver como
Com uma agenda cheia e uma roti-
Mas também existem outras dúvidas
na corrida, ele está em cartaz no teatro,
na vida de uma celebridade de internet.
com a peça teen “4 ever, a Última Noite”
Maju, que viu a sua vida mudar radical-
— Mas continuei, porque vi que é
e concedeu entrevista à Plural durante
mente de 2015 para cá, passou por uma
muito mais do que eu querer. As pesso-
o intervalo entre uma reunião de tra-
crise. Ela ficou “offline” e parou de pos-
as precisam, as pessoas querem. Têm
balho e uma aula do curso de adminis-
tar vídeos por três meses:
toda uma questão mais emocional,
ia ficar sem [postar] e ver se eu realmente queria continuar.
tração, carreira que sempre almejou.
— Foi um momento difícil, eu estava
elas se apegam, sentem falta. Elas me
Hoje, tenta relacionar os estudos ao que
em crise interna, de ver o que eu que-
pediam, elas me cobravam, e para isso
enfrenta na sua rotina de trabalho.
ria, porque eu vi que [a fama] começou
eu não consegui falar não.
— Meu pai tem uma empresa e, desde
a tomar uma proporção muito maior do
pequeno, perguntavam o que eu ia fazer
que eu esperava. Virou um trabalho sem
Público
quando crescer. Era certo que eu iria
eu planejar. Eu ainda não sei lidar muito
Não demorou muito para que o fã-clu-
tocar a empresa dele e eu meio que acre-
bem com esse meio, estou aprendendo
be “Black da Maju” surgisse no Insta-
ditava nisso.
gram. Quem teve a ideia foi Beatriz Cizo-
O dono da Approve é só mais um
to Molina, de 17 anos, que mesmo sem
exemplo dos jovens que vivem a vida em
conhecer pessoalmente Maju, resolveu
função de sua imagem, o que já o levou
criar o perfil após “stalkear” a bloguei-
a participar de propagandas, eventos e
ra. “Eu queria compartilhar com todos
até parcerias com grandes marcas. Mas
porque vi algo de muito especial nela”,
como se manter na “crista da onda”?
diz a jovem que dedica o quanto pode do
Para isso, os aspirantes à fama procu-
seu tempo livre ao fã-clube.
ram se manter ativos em suas redes
Picon, cujo público tem na maioria
sociais, fazer contatos que abram por-
menos de 15 anos de idade, diz que é
tas na sua carreira e produzir conteú-
mais fácil lidar com adolescentes, mas,
dos que despertem interesse do público.
mesmo assim, se preocupa em não “trair
É importante ressaltar que essa nova
os fãs”, divulgando apenas conteúdos
possibilidade de se tornar um famoso
que interessem a eles.
se deu, majoritariamente, por conta da
Karla Reis, 12 anos, faz parte desse
internet. Por ter se tornado o principal
grupo. Há um ano, decidiu montar um
meio de as pessoas se comunicarem e
fã-clube para demonstrar sua paixão
trocarem informações, é nela que cele-
pelo ex-Colírio da Capricho. “Eu come-
bridades e anônimos colocam a cara
cei a gostar dele com 10 anos e decidi
para bater em busca de popularidade.
criar a página com 11. Continuo postando
No caso de Maria Julia Silva, estudan-
fotos dele, pois quero que um dia veja a
te de jornalismo, embaixadora da Seda
importância que tem para mim”, conta.
e com mais de 150 mil seguidores no
Maju cita dois lados dessa relação com
Instagram, o principal problema nesse
os fãs: o bom, em que recebe carinho e
momento de sua vida é conciliar todos os compromissos com apenas 18 anos. Mesmo contando com o auxílio do pai, Maju, como é conhecida nas redes sociais, ainda procura por ajuda. “É uma doidera mesmo, eu estou tentando abraçar tudo, mas sei que vai chegar uma hora em que eu não vou conseguir, por isso eu estou atrás de um assessor”,
“Virou um trabalho sem eu planejar. Eu ainda não sei lidar muito bem com esse meio, estou aprendendo aos poucos” Maria Julia Silva, estudante de jornalismo e embaixadora da Seda
afeto do público, e o ruim, dos “haters” que criticam agressivamente seu trabalho. A atividade desses “odiadores” é hoje em dia um desafio banal na vida de celebridade, uma espécie de preço a ser pago pela fama. “Eu leio tudo e tem coisa que machuca. Mas a gente tem que lidar com isso, porque, infelizmente, o mundo tem pessoas não muito legais.”
Juliana Isen, que foi nua a protestos pró-impeachment em 2015 | FOTO
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REPRODUÇÃO
VALE TUDO PELA FAMA “Subcelebridades” adotam métodos heterodoxos para conquistar um lugar ao sol
ALEX SHIM EDUARDO PASCOAL FELIPE CAPANO SILVIO JUNIOR
Por isso esse tipo de programa trans-
Ela poderia ter se sentido incomodada
forma seus participantes em perso-
pela divulgação, mas acabou se aprovei-
nalidades instantâneas. Mas muitas
tando do caso e se tornou conhecida na
vezes por pouco tempo.
mídia. Usar o corpo, beleza e até o senso
Além de estrelar esses programas, as
de humor são algumas das “armas” usa-
»»»Em um mundo de muita exposição
pessoas também fazem coisas inusita-
e pouca privacidade, reality shows
das para aparecer, como tirar a roupa.
Com a possibilidade de seus conteú-
são febre na TV, atingindo picos de
Juliana Isen é um exemplo disso. Após
dos “viralizarem”, as subcelebridades
audiência. Segundo a revista Veja, o
ir nua aos protestos de 2015 e virar notí-
ganharam espaço na mídia, tanto no
último programa “BBB” atingiu entre
cia, a modelo repetiu o ato no Carnaval
meio jornalístico como não jornalísti-
30 a 35 pontos de audiência em São
deste ano e novamente estava presen-
co. Nos últimos anos isso ficou mais fre-
Paulo. Considerando que um ponto
te nos portais. Outro exemplo é Geisy
quente, considerando que plataformas
equivale a 198 mil telespectadores, a
Arruda, que foi flagrada em sua univer-
como Youtube e Instagram podem pro-
audiência média do reality foi de 6,5
sidade usando um vestido curto e pro-
mover a imagem de pessoas desconhe-
milhões de pessoas só em São Paulo.
tagonizou um vídeo que se tornou viral.
cidas com mais facilidade.
das para se promover.
AS SUBCELEBRIDADES BUSCAM 15 MINUTOS DE FAMA, ENQUANTO AS CELEBRIDADES TÊM UM CAMINHO MAIS LONGO – E FUNDAMENTOS PARA ESTAREM NA MÍDIA.
consequência de muito esforço e dedicação. Já a fama, Renata classifica como “momentânea e efêmera”. A ex-participante do reality A Fazenda, atriz e repórter Renata Banhara ficou famosa instantaneamente com
“É possível que alguém considerado subcelebridade vire uma celebridade de primeira grandeza” Álvaro Leme, colunista do R7
aparições em programas de destaque. Ela distingue o sucesso da fama, comentando que a fama é algo imediato em sua concepção. “A fama é diferente do sucesso. O sucesso é mérito de quem tem um caminho percorrido de um êxito muito grande, que requer esforço. A fama é um fato. As pessoas viram notícia por um feito”, pondera. Ainda, para a repórter, são criados inúmeros famosos e personalida-
Renata Banhara, que participou do reality A Fazenda | FOTO REPRODUÇÃO
Dois lados Mas então o que são essas subcelebridades? Para a jornalista Renata Reif, que está há sete anos no IG e hoje é responsável pela editoria de Entretenimento e Cultura do portal, as subcelebridades buscam seus 15 minutos de fama, enquanto as celebridades têm um caminho mais longo. Além disso a jornalis-
“A fama é diferente do sucesso. O sucesso é mérito de quem tem um caminho percorrido de um êxito muito grande, que requer esforço. A fama é um fato. As pessoas viram notícia por um feito” Renata Banhara, ex-A Fazenda
ta comenta que muitas dessas subcelebridades não têm fundamento para se manter na mídia. “São aquelas mulheres que tiram a roupa em público, conseguem algum destaque até pela bizarrice do ato e depois desaparecem”, exemplifica. Para ela, as subcelebridades existem porque causam curiosidade nas pessoas e são mais acessíveis que atores consagrados. A jornalista ainda ressaltou que há uma diferença entre celebridade e famoso. Ser célebre tem a ver com mérito e comprometimento da pessoa, sendo
des por causa da necessidade de notícias constantes nos portais noticiosos “Como através da tecnologia a notícia precisa ser fresca e rápida, você precisa gerar muito conteúdo. Então tudo pode ser uma coisa famosa, porque os sites precisam de notícia, necessitam de informação o tempo todo – diferentemente de antigamente, quando as notícias vinham de revistas semanais que as pessoas esperavam. Hoje não, você abre seu computador e vê uma notícia nova”, completou a ex-reality. Para Renata Banhara, vale tudo pela fama. Mas ela acredita que as consequências podem ser ruins: “Depende do foco. Vale tudo desde que você tenha
“Para mim não vale tudo. Mas se a pessoa estiver disposta a tudo, consegue se tornar uma celebridade, por exemplo com escândalos recorrentes” Tamires Peloso, ex-BBB
estratégia de continuidade. Fazer algo se tornar público e depois não saber o que fazer com a fama é muito perigoso. Ser famoso é ter a vida aberta, exposta. O preço que se paga é alto”, afirma. Tamires Peloso participou do Big Brother Brasil em sua 15ª edição. Atualmente dentista, Tamires desistiu do programa em 50 dias de participação. A ex-BBB demonstrou um incômodo com a alta exposição durante o programa, por isso requisitou sua retirada do reality. Com um pensamento um pouco
diferentemente de Renata Banhara, a ex-BBB acha que a fama não pode ser atingida a todo custo. “Para mim não vale tudo, participei de um reality show que me rendeu uma visibilidade e exposição enormes em pouco tempo. Mas se
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a pessoa estiver disposta a tudo, consegue se tornar uma celebridade, por exemplo com escândalos recorrentes, por mais que seja uma mídia não muito positiva”, conta. Talento Por outro lado, Álvaro Leme, colunista no portal R7, comenta que uma característica importante para se tornar famoso é ter talento. O jornalista acredita que se atinge a fama quando a pessoa se torna relevante, fruto de um trabalho ou do fato de mobilizar a mídia e atrair interesse. Leme comenta que uma subcelebridade busca a fama pela fama, sem o trabalho que as celebridades enfrentam. “Mas é possível que alguém considerado subcelebridade vire uma celebridade de primeira grandeza”, comenta o jornalista, citando o caso de Sabrina Sato, que começou no Big Brother e hoje é uma figura importante, “muito pelo seu carisma”, completou Leme.
Acima, Geisy Arruda, que primeiro se tornou conhecida em vídeo em que era hostilizada por usar vestido curto, mas que depois soube se promover; ao lado, o “anão universitário” Pedro Carvallio, do “Pânico na TV” | FOTOS REPRODUÇÃO
pensando em sua vida ser o seu trabalho, o “anão universitário”, Pedro Carvallio, surgiu no programa Pânico na Band com uma fala simples que virou
O jornalista Jonathan Pereira que hoje
célebre, “errouuu”. Logo após, teve
tem uma coluna no portal IG, chama-
algumas participações no programa
da Na TV, conta que as subcelebrida-
e passou a ser mais reconhecido, mas
des geram notícias que atraem o públi-
não é contratado pela emissora. Apesar
co. “Como notas com esses personagens
disso, o estudante ressalta que tem um
dão um número grande de cliques com-
bom relacionamento com o canal.
paradas a conteúdos de cinema ou tea-
“Eu ainda acho que não alcancei o
tro, os portais de internet acabam apos-
mérito de ser famoso, tenho muito o que
tando nisso para manter sua audiência
crescer ainda”, comenta. Além disso,
em alta, já que trabalham com metas e
Carvallio contou que tem um proje-
precisam atingi-las”, comenta.
to de abrir um canal no Youtube, onde
Pereira diz ainda que para ser uma
mostrará a sua vida, dia a dia, festas e
celebridade as pessoas precisam ser
baladas que frequenta e ainda respon-
boas no que fazem, e estar em evidên-
der perguntas e dúvidas do público. A
cia pelo seu trabalho e não pela sua vida
ideia é que o projeto tenha o nome de
pessoal.
“Meu Pequeno Mundo”. “Viso alcançar
Misturando
esses
dois
lados,
sempre mais”, completa.
“Como notas com esses personagens dão um número grande de cliques, comparadas a conteúdos de cinema ou teatro, os portais de internet acabam apostando nisso para manter sua audiência em alta” Jonathan Pereira, colunista IG Gabriela Mendes, participante da pri-
mundo da fama parece mágico. E, assim
meira edição do programa Are You The
como Renata Reif, o jornalista vê essas
One Brasil, utilizou sua visibilidade ime-
subcelebridades como sujeitos de fama
diata de forma parecida, mesclando-a
efêmera. “Está na mídia por uma sema-
com sua vida profissional. Ela conta que
na e logo é esquecido”, pondera.
é designer de moda e atua na área, mas
Além disso, o jornalista observa que
também desfruta das coisas que vieram
a internet é uma das grandes responsá-
com a maior visibilidade. “Foi bom, pois
veis pela fama de algumas dessas pesso-
me chamam para vários trabalhos como
as, especialmente as redes sociais.
modelo”, explicou. “Sou presença VIP
O jornalista Álvaro Leme ainda
em eventos como Lollapalooza e tenho
comenta que existem assessores espe-
parcerias fechadas com a Desperados,
cializados em achar meios para os clien-
Famous, Grupo8, entre outros. “Sem-
tes chamarem atenção de profissionais
pre estou no mailing dos caras”, com-
da imprensa. O modo de se vestir é cor-
pletou a designer.
riqueiro entre pessoas que querem apa-
Ciro Hamen, jornalista especialista
recer, além disso muitos vão a eventos
no assunto, atualmente tem um canal
só para “causar” completou o jornalista.
no Youtube, O Brasil Que Deu Certo,
O fluxo e a necessidade de informação
que aborda o tema das subcelebrida-
são grandes e os jornais pedem cada vez
des, entre outros. Segundo ele, as pes-
mais por matérias. E as subcelebridades
soas buscam virar celebridades porque o
se beneficiam dessa demanda constante.
+
PLURAL NA INTERNET
Use um leitor de QR Code e leia no Portal de Jornalismo matéria de Paola Bonoldi que discute o jornalismo de celebridades.
30/31 O chef de cozinha e jurado do programa “Masterchef” Henrique Fogaça |
FOTO DIVULGAÇÃO
NO RASTRO DA FAMA No mundo em que ser famoso é sinônimo de sucesso, marcas tentam atrair celebridades
BIANCA GOMES KELLY CILENTO LARISSA KAZUMI LUIZA CAPELLA
o ideal que todos (ou quase todos) que-
autor do livro “A Construção do eu na
rem alcançar.
modernidade” e professor da ESPM-SP.
E não é preciso necessariamente ter
“Em nosso ambiente cultural, as celebri-
um talento evidente para se tornar uma
dades são valorizadas pelo simples fato
celebridade. Em tempos em que desfru-
de serem célebres. Ser muito conhecido
»»»Na sociedade do espetáculo, elas
tamos dos valores da indústria cultural,
é um valor em si.” Segundo ele, no con-
são as protagonistas. Por onde vão,
importados principalmente dos EUA, há
texto atual, há uma crise de valores mais
nunca passam despercebidas. Deixam
outras formas, que não as realizações,
consistentes, e a visibilidade da celebri-
um vestígio capaz de transformar
para uma pessoa se tornar célebre.
dade passa a ser associada a um valor
qualquer lugar em uma experiência
Essa condição faz parte de uma cir-
social. “É como se se dissesse: se a pes-
necessária de ser vivida. As celebri-
cunstância especial, abordada pelo psi-
soa é famosa, então ela é boa”, conclui.
dades hoje são sinônimo de sucesso e
canalista Pedro Luiz Ribeiro de Santi,
Não à toa, na capital paulista - a mais
“EM NOSSO AMBIENTE CULTURAL, AS CELEBRIDADES SÃO VALORIZADAS PELO SIMPLES FATO DE SEREM CÉLEBRES. SER MUITO CONHECIDO É UM VALOR EM SI” rica do Brasil - os bares, hotéis, restau-
público consumidor. Muitos estabeleci-
rantes, lojas de roupas, cabeleireiros,
mentos são conhecidos por atrair cele-
enfim, desejam que a sua marca seja
bridades e, consequentemente, atrair o
representada pelos maiores símbolos
público que as seguem. É uma troca: o
de sucesso da nossa sociedade.
estabelecimento ganha reconhecimen-
Numa ação de marketing, as empre-
to, e as celebridades, serviços gratuitos.
sas conseguem que o indivíduo, fazendo uma associação direta, transfira - a
Os Lugares
partir da representação - seu valor sim-
Em São Paulo, se desejarmos encontrar
bólico e sua credibilidade como celebri-
com uma celebridade, opção não falta. O
dade para o produto ou serviço à venda.
Instagram dos próprios artistas “denun-
Para Vanessa Clarizia, professora do
cia” o lugar em que estão. Além disso,
curso de graduação em Ciências Sociais
muitos sites fazem questão de listar os
e do Consumo da ESPM, ao frequentar os
estabelecimentos certos para o encon-
mesmos restaurantes, usar as mesmas
tro. “Os restaurantes queridinhos dos
roupas ou cortes de cabelo e se vincu-
famosos em São Paulo”, “Bares e bala-
lar desta forma nas diferentes mídias, o
das de famosos em SP”, “Lugares para
indivíduo se “aproxima de um ideal cul-
encontrar famosos” são algumas das
tural compartilhado. Neste movimento,
manchetes sobre o tema. Restaurantes
nós nos autointitulamos como sujeitos
como o Paris6 e a Frutaria São Paulo,
felizes, realizados, exitosos, entre tan-
lojas de roupas como a John John - na
tos outros adjetivos que resumem o que
rua Oscar Freire -, hotéis e shoppings
são as celebridades”.
ganham destaque e atraem visitantes.
O desejo das pessoas de estarem pró-
A Ótica Ventura é reconhecida por
ximas das celebridades não é de hoje.
estar na cara das celebridades, literal-
Entretanto, com o advento das redes
mente. A jornalista Marília Gabriela e a
sociais, como o Facebook, o Instagram
apresentadora Adriane Galisteu estão
e o Snapchat, e a consequente exposição
entre as clientes de maior visibilidade
da vida privada dos famosos, criou-se
da loja. Seus óculos ficaram conhecidos
uma falsa proximidade. Isso faz com que
e cumpriram bem a função de divulgar
as pessoas se sintam íntimas de deter-
a marca.
minada personalidade e, muitas vezes,
Segundo a diretora de marketing da
busquem um estilo de vida semelhante
Ótica Ventura, Deborah Ventura, a marca
a elas, frequentando os mesmos lugares,
utiliza as ações de marketing a favor da
usando as mesmas roupas e tendo com-
loja. A celebridade é como um porta-voz
portamentos semelhantes.
da mensagem que a marca quer passar
As celebridades representam certos
aos clientes. “Vendemos a atitude [do
ideais sociais em nossa sociedade e por
artista]. Marília Gabriela - por exemplo
isso são tidas como um exemplo a ser
- divulgou os óculos e a ideia de que é
seguido. A psicóloga Mariana Malve-
possível ter vários modelos diferentes.
zzi diz que os famosos são, neste senti-
Partiu dela a mudança de óculos por cor
do, indivíduos que supostamente vivem
e formato. Isso fez as pessoas irem atrás
integralmente no mundo do espetácu-
dos óculos na loja por motivos que vão
lo. “São referências, portanto, de uma
além do design”, afirma. A escolha das
idealização da cultura da atualidade”.
celebridades que representarão a marca
Não por acaso, a propaganda se uti-
não é aleatória. “Elas são porta-vozes de
liza dessa condição para expandir seu
uma ideologia. Não adianta trazer pes-
“[Quando consumimos o mesmo que nossas celebridades favoritas], nós nos autointitulamos como sujeitos felizes, realizados, exitosos, entre tantos outros adjetivos que resumem o que são as celebridades” Vanessa Clarizia, professora da ESPM
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soas que não tenham o seu DNA”.
Recentemente, a blogueira pintou seu
A presença de uma celebridade em um
cabelo com mechas coloridas. Ela sem-
estabelecimento pode ser tão impactan-
pre posta qual salão frequenta, o TP
te que, depois de ela postar o produto
Beauty Lounge, no Rio de Janeiro e, com
comprado ou consumido em determi-
isso, seus fãs procuram por tratamen-
nado local, ele se torna o mais vendido
tos iguais ao dela, como foi o caso da
ou consumido da semana e até do mês.
jovem Giovanna. A menina resolveu ir
Esse é o caso da Frutaria São Paulo, que
ao salão em busca das mesmas mechas
costuma receber famosos como Gabrie-
coloridas de Jade que, por coincidência,
la Pugliesi.
estava no salão no mesmo dia e acompanhou a transformação.
O gerente da Frutaria, Davidson Gomes, conta que a presença de cele-
Jade conta que quando vai mudar o
bridades como a “musa fitness” - como
visual, costuma sempre “dar um ‘spoi-
Pugliesi é conhecida por seus fãs “acaba tendo um grande impacto para a Frutaria. O que mais perguntam é qual
ler’ de que vai acontecer alguma coisa”.
A blogueira “fitness” Gabriela Pugliesi | FOTO REPRODUÇÃO
Ela avalia que as mudanças são importantes, pois as pessoas gostam de acom-
prato eles mais comem. Normalmente
panhar as novidades. “Todo mundo
procuram saber o que aquela celebri-
adora ver mudanças. Acredito que
dade comeu, e às vezes já vêm até com
isso seja a maior inspiração nas redes
foto”, afirma.
sociais”, completa.
Os fãs não escondem a influência que
Não são apenas os lugares que as cele-
uma postagem das celebridades nas
bridades divulgam que atraem o públi-
redes sociais tem na sua vida. A estu-
co. Hoje, é muito comum ver famosos
dante Laura Cipolla, de 18 anos, segue
como donos de estabelecimentos. É o
Gabriela Pugliesi nas redes sociais e com-
caso do restaurante Sal Gastronomia,
partilha o mesmo gosto da famosa: comi-
do chef de cozinha Henrique Fogaça. O
das saudáveis. A fã contou que depois de
restaurante já tinha um público conso-
a musa compartilhar um prato diferen-
lidado, mas desde 2014, quando Foga-
te no Instagram, ela ficou “morrendo de
ça estreou como jurado do progra-
vontade de provar”. “Era uma salada de
ma MasterChef Brasil, o fluxo do local
penne integral ao pesto com lascas de
aumentou. “O movimento mudou um
frango orgânico grelhado com tomate e
pouco, principalmente de pessoas que
lascas de parmesão por cima”, descreve.
não conheciam e ficaram curiosas para
Laura comenta que acha interessan-
conhecer. O movimento cresceu em
te as postagens da Gabriela Pugliesi, por
cerca de 30%”, afirma.
isso segue as indicações. “Eu fui mais
Desde a estreia do reality show, as pes-
por ela ter postado mesmo, porque eu
soas vão ao restaurante para encontrar
nunca tinha nem ouvido falar do res-
com o chef Fogaça. Dono do Sal Gastro-
taurante”, completa.
nomia, Cão Véio, Admiral’s Place e Jami-
A blogueira de moda Jade Seba - que já conta com 1,4 milhão de seguidores no Instagram - viu nas redes sociais a oportunidade de interagir mais de perto com os seus seguidores e, por isso, costuma comunicar aos seus fãs sobre os lugares que frequenta e as mudanças de visual que faz.
le, ele acredita que o público também vai
“[As celebridades] são porta-vozes de uma ideologia. Não adianta trazer pessoas que não tenham o seu DNA”
por conta do interesse em conhecer os
Deborah Ventura, diretora de marketing da Ótica Ventura
terChef ajuda nisso porque provoca uma
restaurantes, saber como é a comida e o ambiente desses lugares. “Acho bem legal isso, porque eu acho que a gastronomia precisa ser democrática e o Mascuriosidade nas pessoas”, diz.
OS FÃS NÃO ESCONDEM A INFLUÊNCIA QUE AS CELEBRIDADES TÊM NA VIDA DELES. E AS MARCAS SE APROVEITAM DISSO. FOTOS DIVULGAÇÃO
Famosos frequentam mais as zonas Oeste e Sul »»» A reportagem da revista Plural fez um levantamento dos lugares mais frequentados em São Paulo pelas celebridades, a fim de saber em qual região da cidade eles se concentram. Foram selecionados 49 estabelecimentos por meio das listas de “points” de celebridades publicadas pelos sites Hagah, Oba Oba, Guia da Semana e Revista Quem. Desses 49, 44 locais estãos sediados nas zonas Sul (principalmente em Moema) e Oeste (principalmente nos Jardins), ambos bairros nobres. O centro aparece na sequência, mas com apenas cinco locais citados – entre eles, o Espaço Parlapatões e o restaurante Famiglia Mancini. As zonas Leste e Norte não foram nem mencionadas nessas listas. Desenvolvimento Não por acaso, as zonas em que os estabelecimentos “badalados” estão localizados concentram os bairros de melhor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de toda a capital paulista. Segundo lista divulgada pelo jornal “O Estado de S.Paulo”, Moema, na
Alguns dos lugares em São Paulo citados por webcelebridades: no alto, os restaurantes Paris 6 e Spot, seguidos por prato do D.O.M; logo acima, a Livraria Cultura, o Comedians e a academia Competition
zona sul, ocupa a primeira posição do ranking de IDH paulistano. É seguida por Pinheiros (zona oeste), Perdizes (zona oeste), Jardim Paulista (zona oeste), Alto de Pinheiros (zona oeste), Itaim Bibi (zona sul), Vila Mariana (zona sul), Consolação (centro), Santo Amaro (zona sul) e Saúde (zona sul).
p&r
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ENTREVISTA: LUCIA SANTAELLA PESQUISADORA E PROFESSORA DA PUC-SP
UMA DAS MAIORES AUTORIDADES EM SEMIÓTICA DO PAÍS ANALISA O FENÔMENO DAS CELEBRIDADES PÓS-MODERNAS PELA PERSPECTIVA DAS MÍDIAS E DAS LINGUAGENS
CELEBRIDADE E MÍDIA SÃO IRMÃS SIAMESAS JULIA GIANESI
chamada “cultura das celebridades” e afirma que “a celebridade é construída nas mídias e pelas mais diver-
A mídia produz cultura? Caso afirmativo, o que caracterizaria essa cultura e como ela se diferencia daquela produzida historicamente pela sociedade?
»»»Uma das pesquisadoras brasilei-
sas mídias. Quanto mais a celebridade
ras de maior reconhecimento em sua
aparecer, nas variadas versões que as
A dúvida quanto à mídia produzir
área, Lucia Santaella é professora titu-
diferentes mídias a ela dá, tanto mais
cultura sinaliza a necessidade de uma
lar do programa de pós-graduação em
ela será celebridade”.
explanação acerca do que se entende
Comunicação e Semiótica da PUC-SP,
Segundo a pesquisadora, a discus-
tanto por mídia quanto por cultura.
com doutoramento em Teoria Literá-
são sobre o tema passa por uma refle-
Até os anos 1980-90, o uso da palavra
ria e livre-docência em Ciências da
xão mais profunda sobre o que é cul-
mídia era praticamente inexistente no
Comunicação. Seu trabalho rendeu
tura. Ela reforça que as mídias não só
Brasil e em outros países latinos. Sabe-
28 livros e mais de 200 artigos.
“criam cultura” como são indispensá-
-se que media é uma palavra latina,
veis para a própria existência de uma
plural de medium, ou meio.
Nesta entrevista, exclusiva para a Plural, ela comenta o fenômeno da
cultura. Leia a seguir a entrevista.
Desde os anos 1990, [a palavra
FOTO DIVULGAÇÃO
mídia] se alastrou até o ponto de não
dendo do seu campo de referência, o
tas do que convergências explícitas
se saber mais do que se está efetiva-
que não significa que todas essas for-
quando se fala sobre esse tema. Ora,
mente falando quando se diz mídia.
mas midiáticas não se cruzem, se com-
não há cultura sem comunicação. Não
Ela virou um coringa. Emprega-se
plementem, se sobreponham ou que
há comunicação sem mídias. Não há
sem nenhuma preocupação quanto ao
não haja competição, guerra e paz
mídia sem linguagem, ou seja, aqui-
campo a que se aplica. Afinal, de que
entre elas. Em suma, todos os meios
lo que semioticamente chamamos de
se está falando? Dos meios de comu-
de comunicação, mesmo aqueles que
signos, de todos os tipos e espécies:
nicação tradicionais, hoje chamados
levamos em nosso próprio corpo bio-
sonoros, visuais, audiovisuais, ver-
de grande mídia: jornal, rádio, tele-
lógico, são mídias. A que elas servem?
bais e todas as suas misturas. Aí está
visão, publicidade? Ou se está falan-
À comunicação.
a célebre frase de McLuhan: “o meio
do da internet? Das redes sociais? E
Neste ponto, entramos em outro
é a mensagem”, tão mal compreen-
o livro, não é mídia? Passei a utilizar
campo minado, o da cultura. Mina-
dida, bastante criticada há algumas
mídias como um substantivo geral,
do porque são tantos os seus senti-
décadas e hoje tão irrecusável. É tam-
com especificações adjetivas depen-
dos que há mais divergências ocul-
bém da escola de McLuhan, no Cana-
dá, que vem a compreensão de que meios de comunica-
ração de híbridos, não havendo mais
ção criam ambientes culturais que
lugar para categorias puras. Mesmo a
funcionam econômica, política e ide-
cultura que é chamada de entreteni-
ativamente de acordo com os poten-
mento fácil é uma cultura de misturas.
ciais e limites desses meios e suas lin-
Até o século XIX, no ocidente, só exis-
guagens, meios que hoje chamamos
tiam duas formas de cultura; a erudi-
de mídias. Por isso, podemos falar em
ta, de um lado, e a popular do outro.
uma cultura da oralidade, uma cultura
O advento da cultura da reprodutibi-
gutenberguiana [relativo a Johannes
lidade técnica deglutiu e miscigenou
Gutenberg, inventor da prensa de tipos
ambas as formas anteriores de cultura,
moveis em 1455], uma cultura de mas-
roubando, de certa forma, o espaço de
sas, uma cultura dos gadgets, uma cul-
produção popular, mas não o espaço,
tura digital e, dentro desta, dada a sua
sempre mais protegido, da produção
acelerada evolução, pode-se falar em
erudita. Entretanto, ao sofrer o impac-
cultura da mobilidade, cultura da ubi-
to da cultura de massas que se intensi-
quidade etc. Portanto, não pode restar
ficou com os meios eletrônicos, rádio
qualquer dúvida sobre o fato de que,
e televisão, a cultura erudita, embo-
sim, certamente, mídias criam cultura.
ra na continuidade de sua existência,
Mais do que isso, sem mídias, de quais-
perdeu o domínio exclusivista de que
quer espécies que possam ser, não
dispunha desde o renascimento. Além
haveria cultura, entendendo-se esta
disso, onde está a cultura do entreteni-
como formas diferenciadas de socia-
mento fácil como uma categoria pura?
lização de que decorrem todas as cria-
Na televisão e no rádio? Discordo, pois
ções e marcas humanas sobre a bios-
o que é entretenimento fácil para uns,
fera, desde o sapiens sapiens.
apresenta elementos educativos para outras faixas menos privilegiadas da
RAIO-X Nome: Lucia Santaella Origem: Catanduva, São Paulo Formação: Livre-docente em Ciências da Comunicação na ECA/USP Livros: é autora de 28 obras, entre elas “Matrizes da Linguagem e Pensamento ” (ed. Iluminuras) e “Comunicação Ubíqua: Repercussões na Cultura e na Educação” (ed. Paulus)
Em seu livro “Civilização do Espetáculo”, o escritor Mario Vargas Llosa critica a ascensão da cultura do espetáculo, ou do entretenimento fácil, que estaria aniquilando uma certa “alta cultura”, de “prazeres difíceis”, como um livro de Faulkner, um filme de Fellini ou uma ópera de Verdi. Esta é, aliás, uma crítica comum à cultura predominante hoje. A sra. concorda com essa visão?
população. Em suma, abandonemos as
Não obstante a minha grande admi-
informativa e transformadora tanto do
ração por esse escritor, a posição de
pensamento quanto da sensibilidade,
Vargas Llosa é marcadamente dualis-
ou seja, uma cultura para repertórios
ta ao dividir a cultura, de um lado, no
bem formados.
polaridades, pois elas mais ocultam do que revelam a complexidade do real. Meu ponto de concordância em relação a Vargas Llosa situa-se na valorização da cultura erudita, infelizmente sempre mais acessível às elites econômicas e culturais. De fato, trata-se de uma cultura refinada, sem redundâncias facilitadoras, profundamente
mundo da salvação, a cultura erudi-
Portanto, em vez de, em defesa do
ta e, de outro, no mundo da perdição,
popular, vociferarmos contra aqui-
todo o restante das produções cultu-
lo que é chamado de cultura de elite,
rais. Isso não corresponde aos fatos.
deveríamos, ao contrário, reivindicar
Sou adepta das concepções de Bruno
que a todos sejam dadas as oportuni-
Latour de que o mundo moderno e o
dades educacionais para que possam
contemporâneo produzem a prolife-
desfrutar dos prazeres do intelecto e
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“AO SOFRER O IMPACTO DA CULTURA DE MASSAS QUE SE INTENSIFICOU COM OS MEIOS ELETRÔNICOS, RÁDIO E TELEVISÃO, A CULTURA ERUDITA, EMBORA NA CONTINUIDADE DE SUA EXISTÊNCIA, PERDEU O DOMÍNIO
“NÃO HÁ CULTURA SEM COMUNICAÇÃO TANTO QUANTO NÃO HÁ COMUNICAÇÃO SEM MÍDIA, ASSIM COMO NÃO HÁ MÍDIA SEM LINGUAGEM” “ TODOS OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, MESMO AQUELES QUE LEVAMOS EM NOSSO CORPO, SÃO MÍDIAS.”
da sensibilidade.
no esquecimento. Quando, por outro
livro Pale Fire, de Nabokov, que morre
Que papel têm as celebridades midiáticas na constituição da nossa cultura hoje, no Brasil moderno?
lado, há algum tipo de mérito maior
sem explicação. Por que morreu? Res-
ou menor, mais ou menos relevante,
posta: porque comeu muita realidade.
que fertiliza a fama, a pessoa se trans-
Assim funcionam a mídia e o público.
Muitas celebridades alcançam esse
forma em notícia consumível que,
Mas há o outro lado da moeda: a cele-
status porque dispõem de talento,
neste caso, é notícia que só se esgota
bridade necessita da mídia. Sem ela,
conseguiram realizar o que realizam
quando a fama entra no crepúsculo.
feneceria no esquecimento. Ambas são
porque, com seu talento, maior ou
Portanto, há um ou alguns pontos de
menor, chegaram na hora certa, no
partida para que uma pessoa se torne
Aqui no Brasil, há muita semelhan-
lugar certo. Assim são atores e atri-
uma celebridade: algum fato ou fatos
ça com o funcionamento do binômio
zes, assim são alguns escritores e pen-
funcionam como um estopim porque
mídia-celebridade nos Estados Uni-
sadores, assim são artistas, esportis-
fisgam e cativam o público. Então,
dos: atores e atrizes estão sempre na
tas, cantores, top models etc. A pessoa
uma vez candidata prometida à cele-
crista, seguidos por cantores, jogado-
se torna célebre porque, a partir dos
bridade, a mídia se apossa dessa vida
res etc. O contraste com alguns paí-
seus feitos, adquire fama. Nem sem-
e passa a se alimentar com voracidade
ses da Europa é bem notável. Nestes
pre a fama é arbitrária; é preciso
de todos os seus passos, hábitos, dese-
ainda se vive a saudosa adoração do
lembrar, para que não se demonize
jos adivinhados, aparições públicas ou
mito da aristocracia.
a celebridade a priori. Certamente,
cenas privadas que são roubadas à dis-
há casos de celebridades passageiras
tância. A vida comum é, via de regra,
que ganham fama momentaneamen-
despida de encantos, surpresas, sofis-
te em função de escândalos. Esse tipo
ticação, glamour e fantasia. O cotidia-
de celebridade explode para durar o
no é sempre profundamente constran-
tempo de um relâmpago e logo cair
gedor. Há uma personagem jovem no
irmãs siamesas.
Por que as celebridades hoje, sejam as de nichos de internet, sejam as internacionais, exercem tanto fascínio entre nós? A sra. acha que esse fascínio cresce à medida que a cultura da mídia se
“CELEBRIDADES ENCARNAM TODOS OS VALORES QUE A SOCIEDADE DE CONSUMO ELEGE COMO MAGNOS E QUE TODAS AS MÍDIAS NÃO SE CANSAM DE VEICULAR”
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FOTOS DIVULGAÇÃO
torna hegemônica no país ou no mundo?
“MEIOS DE COMUNICAÇÃO CRIAM AMBIENTES CULTURAIS QUE FUNCIONAM ECONÔMICA, POLÍTICA E IDEATIVAMENTE DE ACORDO COM OS POTENCIAIS E LIMITES DESSES MEIOS E SUAS LINGUAGENS; MEIOS QUE HOJE CHAMAMOS DE MÍDIAS”
de de consumo elege como magnos e
Não há separação nítida de con-
que todas as mídias não se cansam de
teúdos entre as mídias globais e a
veicular. Por quê? Sociedades de con-
internet. Uma está atenta à outra. As
sumo são sociedades aspiracionais.
mídias globais, que ainda persistem
Cada faixa de renda aspira e luta para
e continuam a ter muita força - veja-
ter aquilo que a classe imediatamen-
-se a televisão aberta no Brasil -, pres-
te superior consome e assim por dian-
tam atenção a tudo que viraliza ou se
te, em todas as escalas da sociedade.
movimenta no frenesi das redes. As
Esse é o fator de realidade. Entretan-
redes, por seu lado - o twitter, o face-
to, existe um outro fator que está fora
book e outras - comentam, criticam e
da realidade para a imensa maioria das
dialogam, muitas vezes de modo con-
classes sociais: as fantasias do dese-
flituoso, com a grande mídia. Portan-
jo. A divulgação da existência banha-
to, celebridades, pela força de atra-
da em luxo das celebridades alimen-
ção que exercem sobre o público, têm
ta essas fantasias, ao mesmo tempo
presença contínua em todos os tipos
em que as fantasias funcionam como
de mídias. De onde vem o fascínio?
garantia para a continuidade da divul-
As vidas das celebridades são vidas
gação midiática, quer dizer, elas pro-
cobiçadas. Não apenas porque são
vocam consumo midiático garantido.
célebres, mas por tudo aquilo de que a celebridade depende e que a celebridade traz: beleza (natural ou artificialmente conquistada) e, sobretu-
A sra. acha possível falar numa cultura de celebridades em tempos atuais? O que caracterizaria essa cultura?
do, dinheiro, muito dinheiro, com tudo
Creio, sim, que se pode falar em uma
a que o dinheiro dá acesso: mansões
cultura de celebridade, contando que
imensas e suntuosas, hotéis luxuosos,
nos expliquemos acerca do sentido
descanso em paraísos que parecem ter
que é dado a isso. Ou seja, não exis-
descido dos céus à terra, roupas e joias
te uma cultura da celebridade em si.
de tirar o fôlego, séquito de emprega-
Lembremos o meu mote: não há cul-
dos... Em suma, celebridades encar-
tura sem comunicação tanto quanto
nam todos os valores que a socieda-
não há comunicação sem mídia, assim
murchos. São as imagens que trazem
tem que a ascensão da figura social da
à presença pessoas célebres às quais,
celebridade só é explicável pela mul-
sem elas, não se teria acesso. São as
tiplicação de mídias que, dos jornais,
imagens que, sofregamente, são bus-
fotografia, cinema, TV, vídeo, hoje cul-
cadas pelo público em virtude da pro-
minam na internet, todas elas mídias
messa que elas encerram de proximi-
veiculadoras e divulgadoras das figu-
dade com aquela pessoa que guarda
ras célebres. Daí se poder dizer que
seus segredos de privacidade por trás
as mídias são condições sine qua non
das imagens. Fotos e legendas, víde-
[obrigatórias] para a existência da
os e comentários, matérias de jornal e
celebridade.
revistas pontilhadas de fotos, programas de TV voltados para a exploração
a construção de signos, especialmente
A sra. acha que vivemos em uma sociedade de imagens, ou de superfícies, como preconizou Vilém Flusser (filósofo tcheco naturalizado brasileiro)? Como a sra. avalia esse fenômeno?
como não há mídia sem linguagem.
das imagens em torno de uma pessoa
Que as imagens são superfícies, tese
Portanto, pensar em uma cultura de
célebre, começa a rarear, a condição
que Flusser explora com muita pro-
celebridade significa lembrar que ela
célebre vai fenecendo. A celebridade
priedade, não se pode negar. Mas que
é construída nas mídias e pelas mais
implica, de modo imperativo, ser con-
vivemos em uma sociedade de ima-
diversas mídias. Quanto mais a cele-
tinuamente lembrada, sempre presen-
gens é uma afirmação que me pare-
bridade aparecer, nas variadas versões
te na mente do público pela mediação
ce simplificada. Nunca se produziu
que as diferentes mídias a ela dá, tanto
das imagens e dos outros signos que
tanto texto quanto no decorrer do
mais ela será celebridade. Pode-se até
rodeiam as imagens.
século XX. Nunca se produziu e dis-
precípua da fama, tudo isso vai compondo uma densa e espessa signagem que é condição da celebridade. Quando
pensar na celebridade transmídia: ela
Mas por que e quando rareiam as
tribuiu tanto som quanto no último
aparece no jornal, nas capas de revis-
imagens? Justamente porque rareiam
século. Foi o som, antes da imagem,
tas que acenam para nós das bancas,
os feitos que incitam as imagens. É por
que desafiou as mídias sonoras tradi-
nos programas de televisão aberta ou
isso que atores precisam terminar um
cionais. Basta pensar na invenção do
fechada, em matérias da internet na
trabalho e começar o seguinte, canto-
transistor, no walkman, no MP3 e hoje
linha do tempo que abraça o passado,
res devem lançar músicas ininterrup-
na possibilidade de baixar, em frações
o presente e os prognósticos de futuro.
tamente, top models e jogadores desa-
de segundos, quaisquer músicas com
parecem tão logo o viço e o preparo
que sonhamos. É certo que isso fere as
Qual é o valor da imagem no culto às celebridades?
físico da idade prescrita os obrigam a
leis dos direitos autorais, mas essa é
se retirar. Certamente, há mudanças
uma outra história, que podemos dei-
Como poderia haver celebrida-
históricas. Tanto essas mudanças exis-
xar para uma outra vez.
de, com a força que hoje essa figura adquiriu na cultura, se não houvesse imagem? Especialmente porque grande parte das pessoas célebres, aliás, aquelas que mais fisgam a cobiça, são encarnações da beleza e da potência da juventude. Além da beleza são exemplos inimitáveis da liberdade de que gozam em relação ao seu desejo: amores que vão e que vêm no império efêmero das paixões não submetidas às conveniências dos afetos
“EM VEZ DE VOCIFERARMOS CONTRA A CULTURA DE ELITE, DEVERÍAMOS REIVINDICAR QUE A TODOS SEJAM DADAS OPORTUNIDADES PARA QUE POSSAM DESFRUTAR DOS PRAZERES DO INTELECTO ”
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“BLOGS E OUTROS MEIOS DIGITAIS AINDA SÃO VISTOS COMO SECUNDÁRIOS. TER UM LIVRO PUBLICADO É TER O RESPALDO DE QUE O QUE VOCÊ FALA REALMENTE IMPORTA”
Kéfera Buchmann durante lançamento de seu livro na Bienal do Rio
FERNANDA GIACHINI GABRIELA OLIVEIRA RAFAELA ANDRADE TAÍSA LUNA
»»»Entre gritos desesperados por um autógrafo e com uma câmera na mão, Kéfera Buchmann lançou seu livro na Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Na ocasião, fãs enfrentaram todo tipo de obstáculo para ficar cara a cara com a
| FOTO ACERVO DIGITAL DA XVII BIENAL DO LIVRO RIO 2015
DA INTERNET PARA OS LIVROS Blogueiros e figuras influentes da web já ocupam as listas de autores mais vendidos do país
youtuber: levar injeção de glicose por ficar sem comer durante horas, chegar de madrugada para conquistar
de livros, somada à ascensão da internet,
O casamento de interesses foi perfei-
um lugar privilegiado na fila e quase
os blogueiros ganharam espaço no mer-
to: as editoras encontraram um perfil de
perder a voz de tanto gritar. Kéfera é
cado editorial. De acordo com Marcos
escritor latente e os blogueiros acharam
proprietária do segundo maior canal
da Veiga Pereira, presidente do Sindica-
uma maneira de popularizar ainda mais
brasileiro do Youtube, tem mais de
to Nacional dos Editores de Livros, 2016
seus conteúdos. “As editoras, enquan-
8 milhões de seguidores e é uma das
será um ano difícil para o setor. Assim,
to instituições legitimadoras do merca-
protagonistas de um novo fenômeno
o universo da literatura, que antes era
do, certamente se alimentam do sucesso
na literatura – o dos blogueiros-escri-
dominado por escritores conhecidos do
dos blogueiros e, num ciclo de interes-
tores, campeões de vendas.
grande público, abriu espaço para que
ses, tornam a alimentá-los”, explica o
celebridades da internet tivessem lugar
doutorando em Estudos Literários Wag-
também fora dela.
ner Lacerda.
No último ano, com a forte crise econômica que atingiu o país e as editoras
“ASSIM COMO HÁ LEITORES PARA GRANDES ROMANCES E BIOGRAFIAS, HÁ LEITORES INCLUSIVE PARA OS BLOGUEIROS”
Para a professora de literatura Mari-
BLOGUEIROS
sa Petcov, o fenômeno é compreensível
O sucesso das figuras da internet vai
sob a ótica contemporânea. “É preciso
muito além dos blogs. Elas são a personi-
considerá-los como fazedores de uma
ficação do que muitos sonham ser: suas
literatura moderna. Blogueiros são atu-
contas no Instagram tecem um estilo de
ais, descartáveis, e é isso que interessa
vida fascinante e distante da monotonia;
ao público”, conta.
seus vlogs no Youtube narram viagens e
O público busca novidades, e tudo
compartilham experiências. E tudo isso
aquilo que é constante e inflexível deixa
acontece sob os olhares de milhares de
de ser atrativo. Os blogueiros trazem
indivíduos que são espectadores de suas
esse frescor que as pessoas tanto bus-
vidas.
cam. Eles se renovam, criam e, quando
Ana de Cesaro começou a fazer víde-
um se torna cansativo, surgem outros
os para o Youtube sobre seu mochilão
nomes. Os personagens digitais são a
pela Europa, em 2010, e hoje é dona do
cara da modernidade.
blog Tá e Daí?. Ficou famosa pela sua
Kéfera Buchman é um exemplo sólido
hashtag #ProjetoAnaGostosa, através
da manifestação dos blogueiros no mer-
da qual mostrava sua rotina saudável, e
cado editorial. De acordo com o Publish-
arrecadou mais de 100.000 inscritos em
News, a youtuber ocupa o quinto lugar
seu canal e mais de 30.000 seguidores
na lista dos nacionais mais vendidos, na
no Instagram. Os tópicos que aborda são:
categoria não-ficção. Kéfera ultrapas-
cultura pop, culinária saudável, feminis-
sou personalidades como Augusto Cury
mo e causas sociais, viagens e motivação.
e fica atrás somente de Padre Marcelo
No ano de 2015, De Cesaro publicou
Rossi, Jojo Moyes e Rezendeevil – outros
seu primeiro livro, com título igual ao
profissionais na arte de vender livros.
nome do blog, no qual conta sua histó-
Esse fenômeno não repercutiu somen-
ria e como superou problemas pessoais.
te no âmbito mercadológico da literatu-
O que a motivou foi ampliar o conteúdo
ra. Ele está trazendo uma linguagem
que publica na web. “Com certeza a ideia
nova para as publicações das editoras.
passou a ser eternizar o meu trabalho
“Os blogueiros estão transferindo para
de uma forma diferente da internet. Até
os livros o linguajar da internet”, aponta
porque no livro há histórias que nunca
o jornalista e escritor Leão Serva.
contei no meu canal”, explica.
Há quem diga que personalidades da
A publicação de um livro também pode
internet e literatura não combinam. O
ser uma ferramenta para agregar prestí-
linguajar e a falta de complexidade dos
gio à imagem de um blogueiro. Ana con-
conteúdos produzidos por blogueiros
sidera que lançar um livro é sinal de tra-
seriam incompatíveis com a potência
balho satisfatório. “No mundo da mídia,
que grandes autores trazem para a lite-
blogs e outros meios digitais ainda são
ratura. Porém, o doutorando Wagner
vistos como secundários. Ter um livro
Lacerda tem uma visão otimista sobre
publicado é ter o respaldo de que o que
o fenômeno. “Não existe leitura boa ou
você fala realmente importa”, diz.
leitura ruim. O que existe é ler e não ler.
A questão comercial também é clara
Simples assim. E ler é sempre a melhor
para a blogueira e não deve ser dei-
opção. Claro que existem níveis de com-
xada de lado. Segundo sua visão, tudo
plexidade diferentes nas mais diversas
isso é um fenômeno puramente comer-
formas literárias, mas não significa ser
cial. As editoras perderam muito espaço
melhor ou pior”, argumenta.
para o mercado digital e os blogueiros,
MUITO MAIS QUE 5INCO MINUTOS Autora: Kefera Buchmann Editora: Paralela, 2015.
DOIS MUNDOS, UM HERÓI Autor: Rezendeevil Editora: Suma de Letras Brasil, 2015.
TÁ, E DAÍ? Autora: Ana de Cesaro Editora: Astral Cultural, 2015.
DEPOIS DOS QUINZE Autora: Bruna Vieira Editora: Gutenberg Autêntica, 2012.
youtubers e influenciadores são uma aposta segura de vendas. Ana de Cesaro é um exemplo entre muitos. Nomes de peso como Kéfera Buchman, Bruna Vieira, Mica Rocha e Isabela Freitas também resolveram
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endossar suas imagens e conteúdos com livros publicados. Entre os mais vendidos estão Muito Mais que 5 Minutos, de Kéfera, Dois Mundos, Um Herói, de Paulo Afonso Rezende e Authenticgames - Vivendo Uma Vida Autêntica, de Marco Túlio. Os assuntos mais comuns tratados pelos blogueiros e que, consequentemente, geram livros atrativos são games, moda e comportamento. São tópicos sedutores que envolvem principalmente o público jovem. PÚBLICO Que as gerações mais jovens recusam um livro em troca de uma tela de celular muitos já sabem. Com tantas inovações tecnológicas ao redor fica difícil atrair crianças e adolescentes com passatempos mais artesanais. Eles gostam
Isabela Frasinelli com livro da blogueira Bruna Vieira | FOTO REPRODUÇÃO
O objetivo é ter mais alguma coisa com a
da instantaneidade e se cansam rapida-
carinha do seu amado e a leitura fica em
mente de tudo o que é mais demorado e
segundo plano”, reflete.
complexo. O interesse por livros físicos
O estudante Enrico Ribeiro adquiriu o
sofreu uma queda significativa e, para
Senão, eu não saberia”, conta a estudan-
livro Dois Mundos, Um Herói, de Paulo
cativar novamente esse público espe-
te Isabela Frasinelli.
Afonso Rezende e, apesar de acompa-
cífico, as editoras lançam mão dos blogueiros.
Amanda Lisboa também é estudante e
nhar o seu canal, Rezendeevil, no You-
leu dois livros de Bruna Vieira. Para ela,
tube, não ficou satisfeito com a quali-
O público jovem é mais fácil de ser fis-
a linguagem acessível desse tipo de livro
dade da leitura. “Eu gosto bastante do
gado e a nova safra de escritores cumpre
pode fazer com que mais jovens adqui-
canal do Rezende e comprei o livro por
bem o papel de levar os jovens para den-
ram o hábito de leitura e tenham seus
esse motivo. Mas, infelizmente, eu não
tro das livrarias novamente. Os blogs dão
ídolos na cabeceira da cama.
achei o livro tão legal quanto eu imaginava”, lamenta.
oportunidade para que o público conhe-
Os blogueiros, porém, podem não ser
ça o escritor de seu livro antes mesmo
um ímã de leitores com 100% de eficácia.
A escritora Eunice Tomé pensa que a
de ele ser lançado. Primeiro, o leitor se
Há um efeito colateral vindo da atração
parceria pode injetar ânimo nas editoras
torna fã e depois ele efetua a compra do
compulsiva por esses livros - o objetivo
e acredita que o legado dos livros nunca
livro, facilitando o processo de envol-
da compra acaba não sendo a leitura em
passará. “Acho que há espaço para todos
vimento dos consumidores. “Antes de
si, mas adquirir um artigo de uma figu-
e os livros não irão morrer, como pensam
eu ler o livro A Menina que Colecionava
ra adorada. A blogueira Ana de Cesaro
alguns apocalípticos. Assim como há lei-
Borboletas, da blogueira Bruna Vieira,
reconhece esse efeito. “Muitos adoles-
tores para grandes romances e biogra-
eu já acompanhava o seu blog e o canal
centes que compram livros dos seus ído-
fias, há leitores para diferentes escrito-
no Youtube. Isso me fez conhecer o livro.
los, os compram como objeto de coleção.
res, inclusive para os blogueiros”, conclui.
FOTO JUNIOR DE OLIVEIRA/NIS
JUNHO 2016 // ANO 5 // NÚMERO 9
COLABORADORES DESTA EDIÇÃO 1
2
4
5 6
8 13
3
9
10
7
11
12
14
18 16
15
19
17 25
20
21
22
1 Eduardo Pascoal 2 Julia Leite Charles Campos 5 6 Rafael Simões 9 Fernanda Giachini 10 Silvio Júnior Alex Shim 13 14 Taísa Luna 17 Giovanna Lunardelli 18 Julia Gianesi 21 Rafaela Andrade 22 Gabriela Oliveira 25 Renata Carlini 26 Letícia Vilar
23
24
3 Izabela Monaco 7 Luiza Capella 11 Carolina Brandileone 15 Kelly Cilento 19 Bianca Kachani 23 Larissa Kazumi
26
4 Urssula Nobre 8 Paola Bonoldi 12 Bianca Alves 16 Mariana Yole 20 Felipe Capano 24 Beatriz Consolin