Plural #15

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JUNHO DE 2019 // ANO 8 // NÚMERO 15 REVISTA-LABORATÓRIO DOS ALUNOS DO CURSO DE JORNALISMO DA ESPM

QUANTO CUSTA O OUTFIT PLURAL FOI ÀS RUAS PARA SABER QUAL É O GASTO QUE AS PESSOAS TÊM PARA MONTAR O VISUAL LIXO REPÓRTERES EXPERIMENTAM DIFERENTES FORMAS DE LIDAR COM OS RESÍDUOS POR UMA SEMANA ENTREVISTA ESPECIALISTA EXPLICA A IMPORTÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO CONSUMO CONSCIENTE

Ego

CONSUMO OU CONSUMISMO

QUANDO O ATO DE COMPRAR SE TORNA NOCIVO?

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REVISTA-LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA ESPM-SP Nº15 - 1º SEMESTRE DE 2019

Presidente Dalton Pastore Jr. Vice-presidente Acadêmico Alexandre Gracioso Vice-presidente AdministrativoFinanceira Elisabeth Dau Corrêa Diretora Nacional de Operações Acadêmicas Flávia Flamínio Diretor de Graduação-SP Rodrigo Cintra Coordenadora do curso de Jornalismo-SP Maria Elisabete Antonioli Responsável pelo Centro Experimental de Jornalismo Antonio Rocha Filho

e

EDITORIAL

CONSUMO COMO ATO DE CIDADANIA O consumo tornou-se um elemento central à existência de qual-

Revista Plural revistaplural-sp@espm.br

quer sociedade moderna. Associar consumo com consumismo, ou

Editora - Revista Plural Profa. Cláudia Bredarioli

cer um olhar reducionista sobre esse potente fenômeno social. O con-

Editor - LabFor Prof. André Deak

que vivemos. Os que não têm condições de consumir estão excluídos

Editor - Fotojornalismo Prof. Erivam De Oliveira Revisão Prof. Antonio Rocha Filho Profa. Maria Elisabete Antonioli Produção e diagramação Amanda Krainer (estagiária) Alunos colaboradores (Revista Plural, LabFor, Fotojornalismo e Design Lab) Amanda Rozenblit; Aline Chalet; Ariel Serafim; Fabrício Julião; Fernanda Shikay; Gabriel Bittante; Gabriela Soares; Giovanna O. Almeida; Giovanna Tuneli; Giulia Pontes; Guilherme Santiago; In Hwan Oh; Isadora Moraes; Isabella Puccini; Isabelle Bulla; João Mello; Juca Trentin Borghi; Luca Carloni; Lucas Bastos; Luiza Consul; Luiza Müller; Maria Clara Jorge; Maria Victória Brizzi; Priscila Antunes; Renata Freire; Sophia Olegário; Yasmin Marcondes; Yasmin Mazzeo CEJor, Centro Experimental de Jornalismo da ESPM-SP agenciadejornalismo-sp@espm.br Rua Dr. Álvaro Alvim, 123, Vila Mariana São Paulo, SP Tel. (11) 5085-6713 Projeto gráfico e direção de arte Marcio Freitas A fonte Arauto, utilizada nesta publicação, foi gentilmente cedida pelo tipógrafo Fernando Caro.

seja, a um ato meio fútil, vazio e, de certa forma, nocivo, é estabelesumo é uma bússola que rege o nosso pertencimento à sociedade em dela. Consumo é identidade, é cidadania. Nele, o ato de comprar está diretamente relacionado à necessidade ou à sobrevivência. Já quando se trata de consumismo, essa relação está rompida, ou seja, a pessoa não precisa daquilo que está adquirindo para sobreviver. Esta 15ª. edição da Plural tenta esclarecer a diferença entre uma coisa e outra. Para isso, a revista está dividida em três etapas: a primeira explicita a contraposição entre consumo e consumismo; a segunda, expõe os “pecados capitais” do consumismo; e a terceira, apresenta algumas soluções de consumo consciente que têm sido adotadas com sucesso. Além disso, ainda temos uma entrevista com a especialista no tema Carmen Migueles, que começa na página 48. Isso tudo só foi possível graças às várias parcerias estabelecidas com o apoio de uma equipe de ponta do curso de Jornalismo – envolvendo os professores Maria Elisabete Antonioli, Antonio Rocha Filho, André Deak, Erivam de Oliveira e o ex-editor e criador da Plural, Renato Essenfelder. A equipe do Design Lab, do curso de Design, produziu a ilustração da capa, a linha do tempo da reportagem com início na página 6 e desenvolveu, com as oficinas LabFor e Fotojornalismo, o projeto Quanto custa o outfit (nas páginas 18 a 23). A agência Arenas, do curso de Comunicação Social, criou o anúncio que está na página à esquerda. Com esse trabalho coletivo, quisemos mostrar que pode haver formas de nos inserirmos no mundo do consumo sem que sejamos escravizados por ele. Na economia consumista, a regra é que primeiro os produtos apareçam (sendo inventados, descobertos por acaso ou planejados), para só depois encontrarem suas aplicações. O consumismo chega quando o coletivo mais que se sobrepõe, passa a ditar o que o indivíduo é. A conscientização dos cidadãos sobre isso é o principal caminho para que a sociedade consiga sair desse círculo vicioso. E o Jornalismo pode contribuir nesse processo. Confira o resultado nas próximas páginas. CLÁUDIA BREDARIOLI, EDITORA DA PLURAL

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Foto: Juca Trentin Borghi e Giulia Pontes

ÍNDICE

4/5

página 6

página 6

CONSUMO OU CONSUMISMO? Os seres humanos consomem desde que é possível encontrar registros de sua existência, para se alimentar ou se aquecer no frio. Mas, com o passar dos anos e o aprimoramento da tecnologia, isso mudou. Não consumimos mais o necessário para a sobrevivência. Atualmente, isso acontece em grande escala para termos produtos que satisfaçam nossos desejos. Isso é o consumismo, algo distante do consumo - necessário ao nosso cotidiano.

página 12 MARCAS O complexo processo de construção de marcas e de relacionamento com os consumidores passa pela compreensão das concepções do subconsciente dos potenciais compradores.

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página 14 TECNOLOGIA Ela facilita o cotidiano das pessoas e os meios de produção, mas também incentiva o consumo desenfreado, especialmente de produtos eletrônicos produzidos sob a ótica da obsolescência programada.

página 24 VAIDADE As cirurgias plásticas e procedimentos estéticos têm procura cada vez maior e consumo quase viciante, especialmente em razão da baixa autoestima dos pacientes que buscam profissionais especializados.

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Foto: Luca Carloni e João Paiva

página 44

Foto: Arquivo Pessoal

página 48

Foto: Divulgação

página 34

página 44

página 34

página 48

PERFIL

MOBILIDADE

ENTREVISTA

O estadunidense que ficou conhecido como Alex Supertramp viveu em um ônibus no Alasca para se afastar da sociedade numa tentativa de buscar a liberdade na natureza selvagem.

A maneira pela qual nos locomovemos diz muito sobre a relação que estabelecemos com as outras pessoas e os espaços públicos que ocupamos nas cidades em que vivemos.

Carmen Migueles, professora e pesquisadora de questões relacionadas ao consumo, explica a importância de compreendermos nossos atos no momento de decidir comprar ou não.

página 26 INVEJA As influenciadoras digitais podem apresentar um mundo de sonhos a seus seguidores, mas geralmente são pagas para divulgar esse conteúdo construído. Qual é o papel que elas exercem no marketing contemporâneo?

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página 28 AVAREZA Conhece alguém com estigma de pão-duro? Às vezes, essa percepção pode esconder ações que inibam o consumismo e preservem ações cooperativas. Mas podem maquiar transtornos de acúmulo desnescessário.

página 39 MODA Uma das áreas que mais têm se destadado com ações que busquem se aproximar da sustentabilidade é a indústria fashion, apostando em inovação e inteligência para ocupar as passarelas e as lojas.

página 42 MINIMALISMO Na contramão do consumismo e da produção desenfreada de bens materiais, surgiu a prática do minimalismo, uma economia comportamental que defende o clichê de que menos é mais, com suas razões.

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COMO O CIDADÃO CONTEMPORÂNEO MUDOU A FORMA DE

CONSUMIR

6/7

O consumismo virou uma alternativa para lidar com o caos e as incertezas do mundo FABRÍCIO JULIÃO FILHO, FERNANDA SHIKAY, GABRIEL BITTANTE (DESING LAB), GIOVANNA TUNELI e GUILHERME SANTIAGO

Primeira propaganda da Coca-Cola cria o mito do Papai Noel vermelho no Natal - ele não tinha essa cor antes, nem a data tinha tanta ênfase comercial. Os carros da marca Jeep eram os veículos mais comuns usados pelo exército americano durante a segunda guerra mundial. Depois foram feitas versões para cidadãos comuns.

As calças jeans tornamse populares entre os americanos por serem usadas por cowboys, militares e trabalhadores de fábricas. Viraram ícone cultural.

Os primeiros óculos Ray Ban foram produzidos para pilotos da Força Aérea norte-americana. As lentes verdes buscavam reduzir náuseas e dores de cabeça dos pilotos.

1930

1936

1940

Os irmãos Richard e Maurice McDonald abrem a hamburgueria McDonald. Mas é Ray Croc que aplica o modo de produção fabril na cozinha e no atendimento criando o fast food.

1941 1948 1945

1950

Produtos, marcas e propagandas que impulsionaram o consumismo no mundo Acontecimentos e invenções históricas que mudaram o contexto do consumo

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Fim da segunda guerra mundial; início da guerra fria.

Início dos “Anos Dourados” do fordismo, produção em massa de automóveis idealizada por Henry Ford, durou até 1968.

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»»»Consumo e consumismo. Pala-

consome, eles correm cada vez mais risco

al me parece equivocado. Por exemplo,

vras similares com significados com-

de escassez. De acordo com dados de

toda a comunicação sobre a alarmante

pletamente distintos. Os seres huma-

2018 da Organização das Nações Unidas

queda nos índices dos reservatórios de

nos consomem desde que é possível

(ONU), 23% das mortes prematuras no

água potável de São Paulo mirava o con-

encontrar registros de sua existência.

mundo são associadas a fatores ambien-

sumidor individual. O consumo indus-

Consumiam para se alimentar, com as

tais, além de doenças relacionadas dire-

trial jamais foi chamado às falas”, anali-

proteínas de outros animais, e para se

tamente à degradação ambiental como a

sa a especialista.

aquecer e sobreviver no frio. No entan-

zika, malária, ebola, entre outras.

Considerando a cultura como um fator

to, com o passar dos anos, a evolução

Gisela Castro, professora doutora do

determinante para a tomada de decisões

e o aprimoramento da tecnologia,

Programa de Pós-Graduação em Comu-

da população, Gisela destaca que uma

mudamos nosso jeito de consumir. Já

nicação e Práticas de Consumo da ESPM-

mudança na cultura de povos mais acos-

não consumimos o necessário para a

-SP, observa uma mobilização pública

tumados com o consumo frenético e o

nossa sobrevivência como antes, con-

maior em prol de algumas causas susten-

desperdício seria uma forma de reverter

sumimos em grande escala produtos

táveis, mas chama a atenção para o foco

a compulsão consumista. “Além disso, é

que satisfaçam nossos desejos. Isto é

no consumidor individual que, segun-

preciso levar em conta que redução do

consumismo.

do ela, não deveria ser o único alvo des-

consumo desenfreado e conscientização

Quanto maior o consumo, maior a

sas campanhas. “Temos visto campanhas

em relação ao desperdício dependem,

produção e, consequentemente, maior

públicas contra diversas formas de des-

também, de políticas públicas. Com tan-

a degradação do meio ambiente. Os

perdício, marcas defendendo a causa da

tos interesses conflitantes em jogo em

recursos naturais não são renováveis

sustentabilidade, crescente preocupação

nossas sociedades, o grande desafio é

e da forma exacerbada e inconsequen-

com o esgotamento dos recursos natu-

sermos capazes de criar uma cultura na

te que a humanidade consumiu e ainda

rais, mas o foco no consumidor individu-

qual o desperdício e a depreciação dos

Diners Club lança o primeiro cartão de crédito.

Surgimento da pílula anticoncepcional.

O empreendedor e jornalista Assis Chateaubriand trouxe ao Brasil equipamentos televisivos e fundou a TV Tupi, primeira emissora do País.

1950

1952

Lançamento da boneca Barbie, com sucesso instantâneo. As primeiras 351 mil bonecas foram vendidas por US$ 3 cada.

1953 1955

Invenção da fibra óptica pelo cientista Singh Kapany. É introduzida nos EUA a televisão em cores. Essa tecnologia demorou mais de uma década para chegar no Brasil devido aos altos preços.

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1959

Surgem as sandálias de borracha Havaianas, que fazem sucesso até hoje no Brasil e no mundo.

1960 1960

1962

Invenção do primeiro controle remoto de TV sem fio.

Há um novo contingente de jovens, chamados “baby boomers”. O mercado se volta para esse público e cria produtos específicos.

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recursos naturais sejam mal vistos e efe-

bido, o Código do Consumidor exige um

O diretor-executivo também afirma que

tivamente combatidos”.

controle bastante ostensivo no âmbito

as empresas estão cada vez mais preo-

da propaganda”, avalia o diretor-execu-

cupadas com o pós-venda e com as ques-

tivo do Procon.

tões do CDC, uma vez que elas sabem das

Um episódio que trouxe grande

8/9

mudança na relação da sociedade com o consumismo foi a criação do Código de

Além disso, Capez ainda afirma que

Defesa do Consumidor (CDC). Colocado

o excesso de propagandas e o incenti-

consequências e o grande aumento de

em vigor no ano de 1991, o CDC visa dar

vo à compra têm relação com a ordem

proteção aos direitos do consumidor a

econômica do nosso país, a qual segue

Consumo consciente

partir de um conjunto de normas, além

a livre iniciativa, ou seja, o Procon não

O Instituto Akatu, organização não

de também colocar em prática as respon-

tem uma oposição direta à publicida-

governamental sem fins lucrativos que

sabilidades dos fornecedores com seus

de, entretanto, defende que ela siga os

trabalha para a eficiência do consumo

consumidores finais.

limites da lei. Para ele, “o consumismo

consciente, destaca o papel das empresas

órgãos fiscalizadores no mercado.

Fernando Capez, diretor-executivo

nada mais é do que a tendência do cida-

nas práticas sustentáveis e suas posições

do Procon-SP, afirmou que o Código

dão de consumir algo supérfluo, algo de

em relação ao consumidor. “As empresas

de Defesa do Consumidor exige infor-

que não precisa como essencial. Ele visa

bem-sucedidas no início do século XX,

mações claras e adequadas sobre qual-

muito mais a uma satisfação mais psico-

que exploravam recursos em demasia,

quer produto e serviço colocado à dis-

lógica do que real”. Assim, o Procon entra

não serão as mesmas a serem bem-suce-

posição da sociedade. Isso envolve, por

em ação quando as propagandas ferem

didas atualmente, que devem encon-

exemplo, as ações da mídia na criação

algum ponto da lei, já que essa publici-

trar maneiras de atender à demanda da

da noção de cidadania para as pessoas.

dade pode reduzir a capacidade cogniti-

sociedade sem sobrecarregar os limi-

“No caso de cigarros, por exemplo, que

va do consumidor.

tes do planeta. Diante desse contexto, é

fazem mal à saúde, são produtos que,

Com a evolução do mercado, as empre-

necessária a adequação a novos padrões

embora a Constituição não tenha proi-

sas passaram a mudar sua mentalidade.

de produção e consumo”, declarou o

É introduzido no mercado o primeiro videocassete, o U-Matic, produzido pela Sony. IBM lança o primeiro chip de computador. A JVS, concorrente da Sony, lançou o VHS (Video Home System), que possuía um formato mais sofisticado e tinha um tempo de gravação de duas horas. Dois jovens amantes da tecnologia, Steve Jobs e Steve Wozniak fundam a Apple.

É inaugurado o Shopping Iguatemi em São Paulo, considerado o primeiro centro de compras do Brasil.

1964 1966 1969

1971

A internet é criada nos Estados Unidos no meio da Guerra Fria, e tinha como função interligar laboratórios de pesquisa. Neste ano foi enviado o primeiro e-mail da história.

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1972

Ocorre a primeira transmissão de televisão a cores no Brasil, pela TV Difusora, de Porto Alegre.

1976 1976

Deng Xiaoping assume o poder político na China e abre os mercados chineses ao mundo.

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Akatu à Plural, por meio de sua asses-

sumidores iniciantes, de 32% para 38% no

Como usar? Como descartar? No dia a

soria de imprensa.

mesmo período. Isso demonstra que este

dia, o guia de 6 Perguntas do Consumo

Em relação à iniciativa dos brasileiros

é o momento de recrutar essas pessoas

Consciente, desenvolvido pelo Akatu,

como forma de contribuir para a reali-

para o rol dos mais conscientes, o que é

auxilia o consumidor a fazer melhores

zação de um mundo mais sustentável, o

um grande desafio”.

escolhas de compra, incentivando-o a

Akatu revelou que os brasileiros são um

Mas, segundo outro estudo realiza-

refletir sobre alguns aspectos que envol-

dos povos mais preocupados com a sus-

do em 2018 pelo próprio Akatu, 24% dos

vem o ato da compra, mas que muitas

tentabilidade. “Foi observado também

brasileiros se preocupam com o que

vezes passam despercebidos.

que os brasileiros, independentemente de

estão consumindo e adotam um consu-

O consumo consciente propõe que se

sua idade, gênero, classe social ou região,

mo mais consciente e efetuado apenas

conheça toda produção por trás do pro-

preferem o caminho da sustentabilidade

quando existe a necessidade da compra.

duto, o modo produtivo, a geração de

ao do consumismo e o desejo pelo estilo

Este número torna-se pequeno, visto que

lixo, entre outros fatores. Dessa forma,

de vida mais saudável ocupa o primeiro

em 2012 a taxa de pessoas que se preocu-

torna-se um desafio para muitas empre-

lugar no ranking de preferências dos con-

pavam com o que estavam consumindo

sas que incentivam um consumo mais

sumidores”, completou o instituto.

era de 27%. Ainda assim, diversas empre-

consciente divulgar coleções, peças e

De acordo com pesquisa da organi-

sas surgem atualmente no mercado com

produtos e ao mesmo tempo incentivar

zação, houve um aumento na práti-

o propósito de atender às pessoas que

a desaceleração do consumo.

ca sustentável por pessoas iniciantes.

buscam produtos e serviços ecologica-

André Carvalhal, autor do best-seller

“A Pesquisa Akatu de 2018 observou

mente corretos, que visem a economia

A moda imita a vida: como construir uma

que o percentual da parcela mais cons-

de recursos e a utilização dos bens até o

marca de moda (2014) e diretor criativo

ciente da população se manteve estável

fim da sua vida útil.

da marca de tecidos reutilizados Ahlma,

entre 2012 e 2018. O que chama atenção,

Por que comprar? O que comprar?

reconhece que esse é um desafio muito

porém, é o aumento significativo de con-

Como comprar? De quem comprar?

grande para empresas de consumo cons-

É fundada a Blockbuster, a maior rede de locadoras de filmes e videogames do mundo por mais de 20 anos

O Walkman permitiu a qualquer um ouvir suas músicas preferidas no local que quisesse, em fitas cassetes. É criado o primeiro celular portátil. O aparelho era muito grande e pesava dois quilos. A bateria tinha duração de ape nas 20 minutos.

1979

A Apple lança o Macintosh, computador que revolucionou a indústria. A propaganda no intervalo do superbowl, com audiência gigante, tornou-se um marco da publicidade.

1983 1984 Os CDs chegam ao mercado e, no início dos anos 1980, já viram um sucesso. A indústria musical evoluiu e movimentou a economia mundial.

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A Microsoft lança o Windows 1.0.

1985

1989

A Microsoft compra o programa de apresentações PowerPoint e lança o Excel.

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ciente e que é importante que a orga-

que estuda a relação da infelicidade com

logia, a definição de consumismo é um

nização sempre se questione o que ela

o consumismo, percebe-se que, muitas

conjunto de processos socioculturais em

vai fazer além de vender produtos. Ele

vezes, a compulsão por comprar é resul-

que se realizam a apropriação e os usos

afirma que “o sucesso de uma empre-

tado da predominância de tristeza no

dos produtos de forma excessiva, ou seja,

sa depende do sucesso do planeta e do

indivíduo, não importando o motivo, que

consumir está imerso na cultura humana.

sucesso das pessoas, porque tudo que a

pode ser com ele mesmo, com o trabalho

A filosofia também possui estudos

gente faz depende do planeta e é feito

ou com suas relações pessoais. Ela com-

sobre o consumo e suas consequências

com pessoas e para pessoas.”

plementa que no cérebro existe uma área

na sociedade. O filósofo Jean Baudrillard

A designer de moda e acessórios sus-

responsável pelo sistema de recompensa

afirma que as pessoas consomem o que

tentáveis Van Loureiro acredita que o

que, quando acionada, proporciona uma

para elas tenha algum significado social,

lucro é essencial, mas que deve ser ape-

sensação de prazer imediato, porém as

algo que as identifiquem e delimitem

nas uma consequência de um trabalho

pessoas que possuem essa área mais vul-

suas relações com os outros.

consciente. Ela afirma que deve haver

nerável nunca estão satisfeitas.

Já o estudioso Pierre Bourdieu colo-

uma reformulação no sistema de con-

O consumismo se tornou um fenôme-

ca que consumir é um modo de diferen-

sumo atual e que “eliminar o consumis-

no que preocupa o ramo da psicologia,

ciar classes e grupos sociais, tornando-

mo e transformar o consumo simples em

por causa do seu grande impacto no com-

-se um instrumento de classificação e

consumo consciente é o caminho ideal

portamento humano. A oneomania, ou

hierarquização de sujeitos. O filósofo

para vivermos melhor”. Ela diz ainda que

compulsão por comprar, está presente

contemporâneo Zygmunt Bauman, por

o consumo é uma necessidade, “um ato

em 3% da população brasileira, na maio-

sua vez, criou o conceito de consumis-

necessário para o ser humano se manter”.

ria mulheres, segundo uma pesquisa do

mo líquido, que descreve esse processo

Instituto de Psiquiatria do Hospital das

como fruto do que a sociedade necessi-

Psicologia do consumidor

Clínicas em São Paulo realizada em 2013.

ta para se sentir bem, estando coberta

Segundo a psicóloga Rosana Munhoz,

De acordo com o ponto de vista da psico-

de objetos e marcas.

A série de TV Friends era exibida pela primeira vez. O seriado durou 10 temporadas e consolidou o mercado de séries.

Primeiro smartphone do mundo, o IBM Simon. O aparelho continha tela sensível ao toque e acessava e-mails. É criada a Netflix, empresa que, inicialmente, vendia dvds pelo correio. O primeiro Playstation é lançado. Com um design moderno e bons gráficos, conquistou milhões de fãs.

1988

1993 1994 1990

1997 Os anos 90 foram marcados pelo fim da URSS e a consolidação do capitalismo e do livre mercado no mundo. Foi nesse período que houve um crescimento da internet e a popularização da Microsoft.

A internet chega ao Brasil.

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De acordo com a Sociedade Brasilei-

com um vazio interior. Por mais que

Há quem acredite, no entanto, que o

ra de Inteligência Emocional (SBIE),

ainda existam casos em que os hábitos

aumento exacerbado do consumo seja

as principais causas da compulsão por

consumistas sejam de natureza patoló-

uma consequência natural do ser huma-

compras são o desequilíbrio emocional,

gica, a sociedade está desenvolvendo,

no. O professor de marketing da ESPM-

a diversão, a necessidade de ser aceito, a

cada vez mais, pessoas esse transtorno

-SP Giancarlo Ricciardi acredita que “o

baixa autoestima, a insegurança, o sta-

compulsivo.”

ser humano busca sempre mais, mais

tus, a indução do comércio e a neces-

bem-estar, mais comodidade, mais ali-

sidade de pertencer. Com isso, pode-

Fenômeno social

mento, mais fartura, mais riqueza e,

-se compreender que o emocional está

Outro fator que possui como objetivo

enquanto houver oferta para atender

conectado com o consumismo. “Se as

induzir a população ao consumismo é a

todo esse ‘mais’, ele sempre vai consu-

emoções estão em desequilíbrio em um

mídia. O ser humano nasce e cresce em

mir”. Ricciardi acredita que a superoferta

corpo, a mente tenta solucionar isso de

um mundo no qual os meios de comu-

existente no mundo faz com que o con-

alguma forma, e em alguns casos ela se

nicação são determinantes para a com-

sumo cresça, segundo ele “uma relação

desenvolve através do consumismo”, diz

preensão do entorno. Com isso, muitas

de causa e consequência”.

a psicóloga Rosana.

vezes as pessoas consomem acreditan-

“Na medida em que fabricantes ofe-

De acordo com ela, a sociedade tem

do que a felicidade pode ser encontrada

recem mais, a percepção de consumo e

impulsionado e tratado como nor-

quando se adquire determinado produ-

decisão de compra das pessoas tendem

mal esse transtorno consumista. Isso

to. “A mídia trata o consumismo como

a crescer. Quer seja por símbolo de sta-

pode ser percebido por meio de ques-

necessário. Isso incentiva as pessoas

tus, por achar realmente que precisam

tões como o fato de o lazer e o dinhei-

a entenderem que isso traz felicidade,

de mais ou por definitivamente precisa-

ro serem vistos como inseparáveis. “As

mas ela é maquiada e momentânea, não

rem de mais”, avalia o professor. “É um

metas das pessoas envolvem comprar

caracteriza uma realização pessoal plena

fenômeno social. Enquanto houver ofer-

coisas e, se não conseguem, se sentem

e sólida”, comenta a psicóloga Rosana.

ta, haverá consumo e vice-versa.”

O Uber, empresa de transporte por meio de aplicativos celulares, chega à cidade do Rio de Janeiro.

A Apple lança seu primeiro smartphone, o Iphone.

É transmitido no Brasil o primeiro BBB (Big Brother Brasil), dando início à tendência do mercado de reality shows no País.

A Nintendo muda a indústria dos videogames após lançar o Wii, com sensores de movimento e controles sem fio.

2002

2005

2006

O mercado do Youtube cresce com o surgimento de pessoas que fazem vídeos de entretenimento com produção simples. No Brasil, Felipe Neto, Kéfera e PC Siqueira são alguns dos primeiros youtubers de sucesso.

2007

2008

A Netflix lança sua primeira série original de sucesso, House of Cards. Começa o boom das produções originais, após o crescimento do consumo de streaming.

2010 2013

2014

Os índices de cirurgias estéticas crescem consideravelmente no mundo. Só nos EUA houve um aumento de 45% de cirurgias de silicone em relação ao início dos anos 2000. É criado o YouTube, plataforma de armazenamento e compartilhamento de vídeos.

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UNIVERSO EM DIÁLOGO COM O SUBCONSCIENTE Especialistas explicam quais questões estão relacionadas aos processos de construção de marcas

de necessidade de ter o modelo mais

estejam claros, lembra ou associa neces-

ISADORA MORAES

novo do celular mais desejado? A nova

sidades existentes”, diz Paulo Rober-

»»»Você sabe o que está por trás de

coleção de maquiagem da blogueira

to Cunha, professor doutor, coordena-

uma marca? O universo da constru-

X e Y? O último game lançado? Então,

dor do curso de Comunicação Social da

ção de marca abrange diversos termos,

esse é o sentimento dominante na

ESPM. A forma de desenvolver marcas

pesquisas e tendências que são fato-

nova geração de consumidores para

e expor produtos foram se modifican-

res determinantes para entender o que

os quais diversas estratégias de cons-

do também, continuamente. Segundo

está por trás desse mundo, e como ele

trução de marca e de relacionamento

ele, hoje em dia, o ambiente digital é um

se relaciona com o consumo e o consu-

têm sido desenvolvidas.

dos fatores que modificam e aceleram a

mismo. De início é importante compre-

A publicidade tem um espaço muito

forma de fazer publicidade, levando-nos

endermos o sistema de consumo em

relevante dentro desse sistema. “Ela

a ter novos espaços de trabalho, novas

que vivemos. Sabe aquele sentimento

estimula desejos, sentimentos que não

relações e ampliação da área audiovisual.

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A CONSTRUÇÃO DE UMA MARCA UNE DIVERSAS VARIÁVEIS QUE COMPÕEM UM SISTEMA REPLETO DE INDUÇÕES, EMOÇÕES E ESTUDOS SOBRE OS DESEJOS DO CONSUMIDOR Foto: Eti Ammos/iStock

Diante dessa nova publicidade, a cons-

uma relação de reciprocidade entre

trução de pontes entre marcas e pessoas

empresa e consumidor, na qual a confian-

passou a ser mais efetiva, com mais rapi-

ça esteja no topo desse relacionamento.

dez nos resultados e facilidade de cole-

Você sabe como criar essa ponte? Primei-

ta de dados para compreender o públi-

ramente, há um toque de experimenta-

co-alvo de uma marca X. A partir disso, o

ção, afinal ninguém arrisca gastar seu

caminho para a elaboração dessa ponte

“dinheiro suado” com um produto des-

é começar a entender, de fato, em o que o

conhecido. Em segundo lugar, é impres-

consumidor em destaque acredita. “Bus-

cindível oferecer uma garantia, caso haja

camos entender em quem ele se inspi-

algum arrependimento de compra. E por

ra, quais pessoas que ele admira, e quais

último e não menos importante, é preci-

qualidades, emoções, sensações e senti-

so oferecer várias formas de pagamento.

mentos ele deseja transmitir através da

Outra pesquisa recente que estampa o

marca”, diz o publicitário Bruno Brigat-

poder do neuromarketing é a de cientis-

ti, da empresa Meme Digital.

tas das Universidades de Warwick (Ingla-

As empresas querem, cada vez mais,

terra) e Montreal (Canadá), que realiza-

relacionar suas marcas a sentimentos e

ram um levantamento com 2 mil pessoas

desejos que estão no subconsciente do

e concluíram que quando somos expos-

consumidor. Quando a companhia busca

tos a grandes marcas como Apple, Ferra-

entender o que se passa com o seu públi-

ri e Coca-Cola sentimos as mesmas emo-

co e como são feitas as escolhas de mer-

ções geradas por símbolos religiosos.

cado, podemos dizer que o neuromarke-

Conceitos que norteiam a construção de uma marca

“Ela estimula desejos, sentimentos que não estejam claros, lembra ou associa necessidades existentes” Paulo Roberto Cunha, professor doutor, coordenador do curso de Comunicação Social da ESPM, sobre a publicidade

12-13 - construcao_marca.indd 13

“É como se ela estivesse ressaltan-

ting foi acionado. Esse termo refere-se a

do sua identidade dentro dos grupos

uma mistura de neurociência e marke-

sociais que você participa”, diz a soció-

ting que tem a intenção de traçar estra-

loga Gabriela Bandeira. Ela acredita que

tégias para conquistar a fidelidade do

os grupos sociais nos quais determina-

cliente. A Associação Americana para o

das pessoas estão inseridas criam neces-

Avanço da Ciência (AAAS) realizou um

sidades e ideais de consumo diferentes.

estudo, em 2017, que mostra que o ato

“Os adolescentes geralmente são os mais

de escolher pode ser segmentado em três

influenciados, devido às subculturas, tri-

partes: seu cérebro decide o que você vai

bos urbanas, e o desejo que eles têm por

fazer; a decisão aparece na sua consciên-

objetos de consumo que se identifiquem

cia, o que transmite a sensação de que

com eles”, ainda ressalta.

você está tomando a decisão de forma

Independentemente da idade, as pes-

racional; você age de acordo com a deci-

soas sempre tiveram uma grande neces-

são tomada. Você sabe aquela famosa

sidade de se autoafirmar a todo momen-

expressão de “piloto automático”? Então,

to, ainda mais quando estamos falando

essa pesquisa aponta que vivemos nele

de um universo bombardeado por ins-

na maior parte do tempo. Uma vez que

tagramers que passam a expor sua vida

as empresas dominam essa ferramen-

“sem filtro” sempre que podem. Vanes-

ta, fica mais fácil induzir o cliente para

sa da Cunha, psicóloga, explica que as

o “lado” desejado.

marcas são um caminho que as pessoas

Segundo um artigo sobre no tema

encontram para construir uma imagem

publicado no site Viver de Blog, escri-

desejada de forma mais fácil. “Não preci-

to por Hernique Carvalho, os conteú-

sa de muito empenho, basta abrir o Insta-

dos visuais têm maior poder de conven-

gram, ver uma marca usada por uma blo-

cimento. Além disso, é necessário criar

gueira e copiar”, afirma.

31/05/19 19:38


14/15

TECNOLOGIA E CONSUMISMO: ALIADOS? Ao mesmo tempo que facilita o cotidiano dos cidadãos e a evolução dos modos de produção, o desenvolvimento tecnológico incentiva o consumo desenfreado, especialmente de aparelhos eletrônicos produzidos sob obsolescência programada

ção Internacional de Resíduos Sólidos

Defesa do Consumidor – Proteste, pro-

FERNANDA SHIKAY

(ISWA), em 2021, o lixo eletrônico global

blemas de funcionamento após o tér-

»»»Já teve a impressão de que seus

deve atingir 50 milhões de toneladas. Um

mino da garantia podem ser classifica-

produtos não são feitos para durar?

número assustador, decorrente de ele-

dos como vício oculto. Trata-se de algum

Independentemente de marca ou

trônicos de última geração, como smar-

defeito que aparece no produto ou no

preço, muitos itens tornam-se obsole-

tphones e tablets, passando por eletro-

serviço que o torna inadequado ao uso.

tos pelo avanço tecnológico, pela subs-

domésticos e lâmpadas.

Ele pode ser constatado por meio de ava-

tituição de sistema operacional ou por

A obsolescência programada ocor-

liação de uma assistência técnica auto-

alguma mudança nos padrões de uso,

re quando um produto vem de fábrica

rizada ou de fatores óbvios, percebidos

como a variação do tipo de tomada, por

com a predisposição a se tornar obsole-

pelo próprio consumidor, como um celu-

exemplo. Mas há ainda uma questão

to ou parar de funcionar após um perí-

lar que para de funcionar quatro meses

intencional nesse processo por meio

odo específico de uso. Dessa forma, as

após a compra, em razão da bateria.

do qual a indústria prevê um deter-

empresas lançam produtos no mercado

O Brasil tem hoje, em média, mais de

minado prazo de validade de seus

para que sejam rapidamente descarta-

um aparelho celular para cada habitante,

produtos para incentivar o consumo

dos e substituídos por outros. Isso não

cerca de metade com acesso frequente às

e, além disso, gerar mais resíduos ao

acontece só com celulares, mas também

redes sociais, segundo informações do

meio ambiente, especialmente de ele-

com TVs, computadores, eletrodomésti-

Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-

trônicos.

cos e até mesmo com as lâmpadas. Com

tística (IBGE). A bateria é uma das maio-

De acordo com o Global E-waste Moni-

os celulares a forma mais fácil de imple-

res responsáveis pelo tempo de vida do

tor 2017, relatório elaborado pela Uni-

mentar a obsolescência programada é

aparelho, segundo o Instituto de Defe-

versidade das Nações Unidas (UNU),

pela atualização de aplicativos e do sis-

sa do Consumidor (IDC). Como a bateria

em parceria com a União Internacional

tema operacional.

tem um ciclo de mil recargas, e os apare-

das Telecomunicações (UIT) e a Associa-

14-17 - tecnologia_fomo.indd 14

Segundo a Associação Brasileira de

lhos são recarregados três vezes por dia

31/05/19 19:39


Foto: Juca Trentin Borghi e Giulia Pontes

O QUE É OBSOLESCÊNCIA PROGRAMADA

Operadoras utilizam estratégias para atrair os clientes

em média, os celulares teriam cerca de

áudio, vídeo e outros inúmers recursos

dois anos de vida.

que conquistam o público. Justamente

No ano de 2018 a eBay, uma das maio-

por esses fatores, as pessoas que querem

res empresas de comércio eletrôni-

estar por dentro das novidades – estimu-

co, realizou uma pesquisa que revelou

ladas para atenderem os apelos do con-

quais foram os produtos mais buscados

sumo – sempre procuram formas de tro-

naquele ano no Brasil. O resultado apon-

car seus aparelhos. Como resposta para

tou que, dentre os produtos mais busca-

suprir esse desejo, grandes operadoras

dos em 2018, o primeiro lugar ficou com

de celular vendem serviços para atender

o iPhone X, último lançamento da Apple

a esse público.

que estava sendo vendido pelo preço

Estratégias adotadas pelas telefôni-

aproximado de R$ 7.000,00. O segundo

cas como Vivo Renova, Claro Troca, Tim

lugar ficou ocupado por mais um apa-

Troca Smart e Oi Troca Fácil são os exem-

relho da multinacional americana, o

plos nítidos dessa grande procura por

iPhone 7, sendo seguido pelos produtos:

smartphones de última geração. Esses

PlayStation 4, Drone, Bonecos Funko Pop

serviços possuem a mesma mecânica de

e relógios. A Samsung foi a fabricante de

funcionamento: o cliente tem que levar

celulares que ficou com o segundo lugar,

o aparelho usado de qualquer operado-

ganhando da Motorola, Xiaomi e Google.

ra em uma das lojas participantes. Após

O constante avanço da tecnologia

isso, o preço do celular será avaliado de

permite que todos os anos apareçam

acordo com o modelo e o estado de con-

novos modelos de telefones para ofe-

servação. E por fim, o valor do aparelho

recer melhor qualidade de uso, câmera,

antigo é descontado na hora da compra

14-17 - tecnologia_fomo.indd 15

»»» Obsolescência programada é a decisão do produtor de propositadamente desenvolver, fabricar, distribuir e vender um produto para consumo de forma que se torne obsoleto ou não-funcional para forçar o consumidor a comprar a nova geração do produto. A obsolescência programada foi criada, na década de 1920, pelo então presidente da General Motors, Alfred P. Sloan. Ele procurou atrair os consumidores a trocar de carro frequentemente, tendo como apelo a mudança anual de modelos e acessórios. »»» Essa prática faz parte de uma estratégia de mercado que visa garantir um consumo constante por meio da insatisfação, de forma que os produtos que atendem as necessidades daqueles que os compram parem de funcionar ou tornem-se obsoletos em um curto espaço de tempo, tendo que ser substituídos de tempos em tempos por outros mais modernos. »»» Empresas desenvolvedoras de hardwares e softwares adotam essa estratégia de negócio em seus produtos e sistemas operacionais, integrando assim as suas pesquisas e a sua agenda de lançamentos a um esforço de flexibilização e aumento capacidade de absorção do mercado consumidor.

31/05/19 19:39


DENTRE TANTAS NOVIDADES E CONSUMO, ALGUMAS PESSOAS PODEM SER CONSIDERADAS FORA DA CURVA POR NÃO SEGUIREM ESSAS TENDÊNCIAS

16/17

Foto: Gabriela Soares

do novo celular. Entretanto, essas faci-

vezes escolhem esse tipo de mercadoria

lidades não são percebidas como muito

para poder presentear seus conhecidos

positivas por algumas pessoas. Gabriel

e familiares, e no período pós-Carnaval,

Lucas dos Santos, dono de uma loja da

pois durante o feriado a grande quanti-

iPlanet – que é revendedora e assistên-

dade de roubos é significativa, e os con-

cia técnica de produtos Apple –, também

sumidores necessitam de um substituto

possui um esquema de troca dos smar-

para o produto perdido ou furtado.

tphones, mas pondera: “Todas essas lojas muito grandes pagam um valor no

Opostos na era da tecnologia

seu aparelho que não é justo”.

Dentre tantos lançamentos, pesquisas, novidades e mais consumo, algumas

Encantados pelo novo

pessoas podem ser consideradas fora da

Independentemente do caminho esco-

curva por não seguirem essas tendências

lhido para estar sempre atualizado com

e nem verem necessidade de possuir um

as tecnologias, há aqueles consumido-

aparelho de última geração. Famosos estão voltando com a ideia

res que buscam pelas novidades, como é o caso do estudante de administração Vinícius Rebouças, que troca seu aparelho todos os anos e repassa o antigo

de carregar telefones que um dia foram

Gabriel Lucas dos Santos: incentivo à troca constante dos aparelhos celulares

populares, como é o caso do Motorola Flip, que virou o queridinho de muitas

para o seu irmão Para ele, as novidades

pessoas. Artistas como Scarlett Johans-

do mercado proporcionam experiên-

son e Rihanna aderiram aos antigos

cias e inovações que são dignas de fil-

modelos de celular, ou seja, só usam esse

mes e ideias fabulosas. “O que mais me

tipo de aparelho para efetuar ligações ou

encanta nos novos aparelhos são a câme-

no máximo mandar mensagens de texto,

ra, processador, tamanho de tela, já que

já que na maioria deles não possui recur-

gosto de celular grande, memória, dura-

sos de acesso à internet.

ção de bateria, que é o mais importan-

Mas não são só as celebridades que

te para mim, já que eu fico grande parte

adotam esse comportamento. O músi-

do meu dia fora de casa”, diz Vinícius. O

co Henrique Pinto Júnior não possui um

estudante ainda contou que muitos dos

celular com acesso às redes e veio a ter o

novos aparelhos vêm com a compatibi-

livres. Hoje você conversa com assisten-

seu primeiro computador com 50 anos,

lidade com computadores, ou seja, os

tes de voz que podem fazer muita coisa

dois anos atrás. Antes disso, ele não via

equipamentos encontram-se conectados

para você. E isso vai evoluir. ”

necessidade de carregar um telefone,

entre si para uma melhor funcionalida-

O estudante Epiphanio diz que sua

uma vez que sempre viveu no seu mundo

de e praticidade para os consumidores.

principal motivação para ir atrás de um

da música e a única ferramenta que pre-

Para Vitor Epiphanio – estudante de

dispositivo novo é o quesito inovação

cisava para se comunicar com as pesso-

tecnologia que foi o primeiro comprador

tecnológica. “Atualmente sabemos sobre

as era a ligação por áudio.

do mundo do iPhone 6s plus, na Austrá-

os aparelhos que serão lançados muito

Porém, com o passar do tempo, o músi-

lia –, todo esse encantamento se dá pela

tempo antes, devido à grande gama de

co se viu intrigado e curioso para entrar

inovação tecnológica que as grandes

marketing que cerca essas empresas,

nesse mundo. E o notebook que ganhou

empresas estão trazendo. O empresário

proporcionando apresentações majes-

acabou se tornando um instrumen-

Gabriel dos Santos confirma: “A tecnolo-

tosas de suas novidades.”

to de trabalho. “Ainda não sinto aquela

gia avança, e a gente tem que se adaptar

Além das datas de lançamentos dos

necessidade de entrar, de fato, no mundo

a ela. Então, é bom poder não ficar para

novos modelos, o dono da iPlanet,

das redes sociais e da tecnologia, mas

trás. ” Além disso, Gabriel comenta sobre

Gabriel Lucas, revela que a época em que

temos que saber a hora de reconhecer

o projeto do futuro da empresa da maçã.

as vendas de celulares mais aumentam

o mundo que estamos vivendo para não

“A Apple quer que você tenha as mãos

são no Natal, já que as pessoas muitas

ficar numa bolha fora dele”.

14-17 - tecnologia_fomo.indd 16

31/05/19 19:39


Foto: JESHOOTS-com/ Pixabay

O brasileiro verifica aproximadamente 1.500 vezes o celular por semana

alta exposição à tecnologia e às mídias sociais tem grande papel no desenvolvimento a doença. Segundo a filósofa Marilise Dadalto, a aceleração do mundo e a cobrança por criarmos a nossa própria identidade, sermos legais, bem sucedidos e estarmos sempre felizes, junto com outras tantas outras cobranças sociais acabam provocando muita ansiedade nas pessoas. “A ansiedade é um grande início

A VIDA POR UM CLIQUE

de doenças mais sérias, atualmente, a

A dependência do celular pode gerar a síndrome do medo de perder alguma novidade, que afeta a saúde das pessoas

75% dos indivíduos adultos já passaram

modernidade ao mesmo tempo em que nos trouxe a tecnologia e infinitas coisas boas, ela também nos trouxe este mundo acelerado.” De acordo com estudos divulgados em 2016 pelo departamento de Psicologia da Universidade de Essex, no Reino Unido, pelo sentimento da FoMO. Em entrevista para a Universa, Leda Spessoto, psiquiatra e psicanalista, membro da Socieda-

um editorial da The Harbus. YASMIN MARCONDES

de Brasileira de Psicanálise de São Paulo,

A psicóloga Jeane Dianoski aponta o

comenta que o maior problema está em

»»»Consumir informação nas redes

perigo da doença. “FoMO é um compor-

deixar de viver a sua própria vida, para

sociais, atualizar o Instagram diversas

tamento disfuncional, uma patologia a

virar um espectador de uma realidade

vezes durante o dia e checar o Twit-

ser tratada, já que tudo que sai do equi-

que não é a sua.

ter para saber as novidades sobre os

líbrio natural e altera a qualidade de vida

A FoMO é uma síndrome que refor-

famosos mais badalados do momen-

pode ser considerado danoso”, afirma a

ça a sensação incalculável da perda em

to podem ser sinais de FoMO (fear of

especialista.

cada ser humano, seja de oportunida-

missing out), síndrome que represen-

A agência de marketing Tecmark, em

des, momentos, sensações ou objetos.

ta o medo de perder alguma novidade

pesquisa divulgada em 2018, concluiu

“O medo da perda está em nós desde

ou ficar de fora de alguma coisa.

que o usuário médio brasileiro verifica

que o mundo é mundo. É importan-

O nome FoMO foi usado e apontado

o celular aproximadamente 1.500 vezes

te que saibamos lidar com ele sem que

como uma síndrome pela primeira vez

por semana. Sendo assim, uma pessoa

nos machuquemos. Aí está o equilíbrio,

em 2004 por Patrick J. McGinnis, autor

costuma gastar 3 horas e 16 minutos por

em tempos de internet ou não”, comen-

estadunidense, que cunhou o termo em

dia olhando para a tela de seu celular. A

ta a especialista.

14-17 - tecnologia_fomo.indd 17

31/05/19 19:39


18/19 os pecados capitais do consumismo  |  vaidade

QUANTO CUSTA O OUTFIT Fomos às ruas Oscar Freire e José Paulino para ver quanto as pessoas gastam na composição do seu visual

»  Conhecida por “Rua dos Imigrantes”, a José Paulino é um dos maiores centros comerciais de São Paulo. Repleta de vendedores estrangeiros, é considerada um paraíso para aqueles que buscam roupas com preços acessíveis. »  Aproximadamente a 6 quilômetros fica o metro quadrado mais caro da América Latina, na Avenida Paulista, e perto dali a Oscar Freire, desde 1970

LABFOR, FOTOJORNALISMO E DESIGN LAB

18-23 - vaidade_outfit.indd 18

palco de grandes eventos de moda.

31/05/19 19:21


»  Com lojas de grife, restauran-

Rede Globo, foi uma das pessoas que

»  Inspirados pelos vídeos que se tor-

tes e bistrôs, é uma das mais caras

nossa equipe cruzou na Oscar Freire.

naram virais Quanto Custa o Outfit, fizemos as mesmas perguntas para os

ruas da cidade de São Paulo. Qual seria a diferença entre o estilo e o

»  Na José Paulino, em geral, as pes-

pedestres: qual o preço de cada uma

preço das roupas de quem frequen-

soas pareciam mais tímidas e apres-

das peças que compõem seu visu-

ta uma e outra dessas regiões?

sadas. A maioria estava em horário

al? Alguns ficaram com vergonha

de trabalho e alguns utilizavam uni-

de contar, outros tiveram orgulho.

»  Na Oscar Freire, ao caminhar pelas

forme. Mesmo assim, mantiveram o

calçadas, as vitrines despertam a

estilo e capricharam na pose para as

» O resultado dessa experiência,

atenção do consumidor com maior

fotos. Durante a apuração, dividi-

que expôs a diferença de gastos de

poder aquisitivo. Pessoas com um

mos o espaço das calçadas com ven-

um bairro para outro, está nas pró-

visual chique e único chamam aten-

dedores ambulantes e camelôs.

ximas páginas. À esquerda, estão

ção. A atriz Giovanna Lancellotti, da

os consumidores da Oscar Freire e, à direita, da José Paulino.

18-23 - vaidade_outfit.indd 19

31/05/19 19:21


R$

os pecados capitais do consumismo  |  vaidade

20/21

60

18-23 - vaidade_outfit.indd 20

0

Giovanna Lancellotti 0

R$15

00

2.0 1 $ R

R$4.000

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Arthur Ramos

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22/23 os pecados capitais do consumismo  |  vaidade

Maria Luisa Lepesqueur

18-23 - vaidade_outfit.indd 22

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Samuel Vaz

R$40

0 3 $ R

18-23 - vaidade_outfit.indd 23

31/05/19 19:21


Foto: Jennifer Burk/iStock

MARIA VICTÓRIABRIZZI FONTANA

PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS Até que ponto eles são essenciais para a autoestima?

»»»Quantas pessoas você conhece que já realizaram algum procedimento estético ou cirurgia plástica? Nos dias de hoje isso tem se tornado cada

24/25

vez mais comum. Mulheres, homens e até jovens antes de completarem a maioridade estão em busca de melhorar algo no rosto ou no corpo. Geralmente as mulheres são maioria quando o assunto é a insatisfação. Aumentar os seios, glúteos, lábios, diminuir barriga, nariz, eliminar rugas, marcas de expressão, celulite... São inúmeros os procedimentos aos quais o ser humano pode se submeter para adqui-

os pecados capitais do consumismo  |  vaidade

rir o “corpo perfeito” ao seu ver, ou pelo menos chegar perto dele. O médico Edélcio Shimabucoro, cirurgião plástico da cidade de Assis, contou à Plural que a procura pelas cirurgias plásticas tem sido muito frequente e que cerca de 90% das pessoas que vão até seu consultório são mulheres. “Os procedimentos mais realizados são abdominoplastia (pós-cirurgia bariátrica e grande emagrecimento), seguida de lipoaspiração e orelhas de abano”, explica ele. Com a padronização que a mídia faz com o corpo feminino, tendendo a mos-

Os padrões de medida impostos pela sociedade podem acarretar vícios em procedimentos estéticos

trar que ter seios grandes e ser magra é sinônimo de beleza, muitas mulheres ficam insatisfeitas com o que veem

perna e uma para empinar o bumbum”.

os procedimentos, sendo que em 2014 o

no espelho e procuram um profissio-

A Sociedade Brasileira de Cirur-

nal para mudar o que achar necessário.

gia Plástica (SBCP) realizou um levan-

A biomédica esteta Andressa Locat-

Foi o caso de Yvone Lima, de 63 anos de

tamento e constatou que houve um

ti explica que hoje em dia todos que-

idade. Ela já realizou cinco cirurgias

aumento, desde 2014 de 23% em inter-

rem envelhecer com qualidade e ter

desde 2007 e conta que, na sua opinião,

venções para fins reconstrutores e 8%

mais saúde. Segundo ela, homens tam-

o que a mídia mostra ser bonito pode,

naquelas que foram para fins pura-

bém almejam a melhoria na estética e

sim, influenciar na autoestima das pes-

mente estéticos. No destaque feito pelo

buscam com mais frequência procedi-

soas. “Comecei com a prótese de silico-

censo de 2016 da SBCP, o crescimento da

mentos faciais para linhas de expres-

ne nos seios e conforme a recuperação

busca por procedimentos menos inva-

são, emagrecimento e gordura locali-

passou, fui percebendo que sempre

sivos também aconteceu, como botox,

zada abdominal.

tinha uma coisinha ou outra que eu que-

e correção em linhas de expressão. Os

A autoestima baixa é um dos prin-

ria mudar. Aí fiz além da mamoplastia,

números cresceram 390% em apenas

cipais fatores que Andressa perce-

lipoaspiração, flancoplastia, lifting de

dois anos, representando 47,5% de todos

be quando pacientes entram em seu

24-25 - vaidade_cirurgia.indd 24

percentual não passava dos 17%.

31/05/19 19:23


AUTOESTIMA BAIXA É UM DOS PRINCIPAIS FATORES QUE MOTIVAM AS PESSOAS A PROCURAREM AJUDA PROFISSIONAL Foto: Jennifer Burk/iStock

individuais ou biológicos, causando riscos e vícios. “A pessoa viciada em cirurgia plástica possui uma visão deturpada de sua própria imagem e passa horas sofrendo e se preocupando com a aparência, o que faz com que muitas vezes nenhum procedimento alivie essa eterna insatisfação, causando o chamado ‘transtorno dismórfico corporal, uma doença mental que envolve um foco obsessivo em um determinado defeito que a pessoa considera ter na própria aparência”, explica a psicóloga. Além disso, é preciso considerar que uma cirurgia plástica pode ser perigo-

Andressa Locatti, biomédica, em seu consultório na cidade de Assis, interior de SP

sa porque podem surgir algumas complicações como infecção, trombose ou rompimento dos pontos. Há maior chances de complicações quando o procedi-

consultório. “A melhora da autoestima

ter uma certa cumplicidade, para não

mento dura mais de duas horas, em caso

muda a vida de muitos deles. Alguns

haver excessos, ainda mais no rosto”,

de anestesia geral ou quando se faz uma

chegam com sua autoimagem totalmen-

explica o decorador, que após ter pas-

cirurgia grande, como abdominoplastia

te distorcida, fragilizados, e os proce-

sado por alguns esteticistas e biomé-

seguida de prótese de mama e enxerto

dimentos estéticos melhoram muito

dicos, está há três anos com o mesmo

de glúteos, por exemplo. Alguns pro-

o amor próprio e qualidade de vida de

profissional. Apesar de estar satisfeito

blemas podem aparecer certo tempo

todos. ” Em contrapartida, muitas pes-

com todas as pequenas e sutis mudan-

depois de feito o procedimento são cica-

soas exageram nos procedimentos,

ças em seu rosto, Fernandes ainda quer

trizes de má qualidade, como as quelói-

atingindo o que podemos considerar

fazer um procedimento para diminuir

des e as hipertróficas (com aspecto feio,

“estranho” em vez de “bonito”.

as bochechas, afinal, segundo ele, a

alargado, espesso e, às vezes, doloroso).

Embora algumas pessoas os usem

autoconfiança com seu próprio corpo

A melhor forma de diminuir os riscos

sem moderação, há aqueles que pre-

melhorou muito após ter dado o primei-

de complicações devido a uma cirurgia

zam pela naturalidade e cuidados na

ro passo para cuidar de sua pele e apa-

plástica é realizar o procedimento numa

hora de realizar tais procedimentos

rência.

clínica ou hospital, com um cirurgião

estéticos, e alguns homens também se

plástico membro da Sociedade Brasilei-

renderam a preenchimentos labiais,

Fique atento

ra de Cirurgia Plástica (SBCP) e seguir

remoção de linhas de expressão, entre

A psicóloga Vanessa da Cunha expli-

todas as suas recomendações no pré

outros. É o caso de Hemerson Fernan-

ca que muitas pessoas têm insatisfa-

e no pós-operatório. Operar com um

des, decorador de festas. Ele conta que

ção com a imagem corporal e que esse

cirurgião plástico é o passo mais impor-

sempre gostou muito de se cuidar e que

é o fator mais motivador na procura da

tante para uma cirurgia bem feita. São

acha importante a harmonização facial.

cirurgia plástica, afinal, a imagem cor-

inúmeros os cuidados que esse profis-

“Meu primeiro procedimento escolhi-

poral é considerada uma das construto-

sional estuda e observa ao conduzir

do foi o botox facial. Fiz porque queria

ras da autoestima. Entretanto, é neces-

qualquer procedimento, analisando os

diminuir algumas marcas que me inco-

sário cuidado, uma vez que há pessoas

potenciais riscos durante e depois da

modavam. ”

que buscam as intervenções cirúrgi-

operação, com todos os exames neces-

O profissional escolhido para apli-

cas a partir do momento em que são

sários e, principalmente, considerando

cação de botox ou qualquer método é

influenciadas por uma variedade de

os prós e contras da cirurgia.

muito importante também. “Temos que

fatores, sejam eles culturais, sociais,

24-25 - vaidade_cirurgia.indd 25

31/05/19 19:23


os pecados capitais do consumismo  |  inveja

26/27

Foto: Christian Wiediger/iStock

As digital influencers recebem para testar e divulgar produtos, lugares de interesse e eventos

INFLUENCIADORA DIGITAL: Qual é o seu papel no marketing contemporâneo?

AMANDA ROZENBLIT

as influenciadoras digitais. E como

que, se usarem ou fizerem as coisas que

isso afeta os consumidores?

ela promove, também serão como ela”,

»»»Quando lançado, em 2010, nin-

Fenômeno entre os millenials, as

conta o publicitário Arthur Verechi. O

guém imaginou o quanto o Instagram

influencers, como ficaram conhecidas,

retorno das propagandas no Instagram

seria importante dentro dos proces-

são figuras públicas responsáveis pela

foi tão positivo que basicamente todos

sos de consumo nos dias de hoje. A

criação de conteúdo no mundo virtual.

os planos de marketing atuais envolvem

rede social, que é uma das maiores

Conhecidas por serem dinâmicas, esti-

estratégias e investimentos dentro da

do mundo, se tornou não somente

losas e atraentes, elas dominam o Ins-

plataforma.

um espaço para compartilhar fotos

tagram e têm uma quantidade enorme

A influencer Bruna Furlan (@bru-

e vídeos, mas também uma platafor-

de seguidores. Com toda essa influên-

nafurrlan), que conta com mais de 230

ma publicitária para as marcas. Isso

cia, as empresas viram nas blogueiras

mil seguidores em seu perfil do Insta-

acontece porque grande parte desse

uma oportunidade de promoção de suas

gram, revela que grande parte de suas

novo processo de marketing é feito

marcas. “A influencer é bela e amada,

parcerias são feitas por permuta. “As

pelas novas musas contemporâneas:

então suas seguidoras têm a impressão

propostas que chegam para mim são

26-27 - inveja.indd 32

31/05/19 19:24


AS INFLUENCERS SÃO FIGURAS PÚBLICAS RESPONSÁVEIS PELA CRIAÇÃO DE CONTEÚDO NO MUNDO VIRTUAL

Foto: Arquivo pessoal

pensar em como que essa nova forma de publicidade afeta os consumidores? Quando seguimos uma blogueira, normalmente é porque a admiramos e gostamos de seu conteúdo. Logo, quando ela faz um post promocional sobre alguma marca ou produto, tendemos a acreditar que realmente o utiliza. Porém, será que é assim que as coisas realmente são? A influencer e DJ Clara Aguiar, que possui 788 mil seguidores no Instagram, revela que algumas pessoas podem ser influenciadas negativamente nas redes. “Eu já vi várias blogueiras postando e divulgando coisas que tenho certeza que elas jamais usariam”, diz. Além de Clara, Bruna também enxerga o lado negativo desse marketing digital. “O que a gente mais vê são influencers que foram completamente compradas, que vendem não só produtos, mas coisas que elas não acreditam”, ela diz. Os mais prejudicados nesse cenário

“Sempre recuso propostas de marcas que promovem o emagrecimento”, diz Bruna

são os próprios seguidores das influencers, levados a acreditar em coisas que, muitas vezes, são apenas divulga-

normalmente de moda, beleza ou de

de marketing para startups e empreen-

ção paga. Mas calma. Existe sim uma

lifestyle. Eu não costumo fugir disso,

dedores, afirma que tendemos a nos tor-

forma de não ser explorado nas redes

nunca sigo uma proposta diferen-

nar mais consumistas por conta dessas

sociais, apesar de exigir atenção. O pri-

te dessa área”, ela diz. Ainda comple-

propagandas. “Acredito que esse pro-

meiro passo é lembrar que as coisas nem

ta que, quando se interessa por uma

cesso de consumo pelo aplicativo seja

sempre são o que parecem. O publicitá-

marca, manda mensagem direta suge-

facilitado pelo vínculo emocional ou

rio Arthur Verechi, que trabalha como

rindo uma colaboração entre eles. Nes-

de pertencimento que essas influen-

gerente de Marketing na empresa By

ses casos, Bruna recebe os produtos e,

ciadoras constroem com seus seguido-

Kamy, recomenda que os seguidores das

em troca, faz divulgação deles pelos sto-

res. Elas criam verdadeiras comunida-

blogueiras reparem na lista de suas pos-

ries do Instagram.

des, que também se reúnem offline”,

tagens para saber analisar se suas divul-

ele conta.

gações possuem teor verdadeiro ou não.

Para quase todos que possuem redes sociais, é quase impossível não acompa-

“O Instagram é uma plataforma ima-

Mesmo com conhecimento sobre o

nhar pelo menos uma influencer digital,

gética com forte poder de compra por

lado nocivo que o Instagram apresenta,

seja lá qual for seu conteúdo. Vamos ser

impulso, pois permite a geração de con-

as influencers também acreditam que as

sinceros: quantas vezes você já entrou

teúdo que pode trazer um apelo estético

seguidoras possuem um papel impor-

no Instagram, viu uma blogueira divul-

segmentado devido aos recursos exis-

tante dentro das redes sociais. “A s pes-

gando um produto e teve vontade de

tentes no próprio aplicativo. Isso incen-

soas têm que ter a responsabilidade de

comprá-lo? Isso acontece basicamente

tiva que as campanhas de marketing

saber dosar e não acreditar em tudo que

todos os dias com diversas pessoas. O

sejam muito mais assertivas”, conta

veem, porque tem muita gente que faz

publicitário Alexandre Galliotti, mentor

Arthur Verechi. Mas você já parou para

as coisas só pelo dinheiro”, diz Clara.

26-27 - inveja.indd 33

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os pecados capitais do consumismo  |  avareza

28/29

Foto: Ariel Serafim

No mezanino do bar, coisas velhas são usadas como enfeites que reforçam a ideia da avareza

MINHA DOCE MESQUINHARIA Mesmo os mais avarentos criam seus modos de consumir para estarem inseridos socialmente

O professor Gilberto Fernando Xavier, especialista em neurociência e comportamento humano da Universidade São Paulo (USP), explica que esse fato histórico de interação com o mundo e com as outras pessoas nos é transmitido por meio de valores ideológicos, condutas que estariam relacionadas com a autopreservação, podendo haver uma pessoa que cresce num determinado contexto e ambiente e, em razão desse meio, adote as característica da avareza.

ARIEL SERAFIM

diretamente com a pessoa que escolhe esse estilo de vida.

“As pessoas dispõem de uma evolução única e pessoal, que determina sua forma

»»»Unha de fome, muquirana, mão de

A avareza está voltada ao comporta-

de interagir com o mundo e dele extrair

vaca. São infinitas as nominações usa-

mento cujo cunho seria negativo, de que

a segurança necessária”, diz Xavier. “Os

das para designar quem pratique hábi-

a pessoa vá adotar uma conduta ou outra

avarentos sentem necessidade de acu-

tos que estejam relacionados à avare-

dependendo da circunstância em que ela

mular e guardar, e também muita dificul-

za. Os motivos podem ser variados,

está inserida, apesar de este comporta-

dade para dividir ou doar. É muito prová-

ou talvez um dos principais meios de

mento ser naturalmente vindo do instin-

vel que isso tenha relação com o histórico

cooperar com a poupança mensal para

to de sobrevivência humano. Porém, a

de vida de cada uma dessas pessoas.”

fazer o dinheiro render. Mas a econo-

falta de carinho e de afeto familiar pode

Gabriel Limeira, de 21 anos, vendedor

mia em excesso pode ser um obstácu-

transformar uma pobre criança em um

de roupas de surfe do Shopping Praça

lo para familiares ou até mesmo ami-

futuro pão-duro e extremo controlador

da Moça, no centro de Diadema, expli-

gos próximos que costumam lidar

de dinheiro.

ca como faz para se vestir de acordo

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Foto: Arquivo pessoal

mas o que mais chama atenção dos muquiranas é o Bar da Avareza. Inaugurado em abril de 2017, o ambiente tem feito muito sucesso entre os amantes da boa cerveja e chopes. Nara Fernandes é a supervisora responsável pelo bar durante a semana. Ela afirma que os preços são acessíveis para causar justamente um destaque entre outros bares e baladas que existem na rua Augusta. ‘’Vários points da rua têm uma relação entre custo e benefício que não é muito viável. As coisas geralmente são caras, principalmente nas hamburguerias”, afirma. Nara conta que a ideia era justamente trazer um hambúrguer de qualidade e com um preço razoável, para que todos tenham esse fácil acesso a um bom lanche e a uma cerveja de qualidade. “A ideia

Gabriel Limeira compartilha o guarda-roupa com amigos

foi justamente ter um sanduíche artesanal, assinado por um chef, com um preço que fosse viável para os consumidores,

com seu estilo sem ter que desembolsar

Limeira diz que gosta de colecionar os

sejam eles estudantes ou aposentados.”

muito dinheiro. Ele optou por uma ten-

melhores momentos junto de seus ami-

Com uma estrutura física parecida

dência muito usada por alguns jovens da

gos. Ele junta dinheiro e gasta em fes-

com a de um depósito antigo, mesas e

mesma idade que ele: compartilhar seu

tas, bares e festivais de música eletrôni-

cadeiras são improvisadas, garrafas de

armário entre amigos mais próximos.

ca. ‘’Eu tenho uma grande paixão pelo

cervejas são utilizadas como lâmpa-

“Usamos o mesmo estilo e as mesmas

skate e tem também pelas raves e shows

das, o estabelecimento possui pratelei-

marcas e economizamos muito dinhei-

de reggae.”

ras recheadas de brinquedos antigos.

ro com as roupas.”

No andar de cima, mais coisas velhas Um happy hour avarento

são usadas como enfeites. Algumas fer-

muita amizade e união entre seus cole-

‘’Vixe, esqueci a carteira, paga uma gela-

ramentas, como máquinas de escrever e

gas e que costuma comprar roupas junto

da aí pra mim, brother, na próxima eu

visores antigos, são usados para decora-

com os amigos mais próximos. “Para

acerto com você.” E essa provavelmen-

ção, pneus de carros tomam a forma de

que gastar muito dinheiro compran-

te foi a última vez que você viu aqueles

pufes artesanais, e gigantescos carretéis

do roupa, se eu posso dividir tudo com

R$ 20 que deixou bem guardadinhos lá

de madeira são utilizados como mesas.

meus amigos?”, diz. “Eu faço meu pró-

na sua carteira, que havia economizado

prio marketing. Eu e o pessoal gostamos

para usar em uma emergência.

Ele conta que seu estilo de vida requer

Nara reforça que praticamente toda a decoração do estabelecimento foi reapro-

de investir nos acessórios que são mais

O Bar da Avareza, mais conhecido por

veitada e que a partir daí surgiu a ideia

caros, que dão um ar mais autêntico, e

seus chopes artesanais e drinques, é um

do lanche com um preço justo que aca-

aí já dá pra montar um montão de com-

ponto de encontro rústico e boêmio,

bou se apropriando da ideia da avareza.

binações.” Ele afirma também que não

com música ao vivo e festas de karaokê.

‘’Todo o contexto do bar é permeado pela

costuma dividir algumas peças, nem

O local no coração dos happy hours de

questão avarenta, uma questão de pouco

mesmo para os mais chegados da turma.

São Paulo: a rua Augusta, na região cen-

gasto. Então, a decoração é de garimpo. E

‘’Nem insista! Tem algumas coisas que

tral da cidade.

para bater de frente com a concorrência,

eu não gosto de compartilhar, tipo os

O bairro é repleto de lanchonetes,

meus bonés, os corta-ventos e os tênis.’’

bares temáticos, baladas e muito mais,

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tivemos a ideia de passar para a freguesia valores acessíveis e justos.’’

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30/31 os pecados capitais do consumismo  |  gula e preguiça

Foto: PeopleImages/iStock

Segundo a OMS, 70% da população brasileira consome sódio em excesso

DELÍCIAS QUE AMEAÇAM A SAÚDE Alimentos ultraprocessados, comercializados em todo lugar e a preços quase sempre acessíveis, excedem em níveis de sódio, açúcar, gordura e conservantes

alimentos estão muito acima do que é

do consumo de sódio representa melho-

LUIZA CONSUL

estabelecido pela Organização Mundial

ria da saúde do coração na vida adulta.

»»»É muito comum que, em razão

da Saúde (OMS), que classifica como sau-

A inda segundo a OMS, mais de 70% da

da correria do dia a dia e até mesmo

dável um consumo de 2 gramas ao dia,

população brasileira consome sódio em

por uma questão de gosto, as pesso-

não devendo exceder 5 gramas ao dia

excesso e mais de 90% dos adultos e ado-

as optem pelo consumo de alimen-

– o que corresponde a menos de uma

lescentes nas áreas urbanas ultrapas-

tos processados e ultraprocessados,

colher de chá rasa ou menos de cinco

sam esse limite diário. Refeições fora

como biscoitos, salgadinhos, macar-

pacotinhos servidos em restaurantes,

de casa preparadas com produtos indus-

rão instantâneo, lasanha congelada,

já que cada um contém 1 grama. Os limi-

trializados, principalmente do tipo fast-

nuggets e outros com frequência na

tes máximos de sal para crianças e ado-

-food, apresentam em sua composição

hora da escolher o que vão comer.

lescentes são ainda menores por serem

quantidades excessivas de sódio, gor-

Apesar de caírem no gosto de muita

populações mais vulneráveis. Além

duras saturadas, gorduras trans, açú-

gente, os níveis de sódio contidos nesses

disso, nessas faixas etárias a redução

cares e alto valor energético. Ou seja,

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Foto: Credito de foto

é fácil excedermos 2 gramas de sódio se não tomarmos cuidado no dia a dia. Sódio em excesso aumenta o volume de sangue, aumenta a pressão arterial e o risco de doenças coronarianas. Alguns exemplos do exagero nos níveis sódio na composição de alimentos ultraprocessados podem ser observados em uma porção de macarrão instantâneo ou em meia lasanha congelada, que podem ter, aproximadamente, 1,2 grama da substância – cerca

A Uber eats, além de moto, também adotou a bicicleta como meio de transporte

Aplicativos de entregas e a preguiça

com a promessa de entregar qualquer coisa, desde comidas e remédios até produtos eróticos. A empresa realiza entregas de tudo o que cabe nos compartimentos de seus motoboys. Avaliada em US$ 1,1 bilhão, a companhia já existe em 15 cidades brasileiras. Além

de metade da quantidade considerada GUILHERME SANTIAGO JOÃO PEDRO MELLO YASMIN MAZZEO

disso, de acordo com a revista Forbes,

A nutricionista Nathália Gazarra

»»»Um dos hábitos mais frequen-

pal mercado, e deverá investir gran-

alerta que, além desses alimentos pos-

tes nos lares brasileiros é pedir

de parcela de seus US$ 220 milhões.

suírem níveis de sódio elevados, têm

comida no conforto de suas casas

Diante disto, cada vez mais as pes-

baixo valor nutricional e muitas vezes

por meio de aplicativos de deli-

soas evitam sair de casa para reali-

são ricos em gorduras, conservantes,

very. Apesar dos pedidos por tele-

zar determinadas funções e esco-

corantes e outros tipos de aditivos, ele-

fone ainda serem algo comum, o

lhem pagar para que um aplicativo de

mentos que ao serem consumidos em

mercado dos apps de entrega vem

entrega realize isto por elas. Com isso,

excesso podem colaborar com o surgi-

crescendo muito nos últimos tem-

temos uma sociedade que, sempre que

mento de doenças cardiovasculares e

pos. Rappi, Ifood e Uber Eats são as

possível, evita sair do conforto de suas

diabetes. “Moderação é a palavra-cha-

franquias mais conhecidas e utiliza-

casas. O engenheiro Gustavo Ribeiro

ve, e sempre preferir alimentos in natu-

das do mercado atual e, consequen-

é usuário assíduo dos aplicativos de

ra e frescos, além de utilizar uma quan-

temente, as que mais lucram. Segun-

entrega. “Sempre utilizei delivery pela

tidade moderada de sal nas preparações

do dados da Associação Brasileira

praticidade e costumo variar bastan-

em casa”, recomenda.

de Bares e Restaurantes (Abrasel),

te os pedidos, especialmente em busca

em 2018 o mercado de delivery movi-

de promoções. Mas depois que minha

mentou R$ 11 bilhões.

filha nasceu, ficou ainda mais difícil

ideal para consumo ao longo de um dia inteiro.

Em 2017, o Ministério da Saúde começou a divulgar uma campanha na ten-

a Rappi enxerga no Brasil seu princi-

tativa de reduzir a quantidade de sódio

Segundo a revista Exame, o aplica-

sair de casa, e eu e minha mulher, no

consumida pelos brasileiros. Foram

tivo de delivery Ifood fatura anual-

fim de semana, praticamente só come-

várias ações concomitantes com efei-

mente cerca de R$ 370 milhões e conta

mos o que nos entregam”, conta. “Tor-

tos positivos. A primeira delas instituiu

com mais de 6 milhões de usuários ati-

nou-se até uma diversão o processo de

um acordo com a Associação Brasileira

vos. Maria Silivana, aposentada de 73

escolha dos nossos pratos.”

da Indústria de Alimentos (Abia) para

anos, conta que antigamente não exis-

Para a psicóloga Francine Contato,

retirar do mercado 17 mil toneladas de

tia tanta praticidade quando o assun-

a adoção desses hábitos é inerente à

sódio, especialmente das comidas ultra-

to era comida. “As pessoas hoje em dia

sociedade em que vivemos, principal-

processadas. Outro passo dado foi a

têm tudo na palma da mão e por isso

mente nas cidades grandes, onde os

assinatura de um acordo com as indús-

ficam cada vez mais ociosas”, comenta.

deslocamentos são mais complexos.

trias para a realização de um esforço

Mas se engana quem pensa que só

“Isso traz uma mudança nos proces-

para ampliar ainda mais essa redução

existem deliveries de alimentos. A

sos de socialização e da relação com

ao longo de cinco anos. Foi criado tam-

Rappi, empresa colombiana funda-

o entorno que estabelecemos, porque

bém um portal para levar à população

da em 2015, que atualmente funcio-

cada vez mais as pessoas passam a

informações sobre hábitos saudáveis e

na em sete países, (todos da Améri-

maior parte de seu tempo livre somen-

mudança de rotina.

ca Latina) apresenta um diferencial,

te dentro de suas casas.”

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OS MALES RELACIONADOS AO CONSUMO DE PORNOGRAFIA A prática, muitas vezes vista como comum, afeta diariamente mulheres – e até crianças – vítimas da indústria mais rentável do mundo Foto: JLGutierreziStock

YASMIN GUIMARÃES

»»»Lésbicas, sexo a três e ejaculação

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feminina. Esse são os termos mais buscados no Pornhub, que é o 27º site mais acessado do mundo, segundo a Alexa, ferramenta de marketing desenvolvida pela Amazon. A posição em que o site se encontra o coloca à frente inclusive do Ebay, uma das maiores plataformas de compra e venda do mundo. O consumo pornográfico existe muito antes da era virtual. Antes, o conteú-

os pecados capitais do consumismo  |  luxúria

do que até então era mais voltado para o público masculino obtinha sua renda

Pesquisa por conteúdo de cunho sexual ultrapassa acessos do Ebay

por meio da venda de revistas, contos eróticos, VHS e canais fechados. Hoje,

Bruna trabalha no site 4CA M, um dos

ming Belle Knox, a atriz conta um pouco

os mais de 800 milhões de sites do ramo

maiores do ramo. Os ganhos são vari-

dos abusos sofridos dentro da indústria.

recebem mais acessos do que Netflix,

áveis: R$ 200 para mostrar os seios, já

“É comum que nos espanquem e nos for-

Amazon e Twitter juntos, segundo estu-

a nudez completa custa R$ 1 mil. Além

cem a fazer um ato com que não concor-

do divulgado pelo National Center on

disso, as cam girls costumam ter clien-

damos anteriormente”, comenta.

Sexual (NCOSE).

tes fiéis que pagam bem. “Por mês eu

Com o discurso de empoderamen-

Os números alarmantes que circun-

tiro cerca de R$ 12 mil. Em qual empre-

to feminino, muitas mulheres vendem

dam esse consumo são resultado de uma

go tradicional eu conseguiria tirar

seus corpos com o propósito de pro-

cultura majoritariamente machista.

tanto trabalhando pouco?”, comenta.

mover a liberdade sexual. Entretanto,

Luiz (nome fictício), hoje com 19 anos,

Para não ser identificada, Bruna utili-

não veem que existem outros interes-

estudante de Direito, começou a consu-

za máscaras e cobre suas tatuagens com

ses por trás da ideia de quebrar para-

mir pornografia por influência de seu

maquiagem.

digmas tradicionais. Paloma Vanni, psi-

pai. “Eu tinha cerca de 10 anos quando

Dentre as problemáticas da profissão,

cóloga e sexóloga, afirma que a linha

meu pai me deu suas revistas e falou

há o lado de como ela é vista pela socie-

entre hipersexualização e liberdade é

para eu passar um tempo sozinho com

dade. No site de perguntas Gloove, 100%

bem tênue. “As mulheres podem fazer

elas”, afirma.

das 123 respostas à pergunta “Você se

o que quiserem, mas muitas vezes elas

relacionaria com uma atriz pornô?” são

apenas reforçam o machismo, ao invés

negativas.

de quebrá-lo”.

Uma das formas de consumo pornográfico é pelos live chats, em que mulheres se exibem ao vivo para quem

Além da desvalorização da profissão

Visto por alguns como entretenimen-

estiver online - e pagar por elas. Bruna

como um todo, há a questão do abuso da

to, por outros como uma questão a ser

(nome fictício) optou por se tornar cam

indústria pornográfica com as mulhe-

debatida, o meio pornográfico já está

girl quando perdeu o emprego de comis-

res – que, apesar de serem a principal

instaurado na nossa sociedade e cul-

sária de bordo. “As contas não paravam

mercadoria, são totalmente controla-

tura. “Nós temos que falar sobre isso.

de chegar e eu me vi sem opção. É um

das por homens. Dentre as histórias que

A pornografia dificilmente irá acabar,

dinheiro fácil, trabalho cerca de três

ilustram essa realidade, há a de Miriam

pelo contrário. Mas há formas de se exi-

horas por dia e ganho mais do que como

Weeks, mais conhecida no ramo por

gir condições de trabalho mais dignas”,

comissária”, diz.

“Belle Knox”. Na série do Youtube Beco-

completa Paloma Vanni.

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Foto: Isabelle Bulla e João Paiva

consumidor, que não tem garantia dos produtos. Em muitos casos, são produtos que oferecem riscos à saúde”. Um fator que sustenta, de certa forma esse cenário, tem base no fato de o sistema capitalista estar calcado no constante incentivo ao consumismo, por meio do qual o desenvolvimento econômico e social é baseado pelo aumento desenfreado do consumo. Os estímulos ao consumismo evoluem de forma gradativa, com novas opções para a grande massa, ao mesmo tempo em que formulam novidades para os indivíduos já integrados, provocando uma crescente inovação. Essa estrutura gera diversos problemas ao funcionamento da sociedade, que, de certa forma, responde de maneiras enviesadas a esses estímulos. Em países como o Brasil, que se encontra em uma grave crise econômica e social,

Produtos vendidos em barracas na rua nem sempre têm origem conhecida

em que o índice de desemprego é de 12,7% (13,4 milhões de pessoas), segun-

COMO O DESEJO INCITA A PIRATARIA Submetidos aos estímulos do consumismo, muitos recorrem a práticas ilegais para obter o que cobiçam

do dados de abril do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as pessoas não possuem o poder aquisitivo necessário para a obtenção das novas mercadorias que chegam ao mercado. E, dentro da lógica consumista, muitos recorrem a práticas ilegais para obter seus objetos de desejo, como a pirataria, por exemplo. Sobre alternativas para fugir da pirataria, o economista Solimeo avalia que

JOÃO PEDRO MELLO

Conhecidos por frustrar o consumidor

isso é algo que depende unicamente do

no quesito qualidade e durabilidade, a

próprio consumidor. “Apenas a cons-

»»»A pirataria é algo muito popular

falsificação de certos produtos, como

cientização do cidadão, de que ao com-

no Brasil. Segundo a Federação do

óculos de sol pode apresentar sérios

prar produtos contrabandeados ele

Comércio do Rio de Janeiro (Fecomer-

riscos à saúde do consumidor.

está ajudando os que cometem crime. E

cio-RJ), a cada dez brasileiros, três

Além disso, a pirataria gera muitos

mesmo nos casos de produtos nacionais,

possuem o hábito de comprar pro-

prejuízos ao setor econômico, especial-

o não recolhimento dos impostos acaba

dutos piratas, de acordo com dados

mente ao comércio. Em nota publicada

reduzindo a capacidade dos governos de

de 2018. Em pesquisa realizada pela

em seu site oficial, o governo brasileiro

atender a necessidade da população.”

Muso, uma rede de consultoria britâ-

anunciou que o comércio pirata tira de

Mas nem sempre os consumidores

nica contra a pirataria, o Brasil é o 4º

circulação anualmente R$ 115 milhões,

conseguem resistir aos preços convi-

país que mais consome produtos fal-

de acordo om dados de 2017.

dativos desses produtos. Cláudia Valen-

sificados no mundo.

De acordo com Marcel Solimeo, eco-

tim é mãe de um menino de 9 anos. Ela

Essa prática, contudo, é ilegal e se

nomista da Associação Comercial de

sempre compra os presentes do filho

baseia na venda de produtos falsifica-

São Paulo (ACSP), a pirataria prejudica

no camelô em diversas datas festivas,

dos sem autorização do proprietário da

o comércio formal ao fazer concorrência

especialmente aniversário. “Meu filho

marca ou do produto. Desde roupas e

desleal, pois não paga os impostos a que

pede um monte de coisa que vê na tele-

calçados até eletrodomésticos e remé-

o varejo está submetido. “Também pre-

visão e na internet. Mas é tudo muito

dios, o comércio dessas mercadorias

judica o governo, que perde arrecada-

caro e tem que comprar aqui. Não dá

abrange diversos setores da sociedade.

ção de imposto, e muitas vezes o próprio

para deixar o menino sem presente.”

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Foto Divulgação

Pôster do filme Na Natureza Selvagem

os pecados capitais do consumismo  |  ira

LUIZA CONSUL

»»»“Há dois anos ele caminha pela terra. Sem telefone, sem piscina, sem animal de estimação, sem cigarros. Liberdade definitiva. Um extremista. Um viajante estético cujo lar é a estrada. Fugido de Atlanta, não retornarás, porque ‘o Oeste é o melhor’. E agora depois de dois anos errantes chega à última e maior aventura. A batalha final para matar o ser falso interior e concluir vitoriosamente a revolução espiritual. Dez dias e noites de trens de carga e pegando carona trazem-no ao grande e branco Norte. Para não mais ser envenenado pela civilização, ele foge e caminha sozinho sobre a terra para perder-se na natureza.” Foi assim que Alexander Supertramp se descreveu durante a viagem que realizou rumo ao Alasca, numa iniciativa incessante de se afastar da sociedade. O nome adotado também foi parte deste processo de transformação criado pelo norte-americano Christopher Johnsson McCandless, que deixou seus

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p

PERFIL: ALEX SUPERTRAMP

UMA PASSAGEM INTENSA PELA VIDA A história que virou filme do estadunidense Christopher McCandless, que partiu rumo ao Alasca numa tentativa de viver longe da sociedade capitalista

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LIVRE DE BENS MATERIAIS, ELE BUSCAVA O QUE CONSIDERAVA SER O BEM MAIS PRECIOSO: A LIBERDADE

documentos, sua identidade, família e

imitam a famosa imagem em que o rapaz

eles, o ser humano só se aproxima de sua

conforto financeiro para trás com o obje-

aparece sorridente sentado em frente ao

dignidade quando abdica dos bens mate-

tivo de se embrenhar pela natureza sel-

veículo abandonado.

riais para viver uma vida simples. Thore-

vagem do território gelado.

No livro, Krakauer remonta toda a tra-

au e Jack London narram a experiência

Com essa decisão, McCandless viveu

jetória do jovem, nascido em 12 de feve-

do contato com a natureza em seu estado

muito mais que uma “loucura de juven-

reiro de 1968. McCandless foi criado no

mais puro e selvagem como uma forma

tude”. Mobilizou pessoas em torno das

pacato subúrbio de Annandele, cidade do

de provação e elevação da alma.

questões que levantou com sua trajetó-

estado de Virgínia, nos Estados Unidos.

Assim que terminou o ensino médio,

ria – eternizada ao ser inspiração para

Seus pais, Walt e Billie McCandless, con-

pegou seu carro e partiu numa viagem

um livro e um filme.

seguiram superar a condição de pobre-

solitária e com poucos recursos em dire-

O caso chamou a atenção de pesso-

za na qual foram criados e concretiza-

ção às regiões áridas do sul e do oeste

as de todos os Estados Unidos desde

ram o sonho de viver o american way of

do país. Essa experiência o transformou

a publicação de um artigo lançado na

life. Fundaram juntos uma empresa de

totalmente, pois além de se apaixonar

revista Outsider, em 1993. Instigado pela

consultoria de sistemas que garantiu a

pela sensação de liberdade proporcio-

história, o mesmo autor do artigo, Jon

eles proporcionar uma vida de conforto

nada pela vivência, em uma visita a sua

Krakauer, decidiu fazer uma investiga-

e estabilidade para os filhos.

cidade natal na Califórnia, descobriu que

ção detalhada refazendo os passos de

Conhecido por sua inteligência e jeito

nos seus primeiros anos de vida seu pai

McCandless para tentar desvendar lacu-

questionador, McCandless nunca pas-

ainda mantinha um relacionamento com

nas em sua trajetória. Em 1996, publi-

sou despercebido pela vida das pesso-

sua ex-esposa, algo que se revelou ina-

cou o livro Na Natureza Selvagem, em

as que conviveram com ele, mesmo que

ceitável e imoral para ele.

que narra todos os detalhes da aventura,

por um curto período. Desde criança, já

Na faculdade, McCandless se tornou

cujos pontos centrais recontamos aqui,

chamava a atenção por sua eloquência

ainda mais recluso e crítico à sociedade,

com a extração das frases mais marcan-

e capacidade de impactar o ambiente ao

mas continuou nutrindo expectativas da

tes registradas por Supertramp ao longo

seu redor. Além disso, era muito deter-

família de que iria seguir o caminho de

de sua jornada.

minado quando colocava algo na cabe-

uma vida tradicional. As coisas realmen-

ça, demonstrando essa característica nas

te mudaram quando logo após se formar,

atividades escolares e no dia a dia.

em 1990, decidiu embarcar numa jorna-

Anos mais tarde, o ator e diretor Sean Penn decidiu adaptar a obra para o cinema. Em 2007 foi lançado o filme

Não era incomum que tomasse deci-

de mesmo nome sobre a vida do jovem,

sões impulsivas e repentinas. Interessa-

Sem avisar ninguém sobre seus pla-

interpretado por Emile Hirsch. Sean

va-se muito por questões sociais e tinha

nos, doou todo o dinheiro restante de

Penn excursionou por mais de 35 loca-

o costume de perambular pelos cantos

seu fundo escolar para uma instituição

ções, refazendo os passos de Christopher

mais esquecidos e marginalizados para

dedicada a combater a fome (aproxima-

dos EUA ao México. Todas as cenas foram

conversar e ajudar as pessoas desses

damente US$ 20 mil), se desfez de seus

gravadas de acordo com o local verdadei-

locais, muitas vezes usuários de drogas,

documentos e partiu de carro para sua

ro, exceto as do ônibus, local que abrigou

sem-teto e prostitutas. Na faculdade não

grande viagem.

Alex em seus últimos dias de vida. Penn

foi diferente. Chegou a cursar várias dis-

O plano inicial de fazer a viagem de

achou que seria falta de respeito com os

ciplinas que discutiam problemas como

carro foi por água abaixo quando estava

McCandless. Então ele recriou o veícu-

a pobreza, o racismo e a fome.

acampado próximo a um lago na frontei-

da rumo ao Alasca selvagem.

lo e a locação fielmente em outra flores-

Leitor ávido, McCandless tinha admi-

ra dos estados Arizona e Nevada e uma

ta, conforme conta uma reportagem da

ração especial pelos escritos de Thore-

enxurrada danificou o funcionamento do

revista New Yorker sobre o lançamen-

au, Tolstoi e Jack London – era capaz de

motor do veículo. Como ele não queria

to do filme (‘Into the Wild’ premieres in

citar vários trechos das obras, e muitas

que as autoridades soubessem de seus

Fairbanks’, de setembro de 2007).

vezes os usava como referência para fun-

planos, principalmente para não dar

Muita gente se inspira na história de

damentar seu ponto de vista sobre algum

pistas de seu paradeiro para seus pais,

Alex Supertramp e refaz seus passos

assunto. Os dois primeiros autores fre-

decidiu abandonar o veículo e seguir a

até o “ônibus mágico” 142. Na internet

quentemente criticavam o capitalismo e

viagem pedindo carona e andando ile-

existem muitas fotos em que as pessoas

a hipocrisia presente nesse sistema. Para

galmente em trens de carga.

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Foto Divulgação

Tendo incorporado totalmente esse estilo de vida, decidiu mudar seu nome para Alexander Supertramp, e foi assim que se apresentou às pessoas que conheceu durante toda a viagem, raramente deixando escapar seu verdadeiro nome.

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As experiências que Supertramp vivenciou, mesmo antes de chegar ao Alasca, incluíram passar por fome, frio e solidão. Mas, independentemente dos riscos que corria, suas anotações de viagem mostravam que ele sentia prazer em viver esse tipo de situação, confor-

Bilhete de despedida de McCandless

me retratam tanto o livro quanto o filme. Não deixava as dificuldades prejudica-

os pecados capitais do consumismo  |  ira

rem seu plano. Sempre encontrava meios

foram ignorados.

da natureza do Alasca. Em um ato de

de segui-lo, mesmo que envolvesse a

Em 1º de maio encontrou um ônibus

necessidade de voltar a entrar em conta-

abandonado em meio à natureza e, den-

to com o mundo capitalista que criticava

tro dele, um colchão e alguns utensí-

“S.O.S preciso da sua ajuda. Estou

tanto. Durante os dois anos em que rea-

lios para se aquecer e preparar alimen-

muito ferido, quase morto e fraco demais

lizou a sua jornada, trabalhou fazendo

tos. Com isso, decidiu que aquele era o

para sair daqui. Estou sozinho, isto não é

hambúrguer na cozinha do McDonald’s e

melhor lugar para se instalar e lá perma-

piada. Em nome de Deus, por favor fique

como uma espécie de faz-tudo num ele-

neceu até seu trágico fim.

para me salvar. Estou catando frutas por

vador de cereais em Cartago, em Dakota do Sul. Diversas pessoas relatam ter convivido com McCandless no período de sua via-

desespero, tentou pedir socorro pendurando um bilhete na frente do ônibus:

perto e devo voltar esta tarde. Obrigado. “Jack London é rei Alexander Supertramp Maio de 1992”

gem, e isso foi um dos fatores que cola-

Chris McCandless. Agosto?” Em agosto, um grupo de pessoas encontrou o cadáver de Supertramp em estágio avançado de decomposição. Pre-

boraram para que sua história se tornas-

Grafitou em um pedaço de madei-

cisaram ligar para a polícia para retirar

se famosa. Tinha uma presença muito

ra próximo encontrado em seu local de

o corpo do local. Na autópsia, a possí-

marcante e inspirava muita simpatia.

morte.

vel causa de morte se deu por inanição,

Fez questão de manter contato com algu-

Conseguiu se manter bem caçando

mas existe a teoria de que o jovem tives-

mas pessoas, como no caso de Jan Bur-

alguns animais como esquilos, pequenas

se se envenenado por engano ao ingerir

res, uma viajante de meia idade, Ronald

aves e até mesmo um alce. Tudo pare-

sementes de batata selvagem.

Franz, um octogenário aposentado do

cia de acordo com seu plano, e McCand-

Já conformado que não iria sobrevi-

exército, e Wayne Westerberg, dono do

less documentou a experiência por meio

ver, ele rasgou uma página de um livro e

elevador de cereais onde trabalhou.

de fotos e algumas anotações em pági-

deixou a seguinte mensagem: “Tive uma

nas de livro.

vida feliz e agradeço a Deus. Adeus e que

Chegou ao Alasca em abril de 1992, se instalando próximo ao Monte Healy, cujo

A sorte mudou logo no começo de

acesso só era possível pela estrada Stam-

julho de 1992, quando apresentava sinais

Livre de bens materiais, Christopher

pede Trail ou de helicóptero. As últimas

de fraqueza devido à falta de alimentos.

McCandless buscava o que considera-

pessoas que o ajudaram a chegar no local

Tentou voltar à civilização, mas o nível

va ser o bem mais precioso: a liberdade.

o alertaram sobre os perigos de sua aven-

de água do rio que atravessara para che-

“Sem jamais ter de voltar a ser envenena-

tura, principalmente pelo fato de que

gar ao ônibus havia aumentado, e a cor-

do pela civilização, foge e caminha sozi-

estava desprovido de comida suficien-

renteza estava muito forte.

nho pela terra para se perder na floresta”,

te e material adequado para caçar e se

Seu corpo foi cedendo cada vez mais

manter aquecido. Os avisos, no entanto,

rápido às condições climáticas extremas

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Deus abençoe a todos!”.

escreveu em um de seus 113 dias diferentes de registros em seu diário.

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LIXO: UMA QUESTÃO DE CONSCIENTIZAÇÃO As reflexões de nossas repórteres que passaram uma semana atentas às complexidades envolvidas no descarte das coisas Foto: Thales Antônio

Repórteres Luiza Consul (esq.) e Luiza Müller (dir.) com o lixo coletado na semana da experiência

“Através do lixo, o particular se torna público. O que sobra da nossa vida privada se integra com a sobra dos outros. O lixo é comunitário. É a nossa parte mais social. Será isso?” O Lixo, Luis Fernando Veríssimo

ladas, com geração per capita de 1,07

prio, incluso na área de comportamen-

kg ao dia, segundo levantamento da

to humano e consumo”. Ainda de acor-

Associação Brasileira de Empresas de

do com ele, essa imprecisão gera uma

Limpeza Pública e Resíduos Especiais

falta de discernimento sobre nosso pró-

(Abrelpe).

prio comportamento consumista do dia

O que hoje chamamos de Segunda

a dia, o que faz “com que as pessoas não

Revolução Industrial fez surgir o afeto

pensem que tudo aquilo que elas conso-

desenfreado pelo excesso. Um sécu-

mem está necessariamente impactando

lo depois de sua criação, o plástico, um

o meio ambiente”.

dos principais exemplos neste contexto,

E justamente pensando nos impactos

passou a ser um material útil e de fácil

que causamos todos os dias com nossas

acesso. Alguns tipos de plástico demo-

contribuições pessoais ao montante de

»»»O lixo é democrático, pertence a

ram quase 600 anos para se decompor

lixo produzido diariamente na Terra que

todos, estampa identidades, se alastra

completamente.

duas repórteres da Plural se propuseram

LUIZA MÜLLER LUIZA CONSUL

sem pudor. O Brasil se tornou o quarto

Segundo professor da ESPM-SP Mar-

a testar caminhos diferentes por uma

maior gerador de resíduos sólidos no

cus Nakagawa, especialista em susten-

semana: uma iria consumir normalmen-

mundo, mesmo com toda a crise eco-

tabilidade, temos um grande problema

te e guardar seu lixo reciclável, a outra

nômica impactando sobre o poder de

em lidar com o lixo em razão da manei-

tentaria produzir o mínimo de lixo pos-

compra da população. A quantida-

ra como a ecologia nos é apresentada,

sível, sendo que este acúmulo deveria

de de lixo urbano produzida no país

“como um tema da aula de biologia e

caber em um pote de vidro. Aqui estão

em 2015 atingiu 79,9 milhões de tone-

geografia, e não como um espaço pró-

os resultados do experimento.

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Foto: Luiza Consul

Lixo acumulado por Luiza Consul

Lixo acumulado no pote por Luiza Müller

LUIZA CONSUL 1 semana sem descartar o lixo reciclável

LUIZA MÜLLER 1 semana tentando não produzir lixo

Quando aceitei o desafio de não descartar o meu lixo

A semana começou difícil e, honestamente, eu esta-

reciclável durante uma semana, imaginava que iria me

va preparada para lidar com outro tipo de desafio. Logo

surpreender com o resultado do experimento, prin-

nos primeiros dias notei que não me preparei correta-

cipalmente em relação aos aspectos dos meus hábi-

mente para algumas coisas. No quarto dia fui assistir à

tos de consumo. Eu também pensei: se somos o que

palestra da Cristal Muniz, uma blogueira que relata seu

comemos, acho que o mesmo pode ser dito sobre

percurso até o ponto onde está agora, completamen-

a quantidade e o tipo de lixo que produzimos.

te imersa no movimento “lixo zero”; lá compreendi que

Guardei numa sacola todos os resíduos recicláveis do

o estilo de vida também se trata de planejamento deli-

que eu consumi individualmente. Eu pensava que ao final

cado, de reconhecer as necessidades ao longo dos dias.

da semana eu estaria com uma sacola cheia, mas aca-

Nos primeiros dias me percebi completamente obce-

bei me surpreendendo bastante com a pouca quantida-

cada pelo destino das coisas: Para onde vão? Por quan-

de de itens, que foram: uma lata de Coca-Cola, uma garra-

to tempo ficarão na terra até que se decomponham?

fa de água mineral de 500 ml, uma cartela de remédio, um

Comprei alguns apetrechos para o início de viagem,

saquinho plástico para guardar talheres (desses de restau-

mas só alguns, porque como Cristal disse em sua pales-

rante), outro saquinho plástico e algumas tiras de papel.

tra, e não poderia ser dito melhor, “às vezes o consu-

Só isso? Fiquei inconformada, questionei

mo mais consciente é não consumir”. Então lá fui, uma

várias vezes se fiz tudo certo. Diante desse resul-

sacola de pano, que por incrível que pareça, eu não

tado curioso, eu formulo duas hipóteses:

tinha; dois sacos de pano, um de padaria e outro mul-

1. Uma semana não é suficiente para analisar o consumo de lixo. 2. Quanto à minha alimentação, o fato de realizar boa

tiuso; um copo retrátil, que me lembra os que eu tinha quando eu era criança; um pano de algodão encerado, para substituir o tão adorado plástico filme; e um

parte das minhas refeições em casa pode reduzir con-

shampoo em barra, que deixaria meu cabelo um pouco

sideravelmente o impacto no meu consumo, e conse-

estranho, mas também pouco tem importância.

quentemente, no volume de resíduos produzidos.

Comecei o projeto muito empolgada, mas ao longo

Mesmo sem enfrentar dificuldades em reali-

dos dias fui me cansando, mesmo porque não há pausa:

zar a tarefa, passei a refletir mais sobre o meu consu-

o lixo está em tudo. Consegui ir ao hortifrúti e não com-

mo e como eu faço o descarte do lixo. “Será que isso é

prei nada embalado, somente o que podia ser carrega-

considerado reciclável?” Esse pensamento me ocor-

do nas sacolas que levei. Tomei café no copo reutilizável.

reu várias vezes enquanto consumia alguma coisa.

Levei minha própria garrafa de água para a faculda-

O ato de jogar alguma coisa no lixo muitas vezes

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. Foto: Luiza Müller

de. Comprei a granel. Uma porção de coisas que talvez

nos passa despercebido, não refletimos sobre o lugar

não pareçam importantes, mas cortaram meu consumo

no qual esses resíduos vão parar. Separar um tempo

– não só de lixo – pela metade. Pense bem, se todos con-

para essa experiência me fez pensar na nossa como-

sumíssemos pela metade, quantas coisas desnecessá-

didade em ignorar uma questão tão importante.

rias não se acumulariam em cada uma de nossas casas?

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Consumidora experimentando peça vendida em brechó de luxo

cas optam por reutilizar materiais descartados por algum motivo ou adotar matérias-primas que inicialmente não seriam pensadas para produzir algo no mundo da moda como transformar garrafas pet em tecido. Segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), os principais nichos da moda sustentável são a produção com fibras naturais (algodão orgânico, linho, lã, cânhamo) ou com tecidos alternativos, como pet ou de fibra de bambu ou, também, reaproveitamento de rejeitos de tecidos, couro ou materiais sintéticos descartados pela indústria. Segundo pesquisas do The Boston Consulting Group (BCG) de 2017, o processo de produção e extração de matéria-prima é responsável por 16% dos inseticiFotos: Giuloia Pontes e Sophia Olegario

AS TENDÊNCIAS DA MODA SUSTENTÁVEL A inovação e inteligência da moda sustentável está tomando conta de passarelas e do gosto dos consumidores

das, 7% dos herbicidas e 4% dos fertilizantes de nitrogênio usados no mundo. Tais produtos químicos, quando utilizados excessivamente, atingem os lençóis freáticos e contaminam a água, proporcionando uma queda no nível de oxigênio dela. Além da contaminação, a grande quantidade de água utilizada na produção têxtil é preocupante. É estimado que a indústria utilize 79 bilhões de metros cúbicos de água, esse número equivale a 32 milhões de piscinas olímpicas. Surpreendentemente, nos próximos 12 anos, o consumo desse bem ainda deve crescer 50%. De acordo com pesquisas do BCG e do GFA, países que possuem maior culti-

com o ecossistema, uma vez que são

vo de algodão, como China e Índia, terão

GIOVANNA TUNELI

diversos os impactos negativos que ela

de escolher, daqui alguns anos, entre

»»»Se por um lado o desenvolvimen-

causa, indo desde a contaminação dos

continuar com a produção ou reservar

to da moda é um fenômeno sociocul-

lençóis freáticos até o desmatamento

a água limpa para beber.

tural, já que, conforme o estudo The

e à prática de trabalho escravo.

No processo de malharia e fiação,

Pulse of Fashion 2017 feito pelo Global

A moda sustentável, resumidamen-

quando as fibras se transformam em

Fashion Agenda (GFA), 60 milhões de

te, preza pelo respeito tanto ao meio

tecidos, o impacto ambiental é enorme

pessoas estão empregadas na cadeia

ambiente quanto à sociedade, valori-

e visível, já que as máquinas gastam uma

produtiva e a receita gerada por ela é

zando as pessoas que trabalham no pro-

grande quantidade de energia elétrica e

de 1,5 trilhão de euros. Sob outro ponto

cesso e sempre incentivando o consumo

há grande emissão de gases, como o gás

de vista, a indústria têxtil pode acabar

consciente. Com essa proposta, as mar-

carbônico. Segundo o estudo The Pulse of

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PAÍSES QUE POSSUEM MAIOR CULTIVO DE ALGODÃO, TERÃO DE ESCOLHER ENTRE CONTINUAR COM A PRODUÇÃO OU RESERVAR A ÁGUA LIMPA PARA BEBER

Fashion 2017, esses problemas estão alta-

Shoes também tem em pauta a questão

Débora Martins é estudante e adepta

mente atrelados ao aquecimento global e

da reciclagem de materiais. No último

da moda ecológica. Diz que seu interes-

ao efeito estufa. Desmatamento e gran-

ano, a empresa reutilizou 6640 garrafas

se por esse estilo de produção aumentou

de utilização de petróleo também estão

plásticas, 391,69 metros quadrados de

por causa da mão-de-obra escrava que

na lista dos pontos negativos da indús-

tecido e mais de 2 mil quilos de borra-

muitas marcas ainda mantêm. “Comecei

tria têxtil. O levantamento mostra que

cha. Fundada em 2014, por Barbara Mat-

a pensar antes de comprar, não ajo mais

o poliéster, por exemplo, que é a fibra

tivy, a Insecta Shoes possui a essência de

por impulso, só compro aquilo que real-

sintética mais usada na indústria têx-

ser vegana, ecológica e enaltecer a bra-

mente preciso e sei que vou usar”, diz.

til, gasta 70 milhões de barris de petró-

silidade, com isso a marca possui diver-

Conforme a Pesquisa Akatu 2018, 70% dos

leo para ser produzido, além de demorar

sos certificados.

consumidores brasileiros preferem um

cerca de 200 anos para se decompor. A

estilo de vida sustentável, o que reflete

viscose, outro tipo de tecido feito da celu-

na indústria da moda diretamente. Segundo Harumy Yamaguchi, o mundo

lose, provoca a derrubada de 70 milhões

está cada vez mais antenado e preocupa-

de árvores anualmente.

do e, cada vez mais, a forma como consuIniciativa brasileira

mimos tende a se tornar obsoleta. “Mui-

Preocupados com o meio ambiente e

tas pessoas estão mudando o olhar para a

o ecossistema, algumas marcas foram

forma de consumir, e estão optando por

criadas com propósitos sustentáveis. É

comprar marcas que tenham um com-

o caso da loja Joaquina Brasil, que utiliza

promisso com o meio ambiente e com a

excesso de tecidos descartados por gran-

sociedade”, completa a representante de

des fabricantes e matéria-prima com

mídias sociais da Joaquina Brasil.

pequenos defeitos que não comprome-

Pesquisas apontam que o consu-

tem a qualidade das peças. Além disso,

mo consciente passa por quatro eta-

a representante de mídias sociais da loja

pas: questionamento; busca por marcas

Harumy Yamaguchi, diz que eles procu-

com responsabilidade socioambiental;

ram se tornar uma marca zero waste, ou seja, que não produz nenhum lixo, com a

Etiqueta do brechó Luz da Villa fala sobre a essência da loja

bom uso do produto; descarte adequado. “Qualquer esforço é válido, mesmo que

missão de reaproveitar todo e qualquer

você compre uma peça de roupa que não

retalho na fabricação.

seja de uma marca ecológica você conse-

“Hoje em dia, muitas marcas prati-

gue fazer com que ela se torne sustentá-

cam o greenwashing, se apropriando

vel tanto pela boa utilização do produto

de propósitos para que possam cres-

quanto pelo descarte dela”, fala a con-

cer e fazer sucesso, mas a sustentabili-

sumidora de moda sustentável Débora.

dade na moda tem de englobar todos os

São inúmeras as opções de se descartar

processos da empresa, e não apenas o

uma peça que não se utiliza mais, como o

midiático”, diz Harumy. Cálculos do The

Projeto Gaveta que consiste em um clube

Pulse of Fashion Industry 2017 mostram que os investimentos em sustentabilidade aumentam a lucratividade e que não tomar nenhuma ação reduzirá as margens de ganho. Ainda assim, é comum que empresas digam que tomam atitudes sustentáveis – uma vez que há pressão social quanto ao tema – e mantenham o sistema de produção inalterado. A loja de calçados e acessórios Insecta

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“Mesmo que você compre uma peça de roupa que não seja de uma marca ecológica você consegue fazer com que ela se torne sustentável” Débora Martins, consumidora de moda sustentável

de troca de roupas e o aplicativo Enjoei, no qual pessoas colocam à venda produtos que não utilizam mais. Outras maneiras de ser sustentável e estar na moda também se tornaram válidas quando o assunto é ajudar a melhorar o ecossistema. Brechós, locais onde se vendem peças usadas por um valor menor que o vendido na loja, ganharam vários adeptos,

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sem comprar nada novo, apenas criando combinações com as peças existentes. “Roupa não é descartável, com o armário-cápsula aprendemos a repetir e a inovar com o pouco que temos”, disse a jornalista. É importante ressaltar que, nesse número restrito de peças de roupa, incluem-se também os acessórios como bolsas, lenços e sapatos. Além de prezar pelo ecossistema e não incentivar o consumismo, outro valor agregado a esse conceito é uma produção mais humanizada, sem exploração de quem os confecciona, proporcionando um salário mais justo. Harumy, representante das mídias sociais da loja Joaquina Brasil, conta que a marca emprega mulheres em situação de vulnerabilidade social, detentas e ex-detentas, acolhendo, oferecendo resgate de autoestima, profissionalização e geração de renda. “A ideia da marca veio com a insatisfação da fundadora Roberta Negrini com a realidade da moda. Apesar de não trabalhar com isso, sua indignação começou ao assistir um documentário de moda que falava sobre condições análogas à

Frequentadores de brechó procuram ver a qualidade das peças antes de comprá-las

escravidão, após isso, quis saber mais e quis fazer diferente”, conta Harumy sobre a criação da Joaquina Brasil.

incluindo a atriz Julia Dalavia, que em

ótimas roupas, que sejam versáteis, que

uma entrevista para Pure People con-

combinem entre si e que representem o

Trabalho artesanal

tou: “Acho legal procurar mais roupas

que você é. O conceito armário-cápsula,

De acordo com um levantamento do

em brechós, afinal, as peças vão continu-

criado em 1970 por Susie Faux e consoli-

Sebrae, a sustentabilidade na moda tem

ar rodando pelo mundo por alguns anos.

dado pela estilista Donna Karan, consiste

crescido e conquistado espaço devido ao

Dá para montar looks bem descolados”.

em uma coleção de peças básicas e atem-

trabalho de ateliês, cooperativas e ofici-

Há vários tipos de brechós, indo desde

porais que, aliadas a peças de estação,

nas, que, muitas vezes, se localizam em

aqueles com peças com preço mais aces-

deixariam a pessoa sempre bem vestida

comunidades carentes. Assim, propor-

sível até os de luxo, que possuem somen-

e atual. Com a popularidade do concei-

cionando uma visão que a moda sus-

te produtos de marca.

to, foi lançado o Project 333 que propõe

tentável não se resume somente à pre-

a montagem de um guarda-roupa com

ocupação com o meio ambiente, mas

Armário-cápsula

somente 33 peças para serem usadas

também com a sociedade que vive nele.

A jornalista Sílvia Henz é adepta do

durante três meses.

Isso mostra que a sustentabilidade pode

armário-cápsula e em uma entrevista

Tal conceito pode ser considera-

ser resumida como o compromisso de

ao programa Mais Você disse que não

do uma técnica que preza por escolher

estabelecer o equilíbrio entre o sucesso

há regras rígidas quanto ao número de

uma quantidade limitada de peças para

econômico, progresso social e preserva-

peças, desde que você tenha poucas e

vestir durante um tempo determinado,

ção ambiental.

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MINIMALISMO: QUEM ACREDITA NO PODER DO DESAPEGO MATERIAL? seguem atualmente. O estoicismo, con-

apostam no “comprar melhor”. A desig-

ceito criado na Grécia antiga, apontava

ner comenta que a grife tem usado a ideia

que a felicidade deveria ser o centro da

de buy less (compre menos), mas com-

»»»Na contramão do consumo e da

vida das pessoas, e o estado de felicida-

pre coisas melhores e que durem mais,

produção desenfreada de bens mate-

de era inteiramente ligado à simplicida-

para não ter tanta produção, sem sen-

riais, surgiu a prática do minimalis-

de. O clichê “menos é mais” é um refle-

tido. “Algumas empresas estão come-

mo. O termo, conhecido por incenti-

xo claro dessa ideia.

çando a incentivar isso, como a Vivien-

GUILHERME SANTIAGO YASMIN MARCONDES

var o desapego material, proporciona

Uma pesquisa sobre o panorama do

ne Westwood, que desincentiva a compra

mais do que uma sala vazia e sem mui-

consumo no Brasil, realizada pelo Ins-

da própria marca”, exemplifica Beatriz.

tos objetos de decoração. Quem adota

tituto Akatu em 2018, evidencia que

e coloca em prática esse estilo de vida

diariamente somos bombardeados

Consumo consciente

tem em mente otimizar o seu tempo

com propagandas e anúncios que nos

Área expoente para a onda do consumo

para viver o melhor que o nosso coti-

influenciam a comprar e consumir sem

com mais consciência, a economia com-

diano tem para oferecer. O conceito

uma reflexão sobre se a compra é real-

portamental surgiu em meados de 1970,

chama a atenção de muitas pessoas

mente necessária. O estudo concluiu

e para Carolina Ruhman Sandler, espe-

e existem, ainda, aquelas que o prati-

que 76% dos consumidores brasileiros

cialista no assunto, é essencial o equilí-

cam sem saber, como a jornalista Rosa-

se mostram indiferentes em relação ao

brio na hora de gastar o salário. “O ideal

na Radke. “Eu já aplicava o minimalis-

que e como estão consumindo. Porém,

é que a pessoa gaste até 30% da renda

mo sem saber, eu usava sem conhecer

mesmo com a alta carga de influências

com compras, presentes e lazer”, afir-

o termo”, conta.

externas, há pessoas que decidem mudar

ma a especialista, que está à frente do

de vida e escolhem viver apenas com o

site Finanças Femininas, plataforma de

necessário.

educação financeira.

Com as redes sociais e os influenciadores digitais em expansão, os estímu-

Mas objetos materiais agregam à rea-

los ao consumo se tornam cada vez mais presentes em nossas vidas. Diariamente

Reduzir é a nova regra

lização pessoal? Para Carolina, a respos-

somos bombardeados com propagandas

Viver com menos peças de roupas, por

ta é: não. E existem estudos psicológicos

e anúncios que nos impulsionam a com-

exemplo, é viável. A jornalista Rosana

para sustentar a conclusão.

prar e consumir.

Radke diz que vive com três pares de

De acordo com o pisicólogo Tim Kas-

Há quem pense que o estilo de vida

calça. O consumo de moda sustentá-

ser, quanto mais materialistas somos,

minimalista é moderno e totalmente

vel, segundo Beatriz Poletto, designer

maiores as chances de desenvolvermos

contemporâneo, mas cuidado, apesar

de moda e repórter digital da Harper’s

depressão e outros distúrbios. “Quando

de o termo ter sido cunhado no século

Baazar Brasil, ainda está engatinhan-

compramos, vem uma descarga hormo-

20, esse estilo de vida é antigo: é preci-

do. Parece loucura, não? Mas, em con-

nal grande de dopamina, ficamos felizes,

so revisitar a história para encontrarmos

trapartida às muitas marcas que produ-

mas por pouco tempo, aí se inicia um

a origem dos ideais que os minimalistas

zem peças e mais peças, algumas grifes

ciclo sem fim”, comenta Carolina.

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ESTUDO DO INSTITUTO AKATU APONTA QUE 76% DOS BRASILEIROS SÃO INDIFERENTES AO QUE ESTÃO CONSUMINDO O QUE SE DIZ SOBRE O MINIMALISMO Fotos: Arquivo pessoal

Fernanda Marinho

Rosana Radke

Marília Savio

Rebeca de Moura

Trabalha com Educação

Entrou de cabeça nesse esti-

É formada em Publicidade e

É arquiteta e acredita

Corporativa. Ela adotou o

lo de vida em 2016. A jorna-

mora em São Paulo.

que o minimalismo vai

estilo de vida minimalis-

lista, que divide o seu tempo

Para ela, o minimalismo

muito além da decoração

ta após enfrentar proble-

entre ser mãe, ter um canal

consiste em eliminar

e de regras para serem

mas de saúde, ter ido morar

no YouTube e cuidar da

tudo aquilo que não faz

seguidas. Segundo ela,

com sua mãe e precisar eco-

casa, acredita que a prática

mais sentido em sua vida.

minimalismo é encontrar o

nomizar dinheiro. Para ela,

do minimalismo, ou consu-

A principal mudança

equilíbrio e cada indivíduo

o minimalismo não é uma

mo consciente, como prefe-

que a decisão de largar

desenvolve uma prática

característica de uma pes-

re chamar, fez com que ela

o supérfluo e escolher o

particular do minimalismo.

soa e sim uma forma de

aprendesse mais sobre si

essencial trouxe para ela foi

Rebeca acredita que esse

ver a vida. “Significa focar

mesma e o que é realmen-

na maneira de consumir.

estilo de vida também

naquilo que é essencial para

te importante. “A partir do

“Visitava shoppings com

pode ser aplicado no

você e desapegar do que é

momento em que eu apren-

objetivo de comprar.

modo como a pessoa se

supérfluo”, diz. “É um exer-

di a identificar o que é mais

Essa necessidade era

comporta na sociedade.

cício constante de foco e

importante, eu soube como

emocional e descontrolada,

Além disso, conta que

escolha consciente”, expli-

destinar o meu tempo”, afir-

não comprava porque

“falar menos, falar quando

ca. Atualmente, Fernan-

ma. Para ela, a máxima de

precisava, consumia

necessário e ouvir mais”

da compartilha suas experi-

que tempo é dinheiro não

apenas para me sentir

são atitudes que condizem

ências e ideias em um blog

tem vez. Rosana conside-

bem”, conta Marília.

com o minimalismo. Ela

(www.minimalizo.com.

ra que tempo é vida, e dire-

“Passei a ter mais tempo,

se deu conta que seria

br) e conta que o principal

cioná-lo para o que é real-

equilíbrio emocional,

necessário alterar a

benefício que esse jeito de

mente importante é o seu

praticidade e energia

forma como levava a vida

levar a vida trouxe redução

grande aprendizado sobre

positiva”. Atualmente, ela

quando percebeu que

de gastos e, por consequ-

o minimalismo “As pes-

administra uma conta no

era muito jovem para ter

ência, mais independência

soas não costumam pen-

Instagram com mais de 100

tanta coisa. “Aprendi a

financeira. Para ela, adotar

sar no quanto vale o tempo

mil seguidores e mostra a

não acumular um monte

esse estilo significa se des-

delas, elas apenas con-

possibilidade de decorar

de coisa negativa e coisa

vincular de alguns hábitos

somem sem pensar.”

com estilo minimalista.

que não serve para nada.”

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MOBILIDADE URBANA:

DESAFIOS DA SUSTENTABILIDADE E DA INSERÇÃO SOCIAL Projetos de transportes não-agressores ao meio ambiente travam uma batalha contra a era do hiperconsumo Foto: Luca Carloni e João Paiva

GIOVANNA TUNELI

»»» Mobilidade urbana consiste em na facilidade que a população tem para se locomover de um local a outro em uma

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cidade. As alternativas para o transporte podem ser desde as mais consumistas – que costumam respondem às necessidades de apenas uma pessoa, com alto grau de poluição do ambiente e reforço aos congestionamentos – até aquelas que contemplam a sustentabilidade. Além disso, a mobilidade dá às pessoas a chance de escolher se inserir ou não no contexto social já que o

O patinete, além da bicicleta, tem sido um dos principais meios de transporte limpo adotados nas cidades

carro as isola por meio do vidro fechado, enquanto o transporte público permite maior interação entre as pessoas. Segundo a empresa de compartilha-

tilhados de se locomover, contribuímos

A pesquisa da Rede Nossa São Paulo

mento de bicicletas Tembici, um estudo

para a queda da emissão de carbono no

mostrou que 60% dos paulistas possuem

feito pela Ipsos, com bases nos dados da

meio ambiente. Um exemplo disso é o

pelo menos um carro, tal número se mos-

Denatran (Departamento Nacional de

Bike Sampa, por meio do qual foram

tra preocupante, pois a maioria das pes-

Trânsito), em 2018, aponta que o inte-

economizados 2,6 milhões de quilos em

soas se isola em uma bolha em seus veí-

resse por tirar carteira de motorista caiu

emissões de carbono”, diz Alline Roble,

culos e não se insere socialmente na

20,6% entre os jovens na faixa dos 18 aos

coordenadora da área de Comunicação

comunidade.

21 anos. Como alternativa de um meio

Corporativa da empresa Tembici. Com

Por mais que o interesse e a procura

de transporte sustentável e de inserção

mudanças no transporte público, melho-

por alternativas sustentáveis de loco-

das pessoas no contexto social, a bicicleta

rias nas ciclofaixas e a conscientização

moção tenha crescido, a comodidade de

conquistou destaque na questão mobili-

das pessoas sobre a poluição causadas

automóveis ainda é convidativa ao con-

dade. Projetos como o Bike Itaú oferecem

por automóveis, o consumo sustentá-

sumidor de mobilidade. O motorista da

bicicletas em pontos estratégicos pela

vel de transporte teria grande aumento,

Uber Francisco Fernandes diz: “Percebo

cidade, de maneira prática e econômi-

de acordo com um estudo da mexicana

que os passageiros não se importam no

ca, já que uma hora de uso custa R$ 5. Em

Claudia Cortés sobre os meios de trans-

quanto irão gastar, e sim com a praticida-

2015, um estudo feito pela Rede Nossa São

porte brasileiro.

de e o conforto que o carro proporciona”.

Paulo e pelo Ibope Inteligência concluiu

De acordo com Alline, os meios de

que 44% das pessoas que não se locomo-

transporte se mostram como um viés de

vem por meio da bicicleta têm resistên-

inserção das pessoas no contexto social,

cia por causa da segurança.

ao facilitarem o deslocamento e criarem

O empresário Marcos Dantas tem como

contato de pessoas de diferentes cama-

seu principal meio de transporte a bici-

das sociais. O empresário Dantas afirma

cleta e relata que a melhoria mais impor-

que a diferença entre a percepção do con-

tante e necessária quanto essa forma de

texto social no carro e na bicicleta é gri-

mobilidade é fazer as pessoas entende-

tante. “Dentro do carro você se fecha em

rem que bicicleta também tem que ser

uma bolha, enquanto na bicicleta a gente

respeitada no trânsito.

se envolve mais com o que acontece ao

“Como incentivamos meios compar-

44-45 - mobilidade e coletores.indd 32

nosso redor”.

Consulte a galeria de imagens sobre mobilidade em SP

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Foto: Nensuria/iStock

Feito de silicone, o coletor é reutilizável e pode durar até dez anos

PERÍODO SUSTENTÁVEL Tabu? Coletor menstrual pode ser a melhor opção para o seu bolso e para o meio ambiente quando oxida pois entra em contato com AMANDA KRAINER

o ar ou com o algodão.

O copinho também é conhecido pela praticidade, pois pode ser utilizado por

»»»Você já ouviu falar em coletor

A função do coletor se assemelha ao

até 12 horas seguidas, não incomoda e

menstrual? Feito de silicone hipoaler-

absorvente interno, no entanto, a dife-

não traz risco de vazamento. Giselle

gênico, ele nada mais é que um “copi-

rença é que este, além do sangue, absor-

Ferreira Bastos disse que resolveu usar

nho” de uso interno, em formato de

ve também outros fluidos vaginais sau-

o coletor para ter mais autonomia com

cone, que colocado no canal vaginal

dáveis, enquanto o coletor recebe apenas

o seu corpo, coisa que não tinha com

serve como um depósito do sangue da

o sangue, sem alterar a flora vaginal.

outros absorventes. “Decidi usar pela

menstruação. Patricia Versolato utili-

Segundo a ginecologista e obstetra Dilma

liberdade de poder ir no mar e na pisci-

za há dois anos e afirma que a transi-

de Moraes, qualquer mulher pode usar o

na sem me preocupar, além de ter tam-

ção para o coletor mudou sua relação

coletor, com exceção das que ainda não

bém o quesito ambiental”.

com a menstruação, mas percebe que

tiveram relação sexual, pois o mesmo

as mulheres ainda sentem preconceito.

pode romper o hímen.

Considerando a questão ecológica, o coletor é vantajoso já qcue uma mulher,

O primeiro registro de um coletor foi

ao fim de sua vida fértil, poderá ter uti-

feito em 1937, mas não houve populari-

lizado uma média de 10 a 15 mil absor-

zação na época. Nos anos 2000 o coletor

ventes descartáveis, sendo que cada um

voltou à cena e, com as redes sociais e a

pode levar até 100 anos para se decom-

onda de influenciadores digitais, as mar-

por. O copinho pode durar de 5 a 10 anos

cas passaram a divulgá-los mais.

se utilizado, higienizado e armazenado

Atualmente, a Agência Nacional de

corretamente conforme as orientações.

Vigilância Sanitária (Anvisa), já regu-

Assim, o benefício do uso do coletor se

larizou a venda e o uso no Brasil desde

odores da menstruação, quem usa não

“Decidi usar pela liberdade de poder ir no mar e na piscina sem me preocupar, além de ter também o quesito ambiental”

sente nada, pois o sangue só cheira mal

Giselle Ferreira Bastos

que o material do coletor seja atóxico e que não contenha fragrâncias e/ou inibidores de odores. Por mais que os coletores não tenham cheiros e nem inibam os

44-45 - mobilidade e coletores.indd 33

torna mais atraente, pois são vendidos entre R$ 80,00 e R$ 100,00, mas duram até 10 anos, já os absorventes descartáveis tradicionais custam entre R$ 5,00 e R$ 15,00 por mês. “Acho ecologicamente correto e excelente financeiramente falando”, afirma Dilma de Moraes.

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CANUDOS DE METAL: INOVAÇÃO OU TENDÊNCIA? Com a proposta de reduzir os prejuízos ao meio ambiente, produto tem sido bastante procurado por consumidores

AMANDA ROZENBLIT ISADORA MORAES

coisa que há pouco tempo mal existia, se

verdadeiro vilão do meio ambiente não é

tornou viral em questão de meses. Quan-

o canudo de plástico. “Não faz diferença

tos stories no Instagram você já viu de

você comprar um canudo de metal e dei-

»»» O queridinho da vez é o canudo

pessoas usando esse canudinho? Eles

xar de usar cinco canudos em um perío-

de metal, opção com menos impac-

estão em todos os lugares! “Eles viraliza-

do de dois meses, mas continuar usan-

to na natureza que se tornou tendên-

ram pois são algo que depende da atitu-

do 30 sacolas de plástico cada vez que

cia nas redes sociais. A nova aposta

de de cada um em si, não de grandes ins-

vai no supermercado.” Ainda comple-

sustentável não visa somente a redu-

tituições. O impacto dessa mudança será

ta que o uso do canudo reutilizável tem

ção do consumo de plástico, mas tam-

muito positivo”, conta Nathalia Nazaré,

um impacto muito pequeno.

bém propõe aos seus consumidores

criadora e administradora do Canudos

Você sabia que o resíduo resultan-

um lifestyle diferenciado e autên-

do Bem, que vende canudinhos reutilizá-

te dos canudos de plástico represen-

tico. Mas será que essa alternativa é

veis de alumínio. A fundadora diz que os

ta 4% de todo lixo do mundo, de acor-

um projeto eficaz de conservação do

diferenciais de sua empresa são o preço e

do com a Universidade da Georgia nos

meio ambiente?

as opções de canudos em diversas cores.

EUA? Então, esse é um número signi-

Nos últimos tempos, um dos objetos

Mas há quem discorde desse pensa-

ficativo. Porém, levando em conta que

que mais vemos nas publicações das

mento. Maria Luiza Silvestre, estudante

ainda existem aqueles outros 96%, vale

redes sociais é o canudo de metal. Uma

e ativista da causa ecológica expõe que o

pensar que os canudos de plástico não

46-47 - sustentabilidade.indd 46

31/05/19 19:41


Michelle Patrick Photography LLC/iStock

representam todo o mal que se faz ao

do canudo de metal é muito pequena

meio ambiente. O biólogo Ismael Fer-

perto dos reais problemas que a socieda-

nandes, ao ser questionado sobre a efi-

de enfrenta. As pessoas não ligam para

ciência dos canudos de metal, contou

a poluição causada pelos plásticos que

que eles ajudam um pouco no processo

realmente são nocivos para o planeta.

de sustentabilidade, mas que são ape-

Por exemplo, as garrafas pet desses esta-

nas uma parte da engrenagem. “Mesmo

belecimentos podem ser recicladas, mas

que eles sejam modinha, ainda ajudam o

o processo é complicado por conta dos

ambiente. Uma campanha de conscien-

rótulos, que também são de plástico”,

tização passa por educação ambiental

ela diz. Ou seja, é possível perceber que

diferenciada, com sensibilização. Temos

os canudos de metal, apesar de repre-

de mostrar a bela natureza para que haja

sentarem uma inovação no contexto da

vontade de preservar’’, ele diz.

sustentabilidade, são insuficientes para

Uma forma que a Canudos do Bem

uma mudança mais significativa.

encontrou de incentivar práticas sus-

De nada adianta criar políticas susten-

tentáveis foi através da diversidade de

táveis sem antes mudar as políticas eco-

seus produtos. “O objetivo da empresa é

nômicas. ‘’É necessário rever o sistema

inserir o canudo reutilizável não só como

econômico. Não tem como conciliar o

uma necessidade, mas também como

que vivemos em termos de obsolescên-

um acessório de moda, trazendo per-

cia programada e ainda querer ser sus-

sonalidade e autenticidade para quem

tentável. Ou é um ou o outro”, diz bió-

usa”, diz a empresária Nathalia Nazaré.

logo Ismael Fernandes sobre qual seria

Em contraste, ativista Julia Benzatti

a forma ideal de pararmos de poluir o

expõe sua visão negativa sobre as pes-

meio ambiente.

soas que utilizam esse produto e postam

Além de tudo, ainda temos que lem-

em suas redes sociais. “Esse pessoal que

brar a questão da acessibilidade desse

usa o canudinho só para ficar postando

produto no mercado. A administradora

no Instagram não é realmente susten-

do Canudos do Bem afirma que o públi-

tável. Eles só querem criar uma imagem

co alvo da empresa são pessoas de clas-

R$ 20

boa de si mesmos”, ela lamenta.

se média e classe média alta. De acordo

» É o custo em média de um conjunto com cinco canudos de metal

A tendência da anulação de uso dos

com dados do Ibope de 2017, as classes

canudos de plástico não chegou só às

C, D e E correspondem a 80% da popula-

redes sociais, mas também ao univer-

ção do Brasil. Logo, pode se inferir que,

so alimentício. Essa questão está modi-

na hora de selecionar seu produto na

ficando a conduta ecológica de algu-

prateleira, essas pessoas tendem a dar

4%

mas das maiores multinacionais, como a

preferência aos produtos mais baratos e

Starbucks. A rede de cafeteria traz a pro-

volumosos. Será que é possível falar de

posta de banir os canudinhos em todos

inovação e sustentabilidade sem enten-

os países que atua até 2020, inclusive no

der o que está por trás desse discurso?

» Do lixo mundial é representado pelos os canudos de plástico

Brasil. A expectativa é de que 1 bilhão de

46-47 - sustentabilidade.indd 47

canudos sejam economizados por ano.

Com R$ 20 é possível adquirir cinco canudos de metal e mais uma escova

Mas de que adianta parar de utilizar os

higienizadora no site canudosdobem.

canudos se basicamente todos os outros

com.br, enquanto com os mesmos R$ 20,

utensílios que utilizamos no dia a dia são

pode-se comprar mais de 300 canudos de

feitos de plástico? Essa é uma das per-

plástico descartáveis no site www.ame-

guntas que a ativista Maria Luiza colo-

ricanas.com.br. Qual opção você esco-

cou em pauta. “Eu acho que essa onda

lheria?

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Fotos: Arquivo Pessoal Carmen Migueles

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p&r

ENTREVISTA: CARMEN MIGUELES PROFESSORA E PESQUISADORA

O CONSUMO NÃO É SÓ UM ATO SOCIAL, MAS POLÍTICO CARMEN MIGUELES, ESTUDIOSA DO TEMA, EXPÕE AS COMPLEXIDADES IMPLÍCITAS ÀS NECESSIDADES CRIADAS PARA INCENTIVAR O CONSUMISMO E COMO LIDAR COM ELAS EM UMA SOCIEDADE DESIGUAL

Sociologia das Organizações e mestre LUIZA MÜLLER

em Antropologia do Consumo, ambos

»»»Frente às mudanças vertiginosas

os títulos conferidos pela Universida-

da tecnologia, o mundo se entregou ao

de de Sophia, em Tóquio, Japão. Carmen

consumo tal como se esperava. É o fre-

assina a autoria dos livros Antropologia

nesi dos plásticos, hardwares e todo o

do Consumo: casos brasileiros e Crian-

tipo de bugiganga inventiva que o seres

do o hábito da excelência.

humanos não pensavam necessitar que

Na rede labiríntica das vontades e

transforma o hiperconsumo em mode-

moralidades que se ligam ao ato de con-

lo dominante na sociedade atual. Incer-

sumir seja lá o que for – informação, ali-

tas sobre a real motivação de seus dese-

mentos, bens duráveis ou não –, Carmen

jos e impacientes por um novo mundo,

afirma que essa ação é inerente ao ser

as pessoas ainda não compreendem

humano e à sua integração à sociedade.

se de fato o homem quis e promoveu

“Precisamos consumir até para negar o

o desenvolvimento da técnica ou se a

consumo. A relação do ser humano com

técnica inventou esse novo modelo de

a cultura material não é simples e dire-

homem. Para explorar as singularida-

ta, é múltipla, complexa e cheia de ten-

des da contemporaneidade, uma época

sões”. Segundo a professora, o consu-

única e marcada pelo consumo, convi-

mo não é só um ato social, mas político.

damos a professora Carmen Migueles

Nesta e nas próximas páginas, ela conta

para um bate-papo com a Plural.

um pouco mais sobre as nuances e com-

Graduada em História, é doutora em

48-53 - pingue_luizamuller.indd 49

plexidades dessa temática.

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Foto: Karimpard/iStock

Em seu livro Antropologia do consumo, você diz que o homem pode se posicionar politicamente por meio do consumo. Como isso se dá? Isso ocorre de diferentes formas. A cultura material é parte da cultura de

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uma sociedade. A relação entre os seres humanos e as coisas se dá sempre por meio de uma mediação cultural. Podemos preferir empresas que prometem cuidado com o meio ambiente. Ao fazê-lo, reduzimos a necessidade de regulação e criamos estímulos no mercado para que as empresas atuem de forma alinhada com nossos valores. Quanto mais os indivíduos consomem de forma consciente e orientada por valores, mais as empresas precisarão ter isso como parte da sua proposta de valor.

Como o Estado pode incutir as empresas a assumirem certos posicionamentos?

Segundo Carmen, as pessoas consomem por razões diferentes

As empresas, ao longo do século XX e neste começo do século XXI, cresceram de tal forma que extrapolaram os limites dos estados nacionais. As formas como atuam impactam na vida de

o PIB de muitos países. Há uma imbri-

milhões, e o Estado tem pouco poder

cação cada vez maior entre cidadania e

sobre determinadas pautas. Se pensar-

consumo e os gestores das marcas em

mos que o Estado, como a instituição

muitas delas estão conscientes disso. A

Podemos observar isso de modo con-

que conhecemos, não existia até a idade

força da marca está cada vez mais cal-

creto, por exemplo, em uma mensagem

moderna, veremos que isso pode não

cada sobre a reputação, e menos sobre

que é vazada por uma rede social sobre

ser grave. Mas é um pouco assustador

as promessas ou o imaginário que a

o comportamento de um membro ou

porque não sabemos ainda o que colo-

publicidade criava em torno dos pro-

grupo de membros de uma organização,

car no lugar nem para onde o fluxo da

dutos no passado. E reputação é menos

que, se for contrária à ideia do públi-

história está nos levando. Passamos por

sobre o que nós falamos sobre nós mes-

co a respeito da empresa, pode fazer

uma série enorme de rupturas recentes,

mos e mais sobre tudo aquilo que faze-

com que o consumidor, nesse mundo

no Brasil e no mundo, e vemos a corro-

mos. Essa interação entre os valores

de escolhas cada vez mais constantes,

são da legitimidade de muitas das nos-

da empresa e a reputação construída

se desligue emocionalmente daquela

sas instituições.

no mercado vem ganhando concretu-

organização e migre para outra. A vola-

de. Há um certo “retorno ao concreto”

tilidade é a marca desse nosso momen-

Com base nesse cenário, como as empresas se encontram nos tempos modernos?

nessa questão. E quando falo de retorno

to e entender essas novas tribos, que

ao concreto estou me referindo a uma

se articulam na forma de propostas de

tendência contrária ao glamour do ima-

um mundo melhor ou de resistência a

As empresas cresceram e o fatura-

ginário das marcas que vivemos ante-

essas propostas, passa a ser relevan-

riormente.

te. Compreendemos pouco ainda essa

mento de algumas delas é maior do que

48-53 - pingue_luizamuller.indd 50

Isso pode ser observado no dia a dia por meio de ações ou é uma tendência silenciosa?

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“QUANTO MAIS OS INDIVÍDUOS CONSOMEM DE FORMA CONSCIENTE E ORIENTADA POR VALORES, MAIS AS EMPRESAS PRECISARÃO TER ISSO COMO PARTE DA SUA PROPOSTA DE VALOR”

imbricação entre cidadania e consumo. Mas vemos claramente que a lógica que rege o consumo é de lealdade a certa cosmovisão. Consumimos de forma coerente com nossos valores e

RAIO-X Nome: Carmen Migueles Origem: Rio de Janeiro Formação: Graduada em História; mestre em Antropologia do Consumo e doutora em Sociologia das Organizações

crenças e esses valores e essas crenças é o que nos unem às nossas comunidades de referência.

Por que temos essa vontade constante por exclusividade? Porque é bom se sentir único. Queremos ser amados e ter uma relação com outro ser humano real, concreto. É a mesma coisa sobre reconhecimento, valorização pessoal, e coisas assim. Esse é um processo natural de indivi-

“A TRÍADE AMBIÇÃO, COMPETITIVIDADE E HEDONISMO NOS INCOMODA POR SER O OPOSTO DE VALORES QUE TEORICAMENTE SERIAM MELHORES, COMO HUMILDADE, COLABORAÇÃO E ESPIRITUALIDADE”

duação. Lutamos por isso. Inconscientemente, quando crianças, disputamos com irmãos o amor dos pais. E o mundo dos bens é, para nós, um conjunto de recursos para fazer isso. É claro que em sociedades mais coletivistas, em que o individualismo é de certa forma repri-

conta dessas coisas e que aqueles que

mido, busca-se reconhecimento por

amamos estão protegidos e bem cuida-

outros meios. Mas ainda assim a ten-

dos. E isso é consumo. Dá muita satis-

são entre pertencer e se diferenciar

fação trabalhar duro e chegar na sexta

também está presente. A autoestima e

à noite e celebrar com um bom vinho

autoimagem estão relacionadas ao fee-

em boa companhia. Felicidade já é outra

dback desse reconhecimento. Como diz

questão bem mais fugidia. Eu acho que

Lacan, o olhar do outro é um espelho

o problema está menos no consumo e

em que nos vemos refletidos. Queremos

mais no desconforto que sentimos com

que esse olhar do outro nos diga o quan-

a desigualdade e com os exageros.

to somos especiais. Em uma sociedade

“CONSUMIMOS DE FORMA COERENTE COM NOSSOS VALORES E CRENÇAS E ESSES VALORES E ESSAS CRENÇAS É O QUE NOS UNEM ÀS NOSSAS COMUNIDADES DE REFERÊNCIA”

na qual sucesso material é importan-

Como equacionar essas questões?

te, a exclusividade é duplamente rele-

Como dizem os budistas, há duas

vante: ela reflete a minha capacidade

maneiras de estar mais satisfeito:

de sucesso e os meus valores, meus gos-

obtendo mais ou desejando menos.

tos e sabores.

Aqui caímos no despenhadeiro das virtudes humanas. Os mais virtuo-

O consumo gera satisfação ou felicidade?

sos teoricamente desejariam menos e estariam mais satisfeitos com pouco.

Precisamos olhar para o consumo de

Os menos virtuosos e mais hedonis-

forma mais neutra moralmente. O olhar

tas desejariam mais. E isso nos parece

de condenação moral ao materialismo

errado em um mundo desigual. A tríade

e o hedonismo nos faria dizer que não.

ambição, competitividade e hedonismo

Mas não é verdade. É claro que o con-

nos incomoda por ser o oposto de valo-

sumo gera satisfação. É muito bom ter

res que teoricamente seriam melhores,

conforto. É muito bom poder pagar uma

como humildade, colaboração e espiri-

excelente escola para os filhos e um

tualidade.

bom plano de saúde. Não é bom não ter essas coisas e se sentir sempre se equi-

48-53 - pingue_luizamuller.indd 51

librando na borda de um abismo. Há um

Como poderíamos procurar o equilíbrio entre o desejo e a contenção?

conforto enorme, no fundo da alma, de

Eu particularmente acho que essa é

saber que estamos conseguindo dar

uma questão individual. A capacidade

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“A CAPACIDADE DE CONTER-SE DEMANDA DISCIPLINA PESSOAL, QUE DEPENDE DO GRAU DE AUTONOMIA DE CADA UM”

de conter-se demanda disciplina pessoal, que depende do grau de autonomia (cuja etimologia é auto + nomos = capacidade de autogestão, de dar a si mesmo a regra) de cada um. Pessoas

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mais inseguras têm mais dificuldade

“NO LIMITE, O SAUDÁVEL É O QUE FAZ BEM E O PREJUDICIAL É O QUE FAZ MAL.MAS O PENSAMENTO POLARIZADO É SEMPRE RUIM, POIS LEVA A BECOS SEM SAÍDA”

com isso. Pessoas que foram criadas com muito pouco idem, querem provar o outro lado. Há também quem ache que estar bem vestido, ter uma casa elegantemente decorada é uma questão de dignidade. As pessoas são diferentes e consomem por razões diferentes.

pessoas deveriam pensar sobre isso e

E o que é o desejo desbragado e o que é

fazer o seu trabalho com a maior cons-

uma questão de hábito e estilo de vida

ciência possível dos impactos.

também são importantes para levar em conta. Para uma pessoa de família muito pobre comprar um tapete persa pode ser um ato de esnobismo gigan-

Qual é o limite entre o saudável e o prejudicial quando falamos sobre consumo?

tesco. Para uma pessoa criada em uma

Não sei se há um limite claro. Nem

casa com esses tapetes é uma peça de

se sei se deveríamos dizer qual é esse

reposição. Para outro pode significar a

limite. No limite, o saudável é o que

valorização de um produto artesanal

faz bem e o prejudicial é o que faz mal.

de alta qualidade.

Mas o pensamento polarizado é sempre ruim, pois leva a becos sem saída.

Você acredita que há um modo de fazer publicidade que contribua para o consumo consciente?

Por exemplo: um hidratante pode fazer

Nossa, essa pergunta é difícil. Não

e de embalagem. E se eu parar de hidra-

acho que essa seja a função da publi-

tar a minha pele e todos os outros me

cidade. É claro que quanto mais as

seguirem, os que trabalham nesse setor

empresas competirem em merca-

estarão desempregados. Uma pessoa

dos nos quais os cidadãos demandem

com pele oleosa pode achar isso fres-

consciência dos impactos, mais a publi-

cura. Uma pessoa com a pele muito seca

cidade falará sobre isso e mais as pes-

pode sentir um grande desconforto sem

soas pensarão sobre isso, criando um

isso. Onde está o equilíbrio? Conscien-

certo círculo virtuoso de consumo cons-

tes das consequências que nosso consu-

ciente. Mas acho que a principal fun-

mo causa, devemos fazer o maior esfor-

ção da publicidade é apoiar a estraté-

ço possível por mitigar os impactos. As

gia de marketing das organizações. Isso

empresas buscarem cada vez saídas

garante a sua sobrevivência. Não sei até

mais limpas para a produção e procu-

que ponto a publicidade deveria trazer

rarmos todos cada vez mais formas de

sobre si a responsabilidade por promo-

reprocessar as embalagens.

bem para a minha pele, mas gera resíduo decorrente da poluição industrial

ver uma sociedade melhor por algum tipo de “ativismo propagandístico”. É claro que, em certa medida, todas as

48-53 - pingue_luizamuller.indd 52

A desigualdade social interfere na possibilidade de consumo consciente?

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Sim, muito. Um exemplo disso é uma mãe de menor renda que terá que alimentar os filhos com uma forte restrição de recursos. Pode desejar comprar produtos orgânicos, mas eles são mais caros. E são mais caros por uma questão básica de custo de produção. Se comprar orgânicos, talvez não consiga vestir e calçar as crianças. O consumo sempre se dá em uma hierarquia de sacrifícios.

mesmo que ainda tenhamos muita desi-

Quando há forte restrição de recursos,

gualdade no Brasil, não somos mais a

precisamos abrir mão de coisas que são

mesma sociedade de 50 anos atrás.

muito importantes para nós, para ter,

Vemos a desigualdade hoje, mas nem

por exemplo, dinheiro para ir ao médi-

sempre a vemos em uma linha histó-

co em uma emergência. Nesse caso, é

rica.

melhor comprar frutas não orgânicas do que não comprar frutas, mesmo que idealmente se considere as orgânicas melhores.

A similaridade entre os produtos também contribui nesse sentido? Sim. Uma outra questão é que, hoje, com a competição entre marcas, a dife-

Quais os principais fatores que levaram a sociedade a essa consciência de excessos?

renciação está cada vez mais difícil. Há

Acho que são fenômenos interliga-

lidade e por preços menores. E muita

dos. O primeiro deles é que o próprio

gente diz: isso para mim está ok. Há

nível de saciedade traz essa sensação

uma erosão da capacidade de se dife-

de excessos. Hoje temos muitas coisas.

renciar por meio do consumo.

marcas novas, mais baratas do que muitas tradicionais, com bom design e qua-

E as coisas ficaram muito mais baratas

No limite, quem investe muito nisso

do que no passado. Facilmente nossas

pode ser visto como excêntrico, gente

casas se transformam em um depósi-

que “precisa se mostrar por alguma

to de coisas que não queremos mais. E

razão”. Há uma erosão da legitimidade

ter coisas dá trabalho. Elas precisam

desse tipo de recurso de distinção. Ele

de cuidados. Outro ponto importante

não traz o mesmo benefício que no pas-

é que as sociedades evoluíram muito e

sado. Além disso, é preciso considerar que a diferenciação das coisas faz muito sentido em sociedades em que as coisas são difíceis de serem obtidas. O que se obtém de retorno pelo investimento em coisas hoje é mais baixo. Nesse contexto, quem sabe ser simples talvez adquira mais “capital simbólico”.

“COMO DIZEM OS BUDISTAS, HÁ DUAS MANEIRAS DE ESTAR MAIS SATISFEITO: OBTENDO MAIS OU DESEJANDO MENOS. AQUI CAÍMOS NO DESPENHADEIRO DAS VIRTUDES HUMANAS”

Só somos se consumimos? Novamente caímos em uma questão moralista. E na verdade, dado que somos animais, encarnados em um corpo físico, no limite só somos se consumimos. Precisamos comer, vestir, morar, precisamos de remédios, de muitas coisas. E consumir é sobre adquirir essas coisas. Mas até em um

“VEMOS A DESIGUALDADE HOJE, MAS NEM SEMPRE A VEMOS EM UMA LINHA HISTÓRICA”

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sentido “social” acho que a pergunta é retorica – pois como dissemos, até o monge precisa do hábito... e isso é consumo.

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54

Fotos: Divulgação

FILMES QUE NOS LEVAM ÀS COMPRAS (OU NOS AFASTAM DELAS)

Os Delírios de Consumo de Becky Bloom conta a história de Rebecca, moradora de Nova York que sonha em trabalhar para uma famosa revista de moda

No cinema há tanto obras que criticam o consumismo quanto aquelas que os incentivam

Brad Pitt incorporou Tyler Durden, o icônico vendedor de sabonetes que funda um clube da luta e mostra a seus adeptos como viver uma vida longe do consumismo Todos eles fazem uma crítica às consequ-

vão a Las Vegas para a despedida de sol-

ências do consumismo para o ser huma-

teiro de um deles. Tudo termina com

no. Em Clube da Luta, por exemplo, há

muita gastança em jogos de azar, garo-

»»»O tema não é novo quando se trata

uma das falas mais icônicas e represen-

tas de programa e suposto divertimen-

de obras cinematográficas. Existem

tativas na luta contra o consumismo pro-

to. Marca já registrada da cidade, nada

diversos filmes que fazem críticas,

feridas por Tyler Durden, personagem

do que foi retratado na trilogia de filmes

algumas de forma implícita, sobre o

interpretado por Brad Pitt. “Temos tra-

é novidade. Porém, criou-se uma ima-

processo de exuberância dos persona-

balhos que odiamos para comprar coi-

gem de satisfação ao final do filme que

gens para que, ao final, este seja visto

sas que não precisamos”.

leva as pessoas a conhecer e consumir

FABRICIO JULIÃO FILHO JOÃO PEDRO MELLO

de maneira depreciativa.

54 - cinema.indd 54

No entanto, algumas obras tam-

na “cidade do pecado”. Até gente vesti-

Entre os mais conhecidos estão Clube

bém fazem o inverso em suas propos-

da como Alan (o personagem engraçado

da Luta, de David Fincher, Os Delírios de

tas cinematográficas de atrair o públi-

e problemático do filme) hoje é atração

Consumo de Becky Bloom, de P.J.Hogan,

co. A franquia de filmes Se Beber Não

em Las Vegas para estimular o comér-

e Psicopata Americano, de Mary Haron.

Case conta a história de três amigos que

cio na cidade.

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Foto : Junior de Oliveira / Estúdios ESPM

COLABORADORES

JUNHO DE 2019 ANO 8 // NÚMERO 15

1 Gabriel Bittante  2 Guilherme Santiago  3 João Mello  4 Fabrício Julião  5 Amanda Krainer  6 Luiza Müller  7 Luca Carloni  8 Isabelle Bulla  9 Lucas Bastos 10 In Hwan Oh 11 Renata Freire 12 Sophia Olegário 13 Fernanda Shikay 14 Yasmin Mazzeo 15 Luiza Consul 16 Maria Victória Brizzi 17 Isadora Moraes 18 Amanda Rozenblit 19 Giovanna Tuneli 20 Ariel Serafim 21 Yasmin Marcondes 22 Maria Clara Jorge 23 Gabriela Soares 24 Giulia Pontes 25 Priscila Antunes 26 Aline Chalet 27 Isabella Puccini Juca Trentin Borgui Giovanna O. Almeida

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