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Por que a gente fala assim no zap?
GIZMODO
NA VIDA REAL OU VIRTUAL, AS PESSOAS BUSCAM DEMARCAR SEU GRUPO E O VOCABULÁRIO QUE NASCE E CRESCE ONLINE AJUDA NESSA TAREFA
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por LAURA CAPELHUCHNIK
Plataformas como o WhatsApp solicitam uma linguagem diferente
Sem o auxílio das expressões do rosto, dos gestos ou da oscilação no tom de voz, criamos novas regras de linguagem para nos fazer entender no WhatsApp, em fóruns da internet, nas redes sociais. Uma reação natural diante da necessidade de se comunicar em uma nova plataforma. Basta lembrar de “alô”, a saudação que nasceu dedicada ao atender o telefone. Modificar (às vezes abolir) a pontuação e criar novas grafias e expressões para estabelecer um diálogo online faz parte da tentativa de “restaurar nossos corpos na escrita“, como define a linguista americana Gretchen McCulloch, autora do livro Because Internet, sobre as novas regras de linguagem. É como se a linguagem formal tivesse “menos alma” do que a informal: quando falamos com um amigo pessoalmente, por exemplo, movemos as mãos, franzimos as sobrancelhas, sorrimos. No telefone, sem o apoio dos movimentos do corpo, temos a ajuda do tom e do volume da voz, das risadas e dos ruídos para passar os recados como achamos que eles devem ser passados. Já na troca de mensagens escritas, não há um sinal do corpo sequer. São mais escassos, portanto, os recursos para contextualizar a fala, deixá-la mais ou menos intensa, mais feliz ou mais irônica.
E é nessa busca por contextualizações que uma nova linguagem repleta de memes entra em cena na internet.
“Memes são conteúdos informacionais, jargões passados adiante sem que a gente consiga em grande medida rastrear sua origem. Essa é a definição basilar do que se conhece por meme“, explica Viktor Chagas, professor de comunicação e fundador do Museu de Memes, projeto responsável por reunir em um acervo online a produção nacional de memes e as pesquisas relacionadas aos temas.
“Tá serto” e “só que não”, por exemplo, têm sido as expressões favoritas na internet para demarcar ironia e sarcasmo. Elas também entram na categoria meme. Segundo Viktor Chagas, o primeiro aspecto importante para entender como algumas palavras ganham popularidade de uma hora para outra é a ideia de reconhecimento e pertencimento a determinadas comunidades, dentro e fora da internet.
CATRACA LIVRE
Meme “ata” legenda capa de edição do Almanaque da Mônica e se torna um meme viral na internet
Muitas dessas gírias surgem na versão legendas de imagens, como o “ata” e “Sem tempo, irmão”. A expressão “Grande dia!”, que viralizou em grupos políticos de direita, por exemplo, é derivada de um jargão do presidente Jair Bolsonaro para comemorar suas vitórias políticas e as dificuldades da oposição. A mensagem, acompanhada de um emoji de joinha, foi adotada pelos seguidores do presidente, em contextos descolados dos tuítes que a originaram, para denotar entusiasmo. São usadas em figurinhas, em comentários de fóruns, em mensagens do WhatsApp. “Grande dia!” ganhou ainda mais projeção ao ser apro-
priada por opositores políticos do governo, desta vez de maneira irônica, para ridicularizar seguidores da família Bolsonaro. Gramáticas particulares também ascendem quando queremos nos diferenciar dos outros. É o caso do dialeto pajubá, falado pela comunidade lgbtq+ no Brasil. Começou a ser usado entre os anos 1960 e 1970, como uma espécie de língua cifrada, para proteger seus falantes. Era um jeito de despistar a repressão durante o regime militar brasileiro, segundo Keyla Simpson. Expressões furam suas bolhas porque as comunidades se conversam e se reconhecem pelas relações sociais. Na medida em que pessoas se inserem em grupos, levam adiante suas expressões culturais, carregando parte do repertório para outros círculos dentro da sociedade. Na vida real, isso não é lá muito novo. As gírias sempre estiveram por aí para dar identidade aos grupos sociais. A diferença é que WhatsApp, Facebook, Instagram, Twitter e outros pontos de encontro online oferecem o que talvez sejam as melhores condições de temperatura e pressão já vistas para a sua proliferação: são inéditas a velocidade e a escala dos encontros entre as múltiplas comunidades e suas bagagens de memes. A internet não perdoa.
Cantora Gretchen que viralizou como meme pela comunidade lgbtq+ nas redes sociais