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Maioria dos jovens não conversa
MARIANA PEKIN
INTIMIDADE EM CONSTRUÇÃO
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DOIS PAIS FALAM SOBRE OS DESAFIOS DA CONSTRUÇÃO DA PATERNIDADE E DA CRIAÇÃO DE LAÇOS DE INTIMIDADE COM OS FILHOS
por MARINA PAGNO
Ismael dos Anjos e Pedro Fonseca, respectivamente, são os pais que compartilharam suas experiências com a paternidade
ISMAEL DOS ANJOS
Pai do Francisco, de 8 anos “Sou pai socioafetivo do Francisco. Além da mãe, meu filho tem dois pais: eu e o pai biológico. A relação de paternidade socioafetiva não tem vínculo biológico, mas tem vínculo de afeto e de confiança que se desenvolve. E isso só se desenvolve ao longo do tempo e da relação. Eu não virei pai do dia pra noite, foi uma construção.
Justamente por não ter o vínculo biológico, eu só sou pai do Francisco porque em algum momento a gente entendeu que tem uma relação de afeto. E não tem nada mais forte do que ter um vínculo de amor, de confiança e de afeto que ninguém mandou você ter, que não foi obrigado, que não tem uma desculpa biológica ou social. É uma relação que se desenvolveu e pra mim isso é muito bonito. Eu me emociono muito toda vez que ouço um “pai” vindo dele.
Acho que estabelecer o diálogo e a confiança são as principais maneiras de estabelecer intimidade. Desde o início eu tenho o hábito de abaixar e olhar no olho dele para entender o que ele estava falando e sentindo. Quero que meu filho me veja como alguém que ele possa se apoiar, tirar dúvidas, chorar, sorrir, brigar, ficar bravo,
SE A GENTE CRIAR ESSES TABUS AQUI DENTRO, VAI VIR DE FORA
e que ele não vai ter menos amor, carinho e compreensão por isso. A paternidade é uma viagem muito doida. Eu penso: “que sorte eu tive”. Eu respeito muito a decisão de quem decide não ter filhos, não é para todos. Mas eu não trocaria um segundo. Eu não economizo nem um “te amo”. É diferente do que eu vivi. Meu pai foi um cara presente, mas tivemos uma relação menos afetuosa, mais clássica de masculinidade, pautada pela autoridade, pelo respeito e pelo medo. Não vamos mudar séculos de uma paternidade que se baseia em três “P”, que são procriar, proteger e prover, para magicamente estar centrada no cuidado. Aprendo muito.
Até o último dia da minha vida eu vou estar em uma relação de aprender, ensinar, falar, ouvir, dialogar, trocar, errar e acertar. E ele vai me desafiar em coisas que eu nunca pensei, vai trazer coisas que eu nunca imaginei, eu vou ter que descobrir como lidar, descobrir se eu sei aconselhar”
MARIANA PEKIN
Ismael dos Anjos, pai do Francisco
PEDRO FONSECA
Pai da Irene, 10, da Teresa, 8 e do Joaquim, 5. cEu tive que imaginar como ser pai muito cedo. Aos 21 anos, uma namorada engravidou. Nessa época, minha ideia de paternidade era uma fantasia imatura, frágil e autocentrada. Eu achava que ser pai era sobre mim. Acabamos perdendo o filho por uma complicação no terceiro mês da gravidez. Doze anos depois, quando eu finalmente me tornei pai, entendi que a paternidade é tudo, menos sobre mim mesmo.
A chegada dos filhos representou um impacto gigantesco em todos os papéis da
minha existência. E essa transformação não parou quando a chegada dos filhos pararam. É um aprendizado que não termina, se a gente estiver atento vai aprender constantemente a cada minuto.
Vivemos em um tempo de desconhecimento, porque passamos a conviver através das telas, passamos a não olhar no olho das pessoas. E diante de um filho a gente tem que se olhar no olho para se reconhecer. Para mim, o que rege uma relação de intimidade de um pai com os filhos é o reconhecimento. É eles conseguirem reconhecer a minha humanidade, quando estou forte, fraco, feliz, triste… E o contrário também, quando eu consigo simplesmente de olhar e conversar com eles, reconhecer em que momento eles estão.
Eu não tive uma relação íntima com o meu pai. Nós, ele e eu, não construímos isso. Mas essa não é a escolha que eu quero fazer para a minha vida. Eu tenho construído uma relação de afeto e intimidade com meus filhos de maneiras muito diferentes, porque eles são criaturas muito diferentes umas das outras com suas personalidades. Para mim, a paternidade é um convite radical, diário, de coisas simples e sutis, mas também de coisas complexas, para pensar na minha masculinidade.
Pedro Fonseca, pai do Joaquim, Teresa e Irene