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Entrevista: Maria Homem
INSTITUTO CLARO
QUASE NUNCA A GENTE É TOTALMENTE HARMÔNICO COM QUEM NOS SOMOS
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A PSICANALISTA MARIA HOMEM FALA SOBRE DIFICULDADES DE CHEGAR EM UMA FASE DA VIDA NA QUAL O PASSADO DÁ SAUDADE E O FUTURO ASSUSTA
por LUARA CALVI ANIC
Maria Homem é psicanalista, pesquisadora do Núcleo Diversitas e professora na faap
Se a vida fosse uma montanha a ser escalada, os 40 anos seriam o pico. Não necessariamente representando o auge profissional, pessoal, muito menos a felicidade plena. Mas uma fase em que é possível olhar para o passado e para as escolhas feitas até aqui com alguma maturidade. Pensar se elas ainda fazem sentido e, então, imaginar o futuro que se almeja.
A psicanalista Maria Homem faz essa analogia com uma montanha para explicar o ponto de vista de quem, a partir dos 40, tem o privilégio de fazer essa revisão. Acontece que, às vezes, a paisagem não é agradável. Não à toa, pesquisas mostram que, nessa fase da vida, há uma alta incidência de depressão, ansiedade e insônia.
As causas são diversas e incluem, além da responsabilidade com pais, filhos, com nós mesmos e com o trabalho, a consciência da finitude. “A vida não é infinita. Não é que eu posso fazer tudo. Você vai enrolando até hoje tal assunto, até que não dá mais”, diz a Gama.
Na conversa a seguir, ela fala dos desafios de uma fase que se inicia aos 40 e do poder da conversa – com nós mesmos e com nossos pares – para encarar desafios, medos e crises. A gente nostalgiza, romantiza a primeira parte.
COMO EU ANDO, COMO EU FALO, O QUE O OUTRO VAI ACHAR DO QUE EU SOU, O QUE É O MEU CORPO
A CHAMADA CRISE DA MEIA-IDADE, QUE NO GERAL PARECE CHEGAR A PARTIR DOS 40 ANOS, EXISTE?
A crise da meia vida existe certamente. Tem que existir. Como eu ando, falo, o que o outro vai achar do que eu sou, como vou usar essa roupa, o que é o meu corpo, como vou encostar no corpo do outro, como eu vou existir, o que é reprodução da vida, com quem eu vou me aliar para fazer essa reprodução da vida, etc.
É POSSÍVEL SE RECONSTRUIR CASO O QUE SE VÊ NÃO SEJA SATISFATÓRIO?
Aos 40, 50 você pode se reinventar, se repensar, cada vez mais a gente tem esse direito. Isso é uma especificidade da crise da meia-idade no contemporâneo. A gente vive hoje uma era que tem um lado angustiante porque você pode se construir. Era muito mais fácil obedecer, seguir a tradição.
COMO COSTUMA FICAR A RELAÇÃO COM PAIS E FAMILIARES?
Aos 40 você tem que fazer uma dupla jornada, começa a entender que é um arrimo senão econômico, mas tem algum lugar de responsabilidade com três gerações. Se a gente não sacaneia no jogo, essa crise da meia-idade é porque estamos no ápice em relação a todas as idades sociais.
E COMO LIDAR COM ESSA CRISE?
É claro que você pode fazer o que quiser da vida. Temos percursos e dúvidas, não precisamos apenas de tristeza e depressão. Mas também se a gente se defende muito do envelhecimento e da morte. Aí tem depressão, ansiedade porque você vê que não produz tanto quanto produzia, não corre tanto quanto corria. E se a gente puder fazer isso juntos, é a graça do laço social.
FAAP