O seu combustível
O primeiro passo é encontrar uma espécie de microalga ideal para a produção. Para isso, ela precisa ter um ótimo crescimento em cultivo e um alto teor de lipídios. Esses lipídios formam a matéria-prima dos biocombustíveis
O processo utilizado pelo Laboratório de Cultivo de Algas para extrair biodiesel das microalgas Lipídios
Cientistas do Laboratório de Cultivo de Algas da UFSC tem pesquisado quais são as melhores microalgas para a produção de biocombustíveis
B
iocombustíveis tem a vantagem de serem renováveis - entretanto normalmente envolvem plantação, precisando de grandes áreas de cultivo, dependendo de safras e podendo degradar o solo. Mas não precisa ser assim. Países como Estados Unidos, Alemanha e Brasil tem pesquisado a produção de biodiesel por meio de microalgas (saiba mais sobre elas no box da próxima página). Elas podem ser produzidas em tanques, e precisam apenas de água, luz, gás carbônico e nutrientes para sobreviverem. O problema é que é uma área de pesquisa recente, com questões a serem resolvidas antes da produção em escala industrial - e uma das principais delas é se o custo elevado em estrutura e pesquisa vale a pena. Por este motivo, o Laboratório de Cultivo de Algas, ligado ao Laboratório de Cultivo de Camarões da UFSC, em parceria com a Petrobrás e a Universidade do Rio Grande, pesquisou a partir de 2006 como este processo pode ser desenvolvido. A equipe, chefiada pelo professor Roberto Bianchini Derner, que estuda microalgas desde 1991, recebeu 80 mil reais da Petrobrás para fazer a pesquisa. Além do interesse em produção de biodiesel, as microalgas podem ser usadas para descontaminar águas utilizadas na extração do petróleo, além de servirem para a indústria de alimentos, cosméticos e remédios.
Infográfico: Rogério Moreira Jr. Fontes: Roberto Bianchini Derner e Rafael Garcia Lopes
As microalgas fazem fotossíntese, e precisam de luz para sobreviver. Por isso os tanques são iluminados por lâmpadas, normalmente de 40W, que simulam a luz do dia
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Nutrientes
Uma vez selecionadas, as microalgas vão para um meio de cultivo, composto de água, nutrientes e gás carbônico, e que precisa ser iluminado. Estes cultivos normalmente começam em recipientes com menos de um litro até irem para os tanques de produção industrial - a partir de 400 litros, no LCA
Uma tubulação passa por baixo do tanque lançando ar no meio de cultivo. O gás carbônico é absorvido pelas microalgas e utilizado na fotossíntese, além de regular o pH do meio de cultivo. O ar também agita a água, movimentando os nutrientes para que todas as microalgas possam absorvê-los
Centrifugação Força Centrífuga Biomassa seca
O triglicerídeo da microalga é dissolvido em metanol...
... dando origem a glicerina e aos ésteres do biocombustível
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A água compõe cerca de 85% da massa das microalgas, e precisa ser retirada para se conseguir a biomassa seca, e daí, o biocombustível. O processo acontece em estufas, que no LCA operam normalmente em 80ºC por 24h. É um processo delicado, pois os triacilglicerídeos, que compõe os lipídios, são frágeis e podem ser quebrados pelo calor. É destes triacilglicerídeos que é produzido o biodiesel
A parte verde da molécula do biocombustível corresponde a uma a cadeia de carbonos. É importante que haja entre 15 e 18 carbonos para que o biocombustível seja adequado para veículos. Como nem todas as microalgas produzem o mesmo tipo de lipídio, esta é mais uma variável que tem de ser levada em consideração pelos pesquisadores. Uma vez pronto o biodiesel, ele precisa ser avaliado pela ANP. O biodiesel de microalgas correspondem aos padrões (veja na próxima página)
Com o cultivo terminado, é necessário secar as microalgas, o que pode ser feito por centrifugação ou floculação. A vantagem da centrifugação é que ela demora menos - meia hora, em comparação com 24 horas que o agente floculante necessita. Por outro lado, a floculação é mais barata - o que levou a Petrobrás a exigir que a UFSC utilizasse este método na pesquisa. Os pesquisadores ainda não chegaram a um consenso sobre qual o melhor método a ser utilizado na produção de biodiesel
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A água do tanque é colocada numa centrífuga industrial. Com a rotação as células das microalgas são empurradas para as paredes externas da centrífuga, enquanto a água fica no centro. Depois de terminado, as microalgas são raspadas e colocadas num recipiente para irem à estufa
Água
Os lipídios retirados da biomassa seca da microalga são compostos de triacilglicerídeos, que precisam ser quebrados para se tornarem combustível. O processo de quebra se chama transesterificação
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Num ciclo que pode demorar de cinco a 20 dias, as microalgas consomem todos os nutrientes do cultivo, e por serem tantas, impedem a luz de alcançar todos os organismos. Para evitar que elas morram, o cultivo pode ser interrompido ou uma parte dele ser retirada, e acrescentada mais água e nutrientes
Nutrientes
10 micrômetros correspondem a um milímetro dividido em cem partes
Reportagem: Franscisco José Gomes Dantas e Rogério Moreira Jr.
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Não existe um único meio de se cultivar microalgas: cada espécie tem características diferentes. É por isso que os cultivos podem ser feitos tanto em tanques externos (ao ar livre) quanto em ambientes com temperatura e iluminação controlados. Uma das pesquisas desenvolvida na UFSC buscava saber qual o melhor método para cultivar três microalgas colhidas no Nordeste
Luz
vai vir
De microalgas a Biodiesel
Agente Floculante
Floculação
A membrana celular das microalgas tem cargas negativa, o que impede que elas se unam naturalmente, permanecendo suspensas na água. O agente floculante, entretanto, possui cargas positivas que fazem com que as microalgas se atraiam, formando um “floco” que se deposita no fundo do tanque de floculação. Depois só é necessário tirar a água e recolher as microalgas
O método da centrifugação é mais utilizado quando as microalgas serão aproveitadas na indústria de alimentos e remédios, porque o produto final não tem nenhum aditivo - o que acontece com o agente floculante, por exemplo Depois da ação do agente floculante , a massa de algas ainda precisa retirar o que sobrou de água passando por uma centrífuga - mas pode ser por uma menor do que a utilizada na centrifugação
Microalgas: Uma cÊlula, muitas funçþes Elas servem de alimentos para os animais, tratar åguas utilizadas na indústria, produzir energia e corantes - mas algumas espÊcies são tóxicas, inclusive para os seres humanos
P
Que bicho ĂŠ esse?
Como vai a pesquisa?
A palavra microalga engloba algas unicelulares que fazem fotossĂntese - mas que mesmo fazendo parte do memso grupo, podem ter formas muito diferentes entre si. HĂĄ representantes das microalgas tanto no reino Plantae quanto no Monera e Protista. Elas constituem o fitoplâncton, servindo como alimento de animais marinho. TambĂŠm sĂŁo responsĂĄveis por boa parte da produção de oxigĂŞnio da atmosfera.
A parceria entre a Petrobrås e o Labratório de Cultivo de Algas acabou em 2008, e atualmente a pesquisa sobre microalgas continua na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Na UFSC o LCA pesquisa o uso de microalgas para recuperar åguas usadas na indústria - o chamado sequestro de carbono. TambÊm se estuda, na årea da aquicultura, meios de se melhorar a alimentação dos camarþes com compostos produzidos por algas. Na årea de biodiesel, eles tem buscado pareceria com órgãos de fomento, mas atÊ agora nenhum resultado foi alcançado.
ara se ter uma ideia da importância das microalgas para os seres humanos, elas jĂĄ eram utilizadas hĂĄ sĂŠculos como fonte de alimento pelos kanembous, na Ă frica, e pelos astecas, no MĂŠxico. Os kanembous coletavam as microalgas no Lago Chade, enquanto os astecas no Lago Texcoco. PorĂŠm, sĂł no sĂŠculo 20 ĂŠ que esses microorganismos passaram a ter uma produção comercial, com o desenvolvimento do cultivo das espĂŠcies em tanques abertos e em sistemas fechados (fotobiorreatores). As microalgas possuem uma diversidade de aplicaçþes, por exemplo, servem de alimento para peixes, moluscos, crustĂĄceos, como suplemento alimentar, no tratamento de ĂĄguas residuais de indĂşstrias e agrĂcolas, na produção de energia e de corantes naturais. AlĂŠm desses e de outros usos, os microorganismos algais atuam na diminuição de gĂĄs carbĂ´nico (CO2) da atmosfera, pois o consomem e devolvem mais oxigĂŞnio do que o que precisam para respirar. Contudo, as microalgas nĂŁo possuem sĂł aspectos positivos, algumas espĂŠcies podem ser tĂłxicas para outros organismos, inclusive para o homem.
interferir no crescimento das microalgas sĂŁo a quantidade de nutrientes e a agitação da cultura em meio lĂquido. O cultivo pode ser realizado em poucos ou bilhĂľes de litros. Uma das vantagens das microalgas em relação Ă s plantas ĂŠ o curto ciclo de vida, de apenas algumas horas ou dias, conforme a espĂŠcie, e a nĂŁo necessidade de agrotĂłxicos. Outra vantagem das microalgas sobre a grande parte das plantas com valor para a agricultura ĂŠ que elas podem ser cultivadas com ĂĄgua do mar.
Cultivo As microalgas podem ser cultivadas em diversos sistemas de produção. Os mais comuns são os em tanques a cÊu aberto, com pouco ou nenhum controle de condiçþes como iluminação, temperatura e pH; ou nos fotobiorreatores, nos quais são controladas essas variåveis, o que possibilita alta produtividade. Outros fatores que podem
Tratamento de åguas residuais Um grande problema para alguns tipos de indústria Ê o que fazer com as åguas que são usadas na produção e que não podem ser jogadas nos rios sem serem antes tratadas. As åguas residuais podem conter metais pesados, óleos, detergentes, pesticidas, entre outros compostos tóxicos. Uma das empresas que investe em pesquisa
Animais Plantas Fungi Protista Monera
Quanto rende o biodiesel de microalgas?
Mil Litros de cultivo rendem ≈6,7kg
de biomassa Ăşmida, composta de algas antes de serem secas em estufas, onde dĂŁo origem a
Biodiesel de Microalgas corresponde aos padrĂľes da AgĂŞncia Nacional do PetrĂłleo Em fevereiro deste ano a ANP definiu os novos padrĂľes para os biocombustĂveis. Amendoim e Mamona tĂŞm Ăndices que vĂŁo alĂŠm do permitido
Ă?ndice de Acidez MĂĄxima
1 kg
de biomassa seca, do qual se extrai
300g
de lipĂdios que podem ser usadas para produzir
150ml de biodiesel
Massa especĂfica 900 kg/mď ?
850 kg/mď ?
micro algas
Fonte: Roberto Bianchini Derner, Rafael Garcia Lopes, Algaebase
nesse segmento de uso das microalgas ĂŠ a PetrobrĂĄs, que em parceria com a Universidade Federal de Rio Grande (Furg) e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) realizou de 2006 a 2008 o projeto Desenvolvimento de um pacote tecnolĂłgico integrado para a produção de biodiesel a partir de microalgas cultivadas em ĂĄgua de produção e salobra. O objetivo da empresa ĂŠ utilizar as ĂĄguas residuais da extração de petrĂłleo do pĂłlo de GuamarĂŠ-RN. Suplemento alimentar As microalgas tambĂŠm sĂŁo utilizadas para complementar a alimentação humana por meio de suplementos, que sĂŁo comercializados em pĂł e em cĂĄpsulas ou como ingredientes de outros produtos, por exemplo, massas, pĂŁes, iogurtes e bebidas. A vantagem dos compostos extraĂdos das microalgas ĂŠ que eles sĂŁo naturais, ao contrĂĄrio dos produzidos artificialmente. As
Para saber mais Microalgas, produtos e aplicaçþes (http://tinyurl.com/prodeapli), de Roberto Bianchini Derner e outros autores, publicado na Revista Ciência Rural, da UFSM, volume 36, nº 6; Revisão: Biotecnologia de Microalgas (http://tinyurl.com/biotecno), de Fabiano Cleber Bertoldi e outros autores, publicado no Boletim do Centro de Pesquisa de Processamento de Alimentos, da UFPR, volume 26, nº 1.
Ponto de fulgor
substâncias sintetizadas por esses microorganismos algais, como os ĂĄcidos graxos poliinsaturados (uma classe dos lipĂdios) e os pigmentos carotenĂłides (como o betacaroteno), possuem propriedades terapĂŞuticas. (F.D.)
Dados: ClĂĄudia Maria Teixeira e Maria Elizabeth Morales, do Instituto Nacional de Tecnologia, no documento “Microalga como matĂŠria-prima para a produção de biodieselâ€?