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Produção | Bovinos de leite

Paula Rego é responsável pela produção da marca Queijos do Vale, um projeto que começou ainda estudante e que lhe valeu 2 prémios InovAçores.

PRODUÇÃO | BOVINOS DE LEITE QUEIJOS COM ALMA

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"QUANDO SE FECHA UMA PORTA, ABRE-SE UMA JANELA", OU, COMO NESTA HISTÓRIA, ABRE-SE UMA PORTA MAIS LARGA. O FIM DAS QUOTAS LEITEIRAS, EM 2015, LEVOU UMA FAMÍLIA DE PRODUTORES DE LEITE, DA REGIÃO AÇORIANA DAS FURNAS, A CRIAR UM OUTRO NEGÓCIO ONDE PUDESSE ACRESCENTAR VALOR AO LEITE DA SUA EXPLORAÇÃO. FOI ASSIM QUE NASCEU A QUEIJARIA DAS FURNAS, DE ONDE HOJE, PASSADOS 6 ANOS, SAEM 6 VARIEDADES DE UM QUEIJO ÚNICO, FEITO A PARTIR DE UMA SALMOURA DE ÁGUA MINERAL PROVENIENTE DE NASCENTE VULCÂNICA. Por Ruminantes | Fotos FG

A QUEIJARIA

Como surgiu a queijaria?

Paula Rego (PR): A ideia surgiu em 2015, com o anúncio do fim das quotas leiteiras. Na altura, produzíamos em média 1 milhão de litros de leite e, se ultrapassássemos esta quantidade, seríamos penalizados. Foi então que decidimos fazer um derivado do leite, o queijo. Após um ano e meio de aprendizagem e experiências, abrimos, em 2017, a nossa primeira queijaria. "Não tínhamos experiência no fabrico de queijo, tivemos que aprender. O nosso primeiro professor foi o Youtube, mas depois tivemos a oportunidade de trabalhar com técnicos ligados à área, bem como a ajuda técnica e científica do Instituto de Inovação Tecnológica dos Açores (INOVA), até conseguirmos chegar aos produtos que temos hoje em dia. O nosso queijo amanteigado, por ser de pasta mole, não nos oferece muita dificuldade porque temos o ingrediente mais importante: um leite de qualidade.

Que produtos fabricam?

PR: Produzimos aqui 6 variedades de queijo com a nossa marca, Queijo do Vale: amanteigado, meia cura, aromático com

orégãos; aromático com alho; aromático com tomilho e limão (sazonal) e um queijo com 8 meses de cura. Nesta fábrica temos capacidade para 2500 litros de leite por dia, o que representa uma produção de 500 queijos diários. Fabricamos também gelados e o ano passado apostámos nos bombons de queijo com vários dos nossos produtos regionais. Também fazemos queijadas de queijo.

Como chegaram a esta "receita" de queijo?

PR: A nossa ideia era fazer, para além de queijo, um queijo que fosse diferenciado. E isso passou por utilizarmos um recurso natural da nossa freguesia, a “água azeda”, uma água naturalmente gaseificada, vinda duma nascente vucânica, que tem um teor férreo mais elevado. Após ser banhado em salmoura, que é esta água azeda, o queijo absorve algumas características da água e adquire um sabor distinto.

Como comercializam o queijo?

PR: Na loja da queijaria, em várias lojas em Ponta Delgada, no Continente, na Madeira, na Alemanha e, em breve, chegará também aos EUA e ao Canadá.

Porque decidiram entrar neste negócio?

Carlos Rego (CR): No negócio do leite, como produtores não temos capacidade de discutir com a indústria. Em determinado dia do mês enviam-nos uma mensagem a informar se o leite vai subir ou vai descer, e não podemos fazer nada. Houve uma pessoa que me disse, um dia, que negócio ruim é aquele que dá subsídios…

Porque não há mais negócios como este?

CR: Por causa da burocracia. O país não se desenvolve por causa disso. E nós nem sequer pedimos qualquer tipo de ajuda financeira.

Como imagina este negócio em 2027?

PR: A ideia é melhorar o que temos e vender cada vez mais na nossa cafetaria.

A EXPLORAÇÃO LEITEIRA

Qual é a produção anual de leite da vossa exploração?

CR: Um milhão de litros. Neste momento 2/3 ficam na queijaria e 1/3 vai para a BEL, para o projeto das Vacas Felizes. Do leite que entra na queijaria, cerca de 10% é para o fabrico de produtos diferentes, como gelados, leite do dia, queijo fresco e bombons.

Quando começou a fazer queijo, mudou a forma de fazer leite?

CR: Tornei-me mais sensível à questão da conservação das silagens. Começámos a usar películas nas silagens de milho para evitar os bolores. Isso é muito importante para o fabrico do queijo. Fazemos silagem de erva e de milho.

DADOS DA EXPLORAÇÃO

Área total

Área de milho 70 ha (50+20) 18 ha/ano

Produção de leite da vacaria/ano 1.000.000 litros

Raça Holstein x Montbéliarde

Nº vacas em ordenha 100

GB (%) | PB (%) 3,7 | 3,2

Qual é o efetivo total?

CR: O nosso efetivo atual são 220 animais, dos quais 100 são vacas em ordenha.

Quantas ordenha faz por dia?

Fazemos 2 ordenhas diárias, mas o nosso objetivo é passar para apenas uma. Para isso, vamos mudar o nosso efetivo para Montbéliarde. Esperamos dessa forma reduzir o fornecimento de concentrado quase a zero, dando boas silagens e muitos minerais.

O cruzamento da Montbéliarde com a Angus pode dar uma carne de excelente qualidade. Atualmente trabalhamos muito Angus cruzada com Holstein, para produzir carne para a nossa cafetaria. Depois da pandemia, quando abrimos este espaço, constatei que quase só entravam turistas. Sempre achei que isso não era bom, por qualquer razão essa gente

Paulo Rego, responsável pelo dia-a-dia na exploração e seu pai, Carlos Rego.

A paisagem que deu o nome ao queijo "Queijo do Vale".

pode desaparecer. Como as pessoas aqui gostam de comer carne, começámos a produzir também para abastecer o nosso estabelecimento: as partes nobres vão para os pregos e o resto para hambúrgueres.

Porquê a raça Montbéliarde?

CR: Foi a pensar no leite A2A2, na robustez da raça e na possibilidade de alimentar as vacas quase exclusivamente com forragens. É uma raça com boa fertilidade, com poucos problemas de úberes e de patas e que dá boa carne.

Quantas vacas de leite A2 têm?

CR: Estão 23 identificadas (com coleira) como A2, mas esta identificação resultou de testes feitos há 4 anos. Daí para cá só inseminámos com touros A2, por isso o efetivo de A2 já é muito maior. Na primeira ordenha da manhã, entram primeiro as vacas A2, para o leite não se misturar com o outro.

Espera vir a diminuir a produção de leite com a Montbéliarde?

CR: O meu foco vai estar na produção de queijo. Acho que vou produzir menos leite, utilizando apenas erva, mas penso que não vou fazer muito menos queijo. Inclusivé, estou a pensar a fazer apenas uma ordenha diária porque também nos permite ter mais qualidade de vida.

A alimentação dos animais é muito importante para o queijo. É igual todo o ano?

CR: Praticamente todo o ano. A qualidade do leite mantêm-se quase sempre em 3,7% de gordura e 3,2% de proteína. A diferença está na qualidade da erva ao longo do ano, que nos pode fazer variar o rendimento queijeiro em até 20%. Para as pastagens que temos e o tipo de queijo que fazemos, o rendimento queijeiro é superior na primavera. Em média precisamos de 7,5 litros de leite para 1 kg de queijo.

Faz rotação de parques?

CR: Todos os dias, durante o dia, as vacas têm acesso a um parque novo, com 1 ha. À noite, depois da ordenha, ficam num parque de 0,5 ha junto à exploração e com acesso à mesma. Em média, passadas 3 semanas, voltam ao mesmo parque. De 3 em 3 anos fazemos a renovação da pastagem.

Atualmente, como é a alimentação das vacas?

CR: Genericamente, é igual todo ano: pastoreio todo o ano, silagem de milho e de erva e alguma ração.

Como prepara o terreno para a silagem?

CR: Antes de semear o milho, espalhamos o estrume sólido e lavramos em “cru” (a cerca de 40 cm profundidade). Esperamos uma semana, passamos o rototerra e semeamos. Quando tiramos o milho, dependendo dos terrenos, passamos com o subsolador e voltamos a semear azevém.

Face aos aumentos dos preço das matérias-primas e dos fatores de produção, tomou alguma decisão?

Sim, baixei a quantidade de ração por vaca, passei para 3,5 kg/vaca/dia e subi a silagem de milho. A produção desceu menos de 8%, o ano tem sido excelente para a pastagem e isso tem ajudado. Como não têm ração, comem mais pastagem.

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