O mais novo filme do brasileiro José Padilha, ROBOCOP, consegue levantar uma importante questão da sociedade moderna: é possível humanizar as máquinas e robotizar os humanos? por Henrique Januario, Raquel Temistocles e Sarah Mund
Prazer, ciborgue – A arte conceitual de RoboCop (2014) mostra o rosto de Joel Kinnaman ligado à máquina que mantém o que sobrou de Alex Murphy vivo depois de se tornar o policial-robô
ESTAMOS VIVENDO NO FUTURO. Mas não aquele dos Jetsons – ainda. Muito mais próximo do nosso dia a dia está o ciborgue eternizado pelo diretor Paul Verhoeven em 1987 e que ganha nova versão nas mãos de José Padilha (Tropa de Elite, 2007). Por incrível que pareça, a realidade vivida pelo robô-policial Alex Murphy não é tão absurda. “As próteses biônicas estão caminhando de forma interessante para chegar nisso. Claro que ainda falta muito e a coisa mudou mais do que imaginávamos que seria algumas décadas atrás. O homem está se aproximando dessa realidade. Não vai acontecer agora, mas num futuro não muito distante será possível um homem como o RoboCop”, confirma Nelson Nolé, sócio-fundador da Abotec (Associação Brasileira de Ortopedia Técnica). Isso mesmo. Seremos indestrutíveis em breve. Ou, pelo menos, seremos dominados por seres indestrutíveis. Resistência, visor computadorizado, GPS interno e acesso imediato ao banco de dados da polícia eram algumas das características do RoboCop já em 1987, há mais de 26 anos. Ou seja, o que Hollywood produz sempre dependeu da criatividade, não tem limite, ao contrário da ciência, que caminha a passos lentos por falta de materiais e pesquisas a serem desenvolvidas. Hoje, tecnologias vistas em filmes e que pareciam inatingíveis acabaram virando realidade. Em De Volta para o Futuro Parte II (1989), o filho de Marty McFly usa um óculos-computador durante o jantar. Seria uma visão do Google Glass? Em Apertem os Cintos, o Piloto Sumiu! – 2ª Parte (1982), há uma cena parodiando os antigos raios-X dos aeroportos, que aparentemente mostrariam as pessoas sem roupas. Hoje em dia, isso não só é possível, como já causou muita polêmica. Os testes de DNA caseiros de Gattaca - Expe riência Genética (1997) podem ser feitos de verdade atualmente através de serviços online. Todo mundo achou incrível Tom Cruise utilizando tela sensível ao toque em Minority Report: A Nova Lei (2002). ROBOCOP (2014) I
2 6 + M on e t + J U N H O
DISPONÍVEL NO NOW •
ROBOCOP (1987) I DIA 30, SEGUNDA, 23H50, TC CULT, 166 E 666 (HD)
MEU NOME É BORGUE, CIBORGUE
RoboCop não é o único a usar a tecnologia para exceder a capacidade humana. Relembre outros personagens do cinema que também desafiam os limites entre homem e máquina
BLADE RUNNER
O SATÂNICO DR. NO
ELYSIUM
Os replicantes eram ciborgues orgânicos criados para fazer trabalhos arriscados e degradantes. Possuíam força e habilidades além do comum.
O vilão do primeiro filme da franquia 007 perdeu as mãos por causa da radiação e utiliza próteses que lhe garantem força sobre-humana.
Em uma sociedade distópica, um trabalhador debilitado recebe de um hacker um exoesqueleto que lhe dá força suficiente para buscar justiça.
EU, ROBÔ
STAR WARS
Em 2035, um policial que não se dá bem com tecnologia deve investigar um robô homicida. Apesar de odiar as máquinas, ele mesmo tem um braço biônico.
Darth Vader teve os braços e pernas cortados pelo sabre de luz de Obi Wan Kenobi. A armadura lhe garantia novos membros e a sua icônica respiração.
O EXTERMINADOR DO FUTURO – A SALVAÇÃO
Ultrapassado? – O Alex Murphy de 1987 não era como a versão de José Padilha, que tem um design mais moderno e estrutura mais eficaz
Mais do que motivações voyeur ou militares, o que se vê atualmente é a ciência em busca da qualidade de vida de pessoas com deficiências físicas. Segundo Nolé, a China está empregando novas tecnologias em testes impressionantes com animais: “Eles conseguiram substituir a cabeça de um cachorro e mantê-lo vivo por algumas horas. Se eles conseguirem realizar uma ligação nervosa entre nervo ou medula rompidos e passar o sinal novamente para os membros, essa vai ser a grande explosão no mundo da mobilidade. Claro que tudo isso está em nível de pesquisa e não há nenhum resultado oficial ainda, mas seria a grande virada para pessoas com paralisia”, afirma. É o que vamos poder ver no dia 12 de junho deste ano. A grande cerimônia de abertura da Copa do Mundo da FIFA marca não só o início da campanha pelo hexa, mas também o pontapé inicial dado por uma pessoa paraplégica utilizando o exoesqueleto biônico do projeto Caminhar de Novo, liderado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. A estrutura é controlada pelo cérebro e envia sinais ao usuário, garantindo até a sensação tátil semelhante ao toque da pele. Este é mais um exemplo de ciência imitando a arte – independentemente de ser para criar um RoboCop ou o Inspetor Bugiganga.
FOTOS: DIVULGAÇÃO
Ninguém imaginaria o quão popular essa tecnologia estaria nos dias de hoje. Mas nem sempre todos esses avanços são tão bem aceitos, principalmente por causa dos impactos que causam nas relações sociais. Em RoboCop, a intenção de criar um policial meio homem meio máquina era conquistar a simpatia da população que via com maus olhos policiais-robôs. Como efeito colateral, a máquina com feições humanas ganhou também emoções e sentimentos que tornaram seu comportamento instável. É essa relação entre a autonomia do homem e o controle artificial que se tornou a grande discussão da atualidade. Um dos maiores entusiastas do Google Glass, o americano Robert Scoble sofreu na pele a tecnofobia quando foi hostilizado por estar usando o aparelho no festival de música Coachella. O medo das pessoas ao redor era o de serem vítimas de uma tecnologia que elas acreditam ser invasiva. Invasão essa que pode ser ofensiva para uns e essencial para outros.
Marcus Wright desconhecia sua condição, mas seu lado máquina não o impediu de doar o que tinha de humano a John Connor.