A História da minha Vida

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A HISTÓRIA DA MINHA VIDA A HISTÓRIA DA MINHA VIDA Um caminho de luta

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Ne st e me u pe q u e no l i v ro, vou cont a r u m po uco da min ha história de v i da . S ou a C a r l a Mi c ael a Gaspa r e t e n ho 4 2 anos. Nasci em S ão Pedro , no Fu n c ha l , e a t u a l me nt e v i vo e m Pa mpi l hos a da S erra. S ou c as ada , t e n ho doi s fi l hos e u ma ne t a . Ao lere m e st e l i v ro, v ã o con he c er a hi st ó r i a da min ha vida, pelo mun do haver á m u it as , mas e st a t e m a pa r t i c u l a r i dade de ter um fi n al fel iz. Est a é u ma hi st ó r i a de q u a t ro ir m ã os q u e fi caram sem pais e tiveram de ser sepa rados . C ada u m foi pa ra se u l ado, mas , com a g ra ç a de D eus, to dos fo ram pelos c a mi n hos c er t os , e , hoje , c ada u m é fel i z à sua maneira. S omos q u a t ro, mas , de t odos , q u e m foi ma i s pen al izado fui eu. Ao cont i n u a re m a ler , v ã o e nt e n der porq u ê .

Micaela Gaspar

Um c aminho de l ut a


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A HISTÓRIA DA MINHA VIDA


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Micaela Gaspar

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A HISTÓRIA DA MINHA VIDA

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UM CAMINHO DE LUTA


autora:

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título: A

História da minha Vida - Um caminho de Luta Micaela Gaspar

Liliana Simões Paulo S. Resende capa: Ângela Espinha revisão:

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paginação:

1.ª edição, Lisboa março, 2019

978­‑989-8867-55-1 452432/19

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isbn:

depósito legal:

© Micaela Gaspar

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Introdução

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Os meus pais conheceram-se em Lisboa, quando o meu pai andava na tropa, e a minha mãe estava a servir numa casa. O meu pai era de Pampilhosa da Serra e a minha mãe era do baixo Alentejo, mas ela veio muito cedo para Lisboa para trabalhar. Quando o meu pai acabou a tropa, casaram-se e quiseram ir à procura de uma vida melhor. Por isso, foram para os Açores e estiveram por lá algum tempo.


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A vida não corria muito bem, começou a faltar trabalho e a minha mãe já estava grávida do meu irmão mais velho. Nessa altura, tiveram uma proposta de um amigo de irem para a Madeira, e foram, trabalhar para um aviário. Lá iria começar outra etapa da vida deles. Começaram a nascer os filhos e começaram as dificuldades, pois só temos diferença de um ano. Agora, vou contar-vos um pouco da minha história.


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O começo

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Nasci a 16 de janeiro de 1977 em São Pedro, Funchal, onde vivi com os meus pais e irmãos até aos meus cinco/ seis anos. Como éramos seis pessoas a viver numa casa pequena, com poucas condições e as posses económicas também eram poucas, vivíamos com muitas dificuldades. Os meus pais tinham amigos que ajudavam, mas foram tempos muito difíceis. A certa altura, uma tia-avó foi-nos procurar. Essa tia-avó já tinha ajudado a minha mãe, quando esta veio para Lisboa, e foi ela quem fez o casamento de meus pais. Essa nossa tia quando chegou e viu as condições em que vivíamos, ficou muito triste, e disse à minha mãe,


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Gisela, que esta não podia viver assim, e que tinha de regressar porque aquilo não era vida para nós.

A minha mãe começou a chorar e pediu-lhe ajuda. Então, a minha tia perguntou quem queria ir para Lisboa com ela. Eu como traquina que era, disse logo: «Eu vou. Posso, mãe?». A minha tia referiu que viriam todos, mas que tinha de preparar as coisas, as viagens e onde ficar. Fiquei triste por ter de deixar a minha família, mas ao mesmo tempo feliz porque sabia que a minha tia ia ajudar-nos — e assim o fez.


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A minha tia veio para Lisboa, mas eu ainda fiquei, porque ela tinha de falar com o meu tio. Ele também não sabia nada de nós, mas quando a minha tia disse nas condições em que vivíamos, disse que tinham de nos ajudar. Então, compraram o bilhete e enviaram para nós. Fiquei contente, mas triste porque ia deixar a família. A minha mãe dizia: «Filha, agora vais tu, depois vamos nós. Não fiques triste». Aí fiquei melhor. Embora tivesse cinco/ seis anos, já compreendia as coisas. Chegou o dia de vir embora… muitas lágrimas e as saudades já apertavam. Tiramos uma foto para um dia recordar. Os meus pais foram levar-me ao aeroporto para apanhar o avião com rumo a Lisboa.


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Lembro-me como se fosse hoje, pequenina, a chorar por deixar os meus queridos para trás. Mas, lá vim eu, entregue a uma hospedeira. Sentia-me triste e feliz ao mesmo tempo. Triste porque deixava os meus queridos, e contente por ir conhecer o continente e a família que não conhecia.


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Um novo rumo

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Quando cheguei a Lisboa tinha a minha tia à espera. Lá vinha eu toda contente. Fui recebida de braços abertos. Foram tios que nunca deixaram faltar nada, desde carinho e muitos miminhos. Tive coisas que nunca tinha tido: brinquedos, roupas novas e muitas coisas. Eu não conhecia os meus avós maternos, que viviam no Alentejo, mais concretamente no distrito de Odemira. A minha tia levou-me a visitar os meus avós, tios e uma tia (irmã da minha mãe). Quando cheguei, a minha avó e essa tia perguntaram quem eu era. A minha tia, de Lisboa, respondeu que eu era neta e sobrinha, respetivamente, que eu era filha da Gisela. Explicou que tinha ido à nossa procura, e que estávamos na Madeira a viver com dificuldades. Revelou que tinha trazido a Carla (ou seja, eu) porque era das mais velhas, e que a minha avó tinha mais três netos, e bem bonitos. Disse que tinha resolvido ajudar e que queria trazer todos para o continente. Ia tratar da vinda da filha, netos e genro da minha avó, e que ia ver onde podiam ficar para poderem criar os filhos.


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A minha avó e tia, para não ficarem sem fazer nada, disseram que eu podia ficar lá até a filha desta regressar. Isso deixou-me um pouco triste, mas fiquei também para conhecê-los um pouco. E por lá fiquei. A minha tia tinha um menino bebé, então, era tudo para ele: carinhos, prendas, tudo. Os meus avós cultivavam muito e tinham muitos animais: vacas, bois, galinhas, cavalos, éguas, porcos e burros. Tínhamos de semear e colher muito para alimentar estes animais, mas também para nós comermos. Tudo o que se comia era colhido da horta. Também frequentei o primeiro ano da escola. Ia para a escola, quando voltava fazia os trabalhos e tinha de


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ajudar os meus avós na lavoura. Muitas vezes não gostava. Quando ia de má vontade, só fazia asneiras. Lembro-me, uma vez, da minha avó me chamar para ir arrancar erva às cebolas. Eu disse que não ia porque não me apetecia. Ela disse vais, e lá fui eu. Comecei a arrancar a erva e as cebolas também! Ora a fazer disparates o que me esperava? A minha avó foi buscar um vime, e levei com ele. Aí, comecei a fazer o trabalho, mas a dizer que ela era má, e que eu não gostava deles. — Não gostas, mas agora estas cá, e como nós queremos — diziam a minha avó e tia. E eu, sempre triste, só dizia que nunca mais vinham os meus pais e que estava farta de lá estar. Naquele tempo, não havia comunicações como há agora, para falar com a minha tia, que me foi buscar à Madeira, tínhamos de andar uns quilómetros para poder ligar, porque os meus avós não tinham telefone, nem sequer luz. Vivíamos com candeeiros a petróleo e íamos dormir cedo para não gastar petróleo. Então, fizemos alguns quilómetros para telefonar à minha tia que estava em Lisboa. Queríamos ter notícias, se ela já sabia quando vinham os meus pais. A minha tia disse que ainda não, mas assim que soubesse de alguma coisa dizia, e que devia ser rápido. Passado algum tempo, desde que eu estava com os meus avós, recebi a notícia que eu tanto esperava! Finalmente, os meus pais e irmãos vinham para o continente. Contudo, iam demorar mais tempo porque a


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minha tia só conseguiu viagem para eles de barco, assim ficava mais barato para poderem regressar todos. Passado uma semana de saber que eles vinham, a minha tia foi ao Alentejo buscar-me e informou: — Carla, depois de amanhã já vão cá estar os teus pais e irmãos. Fiquei tão contente que disse: — Finalmente, a minha família. No dia a seguir, vim para Lisboa com a minha tia. Perguntei-lhe onde iríamos morar, agora que eles já estavam cá. A minha tia respondeu que tinha encontrado um irmão do meu pai que vivia na Pampilhosa da Serra na casa dos meus avós paternos, que já tinham falecido. Como a casa também era do meu pai, nós íamos para lá. Além disso, havia família que nos ia ajudar. Perguntei-lhe também a que horas eles chegavam, a minha tia respondeu que era de manhã cedo, e que nós íamos esperá-los. Mal dormi, ansiosa pelo dia. Amanheceu, e lá fomos nós. Eu estava tão feliz. Ainda o barco não tinha parado, e eu já via a minha mãe. Gritava por ela, pelo meu pai e manos, tão feliz. Quando saíram do barco, abraçamo-nos e choramos de alegria. Finalmente, estávamos juntos. Em seguida, fomos para a casa da minha tia. Nós éramos muitos, mas lá conseguimos ficar na casa pequena, mas aconchegante dela. Como a minha mãe não via os pais há muitos anos, a minha tia sugeriu irmos ao Alentejo para ela ver os pais, e, assim, estes também


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ficavam a conhecer os netos. No regresso, iríamos para a Pampilhosa. No dia a seguir, lá fomos nós para o Alentejo ver a família. Quando chegamos, viveram-se momentos felizes, pois há muito tempo que os meus avós não viam a filha, e, além disso, não conheciam os netos, nem o genro (sim, o genro, porque os meus pais quando se casaram os meus avós não foram ao casamento). Passamos lá uns dias e depois regressamos à Lisboa. Em Lisboa, estivemos mais uns dias até irmos para a casa dos meus avós paternos, começar uma nova etapa, conhecer mais família, primos e tios.


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A vida na serra

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Quando chegamos a casa dos meus avós paternos, esta era pequena e antiga, mas muito aconchegante. Vivíamos nós os seis, mais o meu tio (irmão do meu pai). Lá, começamos outra vida. O meu pai conseguiu trabalho, e a minha mãe cultivava uma horta para termos o que comer, dava dias para nos dar de comer. As pessoas eram muito amigas, chamavam a minha mãe para trabalhar e davam-lhe comida para os filhos. Como éramos quatro, precisávamos de muita coisa para todos, mas os amigos e todas as pessoas ajudaram-nos. Nós começamos a ir à escola, e a minha mãe depois também conseguiu trabalho, numa fábrica de madeira a fazer paletes. Nessa altura, começamos a ter uns miminhos. A minha mãe comprava bolinhos e escondia-os, se nos portássemos bem, e se ela assim o entendesse, podíamos comer. Não podia era ser todos os dias, pois também nesta altura o meu pai começou a beber. Foi, então, que as coisas começaram a complicar-se. A minha mãe trabalhava muito para não nos faltar nada, e, por vezes, em alguns dias, o meu pai estava sempre com os copos. Mas, à nossa maneira, éramos felizes. Não tínhamos brinquedos, mas podíamos brincar ao ar livre. Lembro-me


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