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Os Manifestos Rosacruzes

Uma Tradição Secreta com 400 Anos de História Por Rui Lomelino de Freitas

A «Fama Fraternitatis R. C.» (1614), a «Confessio Fraternitatis R. C.» (1615) e «As Núpcias Alquímicas de Cristão Rosacruz» (1616) propunham uma completa renovação do mundo, com propostas e ideais, que nos confrontam com uma atualidade surpreendente.

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O nome Rosacruz emerge na História há 400 anos, no início do século XVII, com a publicação anónima destes textos, fruto da reflexão espiritual de um círculo de eruditos, teósofos e místicos, que se reuniam em Tübingen, uma pequena cidade da Floresta Negra, na Alemanha. Agora pela primeira vez publicados em Portugal, a tradução, integral dos originais vem acompanhada de uma investigação esclarecedora sobre o movimento e os ideais rosacruzes clássicos (com as mais recentes descobertas sobre os textos e contextos da época), assim como de um levantamento simbólico e filosófico.

Considerados por muitos investigadores (e.g. Frances Yates) como precursores do Pensamento Moderno e de muitas das suas conquistas no âmbito da Ciência, da Filosofia Humanista e das dos Direitos Humanos, estes textos no seu conjunto trazem uma proposta de Renovação do Mundo e a indicação de um Caminho Espiritual, necessário para que se realizasse essa Renovação. Neles é lançado um apelo à «Restauração do Templo que é o Homem» nos campos da ciência, da religião e da sociedade. Para que isso eram necessários o conhecimento e a aplicação das leis naturais e das leis divinas, através de um processo simultaneamente individual e social conduzido pelo espírito liberto no ser humano.

A esse respeito o investigador Frans Smit (2001) afirma que estes textos “contêm a chave que faz com que a proposta se eleve acima das ideias reformis-

tas conhecidas e adquira um caráter universal”. Essa chave, segundo Smit, encontra-se na figura de “Christian Rosenkreutz” - ou Cristão Rosacruz – considerado o “pai”, fundador da Fraternidade Rosacruz, e conhecido pelas iniciais C.R.C. – a personagem central das suas narrativas, que assume uma dimensão de protótipo do iniciado.

A expectativa central, principalmente na Fama, é a de que a humanidade se encontra no limiar de um salto qualitativo de consciência. Tudo depende da consciência individual e da vontade em ir em direção a uma consciência centrada na comunidade humana como um todo, para uma entrega à luz da Unidade.

Pensadores como Jacob Böhme, Robert Fludd, René Descartes, Jan A. Comenius, Isaac Newton, Robert Boyle, Gottfried W. Leibniz, Karl von Eckarthausen o Johan W. Goethe, testemunharam dessa orientação humanista Rosacruz. E vários movimentos contemporâneos como a Franco-Maçonaria, o Martinismo, a Teosofia contemporânea ou a Antroposofia, consideram-se herdeiros do seu legado. Para muitos, desde Frances Yates (1972: 35) a Godwin (2016,:6), é muito evidente que existia uma rede espalhada pela Europa, de pessoas profundamente implicadas com os objetivos e ideário rosacruzes, que se reviam na tarefa e nos ideais de uma “Renovação Geral” Rosacruz.

Para Yates, o termo Rosacruz deve ser usado para descrever um movimento cultural e espiritual, sem que necessariamente implique uma pertença a uma organização. Nesse sentido poderíamos talvez afirmar que a ordem dos rosacruzes (independentemente das manifestações históricas) existiu de forma “não-localizada”, enquanto movimento de ideais e ideias, mas também de ações humanas.

O projeto dos textos dos Manifestos R.C. – pensados pelos autores para serem traduzidos e chegarem a todos os que se identificavam com este impulso – acabou por ser em grande parte adiado, por causa da intolerância, conflitos e guerra religiosa em que a Europa se viu afogada nos inícios do século XVII. Ocultadas, esquecidas, reencontradas e traduzidas, quatrocentos anos depois, finalmente estas propostas chegam agora às suas mãos neste livro.

Sobre o autor:

Rui Lomelino de Freitas. Professor e investigador em Ciência das Religiões da Universidade Lusófona, onde coordena a Linha de Investigação em Gnose e Esoterismo Ocidental, assim como a pós-graduação em Estudos Maçónicos.

Os seus interesses de investigação abrangem a Filosofia Hermética Antiga e Renascentista, os movimentos gnósticos da Antiguidade, a Rosacruz Moderna e Contemporânea e a Alquimia. É autor de dezenas de trabalhos científicos, entre publicações e comunicações. Tem colaborado com múltiplas instituições académicas e culturais, entre as quais se contam a Universidade de Lisboa, o Museu Calouste Gulbenkian ou a ESSWE –European Society for the Study of Western Esotericism – da qual é membro.

“A expectativa central, principalmente na Fama, é a de que a humanidade se encontra no limiar de um salto qualitativo de consciência. Tudo depende da consciência individual e da vontade em ir em direção a uma consciência centrada na comunidade humana como um todo, para uma entrega à luz da Unidade.”

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