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O DUQUE DE FERRO

por Paulo Refega

Arthur Wellesley, primeiro Duque de Wellington, (1 Maio de 1769 – 14 Setembro 1852) foi um militar anglo-irlandês e politico do Partido Tory, tendo sido um dos vultos mais importantes da Grã-Bretanha do Sec. XIX. Foi duas vezes Primeiro Ministro e foi um dos comandantes que ganhou as guerras napoleónicas, tendo saído vitorioso da batalha de Waterloo.

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Wellesley nasceu no seio de uma família aristocrática Protestante na Irlanda sendo os seus pais o Conde e a Condessa de Mornington. Se bem que subsistam algumas dúvidas sobre o seu local e data do nascimento, aceita-se que nasceu em Dublin no dia 1 de Maio de 1769 e faleceu no dia 24 de Setembro de 1825. Era sexto de nove irmãos.

Não é de espantar que Arthur Wellesley seja considerado anglo-irlandês: entre 1801 e 1922, sob o título oficial de Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda este país incluía a totalidade das ilhas britânicas e foi estabelecido pelos “Acts of Union” de 1800, que fundiu o Reino da Grã-Bretanha com o Reino da Irlanda.

No Sec. XIX o Reino Unido, ou Grã-Bretanha como era normalmente designado à época, era talvez o país mais poderoso e rico do mundo. Apear de ter perdido as colónias na América do Norte há relativamente pouco tempo, tinha um império no vastíssimo “onde o sol nunca se punha” e incluía a Joia da Coroa, a Índia. Foi também neste século que se iniciou a Revolução Industrial, que provocou inúmeras mudanças na sociedade. Por alturas do primeiro censo em 1801, 20% da população vivia em cidades. Esse número já tinha aumentado para mais de 50% em 1851 e em 1881 já era de dois terços. Foi igualmente no Sec. XIX que começou a Era Victoriana, com uma prosperidade inédita até a data.

Arthur Wellesley passou a sua infância nas duas casas da família na Irlanda, um palacete em Dublin e um castelo no Condado de Meath. Em 1781 o seu pai faleceu e o seu irmão mais velho herdou o título. Estudou inicialmente em Dublin, depois em Londres e mais tarde foi para o famoso colégio de Eton, local de estudo tradicional das famílias de classe alta. Devido à sua solidão, foi uma experiência muito desagradável e nunca teve grande sucesso nos estudos. Em 1785, problemas financeiros causados morte do pai forçaram o jovem e a sua mãe a mudarem-se para Bruxelas. Até ao início dos seus 20 anos o futuro Duque de Wellington mostrou poucos sinais de distinção, de tal modo que a sua mãe se revelava preocupada com o seu futuro.

Em 1786, Arthur inscreveu-se na Academia Real de Equitação Francesa fazendo grandes progressos. Apreendeu francês (que se viria a revelar útil mais tarde) e tornou-se um bom cavaleiro.

Uma vez que a família ainda tinha dificuldades económicas, a mãe de Wellesley pediu ao irmão Richard pare perguntar ao Duque de Rutland se Arthur poderia ser considerado para uma comissão no exército. E assim, em 7 de março de 1787 foi nomeado alferes no 73.º Regimento de Infantaria.

Gradualmente foi percorrendo a carreira militar e em 1789 iniciou-se, ao que parece com alguma relutância, na política e foi eleito membro do parlamento servindo na Câmara dos Comuns irlandesa durante 2 anos.

Carreira militar

Na sequência de um infortúnio amoroso, uma vez que foi rejeitado pelo irmão da sua pretendida, dedicou-se à carreira militar e alcançou os postos

Templo Interior

de capitão, major e tenente coronel, este em 1793. Conforme era costume na época, esses dois últimos postos foram comprados, pois era possível pagar ao exército para ser oficial, não sendo necessário esperar para ser promovido por mérito.

Seguiram-se várias campanhas militares no estrangeiro:

Na Flandres em 1793, fazendo parte contingente britânico de uma força aliada que visava a invasão da França. Esta campanha acabou de forma desastrosa para os britânicos, mas permitiu a Wellesley aprender sobre táticas de batalha. Foi seguidamente para a India, para onde o seu regimento foi enviado em 1797 e onde mais tarde soube da nomeação do seu irmão Richard para novo Governador-Geral. Aí lutou na Quarta Guerra Anglo-Maiçor na batalha de Seringapatão. Foi nomeado governador de Seringapatão e Maiçor em 1799, e como bugadeiro-general recém-nomeado obteve uma vitória decisiva sobre a Confederação Marata na batalha de Assaye em 1803. A sua passagem pela Índia teve uma influência importante nas suas tácitas militares e na sua personalidade. Essas táticas revelaram-se fundamentais para o seu sucesso posterior nas guerras peninsulares e incluía um forte sentido de disciplina através de ordem unida e treinos, a necessidade vital de uma linha de abastecimento segura, a aquisição de informações através de espiões e de batedores e o uso de diplomacia para fazer aliados. Os seus gostos pessoais também mudaram, vestindo-se com uma túnica escura, calças brancas, botas de Hesse e um tricórnio preto.

Achando que já não tinha nada mais a fazer na India, Wellesley, que entretanto tinha sido promovido a major-general em 1802, pediu para voltar à Grã-Bretanha, o que aconteceu em 1805. O tempo passado na India deu-lhe um grande prestígio militar e permitiu-lhe também reunir uma considerável fortuna para a época, consistindo principalmente em prémios monetários pelas suas campanhas.

Wellesley decidiu tirar uma licença prolongada do exército e foi eleito membro do parlamento britânico por Rye em Janeiro de 1806. Um ano mais tarde foi eleito membro do parlamento por Newport na Ilha de Wight, e nomeado Secretário Chefe para a Irlanda e foi também nomeado para o Conselho Privado do Soberano britânico, um lugar de grande prestígio.

Depois de ter tomado parte na batalha de Copenhaga em 1807 e de ser nomeado tenente-general em 1808, foi-lhe ordenado para ir para Portugal e tomar parte na Guerra Peninsular. Mais uma vez se cobriu de glória, tendo experiência no comando a partir de baixo, de lutar num ambiente hostil e da importância da logística.

Wellesley derrotou os franceses na batalha de Roliça e na batalha de Vimeiro em 1808 mas foi substituído no comando após esta última batalha. Teve de voltar à Grã-Bretanha por questões mais política do que militares, e nessa altura Napoleão invadiu novamente a Espanha e derrotou os ingleses na batalha da Corunha. Apesar de a guerra contra a França não estar a correr bem para a Grã-Bretanha, era na Península, que, juntamente com o exército português, os britânicos melhor resistiam. Wellesley elaborou assim um memorando acerca da defesa de Portugal. Salientou as fronteiras montanhosas e defendeu que Lisboa deveria ser a base principal pois podia ser defendida pela Royal Navy. O Governo aprovou o memorando e Wellesley foi nomeado comandante de todas as forças britânicas em Portugal.

A 22 de Abril de 1809 desembarcou em Lisboa e passou à ofensiva. Na segunda batalha do Porto atravessou o Douro e derrotou as tropas Marechal Soult. Estando Portugal seguro, avançou para Espanha para se unir às forças do general Cuesta e preparar um assalto às forças do Marechal Victor em Talavera, tendo vencido a batalha. Contudo, desentendimentos com os aliados espanhóis forçaram Wellesley a retirar-se para Portugal. Na sequência da vitória em Talavera Wellesley foi nomeado Par do Reino Unido em 26 de Agosto de 1809 como Visconde Wellington de Talavera e de Wellington, no Condado de Somerset, e com o título subsidiário de Barão Douro de Wellesley.

Em 1810, um exército francês maior sob o comando do general Masséna invadiu Portugal. Apesar de a opinião britânica negativa e de sugestões de evacuar Portugal, Wellesley (agora Lord Wellington) abrandou o avanço dos franceses no Buçaco e impediu-os de conquistar Lisboa. Para tal foi fundamente a construção, por si promovida, das linhas de defesa conhecidas com as Linhas de Torres Vedras.

A luta contra os franceses prolongou-se por 1813 e 1814, chegando a invadir a França e tendo a última batalha contra Soult em Toulose. Com a abdicação de Napoleão em 1814 não havia motivos para continuar a guerra e acordou-se um cessar fogo.

Reconhecido na Grã-Bretanha como um herói conquistador, em Maio de 1814 foi nomeado Duque de Wellington e Marquês do Douro. Em Espanha foi também reconhecido e nomeado Duque de Cuidad Rodrigo. A sua popularidade na Grã-Bretanha deveu-se aos seus feitos militares e á sua imagem, que influenciou a moda da época. Ao mesmo tempo, as suas vitórias integravam-se bem no movimento romântico, que privilegiava a individualidade.

Foi nomeado embaixador na França e posteriormente plenipotenciário no Congresso de Viena, onde defendeu que a França mantivesse o seu lugar no equilíbrio de poder europeu.

Em Fevereiro de 1815 Napoleão fugiu de Elba e retomou o controle da França. Wellington deixou Viena e chegou à Holanda para comandar o exército britânico/alemão e os seus aliados holandeses estacionados ao lado do exército prussiano do Marechal von Blücher. Tendo invadido a Bélgica, os franceses e as forças aliadas defrontaram-se numa primeira batalha, que obrigou os aliados a recuar para a localidade de Waterloo a sul de Bruxelas. A batalha de Waterloo teve lugar do dia 18 de Junho de 1815. Esta batalha terminou com a derrots do exército francês e com o sonho imperial de Napoleão.

Carreira Política

Wellington entrou na política novamente quando foi nomeado Mestre-Geral da Ordenança no governo Tory de Lord Liverpool em Dezembro de 1818. Foi também nomeado Governador de Plymouth em 1819, Comandante-em-Chefe do exército britânico em Janeiro de 1827 e Condestável da Torre de Londres em Fevereiro de 1827.

Wellington estava a ser um membro cada vez mais influente do Partido Tory e em 1828 demitiu-se de comandante-em-chefe e tornou-se primeiro ministro. Durante os primeiros sete meses como primeiro ministro decidiu viver na sua casa, Apsley House, e não na residência oficial em 10 Downing Street porque a achava demasiado pequena.

Vale a pena falar um pouco de Apsley House: é o palacete londrino dos Duques de Wellington, situada junto do Hyde Park Corner e numa das zonas mais movimentadas e exclusivas da capital. Actualmente é um imóvel protegido e um museu, podendo ser visitado. Foi construída em tijolos vermelhos entre 1771 e 1778 para Lord Apsley, o Lord Chancellor, que deu o nome à casa. Em 1807 Richard Wellesley, 1º Marquês de Wellesley e irmão mais velho de Arthur Wellesley adquiriu a casa, mas dificuldades financeiras forçaram-no a vender a casa ao irmão, que precisava de uma base em Londres para prosseguir a carreia política. Entre 1818 e 1819 Wellington encomendou obras, tendo aumentado o palacete e cobriu o tijolo vermelho por pedra sabão. A casa ainda hoje é popularmente designada por Number One, London uma vez que era a primeira casa que visitantes viam quando entravam por Londres pelos portões de Knightsbridge. Originalmente fazia parte de uma linha contígua de casas grandiosas em Piccadilly, que foram demolidas por causa do alargamento de Park Lane. É provavelmente a única mansão aristocrática preservada deste período e contém a uma grande coleção de obras de arte, pinturas e recordações da carreira do primeiro Duque. De particular interesse para nós é um centro de mesa em prata de Domingos António de Sequeira

Durante o seu governo, Wellington foi fundamental para a fundação do King’s College de Londres, uma das universidades mais prestigiadas do mundo.

Wellington foi líder Partido Conservador de 1828 a 1846 e de grande importância no seu mandato foi a Emancipação Católica de 1829, que restaurou os direitos civis dos católicos no Reino Unido. Até esta data, católicos eleitos não podiam sentar-se no Parlamento. Contudo, esta lei foi muito mal aceite pela maioria protestante e tornou o Duque política e pessoalmente muito impopular. Além disso, enfrentou problemas e tumultos na sequência da sua oposição à Reform Bill em 1832. Foi aliás dai que veio a alcunha “Duque de Ferro”. O seu Governo caiu em 1830, mas foi primeiro ministro por alguns meses no final de 1834 e durante o Governo de Robert Peel foi Ministro dos Negócios Estrangeiros e Ministro sem pasta. Wellington foi líder do Partido Conservador na Câmara dos Lordes de 1828 to 1846 e retirou-se da vida política em 1846, embora se tenha mantido como Comandante-em-Chefe.

Wellington morreu no 14 de Setembro de 1852 no Castelo de Walmer em Kent, e recebeu um funeral de Estado, uma honra reservada a muitos poucos súbditos britânicos. Está enterrado na Catedral de S. Paulo.

Personalidade

Wellington sempre se levantou cedo: não conseguia ficar na cama, mesmo que não estava em campanha. Mesmo depois de retornar á vida civil em 1815, dormia numa cama de campanha, o que mostrava o seu desprezo pelo conforto. Ligava também muito pouco a comida e durante campanhas militares não comia quase nada entre pequeno almoço e jantar e subsistia a pão e carnes frias. Praticava uma disciplina de ferro e tinha sempre um semblante carregado,

Templo Interior

demonstrando raramente emoções em púbico. Era também um homem pouco falador e extremamente prático. Contudo, cuidava dos seus homens: recusou perseguir os franceses após as batalhas do Porto e de Salamanca temendo perdas inúteis e única vez em que ele mostrou tristeza em público foi após a tomada de Badajoz, quando chorou com a visão dos mortos britânicos nas brechas.

Sem dúvida que a sua personalidade foi influenciada pela Maçonaria, como a de qualquer bom Maçom deve ser. Foi iniciado na Loja de Trim, Irlanda em 7 de Dezembro de 1790, sendo essa a Loja sua família, uma vez que tanto o seu pai como o seu irmão mais velho fora Mestres dessa Loja e posteriormente foram ambos Grã-Mestres da Grande Loja da Irlanda. Sabe-se que quando estava em Lisboa em Outubro de 1809 as suas tropas organi- zaram um jantar e posterior desfile maçónico com todos os paramentos.

Conclusão

Tendo crescido e vivido no seio da alta nobreza, Wellington subiu à sua custa na carreira militar, sendo gradualmente promovido devido á sua competência e a ter obtido alcançando vitórias extremamente importantes: Além das vitórias na India, ajudou Portugal a manter a sua independência face às invasões francesas e infligiu a derrota final a Napoleão, mudando certamente o curso da história europeia.

A sua carreira política, também de grande importância para o seu país, decorreu do seu prestígio como militar.

Durante a vida recebeu cerca de trinta títulos, não incluindo distinções e medalhas e patentes militares. Há estátuas suas erguidas em várias cidades, incluindo Londres, Trim, Glasgow, Edimburgo e Leeds e um busto seu no Porto. Há também inúmeras ruas e praças com o seu nome, um Monte Wellington na Austrália e deu o seu nome à capital da Nova Zelândia. Influenciou também a cultura popular: as botas de cano alto que usava ainda hoje são designadas em inglês por wellington boots ou wellingtons. Há uma receita de bife à Wellington.

Deixou sem dúvida um legado a todos os títulos notável e uma vida e memória que merecem ser lembradas e celebradas.

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Leia os artigo na íntegra na 7ª Edição de ORIGEM | SOBERANA MAGAZINE.

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