As aves em revista
REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA PARA O ESTUDO DAS AVES NÚMERO 53 | 2/2016 | 2.00 € | GRÁTIS PARA SÓCIOS
Madeira UM PARAÍSO NO MEIO DO ATLÂNTICO P.13
Canhão Cársico de Ota UM PATRIMÓNIO A PROTEGER P.10
VO.U. pela Natureza VOLUNTARIADO AMBIENTAL P.34
Bisbis © Markéta Eijsvogelová n.º 53 pardela | 1
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CAPTURAR AS MARAVILHAS DA NATUREZA Uma garça-real aparece num recanto calmo e pouco profundo do rio em busca de comida. Consideravelmente mais fina que outras espécies, mostra uma plumagem surpreendente com subtis tonalidades de cinzento. A longa espera mereceu a pena. TLS APO da SWAROVSKI OPTIK torna realidade o seu sonho de poder partilhar momentos inolvidáveis com os outros. Este adaptador para digiscoping liga a sua câmara SLR fácil e rapidamente ao seu telescópio STX. Assim, sempre poderá mudar rapidamente entre o modo de observação e fotografia. Desfrute mais se viver estes momentos com SWAROVSKI OPTIK.
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2 | pardela n.º 53
13
Madeira
ÍNDICE
© Marta Nunes
Um paraíso no meio do Atlântico
Indonésia 4
Editorial
5
Breves
8
Ave do Ano 2016
Rainha dos endemismos
17
A viagem do britango
Canhão Cársico de Ota
Gaio © José Heitor
10
Um património a proteger
13
Madeira Um paraíso no meio do Atlântico
Indonésia Rainha dos endemismos
20
A ciência das aves
© Paulo Alves
17
O que sabemos sobre as aves e o montado
30
A pesca em Portugal Nem tudo o que vem à rede é peixe
23
Cátedra REN em Biodiversidade
27
Life Imperial Pela conservação da águia-imperial-ibérica em Portugal
30
A ciência das aves
34
VO.U. pela Natureza Voluntariado Ambiental
37
Juvenis
© José Carlos Morais
O que sabemos sobre as aves e o montado
Canhão Cársico de Ota Um património a proteger
10 n.º 53 pardela | 3
EDITORIAL FICHA TÉCNICA PARDELA N.º 53 | 2/2016
Juntos, atentos e ativos Domingos Leitão Diretor Executivo da SPEA © Liberty Bird
Já escrevi sobre muitos temas na Pardela. Sobre espécies de aves, projetos de conservação, viagens ornitológicas e até sobre orquídeas. Mas nunca antes tinha escrito um editorial. Estou até um pouco envergonhado, porque não sei o que escrever. Com tanto que há para dizer sobre a SPEA e sobre os desafios da conservação da natureza em Portugal, eu não sei por onde começar. Poderia começar pela Berlenga, onde estamos prestes a erradicar o rato-preto invasor e a criar renovadas condições de sobrevivência para as aves e plantas que dependem da ilha. Um feito conseguido com o trabalho de muitos, apesar das campanhas difamatórias e processos em tribunal. Ou então, poderia referir-me ao Douro Internacional, onde foi capturado o britango «Rupis», o primeiro ali a ser equipado com um emissor GSM. O «Rupis» dá-nos agora informação preciosa sobre a invernada no Mali e ajuda-nos a ter esperança no regresso das aves migradoras. Poderia localizar-me no meio do Atlântico e falar da alegria de ver a discussão do estatuto de conservação do priolo, para baixar de «Em Perigo» para «Vulnerável». Ou então da satisfação de saber que se conhecem mais de 100 casais de fura-bardos na Madeira, após o trabalho gigantesco de inventariação da espécie e de conservação da floresta laurissilva. Atenção, que para este projeto continuar necessita do apoio de todos através de uma campanha de crowdfunding em curso estes dias. Poderia mudar a agulha, e falar dos desafios da SPEA para os próximos meses. A mudança de sede em Lisboa, o financiamento do atlas das aves nidificantes, a realização de um festival de observação de aves no Douro, etc. A SPEA tem de revitalizar a relação com os seus sócios. De modo a estarem mais envolvidos na vida da associação, organizando atividades e cursos e participando nos censos e campanhas e com as suas ideias. Temos de arregaçar as mangas para isso. As campanhas vão ser muito importantes, porque em Portugal, atualmente, a crise económica justifica um investimento zero na conservação da natureza. Temos de estar todos juntos e exigir mais dos nossos governantes. A coligação C6 (SPEA, LPN, Quercus, WWF, GEOTA e FAPAS) identificou a lei da caça e o financiamento da conservação da natureza como temas de campanha prioritários para 2017. Vamos exigir a suspensão da caça à rola-brava, a interdição do uso de cartuxos com chumbo e, acima de tudo, mais recursos para a proteção das espécies e dos habitats. Vamos exigir isso ao governo de Portugal e à Comissão Europeia. Em suma, o que eu queria escrever é que, juntos, temos de procurar inspiração nos nossos sucessos, acreditar nas nossas capacidades e avançar para 2017 para dar o nosso melhor por uma natureza rica e saudável, para nós e para as gerações futuras. Esta edição contou com o apoio publicitário de: Esteller/Swarovski Optik; Opticron; REN
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DIRETORA: Vanessa Oliveira vanessa.oliveira@spea.pt | 213 220 434/0 COMISSÃO EDITORIAL: Clara Casanova Ferreira, Joana Domingues, Luís Costa, Manuel Trindade e Mónica Costa FOTOGRAFIA DE CAPA: Bisbis Regulus madeirensis, endemismo madeirense (Madeira e Porto Santo), «obrigatório» na lista de qualquer observador de aves no arquipélago © Markéta Eijsvogelová FOTOGRAFIAS: Ana Raquel Rocha, Andy Hay, Carlos Godinho, D’Almeida Simões, Domingos Leitão, Diogo Oliveira, Gustavo Simões, Isabel Fagundes, Iván Gutiérrez, Joaquim Antunes, José Carlos Morais, José Heitor, José Jambas, Jose Pesquero Gomez, José Viana, Laura Castelló, Liberty Bird, Magic onions, Markéta Eijsvogelová, Marta Nunes, Patrícia Antunes, Paulo Alves, Paulo Ventura Araújo, Pedro Alvito, Rafael Amorim Rocha, Ricardo C. Martins, Toni Mullet, Vanessa Oliveira e Vera Buhl TEXTOS: Ana Almeida, Ana Leal, Ana Teresa Marques, Bruno H. Martins, Carlos Godinho, Carlos Pacheco, Cátia Gouveia, Domingos Leitão, Francisco Moreira, Inês Catry, Joana Domingues, João Paulo Silva, José Carlos Morais, Liliana Barosa, Maria Dias, Marta Nunes, M. D’Amico, M. Hall, Paulo Alves, Paulo Marques, Pedro Alvito, Rafael Amorim Rocha, Ricardo C. Martins, Teresa Catry, Sílvia Nunes e Vanessa Oliveira ILUSTRAÇÕES: Davina Falcão, Frederico Arruda, Marco Nunes Correia e Paulo Alves PAGINAÇÃO E GRAFISMO: Frederico Arruda IMPRESSÃO: SIG - Sociedade Industrial Gráfica, Lda. TIRAGEM: 1200 exemplares e digital ISSN: 0873-1124 DEPÓSITO LEGAL: 189 332/02 Os artigos assinados exprimem a opinião dos seus autores e não necessariamente a da SPEA. A fotografia de aves, nomeadamente em locais de reprodução, comporta algum risco de perturbação das mesmas. A grande maioria das fotografias incluídas nesta publicação foi tirada no decorrer de estudos científicos e de conservação sobre as espécies, tendo os seus autores tomado as precauções necessárias para minimizar o grau de perturbação das mesmas. A SPEA agradece a todos os que gentilmente colaboraram com textos, fotografias e ilustrações. www.spea.pt/pt/publicacoes/pardela
DIREÇÃO NACIONAL Presidente: Clara Casanova Ferreira Vice-presidente: José Manuel Monteiro Tesoureiro: Michael Armelin Secretário: Vitor Paiva Vogais: Vanda Coutinho, José Paulo Monteiro, Manuel Trindade Avenida João Crisóstomo, n.º 18 4.º Dto. 1000-179 Lisboa Tel. 213 220 430 | Fax 213 220 439 E-mail: spea@spea.pt | Website: www.spea.pt A SPEA é uma organização não governamental de ambiente, que tem como missão o estudo e a conservação das aves e dos seus habitats em Portugal, promovendo um desenvolvimento que garanta a viabilidade do património natural para usufruto das gerações vindouras. Faz parte da BirdLife International, organização internacional que atua em mais de 100 países. Como associação sem fins lucrativos, depende do apoio dos sócios e de diversas entidades para concretizar as suas ações.
BREVES
por Joana Domingues
Muitos passarinhos selvagens ainda «voam» para o prato «Os Passarinhos pertencem à Natureza» é o mote da nova campanha da SPEA e parceiros, uma iniciativa que conta com o apoio do Nuno Markl através de um spot que apela a que não se perpetue este crime contra a natureza. Nesta época do ano, milhares de aves migradoras são apanhadas com armadilhas ou redes e vão parar ao prato ou a gaiolas. Esta campanha nacional dá a conhecer a gravidade do problema e explica como se devem denunciar situações ilegais. A captura de aves é um crime punível por lei, com coimas que podem ir de 250 € a 3740 €. A SPEA e os parceiros da campanha apelam a que situações ilegais sejam imediatamente denunciadas às autoridades, referindo a localização exata e enviando fotos, se possível. Podem fazê-lo através da Linha SOS Ambiente e Território: 808 200 520 e/ ou para sepna@gnr.pt. É importante ressalvar que todas as denúncias são anónimas, de modo a preservar a identidade das pessoas. Nesta fase, concentram-se esforços, sobretudo na região do Algarve,
uma das zonas mais problemáticas de captura ilegal de aves para petisco. Para isso é fulcral o trabalho em conjunto com as autoridades como o SEPNA/GNR, a ASAE e o ICNF. Os parceiros apostam também numa comunicação no terreno, com a intenção de sensibilizar e consciencializar as populações locais, em prospeções a vários locais, e na análise das leis atuais, consideradas insuficientes e proposta de possíveis alterações. Foi também com muita satisfação que foi recebida a notícia que o spot associado à campanha, produzido pela Play Solutions Audiovisuais recebeu o 1.º lugar dos prémios da Categoria Ecologia e Biodiversidade no Art & Tur – Festival Internacional de Cinema de Turismo, no passado dia 21 de outubro, em Vila Nova de Gaia. A 9.ª edição do Art & Tur, um dos mais prestigiados certames a nível mundial no circuito do cinema turístico, contou com a participação de 52 países que apresentaram 301 filmes a concurso, dos quais 109 participaram na competição nacional. Saiba mais em: www.spea.pt/pt/participar/ campanhas/captura-e-abate-ilegal
Agenda em destaque NOVIDADE
VISITAS DE ESTUDO ORNITOLÓGICAS SPEA | 2017 Canárias 18 a 24 fevereiro 2017
Grécia 13 a 21 maio 2017
Madeira Setembro (em preparação) www.spea.pt/pt/participar/ actividades/
EVENTOS ObservaRia | Estarreja 6 a 9 abril www.bioria.com/observaria Assembleia Geral Sócios SPEA Março | (data e local a anunciar)
CENSOS DE AVES 1 dez a 31 jan | todo o país (litoral) Projeto Arenaria - Censos de aves costeiras
15 dez a 31 jan | todo o país CANAN - Contagens de Aves no Natal e Ano Novo 1 dez a 15 jun | todo o país Noctua - Programa de Monitorização de Aves Noturnas
16 a 18 dez, 20 a 22 jan | Alentejo Censo de grous
14 a 22 jan | todo o país Censo de milhafre-real invernante 15 mar a 15 jul | todo o país III Atlas das Aves Nidificantes
1 abril a 15 jun | todo o país CAC - Censo de Aves Comuns
| Coordenação
| Parceria
www.spea.pt/pt/como-ajudar/ voluntariado/acoes-de-campo/
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BREVES por Joana Domingues
Lagoa Pequena - Um espaço às portas de Lisboa para usufruir da natureza
Rare Bird Club da BirdLife visita os Açores O Rare Bird Club reúne interessados por aves de todo o mundo que apoiam a BirdLife International. Este ano, os Açores foram o destino de excelência, e a comitiva ficou fascinada pelo trabalho de conservação do priolo e aves marinhas. Entre os 15 participantes, esteve a Diretora Executiva da BirdLife International, Patricia Zurita.
Abrigo fotográfico móvel Diogo Oliveira
Malta classifica as primeiras ZPE marinhas O Life Malta, do qual a SPEA é parceira, terminou com sucesso. Malta tem agora as suas primeiras oito Zonas de Proteção Especial marinhas (ZPEm), uma classificação integrada na rede Natura 2000, que concede às aves marinhas em Malta uma proteção integral em terra e no mar. www.birdlifemalta.org/ conservation/malta -seabird-project
A SPEA está, juntamente com a Câmara Municipal de Sesimbra, a gerir o Espaço Interpretativo da Lagoa Pequena (Sesimbra) desde março de 2016. Este espaço conta agora com infraestruturas mais acolhedoras para receber os visitantes, bem como um programa educativo apelativo e diversificado dirigido aos mais novos. Uma das novidades deste outono é a colaboração de voluntários para assegurarem a abertura num horário mais alargado: no 3.º sábado de cada mês, abre às 7h! Nestes dias, os visitantes podem entrar entre as 7h00 e as 7h30, depois o portão encerra e volta a abrir no horário normal, às 9h.
Torne-se Sócio SPEA Junte a sua voz à nossa e apoie o trabalho de conservação das aves e dos seus habitats. Saiba mais em www.spea.pt
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A entrada é gratuita, mas tem sido feito um apelo a donativos para a compra de material útil para o espaço e visitantes. Os visitantes têm acolhido bem este pedido, tendo-se conseguido comprar até ao momento um conversor elétrico, um telescópio e um disco rígido. O próximo desafio será a compra de uma impressora multifunções. Além dos passeios que se podem dar no espaço, é também possível visitar a mini-loja SPEA. Traga a sua família e venha conhecer o Espaço Interpretativo da Lagoa Pequena! www.cm-sesimbra.pt/lagoapequena
BREVES
por Joana Domingues
Futuro do fura-bardos depende de campanha de crowdfunding
Está a decorrer uma campanha de angariação de fundos para continuar a conservar o fura-bardos, uma ave da família dos gaviões que apenas existe na ilha da Madeira e em algumas ilhas das Canárias. A SPEA coordena, atualmente, um projeto LIFE com o intuito de saber mais sobre o enigmático fura-bardos, mas os fundos não cobrem o projeto a 100%, sendo necessário angariar 55 mil euros, para poder continuar a implementar todas as ações necessárias para proteger a espécie. As ameaças à floresta Laurissilva, habitat do enigmático fura-bardos, continuam bem vivas e presentes como se constatou nos últimos anos,
em que os incêndios que deflagram na ilha foram parte dos noticiários nacionais e internacionais. Não foram só as populações que ficaram sem casa. O fura-bardos também. A campanha de crowdfunding decorre até 10 de janeiro e pretende angariar fundos para a SPEA poder continuar a trabalhar na conservação do habitat desta ave, sobre a qual ainda pouco se sabe. Reflorestar o seu habitat, monitorizar as aves e implementar ações de educação ambiental são algumas das atividades que fazem parte da estratégia. bit.ly/helpfurabardos
Escuteiros participam na campanha Ave do Ano Já terminou mais uma Patrulha Ave do Ano dinamizada pelo Departamento Nacional de Ambiente do Corpo Nacional de Escutas, este ano dedicada ao brintango, no âmbito do Life Rupis. Houve 7 participações de 3 agrupamentos diferentes: 512 de Peniche, 583 de Vila Nova de Barquinha e 1069 de Macieira. Os participantes apresentaram trabalhos e no final receberam uma insígnia com o britango. www.rupis.pt
© Patrícia Antunes
SPEA com novo Diretor Executivo
© Liberty Bird
Com mais de 23 anos de trabalho em prol da natureza e ambiente em Portugal, a SPEA iniciou em outubro mais uma etapa no seu percurso, com Domingos Leitão como novo Diretor Executivo. Após 16 anos dedicados à SPEA e à causa ambiental, Luís Costa, Diretor Executivo até setembro, deixou
a SPEA rumo a um novo desafio. Durante a sua liderança, que teve o apoio de inúmeros colaboradores, a SPEA transformou-se numa das maiores ONGA de Portugal, com intervenção em todo o país e inúmeras parcerias internacionais.
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Marco Nunes Correia Ilustração de britango
Rupis A viagem do britango Quando dizemos adeus a alguém amigo que está de partida, fica sempre alguma angústia pelos perigos que existem nas grandes viagens. Sinto o mesmo pelas aves migradoras, a minha alegria é maior quando as vejo chegar do que quando estão de partida.
O
s britangos estiveram connosco toda a primavera e verão. Desde março, foram presença constante nas terras de Miranda do Douro, Mogadouro, Freixo de Espada à Cinta, Figueira de Castelo Rodrigo, Zamora e Salamanca, nas duas margens dos rios Douro e Águeda, conhecidos por internacionais. Alguns de nós, de passagem por estes locais belos, remotos e agrestes, disseram «ali vai um britango», a Ave do Ano de 2016. Mas chegados os primeiros ventos do outono, os britangos têm de partir, em busca de para8 | pardela n.º 53
gens onde possam passar o inverno. Mas a viagem é longa, suspeitamos, e perigosa, tememos. Oxalá corra bem, e voltemos a vê-los na próxima primavera.
Há mar e mar, há ir e voltar Os britangos são migradores de longa distância. Voam até três mil quilómetros, desde os locais onde se reproduzem na Europa mediterrânica até aos locais onde passam o inverno no Sahel. E depois, têm de voltar. Os perigos são muitos e as dificuldades enormes. Têm de atravessar o mar
Mediterrâneo. Mas a passagem é segura apenas em alguns sítios, como os estreitos de Gibraltar e do Bósforo. Sabemos que 90% dos britangos juvenis dos Balcãs que tentam atravessar o mar sem os adultos, o fazem por rotas longas e perigosas, e acabam afogados. Oxalá não se percam dos adultos e não tentem travessias largas. Os britangos que aparecem em Sagres são juvenis perdidos no seu caminho para Gibraltar. Podemos ver os registos e fotos no PortugalAves/ eBird (ebird.org/content/portugal). Muitas destas aves atravessam para
África, outras morrem no mar e algumas vão ficando no sul da península durante o inverno.
Os perigos «humanos» Os britangos que atravessam o mar têm ainda de enfrentar os perigos provocados pelo homem: parques eólicos, linhas elétricas, venenos e perseguição direta. Sabe-se que uma única linha elétrica no centro do Sudão eletrocutou centenas de britangos durante dezenas de anos. Mas, felizmente já foi desmantelada, graças à pressão internacional. Sabe-se também que os britangos e outros abutres são vítimas frequentes de envenenamento secundário. Os pastores colocam veneno contra os carnívoros e os agricultores espalham inseticida contra os gafanhotos.
Britango «Rupis» marcado com emissor José Jambas
Sete das onze espécies de abutres de África, incluindo o britango, estão ameaçadas de extinção.
Espanha Portugal
No final, os abutres, não sendo o alvo, acabam vítimas por exercerem a sua importante função de limpeza dos campos e consumirem os animais envenenados. Sete das onze espécies de abutres de África, incluindo o britango, estão ameaçadas de extinção. A BirdLife International está a dinamizar um projeto que, durante os próximos 10 anos, pretende inverter esta situação (www.birdlife.org/campaign/saving-natures-clean-crew).
Onde está o «Rupis»? Oxalá os britangos do Douro vão e voltem, sãos e salvos. Este ano, temos um amigo que nos ajuda a saber o que se passa. O «Rupis» é um britango capturado no Douro Inter-
| Cofinanciamento
| Coordenação
Marrocos
Algéria
Mauritânia Mali
Viagem do britango «Rupis» (jul-out 2016)
nacional e marcado com um emissor GSM, no âmbito do projeto Life Rupis. Este é um projeto português e espanhol, iniciado em 2015, que visa a conservação das populações de britango e outras aves de rapina ameaçadas nos dois lados da fron-
teira do Douro e do Águeda. O britango «Rupis» é um jovem de quatro anos cheio de garra. Foi marcado em meados de julho e passou agosto e setembro entre o canhão do Douro e uma área de alimentação a oeste de Salamanca. De repente, no dia 20 de setembro, começou a sua migração para sul. O «Rupis» percorreu dois mil quilómetros em dez dias, e no dia 30 de setembro já estava no sul da Mauritânia. Um feito extraordinário! Atualmente, encontra-se no Mali, numa área de savana seca a norte de Bamako. Pode seguir a migração do «Rupis» no website do projeto, e desejar-lhe boa viagem de regresso. Até março de 2017! www.rupis.pt Autor | Domingos Leitão SPEA
| Parceiros
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Vale do Canhão Cársico visto de norte José Carlos Morais
Canhão Cársico de Ota Um património a proteger O Canhão Cársico de Ota, paisagem única na região de Lisboa, apresenta-se com um imponente vale escarpado, resultado de milhões de anos da ação erosiva do rio Ota sobre as suas margens calcárias. É um dos mais valiosos tesouros do património natural, histórico e cultural do concelho de Alenquer. Este tesouro escondido, ainda ameaçado pela exploração de pedreiras e visitação desregrada, foi recentemente proposto a «Monumento Natural de Âmbito Local».
E
stá em curso, desde março de 2015, um projeto que visa a caracterização da área do Canhão Cársico de Ota do ponto de vista da flora, fauna, geologia e arqueologia. O projeto, que foi candidato e obteve financiamento no Orçamento Participativo do município de Alenquer em 2014, integra ainda uma componente de divulgação e um plano de ação com identificação de valores, ameaças e recomendações de gestão. O relatório síntese de caracterização dos 100 ha de área de estudo está con10 | pardela n.º 53
cluído, e o projeto tem final previsto para dezembro de 2016.
Um vale de biodiversidade O perfil escarpado do Canhão Cársico da Ota é resultado da ação erosiva das águas do rio Ota sobre as rochas calcárias que o constituem e datam do período do Jurássico Superior (aproximadamente entre 163,5 MA e 145 MA atrás). O vale estende-se entre as povoações de Ota e Atouguia ao longo de aproximadamente 2,25 km, tem vertentes que chegam a superar os
100 m de altura, e na sua base cascalheiras de importante relevância pela sua dimensão e extensão. Este excecional conjunto geomorfológico abriga comunidades vegetais e um grupo de elementos biológicos de grande importância para a conservação da biodiversidade. No estudo de caracterização conduzido em 2015 pela Sociedade Portuguesa de Botânica (SPB), um dos parceiros institucionais do projeto, foram identificadas 362 espécies de flora, 32 das quais consideradas «Raras, Endémicas,
O Canhão Cársico de Ota é o mais espetacular e extenso vale em canhão das regiões calcárias portuguesas. in Inventário de Geossítios de Relevância Nacional (2014)
Localizadas, Ameaçadas ou em Perigo de Extinção (RELAPE)». Cinco destas espécies integram ainda anexos da Diretiva Habitats. Foram também identificados 11 habitats protegidos (um deles prioritário) ao abrigo desta diretiva, incluindo oito grutas e 6 ha de formações rochosas (escarpas e cascalheiras). São precisamente estes habitats rochosos de elevada sensibilidade e monumentalidade paisagística, que abrigam importantes comunidades vegetais de espécies características. Algumas têm neste local o maior núcleo populacional do país. É o caso do pequeno malmequer da Península Ibérica e norte de Marrocos, Senecio minutus. Considerada rara em Portugal, esta planta tem nas cascalheiras do Canhão Cársico de Ota a maior população conhecida no nosso país.
Significativa é também a presença de uma população de Arabis verna, uma pequena planta anual da família Brassicaceae de distribuição mediterrânica com apenas duas localizações conhecidas: Barrocal Algarvio e Serra d’Aire e Candeeiros. Também a zelha Acer monspessulanum, pequena árvore mediterrânica com uma distribuição bastante fragmentada em Portugal, tem possivelmente neste local uma das maiores populações do centro-oeste, aparecendo dispersa nas orlas das cascalheiras e por vezes formando bosques fechados nos fundos dos vales. A lista das espécies da flora está disponível no portal Flora-On (flora-on.pt), através de pesquisa por «Canhão Cársico de Ota». Ao nível da fauna terreste, a SPEA, também parceiro institucional do projeto, localizou nos trabalhos de campo que decorreram no mesmo ano no vale do canhão cársico, 61 espécies de aves (seis legalmente protegidas), 10 espécies de mamíferos (duas delas protegidas), sete espécies de répteis (duas protegidas) e duas de anfíbios. Os morcegos cavernícolas utilizam as muitas grutas e exsurgências cársicas que marcam o vale. Ge-
netas, raposas e javalis foram clientes habituais das câmaras fotográficas montadas junto à linha de água, mas também um esquilo-vermelho foi surpreendido. Das espécies de aves detetadas na área de estudo, 10 têm estatuto de ameaçadas em Portugal ou na Europa. Destas assumem especial relevância aquelas que nidificam na área: o bufo-real Bubo bubo, o açor Accipiter gentilis, a rola-brava Streptopelia turtur, o noitibó-cinzento Caprimulgus europaeus, o guarda-rios Alcedo atthis, o peto-real Picus sharpei e o corvo Corvus corax.
Abrigada
Canhão Cársico da Ota
Ota
Rio Meca N9
da
Ota
IC2
Alenquer N1
Guarda-rios Domingos Leitão
Visita guiada ao Canhão Cársico para autarcas e técnicos municipais Gustavo Simões
A bordo doArabis Arraisverna Bruto Iván Gutiérrez Paulo Ventura Araújo
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«O Canhão Cársico de Ota é uma área prioritária para a conservação da natureza da Região de Lisboa que deve ver assegurada a sua protecção.[…] É uma paisagem única na região de Lisboa apresentando características geomorfológicas da maior relevância a nível nacional.» in PROT-AML, CCDR-LVT, setembro 2001
«Destaca-se o Canhão da Ota… o conjunto de elementos biológicos ali retido indicia grande importância para a conservação da biodiversidade e a sua eventual eliminação ou artificialização seria qualificável como um impacte de elevada magnitude.» in EPIA-NAL, Ota Pg. 11, Flora e Comunidades Vegetais, NAER (1999)
«O Canhão Cársico de Ota é uma área identificada pelos estudos da Conservação da Natureza como espaço de elevado valor ecológico cujos limites e valor de conservação devem ser objeto de estudo detalhado e posterior classificação ao nível municipal ou intermunicipal.» in PPROT-OVT, CCDR-LVT, agosto 2009
«Área rica em vestígios arqueológicos, incluindo diversos sítios com achados do paleolítico e neo-calcolítico, grutas com ocupação humana e o povoado fortificado (castro), com ocupação desde o neolítico até à idade medieval.» in Base de Dados do IPA - Instituto Português de Arqueologia, desde 2006 integrado no IGESPAR
12 | pardela n.º 53
Exsurgência cársica junto ao rio Gustavo Simões
Dos povoamentos pré-históricos às pedreiras da atualidade A ocupação humana da área está também bem documentada em vestígios arqueológicos (perto de 1700 materiais classificáveis identificados) que permitem datar cronologicamente a ocupação desde o Paleolítico até ao Período Islâmico. Existem dois sítios arqueológicos referenciados e 10 locais com ocorrências de interesse arqueológico. No presente, as principais ameaças para a conservação do património natural, cultural e paisagístico da área, resultam da atividade das pedreiras instaladas na periferia do vale, da pressão exercida pela visitação e desportos de natureza em habitats sensíveis como as cascalheiras, escarpas e grutas, e pela poluição das águas do rio. O Canhão Cársico de Ota reúne, pois, um conjunto de valores naturais que enquadra a área na legislação nacional que estabelece o regime jurídico da conservação da natureza e da biodiversidade. A Câmara Municipal de Alenquer deu já início a um procedimento com vista à classificação do Canhão Cársico de Ota como «Monumento Natural de Âmbito Local». A classificação do Canhão Cársico de Ota possibilita a proteção dos valores naturais e a adoção de medidas
de gestão que garantam integridade das suas características e nas zonas imediatamente circundantes. Permite também criar oportunidades para a investigação, educação e apreciação pública desta paisagem única, situada apenas a 35 km de Lisboa. www.facebook.com/canhaocarsicodeota Autor | José Carlos Morais Coordenador do Projeto de Caracterização e Plano de Ação do Canhão Cársico de Ota
Caracterização e Plano de Ação do Canhão Cársico de Ota Coordenação e Divulgação José Carlos Morais Fauna Terrestre SPEA Flora e Vegetação Sociedade Portuguesa de Botânica Geologia e Geomorfologia José Ferreira Arqueologia André Texugo Lopes Projeto financiado pelo Orçamento Participativo de Alenquer
Madeira Um paraíso no meio do Atlântico
Observação de aves na Laurissilva a partir do miradouro dos Balcões Marta Nunes
Contando com cerca de 45 espécies de aves nidificantes, a Madeira é um destino a considerar por qualquer amante da natureza e adepto da observação de aves. O clima ameno, a gastronomia e a simpatia das suas gentes ajudam a compor uns dias bem passados no arquipélago.
O
O arquipélago da Madeira, composto por ilhas oceânicas pertencentes à região biogeográfica da Macaronésia, é um arquipélago que vive do turismo, pelo seu clima ameno, paisagens e simpatia da população. No entanto, é na natureza, caracterizada por uma rica biodiversidade «plantada» em terreno vulcânico, que se escondem os seus bens mais preciosos – a floresta Laurissilva, a fauna e flora endémicas das ilhas e as áreas protegidas, residindo aqui uma boa desculpa para visitar a Madeira.
Contando com cerca de 45 espécies de aves nidificantes, quatro delas endémicas para o arquipélago, quatro para a Macaronésia e outras tantas subespécies, este é, sem dúvida, um destino a não perder, quer seja um amante da natureza ou um birdwatcher mais exigente. Devido ao dramático relevo da ilha da Madeira e à aridez do Porto Santo, a diversidade de habitats e microclimas é assinalável, podendo fazer-se observação de aves durante todo o ano: desde as espécies residentes nos
seus diversos habitats, às migratórias, maioritariamente associadas a fenómenos climáticos que as desviam das suas rotas, proporcionando raros avistamentos enquanto repousam e se alimentam em paragem no arquipélago. Seja num passeio de barco ao longo da costa, numa levada pela floresta, num miradouro, ou numa passeio noturno junto das colónias de nidificação de aves marinhas, a região da Madeira oferece oportunidades únicas para a observação de aves. n.º 53 pardela | 13
Porto Moniz
Ilha da Madeira Ponta do Pargo
Floresta Laurissilva (ZPE)
São Vicente
Santana
Fanal / Chão da Ribeira
Ilha do Pico Branco Porto Santo Terra Chã
Queimadas
Ponta de
Reserva do Tanque São Lourenço (ZPE) Porto Santo Oeste de Cima Ponta de SãoIlhéu Lourenço ou do Farol
Pico do Areeiro Ilhéu de Ferro
Calheta
Ribeira de Machico
Ilhéu de Baixo ou da Cal
Lagoa do Lugar de Baixo Ponta do Sol
Maciço Montanhoso Oriental (ZPE)
Santa Cruz
Ribeira Brava Câmara de Lobos
FUNCHAL Selvagem Grande
Do vale à montanha e do mar à serra As aves marinhas nidificantes no arquipélago, presentes não só nas ilhas habitadas da Madeira e Porto Santo, como também nas vizinhas Ilhas Desertas e nas um pouco mais distantes Ilhas Selvagens, representam um dos principais atrativos para os mais entusiastas da observação de aves. Este grupo de aves nidifica principalmente em ravinas rochosas ao longo da costa, mas também nos vales profundos de Laurissilva e nas encostas íngremes de alta montanha.
Uma visita à reserva natural das inóspitas Ilhas Desertas é deveras aliciante. A melhor maneira de deslumbrar-se com a majestosidade do voo destes animais é através de uma saída de barco entre ilhas, principalmente na primavera e verão, época durante a qual poderão ser observadas as oito espécies nidificantes do arquipélago: as endémicas freiras, da madeira e do bugio Pterodroma madeira e P. deserta; as pardelas, como a cagarra Calonectris borealis, o patagarro Puffi14 | pardela n.º 53
Ilhas Selvagens (ZPE) Ilha do Pico Branco Porto Santo Terra Chã
Selvagem Pequena
Reserva do Tanque Porto Santo Oeste Ilhéu de Cima ou do Farol Ilhéu de Ferro Ilhéu de Baixo ou da Cal Ilhéu Chão
Deserta Grande
nus puffinus, o pintainho P. lherminier e a alma-negra Bulweria bulwerii, e os painhos, como o roque-de-castro Selvagem Hydrobates castro e o calca-mar PelaGrande godroma marina. Uma visita Ilhas à reserva natural das inóspitas Ilhas Selvagens Desertas (ZPE) é deveras aliciante. Nesta reserva natural, detentora de uma rica biodiversidade, Selvagem Pequena encontram-se as maiores colónias do Atlântico de alma-negra e a única colónia de nidificação de freira-do-bugio do mundo. Em alternativa às saídas de mar, a partir da costa, poderá encontrar na Madeira um dos melhores locais da Europa para observação de Ilhéu Chão aves marinhas em migração – o Porto Moniz, no extremo noroeste de ilha. Deserta Grande Ainda para os aficionados das aves Doca
Ilhas Desertas
Doca
Ilhas Desertas (ZPE) Bugio
marinhas, uma visita noturna à colónia de nidificação da rara freira-da-madeira, no Pico do Areeiro, o terceiro pico mais alto da ilha da Madeira, é, sem dúvida, uma paragem obrigatória! Nesta visita, realizada apenas com autorização do Parque Natural da Madeira, terá o privilégio de ouvir as «assustadoras», mas peculiares, vocalizações de uma
Reserva Natural das Ilhas Desertas Laura Castelló
Observação de aves numa caminhada por uma levada na floresta Laurissilva Marta Nunes
das aves mais ameaçadas da Europa, atualmente com apenas cerca de 80 casais nidificantes.
Da Laurissilva ao Porto Santo É na verde e luxuriante Laurissilva que se encontram as duas aves terrestres endémicas da Madeira: o bisbis Regulus madeirensis, do grupo das estrelinhas, ave muito enérgica e a mais pequena presente no arquipélago, e o pombo-trocaz Columba trocaz, importante disseminador da vegetação nativa. Seja ao longo das levadas, veredas, parques ou ribeiras existentes no seio da Laurissilva, outras aves residentes podem ser observadas, como o tentilhão Fringilla
coelebs madeirensis e a lavandeira Motacilla cinerea schmitzi, subespécies endémicas da Madeira. Um olhar mais atento poderá brindar-nos com o voo exuberante de uma manta (o nome local para a águia-d’asa-redonda Buteo buteo harteri), ou com um rápido e esquivo movimento de fura-bardos Accipiter nisus granti, também conhecido por gavião da Macaronésica e subespécie endémica desta região, que é atualmente alvo de um importante projeto de conservação liderado pela SPEA: o Life Fura-bardos (life-furabardos.spea.pt) A busca de outras espécies poderá atrair-nos até à vizinha ilha do Porto Santo sem descurar, no entanto, a
extensa praia de areia de origem biogénica. O relevo suave, vegetação rasteira e pequenas lagoas proporcionam um dos melhores locais no arquipélago para observação de espécies migratórias, como as limícolas e garças que utilizam habitats aquáticos para se alimentar e repousar, ou até pequenos bandos ou indivíduos isolados de passeriformes, mais frequentes durante o outono e inverno. O Porto Santo é também um local para observação de espécies residentes menos comuns na ilha da Madeira, como o cigarrinho Sylvia conspicillata, o pardal-espanhol Passer hispaniolensis, a poupa Upupa epops e o borrelho-de-coleira-interrompida Charadrius alexandrinus. n.º 53 pardela | 15
O birdwatching na promoção do turismo de natureza Com cerca de 1400 taxa endémicos, no qual se destacam também as plantas, artrópodes e moluscos, no arquipélago da Madeira existem cinco Zonas de Proteção Especial (ZPE), criadas no âmbito da Rede Natura 2000: Floresta Laurissilva, Maciço Montanhoso Oriental, Ponta de São Lourenço, Ilhas Desertas e Ilhas Selvagens. Dada a sua importância e riqueza, todas estas ZPE são consideradas também Áreas Importantes para as Aves e Biodiversidade (IBA), acrescidas ainda da Ponta do Pargo, Porto Santo Oeste e Ilhéus do Porto Santo. Por todas estas razões, a Madeira é um arquipélago de referência em toda a Europa para a conservação da natureza e proteção da biodiversidade. No entanto, e embora o birdwatching constitua uma das vertentes do turismo de natureza com maior representatividade na região, ainda não existe um produto suficientemente desenvolvido.
A SPEA tem sido pioneira na promoção deste mercado, através de diversos projetos, dos quais são exemplo o MacaroAves, de âmbito macaronésico, e o Sustainable Tourism Agents in Rural Societies (STARS), resultante de uma parceria de sete países, onde se destacam o Sri Lanka e a Indonésia. Tem
A Madeira é um arquipélago de referência em toda a Europa para a conservação da natureza e proteção da biodiversidade. ainda atuado na promoção do turismo ornitológico, através da execução de ações que tornam a observação de aves uma atividade compatível com o turismo sustentável, potenciando o desenvolvimento rural e promovendo a conservação da avifauna local. A colocação de painéis informativos em diversos pontos de interesse do arquipélago, a produção de mapas ornitológicos com indicação dos melhores
locais para observação de aves e de folhetos que despertam para a prática do turismo ornitológico nas diferentes regiões da Macaronésia, são exemplos de ações que ajudam a promover a prática do birdwatching na Madeira. Ainda na rede STARS, prevemos a criação de trilhos interpretativos para este tipo de atividade, numa ação conjunta com o Município de Santa Cruz. Até ao final do primeiro trimestre de 2017, levaremos a experiência SPEA além-fronteiras, com o envio de estagiários para o Chile e Ilhas Salomão e com um job shadowing na América do Sul. E porque para o birdwatcher, o conhecimento e a qualidade são fundamentais, são também promovidas formações dirigidas a agentes turísticos e outros públicos, contribuindo para o crescimento da família SPEA e do número de adeptos da observação de aves.
Autoras | Marta Nunes & Cátia Gouveia SPEA
Tentilhão Andy Hay
Cagarras Ana Isabel Fagundes
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Painel informativo no Porto Moniz Laura Castelló
Parque Nacional Aketajawe (Halmahera) Paulo Alves
Indonésia Rainha dos endemismos
Celebes Kalimantan Molucas Papua
Sumatra Java
Bali
Sondas
cea
Walla
Segundo dados recentes, a Indonésia possui 1672 espécies de aves, das quais 427 são endémicas deste país. Em nenhum outro país do mundo encontramos uma tal diversidade de endemismos. Não admira que seja considerado um paraíso para os observadores de aves e, depois da viagem por Gede-Pangrango, em Java, nesta edição, prosseguimos à sua descoberta.
A
diversidade ornitológica da Indonésia deve-se sobretudo à geografia deste gigante arquipélago que engloba 17 500 ilhas. O país expande-se por duas regiões zoogeográficas distintas. A zona oeste (Sumatra, Kalimantan, Java e Bali) encontra-se na região asiática enquanto as ilhas a este até à Papua-Nova Guiné se inserem na Australásia. As Pequenas Sondas, Celebes e Molucas pertencem à sub-região Wallacea.
Oeste superpovoado O Oeste indonésio possui uma das maiores densidades populacionais do planeta; vastas áreas de floresta e áreas costeiras foram substituídas por urbanizações, plantações de óleo de palma, pisciculturas ou resorts turísticos. Apesar disso, encontramos ainda recantos vibrantes de vida selvagem. É nesta área geográfica que encontramos os trogons Apalharpactes e Harpactes sp. Apesar de coloridas, estas aves passam facilmente
despercebidas por entre a folhagem espessa tropical. Sumatra e Java têm ambas uma espécie endémica, anteriormente consideradas a mesma espécie. Nos Parques Nacionais de Sumatra, a variedade de calaus é impressionante, sendo impossível não referir o enorme calau-bicórnio Buceros bicornis ou o calau-de-capacete Rhinoplax vigil, ameaçado pela captura e tráfico ilegal do seu casco sólido de composição semelhante ao marfim. n.º 53 pardela | 17
Lago Tolire (Ternate)
Sulamadaha (Ternate)
Paulo Alves
Quem visita Sumatra e Kalimantan deverá investir algum esforço na procura dos elusivos faisões florestais. A paciência será recompensada, por exemplo, com a observação do magnífico argos-real Argusianus argus. Em Kalimantan poderá ser observado o estranho gimnocéfalo-do-bornéu Pityriasis gymnocephala, que além de endémico desta enorme ilha é também o único representante da família Pityriaseidae. O cucal-de-java Centropus nigrorufus, uma das mais ameaçadas espécies da Indonésia, só pode ser encontrado num ou outro local costeiro de Java, enquanto em Bali encontrare-
Paulo Alves
mos uma das mais raras espécies do mundo, o endémico mainato-de-rothschild Leucopsar rothschildi.
Wallacea A Wallacea deve o seu nome a Sir Alfred Russel Wallace, brilhante e intrépido naturalista que no séc. XVIII explorou esta área geográfica. Nestas ilhas, somos brindados com um cenário idílico, onde florestas de mangais se prolongam em encostas de floresta pristina. Encontramos poucas pessoas, poucas estradas e vastas florestas que ainda sofrem um baixo impacto por parte da exploração madeireira. Nestas mesmas florestas ecoam os cha-
mamentos de inúmeras espécies de papagaios, cacatuas e lóris. Nas ilhas Halmahera e Bacan encontramos a ave-do-paraíso-de-wallace Semioptera wallacii de peito verde iridescente e quatro longas penas de exibição. Os sons e as cores vibrantes de um lek de machos em exibição dificilmente desaparecerão da memória… Sulawesi, também conhecido por Celebes, é uma ilha de forma contorcida e estranha, tão estranha quanto os seres que a habitam. A enorme variedade de guarda-rios que povoam esta e as ilhas vizinhas é uma das razões para a popularidade deste destino. O seu tamanho varia desde o enorme
Pôr do sol na Praia Kastela (Ternate) Paulo Alves
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Uma ameaça gritante é a captura ilegal e o comércio descontrolado de vida selvagem.
Ave-do-paraíso-de-wallace Ilustração © Paulo Alves
Galinha-de-água-de-talaud Ilustração © Paulo Alves
Coruja-gavião-de-sumba Ilustração © Paulo Alves
Cacatua-de-goffin
Calau-de-sumba
Ilustração © Paulo Alves
Ilustração © Paulo Alves
guarda-rios-de-bico-negro Pelargopsis melanorhyncha ao guarda-rios-pigmeu Ceyx fallax, uma minúscula joia alada dos rios de floresta.
fáceis de ver, no entanto, é necessário um guia local para experimentar a emoção de as observar durante as exibições matinais.
Papua
Um paraíso em risco
Uma visita à Papua pode muito bem ser o pináculo da observação de aves na Indonésia. Sim, é quente e húmido nas terras baixas e as montanhas são difíceis de explorar, mas nada se compara a esta experiência; além disso, esta ilha é sinónimo de aves-do-paraíso. As aves-do-paraíso estarão certamente entre as aves mais emocionantes do mundo: o sonho de qualquer observador de aves passa por observá-las em estado selvagem. São ainda bastante comuns nestas florestas e
Os tesouros da Indonésia não se esgotam nas linhas anteriores, muito fica por dizer. Infelizmente, este paraíso encontra-se em risco… Se, por um lado falamos de um país que nos presenteia com uma avifauna singular, paisagens deslumbrantes, uma cultura extraordinária e pessoas amigáveis, por outro falamos também de um país onde os atentados à natureza são uma constante. Uma ameaça gritante é a captura ilegal e o comércio descontrolado
de vida selvagem. Soluções para este problema passarão sempre pela aplicação da lei e um compromisso por parte das autoridades governamentais para a conservação. Um extenso programa de educação ambiental nas escolas deve ser uma prioridade, e tem sido um dos focos do trabalho da Burung Indonesia, o parceiro local da BirdLife International (www.burung. org). As gerações futuras são a única esperança para a segurança da vida selvagem e conservação da natureza na Indonésia.
Autor | Paulo Alves Colaborador da Burung Indonesia
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A pesca em Portugal Nem tudo o que vem à rede é peixe
Captura acidental de cagarra em palangreiro Iván Gutiérrez
A captura acidental de aves marinhas na pesca (bycatch) é um problema sério de conservação ao qual a SPEA se tem vindo a dedicar. Perceber qual o impacto dos diferentes tipos de arte de pesca e quais são as espécies de aves marinhas mais vulneráveis é fundamental. Assim, torna-se fundamental testar medidas que consigam reduzir de forma eficaz o bycatch, em colaboração próxima com o setor da pesca.
A
atividade da pesca em Portugal tem uma longa e profunda história de costumes e tradições. Apesar de ter sofrido um acentuado decréscimo ao longo da última década, continua a desempenhar um papel muito importante no nosso país, não só em termos económicos (segundo dados do INE representa 25,7% do Valor Acrescentado Bruto e 38,8% do emprego da Conta Satélite do Mar 2011-13, que engloba o conjunto das atividades explicitamente relacionadas ligadas ao mar)
20 | pardela n.º 53
mas também culturalmente. O peixe é regular na ementa dos portugueses, sendo um dos países do mundo com maior consumo de peixe per capita. A frota portuguesa é maioritariamente constituída por embarcações de pequena pesca (cerca de 80%). Estas caracterizam-se pela sua dimensão e autonomia reduzidas, e operam normalmente a menos de 3 milhas da costa. Em 2015, a grande maioria das licenças de pesca concedidas foram para artes fixas (anzol, redes e armadilhas), características
de embarcações polivalentes. Já as artes de arrasto e cerco representaram, respetivamente, apenas 3,7% e 1,6% do total de licenças. A atividade pesqueira assenta na abundância e diversidade de peixe da nossa extensa costa litoral. Mas todo o ecossistema marinho depende do «estado de saúde» dos nossos cardumes de peixe. As aves marinhas, o grupo de aves mais ameaçado ao nível global, também precisam deste recurso para se alimentarem, e para cuidarem das suas crias.
As estimativas mais recentes da BirdLife Europa apontam para cerca de 200.000 aves capturadas acidentalmente por ano nas águas europeias. Como as aves marinhas se alimentam habitualmente nas áreas mais produtivas dos oceanos, que são igualmente o alvo da pesca comercial, esta sobreposição pode levar a interações entre as aves e embarcações, que podem ficar presas acidentalmente em anzóis ou redes e consequentemente, morrer por afogamento. Este fenómeno da captura acidental de espécies não alvo é conhecido internacionalmente por bycatch. As estimativas mais recentes da BirdLife Europa apontam para cerca de 200.000 aves capturadas acidentalmente por ano nas águas europeias.
Como lidar com o bycatch? Para fazer face a este problema, a SPEA e diversos parceiros começaram
a trabalhar neste tema através do projeto europeu FAME - Future of the Atlantic Marine Environment, em 2010 (www.fameproject.eu). Desde então, tem-se vindo a aumentar o conhecimento sobre capturas acessórias e a melhorar as metodologias aplicadas. Os resultados destes seis anos de trabalho apontam para que as redes de emalhar, o palangre e as redes de cerco sejam as artes de pesca com maior impacto nas populações de aves marinhas. Entre as espécies mais frequentemente capturadas temos o alcatraz Morus bassanus e a pardela-balear Puffinus mauretanicus, esta última classificada como «Criticamente em Perigo». Atualmente, no âmbito do Projeto Life Berlengas (2014-2018) (www.berlengas.eu), o foco é perceber qual é o impacto da pesca sobre as aves marinhas que utilizam a Zona de Proteção Especial das Ilhas Berlengas e sobre as formas pelas quais podemos minimizar as interações negativas.
Mestre Joaquim a bordo do Olímpico Iván Gutiérrez
É importante proteger as aves marinhas porque elas sempre estiveram no mar e têm de existir. Tem sido bom trabalhar com a SPEA. Afinal, só é preciso um pouco de compreensão para ajudar nestes projetos. Mestre Joaquim
Painel de contraste para minimização do bycatch Iván Gutiérrez
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Airo José Viana
Para isso, a SPEA conta com uma equipa de observadores que acompanham de perto a faina da pesca que opera a partir de Peniche. Uma vez a bordo, os observadores-marinheiros não só monitorizam o bycatch mas também recolhem informação sobre a pescaria e as condições de mar. Em terra, são realizados inquéritos aos mestres de pesca para melhor entender a sua perceção sobre o problema do bycatch e, para que este trabalho corra bem, é fundamental assegurar uma relação de confiança com os intervenientes do setor, respeitar o trabalho árduo dos pescadores e partilhar com eles o conhecimento sobre o mar. Afinal, o tema interessa igualmente aos pescadores, que veem no bycatch um problema para a sua atividade. No Atlântico Sul, onde o trabalho com bycatch de aves marinhas se encontra bastante desenvolvido, foram testadas e desenvolvidas medidas que pretendem minimizar as interações negativas entre aves e pesca. Estas medidas podem ser dispositivos a aplicar na arte de pesca e/ou na embarcação, como sinalizadores, ou a adoção de comportamentos que reduzam a ocorrência de interações (por exemplo, iscagem à noite). Em Peniche, está a ser testado um método que consiste na colocação de painéis de alto contraste diretamente
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O caso do airo na Berlenga O airo Uira aalge costumava nidificar em grandes números na Berlenga, mas a população sofreu um declínio populacional acentuado na segunda metade do século XX. Hoje considera-se extinto como reprodutor no arquipélago. Este declínio resultou, em grande parte, de uma proliferação de redes de emalhar sintéticas na atividade pesqueira, em detrimento das constituídas por material de origem vegetal.
nas redes de emalhar. O objetivo é que a rede fique mais visível para as aves marinhas e que assim, estas a possam evitar. Estes painéis foram desenhados com base em estudos que indicam que, debaixo de água, as aves detetam mais facilmente o padrão do que as cores. Já foram realizados embarques experimentais com estes painéis e os resultados obtidos até ao momento são positivos. Paralelamente, será necessário perceber se estas medidas têm algum impacto sobre a eficiência da pesca, pois o objetivo é minimizar o bycatch sem reduzir a captura de peixe. Uma das maiores dificuldades deste trabalho, para além das condições de mar que se fazem sentir (especialmente no inverno), é a dificuldade em obter dados espaciais de esforço de
pesca, ou seja, saber quem pesca o quê, onde, com que arte de pesca, quando e em que quantidades. Esta informação é fundamental para avaliar a dimensão do problema das capturas acidentais e o seu impacto sobre as populações de aves. Apesar dos muitos desafios, os resultados deste projeto inovador, serão um importante contributo para a conservação das aves marinhas em Portugal. www.berlengas.eu Autora | Ana Almeida SPEA
Cátedra REN em Biodiversidade Aumentando o conhecimento científico sobre a interação entre aves e linhas de transporte de eletricidade
Ninho de cegonha-branca Vera Buhl
A Cátedra REN visa aprofundar o conhecimento sobre a interação entre aves e linhas de muito alta tensão. Os objetivos desta iniciativa passam por compreender melhor a mortalidade por colisão, estudar a ecologia e impactes indiretos das linhas em espécies sensíveis, bem como a nidificação da cegonha-branca nos apoios da REN e ainda promover a participação do público em atividades de ciência cidadã.
O
aumento do consumo de energia pelo Homem, nas últimas décadas, tem levado a uma grande expansão da rede elétrica. A colisão de aves com cabos aéreos constitui, para algumas espécies, a maior causa de mortalidade não natural e é o principal tipo de impacte direto associado a linhas elétricas de muito alta tensão (LMAT; 150-400 kV), nas quais o problema da eletrocussão é praticamente inexistente. Embora existam muitos estudos sobre o tema da colisão, são ainda extensas as lacu-
nas, por exemplo ao nível dos fatores determinantes para este tipo de mortalidade ou sobre a eficácia das medidas de minimização. Adicionalmente, mesmo para espécies sensíveis, ainda se conhecem mal os efeitos da mortalidade para a sua viabilidade populacional, ou a ocorrência de impactes indiretos, como os efeitos de exclusão. Por outro lado, as LMAT podem ter alguns impactes positivos na avifauna, por exemplo, por fornecerem locais de pouso ou nidificação (desde que seguros), ou através da criação de
habitats favoráveis devido à gestão das faixas de servidão das linhas. Assim, torna-se evidente a necessidade de aprofundar o conhecimento sobre a interação entre aves e as LMAT, através de investigação de relevância internacional, sendo importante também sensibilizar o público para o tema. Foi com este objetivo geral que se constituiu, em 2015, a Cátedra REN em Biodiversidade, um protocolo entre o Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos, da Universidade do Porto (CIBIO/ n.º 53 pardela | 23
Colocação de um GPS/transmissor numa cria de cegonha-branca Ricardo C. Martins
Ninhos de cegonha-branca em plataformas instaladas para o efeito Ricardo C. Martins
InBIO), a REN – Redes Energéticas Nacionais, SA e a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). A REN é a empresa responsável em Portugal pela rede de transporte elétrico através de LMAT e, no âmbito das suas políticas de responsabilidade social e ambiental, financia a cátedra a 75%, sendo os restantes 25% suportados pela FCT. O plano de trabalhos, levado a cabo pelo CIBIO em colaboração com a REN, tem uma duração prevista de até 5 anos e desenvolve-se em três linhas principais de atividade.
Monitorização, minimização e compensação de impactes ambientais Fruto de inúmeros processos de avaliação de impacte ambiental e de dois protocolos com o Instituto 24 | pardela n.º 53
Durante 5 anos, a Cátedra REN em Biodiversidade vai avaliar o impacte ambiental das linhas elétricas de muito alta tensão nas populações de aves. para a Conservação da Natureza e Florestas e organizações não governamentais de ambiente, ao longo dos últimos anos, a REN dispõe de muitos estudos de avaliação, monitorização, minimização e, em alguns casos, compensação de impactes de LMAT nas populações de aves. A compilação e análise destes trabalhos (em conjunto com outros estudos publicados) pretende servir sobretudo dois objetivos da cátedra: (1) compreender os fatores que determinam a frequência de colisões de aves com LMAT e (2) consolidar o conhecimento existente sobre a eficácia de dispositivos de sinalização de linhas. Um outro objetivo nesta linha de atividade consiste na melhoria dos métodos que permitem estimar
a taxa de mortalidade real de aves com base no número e frequência de aves mortas encontradas nas prospeções. No âmbito desta componente, o CIBIO presta assessoria científica à REN em diversos temas de atuação da empresa, pretendendo-se em particular atualizar as recomendações em vigor para a avaliação, monitorização, minimização e compensação de impactes de LMAT nas aves, com base no conhecimento adquirido e investigação produzida. Pretende-se ainda estudar os padrões de utilização dos apoios da REN pela cegonha-branca Ciconia ciconia para nidificação, com o objetivo de melhoria da segurança do transporte de energia e minimização de riscos de mortalidade da espécie.
LMAT com dispositivos de sinalização (espirais) nos cabos de guarda Ricardo C. Martins
A colisão de aves com cabos aéreos constitui, para algumas espécies, a maior causa de mortalidade não natural. Ecologia populacional Esta linha de atividade tem como objetivo geral compreender se a mortalidade e degradação/perda de habitat causadas por infraestruturas lineares, incluindo as LMAT, têm ou não impactes ao nível populacional, focados sobretudo no sisão, na cegonha-branca e em grandes águias devido ao conhecimento já existente sobre estas espécies e à sua suscetibilidade em relação a linhas elétricas. Mais concretamente, as ações desta componente passam por (1) recolher informação sobre o estado atual das populações e suas tendências demográficas e realizar/participar em censos populacionais e (2) marcar alguns indivíduos com dispositivos de
localização e segui-los remotamente, para analisar a ecologia de movimentos, sua relação com linhas elétricas, bem como análise de sobrevivência e causas de mortalidade natural e não natural.
que permitam a recolha fácil de informação, como o número de crias de cegonha em cada ninho, pelo público em geral.
Cidadania na ciência
Autores | Francisco Moreira1,2, Ricardo C. Martins1, M. D’Amico1, Inês Catry1,2, M. Hall3, Ana Teresa Marques1,4 & João Paulo Silva1,4
Esta componente visa contribuir para a sensibilização dos cidadãos para a conservação da biodiversidade, em particular sobre a interação entre aves e linhas elétricas, promovendo a sua participação no processo científico. Uma das atividades previstas consiste na avaliação dos fatores que afetam a produtividade da cegonha-branca, através do uso de sistemas online (e/ou aplicação para smartphone)
1 Cátedra REN em Biodiversidade, CIBIO/InBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos,Universidade do Porto 2 CEABN/InBIO – Centro de Ecologia Aplicada “Professor Baeta Neves”, Instituto Superior de Agronomia 3 REN – Redes Energéticas Nacionais, SA 4 cE3c – Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa
n.º 53 pardela | 25
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Águia-imperial Jose Pesquero Gomez
LIFE Imperial Pela conservação da águia-imperial-ibérica em Portugal Um dos principais desafios da monitorização das aves, essencial em projetos de conservação, é a correta identificação das aves observadas. No que se refere à águia-imperial-ibérica, essa tarefa está agora mais facilitada, com o guia publicado no âmbito do projeto Life Imperial, que tem como objetivo a conservação desta espécie em Portugal.
A
águia-imperial-ibérica Aquila adalberti é uma das espécies de aves de rapina mais ameaçada do mundo. O projeto Life Imperial «Conservação da Águia-imperial-ibérica (Aquila adalberti) em Portugal», coordenado pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN), congrega um conjunto de parceiros empenhados
em garantir que o regresso das águias-imperiais ao nosso país seja sustentado e duradouro. A águia-imperial é uma espécie que, atualmente, apenas se reproduz na Península Ibérica. A sua população mundial é inferior a cinco centenas de casais, sendo ainda bastante dependentes da gestão humana, o que
a caracteriza como uma ave de rapina muito ameaçada a nível mundial. Em Portugal está classificada como Criticamente em perigo. A águia-imperial sofreu um grande declínio durante a segunda metade do século XX em toda a sua área de distribuição, que em Portugal culminou com o desaparecimento da população n.º 53 pardela | 27
reprodutora entre o final da década de 1970 e o início da década de 1980. Apenas em 2003 se voltou a confirmar a sua nidificação em Portugal, concretamente de um casal na região da Beira Baixa. Desde então, a espécie tem vindo a colonizar lentamente algumas regiões com o aparecimento de novos casais e novos núcleos de reprodução. Em 2015, a população reprodutora em Portugal totalizava os 13 casais. No entanto, este regresso ao território nacional tem sido ensombrado por uma elevada taxa de mortalidade não natural, pelo frequente desaparecimento de indivíduos reprodutores e também devido a algum insucesso reprodutor.
Ameaças e algumas soluções O projeto Life Imperial tem como principal objetivo criar condições para potenciar o aumento da população de águia-imperial-ibérica através da concretização de um conjunto de ações de conservação específicas em 4 Zonas de Proteção Especial no Alentejo: Cas-
Palhiço pousado Ilustração © Davina Falcão
tro Verde, Vale do Guadiana, Mourão/ Moura/Barrancos e Tejo Internacional, Erges e Pônsul. A estratégia é simples e visa redu-
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zir o impacto das ameaças na espécie e melhorar a gestão do território, de modo a criar as condições de sustentabilidade do habitat para os casais existentes e para a fixação de novos casais. Entre as principais ameaças que a espécie enfrenta destacam-se a perda e degradação de habitat, o declínio das populações de coelho-bravo e a perturbação nas áreas de nidificação. O envenenamento é também uma ameaça grave para a águia-imperial, assim como para outras espécies que se alimentam de cadáveres de animais. O seu mau uso afeta também animais domésticos e pode constituir um problema de saúde pública. São ainda ameaças significativas para a espécie a eletrocussão em linhas elétricas (a maior causa de mortalidade não natural conhecida em Portugal), e o abate a tiro. No âmbito deste projeto está-se a trabalhar com proprietários e gestores do território no sentido de melhorar o habitat para a águia-imperial e de harmonizar as atividades desenvolvidas no terreno, nomeadamente implementando medidas que fomentem a abundância de alimento e a disponibilidade de locais de nidificação seguros. A ação do Life Imperial inclui ainda a vigilância de ninhos, a luta contra o uso de venenos e o patrulhamento com unidades cinotécnicas para a sua deteção, a implementação de medidas de prevenção de eletrocussão de aves em apoios da rede elétrica, a monitorização e recuperação de espécies presa e ações de sensibilização e educação ambiental. Além disso, estão ainda a ser desenvolvidos estudos para monitorizar a espécie e a eficácia das ações de conservação. De facto, o caminho estabelecido para salvaguardar o regresso da espécie a Portugal é um grande desafio,
mas o seu sucesso será um passo importante para a preservação, a longo prazo, da águia-imperial.
A identificação da águia-imperial-ibérica Em voo, a águia-imperial-ibérica pode, por vezes, ser confundida com outras aves de rapina. A observação
Adulto pousado Ilustração © Davina Falcão
atenta da forma da silhueta é muito importante para uma correta identificação. Esta espécie é uma águia de porte muito grande, que se caracteriza pelas asas longas e uniformemente largas e uma cauda relativamente curta. Plana com as asas retas, por vezes apenas com a ponta ligeiramente subida e apresenta a cabeça e o bico maciços, mais imponentes que na águia-real Aquila chrysaetos.
A águia-imperial-ibérica é uma das espécies de aves de rapina mais ameaçada do mundo. Relativamente à sua plumagem, esta espécie atravessa distintas fases de coloração até atingir a maturidade. No âmbito do projeto, foi recen-
Fases de coloração da plumagem Ilustrações © Davina Falcão
Juvenil
Palhiço
temente produzido o Guia para Identificação «A Águia-Imperial-Ibérica e as outras aves de rapina de Portugal», que está disponível para consulta no website do projeto (secção Documentação/Publicações).
Guia para Identificação A águia-ImperialIbérica e as outras aves de rapina de Portugal
Nos primeiros meses de vida, os juvenis apresentam uma coloração avermelhada, em tons de ferrugem. A plumagem vai depois sofrendo desgaste e descoloração por ação do sol e da abrasão física, adquirindo um tom amarelado/dourado, semelhante à cor da palha, pelo que é utilizado o termo «palhiço» para descrever esta fase. Os «palhiços» mais avançados começam gradualmente a substituir as penas do corpo, cabeça, pescoço e coberturas alares por penas novas, de tom alaranjado, notando-se tonalidades distintas nas zonas mais claras destas aves. Posteriormente, começam a adquirir penas novas, castanhas escuras, que se destacam da matriz de cor
Xadrez Claro
Xadrez Escuro
amarela clara, pelo que adquirem um aspeto axadrezado, sendo por isso utilizado o termo «xadrez». Quando ainda apresentam menos de 50% de penas escuras, denomina-se «xadrez claro». Nesta altura apresentam já muda nas penas de voo e em algumas retrizes. Quando a plumagem passa a ter mais de 50% de penas escuras, passa a designar-se «xadrez escuro». Nesta plumagem podem por vezes ver-se já algumas penas de adulto na zona central da cauda. Os subadultos (ou «adultos imperfeitos») caracterizam-se por apresentarem uma plumagem castanho-escura praticamente negra, muito similar à dos adultos, embora ainda com alguns vestígios (de tons claros) da plumagem anterior e já possuem os ombros brancos bem visíveis. A cauda apresenta o padrão dos adultos, sendo de cor cinzenta com barra terminal larga de cor preta. A plumagem definitiva de adulto é praticamente negra, com as penas da parte posterior da cabeça e nuca douradas. Um bordo branco, de dimensão muito variável, delimita as asas a partir dos ombros e/ou zona escapular (em casos raros, este bordo pode não ocorrer). Autores | Paulo Marques, Liliana Barosa, Bruno H. Martins & Carlos Pacheco
Sub-adulto
Adulto
Projeto LIFE Imperial (LIFE13 NAT/PT/001300) Conservação da Águia-imperialibérica (Aquila adalberti) em Portugal Duração 1 de julho de 2014 a 31 de dezembro de 2018 Beneficiários Liga para a Protecção da Natureza (Coordenador), Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas; Câmara Municipal de Castro Verde; Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa; Guarda Nacional Republicana; EDP Distribuição – Energia S.A.; Sociedade Española de Ornitologia (SEO/BirdLife) e TRAGSATEC S.A. Cofinanciamento Contribuição financeira do programa LIFE da UE (75%) Saiba mais em lifeimperial.lpn.pt
LPN - Equipa Life Imperial
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A Ciência das aves O que sabemos sobre as aves e o montado Autores | Carlos Godinho1 e Ana Leal 2 Coordenação | Teresa Catry e Maria Dias
1 LabOr – Laboratório de Ornitologia, ICAAM – Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais Mediterrânicas, Universidade de Évora 2 cE3c - Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, CEABN/InBio - Centro de Ecologia Aplicada “Prof. Baeta Neves”, Universidade de Lisboa
Trepadeira-azul D’Almeida Simões
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OS MONTADOS
Os montados são tradicionalmente definidos como sistemas agro-silvo-pastoris, multifuncionais, de origem antropogénica, criados a partir das florestas mediterrânicas de carvalhos, principalmente sobreiro Quercus suber e azinheira Q. rotundifolia. A sua origem está associada à exploração da bolota e pastagens para gado tendo surgido, ao longo dos séculos, outras formas de exploração dos recursos que o montado proporciona (p. ex. extração de cortiça, lenha, carvão, mel, plantas aromáticas, cogumelos, cinegética, turismo). A amplitude de densidade arbórea (± 20-60 árvores/ha) observada 30 | pardela n.º 53
ao longo da área de distribuição do montado, permite a ocorrência de um elevado número de espécies de aves. Podemos encontrar espécies associadas a ambientes agrícolas com o trigueirão Emberiza calandra e o cartaxo-comum Saxicola torquatus, a zonas de orla como o picanço-barreteiro Lanius senator e a escrevedeira-de-garganta-preta Emberiza cirlus, espécies florestais generalistas como o chapim-azul Parus caeruleus e o tentilhão Fringilla coelebs e espécies florestais especialistas como o rabirruivo-de-testa-branca Phoenicurus phoenicurus e a trepadeira-azul Sitta europaea. A área ocupada por montado, ou pelo sistema homólogo espanhol (dehesa), restringe-se à região do
Mediterrâneo, nomeadamente aos países do sul da Europa e norte de África, acompanhando a distribuição mundial do sobreiro e azinheira. Em Portugal e Espanha, as áreas de montado ocupam cerca de 3 a 6 milhões de hectares.
O montado como sistema de Alto Valor Natural De acordo com a Agência Europeia do Ambiente, a maioria dos sistemas silvo-pastoris da Península Ibérica são considerados sistemas de Alto Valor Natural (High Nature Value - HNV), onde o montado está incluído. Esta inclusão deve-se em muito à forma como o montado é gerido, com diversas atividades
Turismo de natureza, um dos múltiplos recursos proporcionados pelas áreas de montado Vanessa Oliveira
SABIA QUE?
Trepadeira-azul, uma das principais ajudantes no controlo de pragas dos montados D’Almeida Simões
ao longo do ano (caça, pastoreio, agricultura, etc.), que juntamente com o gradiente de cobertura arbórea potencia a sua complexidade estrutural, permitindo albergar uma maior diversidade biológica. As aves podem ser usadas como indicadores de montados HNV, seja através da ocorrência de espécies incluídas em determinados grupos funcionais (por ex. espécies florestais especialistas) ou da diversidade e riqueza de espécies.
2
BEM GERIR PARA CONSERVAR
Os montados albergam uma elevada biodiversidade e vários são os investigadores que se têm dedicado a
A cortiça foi o primeiro tecido vegetal examinado ao microscópio, devidamente descrito e desenhado? E foi graças a esta observação que Robert Hooke, em 1665, descreveu o termo «célula».
estudá-los, contribuindo para melhor os conhecer e preservar. Mas porque é que sustentam níveis tão elevados de biodiversidade? Alguns dos fatores mais citados são a gestão tradicional, a sua extensão e a estabilidade das condições do habitat. No entanto, outro fator relevante é a complexidade que se observa, por exemplo, nas variações ao nível da densidade de árvores e uso do sub-coberto (p. ex. pastagens, zonas agrícolas ou matos), bem como na presença de elementos únicos como galerias ripícolas. Estes elementos formam um mosaico de habitats que permite a existência de espécies associadas a cada um deles e contribuem para uma diversidade global muito elevada. Com efeito, ocorrem mais de 120
espécies de aves nos montados, entre residentes (p. ex. chapim-real Parus major, pica-pau-malhado-pequeno Dendrocopos minor), invernantes (p. ex. tordo-pinto Turdus philomelos, grou Grus grus), estivais (p. ex. felosa-ibérica Phylloscopus ibericus, rabirruivo-de-testa-branca) ou migradores de passagem (p. ex. papa-mosca-preto Ficedula hypoleuca, papa-moscas-cinzento Muscicapa striata). Há ainda a realçar a importância dos montados para aves de grande porte, algumas das quais ameaçadas, como a águia-imperial-ibérica Aquila adalberti, o abutre-preto Aegypius monachus e a cegonha-negra Ciconia nigra. Os montados estão dependentes da intervenção do homem e a sua correta gestão é fundamental. n.º 53 pardela | 31
Chapim-real
Rabirruivo-de-testa-branca
José Viana
Joaquim Antunes
A cortiça é um dos mais conhecidos recursos proporcionados pelo montado de sobro
Trepadeira-comum, uma das principais ajudantes no controlo de pragas dos montados
Vanessa Oliveira
Mas o que se sabe sobre a influência da gestão humana nos montados e as suas implicações para as aves? E qual o seu papel na manutenção deste sistema? Apresentam-se em seguida alguns exemplos.
Extração da cortiça Uma vez que a extração da cortiça é fundamental para a manutenção destes sistemas, importa perceber como reagem as aves a esta intervenção. Um estudo realizado em Portugal permitiu saber que espécies, como a trepadeira-comum Certhia brachydactyla e a trepadeira-azul podem ser sensíveis ao descortiçamento porque nas zonas da árvore onde a cortiça foi recentemente extraída, a disponibilidade de alimento é menor. Estas duas espécies passam a maior parte do seu tempo de alimentação no tronco e ramos 32 | pardela n.º 53
Diogo Oliveira
maiores onde capturam artrópodes bicando na casca. No entanto, a dinâmica natural de gestão do montado e o crescimento da cortiça permitem manter as comunidades de aves estáveis e em equilíbrio tendo-se comprovado que a extração de cortiça é uma prática compatível com a conservação da avifauna.
Desbastes e podas A poda das árvores é uma prática comum nos montados que causa a redução da área de copa e folhagem. Através de um trabalho realizado em zonas de montado de sobro percebeu-se que esta prática não parece influenciar a densidade nem a diversidade de espécies de aves. No entanto, espécies que se alimentam sobretudo na copa, como o chapim-azul, o chapim-real e a felosinha Phylloscopus
collybita tendem a ser menos abundantes em zonas podadas há pouco tempo, sendo aconselhado evitar podas que reduzam muito a densidade da folhagem.
Regeneração natural O montado enfrenta um grave problema de falta de regeneração natural mas há uma ave que é um forte aliado dos montados, o gaio Garrulus glandarius. O gaio é uma ave florestal, com uma dieta variada mas que tem uma grande preferência por bolotas. Sabe-se até que as bolotas não são escolhidas ao acaso: na Península Ibérica, as preferidas são as de azinheira e de sobreiro. Um estudo realizado em Espanha estimou que um gaio pode recolher mais de 400 bolotas/ha! Mas a grande ajuda vem do seu hábito de armazenar bolotas enterrando-as no
Ana Leal é investigadora de pós-doutoramento na Universidade de Lisboa (centros de investigação cE3c e CEABN/InBio) e no âmbito do seu trabalho desenvolveu o web site Montados com Futuro, um projeto de divulgação de ciência que pretende contribuir para a disseminação do conhecimento científico sobre montados para a sociedade, incluindo os mais novos. © Ricardo C. Martins
www.montadoscomfuturo.wixsite.com/ montados
Carlos Godinho é investigador no Laboratório de Ornitologia da Universidade de Évora e co-autor do livro O Montado e as aves | Boas Práticas para uma gestão sustentável, editado pela Câmara Municipal de Coruche e pela Universidade de Évora. Gaio, o grande aliado da regeneração natural dos montados
www.labor.uevora.pt/index.php/pt/ livro-o-montado-e-as-aves
José Heitor © Carlos Godinho
solo, uma vez que uma parte não é recolhida e acaba por germinar. O gaio é assim um grande dispersor de bolotas, contribuindo para a regeneração natural dos povoamentos de carvalhos.
Controlo de pragas Os sobreiros e as azinheiras são por vezes alvo de ataques por pragas de insetos que afetam diferentes partes da árvore, como a folhagem e a casca. Estudos realizados em Portugal demonstraram a importância de alguns passeriformes como controladores destas pragas. Estes trabalhos identificaram o chapim-azul, o chapim-real, o chapim-de-poupa Parus cristatus, o tentilhão, a toutinegra-de-cabeça-preta Sylvia melanocephala, a trepadeira-azul e a trepadeira-comum como os principais predadores de artrópodes em sobreiros e azinheiras.
Estas espécies consomem ovos, larvas e pupas de insetos que causam a queda das folhas e que se alimentam da madeira. Nos últimos anos têm sido avaliadas medidas que contribuam para o aumento destas aves e que podem assim ajudar a prevenir eventuais surtos de pragas no montado. Uma destas medidas é a instalação de caixas-ninho para promoção do aumento de populações de aves insetívoras (principalmente chapim-azul, chapim-real e chapim-de-poupa) cuja implementação tem sido estudada em duas Herdades no Ribatejo e Alentejo.
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O FUTURO
A importância social, ambiental e económica do montado é amplamente reconhecida, estando em curso uma candidatura do montado de
sobro a Património da Humanidade. A resiliência do montado tem permitido ultrapassar diversas contrariedades ao longo dos séculos, mas num mundo em mudança estará este sistema preparado para sobreviver a ameaças como reduzida regeneração natural, mortalidade de árvores adultas, pragas e doenças, reduzida rentabilidade do montado de azinho, alterações climáticas, competição de materiais sintéticos com as rolhas de cortiça?… A continuação da investigação nesta área, bem como a disseminação das boas práticas de gestão do montado, são essenciais para responder a esta e muitas outras questões contribuindo assim para a preservação dos montados e da enorme biodiversidade que acolhem!
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VO.U. pela Natureza Voluntariado ambiental
Censos de aves costeiras Rafael Amorim Rocha
Reunir estudantes universitários de diversos cursos com um objetivo comum – a paixão pela Natureza – é a missão do projeto pioneiro VO.U. pela Natureza. O projeto pretende dinamizar ações em parceria com outras entidades, como a SPEA, desde trabalho de campo a sessões de sensibilização da população.
O
lhando para as rochas da praia com os binóculos, Ana Raquel Rocha, estudante de Direito, exclama: «Olhem! Uma rola-do-mar!». O grupo faz o registo na folha do Projeto Arenaria e contempla a beleza desta ave e a graça do seu comportamento. Esta foi uma de muitas observações feitas pelo grupo de estudantes universitários naquele dia, em dezembro de 2015, na atividade que viria a marcar o início de um projeto promissor. 34 | pardela n.º 53
Na escola e no campo A VO.U. é uma associação sem fins lucrativos, sediada no Porto, que procura envolver os estudantes universitários em atividades de voluntariado em diversas vertentes: desde ações de acompanhamento de crianças e idosos carenciados a ações de formação em primeiros socorros e apoio a animais abandonados. O projeto VO.U. pela Natureza surgiu com o intuito de estender a esfera de atuação da VO.U. à área da
conservação do ambiente. Para concretizar este objetivo, tem atuado em várias vertentes: trabalho de campo; sensibilização da população, principalmente através de sessões teorico-práticas com crianças e jovens de escolas. Estas sessões têm decorrido nas escolas do agrupamento Aurélia de Sousa, com alunos do 4.° ao 8.° ano, abrangendo temas como a poluição, a política dos 3R (reduzir - reutilizar - reciclar), a flora e a fauna de Portugal. Como não podia deixar de
A VO.U. é uma associação sem fins lucrativos, sediada no Porto, que procura envolver os estudantes universitários em atividades de voluntariado em diversas vertentes. ser, as aves têm também o seu lugar. Além de mostrar aos alunos algumas das espécies mais comuns, a VO.U. pela Natureza dinamizou um desafio de fotografia de natureza, no qual as aves foram protagonistas. No que toca ao trabalho de campo, as iniciativas e parcerias desenvolvidas foram muito variadas, incluindo plantação de espécies autóctones na Mata Nacional do Buçaco, controlo de plantas invasoras na Reserva Natural Local do Estuário do Douro e na Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos, recolha de lixo nas praias do Porto, monitorização de insetos com o Tagis (Centro de Conservação das Borboletas de Portugal) e várias atividades em colaboração com a SPEA: palestra sobre captura ilegal de aves, censos de aves no âmbito dos projetos Atlas das Aves Nidificantes, Projeto Arenaria e Programa Noctua.
Participação de alunos do 4.º ano no desafio «Esculturas Reutilizadas» Rafael Amorim Rocha
Mais recentemente, na última primavera, os voluntários do VO.U. pela Natureza contribuíram durante duas semanas para o projeto Life Berlengas, coordenado pela SPEA. A propósito da sua participação, Ana Luísa Amaro, estudante de Biologia, afirma: «Assumindo um papel extraordinariamente ativo na promoção da ciência cidadã, o Life Berlengas permitiu-nos a construção de caixas-ninho, manutenção de trilhos, remoção de chorão e monitorização de ninhos de cagarras. Foi uma experiência plena e, claro, única, que contagiou futuros dentistas, físicos, nutricionistas, engenheiros, veterinários e diplomatas. A conservação da natureza não exige medidas distantes ou concretizações exageradas, mas movimentos pontuais e gestos cuidadosos que motivem e impulsionem tamanha cadeia onde ciência ou literacia não dominem.»
Experiências de vida O conceito do VO.U. pela Natureza nasceu da perceção de que, apesar de o voluntariado ser bastante popular nos dias de hoje, raramente surgem oportunidades de ajudar em iniciativas ambientais. Além da oferta ser reduzida, a procura está muito limitada a
Remoção de chorão no Projeto Life Berlengas Toni Mullet
pessoas de áreas já relacionadas com o ambiente, como Biologia. Assim, o VO.U. pela Natureza surge com o propósito de estimular um papel ativo na conservação da natureza em estudantes de outras áreas, assumindo que esta é, de facto, uma tarefa de todos. Futuros médicos, engenheiros e advogados, trabalhando em conjunto. É uma experiência de vida e, ao mesmo tempo, também uma mais-valia na formação profissional. As palavras de Ana Raquel Rocha são disso exemplo: «Sendo uma pessoa ligada ao curso de Direito, são raras as vezes que abordo temas relacionados com a natureza, e esta ação proporcionou-me
Plantação de espécies autóctones na Mata do Buçaco Rafael Amorim Rocha
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EU VO.U. PELA NATUREZA Se é estudante universitário e pretende participar nas iniciativas do VO.U. pela Natureza, inscreva-se no nosso banco de voluntariado, e no caso de alguma dúvida não hesite em contactar-nos. www.vou.pt www.facebook.com/ VO.U.associacao Voluntários VO.U pela Natureza na Mata Nacional do Buçaco
pelanatureza@vou.pt
Ana Raquel Rocha
É uma experiência de vida e, ao mesmo tempo, também uma mais valia na formação profissional. isso mesmo, uma harmonia com o ambiente que nos rodeia e o poder de retribuir. Por mais pequenos e singelos que sejam os nossos atos, eles irão ficar como pedaços da história e ter um impacto em futuras ações, e se todos nós contribuirmos um pouco com a nossa disponibilidade não só iremos ajudar os outros como também a nós próprios». Outra missão do VO.U. pela Natureza é restabelecer os laços com a Natureza numa população cada vez mais urbana, pois essa será uma tarefa essencial para valorizar e proteger o património natural. Será possível incentivar a proteção de espécies em-
| Coordenação
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| Parceiros
blemáticas, como o priolo ou a águia-imperial e seus habitats, quando não somos capazes de distinguir um melro de um pardal?
Desafios em cadeia Quase após um ano de vida, o balanço do projeto parece ser muito positivo, tanto em termos de variedade de iniciativas como da adesão de voluntários. Podíamos limitar-nos a apresentar alguns números, como: mais de 50 voluntários participantes, cerca de 600 alunos sensibilizados, 400 árvores plantadas, etc. Mas o verdadeiro impacto do VO.U. pela Natureza é incalculável e reside em grande parte na semente que foi colocada em todas as pessoas envolvidas no projeto, capacitando-as a serem elas próprias agentes de mudança - um efeito verde em cadeia. Este caminho pela Natureza está
ainda no início e muitos desafios se impõem: manter e reforçar as parcerias através de mais atividades e projetos conjuntos; expandir a nossa área de atuação e reunir mais voluntários. O projeto nasceu no Porto, mas tem recebido alguns voluntários de outras regiões: Braga, Coimbra, Aveiro. Seguindo esta tendência, pretendemos criar uma rede de jovens pela Natureza a nível nacional, quer através de parceria com outras associações já existentes, quer através de incentivos à criação de projetos semelhantes locais. Este é um objetivo final, mas simultaneamente uma proposta para um começo. O começo de uma tradição em que ir pela Natureza é o padrão e não a excepção.
Autor | Rafael Amorim Rocha Coordenador do VO.U. pela Natureza
NESTE NATAL, OS ENFEITES DA ÁRVORE FICAM POR TUA CONTA. VÊ AS PROPOSTAS DO CLUBE JUVENIS SPEA E DO AMIGO RUPIS, E DEPOIS NÃO TE ESQUEÇAS DE PARTILHAR CONNOSCO AS TUAS OBRAS-PRIMAS. www.facebook.com/ClubeJuvenisSpea
Pássaro-Tempo 1 Descobre as diferenças com o Rupis
Por Vanessa Oliveira (texto) e Frederico Arruda (ilustração)
Olá, eu sou o britango Rupis, a mascote do projeto Life Rupis! Ganhei asas em setembro e já estive em Sagres, em várias escolas no Douro Internacional, e agora tenho um desafio para ti: descobre as 7 diferenças entre estas imagens!
SOLUÇÃO
E os desafios não acabam! Em casa, dá asas à tua imaginação: pinta o Rupis e os seus amigos com cores a teu gosto e usa a sua imagem para fazeres enfeites de natal, ímanes para o frigorífico, molduras, etc. Fica a saber tudo em www.rupis.pt/pt/educacao-ambiental. n.º 53 pardela | 37
Pássaro-Tempo 2 Árvore de Natal biodiversa por Sílvia Nunes e Pedro Alvito
PINHAS COM FORMAS DE ANIMAIS Ideal para animar a tua árvore de Natal ou ofereceres à tua família.
MATERIAL
MÃOS À OBRA
Pinhas (de diferentes formas e tamanhos, não muito grandes)
1 - Atribui a cada pinha um animal, consoante a sua forma e tamanho. Antes de começar, verifica onde colocar cada parte do seu corpo (cabeça, asas, patas, olhos, etc) e o fio para pendurar na árvore.
Cartolinas coloridas ou cartolina branca e lápis de cor se preferires pintar Lápis de carvão e borracha
2 - Desenha nas cartolinas as diferentes partes do corpo dos animais: asas para borboletas, bicos e patas para aves, pernas e orelhas para mamíferos, etc. Para os membros (asas, patas), orelhas e caudas, faz um retângulo extra numa ponta do desenho – essa parte funcionará como uma aba para colar à pinha.
Tesoura (pede ajuda a um adulto)
3 - Pinta os desenhos das cartolinas, salienta pormenores com marcador preto e recorta com a ajuda de um adulto.
Palitos
4 - Caso tenhas decidido fazer uma borboleta ou outro inseto, faz o mesmo para as pontas das antenas (os palitos): desenha, pinta e recorta «bolinhas» de cartolina.
Cola líquida
5 - Cola as peças de cartolina e os palitos na pinha; pressiona para fixar bem;
Corda ou fio Marcador preto
6 - Ata a corda ou fio à pinha e coloca na árvore de Natal.
© Pedro Alvito
MÃOS À OBRA 1 - Faz a gelatina desfazendo o pó da gelatina
na água a ferver (pede ajuda a um adulto e segue as instruções da gelatina).
2 - Devagar, coloca a mistura para pássaro na
MATERIAL Mistura ou alimento para pássaros Gelatina
gelatina, mexendo com cuidado. Verifica que todas as sementes estão totalmente revestidas.
Água a ferver (pede ajuda a um adulto)
3 - Coloca os cortadores de biscoito em cima do tabuleiro e enche com a mistura de gelatina e alimento para pássaro (utiliza a parte de trás da colher para pressionar bem a mistura).
Tigela e colher para mexer
4 - Coloca um pedaço de palhinha no sítio onde a corda para pendurar o enfeite vai passar.
5 - Deixa no frigorífico por algumas horas, depois retira e deixar secar durante a noite. 6 - Retira os cortadores com cuidado e pendura
SNACKS DECORATIVOS
Ideal para árvores de jardim, pois são verdadeiros snacks para os nossos amiguinhos de duas asas.
Cortadores de biscoitos com várias formas Tabuleiro coberto em papel de alumínio Palhinhas Corda ou fita
as tuas obras primas numa árvore ou arbusto.
© MagicOnions
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Fonte: www.messylittlemonster.com/2014/12/how-to-make-biscuit-cutter-bird-feeders
n.ยบ 53 pardela | 39
Binóculos & Telescópios Natura BGA ED
Explorer WA ED
Equipado com óticas com amplo campo de visão para melhor observação, objetivas de vidro ED para imagens mais nítidas e com um corpo revestido em borracha, os Natura BGA ED apresentam-se como uma nova referência de qualidade, desempenho e ergonomia.
Com o seu sistema ótico compacto, os Explorer WA ED combinam uma visão de campo ampla com as imagens claras e o sistema de conforto para os olhos, permitindo uma visualização confortável com ou sem óculos. Garantia de 10 anos.
30 anos de garantia. Disponível em 8x32, 8x42 e 10x42 com preços a partir de 339 3
Tripés XFS-C Birdwatcher’s & Traveller 42116 XFS-C Traveller 195 3 42122 XFS-C Birdwatcher’s 234 3
Disponível em 8x42 e 10x42 com preços desde 285 3
Telescópio MM3 GA ED Um novo nível de desempenho por menos do que pensa, o MM3 pesa sensivelmente o mesmo que um par de binóculos de 42mm e pode ser utilizado sem tripé e obter ainda assim uma observação perfeita com ampliações abaixo das 20x. Ao contrário dos binóculos, o MM3 continua a proporcionar uma clareza e definição impressionantes a ampliações até 36x (50mm) e 45x (60mm). Telescópio disponível em modelo de linha recta ou em corpos angulares de 45˚, e com a possibilidade de escolha de oculares intercambiáveis. 30 anos de garantia. Modelos: MM3 50 GA ED 389 3, MM3 60 GA ES 519 3 Oculares recomendadas: HDF T 12-36/15-45x 259 3, SDLv2 12-36x/15-45x 379 3
O equipamento Opticron pode ser testado e adquirido na SPEA, o nosso representante exclusivo em Portugal. Para mais informações, por favor contacte 213 220 430 ou visite-nos online em www.spea.pt/catalogo/ 40 | pardela n.º 53
Opticron. Unit 21, Titan Court, Laporte Way, Luton, Beds, LU4 8EF UK Tel: +44 1582 726522 Email: sales@opticron.co.uk Web: www.opticron.co.uk