Olá, tagger
Écom alegria que enviamos a você este mês, em primeiríssima mão, mais um romance policial brasileiro. Depois do sucesso de O beijo do rio, do escritor capixaba Stefano Volp, lançado no ano passado, temos agora a chance de conhecer outro representante da atual literatura de suspense nacional — Pablo Zorzi.
O autor catarinense vem trilhando uma interessante trajetória no gênero, que inclui a participação em um livro de contos ao lado de nomes como Raphael Montes e Ilana Casoy. Com uma trama envolvente, Colheita de ossos gira em torno de um policial novato que tem de lidar com um crime brutal permeado por uma série de mistérios e subtramas.
A seguir, você confere um texto introdutório ao livro, com direito a outras referências da literatura policial e uma lista de personagens para situá-lo devidamente na história. Há também uma entrevista com Zorzi, que dá mais detalhes da concepção do romance. Por fim, uma reportagem contextualiza uma das subtramas do livro — no caso, a presença nazista no Brasil durante a Segunda Guerra Mundial.
Boa leitura!
TAG Comércio de Livros S.A.
Tv. São José, 455 | Bairro Navegantes
Porto Alegre — RS | CEP: 90240-200
(51) 3095-5200
taglivros
contato@taglivros.com.br www.taglivros.com
QUEM FAZ
JÚLIA CORRÊA Editora
LIZIANE KUGLAND Revisora ANTÔNIO AUGUSTO Revisor
Capa Angelo Bottino e Fernanda Mello
Página da loja Lais Holanda Impressão Impressos Portão
Preciso de ajuda, TAG! Olá, eu sou a Sofia, assistente virtual da TAG. Converse comigo pelo WhatsApp para rastrear a sua caixinha, confirmar pagamentos e muito mais!
+55 (51) 99196-8623
VAMOS LER
Criamos esta experiência para expandir sua leitura. Entre no clima de Colheita de ossos colocando a playlist especial do mês para tocar. É só apontar a câmera do seu celular para o QR Code ao lado ou procurar por “taglivros” no Spotify. Não se esqueça de desbloquear o kit no aplicativo da TAG e aproveitar os conteúdos complementares!
Leia até a página 78
Um crime sangrento e muito macabro é tudo aquilo de que um novato da Polícia Civil gostaria de se manter longe. Mas é exatamente o que Hugo encontra em suas primeiras semanas de trabalho no oeste de Santa Catarina. E é um caso difícil: para começar, o principal suspeito tem um álibi.
Leia até a página 154
Várias atualizações no caso. Uma personagem está sendo mantida refém, e descobrimos que seu avô planejava transformar uma série de memórias em um livro. No meio disso tudo, uma mulher é sequestrada e a polícia descobre o seu vínculo com outra figura envolvida no assassinato. O que está achando da leitura até aqui? Comente no aplicativo da TAG!
Leia até a página 230
A doença de Hugo o atormenta, e o caso parece ficar cada vez mais complicado! Um homem parece estar fazendo “pequenas tarefas” em conjunto com o mentor dos crimes, e a polícia encontra itens bastante suspeitos. Já passamos da metade do livro, está perto de você descobrir o desfecho da história.
Leia até a página 308
A trama está começando a se desembaraçar. Levada ao hospital, uma personagem revela uma série de detalhes. A intuição de Hugo o leva a desconfiar cada vez mais de um suspeito. Será que ele está correto? Sigamos!
Leia até a página 366
Quantas coisas aconteceram nessas últimas páginas! Você já desconfiava de todo o plano que se revelou? Qual sua opinião sobre o desfecho? Conte lá no app!
Colheita de ossos pode ter terminado, mas a experiência não!
Aponte a câmera do seu celular para o QR Code ao lado e escute o episódio de nosso podcast dedicado ao livro do mês. No aplicativo, confira também a nossa agenda de bate-papos. OUVIR
projeto gráfico
Os materiais foram concebidos por Fernanda Mello e Angelo Bottino, ambos também responsáveis pelos projetos da TAG de O mistério de Henri Pick e de Longo e claro rio. A dupla de designers apostou em uma referência à cena inicial do livro, em que corpos humanos são encontrados junto com os de animais. A fusão desses elementos rendeu uma composição impactante, como pede um bom suspense policial!
mimo
Em maio, é comemorado o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Pensando nisso, o mimo destaca um autor muito querido pelos taggers, José Saramago. Celebramos sua visão peculiar do mundo com um abridor de garrafas no formato de seus famosos óculos.
“É um livro instigante desde o começo. Queria sempre ler mais para entender o que acontecia. Tem muito suspense em cada capítulo, o que deixa os sentimentos à flor da pele.”
Ana Catarina Venancio Cruz, parecerista da TAG.
“Desde o início, o suspense já pairava e me instigava a continuar tentando descobrir o assassino. O livro tem uma trama muito bem elaborada e amarrada, sem descrições apelativas. A leitura é fácil e viciante. Amei tanto que passei uma noite acordada, de tão ansiosa para descobrir o final.”
Michelly Vieira Guimarães Wilges, parecerista da TAG.
POR QUE LER O LIVRO
Representante da nova safra da literatura de suspense nacional, Pablo Zorzi apresenta um romance policial eletrizante, situado em uma localidade pouco explorada pela ficção brasileira. Com uma trama ágil e um enredo original, a obra do autor catarinense traz personagens envolventes e revela um trabalho minucioso de pesquisa para a construção dos eventos da narrativa, que são costurados de modo habilidoso.
Investigação e angústia em uma colheita macabra
PAULA SPERBRomance de Pablo Zorzi tem como protagonista um policial em início de carreira que precisa lidar simultaneamente com crise existencial e crime brutal
Talvez nenhum outro tipo de literatura segure tanto a atenção e — por que não? — a tensão dos leitores quanto um bom livro de histórias de detetives. Nessas obras, os crimes são engenhosamente elaborados para despistar qualquer conclusão antecipada por parte de quem lê. Mas, sozinhos, os crimes não seguram uma boa narrativa. Os detetives são peças indispensáveis nessa engrenagem. Alguns deles são célebres e considerados clássicos do gênero, como as histórias de Sherlock Holmes, do escritor Arthur Conan Doyle; C. Auguste Dupin, personagem criado por Edgar Allan Poe; e Hercule Poirot, o investigador saído da mente da rainha do gênero, Agatha Christie.
O livro do mês, Colheita de ossos, tem sua própria história de detetive. É um típico romance policial, porém brasileiro. É verdade que o Brasil tem seus próprios clássicos do gênero, com os autores Rubem Fonseca e Luiz Alfredo Garcia-Roza. Mas uma das características que distingue Colheita de ossos é o espaço da narrativa, um Brasil pouco retratado na literatura: o estado de Santa Catarina, mais especificamente o oeste catarinense. Naquela região, se está mais perto da fronteira com a Argentina do que do centro econômico e cultural do próprio país. Como diz a letra da música dos Engenheiros do Hawaii, “estamos longe demais das capitais”. A cidade onde a trama transcorre não é nominada, mas sabemos que está próxima de Chapecó, bem distante do litoral do estado.
Nada melhor para uma história repleta de crimes macabros do que estar longe de tudo, ainda mais em uma área rural. É justamente o que acontece em Colheita de ossos. O protagonista é Hugo Martins, um gaúcho de 29 anos que deixa o Rio Grande do Sul após ser aprovado na Academia de Polícia Civil de Santa Catarina. O jovem policial assume seu posto na pequena — e aparentemente pacata — cidade. Novato, ele precisa lidar com uma crise existencial enquanto é escalado para investigar uma série de assassinatos dignos de filme de terror. Inicialmente, Hugo parece se sentir inseguro com o desafio, mas irá se dedicar integralmente à tarefa. Tal dedicação é também um modo de fugir de seus próprios problemas.
Colheita de ossos tem um quê da saga do detetive Joona Linna, escrita pela dupla sueca Lars Kepler, por causa dos detalhes perturbadores que envolvem os crimes. Mas o livro do mês também dialoga com o que
há de melhor na literatura contemporânea brasileira, como os catarinenses Ieda Magri e Marcelo Labes, autores, respectivamente, de Um crime bárbaro (2022) e Três porcos (2020). Ambos os romances tratam de crimes reais ocorridos em Santa Catarina — o primeiro, no oeste catarinense, e o segundo, no Vale do Itajaí.
Além disso, diversos elementos que compõem romances policiais estão presentes em Colheita de ossos para não decepcionar quem gosta do gênero: o detetive mais experiente, a cena do crime com detalhes chocantes, personagens misteriosos, pistas que inicialmente não levam a lugar algum e, claro, o final surpreendente.
PRINCIPAIS PERSONAGENS
Hugo Martins: o protagonista, um policial novato de 29 anos
Anderson Vogel: jornalista que se muda para a área rural e trabalha no jornal local
Cristina Weiss: advogada, mulher de Anderson
Miguel Rosso: fotógrafo, amigo de Anderson
Álvaro Fiore: espirituoso delegado de 65 anos, chefe de Hugo
Jonas Heimich: policial transferido para o litoral
Lívia Tumelero: médica perita do Instituto Médico
Legal (IML)
Bento: vizinho do prédio de Hugo
Pâmela Jardim Viana: influencer digital, 27 anos
Estevão Viana: empresário, ex-marido de Pâmela
* e, claro, Magaiver: o cachorro vira-lata de Hugo
começo algo novo, tudo o que sei é o que vou escrever no primeiro capítulo”
Em conversa com a TAG, Pablo Zorzi detalha a concepção de Colheita de ossos, avalia o consumo do gênero policial no Brasil e compartilha referências literárias e cinematográficas
JÚLIA CORRÊA, LAURA VIOLA E SOPHIA MAIA
Como surgiu a ideia de escrever Colheita de ossos?
A cena inicial, ambientada na fazenda, foi o ponto de partida para a história?
A ideia surgiu após um desafio feito por outro escritor para que eu escrevesse uma história que se passasse no Brasil. Na época, todos os livros escritos por mim se passavam fora do país, em lugares reais ou fantasiosos. Vale ressaltar que essa opção por usar o exterior como cenário sempre foi escolha minha, pois, como costumava dizer: “Eu só me sinto bem escrevendo se eu conseguir viajar junto com a história. E não consigo viajar para lugar nenhum contando algo que se passa embaixo do meu nariz”. Apesar disso, posso dizer que escrever Colheita de ossos foi mais prazeroso do que imaginei que seria, pois pude utilizar nele linguajares, ocasiões e situações que apenas um bom brasileiro conseguiria descrever. Sobre a cena inicial ser
“Quando
o ponto de partida, a resposta é sim. Como sempre digo a quem me acompanha, eu não uso escaletas para criar histórias, de modo que, quando começo algo novo, tudo o que sei é o que vou escrever no primeiro capítulo. Todo o resto é mágica de escritor e, com o tempo, acaba vindo naturalmente — às vezes, nem tanto. Acredito que ser escritor seja isto: ter a capacidade de criar uma história inteira que faça sentido a partir do nada.
Entre os vários mistérios presentes em Colheita de ossos, um bem curioso remete aos tempos da Segunda Guerra Mundial, com a presença nazifascista no Brasil. Você fez muitas pesquisas para abordar esse tema? Como foi o processo de construir esse cenário mais histórico?
A pesquisa é importante para abordar qualquer tema que seja tratado em um livro, principalmente quando esse tema tem lastro histórico, como a Segunda Guerra, a fuga dos nazistas borra-botas para a América do Sul ou mesmo a não tão atual propagação de células que compactuam com esse absurdo por cidadãos brasileiros com cérebro de minhoca, que seriam jogados em câmaras de gás na época pelo simples fato de serem brasileiros. Sobre o processo de construção, não foi difícil, pois apenas uma pequena parte da história se passa nesse cenário. No entanto, tudo o que está escrito nesses pequenos trechos foi fruto de diversas pesquisas sobre o tema.
No decorrer da leitura, encontramos várias menções a outras produções de suspense policial. Pode nos contar quais são as suas principais referências do gênero? Além disso, qual é a sua avaliação sobre a produção brasileira atual, pensando também em termos de recepção do público? Acredita que há um interesse renovado por esse tipo de narrativa? Eu preciso confessar uma coisa e respeitosamente peço que não me cancelem por isso: eu leio menos do que deveria. Shame on me! Eu sou apenas um rapaz apaixonado por séries e filmes, de modo que a esmagadora maioria de minhas referências são obras desse tipo: True Detective, Se7en, O silêncio dos inocentes, Sobre meninos e lobos, Zodíaco, Ilha do medo (quatro deles, inclusive, baseados em livros que me orgulho em dizer
que li) e as atuais The Sinner e Mare of Easttown. Sou otimista com respeito ao interesse do público por esse tipo de narrativa, acreditando que tudo sempre tende a melhorar. Com honestidade, acho que estamos longe do ideal, embora estejamos melhores do que ontem. Se conseguirmos produzir, editar e publicar obras de valor que alcancem o leitor e tornem o amanhã melhor do que o hoje, então estamos andando para a frente e, em breve, o ideal vai ser alcançado. E, como a pergunta diz respeito a produções policiais atuais, não posso deixar de citar quatro autores nacionais do gênero que tive o prazer de ler, conhecer e trocar experiências, que são o Gustavo Ávila, a Ilana Casoy, o Raphael Montes e o Victor Bonini. A literatura policial brasileira está em boas mãos.
A doença de Hugo é um elemento que se destaca na história. O seu objetivo era intensificar a tensão da trama a partir da inclusão desse drama vivido pelo personagem?
A princípio, a doença do Hugo tinha sido adicionada somente para intensificar o apego do leitor ao personagem, mas isso acabou se tornando quase uma “estaca moral” na história, com várias decisões sendo tomadas pelo personagem se baseando na doença. Uma curiosidade interessante é que a ideia surgiu tardiamente, quando eu já estava capítulos à frente na história. Ou seja, ela foi acrescentada depois, apenas com a intenção de intensificar o apego, e acabou se tornando peça fundamental na história.
Para criar um suspense policial, você precisa conhecer bem os mecanismos de investigação. Como você se aprofundou nessas questões para garantir verossimilhança ao seu romance? Pesquisa policial. Para conhecimento geral, eu moro em uma cidade pequena — alguns até diriam que ela é minúscula —, onde todo mundo se conhece pelo nome. Dessa forma, tenho acesso facilitado a policiais militares, investigadores, delegados, juízes, promotores, médicos, agricultores e afins. Durante a escrita do livro, perdi a conta de quantas vezes recorri a algum deles para tirar dúvidas sobre como proceder, sobre como o
personagem agiria em determinada ocasião, sobre como a leucemia age no corpo, sobre quantos pés de soja crescem em um hectare de terra, sobre como é feita uma autópsia, sobre quase tudo para o que eu não tinha respostas. Os nomes de alguns deles, os que mais suportaram minhas perguntas sem me mandar “pra aquele lugar”, estão na página de agradecimentos do livro.
Há alguns pontos que não se fecham por completo no final da história, deixando margem para especulações. Como você encara essa proposta de deixar certos aspectos de modo mais sugestivo para a imaginação dos leitores? “Nunca duvide da inteligência do leitor.” Essa é uma das melhores frases que ouvi nos últimos anos. Eu concordo com ela, de modo que não sinto necessidade de explicar algumas coisas no decorrer da história e no final dela. Posso estar errado? Posso! Para mim, o excesso de explicações chateia. Por que Ted Bundy matava mulheres? Ah, porque ele tinha ódio ao sexo feminino por causa de sua mãe, de modo que escolhia apenas meninas que possuíssem semelhança física com ela. Chato demais. Matava porque tinha um parafuso a menos. Simples assim.
Adoraríamos saber um pouco mais de seu processo criativo. De um modo geral, como é a sua rotina de escrita?
Não tenho rotina e deveria ser coroado como o Rei da Procrastinação. Eu demoro para escrever e, somado a isso, tenho outras atividades que me tomam mais tempo do que eu gostaria. Enquanto alguns autores escrevem um livro em quinze dias, eu preciso de dois anos pelo simples fato de que sempre deixo para depois. Quem nunca? Costumo dizer que escrevo quando quero e, quando não quero, não escrevo. E admito que não quero escrever a maioria do tempo. Isso pode soar estranho, mas, para mim, funciona. Minha agente (beijo, Alba) pega no meu pé aqui, cobra um prazo ali, e assim a locomotiva segue. Vou melhorar, prometo. Colheita de ossos está aí e, logo mais, tem novidade. Já estou melhorando.
Crédito: Acervo pessoal
QUEM É PABLO ZORZI?
O autor nasceu em 1987, em Chapecó, Santa Catarina, onde vive ainda hoje. Publicado em 2019, seu primeiro romance — uma ficção científica intitulada WOW! O primeiro contato — esteve entre os mais vendidos do estande do Grupo Editorial Record na 19ª Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Antes disso, em 2017, já havia participado do projeto Fim de Semana do Terror, com a produção de um conto para publicação ao lado de Raphael Montes e Ilana Casoy. No ano passado, lançou seu primeiro suspense policial, O homem de palha, publicado pela Astral Cultural. É membro da Associação Brasileira de Escritores de Romance Policial, Suspense e Terror (ABERST).
O primeiro livro que leu: Tenho quase certeza de que foi algum da coleção Salve-se Quem Puder, provavelmente A maldição do ídolo perdido, de Gaby Waters e Graham Round.
O livro que está lendo: A incrível viagem de Shackleton, de Alfred Lansing.
O livro que mudou a sua vida: Sapiens – uma breve história da humanidade, de Yuval Noah Harari.
O livro que gostaria de ter escrito: Sobre meninos e lobos, de Dennis Lehane.
O último livro que o fez rir: A incrível viagem de Shackleton.
O último livro que o fez chorar: O homem de palha (livro de autoria do próprio Zorzi).
O livro que não conseguiu terminar: A paciente silenciosa, de Alex Michaelides.
O nazismo e o Brasil na Segunda Guerra
Uma curiosa subtrama de Colheita de ossos revela a presença da ideologia nazista na América Latina; a seguir, descubra mais detalhes sobre o tema
Oromance Colheita de ossos, do escritor Pablo Zorzi, possui uma curiosa subtrama. Enquanto, na trama principal, Hugo e Álvaro esforçam-se para decifrar um crime, uma das pistas do caso leva a outra história. O policial recebe em casa um embrulho de papel pardo que guarda um misterioso diário. Ao perceber que está escrito em alemão, recorre a Lívia, médica do IML (Instituto Médico Legal) e parceira de investigação fluente na língua. Ele descobre que a frase da capa, Die Natur ist grausam, significa “a natureza é cruel” — uma frase de Mein Kampf, ou Minha luta, livro escrito por Adolf Hitler que contém os elementos de sua teoria racista e antissemita.
O diário narra a vinda de um oficial nazista para o Brasil em 1945, fugindo da Alemanha com a família diante da iminente derrota. O nazista refugiou-se em Santa Catarina, para onde levou consigo uma prisioneira polonesa e judia, Helena. Um ano depois, ela conseguiu se libertar ao ser ajudada por um imigrante húngaro, autor do diário. Ele acabou descobrindo que o oficial fora ajudado a sair da Alemanha por uma célula do Partido Nazista na América do Sul.
“Depois disso, não pude deixar de pensar que essa mesma célula foi responsável pela chegada do médico nazista Josef Mengele no Brasil, em 1949”, escreveu no diário.
Muitas vezes, a ficção é inspirada na realidade. De fato, Mengele viveu no Brasil. O médico que enviou milhares de judeus para câmaras de gás e fez experimentos cruéis em bebês viveu protegido no Brasil por 17 anos. Além disso, em função da imigração alemã, especialmente ao Sul do Brasil no século XIX e começo do XX, a associação com a presença do nazismo no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul é inevitável. É fundamental, porém, ressaltar que os alemães imigrantes e seus descendentes não eram, necessariamente, nazistas.
Segunda Guerra Mundial
A pesquisadora Ana Maria Dietrich, na sua tese de doutorado Nazismo tropical? O partido nazista no Brasil, defendida na USP (Universidade de São Paulo), aponta que o Brasil tinha a maior célula do partido nazista fora da Alemanha, com 2.900 filiados. Porém, ao contrário do que se possa esperar dos estados sulistas, o maior número de integrantes estava em São Paulo, com 785 membros. Depois, apareciam Santa Catarina (528), Rio de Janeiro (447), Rio Grande do Sul (439) e Paraná (185).
Crédito:
O Brasil assumiu seu lado na Segunda Guerra Mundial em 1942, decidindo se opor ao Eixo (Alemanha, Itália e Japão) e apoiar os Aliados (entre eles Estados Unidos e União Soviética). Na ocasião, em uma reunião com todos os países americanos, apenas Chile e Argentina optaram por não romper relações com o Eixo.
A proximidade do Brasil com a Argentina gerou o temor de uma possível invasão nazista no Brasil caso a Alemanha vencesse a guerra. É importante ressaltar que, na época, as autoridades precisavam cogitar todos os cenários — os riscos não eram infundados.
“Quando o Brasil toma partido contra a Alemanha, abre espaço para que seus inimigos e os aliados dos seus inimigos reajam. Assim, há uma ameaça real”, explica à TAG Micael Alvino da Silva, professor de História das Relações Internacionais na UNILA (Universidade Federal da Integração Latino-Americana).
O professor ressalta, todavia, que essa ameaça real não tinha a forma do alemão ou descendente, muitas vezes pobre, do meio rural. O perigo eram os espiões, que poderiam entrar mais facilmente pelas fronteiras com a Argentina, que perpassa todos os estados do Sul.
“Houve casos de espiões descobertos, por exemplo, fotografando o movimento de navios no Porto de Santos para dizer quais navios de guerra circulavam por aqui e na base de navios norte-americanos no Nordeste. Era o tipo de informação que poderia dar um ganho de preparo aos nazistas contra uma investida dos Aliados, gerando um perigo real de perda do elemento-surpresa, tão importante nas operações”, explica Silva, autor do livro A Segunda Guerra Mundial e a Tríplice Fronteira: a vigilância aos “súditos do Eixo” alemães e italianos (EDUNILA, 2021).
Integralismo
No Brasil, além do partido nazista, existia o movimento integralista, também de cunho fascista e inspirado em Benito Mussolini, líder fascista da Itália na Segunda Guerra. Não raramente, os simpáticos ao nazismo também eram integralistas. Na sua tese, a pesquisadora Ana Maria Dietrich chama o integralismo de “fascismo à brasileira”. A Ação Integralista Brasileira tinha como lema “Deus, pátria e família”, o mesmo adotado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (2019–2022).
Materiais da Ação Integralista Brasileira. Crédito: Arquivo público do Rio de Janeiro.
Dietrich escreve que “o anauê que muitos teuto-brasileiros declamavam nas ruas de Blumenau, Harmonia e Rio do Sul, em Santa Catarina,” é entendido por ela como uma reação “tropical” ao nazismo original, “que não admitia os miscigenados em suas fileiras”.
O escritor catarinense Marcelo Labes é autor de um romance que trata da temática, Deus não dirige o destino dos povos (2023). Assim como em Colheita de ossos, um diário chega às mãos do protagonista do livro de Labes, que acaba revelando a história fascista e integralista no Vale do Itajaí no período da guerra.
O lado pobre da imigração alemã em Santa Catarina é um tema que inquieta Labes e já foi abordado em seus outros livros. Nesse romance, ele reflete sobre o quanto essas pessoas poderiam estar cientes da gravidade do nazismo. “Quem tinha ideia dessas coisas todas era sobretudo quem tinha grana para manter contato com a Alemanha, acesso aos periódicos etc. Então, a gente pode pensar mais no industrial do que naquele pequeno produtor de batata, que estava mais preocupado com a subsistência do que com a hegemonia branca no planeta”, provoca Labes.
Ainda assim, quando o assunto é o neonazismo — movimento contemporâneo que resgata o nazismo —, Santa Catarina acaba aparecendo no noticiário com fatos que variam desde uma governadora cujo pai era simpático ao nazismo até o professor que tinha uma suástica desenhada no fundo da piscina. Em Colheita de ossos, o protagonista, Hugo, passa em frente a uma livraria e pensa em Mein Kampf, referenciado no diário encontrado. “Sentiu-se trouxa por pensar que o encontraria ali. Quem iria querer comprar? Embora soubesse que o Sul do Brasil era o lugar com a maior concentração de neonazistas do país, não imaginava que eles fossem estúpidos o bastante para comprar a bíblia do nazismo numa livraria”, conta o narrador.
Como bom policial, Hugo certamente sabia: no Brasil, apologia ao nazismo pode ter pena de até cinco anos de prisão.
vem aí
encontros TAG:
Perguntas sobre Colheita de ossos
1. Qual é a sua avaliação sobre Hugo, o protagonista? Como você vê a evolução do modo como ele lidou com o crime ao longo do livro? O que achou do drama pessoal vivido por ele?
2. Quais são as suas impressões sobre o modo como o autor conduziu todo o mistério da trama? Ao longo da leitura, você desconfiou de algum personagem em especial?
3. Aproveite para debater a construção dos personagens secundários. O que você achou de figuras como Lívia e Fiore?
4. A partir das memórias de um dos personagens, o livro acaba por nos revelar a presença nazista no Brasil durante a Segunda Guerra Mundial. Você já sabia disso? Leia a matéria da página 16 e reflita sobre a representação do tema no livro.
5. O que você achou do desfecho da história? Quais considera os pontos fortes e fracos da narrativa?
O encontro entre três personagens solitários pertencentes a diferentes gerações é o mote do nosso livro de junho, escrito por uma francesa considerada a romancista mais lida atualmente em seu país.
Para quem gosta de: literatura francesa, livros feel-good, tramas entrelaçadas
Para celebrar os nove anos da TAG, nada mais apropriado do que uma obra que exalte o poder dos livros. Ideal para quem gosta de autoras como Janet Skeslien Charles e Kate Quinn, o título do mês é um romance histórico envolvente ambientado na Segunda Guerra Mundial. Na trama, acompanhamos as trajetórias de três mulheres que buscam resistir àquele período sombrio.
Para quem gosta de: ficção histórica, livros sobre livros, personagens femininas marcantes
“Não há nada mais enganoso do que um fato óbvio.”
— ARTHUR CONAN DOYLE