A cobertura sobre crimes do programa cidade alerta ms análise a partir de parâmetros norma

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL FACULDADE DE ARTES, LETRAS E COMUNICAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

JÚLIA SOARES PAZ

A COBERTURA SOBRE CRIMES DO PROGRAMA CIDADE ALERTA MS: ANÁLISE A PARTIR DE PARÂMETROS NORMATIVOS

Campo Grande (MS) Julho/2017

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A COBERTURA SOBRE CRIMES DO PROGRAMA CIDADE ALERTA MS: ANÁLISE A PARTIR DE PARÂMETROS NORMATIVOS JÚLIA SOARES PAZ

Monografia apresentada como requisito parcial para aprovação na disciplina Projetos Experimentais do Curso de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

Orientador: Prof. Dr. Marcos Paulo da Silva


AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Lucilene Soares da Costa e Ravel Giordano Paz, por, desde criança, me incentivarem a ler e a estudar. Ao meu namorado, Guilherme Teló, que durante os quatro anos de faculdade esteve ao meu lado, me apoiando e amando em todos os momentos, incluindo os de estresse e as noites mal dormidas. Ao meu padrasto, Luiz Alberto Nascimento, sempre disposto a ajudar e a compartilhar comigo seus conhecimentos jurídicos. Ao professor e orientador, Marcos Paulo da Silva, que durante toda a graduação me apoiou e ainda mais durante esta monografia, corrigindo meu trabalho em domingos e me orientando após dias de trabalho cansativos. Posso dizer com convicção que não existe orientador melhor. Ao professor, Pedro Paulo Sperb Wanderley, sempre prestativo, disposto a me auxiliar e a nutrir o amor pelo Direito Penal. Aos docentes do curso de Comunicação Social, cujos ensinamentos vão ficar para sempre na minha memória com carinho. Em especial, a professora Katarini Miguel, que se tornou para mim, e para muitos outros alunos, um modelo de mulher e profissional.


LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Reportagem 1 .......................................................................................................... 40 Figura 2 - Reportagem 2 .......................................................................................................... 44 Figura 3 - Reportagem 3 .......................................................................................................... 48 Figura 4 - Reportagem 4 .......................................................................................................... 54 Figura 5 - Reportagem 5 .......................................................................................................... 57 Figura 6 - Reportagem 6 .......................................................................................................... 61 Figura 7 - Reportagem 7 .......................................................................................................... 64 Figura 8 - Reportagem 8 .......................................................................................................... 68


RESUMO: Este trabalho tem como objetivo desenvolver uma análise baseada em parâmetros normativos sobre a abordagem jornalística acerca das infrações tipificadas como crimes contra o patrimônio e os tipos elencados na Lei 11.343, de 2006, conhecida como Lei de Drogas. Como opção metodológica, foram selecionadas oito reportagens do programa televisivo Cidade Alerta MS, exibido na Rede Record MS e classificado como Jornalismo policial. Ao optar por esse tema, a monografia, busca evidenciar a importância da observância do respeito aos direitos humanos fundamentais no exercício da atividade jornalística. Para esse fim, este trabalho traz, no primeiro capítulo, uma contextualização histórica a respeito da relação entre jornalismo e cidadania; no segundo capítulo, estabelece os parâmetros normativos, formados pelos trechos pertinentes extraídos da Constituição Federal, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, dos princípios do Direito Penal e do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, a serem adotados na análise propriamente dita. A análise empírica verificou se a construção das reportagens do programa Cidade Alerta MS está em sintonia com a legislação brasileira e com os critérios éticos atribuídos ao Jornalismo. Como resultados, foram encontradas diversas infrações aos parâmetros legais e/ou ético-deontológicos estabelecidos. Palavras-chave: Jornalismo; cidadania; direito; cidade alerta ms;


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................

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1 JORNALISMO E CIDADANIA.....................................................................................

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1.1 O JORNALISMO, A CIDADANIA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS............

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1.2 O JORNALISMO, OS DIREITOS SOCIAIS E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO.... 13 1.3 A VISÃO NORMATIVA E A ABORDAGEM CRÍTICA NA RELAÇÃO ENTRE JORNALISMO E CIDADANIA........................................................................................... 14 2 PARÂMETROS NORMATIVOS PARA A COBERTURA DE CRIMES NO JORNALISMO....................................................................................................................

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2.1 A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS E AS GARANTIAS FUNDAMENTAIS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL...............................

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2.1.1 A construção histórica dos direitos fundamentais................................................... 17 2.1.2 Parâmetros de análise extraídos da Declaração Universal de Diretos Humanos e da Constituição Federal...................................................................................................

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2.2 O DIREITO PENAL.......................................................................................................

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2.2.1 Considerações introdutórias sobre o Direito Penal................................................. 23 2.2.2 Os crimes contra o patrimônio: roubo e furto......................................................... 25 2.2.3 O uso e o tráfico de drogas na Lei 11.343/06...........................................................

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2.2.4 Parâmetros de análise extraídos do Direito Penal................................................... 29 2.3 O CÓDIGO DE ÉTICA DOS JORNALISTAS BRASILEIROS...................................

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2.3.1 Parâmetros de análise extraídos do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros............................................................................................................................. 31 2.4 SISTEMATIZAÇÃO DOS PARÂMETROS NORMATIVOS...................................... 33 3 ANÁLISE CRÍTICA A PARTIR DE PARÂMETROS NORMATIVOS................... 39 3.1 REPORTAGEM 1...........................................................................................................

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3.1.1 Análise descritiva........................................................................................................ 40 3.1.2 Análise crítica.............................................................................................................. 41 3.2 REPORTAGEM 2...........................................................................................................

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3.2.1 Análise descritiva........................................................................................................ 44 3.2.2 Análise crítica.............................................................................................................. 45


3.3 REPORTAGEM 3...........................................................................................................

48

3.3.1 Análise descritiva........................................................................................................ 48 3.3.2 Análise crítica.............................................................................................................. 49 3.4 REPORTAGEM 4...........................................................................................................

54

3.4.1 Análise descritiva........................................................................................................ 54 3.4.2 Análise crítica...........................................................................................................

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3.5 REPORTAGEM 5...........................................................................................................

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3.5.1 Análise descritiva........................................................................................................ 57 3.5.2 Análise crítica.............................................................................................................. 58 3.6 REPORTAGEM 6...........................................................................................................

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3.6.1 Análise descritiva........................................................................................................ 61 3.6.2 Análise crítica.............................................................................................................. 62 3.7 REPORTAGEM 7...........................................................................................................

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3.7.1 Análise descritiva........................................................................................................ 64 3.7.2 Análise crítica.............................................................................................................. 65 3.8 REPORTAGEM 8...........................................................................................................

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3.8.1 Análise descritiva........................................................................................................ 68 3.8.2 Análise crítica.............................................................................................................. 69 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 72 REFERÊNCIAS..................................................................................................................

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APÊNDICE A - Transcrição da Reportagem 1................................................................

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APÊNDICE B - Transcrição da Reportagem 2................................................................

79

APÊNDICE C - Transcrição da Reportagem 3................................................................

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APÊNDICE D - Transcrição da Reportagem 4................................................................

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APÊNDICE E - Transcrição da Reportagem 5................................................................

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APÊNDICE F - Transcrição da Reportagem 6................................................................

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APÊNDICE G - Transcrição da Reportagem 7................................................................ 90 APÊNDICE H - Transcrição da Reportagem 8................................................................ 91


INTRODUÇÃO

Esta monografia tem como objetivo desenvolver uma análise baseada em parâmetros normativos sobre a abordagem jornalística acerca de acontecimentos tipificados como crimes contra o patrimônio e os tipos elencados pela Lei 11.343, de 2006, conhecida como Lei de Drogas. Para esse fim, foram selecionadas como recorte empírico reportagens do programa televisivo Cidade Alerta MS, exibido na Rede Record MS e classificado como Jornalismo policial, como será debatido à frente. Por análise baseada em parâmetros normativos, entende-se um estudo que se propõe verificar se o programa mencionado aproxima-se ou distancia-se de princípios considerados ideais em documentos legais e/ou ético-deontológicos. Os crimes contra o patrimônio estão elencados no Código Penal, nos artigos 155 a 183. Para o escopo desta monografia, porém, adota-se como opção metodológica apenas a análise dos crimes de furto e de roubo, os mais comuns crimes contra o patrimônio localizados na cobertura jornalística. Por sua vez, a Lei de Drogas, entre outras disposições, “estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes” (BRASIL, 2006). Com base na Lei 11.343, serão abordadas as questões do uso e tráfico de drogas no interior da abordagem jornalística. A escolha do tema se deu devido à intersecção entre o Jornalismo e o Direito por parte da autora1, em especial o direito penal e os direitos humanos. O interesse em fazer uma análise crítica acerca da cobertura sobre os crimes contra o patrimônio e o tráfico de drogas advém de inúmeros aspectos. Entre eles, encontra-se o fato de que os referidos crimes e seus supostos autores são assuntos controversos na sociedade, suas abordagens despertam reações efusivas por parte do público e até mesmo por parte dos enunciadores. Também são assuntos que fazem parte do convívio diário da população, de grande frequência na mídia e de grande relevância social. A escolha do recorte também se deu pela frequência desses crimes. Segundo dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, de 2014, 28% das pessoas presas no Brasil estão encarceradas acusadas de tráfico de Drogas. Em segundo lugar, estão os denunciados por crime de roubo, que representam 25% da população carcerária e, em seguida,

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Paralelamente à graduação em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), a autora cursa Direito na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB).

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os denunciados por crime de furto, que totalizam 13%. Nem sempre, entretanto, o crime de tráfico de drogas ocupou o primeiro lugar. O mesmo Levantamento do Infopen demonstrou que, desde a vigência da Lei de Drogas de 2006, que revogou a anterior Lei nº6.368/76, o número de presos por tráfico de drogas passou de 14%, 32.880 pessoas em 2005, para 28%, totalizando 147.475 pessoas em 2014. Nos presídios femininos, quase 70% das detentas estão presas por tráfico, um aumento alarmante na população carcerária brasileira, que atualmente é a quarta maior do mundo, com mais 600 mil presos. No ponto de vista deste trabalho, o Jornalismo e o Direito deveriam ser guiados por pressuposto éticos similares, principalmente devido à importância, função e grande impacto social causados por ambos. Logo, o segundo objetivo desta monografia, não menos importante, será expor, mesmo que de maneira breve, a construção histórica do Jornalismo relacionada à cidadania e evidenciar a necessidade da observância dos direitos humanos fundamentais como diretrizes no exercício do jornalismo. Para esse fim, o trabalho foi divido em três capítulos. No primeiro capítulo, intitulado “Jornalismo e Cidadania”, por meio de uma explanação teórica, tratar-se da relação entre a atividade jornalística e os direitos de cidadania pautada no desenvolvimento dos direitos fundamentais. Para esse fim, foi abordada a construção histórica da concepção de “cidadania”, que nasce, na Antiguidade, como atribuição exclusiva de classes mais abastadas, posteriormente, com o advento das revoluções burguesas, ganha novo significado, abrangendo liberdades e direitos individuais e assume, atualmente, caráter mais inclusivista, e pautado, também, na ideia de direitos iguais a todas as pessoas. Tendo em vista a evolução do conceito de cidadania, que deixa de ter cunho estritamente liberal, o referido capítulo aborda também o aparente conflito entre as liberdades de expressão, opinião e imprensa e os direitos sociais. O segundo capítulo estabelece os parâmetros normativos que são utilizados na análise empírica. Destes dispositivos normativos são elencados uma grade de artigos e trechos que, articulados, formam uma matriz de parâmetros. As fontes dos artigos e trechos selecionados são a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Constituição Federal, o Código Penal e o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Ademais, serão apresentados conceitos básicos da esfera do Direito que se relacionam com os dispositivos apresentados. Enfim, foi feita a análise propriamente dita. O corpus escolhido consiste em oito reportagens, que abordam os crimes de tráfico de drogas, roubo e furto. Todas as reportagens foram extraídas do programa televisivo Cidade Alerta MS, no período entre abril e maio de 2017. A escolha do programa decorreu de uma análise exploratória prévia que indicou que o


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programa tinha foco na cobertura de crimes, em especial crimes de tráfico de drogas e crimes contra o patrimônio, objetos desta monografia. A análise empírica correlaciona segmentos das reportagens selecionadas com os parâmetros normativos e observar se a construção das reportagens, está em sintonia com a legislação brasileira e com os critérios éticos atribuídos ao Jornalismo. Observadas a construção teórica deste trabalho e os parâmetros normativos estabelecidos como norteadores da análise empírica em si, pode-se observar que o programa Cidade Alerta MS destoa, de maneira significativa, tanto da legislação vigente quanto dos critérios éticos atribuídos ao exercício da atividade jornalística.


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1 JORNALISMO E CIDADANIA

1.1 O JORNALISMO, A CIDADANIA E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

A relação entre Jornalismo e cidadania pode ser abordada de diversas maneiras. A princípio, é necessário pontuar que o conceito de cidadania consiste em uma construção histórica e, devido a isso, se modificou muito no decorrer do tempo. A noção contemporânea de cidadania, que remete a direitos iguais a todas as pessoas, advém de longos embates e não está nem perto de ser concluída. Murilo César Soares (2009), ao tratar da evolução do conceito de cidadania, menciona a Antiguidade clássica, período histórico em que a noção de cidadania estava invariavelmente ligada a privilégios das classes dominantes. Isso ocorre, pois o status de “cidadão” era atribuído apenas às pessoas mais abastadas, excluindo escravos, classes subalternas e mulheres. O autor cita que, para os gregos, cidadania era um atributo dos proprietários. Já no caso dos romanos, eram privilegiados apenas os membros de uma oligarquia formada por patrícios e proprietários rurais, que dominavam cargos públicos e religiosos. Observa-se, então, que a cidadania na Antiguidade era marcada, ao contrário da visão atual, por seu exclusivismo social (SOARES, 2009). Com o advento das revoluções burguesas, no século XVIII, com ênfase na Revolução Francesa, em 1789 e na Independência Americana, em 1775, a palavra “cidadão” adquire um significado inclusivista, que se contrapõe ao exclusivismo social da Antiguidade. Esse fato decorre do intuito dessas reformas, que era a conquista dos direitos e liberdades à burguesia, fazendo cessar, assim, os privilégios de uma minoria aristocrática. Com a queda das monarquias, não havia mais súditos a serem governados, e sim, pessoas autônomas em busca de seus direitos. Logo, a mudança no conceito de cidadão nasce, em consonância com as mudanças sociais da época, focada nas liberdades individuas e, principalmente, na luta contra o absolutismo monárquico (SOARES, 2009). Durante esses processos de ruptura, começam a se desenvolver novos modelos de Estados, moldados, em grande parte, pelos interesses da classe social em ascensão: a burguesia. Para Wilson Gomes (2009), esse processo ajuda a consolidar a própria noção de democracia moderna:

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É de conhecimento comum que a classe burguesa europeia, ao redor do século XVIII, detentora de muito poder econômico e nenhum poder político, estabeleceu polemicamente contra a classe que lhe é antagônica – a aristocracia – um conjunto de instituições que constituem política e economicamente, o modelo de sociedade ainda nos situamos (cf. Habermas, 1990). Trata-se de nada mais nem menos que instituições como a democracia moderna e os institutos que lhe são correlacionados: mercado, esfera pública, opinião pública, jornalismo de opinião. (GOMES, 2009, p.72).

Como a imprensa era considerada um dos instrumentos fundamentais para a manifestação e formação da opinião do público, surge, nesse contexto histórico, de acordo com Wilson Gomes (2009), o Jornalismo de opinião. “A imprensa que nasce desse modo recebe de tal nascimento um certo destino e conjunto de propriedades” (GOMES, 2009, p.73). Para o autor, a imprensa nasce burguesa e iluminista. Além disso,

Nasce também liberal, portanto, ciosa da sua autonomia em face do Estado ou dos poderes e convicta de que a liberdade de expressão, opinião e imprensa são fundamentais para um modelo de sociedade baseada na autodeterminação dos sujeitos. (GOMES, 2009, p. 74).

Esse modelo só será relativizado no mundo ocidental no início do século XX, com o nascimento da ideia de Jornalismo informativo nos Estados Unidos (SCHUDSON, 1978). Com o passar do tempo, a evolução na concepção de cidadania segue influenciando a prática jornalística. Embora essas mudanças nos direitos de cidadania tenham ocorrido em nível mundial, cada país, considerados seus contextos históricos e culturais, percorreu seu próprio caminho em relação aos direitos fundamentais e à normatização dos mesmos. A América Latina, particularmente marcada pela pobreza e desigualdade social, sofre com um atraso em termos de “cidadania” (VICENTE, 2009, p. 72). Segundo o autor, fatores como esses, somados com a exclusão de indígenas e escravos, repercutem, atualmente, no retardamento da concessão de direitos sociais e políticos nos países do continente latinoamericano. A organização da atividade jornalística na América Latina, portanto, não é aleatória a essa conjuntura. Efetivamente, essa nova concepção de “cidadania” ocorre relacionada à evolução dos direitos fundamentais, que adquirem outras perspectivas no decorrer do tempo. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, é tida como marco, pois normatizou mundialmente o conceito de “cidadania a todos” que é adotado atualmente, pois, nela, além dos direitos individuais, são reconhecidos os direitos sociais.


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A noção contemporânea de cidadania implica que os cidadãos têm certos direitos [...] Trata-se de uma construção histórica em expansão, ligada hoje a muitos aspectos da vida, significando o acesso dos cidadãos à saúde, à educação, à previdência, à cultura, à comunicação, etc. (SOARES, 2009, p.56).

No próximo capítulo, que tratará dos aspectos normativos deste trabalho, será mais amplamente discutida a construção histórica dos direitos fundamentais, sendo pontuadas as gerações dos direitos de cidadania e suas implicações. Neste momento, volta-se ao fato de que o Jornalismo se relaciona intimamente com os direitos fundamentais desde sua gênese no terreno dos debates liberais na Europa e das derivações nas demais partes do mundo. A primeira relação que será feita entre Jornalismo, cidadania e direitos fundamentais se dá justamente como pré-requisito para a existência do mesmo: os direitos à comunicação. Como observado acima, eles foram oriundos de uma construção histórica. No Brasil, são ratificados pelo texto da Constituição Federal, que, entre outras atribuições, protege a atividade jornalística. Ao versar sobre liberdade de imprensa, liberdade de opinião e liberdade de expressão, a intenção do legislador é impedir qualquer tipo de censura. Carlo José Napolitano (2009) considera a liberdade jornalística como uma garantia institucional de democracia.

Dentro desses direitos que compreendem o direito à comunicação podem ser relacionados: o direito à liberdade de expressão, a regulamentação quanto à pluralidade e diversidade nos meios de comunicação, a liberdade de imprensa, o direito de informação, o direito à informação, a liberdade de opinião, os direitos relacionados à liberdade intelectual, dentre outros. Esses direitos estão previstos e garantidos na atual constituição federal brasileira de 05 de outubro de 1988. (NAPOLITANO, 2009, p. 10).

Entretanto, o autor pondera: “Esse direito representa duas vertentes: o direito de informar e o direito de ser informado” (NAPOLITANO, 2009, p. 22). Com essa colocação, o autor elucida que o legislador, ciente de que o Jornalismo é essencial ao exercício dos direitos de cidadania, assegura no texto constitucional o direito da população de ter acesso à informação de forma mais ampla possível. Para Soares (2009, p. 59), o direito à comunicação é indispensável ao exercício de outros direitos fundamentais, sobretudo dos direitos políticos. Por esse ponto de vista, o autor classifica direito à informação como um “direito-meio”, pois a população depende dele, por exemplo, para estar a par das arbitrariedades de um governante e pressiona-lo em busca de melhorias. Nesse caso, os direitos políticos seriam “direitos-fim”, que, consequentemente, não


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seriam possíveis sem os “direitos-meio”. Segundo Gentilli (2005, p. 125 apud SOARES, 2009, p. 58), “a informação jornalística é, simplesmente, indispensável para o estar no mundo nos dias de hoje. O que alguns autores chamam de ‘necessidade social da informação’ é hoje suprida sobretudo pelo jornalismo”. O tópico seguinte abordará o aparente conflito entre o exercício dos direitos de comunicação e os direitos sociais visando mostrar que, entre eles, é necessário equilíbrio.

1.2 O JORNALISMO, OS DIREITOS SOCIAIS E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO

No início deste capítulo, foi abordada a origem liberal do Jornalismo de opinião e sua importância em um contexto histórico específico de luta da burguesia contra o absolutismo monárquico. Entretanto, em mais de dois séculos percorridos desde as revoluções burguesas, esses contextos se alteraram drasticamente. Para Gomes (2009, p, 75), “a disputa entre a burguesia e aristocracia se encerrou com a vitória total da primeira. O Estado absolutista viu-se substituído pelo Estado burguês”. De acordo com o autor, o Jornalismo continua se utilizando desenfreadamente de máximas liberais e iluministas, como a liberdade de expressão e o interesse público, como forma de autolegitimação, sem se atentar às mudanças na sociedade.

O discurso de autolegitimação do jornalismo, pelo menos em sua maior parte, continua o mesmo, não obstante todas as mudanças sociais da sua existência e nos modelos em que ele é praticado. Como se ainda estivéssemos dois dias antes das revoluções burguesas, o jornalismo continua falando de opinião pública, liberdade de imprensa e de interesse público praticamente no mesmo sentido em que essas categorias eram usadas há duzentos anos [...] tudo isso se mantém no imaginário e no discurso por uma estranha e inquietante inércia discursiva. (GOMES, 2009, p. 76).

É incontestável que a liberdade de expressão, assim como os outros direitos de comunicação, é um direito fundamental, garantido constitucionalmente e imprescindível ao exercício democrático. Como explanado anteriormente, eles surgiram atendendo às demandas de um determinado momento histórico. Outros direitos de cidadania, entretanto, com o passar do tempo, foram reconhecidos como tão importantes quanto. Isso poderá ser observado de maneira mais clara no próximo capítulo, quando serão apontadas as gerações dos direitos


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fundamentais, entre eles, os direitos sociais. No que tange aos direitos de comunicação, a intenção deste tópico não é desvalorizá-los, mas apontar que eles não devem ser utilizados como subterfugio para violação de outras garantias. Napolitano (2009, p. 24), ao tratar do aparente conflito entre os direitos sociais e direitos de comunicação, afirma que “nenhum direito constitucional, a exceção do direito à vida, foi concebido de forma absoluta, por isso, há no texto constitucional, inúmeras restrições ao direito à comunicação”. Para ilustrar a afirmação do autor, basta olhar o preâmbulo da Constituição Federal:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bemestar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (BRASIL, 1988).

Mesmo antes de começar a elencar seus princípios e direitos fundamentais, a Constituição Federal estabelece que tem como objetivo a construção de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Napolitano (2009) ressalta que as liberdades de opinião e pensamento não podem ferir a imagem e a moral das pessoas físicas e jurídicas. “São consideradas também invioláveis a intimidade, a vida privada e a honra das pessoas” (NAPOLITANO, 2009, p. 29). Logo, o Jornalismo não pode se ancorar nas liberdades de imprensa, expressão e opinião para, por exemplo, justificar qualquer discurso que propague preconceitos ou fira a dignidade da pessoa humana.

1.3 A VISÃO NORMATIVA E A ABORDAGEM CRÍTICA NA RELAÇÃO ENTRE JORNALISMO E CIDADANIA

A

metodologia

utilizada

para

a

construção

deste

trabalho

abrange,

respectivamente, uma contextualização histórica da relação entre Jornalismo e cidadania, seguida de parâmetros normativos que norteiam a atividade jornalística. De acordo com Murilo Soares (2009), é possível estabelecer a relação entre jornalismo e a construção de


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cidadania por meio de dois enfoques distintos: um de caráter normativo e o outro de caráter crítico. Para o autor, através do enfoque de caráter normativo é possível estabelecer, embasando-se no Direito, os princípios que conduzem uma imprensa comprometida com a cidadania. Segundo Soares (2009, p. 58), “o enfoque normativo do tema cidadania, ao invés de observar e analisar os processos sociais nos contextos históricos concretos pressupõe teoricamente certos princípios racionais transformados em direito, ainda que não estejam sendo aplicados concretamente”. Essa visão considera a função social positivada do Jornalismo, ou seja, exigida pela força da lei, como será visto no próximo capítulo. Dessa maneira, tanto empresas jornalísticas públicas quanto as privadas têm responsabilidade social, por prestarem contas à Justiça e aos cidadãos (GENTILI, 2005, p. 147 apud SOARES, 2009, p. 59), sobretudo aquelas do espectro radiofônico, por serem concessões do Estado. A outra ótica analisada é a abordagem crítica. Ela abrange não apenas os contextos históricos e sociais, mas uma análise dos impactos que os mesmos tiveram no Jornalismo contemporâneo e quais as principais dificuldades enfrentadas atualmente. Para Soares (2009), os dilemas atuais da comunicação, ao contrário do que ocorria no século XVIII, não se dão devido ao absolutismo ou à censura estatal, mas decorrem da lógica mercadológica de grandes corporações que eliminaram toda a competição. Aliada às grandes corporações se encontra a publicidade, que “encoraja a mudança da diversidade da informação em direção ao entretenimento, age a favor dos anunciantes e contra os cidadãos e privilegia a fala corporativa” (SOARES, 2009, p. 60). Para o autor, as relações de mercado que englobam grandes corporações e a publicidade fizeram com que os indivíduos não fossem mais tratados como cidadãos, mas sim como consumidores em potencial. Nesse sentido, Soares (2009) aponta que a desigualdade social obstrui o acesso à informação, pois pessoas com melhor renda têm condições de se informar através de múltiplos meios noticiosos, entre eles a internet, revistas e canais de televisão por assinatura, enquanto os mais pobres têm acesso mais facilitado ao rádio e à televisão aberta. Embora pesquisas2 recentes mostrem que o acesso à internet tenha crescido em todas as classes nos últimos anos (o que não significa que o maior acesso à tecnologia remeta ao acesso aos 2

(De acordo com estudo feito pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), e pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), 58% dos brasileiros têm acesso à internet. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/pesquisa-e-inovacao/noticia/2016-09/pesquisa-mostra-que-58-da-populacaobrasileira-usam-internet>. Acesso em: 6 maio 2017.


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direitos de cidadania). Outro ponto abordado pelo autor é a distância social entre o âmbito dos meios, formado por editores, jornalistas e leitores majoritariamente de classe média e o âmbito das reivindicações sociais, formado pela maioria mais pobre e marginalizada, que luta pelo reconhecimento dos seus direitos sociais. Haveria um “limiar” de preocupação dos meios com esses temas, um intervalo nos quais os meios poderiam incluir demandas sociais da cidadania ampliada. No entanto, a perspectiva recorrente dos meios parece tender à cobertura preferencial do “status quo” econômico, dando espaço maior a temas de política econômica, como “equilíbrio fiscal”, “fundamentos econômicos”, sem sua contrapartida social. (SOARES, 2009, p. 67).

De acordo com o autor, os meios de comunicação retratariam abundantemente os interesses do mercado e da classe média, porém a mesma cobertura não seria dada às reivindicações sociais. Isso não significa que as “camadas subalternas” não apareçam nos meios noticiosos, mas que, de acordo com Soares (2009, p. 62), são sub-representadas e só alcançariam a visibilidade dos meios noticiosos em ocorrências pontuais extremas, nas quais seriam abordados superficialmente os fatos, mas não os contextos sociais que os envolvem, como “assimetrias sociais crônicas, desigualdade de oportunidades e renda, exclusão histórica, a precariedade de moradias, etc.” Complementa o autor:

O Jornalismo apenas tangenciaria as questões sociais, em especial nos eventos pontuais agudos (acidentes, calamidades, ocupações, confrontos), de modo que os direitos sociais ligados à terceira geração de cidadania, não formam um assunto privilegiado pela imprensa [...] Assim, cessadas as circunstâncias imediatas do acontecimento, o assunto tende a desaparecer do noticiário ou a restringir-se a pequenas notas nas páginas policiais. (SOARES, 2009, p. 61-62).

Através dos apontamentos do autor, foram escolhidos esses dois pilares, a abordagem normativa, embasada em preceitos legais, que será desenvolvida no próximo capítulo e a abordagem crítica, baseada em contextos sociais e históricos, que será desenvolvida no capítulo três. Tal abordagem, estruturada nesses dois pilares, resultou na própria organização metodológica da monografia.


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2 PARÂMETROS NORMATIVOS PARA A COBERTURA DE CRIMES NO JORNALISMO

Este capítulo tem como central objetivo estabelecer, através da intersecção entre o Jornalismo e o Direito, parâmetros normativos pelos quais a análise posterior será realizada. Nele, serão elucidados conceitos básicos a respeito das normas utilizadas e serão demonstrados os pontos de convergência entre elas. No âmbito do Direito, serão diretrizes a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Constituição da República Federativa do Brasil, o Código Penal e os princípios do Direito Penal e a Lei 11.343/2006, conhecida como Lei de Drogas. No que tange ao Jornalismo, será utilizado o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. O segundo objetivo do capítulo é demonstrar a construção histórica, concreta e indispensável à humanidade dos chamados direitos fundamentais, que serão norteadores de todo o trabalho. Através deles será possível amparar um olhar crítico em relação às reportagens jornalísticas analisadas. Cabe observar que, devido à amplitude dos temas correlacionados, a exposição acerca dos parâmetros se aterá ao recorte estabelecido e às questões pertinentes a ele.

2.1 A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS E AS GARANTIAS FUNDAMENTAIS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

2.1.1 A construção histórica dos direitos fundamentais

Para tratar da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal foi escolhida uma análise conjunta, devido a alguns fatores. Primeiramente, são normas basilares, estão intrinsecamente conectadas e devem estar presentes em todas as esferas da vida em sociedade. Em segundo lugar, para compreendê-las e, assim, atribuí-las a devida magnitude, é necessária uma análise histórica, ainda que, como no caso dos objetivos desta monografia, breve. [Digite aqui]


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A princípio, é preciso distinguir os verbos “declarar” e “constituir”. Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2008), na obra Direitos Humanos Fundamentais, discorre sobre a necessidade primordial de uma sociedade limitada por regras: o pacto social.

Para estabelecer a vida em sociedade dos seres humanos naturalmente livres e dotados de direitos, há de definir os limites que os pactuantes consentem em aceitar para esses direitos. A vida em sociedade exige o sacrifício que é a limitação do exercício dos direitos naturais. Não podem todos ao mesmo tempo exercer todos os seus direitos naturais sem que daí advenha a balbúrdia, o conflito[...] ou seja: a vida em sociedade presume uma coordenação do exercício por parte de cada um dos seus direitos naturais. Direitos de que ninguém abre mão, exceto na exata e restrita medida imprescindível para a vida comum. É o que o art.4º da Declaração de 1789 exprime, na sua segunda parte: “O exercício dos direitos naturais de cada homem não tem por limites se não os que asseguram aos outros membros da sociedade o gozo dos mesmos direitos. Estes limites não podem ser determinados senão pela lei”. (FERREIRA FILHO, 2008, p. 5-6).

No trecho acima, o autor se refere a “direitos naturais”, pois se tratam de direitos inerentes à pessoa humana, adquiridos ao nascer. Nesse sentido, o pacto social prescinde de documento escrito, embora, possa ser reduzido a termo em solene, ou seja, registrado por força da lei, como em uma Constituição. Tem-se, então, a diferença básica entre “declarar” e “constituir”. Enquanto a Declaração “declara” os direitos fundamentais, a Constituição os presume existentes e os formaliza (FERREIRA FILHO, 2008). Sobre os direitos fundamentais declarados, é possível extrair algumas características essenciais:

Ora, declaração presume preexistência. Esses direitos declarados são os que derivam da natureza humana, são naturais, portanto. Ora, vinculados à natureza, necessariamente são abstratos [...] São imprescindíveis, não se perdem com o passar do tempo, pois se prendem à natureza imutável do ser humano. São inalienáveis, pois ninguém pode abrir mão da própria natureza. São individuais, porque cada ser humano é um ente perfeito e completo, mesmo se considerado isoladamente, independente da comunidade (não é um ser social que só se completa na vida em sociedade). Por essas mesmas razões, são eles universais – pertencem a todos os homens, em consequência estendem-se por todo o campo aberto ao ser humano, potencialmente ao universo. (FERREIRA FILHO, 2008, p. 22-23).

Nesse sentido, faz-se necessário abordar outro ponto: o que são os direitos fundamentais. O conceito de direitos fundamentais, também chamados de direitos de cidadania, que já sofreu muitas alterações, é fruto de transformações históricas. A evolução dos direitos fundamentais teoricamente pode ser dividida em três gerações, que serão apresentadas de maneira sucinta.


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A primeira geração dos direitos fundamentais surge nos séculos XVII e XVIII, em resposta ao arbítrio governamental e em busca de liberdades públicas (FERREIRA FILHO, 2008). Por seu caráter burguês, ela carrega em si os preceitos do liberalismo econômico. Com força das Revoluções Industrial e Francesa, ela culmina, na França, na Declaração dos Direitos do Homem e Cidadão, de 1789. Dentre os direitos pleiteados, tem destaque a liberdade econômica, que inclui a liberdade de comércio, indústria e profissão. Além do aspecto econômico, estão o direito à segurança, à liberdade de locomoção, à liberdade de expressão e à propriedade. Ferreira Lima (2008) pontua também seus corolários: a presunção de inocência, a legalidade criminal e a legalidade processual. A segunda geração dos direitos fundamentais tem origem após a Primeira Guerra Mundial e tem como objetivo a complementação dos preceitos da primeira geração (FERREIRA FILHO, 2008). Tendo em vista que o liberalismo desenfreado trouxe à tona a miséria e a exploração da força de trabalho, a segunda geração tem foco na questão social.

Paralelamente ao avanço do liberalismo político e econômico, o período referido assistiu à deterioração do quadro social, particularmente nos Estados mais desenvolvidos da Europa ocidental e Estados Unidos. Esse quadro costumava ser designado como a Questão Social. A expressão é hoje menos usada, porque os cientistas sociais marxizados preferem discorrer sobre a “luta de classes” em vez de usar da terminologia “burguesa” questão social. Esta, na verdade, envolvia agudamente a luta de classes, como Marx bem o registrou. Entretanto, esta luta era apenas um de seus aspectos. (FERREIRA FILHO, 2008, p. 41-42).

Essa geração reivindica melhorias nas condições de vida, entre elas, as condições de trabalhos em fábricas, minas e outros locais de trabalho insalubres, tendo em vista a omissão do poder público.

O trabalho era uma mercadoria como outra qualquer, sujeita à lei da oferta e da procura. E a máquina reduzia a necessidade de mão-de-obra, gerando a massa de desempregados. E, portanto, baixos salários[...] Ora, a marginalização da classe operária, como que excluída dos benefícios da sociedade, vivendo em condições subumanas e sem dignidade, provocou, em reação, o surgimento de uma hostilidade dessa classe contra os “ricos”, contra os “poderosos”. (FERREIRA FILHO, 2008, p. 43).

Atendendo a essas necessidades, destaca-se a Constituição alemã de 1919. Dentre os aspectos inovadores, estão a sujeição da propriedade à função social, a reforma agrária, a possibilidade de “socialização” das empresas, a proteção ao trabalho, o direito de sindicalização e a previdência social (FERREIRA FILHO, 2008). Como cita o autor, os


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direitos sociais “vieram a ser tratados em Constituições, como a brasileira de 1946 e a italiana de 1947[...], mas toda essa evolução encontrou o seu coroamento na Declaração Universal dos Direitos do Homem” (FERREIRA FILHO, 2008, p. 53). Promulgada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos dos Homens, ou como é tratada atualmente em nome da igualdade de gêneros, Declaração Universal dos Direitos Humanos, sintetiza os direitos fundamentais advindos da primeira e da segunda geração.

Com efeito, nela estão a liberdade pessoal, a igualdade, com a proibição de discriminações, os direitos à vida e a segurança, a proibição das prisões arbitrárias, o direito ao julgamento pelo juiz natural, a presunção de inocência, o direito de ir e vir, o direito de propriedade, a liberdade de pensamento e de crença, inclusive religiosa, a liberdade de opinião, de reunião, de associação, mas também direitos “novos” como direito de asilo, o direito a uma nacionalidade, a liberdade de casar, bem como direitos políticos – direito de participar da direção do país-, de um lado, e, de outro, os direitos sociais- o direito à seguridade, ao trabalho, à associação sindical, ao repouso, aos lazeres, à saúde, à educação cultural [...] – aos meios de subsistência. (FERREIRA FILHO, 2008, p.53).

A terceira geração dos direitos fundamentais não nega a primeira e segunda, mas a elas se soma. Ela tem enfoque na qualidade de vida e solidariedade entre todos os seres humanos, indiscriminadamente de etnia, religião, nação, etc. São esses chamados de direitos de solidariedade ou fraternidade. As três gerações dos direitos fundamentais se resumem, então, no lema da Revolução Francesa. A primeira geração, liberdade. A segunda geração, igualdade. A terceira geração, fraternidade. Com o reconhecimento dos direitos fundamentais, manifesta-se outra preocupação: a sua proteção. É possível enxergar, através dessa ótica, a necessidade de uma Constituição. “O Constituicionalismo – como é sabido – tem por objetivo principal assegurar os direitos fundamentais contra o Poder” (FERREIRA FILHO, 2008, p. 73). No Brasil, na Constituição Federal de 1988, também conhecida como a “Constituição Cidadã”, estão elencados os direitos fundamentais da pessoa humana. No ordenamento jurídico brasileiro, ela é a norma de maior hierarquia. Como Lei Magna, é imperativa a todos os atos, de todos os poderes, logo, toda e qualquer outra norma deve estar em consonância com seu conteúdo. Embora efetivamente, infelizmente, os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, cuja responsabilidade é do Estado, não sejam respeitados para grande parte da população brasileira, a Constituição Federal conta, em seu artigo 5º, com a regra de “aplicabilidade imediata” das normas definidoras de direitos e garantias


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fundamentais, que deveria assegurar a esta prioridade máxima.

2.1.2 Parâmetros de análise extraídos da Declaração Universal de Diretos Humanos e da Constituição Federal

Os artigos destacados abaixo irão constituir parte de um conjunto de parâmetros normativos que, por sua vez, ampararão a análise empírica a ser realizada no próximo capítulo. Ao analisar as reportagens, os parâmetros destacados a seguir serão relacionados aos trechos pertinentes das reportagens televisivas do programa Cidade Alerta MS, que constituem o recorte empírico do trabalho. Dessa maneira, poderá ser verificado se, de fato, o conteúdo do programa está em sintonia com o que a Declaração Universal dos Direitos Humanos e com a Constituição Federal. A título de exemplo, pode-se observar o artigo 11º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Nele, está contido o princípio da presunção de inocência, também presente na Constituição Federal, no Código Penal e no Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Ao analisar o material empírico, será verificado se, durante a construção das reportagens, os personagens são retratados como “suspeitos”, tendo em vista que o programa reporta pessoas presas em flagrante3 e que não ainda foram julgadas e condenadas pelos crimes em questão. Caso estes personagens sejam tratados previamente como culpados, esta será apontada como uma violação direta à presunção de inocência. Objetivando atender à finalidade analítica deste trabalho, serão extraídos do texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição Federal apenas os trechos relevantes ao recorte escolhido. São eles:

Da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

Artigo 1º: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2°: Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou 3

Flagrante significa que a prisão ocorreu enquanto a conduta estava sendo praticada ou logo após ser praticada.


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de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. [...] Artigo 5°: Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. [...] Artigo 7°: Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. [...] Artigo 11°: Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. [...] Artigo 25°: Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. Artigo 26°: Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. Artigo 27°: Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. (ONU, 1948).

Da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

Artigo 1º: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana; [...] Artigo 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Artigo 4º: A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II - prevalência dos direitos humanos; Artigo 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; [...] XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; [...] XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; [...]


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LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; [...] Artigo 6º: São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. [...] Artigo 221: A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; [...] IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. (BRASIL, 1988).

O próximo tópico abordará, de forma complementar, os preceitos do Direito Penal, como parâmetros normativos para a análise jornalística.

2.2 O DIREITO PENAL

2.2.1 Considerações introdutórias sobre o Direito Penal

As concepções de justiça e punição, as quais o Direito Penal está intrinsicamente ligado, sempre estiveram presentes no convívio em sociedade. Entretanto, no ponto de vista legal e social, elas sofreram grandes alterações. Na Idade Média, castigos estavam relacionados a penas severas e corporais, em especial ao suplício. Cenas de execução e tortura dos supostos infratores da lei não apenas eram consideradas lícitas, como eram feitas em praça pública e tidas como entretenimento para a população. Para Foucault (1975), a gravidade das penas aumentava, pois esse era direito exercido pelo Estado. O autor questiona, em Vigiar e Punir, a legitimidade do Estado para matar e torturar um ser humano em nome da “justiça”.

Uma pena, para ser considerada um suplício, deve obedecer a três critérios principais: em primeiro lugar, produzir uma certa quantidade de sofrimento que se possa, se não medir exatamente, ao menos, apreciar, comparar e hierarquizar; [...] o suplício faz parte de um ritual. É um elemento na liturgia punitiva, e que obedece a duas exigências, em relação à vítima, ele deve ser marcante: destina-se a [...] tornar infame aquele que é a vítima. [...] e pelo lado da justiça que o impõe, o suplício deve ser ostentoso, deve ser


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constatado por todos, um pouco como seu triunfo. (FOUCAULT, 1975, p.41).

Com o passar dos séculos, as práticas de castigos corporais se tornaram mais escassas. No Brasil, elas foram proibidas com a Constituição de 1946. A Constituição Federal atual, de 1988, aboli a possibilidade de torturas, penas cruéis, perpetuas ou penas de morte, tendo em vista que trata-se de cláusula pétrea, ou seja, que não pode ser alterada. Logo, em quanto viger esta Constituição, não existe a possibilidade das referidas penas no Brasil. Como consta na obra de Damásio de Jesus (2013), o ponto de partida na formação do Direito, em todas as suas esferas, é o fato social. “O Direito surge das necessidades fundamentais das sociedades humanas, que são reguladas por ele como condição essencial à sua própria sobrevivência” (JESUS, 2013, p. 45). Fatos sociais que caminham em desacordo às normas do Direito geram ilícitos jurídicos. Dentre eles, encontra-se, na esfera do Direito Penal, o ilícito penal, que constitui a forma mais séria de ilícito, pois atenta contra os bens mais importantes da vida social. A ação do Direito Penal se dá por meio da pena, que, no Brasil, se divide em multa, restrição de direitos e, nos casos mais graves, privação de liberdade.

O meio da ação de que se o vale o Direito Penal se dá por meio da pena, em que já se viu a satisfação de uma exigência de justiça, constrangendo o autor da conduta punível a submeter-se a um mal que corresponda em gravidade ao dano por ele causado. Mas, como esclarecia Aníbal Bruno, na evolução Direito a pena vem atenuando cada dia mais, sobretudo no momento de sua execução, esse caráter de retribuição e de castigo, e agora perde o seu posto de sanção única do fato punível. As ideias modernas sobre a natureza do crime e as suas causas e a exigência prática de uma luta eficaz contra a criminalidade foram desenvolvendo, ao lado da velha reação punitiva, uma série de medidas que se dirigem não a punir o criminoso, mas a promover a sua recuperação social ou a segrega-lo do meio no caso de desajustamento irredutível. (JESUS, 2013, p.45).

A partir da suspeita fundamentada da prática delitiva, cria-se uma relação jurídica entre Estado e sujeito. Cabe ao Estado dar andamento ao devido processo legal e, no caso de condenação, cabe apenas a ele punir. Nas palavras de Damásio de Jesus (2013):

Quando o sujeito pratica um delito, estabelece-se uma relação jurídica entre ele e o Estado. Surge o jus puniendi, que é o direito que tem o Estado de atuar sobre os delinquentes na defesa da sociedade contra o crime. Sob outro aspecto, o violador da norma penal tem o direito da liberdade, que consiste em não ser punido fora dos casos previstos pelas leis estabelecidas pelos


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órgãos competentes e a obrigação de não impedir a aplicação de sanções. (JESUS, 2013, p. 46).

A seguir, nos próximos tópicos, serão abordadas as peculiaridades dos crimes contra o patrimônio, os crimes de roubo e furto, bem como o uso e o tráfico de drogas, aspectos que ampararão a análise empírica no próximo capítulo.

2.2.2 Os crimes contra o patrimônio: roubo e furto

Dentro do recorte estabelecido para a análise, foram escolhidos os tipos previstos na Lei 11.343/2006 e os crimes contra o patrimônio, que estão dispostos nos artigos 155 a 183 no Código Penal de 1940. Ao entrar em contato com o material empírico do recorte temporal escolhido, foram encontrados um número considerável de reportagens acerca do tema tráfico de drogas, porém, quanto aos crimes contra o patrimônio, foram encontradas apenas reportagens abordando os crimes de roubo e furto. Todavia, a escolha do recorte “crimes contra o patrimônio” não foi, de maneira alguma, aleatória. Rogério Greco (2010), em sua obra, destaca que os crimes contra o patrimônio são os que mais abarrotam o sistema judiciário, pois são as infrações mais frequentes na sociedade. O autor pontua que as infrações patrimoniais têm como fator preponderante a ausência do Estado, “melhor dizendo, a má administração da coisa pública, que gera desigualdade social, criando bolsões de miséria, separando, cada vez mais, as classes sociais existentes” (GRECO, 2010, p. 1). Ele também critica os critérios utilizados para definição de sanções:

O legislador, mesmo sabendo que o Estado é responsável pelo índice assustador de crimes patrimoniais, parece fazer parte do “jogo” da Administração: pune mais severamente aqueles que se veem compelidos a praticar infrações penais patrimoniais, muitas vezes considerados também vítimas do sistema, do que os verdadeiros responsáveis pela calamidade, que praticam, com seus “colarinhos brancos”, as piores e mais hediondas infrações penais. Como os criminosos de “colarinho branco” não sujam as mãos em suas infrações penais, bem como pelo fato de que, como consequência de seus comportamentos, como regra, não conseguimos enxergar o filete de sangue na calçada, para a população, parece que seus crimes não são tão importantes assim. Na verdade, muito pelo contrário, são verdadeiros genocidas que exterminam a sociedade, matando milhares ao mesmo tempo com as suas subtrações. (GRECO, 2010, p. 2).


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O intuito dessa exposição não é vitimar ou eximir o praticante de fato delituoso de responsabilidade, mas sim de expor o caráter multifacetado dos crimes abordados e tentar romper com o pensamento maniqueísta que tende a dividir a sociedade entre “pessoas de bem” e “bandidos”. Os crimes de furto e roubo estão dispostos nos artigos 155, 156 e 157 do Código Penal. Enquanto o crime de furto é tipificado como “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel” (BRASIL, 1940), o artigo157, ao definir o crime de roubo, remete a “subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência” (BRASIL, 1940). Nota-se que os dois crimes possuem o mesmo núcleo e o que os difere é o emprego de violência ou grave ameaça. Ambos são considerados crimes comuns e não admitem modalidade culposa4, ou seja, exigem “dolo”, que é a intenção de cometer o crime. Pode-se considerar que o roubo constitui um furto acrescido de alguns dados que o tornam especial (GRECO, 2010, p. 53). Entretanto, a gravidade do crime de roubo é consideravelmente maior, pois o emprego de violência ou grave ameaça lesa mais do que o patrimônio da vítima.

Podemos dizer que o tipo penal que prevê o roubo protege, precipuamente, a propriedade, a posse, e, por conta de sua natureza complexa, também a detenção, não deixando, contudo, mesmo que mediatamente, de proteger a integridade corporal ou a saúde, a liberdade individual, bem como a vida. (GRECO, 2010, p. 57).

Os tipos penais descritos possuem diversas particularidades, que podem aumentar, diminuir ou, até mesmo, no caso do furto, tornar irrisória a gravidade dos delitos. Embora seja inviável elencar todos esses aspectos imediatamente, algumas particularidades serão demonstradas no próximo capítulo, durante a análise empírica do corpus desse trabalho.

2.2.3 O uso e o tráfico de drogas na Lei 11.343/06

A Lei 11.343, conhecida como Lei de Drogas, revogou, em 2006, a Lei 6.368, de 1976, que anteriormente dispunha sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e 4

Modalidade resultante da inobservância do cuidado necessário do agente, o qual não intenta nem assume o risco do resultado típico, porém a ele dá causa por imprudência, negligência e imperícia.


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uso indevido de substâncias entorpecentes. A nova lei trouxe muitas mudanças, dentre as mais impactantes, ela abrandou as penas das pessoas tidas como apenas usuários e agravou as penas dos considerados traficantes. Em suma, a Lei de Drogas institui o Sistema Nacional de Políticas sobre Drogas (Sisnad), um sistema integrado que aborda desde a prevenção às drogas e a reinserção social dos usuários e dependentes de drogas até a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito. Uma das grandes inovações da Lei 11.343 trata da figura do usuário. A Lei define quem pode ser considerado usuário e qual a penalidade: Artigo 28: Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. (BRASIL, 2006).

Como pode ser observado, a Lei de Drogas determinou não ser cabível, em hipótese alguma, ao usuário de drogas a condenação à privação de liberdade. Diversamente, a lei prevê penas leves e até mesmo de cunho educativo ao usuário de drogas, que jamais será preso pelo simples fato de ser usuário. Guilherme Nucci (2009) discorre sobre os motivos da mudança:

Parece-nos, como regra geral, medida salutar, pois o usuário habitual ou eventual da droga, por si mesmo, não representa à sociedade um real perigo, muito embora se possa dizer que ele, ao comprar e fazer uso de entorpecentes estimula o tráfico, o que não deixa de ser verdadeiro. Porém, o caminho está na reeducação e na obrigação de se submeter a variados cursos de orientação. (NUCCI, 2009, p. 328).

Embora o simples usuário não possa mais ser preso, a Lei de Drogas aumentou significativamente a pena para o traficante. Enquanto na Lei 6.368 a pena era de três a quinze anos, com a Lei 11.343 a pena mínima passa para cinco anos. O contraste entre as penalidades a quais estão sujeitos usuários e traficantes torna pertinente indagar quais os critérios utilizados para distinguir as condutas tipificadas como uso e como tráfico de drogas. Dispõe a lei sobre o crime de tráfico de drogas ilícitas:

Artigo 33: Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda


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que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. (BRASIL, 2006).

A grande distinção entre traficante e usuário se dá pela finalidade da droga. Notase que as cinco condutas descritas no artigo 28, que trata do usuário, também estão presentes no artigo 33, tendo como diferencial o consumo pessoal. Para ser considerado usuário, quem adquire, guarda, tem em depósito ou traz consigo droga ilícita deve fazê-lo estritamente para uso próprio. Outra particularidade da Lei de Drogas é que, de acordo com o artigo 33, não apenas a produção e o comércio das drogas que visam lucros são considerados tráfico. Qualquer uma das condutas descritas acima, se não forem para uso exclusivo da pessoa podem ser consideradas tráfico, ainda que gratuitamente. Assim, alguém que traz consigo drogas e as compartilha com um amigo, por exemplo, pode ser considerado traficante. Sobre esta colocação da Lei, Nucci (2009) critica:

O correto seria evidenciar em ambos finalidades específicas: traficante é o agente que importa, exporta, remete, prepara, traz consigo, etc, a droga com intuito de lucro, enquanto usuário é o agente que adquire, guarda ou traz consigo o entorpecente para consumo pessoal. Em suma, o tráfico ilícito de entorpecente deve ser bipartido – com e sem o intuito de lucro, gerando o natural aprimoramento da descrição das condutas do usuário de drogas. (NUCCI, 2009, p. 348).

Uma das críticas importantes à Lei de Drogas, se não a mais importante, diz respeito aos critérios adotados para definição de quem seria traficante e quem seria apenas usuário. Preceitua o artigo 28, parágrafo 2º, da Lei 11.343/2006 o seguinte: “para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente”. Nem é preciso assinalar não ser o referido dispositivo aplicado, com efetividade, no cotidiano das prisões de pessoas que carregam ou manipulam drogas ilícitas. Aliás, torna-se extremamente fácil constatar o que ora se afirma: basta uma consulta à jurisprudência brasileira. O pesquisador poderá ler o conteúdo de sentenças e acórdãos e checar, por si mesmo, a inexistência da exploração desses requisitos para justificar a prisão preventiva de um indivíduo, portador de drogas, geralmente considerado traficante. Outro fator curioso, para não dizer desastroso, é a abissal diferença de visões entre magistrados: para uns, carregar 2 gramas de maconha é, sem dúvida, tráfico ilícito de drogas; para


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outros, por óbvio, é consumo pessoal; para terceiros, cuida-se de insignificância, logo, atípico. Não é preciso registrar que a primeira ideia é a franca vencedora na avaliação judicial. (NUCCI, 2016).

Como se pode observar no trecho acima, o legislador previu, na Lei 11.343/06, alguns critérios norteadores para a distinção entre usuário e traficante, sendo eles a quantidade de substância, as circunstancias sociais e pessoais e a conduta e antecedentes do agente. Embora presentes, todos os critérios, com exceção dos antecedentes do agente, têm caráter subjetivo. A lei trata da “quantidade de droga”, sem dar, em momento algum, parâmetro numérico do que seria muita ou pouca droga. Ademais, a lei fala sobre “circunstancias sociais e pessoais”, sem abordar quais circunstancias seriam essas. Na prática, pode-se dizer que cabe ao delegado de polícia e, mais tarde, o magistrado, definirem, através de critérios pouco precisos, quem aparenta ser traficante e quem aparenta apenas ser usuário.

2.2.4 Parâmetros de análise extraídos do Direito Penal

É possível abordar as cautelas advindas da gravidade do Direito Penal ao analisar alguns dos princípios do mesmo. Fernando Capez (2014) destaca a importância dos princípios no Direito Penal no fato de serem baseados primordialmente nos direitos fundamentais, dentre eles, destaca-se a dignidade da pessoa humana. Capez (2014, p. 25) afirma que “a dignidade humana, princípio genérico e reitor do Direito Penal, partem outros princípios mais específicos, os quais são transportados dentro daquele maior, tal qual passageiros de uma embarcação”. De acordo com o autor, este fato faz com que o Direito Penal do Brasil torne-se democrático, pois os princípios adequam o mesmo ao perfil constitucional do país. A partir desta conceituação, é possível observar que eles não apenas estão em consonância, como todas as normas devem estar, com a Constituição Federal, mas que existe a preocupação dentro do Direito Penal de que os direitos fundamentais sejam norteadores das normas e procedimentos penais. Particularmente no Direito Penal, essa preocupação se justifica também devido à seriedade das sanções, dentre elas a possibilidade de privação de liberdade do infrator. Justamente por trazer consigo a possibilidade de cercear um direito fundamental humano, a liberdade, o Direito Penal é considerado como último recurso. Tendo em vista que os tipos que serão abordados na análise empírica, os crimes


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de furto, roubo e os previstos na Lei de Drogas, pertencem à esfera do Direito Penal, serão elencados abaixo os princípios pertinentes ao estudo, que serão também utilizados como parâmetros normativos no capítulo seguinte.

Princípio da legalidade: Advém do art.5º, XXXIX da Constituição Federal e está elencado no art.1º do Código Penal. “Não há crime sem lei que o defina, não há pena sem cominação legal”. Princípio da intervenção mínima: Procurando restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas ou cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros ramos do direito não conseguirem prevenir à conduta ilícita. Princípio da ofensividade: O Direito Penal só deve ser aplicado quando a conduta ofende um bem jurídico, não sendo suficiente que seja imoral ou pecaminosa. Princípio da insignificância: Ligado aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”) recomenda que o Direito Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade, reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material). Princípio da humanidade: O réu deve ser tratado como pessoa humana. A Const, Federal brasileira reconhece esse princípio em vários dispositivos (arts.1.º, III, 5.º,III, XLVI E XLVII). Deve ser observado antes do processo (art. 5.º, LXI, LXII, LXIII, LXIV), durante este (art. 5.º, LIII, LIV, LV, LVI e LVII) e na execução da pena (proibição de penas degradantes, cruéis, de trabalhos forçados, de banimento e da sanção capital – art. 5.º, XLVII, XLVIII, XLIX E L. Princípio do estado de inocência: Geralmente denominado “princípio da presunção de inocência”, está previsto na Const. Federal: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5.º, LVII). Dele decorre a exigência de que a pena não seja executada em quanto não transitar em julgado a sentença de sentença condenatória” (art.5. º, LVII). Dele decorre a exigência de que a pena não seja executada enquanto não transitar em julgado a sentença condenatória. Somente depois de a condenação tornar-se irrecorrível é que podem ser impostas medidas próprias da fase de execução. Princípio da igualdade: Todos são iguais perante a lei penal (Const. Federal, art. 5º, caput) não podendo o delinquente ser discriminado em razão de cor, sexo, religião, raça, procedência, etnia, etc. (JESUS, 2013, p. 52-54).

Como este capítulo visa estabelecer parâmetros normativos para a análise do material empírico, o próximo tópico abordará o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros que, embora não se trata de lei ou qualquer outro instrumento coercitivo, contém determinações éticas e deve ser observado no exercício responsável da atividade jornalística.

2.3 O CÓDIGO DE ÉTICA DOS JORNALISTAS BRASILEIROS


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Assinado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e abrangendo 31 sindicatos brasileiros, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros existe desde 1987. Desde então, houve quatro versões modificadas do Código, sendo que a última atualização ocorreu em 2007. No Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros estão presentes valores e elementos regedores da profissão. Diferente das outras normas vistas neste capítulo, que possuem força de lei e, por isso, coercibilidade, no Código de Ética estão presentes recomendações, indicações de condutas adequadas ao bom exercício da profissão (CHRISTOFOLETTI, 2008, p.50). Estão previstas, entretanto, punições aos transgressores do Código de Ética, mas elas são em forma de observação, advertência, suspensão e exclusão do quadro social do sindicato e a publicação da decisão da comissão de ética em veículo de ampla circulação. Condiz com a proposta analítica deste trabalho utiliza-lo como parâmetro normativo pois, no âmbito do jornalismo, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros funciona como, invariavelmente, uma norma a ser observada e respeitada. Ademais, ele está em consonância com os princípios e direitos fundamentais elencados até então. É importante observar que, embora não possua força de lei, o Código de Ética é relevante ao escopo desta monografia, pois ela visa não apenas observar se existe infração legal, mas se o programa Cidade Alerta MS atende, em seu conteúdo, à função social do jornalismo. Sobre o assunto, Rogério Christofoletti (2009) afirma:

Engana-se quem pensa que os códigos de ética auxiliem somente os profissionais sob seu alcance. O dispositivo é importante para toda a sociedade, pois sinaliza publicamente que aquele grupo social tem preocupações éticas, segue seus valores e possui maturidade suficiente para se pautar por um instrumento de auto-regulação deontológica. (CHRISTOFOLETTI, 2008, p. 81).

A seguir, serão destacados os artigos do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros que visam não apenas o exercício da atividade jornalística, mas que ela seja desenvolvida de maneira compromissada com a ética.

2.3.1 Parâmetros de análise extraídos do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros


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Assim como feito nos parâmetros anteriores, serão elencados os trechos do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros pertinentes ao recorte estabelecido. Estes serão utilizados, no próximo capítulo, para realização da análise do material empírico. São eles:

Capítulo I - Do direito à informação: Artigo 1º: O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros tem como base o direito fundamental do cidadão à informação, que abrange seu o direito de informar, de ser informado e de ter acesso à informação. Artigo 2º: Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que: I - a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida independentemente de sua natureza jurídica - se pública, estatal ou privada - e da linha política de seus proprietários e/ou diretores. II - a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público; III - a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão; [...] Capítulo II - Da conduta profissional do jornalista: Artigo 4º: O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, razão pela qual ele deve pautar seu trabalho pela precisa apuração e pela sua correta divulgação. [...] Artigo 6º: É dever do jornalista: I - opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos; [...] X - defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito; [...] XI - defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial as das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros e das minorias; [...] XIV - combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza. [...] Artigo 7º: O jornalista não pode: [...] V - usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime; Capítulo III - Da responsabilidade profissional do jornalista: Artigo 9º: A presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística. Artigo 10: A opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade. Artigo 11: O jornalista não pode divulgar informações: [...] II - de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes; [...]


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Artigo 12: O jornalista deve: I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas; II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público; III - tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar. (FENAJ, 2007).

Esse tópico encerra a grade de artigos e trechos que, articulados, formam a matriz de parâmetros a serem utilizados na análise empírica. A seguir, para melhor visualização, e para melhor compreensão de como os documentos legais e ético-deontológicos se relacionam entre si, será feita uma organização sistemática dos parâmetros normativos.

2.4 SISTEMATIZAÇÃO DOS PARÂMETROS NORMATIVOS

Este tópico visa, de maneira clara e objetiva, organizar, em forma de um quadro explicativo, os parâmetros normativos que serão utilizados na análise empírica. O quadro é importante para que possa ser observado que, em determinados momentos, os documentos se repetem, reiterando princípios e direitos fundamentais. Em outros momentos, entretanto, eles trazem ideias similares ou que se complementam. A Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição Federal funcionam como normas basilares, nas quais os outros parâmetros se inspiram e devem, obrigatoriamente, estar em sintonia. Já os princípios do Direito Penal conversam com o recorte estabelecido, de crimes contra o patrimônio e tipos elencados na Lei de Drogas. Da mesma maneira, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros aborda especificidades da atividade jornalística. Assim, pode-se observar que todos os parâmetros escolhidos se relacionam intimamente. A sistematização foi desenvolvida em volta de temas abordados por todos os documentos selecionados. São eles: os direitos individuais, como igualdade e liberdade, vedado qualquer tipo de discriminação ou preconceito; a dignidade da pessoa humana, incluindo a pessoa presa; a presunção de inocência e os direitos sociais, incluindo o direito à cultura e a comunicação. Estão elencados também disposições expressas a respeito da obrigatoriedade do cumprimento e respeito dos direitos fundamentais.


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Quadro 15 - Sistematização dos parâmetros normativos Documentos

Temática Direitos individuas, como igualdade e liberdade, vedado qualquer tipo de discriminação e preconceito

Declaração Universal dos Direitos Humanos Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 2° Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania.

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Constituição Federativa da República do Brasil Artigo 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.

Foi preservada no quadro a grafia original dos documentos.

Princípios do Direito Penal

Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros

Princípio da igualdade: Todos são iguais perante a lei penal (Const. Federal, art. 5º, caput) não podendo o delinquente ser discriminado em razão de cor, sexo, religião, raça, procedência, etnia, etc.

Artigo 6º É dever do jornalista: XI - defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial as das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros e das minorias; XIV - combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza.

Princípio da intervenção mínima: Procurando restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas ou cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros ramos do direito não conseguirem prevenir à conduta ilícita. Princípio da ofensividade: O Direito Penal só deve ser aplicado quando a conduta ofende um bem jurídico, não sendo suficiente que seja imoral ou pecaminosa.

Artigo 7º O jornalista não pode: V - usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime.


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Da dignidade da pessoa humana, incluindo a pessoa presa

Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação. Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. Artigo 5° Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Princípio da legalidade: Advém do art.5º, XXXIX da Constituição Federal e está elencado no art.1º do Código Penal. “Não há crime sem lei que o defina, não há pena sem cominação legal”.

Artigo 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana; Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a

Princípio da humanidade: O réu deve ser tratado como pessoa humana.

Artigo 11 O jornalista não pode divulgar informações: II - de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes; Artigo 12. O jornalista deve: III - tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar


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Presunção de inocência

Artigo 11° Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas.

Direitos sociais, incluindo direito à cultura e à comunicação

Artigo 25° Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bemestar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à

honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; XLIX é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Artigo 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

Princípio do estado de inocência: “Ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”

Artigo 9º A presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística.

Princípio da insignificância: Ligado aos chamados “crimes de bagatela” (ou “delitos de lesão mínima”) recomenda que o Direito Penal, pela adequação típica, somente intervenha nos casos de lesão jurídica de certa gravidade,

Artigo 1º O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros tem como base o direito fundamental do cidadão à informação, que abrange seu o direito de informar, de ser informado e de ter acesso à


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assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. Artigo 26° Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. Artigo 27° Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam.

Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; Artigo 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Artigo 221 A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I - preferência a finalidades educativas,

reconhecendo a atipicidade do fato nas hipóteses de perturbações jurídicas mais leves (pequeníssima relevância material).

informação. Artigo 2º Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que: I - a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida independentemente de sua natureza jurídica - se pública, estatal ou privada - e da linha política de seus proprietários e/ou diretores. II - a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público; III - a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão; Artigo 4º O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, razão pela qual ele deve pautar seu trabalho pela precisa apuração e pela sua correta divulgação.


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artísticas, culturais e informativas; IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Disposições expressas à cerca do respeito aos direitos fundamentais

Organização: Paz, 2017.

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Artigo 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II - prevalência dos direitos humanos.

Artigo 10 A opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade. Artigo 12 O jornalista deve: I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas; II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público; Artigo 6º É dever do jornalista: I - opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos; X - defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito.


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3 ANÁLISE CRÍTICA A PARTIR DE PARÂMETROS NORMATIVOS

Este capítulo visa realizar as análises descritivas e críticas do material empírico, desenvolvendo a abordagem crítica a partir dos parâmetros normativos estabelecidos no capítulo anterior. Com isso, completa-se o ciclo metodológico apresentado no primeiro capítulo. Para esse fim, como recorte empírico, foram selecionadas oito reportagens 6

veiculadas no programa televisivo Cidade Alerta MS, no período entre abril e maio de 2017.

O programa vai ao ar de segunda a sexta, às 17h50, na rede Record MS e é apresentado por Rodrigo Nascimento7. Embora, em pesquisa prévia, não tenha sido encontrado material informativo a respeito do Cidade Alerta MS, o programa segue os moldes da versão nacional, apresentada por Marcelo Rezende que, com 5 a 7 pontos de Ibope, é um dos principais programas da Rede Record (ROMÃO, 2013). De acordo com Romão (2013), o Cidade Alerta é classificado como Jornalismo policial, pois faz parte de um conjunto de programas que tradicionalmente tem foco nas denúncias de ocorrências policiais e nos quais é de extrema visibilidade a violência presente na sociedade. Para o autor, o Jornalismo policial tem como característica repórteres mais participativos e opinativos, que estimulam o interesse do telespectador. Ademais, possui linguagem distinta do jornalismo tradicional, utilizando da informalidade, de gírias e expressões coloquiais, que dão tom de conversa direta ao telespectador. Para fins analíticos, foram selecionadas apenas reportagens cuja temática fosse a cobertura dos crimes de furto e roubo e os tipos elencados na Lei 11.343 de 2006. A análise será estruturada em duas etapas, a primeira de natureza descritiva e a segunda de natureza crítica, de acordo com os elementos descritos como parâmetros normativos apresentados no capítulo anterior. Para acesso ao material empírico, foi utilizada a página do Facebook. Importante salientar que a análise não se atém às reportagens em si, mas a todo o contexto de apresentação, que envolve a introdução feita pelo apresentador e seus comentários finais. A transcrição integral de todas as reportagens a serem analisadas está disponível nos apêndices dessa monografia. Recomenda-se também que, para maior compreensão das

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A escolha da terminologia “reportagem” refere-se a nomenclatura utilizada pelo programa Cidade Alerta MS. Essa escolha não entra no mérito teórico das classificações dos gêneros jornalísticos. 7 Além da íntegra no canal televisivo, as reportagens podem ser acessadas na página institucional do Facebook do programa, no site: www.facebook.com/cidadealertams/.


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análises e de todos os elementos presentes nela, assistir às reportagens, cujos links estão presentes ao fim das análises descritivas de cada matéria. 3.1 REPORTAGEM 1

3.1.1 Análise descritiva

Figura 1 - Reportagem 1

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A primeira reportagem, com tempo total de 4 minutos e 53 segundos, foi transmitida no dia 10 de abril de 2017 e produzida por Ana Lívia Tavares. Ela aborda uma prisão em flagrante pelo crime de tráfico de drogas. Emanuelle dos Santos supostamente comercializava um tipo de droga sintética, denominada “ecstasy”, em festas eletrônicas em Campo Grande. O diferencial da reportagem se dá pelo fato da suspeita ser travesti. Primeiramente, o apresentador do programa, Rodrigo Nascimento, introduz a reportagem comentando o caso. Ele se refere à Emanuelle como Lucas dos Santos, nome civil da suspeita, enquanto na tela são veiculadas imagens aparentemente extraídas de redes social


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da suspeita. A “chamada”8 na tela é “Bela do tráfico: Travesti é presa após vender drogas durante exposição”. Logo após a introdução de apresentador, é transmitida a reportagem, em que a repórter discorre sobre o caso em um trecho no formato “passagem”9 de duração de apenas 34 segundos. A reportagem não conta com nenhum outro formato de telejornalismo. Durante a fala da repórter, são veiculadas as mesmas fotos que haviam aparecido anteriormente. De volta ao apresentador, Rodrigo Nascimento, em tom jocoso, chama às câmeras um homem que aparenta ser funcionário do programa, o Bartô. Juntamente com o apresentador, ele encena estar em uma festa. Em seguida, aparece em cena outro funcionário de programa, com uma peruca no cabelo, que representa Emanuelle tentando comercializar drogas. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/604851313051996/

3.1.2 Análise crítica

A introdução da reportagem é iniciada com Rodrigo Nascimento revelando o nome civil de Emanuelle, ato que pode ser considerado ofensivo a pessoas transexuais, tendo em vista a não identificação da pessoa com o gênero biológico. A suspeita de praticar o crime de tráfico de drogas é referida pelo apresentador como “Bela do tráfico” e “moça bonita”. Ele alterna entre chamá-la pelo pronome feminino e pelo masculino. Nos primeiros 30 segundos de introdução, ele desrespeita a identidade de gênero, ironiza e discrimina a moça por se tratar de uma pessoa transexual. Nota-se que a identidade de gênero de Emanuelle, para efeitos de cobertura jornalística, não possui relevância ao crime que ela supostamente cometeu. Para chamar a reportagem, Rodrigo Nascimento afirma: “essa moça bonita que tá aparecendo aí, sabe o que que aconteceu com ela? Ela tava vendendo a balinha batizada, lá nos shows da exposição. É a bela do tráfico. Quer ver só o que ela fazia? Vem comigo, Ana Lívia Tavares, põe na quadrada”. O apresentador utiliza tom de certeza ao afirmar que Emanuelle estava vendendo drogas. É importante lembrar que, como visto anteriormente, em todos os parâmetros 8

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Termo técnico utilizado para texto sobre os principais destaques do telejornal, utilizado para atrair o telespectador. Termo técnico para o momento em que o repórter aparece na reportagem em gravação geralmente realizada no local da notícia e com informações adicionais.


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normativos utilizados, é vedada a condenação prévia. Trata-se da presunção de inocência ou princípio do estado de inocência. A Constituição Federal, o artigo 5º, inciso LVII dispõe: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A reportagem analisada aborda uma prisão em flagrante e a acusada, no tempo em que foi veiculada essa reportagem, não havia sido julgada, muito menos condenada. Apenas o poder judiciário tem o poder de condenar alguém, se tratando, no caso, portanto, de uma “suspeita”. Logo, até condenação penal em instância superior, ela permanece inocente. Na reportagem em si, Ana Lívia Tavares respeita à identidade de gênero da suspeita. A repórter refere-se à Emanuelle utilizando o pronome feminino, sem comentar que se tratar de uma pessoa transexual, tendo em vista que, como dito anteriormente, o fato não tem relevância à notícia. Após a reportagem, durante os comentários, Rodrigo Nascimento faz um tipo de encenação improvisada, para demonstrar o momento em que Emanuelle tentaria comercializar drogas em uma festa. Aparentemente, a intenção do apresentador é trazer um momento de humor ao programa, já que a encenação é feita de maneira jocosa e o apresentador se diverte com a situação. Para isso, Rodrigo Nascimento chama à cena Bartô, que estaria na festa dançando. Logo em seguida entra Emanuelle, representada por um homem com uma peruca, que afina a voz e imita uma mulher. Ele tenta vender drogas à Bartô, que recusa a droga. Após, é veiculada uma trilha sonora de sirene policial, que representa o momento em que Emanuelle iria presa. O apresentador atua como uma espécie de narrador, que orienta e descreve como os personagens devem se comportar. Embora a reportagem em si tenha cunho informativo e não apresente violações aos documentos utilizados como parâmetros por esse trabalho, a introdução à reportagem e os comentários posteriores do apresentador fazem o oposto. Durante toda a sua abordagem, Rodrigo Nascimento desvia do tema tráfico de drogas e foca-se no fato de se tratar de uma travesti. Trata-se de um caso explícito de discriminação contra pessoa transexual. Nesse sentido, a Declaração Universal dos Direitos Humanos aborda a igualdade entre todas as pessoas e garante proteção contra qualquer discriminação (ONU, 1948):

Artigo 1° Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade. [...] Artigo 7° Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação


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que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

O mesmo ocorre na Constituição Federal, que aborda a construção de uma sociedade igualitária, fraterna e livre de preconceitos:

Artigo 1º: A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988).

O respeito, o tratamento de maneira igualitária e livre de preconceitos a todas as pessoas é dever de todo cidadão. Especialmente, o jornalista, devido a função social da atividade jornalística, tem por obrigação combater todo e qualquer tipo de discriminação. Isso pode ser observado no Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (FENAJ, 2007):

Artigo 6º: É dever do jornalista: [...] XIV - combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza. [...] Artigo 7º: O jornalista não pode: [...] V - usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime; [...] Artigo 12: O jornalista deve: [...] III - tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar.

Logo, em suma, pode se afirmar que a primeira reportagem: 

Discrimina a personagem, desrespeita sua identidade de gênero e incita a intolerância;

Fere a presunção de inocência.


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3.2 REPORTAGEM 2

3.2.1 Análise descritiva

Figura 2 - Reportagem 2

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A segunda reportagem, com tempo total de 5 minutos e 57 segundos, foi transmitida no dia 25 de abril de 2017 e produzida por Lia Nogueira. Ela também aborda uma ocorrência do crime de tráfico de drogas. O apresentador introduz a reportagem com um vídeo da cantora Maria Bethânia em performance da música “Não mexe comigo”. A relação da música com a ocorrência vem à luz do telespectador em seguida, quando Rodrigo Nascimento explica que a protagonista do ocorrido, uma jovem de 19 anos, se chama Bethânia. É feito então, um trocadilho com o nome da suspeita e da cantora, assim, o apresentador se refere à cantora como “Bethânia do bem” e a suspeita como “Bethânia do crime”. A “chamada” na tela é “Bethânia do crime compra drogas na fronteira para vender é SP”. A trilha sonora é a música de Maria Bethânia enquanto são mostradas imagens da suspeita e da droga apreendida. No início da transmissão da reportagem, a “chamada” na tela é alterada para “Cavalo doido: DOF apreende 1,5 tonelada de maconha”. A reportagem


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começa com um trecho no formato “passagem”, em que Lia Nogueira, correspondente de Dourados, descreve, primeiramente, uma apreensão de maconha realizada pelo Departamento de Operações de Fronteiras (DOF), em uma caminhonete atolada na estrada vicinal MS-156, na região de Caarapó. A repórter conta as circunstâncias da apreensão enquanto são transmitidas imagens do veículo e droga apreendidos. Após, e ainda na mesma “passagem”, Lia Nogueira comenta o caso de Bethânia. A suspeita teria saído do interior de São Paulo e adquirido, na fronteira com o Paraguai, aproximadamente dezesseis quilos de maconha destinados à comercialização. Enquanto são veiculadas fotos de Bethânia e da droga apreendida, a repórter revela suas opiniões sobre os supostos crimes e sobre a aparência da suspeita. Como na reportagem anterior, a reportagem se resume à “passagem”, que tem duração de 3 minutos e 51 segundos, não contando com nenhum outro formato de telejornalismo. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/612337442303383/

3.2.2 Análise crítica

No início da introdução à reportagem, o apresentador pede para que seja veiculada uma música da cantora Maria Bethânia, por associar o nome da suspeita, Bethânia, com a cantora. Ao fazer isso o autor cria uma dicotomia entre as duas pessoas referidas. A primeira, cantora, ele presume ser “do bem” logo, refere-se a ela como “Bethânia do bem”, em contra partida, a personagem da reportagem, uma menina de 19 anos acusada de traficar drogas, o apresentador presume ser “do crime”, logo, refere-se a ela como “Bethânia do crime”. Como acontece em algumas outras reportagens, a escolha de edição foi de agrupar dois casos que, embora tratem de tráfico de drogas, são distintos e não tem relação entre si. Na reportagem, Lia Nogueira começa falando sobre o primeiro caso, em que foram apreendidas uma tonelada e meia da maconha em uma caminhonete abandonada, com o motor ainda ligado. A repórter afirma que os “traficantes estão metendo o louco e apavorando geral”. Durante toda a reportagem, a repórter utiliza de linguagem informal e debochada, fato que pode ser observado com bastante facilidade nas transcrições e mais ainda nos vídeos das reportagens, pois Lia Nogueira gesticula e sorri durante a maior parte do tempo. Ela aborda a apreensão e, logo em seguida, passa a falar sobre a prisão em flagrante de Bethânia.


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Lia Nogueira refere-se a ela como “mina muito louca” e ironiza a aparência da suspeita ao dizer: “olha só como ela é bonita, só que não, né?”. Ao tratar da prisão em flagrante, ela afirma “pra fazer o esqueminha da patifaria, do tráfico, é aquele negócio, né Rodrigo? Mina muito louca aí não quer pegar no cabo do guatambu, caçar um serviço, fazer uma faxola na casa das madames pra ganhar um dinheirinho de forma honesta, né? Não quer. Quer ganhar um dinheirinho fácil.” As afirmações da repórter podem ser interpretadas apenas como a opinião da mesma a respeito do ocorrido, pois, em momento algum, ela oferece evidências deem suporte às afirmações, como por exemplo, alguma fonte próxima ou até a acusada falando sobre suas motivações. A repórter presume que, se Bethânia traficou drogas, é porque não quer trabalhar e quer ganhar dinheiro de maneira “fácil”. Embora se tratem evidentemente de opiniões e presunções da repórter, ela as divulga em tom de certeza. A seguir, Lia Nogueira ironiza o cabelo da acusada, que, de acordo com a repórter, teria “feito chapinha” e, dessa maneira, feito “uma produção” para cometer o suposto crime. Ao comentar desnecessariamente sobre a aparência ou sobre a “chapinha” da acusada, a repórter desrespeita e fere a dignidade de Bethânia. A Constituição Federal prevê, em seu artigo 5º, inciso X que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Ademais, o Código dos Jornalistas Brasileiros define, em seu artigo 12, inciso III, que é dever do jornalista “tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar”. Não apenas a aparência da moça era irrelevante à reportagem, mas também pode-se observar que o único intuito de comentá-la era constranger e ironizar a personagem. Ainda no campo das presunções, a repórter afirma: “você quer chamar a Bethânia, mina muito louca, de mula do tráfico? Ô Rodrigão, na boa, sai saindo, tá? Por que a Bethânia não é mula, não. É patroa, rapaz. Patroa, madame do tráfico” pois a mesma teria afirmado, em depoimento à polícia, que tinha intenção de comercializar a maconha apreendida. Lia Nogueira ainda afirma que Bethânia, que teria gastado sete mil reais para adquirir as drogas, iria “triplicar esse valor”, afirmação para qual não fornece suporte probatório. Nota-se que, indubitavelmente, a repórter estava durante grande parte da reportagem, dando a sua opinião de maneira indiscriminada e não fundamentada. Além de opiniões, a reportagem é cheia de informações sem embasamento técnico e legal, tanto quanto as supostas condutas da acusada quanto sobre suas motivações. Estes temas são abordados pelo Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (FENAJ, 2007):


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Artigo 2º Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que: [...] II - a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público; III - a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão; [...] Artigo 4º O compromisso fundamental do jornalista é com a verdade no relato dos fatos, razão pela qual ele deve pautar seu trabalho pela precisa apuração e pela sua correta divulgação.

Logo, pode-se observar que o exercício da atividade jornalística demanda cautela quanto ao que é divulgado. Não devem haver presunções ou suposições por partes dos jornalistas. É necessário também cautela quanto às opiniões divulgadas. De acordo com o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, “Artigo 10: A opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade”. Cabe ressaltar que, tanto o apresentador quanto a repórter jamais referem-se à Bethânia como “acusada” ou “suspeita”. Trata-se de uma violação ao princípio da presunção de inocência, pois, ao utilizar a terminologia incorreta, o apresentador e a repórter, a condenam previamente, tratando-a como indubitavelmente uma criminosa. Em suma pode-se afirmar que a segunda reportagem: 

Desrespeita a honra e dignidade da personagem;

Emite presunções e opiniões de maneira irresponsável;

Condena previamente a acusada, em desrespeito ao princípio do estado de inocência.


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3.3 REPORTAGEM 3

3.3.1 Análise descritiva

Figura 3 - Reportagem 3

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A terceira reportagem, com tempo total de 3 minutos e 16 segundos, foi transmitida dia 26 de abril de 2017 e produzida por Thiago Bonfim. A reportagem, que tem como foco na falta de segurança no bairro Amambaí, em Campo Grande, não aborda nenhum crime especificamente, embora mencione crimes de furto. A introdução é pelo apresentador, que comenta sobre o medo infligido pelos “noinhas”. Durante a fala de Rodrigo Nascimento, são veiculadas imagens de imóveis abandonados e pixados do bairro. A “chamada” na tela é “Noinhas dominam região do Amambaí: Moradores e comerciantes abandonam imóveis”. Durante toda a narrativa, quem são os “noinhas”, não é precisamente explicado. Eles são descritos como usuários de drogas, mendigos e criminosos. Em geral, a ideia passada é que são grupos de pessoas não desejadas. A reportagem é iniciada por um trecho no formato “OFF”10 em que são mostradas mais imagens de imóveis e de alguns indivíduos sem nenhum 10

Termo técnico para narração gravada do repórter e coberta por imagens.


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tipo de identificação na antiga Rodoviária. O repórter afirma que os imóveis fechados são utilizados por criminosos como ponto de esconderijo e para esconderijo de objetos furtados. Em seguida, é entrevistada a única fonte da reportagem, Rosana Nery, presidente da Associação do Bairro Amambaí. Após, Thiago Bonfim mostra, em um trecho no formato “passagem”, um imóvel abandonado que, de acordo com o repórter, havia sido arrombado e serviria de moradia para usuários de drogas. São mostradas imagens do local, que se encontra sujo e com latas amassadas, comumente usadas para utilização do tipo de droga denominado “crack”. Na sequência, a reportagem retorna à entrevistada, que pede para que providências sejam tomadas pelo poder público. Após, a reportagem se encerra com um trecho no formato “OFF”, seguido de mais um trecho da fala da entrevistada, Rosana Nery, sobre os supostos criminosos e usuários de drogas. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/612837835586677/

3.3.2 Análise crítica

A introdução da reportagem se inicia com o apresentador abordando a insegurança no bairro Amambaí. Para essa insegurança, ele atribui culpa aos “noinhas”, que de acordo com ele, estão “dominando” o bairro. Rodrigo Nascimento afirma: “os noinhas tão botando medo em moradores e em comerciantes que estão abandonando imóveis, é isso mesmo. E olha, os noinhas são tão cara de pau que eles fumam baseado, fumam ervinha do capeta, em plena luz do dia. Tráfico ali, rola adoidado, pela manhã, pela tarde, pela madrugada, pra eles não têm horário, não. O que têm pra eles é afastar comerciante, é afastar gente do bem”. Com essas colocações, o apresentador começa a construir, então, a imagem do que seria esse grupo referido na reportagem como “noinhas”. Alguns pontos podem ser observados desde já. Primeiro, eles são “cara de pau”; segundo “fumam maconha em plena luz do dia”; terceiro querem “afastar comerciantes”, que seriam, ao contrário deles, “pessoas de bem”. A reportagem, de Thiago Bonfim, tem início com um trecho na modalidade “OFF”, em que o repórter diz: “casas e mais casas fechadas, essas imagens foram feitas por moradores do bairro Amambaí, da região do antigo terminal rodoviário. São várias casas fechadas que acabam sendo usadas por criminosos para esconder produtos furtados ou até mesmo como ponto de esconderijo. Alguns moradores resolveram colocar grades nas portas.


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Já nesta casa, que possuía várias janelas, o dono do imóvel resolveu fechar tudo, para evitar aquelas visitas indesejadas.” Em consonância com a introdução, são adicionados, então, alguns elementos à construção da imagem do grupo retratado: são criminosos e indesejados. A reportagem segue com um trecho na entrevista com a Presidente da Associação do bairro, que fala sobre o abandono de imóveis. Ela pede “pra prefeitura, pra que sejam tomadas providências, o dono seja acionado e tome uma providência de lacrar o imóvel dele, de alugar, de vender, que ele tome uma atitude de cuidar do que é dele”. Ademais, a reportagem mostra imagens de imóveis abandonados e sujos, com latinhas no chão, comumente utilizadas para o consumo de “crack”. O repórter fala sobre uma grande quantidade dos “noinhas”, agora tratados como “usuários de drogas”, mas são mostradas apenas imagens distantes e não identificadas de pessoas na antiga Rodoviária. Thiago Bonfim cita que “eles (moradores do bairro) dizem que já denunciaram, mas até agora, nada foi feito para resolver o problema”. O repórter não explicita porque ou o que exatamente seria denunciado, tendo em vista que, nenhum crime especificamente fora apontado, embora sejam feitas menções impessoais aos crimes de furto, roubo e tráfico de drogas. Ainda nessa colocação, cabe observar que as referidas pessoas são apontadas como um “problema” que ainda não foi resolvido. Efetivamente, a introdução e o decorrer da reportagem demonstram uma visão estigmatizada e estigmatizadora. Os “noinhas” são retratados como parasitas, pessoas indesejadas das quais o poder público deve se livrar para que as pessoas “de bem” possam voltar a ter paz. Trata-se da criminalização não de apenas um indivíduo, mas de todo um grupo marginalizado. A cobertura do caso em questão se limita a singularidade do fato jornalístico, sem aprofundamento do contexto mais amplo que envolve a temática da violência urbana. Alguns temas são absolutamente relegados na abordagem da reportagem: primeiramente, o uso de drogas, em especial o “crack” como problema grave de saúde no Mato Grosso do Sul; segundo, a responsabilidade estatal para com os dependentes químicos retratados pejorativamente na reportagem como “noinhas”. Considerando o fato da reportagem invocar, principalmente na fala da entrevistada, a responsabilidade estatal para com a segurança do bairro, alguns aspectos devem ser pontuados: a reportagem não abordou, em momento algum, a responsabilidade principal do Estado, que é para com as pessoas. Sobre esse tema, a Declaração Universal dos Direitos Humanos traz (ONU, 1948):


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Artigo 25° Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. Artigo 26° Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. Artigo 27° Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam.

Importante lembrar que, de acordo com a Constituição Federal:

Artigo 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; [...] IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988).

Trata-se, evidentemente, de um grupo de pessoas cujos seus direitos sociais mais básicos foram negados, entre eles, moradia, alimentação e saúde, tendo em vista que a dependência química é um grave tema de saúde pública. Os direitos sociais estão dispostos na Constituição Federal:

Artigo 6º: São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988).

Além disso, a reportagem tem foco nos imóveis abandonados, que estariam sendo utilizados para moradia e consumo de drogas. Importante ressaltar que, a propriedade privada no Brasil não é um direito absoluto. Diz a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXIII “a propriedade atenderá a sua função social”. Logo, a ocupação de imóveis abandonados pode inclusive, com o passar do tempo, transferir a propriedade ao ocupante. Trate-se do instituto da usucapião, tendo em vista que o imóvel estava anteriormente abandonado e pode atingir sua finalidade social dando abrigo a alguém que não tem onde morar. Essa colocação não visa


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“justificar” a invasão de imóveis, muito menos afirmar que o que acontece na situação pontuada no bairro Amambaí são exclusivamente casos cabíveis de usucapião, mas apenas apontar que, enquanto há pessoas sem ter moradia, é no mínimo incompleto generalizá-las e trata-las como criminosas por se abrigarem em imóveis que sequer estão sendo utilizados. No que tange à responsabilidade jornalística, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros dispõe:

Artigo 2º: Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que: I - a divulgação da informação precisa e correta é dever dos meios de comunicação e deve ser cumprida independentemente de sua natureza jurídica - se pública, estatal ou privada - e da linha política de seus proprietários e/ou diretores. II - a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público; III - a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão. (FENAJ, 2007).

Sobre os temas é necessário ressaltar que ao estigmatizar e criminalizar um grupo social não apenas o Programa Cidade Alerta MS não se atentou à veracidade das informações, como divulgou informações sem nenhum lastro probatório, como ocorre, por exemplo, ao ser afirmado que os “noinhas” praticam furtos, sem que seja apontado nenhum caso específico do crime. Ademais, é fato que a falta de segurança no bairro Amambaí enquadra-se como assunto de relevância ao interesse público, entretanto, a seletividade com que foi abordado o tema deixa a desejar quanto à amplitude do tema e as pessoas envolvidas. Pode-se dizer que a reportagem responde apenas aos interesses da um grupo específico, os morados do bairro retratados como “pessoas de bem” e ignora a existência, além de tratar de maneira pejorativa, às necessidades da parte das pessoas “indesejadas” do bairro. A partir das análises, é possível concluir que a reportagem utiliza da liberdade de imprensa sem compromisso com a responsabilidade social. Ao propagar o preconceito, o repórter e o apresentador fazem o contrário do que recomenda o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (FENAJ, 2007):

Artigo 6º: É dever do jornalista: [...] XIV - combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza.[...] Artigo 12: O jornalista deve:


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I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas; II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público.

Em suma, a reportagem: 

Estigmatiza e aborda de maneira preconceituosa um grupo de pessoas marginalizadas;

Criminaliza usuários de drogas sem se atentar aos contextos sociais e à responsabilidade estatal;

Desumaniza pessoas desfavorecidas ao trata-los como um “problema” a ser resolvido;

Oferece informação duvidosa e não fundamentada;

Não se atenta à responsabilidade social do jornalismo.


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3.4 REPORTAGEM 4

3.4.1 Análise descritiva

Figura 4 - Reportagem 4

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A quarta reportagem, com tempo total de 2 minutos e 58 segundos, foi transmitida dia 26 de abril de 2017 e produzida por Natalie Malulei. Ela retrata outro crime de tráfico de drogas. A “chamada” na tela é “Irmãos do tráfico são presos: Drogas estavam escondidas em micro-ondas”. Entretanto, logo nos comentários do apresentador, nota-se que o foco da reportagem é outro. A introdução da matéria é feita por Rodrigo Nascimento, que chama atenção ao fato de Guilherme, um dos irmãos presos em flagrante, estar usando uma camiseta estampada com a foto de um amigo falecido. O amigo, Gabriel, teria morrido em confronto com a polícia durante uma tentativa de roubo. Durante a fala do apresentador são mostradas imagens da prisão em flagrante dos dois irmãos. A reportagem se inicia com um trecho no formato “OFF”, em que são veiculadas as mesmas imagens anteriores. Em seguida, Natalie Malulei entrevista o suspeito sobre o


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assunto, que afirma ter prestado a homenagem por afeto ao amigo, independentemente de qualquer crime que ele possa ter cometido. Também a respeito da homenagem, é entrevistado Rodrigo Yassaka, delegado responsável. Após, a reportagem segue com mais um trecho no formato “OFF”, seguido de um trecho no formato “passagem” e mais um trecho no formato “OFF”, nos quais a repórter explica as circunstâncias da prisão em flagrante e os itens apreendidos. Posteriormente, a reportagem se encerra com os comentários do delegado sobre a ocorrência. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/612838945586566/

3.4.2 Análise crítica

A introdução da reportagem, feita pelo apresentador, é iniciada com a notícia de que dois irmãos teriam sido presos em flagrante pelo crime de tráfico de drogas. Entretanto, o foco da introdução rapidamente muda: ele passa a ser a camiseta de um dos suspeitos, Guilherme, de 19 anos. O rapaz estava vestido com uma camiseta estampada com uma foto de um amigo falecido no mesmo mês da reportagem, em confronto com a polícia. Ao falar da camiseta, Rodrigo Nascimento, de maneira irônica, afirma: “na camiseta de um dos irmãos, os irmãos do tráfico, ele homenageou o amigo morto. E o amigo morto, adivinha, também não era flor que se cheirava, não. O amigo morto, olha, também tava ligado diretamente ao mundo do crime, que homenagem, hein. Que homenagem é essa?”, o apresentador pergunta com tom de indignação. A reportagem de Natalie Malulei se inicia também com ênfase na vestimenta de Guilherme e a jornalista descreve a homenagem como “ousada”. Ao ser indagado sobre a homenagem, o suspeito responde: “meu amigo desde criança, conheço ele, não tem nada a ver com roubo, não”. A repórter, então, insiste: “e o fato de ele estar lá, envolvido na ação?” e o rapaz justifica: “não, eu não fiz porque ele tava envolvido na ação, eu fiz porque eu gostava dele, ele era meu amigo. Independente se ele tava roubando ou não, ele era meu amigo”. A ocorrência de tráfico de drogas fica em segundo plano na reportagem, para ser enfatizada a camiseta de Guilherme, que, para efeitos da cobertura jornalística, não possui relevância ao crime que ele e seu irmão supostamente cometeram. Pode-se observar, na abordagem do apresentador e da repórter ao tema, que a homenagem do suspeito prestada ao


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amigo é considerada imoral, como se dissessem que Guilherme não possuísse direito de lamentar a morte do amigo, pois, no ponto de vista deles, o amigo era bandido. Trata-se da falta de empatia para com uma pessoa de luto, mas também faz parte da construção social desumaniza a figura do “bandido”. A seguir, é exibida à entrevista com o delegado, que também comenta sobre a camiseta. Ele diz: “ele alega que fizeram essas camisetas aí pra homenagear esse amigo, alegando que seria uma pessoa de boa índole e que não teria participação na vida criminosa. Contudo, eles caem em contradição alegando que esse indivíduo realmente participou desse roubo, mas que foi induzido a erro por um outro colega”. A linguagem rebuscada do delegado, assim como a utilização de termos como “alegação”, dão a impressão de que Guilherme, ao usar a camiseta em homenagem ao amigo, estaria cometendo algum tipo de infração e tivesse a obrigação de se justificar e defender. Vale ressaltar que a homenagem de Guilherme não enseja nenhum tipo de crime ou infração, tendo em vista que não existe nenhum tipo penal que defina a conduta do rapaz como ilícita. Trata-se de um dos princípios do Direito Penal, o princípio da legalidade ou da reserva legal, que define: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Ademais, o princípio da ofensividade afirma que, para que seja considerada ilícito penal, “não basta que a conduta seja imoral ou pecaminosa, ela deve ofender um bem jurídico provocando uma lesão efetiva ou um perigo concreto ao bem”. Sendo assim, a opinião do delegado sobre a atitude de Guilherme ao homenagear o amigo não faz, por si só, com que o ato seja ilícito. Ainda na esfera do Direito Penal, o princípio da humanidade diz que “o réu deve ser tratado como pessoa humana”, significando que, mesmo o réu condenado (o que não é o caso da reportagem analisada) não pode ser despido de sua humanidade em detrimento da infração penal cometida. Todas as pessoas humanas têm direito de sofrer pelo falecimento de uma pessoa querida, seja ela quem for. No que tange ao Jornalismo, é importante ressaltar que o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros dispõe:

Artigo 11: O jornalista não pode divulgar informações: [...] II - de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes; [...] Artigo 12: O jornalista deve: [...] III - tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar. (FENAJ, 2007).


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Pode-se afirmar que, abordar enfática e desnecessariamente a homenagem de um suspeito a um amigo falecido denota caráter mórbido e sensacionalista. No mais, ironizar o sofrimento de alguém nessa situação pode ser considerado desrespeito ao personagem da reportagem. Outro aspecto presente na reportagem é o desrespeito ao princípio do estado de inocência. Embora os dois irmãos, Guilherme e Gabriel, tenham sido presos em flagrante e não ainda julgados ou condenados, eles são tratados na reportagem como “traficantes” e não como “acusados” ou “suspeitos”. Em suma, a reportagem: 

Trata de maneira desrespeitosa e desumaniza os personagens;

Fere a presunção de inocência.

3.5 REPORTAGEM 5

3.5.1 Análise descritiva

Figura 5 - Reportagem 5

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/


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A quinta reportagem, com tempo total de 4 minutos e 43 segundos, foi transmitida dia 5 de maio de 2017 e produzida por Thiago Bonfim. Ela também aborda o crime de tráfico de drogas. A reportagem trata de uma operação deflagrada pela Delegacia especializada em repressão ao narcotráfico (Denar), que, envolvendo quatro diferentes ações, prendeu em flagrante seis pessoas. A reportagem é introduzida pelos comentários do apresentador, que comenta o caso enquanto, são mostradas imagens dos seis supostos criminosos detidos na delegacia. A “chamada” na tela é: “Seis traficantes são presos pela Denar”. A reportagem conta com cinco trechos no formato “OFF”, em que são veiculadas imagens dos suspeitos, armas, munições e drogas apreendidos na Denar. Durante três “OFFs”, são comentadas três operações. Eles explicam que, na primeira ação, foram presas três pessoas, no bairro Mario Covas; na segunda ação, foi presa uma pessoa, no bairro Cristo Redentor; e, na terceira ação, foi presa mais uma pessoa, no bairro Universitário, todos por tráfico de drogas. Cada “OFF” é intercalado com trechos da entrevista ao delegado, João Paulo Sartori, que comenta cada uma das prisões. Em seguida, a reportagem continua com um trecho no formato “passagem”. Embora a “chamada” afirme que seis pessoas haviam sido presas por tráfico de drogas, durante a “passagem”, o repórter afirma que a sexta pessoa presa em flagrante teria sido detida por porte ilegal de armas, no bairro Tijuca. A reportagem segue com outro trecho no formato “OFF” e, após, há tentativa do repórter de entrevistar os suspeitos, que afirmam ser apenas usuários ou se recusam a falar. A reportagem se encerra com mais comentários do delegado. De volta ao apresentador, Rodrigo Nascimento comenta sua opinião sobre o caso. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/616880875182373/

3.5.2 Análise crítica

A introdução da reportagem se inicia com o apresentador falando sobre uma prisão em flagrante de seis pessoas, por crime de tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento afirma que “a casa caiu para seis traficas”, sendo “traficas” termo coloquial utilizado pelo apresentador para se referir a traficantes de drogas. Embora Rodrigo Nascimento fale sobre seis traficantes e a “chamada” na tela seja “Seis traficantes são presos pela Denar”, mais tarde,


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na reportagem, essa afirmação é revelada incorreta, pois se tratam, na realidade, de cinco pessoas presas acusadas de traficar drogas e uma por posse ilegal de armas. Na reportagem de Thiago Bonfim, que se passa na Denar, são retratadas todas as operações que levaram às prisões e é entrevistado o delegado responsável. O repórter tenta abordar os suspeitos detidos na delegacia. Entretanto, eles falam com relutância e de cabeça baixa. Três dos supostos traficantes negam às acusações e afirmam serem apenas usuários de drogas, enquanto um diz ao repórter que não tem nada a declarar. No desenrolar da introdução da reportagem e da reportagem em si, assim como em outras reportagens analisadas, os suspeitos são tratados com o uso da terminologia inadequada, que desrespeita a presunção de inocência: são chamados de traficantes, sem que tenham sido condenados pelo crime de tráfico de drogas. Entretanto, após o fim da reportagem, nos comentários posteriores, Rodrigo Nascimento, ao dar sua opinião sobre a ocorrência, nega o princípio do estado de inocência de maneira bastante explícita. De acordo com o apresentador, “quem não deve, não teme” e o fato de os suspeitos estarem de cabeça baixa ou se recusarem a falar com o repórter serviria de evidência de que eles não eram apenas usuários de drogas como alegavam, mas traficantes. Rodrigo Nascimento afirma: “Eu não entendo, se você é inocente, aí vai pro paredão aqui da Denar, baixa à cabeça, né? Aí fica com vergonha! Rapaz, se você não fez nada, ergue à cabeça.” A afirmação do apresentador transita no campo das opiniões, pois ele não oferece nenhuma prova que sustente suas colocações. Ademais, o apresentador afirma reiteradamente que os suspeitos estariam mentindo com a intenção de enganar a polícia. Ele diz: “a historinha que vocês contam pra ludibriar a polícia, ô seus trafica, ô seus trafica, ceis são traficante, ceis não são atores não. Que que é isso? Que absurdo. “Eu não tenho nada à declarar não, senhor”. Engraçado, na hora de comercializar a ervinha do capeta negocia que é uma beleza, né?”. Sendo assim, o apresentador viola diretamente a presunção da inocência, princípio de suma importância e que está disposto em todos os parâmetros normativos utilizados para este trabalho. A Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe:

Artigo 11: Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. (ONU, 1948).


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Já a Constituição Federal afirma, em seu artigo 5º, inciso LVII, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. A disposição constitucional serviu de base para o princípio do Direito Penal, denominado princípio da presunção de inocência ou princípio do estado de inocência, trata-se de um dos princípios norteadores do Direito Penal. O Código dos Jornalistas Brasileiros também dispõe expressamente, em seu artigo 9º que “a presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística”. A ênfase dada nesta análise a todas as disposições acerca do princípio da presunção da inocência advém da gravidade da violação. No caso, não se trata de um descuido, ou da utilização, mesmo que reiterada, de termos incorretos, mas de afirmações explícitas e de violações diretas e voluntárias ao princípio constitucional. Ademais, o apresentador expõe suas opiniões de maneira irresponsável e não fundamentada. De acordo com o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (FENAJ, 2007):

Artigo 10. A opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade.[...] Artigo 12. O jornalista deve: I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas; II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público.

Em suma, a reportagem: 

Desrespeita explícita e reiteradamente a presunção de inocência;

Divulga de maneira irresponsável e sem fundamentos a sua opinião.


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3.6 REPORTAGEM 6

3.6.1 Análise descritiva

Figura 6 - Reportagem 6

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A sexta reportagem, com tempo total de 4 minutos e 24 segundos, foi transmitida dia 5 de maio de 2017 e produzida por Natalie Malulei. Ela aborda o crime de roubo na modalidade tentada11. A reportagem retrata a história de um dono de bar que reagiu a uma tentativa de assalto, desarmou o suspeito e, com ajuda dos clientes e vizinhos, o amarrou em uma barra de ferro em frente ao bar. O suspeito teria descido de uma motocicleta guiada por outro homem, que teria permanecido no veículo e, ao notar que o assalto tinha dado errado, teria evadido o local. Durante a introdução da reportagem feita pelo apresentador, são veiculadas imagens do local, do suspeito e da arma que portava. A “chamada” na tela é: “Ladrão é amarrado em barra de ferro após tentativa de assalto a bar”. A reportagem é iniciada com um trecho no formato “OFF”, em que são apontados os antecedentes criminais do suspeito e mostradas as mesmas imagens da introdução. Em 11

Quando o crime não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.


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seguida, em um trecho no formato “passagem”, são abordadas as circunstâncias do ocorrido. A reportagem segue com um trecho no formato “OFF” e com uma entrevista ao proprietário do bar onde ocorreu o fato, um senhor de 54 anos. A reportagem também conta com entrevista a um comerciante vizinho, proprietário de uma lanchonete. De acordo com ele, os supostos assaltantes teriam passado, em uma motocicleta, em frente ao seu estabelecimento poucos minutos antes da tentativa de assalto ao bar. Após, em dois trechos no formato “OFF” e trechos da entrevista aos proprietários dos estabelecimentos, é abordado o tema da insegurança no bairro e o medo dos comerciantes e moradores. Ambas as fontes não tiveram os nomes revelados. O programa retorna com mais comentários do apresentador acerca do acontecimento. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/vb.479974528873009/616881965182264/

3.6.2 Análise crítica

A introdução à reportagem se inicia com o apresentador contando a história de um dono de bar que, ao reagir a uma tentativa de assalto, teria, com a ajuda de vizinhos e clientes do bar, amarrado o suposto assaltante em uma barra de ferro. Logo no início da reportagem, Rodrigo Nascimento expressa sua opinião acerca do caso e da “punição” antecipada ao suposto bandido. O apresentador afirma: “você acha que eu acho coitadinho? Eu acho é pouco.” Rodrigo Nascimento se refere ao suspeito como “fanfarrão” e afirma que ele “não é flor que se cheire”. Na reportagem de Natalie Malulei, o proprietário do estabelecimento, explica que se aproveitou do descuido do suposto assaltante para reagir ao roubo. Ele conta: “Eu passei um dinheiro pra ele, ele não queria, ele, ele “eu quero o da gaveta, eu quero o da gaveta” e me apontando a arma pro meu peito. Eu fui me desvencilhando dele, até acalmar ele um pouquinho e ele, muito nervoso, quando ele levou a mão na gaveta pra pegar o dinheiro maior um pouco, ele abaixou a guarda e foi a hora que eu segurei a mão dele, levantei e entrei em luta corporal. E, graças à Deus, eu consegui vencer”. A repórter ainda conta que o suposto assaltante chegou a disparar a arma, que falhou. A terminologia utilizada, tanto pelo apresentador quanto pela repórter está em desacordo com o princípio da presunção de inocência, tendo em vista que o suspeito não


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havia sido condenado pela prática do crime. Ademais, a reportagem aborda o ocorrido de forma informativa. De volta ao apresentador, ele afirma: “olha, a gente não deve fazer justiça com as próprias mãos, mas em que situação nós chegamos... A que ponto chegamos que, o cidadão de bem, que coloca sua vida em risco, pra amarrar um bandido sem vergonha num cano como esse daqui”. Nota-se que a utilização da conjunção “mas” implica que, embora a conduta seja em regra incorreta, ela é, de alguma maneira, justificável devido à situação. A análise desta reportagem específica não tem como foco as opiniões do apresentador em relação ao suposto assaltante, considerando que o fato abordado não necessariamente enseja um caso de linchamento e pode ser argumentado que o proprietário do bar estava apenas se defendendo. Cabe observar, porém, que existe uma linha tênue entre a defesa e a agressão, por isso, ao retratar assuntos como este, é necessário muito mais cautela, para que as pessoas não sejam incentivadas a fazerem “justiça com as próprias mãos”, tendo em vista que o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros dispõe, em seu artigo 7º, inciso V, que o jornalista não pode “usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime”. Nesse sentido, o apresentador, ao ter como foco comentários que expressassem sua indignação com o “bandido”, ignorou outro ponto importante (se não o mais importante): o quanto a conduta do proprietário do bar foi perigosa e ameaçou à vida de todos os presentes no local. Embora, em um breve momento, Rodrigo Nascimento cite que o dono do bar “colocou sua vida em risco”, toda a abordagem da introdução da reportagem e da reportagem em si retratam a atitude de reagir a um assalto como aceitável. Ao falar que o suspeito “não é coitadinho” e que ser amarrado em uma barra de ferro “é pouco”, o apresentador propaga a ideia de que atitudes como essa são exemplos a serem seguidos, sem se atentar à possibilidade de incentivar o público a fazer algo potencialmente fatal. No caso da ocorrência, por sorte, a arma falhou e ninguém saiu ferido, entretanto, poderia ter sido diferente. Assim, pode-se dizer que a abordagem, tanto dos comentários do apresentador quanto da reportagem em si, foram irresponsáveis. Nesse sentido, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros ressalta, em seu artigo 2º, inciso III: “a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão”. Logo, o jornalista, ciente do alcance de seu trabalho e de sua capacidade de influência na vida das pessoas deve se preocupar em não propagar ideais que incitem violência ou que possam incentivar comportamentos perigosos. Em suma, a reportagem:


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Desrespeitou a presunção de inocência;

Relativiza a violência e/ou linchamento;

Pode incentivar comportamento inseguro/arriscado.

3.7 REPORTAGEM 7

3.7.1 Análise descritiva

Figura 7 - Reportagem 7

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A sétima reportagem, com tempo total de 2 minutos e 14 segundos, foi transmitida dia 10 de maio de 2017 e produzida por Natalie Malulei. Ela aborda três crimes: primeiramente, um crime de furto na modalidade tentada, seguido dos crimes de estupro e lesão corporal. A reportagem tem como “chamada” na tela: “Ladrão tem mandioca introduzida no corpo”. De acordo com a reportagem, durante uma suposta tentativa de furto de cinco quilos de mandioca, um homem de 33 anos teria sido flagrado por um grupo de moradores


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que, ao se depararem com a situação, teriam o espancado estuprado, utilizando, para este fim, uma mandioca. Embora a reportagem apenas utilize os termos “tem mandioca introduzida no corpo”, em pesquisa a outros portais de notícia, pode-se averiguar que o suspeito teria sido estuprado com uma mandioca introduzida nos ânus. Nenhum dos envolvidos na ocorrência foi identificado. A reportagem é introduzida pelos comentários do apresentador e conta com apenas um trecho no formato “OFF” e com um trecho no formato “passagem”, em que são abordadas as circunstâncias dos crimes e são veiculadas imagens do local dos crimes. Durante a maior parte da abordagem do acontecido, tanto na reportagem em si quanto nos comentários de Rodrigo Nascimento, o suposto autor do furto é referido pelo termo “ladrão” e os supostos autores dos crimes de lesão corporal e estupro, são tratados como “populares” ou “moradores”. A reportagem pode ser acessada no link: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/619108931626234/

3.7.2 Análise crítica

A introdução da reportagem se inicia com os comentários de Rodrigo Nascimento, que diz ter ficado preocupado com a notícia e afirma: “a gente sabe que não pode fazer justiça com as próprias mãos”. O apresentador começa, então, a narrar o acontecido. Ele afirma: “ladrões não estão deixando nem escapar plantações de mandioca. E olha só nessa história, presta atenção nessa história. O homem foi flagrado furtando mandioca. E o que que aconteceu? Esse homem acabou sendo flagrado. O pessoal tava tão revoltado, tão revoltado que pegou e falou o seguinte: “Você tá roubando mandioca, você tá furtando mandioca? Quer mandioca?” E o que aconteceu? Pegaram a mandioca e introduziram no corpo desse ladrão.” Durante os comentários, Rodrigo Nascimento discorre sobre os supostos crimes ocorridos: a tentativa de furto, seguida do estupro (o apresentador refere-se ao segundo como “teve mandioca introduzida no corpo”). Adiante, na reportagem, é revelado que o homem acusado do furto também teria sido espancado. Trata-se de uma situação de lichamento, embora os termos “linchamento” ou “estupro” em momento algum apareçam nos comentários do apresentador ou na reportagem em si. A princípio, é necessário pontuar alguns aspectos sobre os referidos crimes. Primeiramente, o crime de furto, como definido no segundo capítulo desta monografia, não


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possui violência ou grave ameaça, logo, não oferece periculosidade, apenas lesa o patrimônio. No caso específico, estariam sendo furtados cinco quilos de mandioca, em uma plantação aberta, assim, o dano material ocasionado seria ínfimo e, provavelmente, imperceptível. Nesse sentido, alguns princípios do Direito Penal devem ser observados: O princípio da fragmentariedade afirma que “o estado só protege os bens jurídicos mais importantes, assim intervém só nos casos de maior gravidade” assim como o princípio da intervenção mínima, que de acordo com Damásio de Jesus:

Procurando restringir ou impedir o arbítrio do legislador, no sentido de evitar a definição desnecessária de crimes e a imposição de penas injustas, desumanas ou cruéis, a criação de tipos delituosos deve obedecer à imprescindibilidade, só devendo intervir o Estado, por intermédio do Direito Penal, quando os outros ramos do direito não conseguirem prevenir à conduta ilícita. (JESUS, 2013, p. 52).

O Direito Penal é considerado como último recurso e não deve intervir em casos de pequeníssimo dano. Em consonância com esses princípios, está o princípio da insignificância ou bagatela que se baseia no pressuposto de que a tipicidade penal exige um mínimo de lesividade ao bem jurídico, reconhecendo a “atipicidade do fato nas perturbações jurídicas mais leves” (JESUS, 2013, p. 10). Essa exposição foi feita para fundamentar que, se comprovado o furto em questão, é possível que seu delito fosse considerado, pelo Poder Judiciário, como atípico, ou seja, que não enseja crime, devida a ínfima gravidade e lesividade de sua conduta. Em contrapartida, o crime de lesão corporal pode acarretar pena de três meses a oito anos (dependendo da gravidade) e o crime de estupro é considerado crime hediondo12, com pena de seis a dez anos. Logo, indubitavelmente, a conduta dos supostos linchadores é muito mais gravosa, tendo em vista que oferece lesão à pessoa e sua dignidade sexual. Feitas estas ressalvas, é possível voltar à fala do apresentador. De início, ele afirma que não se deve fazer justiça com as próprias mãos. Porém, logo em seguida, Rodrigo Nascimento relativiza a magnitude do linchamento ao oferecer justificativas, dizendo que “ladrões não estão deixando escapar nem plantações de mandioca”, atribuindo, assim, grande gravidade ao ato de furtar mandioca. Ele também afirma que as agressões teriam se dado devido a grande revolta com o furto.

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São os crimes elencados na Lei 8.072/90, são chamados hediondos porque merecem maior nível de reprovação perante o Estado.


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A reportagem de Natalie Malulei se inicia com a repórter afirmando que “a plantação de mandioca de uma chácara, no bairro Monte Alegre, em Campo Grande, foi alvo de um ladrão”. Em seguida, ela acrescenta: “um homem de 33 anos foi flagrado por populares no momento em que arrancava as ramas e foi agredido pelo grupo”. A construção da narrativa leva à ideia de causa e consequência: estava furtando, por isso foi agredido. Nota-se que, tanto Natalie Malulei quanto Rodrigo Nascimento, se referem ao homem que supostamente estaria furtando como “ladrão”, enquanto o grupo acusado de agredi-lo e estupra-lo é tratado como “grupo de pessoas” ou “populares”, embora a gravidade da conduta do primeiro seja muito menor. É significativa também a escolha dos termos “introduziu no corpo” ao invés de “estuprou” ou “introduziu no ânus”. A opção de vocabulário serve como eufemismo e desqualifica a gravidade da conduta. Este fato também pode ser observado na construção da “chamada” na tela: “Ladrão tem mandioca introduzida no corpo”. Mesmo que a interpretação possibilite a visualização de que houve um estupro, ao ser identificado como “ladrão”, ele é despido de sua humanidade, como se dissesse “não é uma pessoa, é um ladrão”. Ao estigmatiza-lo na figura de “ladrão”, o apresentador e a repórter ferem os princípios de igualdade, pois atribuem, mesmo que involuntariamente, uma noção de merecimento advinda da condição de “bandido”. De acordo com a Constituição Federal, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Ademais, repete-se a conduta recorrente de desrespeito à presunção de inocência, tendo em vista que, sem ser condenado, o homem acusado de furtar mandioca era tratado por “ladrão”. Importante salientar também que, de acordo com o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, é vedado ao jornalista “usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime”. Embora, em nenhum momento, a reportagem diretamente incite a violência, a abordagem incorreta e seletiva, assim como as justificativas apresentadas pelo apresentador, a relativizam. Em suma, a reportagem: 

Fere ao princípio da igualdade;

Desrespeita a presunção de inocência;

Relativiza a gravidade da prática de linchamento.


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3.8 REPORTAGEM 8

3.8.1 Análise descritiva

Figura 8 - Reportagem 8

Fonte: www.facebook.com/cidadealertams/

A oitava reportagem, com tempo total de 3 minutos e 6 segundos, foi transmitida dia 10 de maio de 2017 e produzida por Lia Nogueira. Ela aborda o crime de tráfico de drogas. Nela são tratadas duas ocorrências distintas, na cidade de Dourados. A primeira, cuja “chamada” na tela é: “Garoto do crime: Rapaz é preso com paradinhas” trata de Júlio César Nunes, de 18 anos, preso com papelotes de pasta base e de cocaína. A segunda ocorrência, cuja “chamada” na tela é: “Mineira do tráfico: Jovem é presa na rodoviária de Dourados com 30 kg de maconha”, envolve Julye Manuelle presa na rodoviária de Dourados, em um ônibus que saiu de Ponta Porã e tinha como destino Campo Grande, com 30 quilos de maconha, distribuída em seis malas. A introdução da reportagem é feita por Rodrigo Nascimento. Durante ela, são colocadas fotos dos dois supostos agentes das ocorrências lado a lado. O apresentador se refere a eles como “dupla dinâmica” e “Sandy & Junior”. A reportagem se resume à repórter,


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sentada em o que aparenta ser uma redação, comentando os casos, durante 1 minuto e 53 segundos. Enquanto Lia Nogueira fornece as informações, são veiculadas as mesmas fotos dos suspeitos mostradas anteriormente, sendo que a foto de Julye é recortada algumas vezes, para destacar o short que a suspeita usava. A reportagem não conta com nenhum no formato de telejornalismo ou com qualquer outro elemento jornalístico. A reportagem pode ser acessada: https://www.facebook.com/cidadealertams/videos/619109878292806/

3.8.2 Análise crítica

A introdução da reportagem se inicia com os comentários de Rodrigo Nascimento, que narra duas ocorrências distintas do crime de tráfico de drogas, protagonizadas por dois jovens: Júlio César, de 18 anos e Julye Manuelle, de 20 anos. Embora as duas ocorrências não tenham nenhuma relação entre si, o apresentador associa a pouca idade dos suspeitos e referese a eles como “Sandy e Junior”. Ao tratar de Julye Manuelle, o apresentador afirma que ela é uma “moça bonita” e a apelida de “mineirinha do tráfico”. Já em relação a Júlio César, o apresentador comenta: “olha a carinha de novinho dele, é um menino de papai”. Rodrigo Nascimento expressa a sua opinião em relação às motivações dos suspeitos para cometerem o crime de tráfico de drogas. De acordo com o apresentador, eles “não pensam em estudar, não pensam em trabalhar, pensam na safadeza, numa maneira de ganhar dinheiro fácil”. Na reportagem de Lia Nogueira, a repórter afirma que “a molecada tá de patifaria”. Em consonância com a opinião manifestada pelo apresentador, ela diz que a “molecada” não quer trabalhar de forma honesta, estudar ou fazer uma faculdade, mas, sim “praticar a patifaria”. Ao abordar as ocorrências, a jornalista refere-se a Júlio César como “esse comédia aí” e a Julye como “mina muito louca”. Lia Nogueira também ironiza a aparência da suspeita, ao dizer que a menina quer “pagar que é gatinha”, tem luzes no cabelo e está de “roupinha curta”. A repórter afirma que, ao invés de traficar drogas, seria melhor se a Julye fizesse “faxola na casa das madames”, para ganhar dinheiro de forma honesta. Pode-se observar que, durante toda a abordagem, o apresentador e repórter emitem suas opiniões, que, para efeitos de cobertura jornalística, não possuem relevância informativa, apenas manifestam juízos de valores particulares em relação à índole dos


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suspeitos. Nesse sentido, é importante ressaltar que o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros dispõe expressamente, em seu artigo 10, que “a opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade”. Ademais, devem ser observados o interesse público e a responsabilidade social do jornalismo. Diz o Código:

Artigo 2º: Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que: II - a produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público; III - a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão. (FENAJ, 2007).

Dessa maneira, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros visa que o jornalista, a divulgar sua opinião no exercício da atividade jornalística, o faça com cautela e atento à responsabilidade social inerente a profissão. Assim, toda informação veiculada deve ter como finalidade o interesse público e seu direito de se informar. Ao tratarem dos suspeitos como indubitavelmente traficantes, sem utilizar os termos “acusado” ou “suspeito”, ambos, apresentador e repórter, ferem o princípio do estado de inocência. No mais, comentários irônicos, como, por exemplo, quando a repórter afirma que Julye quer “pagar de gatinha” ou está de “roupinha curta”, ferem o artigo 12, inciso III do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, que dispõe ser dever do jornalista o tratamento respeitoso as pessoas mencionadas na informação divulgada. Ferem também o texto da Constituição Federal, que diz, em seu artigo 5º: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Em suma, a reportagem: 

Emite opiniões particulares de maneira irresponsável;

Fere à presunção de inocência;

Viola a honra e à imagem dos personagens;

Desrespeita os personagens.


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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O primeiro capítulo demonstrou a construção histórica da relação entre a atividade jornalística e a concepção de cidadania, intimamente relacionada com a evolução dos direitos fundamentais. Já o segundo capítulo, além de estabelecer os parâmetros a serem utilizados na análise empírica, teve como objetivo explanar que a evolução das três gerações de direitos fundamentais transcorreram em decorrência de embates e necessidades históricas. Enquanto a primeira geração dos direitos fundamentais teve como pauta a ascensão da burguesia e o desvencilhamento do autoritarismo monárquico, nascendo, assim, atrelada ao liberalismo econômico, a segunda geração surge em decorrência das desigualdades sociais e da miséria agravadas pelas práticas liberais. Cada geração decorre visando atender às necessidades de seu tempo e, conforme novas necessidades são observadas, conflitos e lutas históricas são travados em busca do reconhecimento de novos direitos. Cabe salientar que, os direitos pleiteados e conquistados pelas três gerações de direitos fundamentais, não substituem uns aos outros, mas se somam. A cultura de uma sociedade não é estanque, ela varia com o decorrer do tempo. Da mesma forma, as necessidades dessa sociedade estão em constante mudança. Por essa percepção, o ponto de vista defendido por essa monografia é o de que o Jornalismo não deve permanecer imutável e deve tentar se adaptar às demandas sociais. Isso implica também na concepção de que a atividade jornalística não deve meramente se ancorar em preceitos liberais da primeira geração de direitos fundamentais, como as liberdades de expressão, opinião e imprensa, e usá-las como pretexto para deliberadamente violar direitos de segunda ou terceira geração. Faz parte do compromisso ético da profissão buscar o equilíbrio entre os direitos. Nesse sentido, cabe à esfera jurídica a normatização desses direitos, pois não basta seu reconhecimento, são necessárias maneiras coercitivas que garantam sua aplicação. Na visão defendida por esse trabalho, o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros peca justamente por possuir pouca coercibilidade, uma vez que não existe no país um conselho ou ordem para aplicabilidade do documento (como ocorre em outros grupos profissionais, como médicos e advogados, por exemplo). Sob essa ótica, alguns aspectos do programa Cidade Alerta MS, observados na análise empírica, devem ser pontuados: Em todas as reportagens analisadas, a presunção de inocência foi desrespeitada.


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Na maioria das vezes, os personagens foram referidos com a utilização dos termos “bandido”, “ladrão” ou “traficante”, destoando, assim, das terminologias corretas, “acusado” ou “suspeito”. Por outras vezes, entretanto, a violação ocorreu de forma explícita, como na Reportagem 5, em que o apresentador afirma que os acusados estariam mentindo sobre serem apenas usuários de drogas. Em muitos momentos, os personagens são abordados de forma desrespeitosa e irônica, com atribuição de ofensas pessoais e apelidos. É o caso da Reportagem 1, na qual Emanuelle é apelidada de “bela do tráfico”. Nas Reportagens 2 e 8, Lia Nogueira comenta ironicamente sobre o cabelo e roupas das suspeitas. Ademais, os personagens frequentemente são tratados com a utilização de termos pejorativos, como “mina muito louca”, “traficas”, “fanfarrões”, “comédia”, entre outros. O programa estabelece, de maneira maniqueísta, relações dicotômicas entre “pessoas de bem” e “bandidos”. Na Reportagem 2, o apresentador, ao comparar a personagem à cantora Maria Bethânia, refere-se à primeira como “Bethânia do crime”, enquanto a segunda seria a “Bethânia do bem”. O mesmo ocorre, em maior escala, na Reportagem 3, em que os “noinhas” são retratados como um grupo de pessoas indesejadas, que querem, nas palavras do apresentador, “afastar gente do bem”. Outro aspecto importante é que, em determinados momentos, como na Reportagem 3, ao estigmatizar a imagem dos “noinhas”, a cobertura jornalística aborda apenas a singularidade do fato, sem se aprofundar em contextos mais amplos, como, no caso, a questão da desigualdade social. O mesmo pode ser observado quando algumas opiniões são expressadas. Em reportagens como a 2 a 8, são proferidas opiniões a respeito das motivações dos supostos criminosos. É afirmado que os suspeitos não querem trabalhar, não querem estudar e não querem ganhar dinheiro de forma honesta. Essas opiniões, além de não passarem de presunções e juízos de valor, não são fundamentadas com evidências e desconsideram qualquer contexto social, cultural e histórico que possa ter envolvimento na ampla temática de crimes e violência urbana. Vale salientar que, ao apontar que os crimes envolvem outros contextos além dos apontados pela cobertura jornalística do referido programa, não significa justificar ou relativizar a prática criminosa. O intuito é apenas apontar que se trata de uma realidade complexa, envolvendo diversos fatores, e não apenas uma simples divisão dicotômica entre pessoas boas e pessoas ruins. Por fim, é importante acrescentar que, a Constituição Federal, em seu artigo 4º, inciso II, dispõe que a República Federativa do Brasil é regida pela prevalência dos direitos


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humanos. Já o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros prevê, em seu artigo 6º, inciso X, que é dever do jornalista “defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito”. Permanecem assim, neste trabalho, o desejo e a esperança na construção de uma sociedade digna e igualitária, com a convicção de que o Jornalismo pode cumprir importante papel nesse processo, mas que, para isso, deve ser sempre pautado por sua função social e pelo respeito aos direitos fundamentais.


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REFERÊNCIAS

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APÊNDICE A - Transcrição da Reportagem 1 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

"BELA DO TRÁFICO": TRAVESTI É PRESA APÓS SER FLAGRADA VENDENDO DROGAS DURANTE SHOWS DA EXPOGRANDE NA CAPITAL. SOLDADO E BARTÔ ENCENAM COMO FUNCIONAVA A VENDA DE ENTORPECENTE QUE ERA FEITA POR EMANUELLE NA CAPITAL. ASSISTA: 10 de abril de 2017 – Tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: Lucas Fernandes dos Santos de 28 anos, Lucas Fernandes, de 28 anos, só que o Lucas era conhecido como Emanuelle. Cadê a Emanuelle? Coloca aqui. A Emanuelle é considerada a bela do tráfico, ó, esse é o Lucas, é uma travesti. Essa moça bonita que tá aparecendo aí, sabe o que que aconteceu com ela? Ela tava vendendo a balinha batizada, lá nos shows da exposição. É a bela do tráfico. Quer ver só o que ela fazia? Vem comigo, Ana Lívia Tavares, põe na quadrada. Ana Lívia Tavares: Por meio de uma denúncia, um policial da delegacia especializada no narcotráfico de Campo Grande, chegou até a casa de Emanuelle no bairro Pioneira, lá ele encontrou, no quarto dela, 89 comprimidos de ecstasy, e dois mil reais em dinheiro. Ela confessou que estava comercializando a droga durante os shows na Expogrande, no Parque de Exposições Laucídio Coelho. A polícia também encontrou um celular onde ela recebia pedidos de encomenda. Emanuelle foi presa por tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: Olha, eu só ouvi aqui no meu ponto que alguém conhece, alguém viu, olha só, a Emanuelle do tráfico. Bartô, vem aqui, trava a câmera, vem cá, vem cá Bartô, vem cá. Cê sabe que eu sempre conto essa historinha porque as pessoas não sabem se divertir na balada. A pessoa, ela tinha que beber água mineral nos shows. Eu fui num show do Safadão, eu só fiquei na minha aguinha a noite inteira, porque senão eu não conseguia acordar no dia seguinte. Vem cá, a pessoa, Bartô, pode vir pra cá Bartô, você é a sensação. Olha a sensação, o Bartô tá chegando e vai até o chão (cantando). Bartô, a pessoa normal na balada, empresta um microfone ow xará, empresta um microfone cá pra mim ow piu piu, prepara uma


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música eletrônica pra mim. Ô Bartô tá conhecendo, tá lá, na balada, tá no show do Safadão, como que é o nome do Dj lá que veio aqui? Alok, o Dj Alok, é o Dj Alok, nunca ouvi falar na vida. Você já ouviu falar do Dj Alok? Bartô, quantos... tá, você diz que não... Mas você já ouviu falar do Dj Alok. Nunca ouviu? Então tá, o Alok é um Dj. Aí, Bartô, tá chegando lá, você tá na baladinha e aí tá dançando. Como que dança eletrônico? Vai, mostra pra mim como que dança, vai, mostra aí. Bartô: Do meu jeito? Rodrigo Nascimento: Do seu jeito, vai, dança, vai. O Bartozinho tá lá, tá chegando lá... Vai, Bartozinho, dança, continua dançando, tá na pista. Vai, vai Xará, balança aí, Xará. O Bartô tá lá, o Bartozinho tá lá... Vem cá, traz esse soldado, pode vir soldado, coloca aqui soldado, vem aqui, dá aqui, dá aqui, põe aqui, Bartô, vai ficar bonitão. Põe aqui, vai ficar bonitão, Bartô, põe aí, vai, Tá lá na baladinha, o Bartô tá lá, olha aqui, vamos dançar, vamos. E dançando lá na balada, com Dj Alok, vai, Bartô, dança, vamo dançar comigo, vai, oi, oi, oi, oi. Chegou lá, o Bartô no tuts, tuts, tuts, tuts. Aí, Bartô, chegou a Emanuelle. Cadê a Emanuelle? Coloca aí a Emanuelle. A Emanuelle chegando. A Emanuelle, ela tá com a balinha batizada, ela tá com ecstasy. Aí a Emanuelle, de forma sorrateira, ela vai chegar assim como quem não quer nada, ela vai chegar assim do nada, olha só. Vai Bartô, continua dançando, vamo continuar dançando, ó. Tão lá, bebendo aguinha, o Bartô tá naquele whiskyzinho, na vodca, porque na balada tem isso, né? E aí, de repente, de repente, a balinha batizada aparece, a Emanuelle vai chegar como se não quisesse nada. Chega a Emanuelle. Olha a Emanuelle chegando na balada, olha lá a Emanuelle, chega desse jeito, olha lá a Emanuelle. A Emanuelle chegou ali ó, ela tava nos shows, ninguém tava conhecendo a Emanuelle. Olha lá, a Emanuelle lá. Tá parecendo a Samara do chamado. Olha, aí o que a Emanuelle vai falar pra você? Vem cá, Emanuelle, fala. Homem “fantasiado” de Emanuelle: Oi, Bartô... tudo bem? Rodrigo Nascimento: E aí, mas cê não conhece o Bartô? Homem “fantasiado” de Emanuelle: Conheço... Oi negão, tudo bem? Rodrigo Nascimento: E aí você vai responder o que pra Emanuelle na balada? Bartô: Cem por cento. Rodrigo Nascimento: E aí? Homem “fantasiado” de Emanuelle: Quer ficar duzentos por cento? Bartô: Não, brigado, sô tranquilo. Homem “fantasiado” de Emanuelle: Mas eu tenho um negocinho que você fica trezentos por cento, Bartô.


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Bartô: Não, tô tranquilo aqui, tô só no meu whiskyzinho, tá ótimo. Homem “fantasiado” de Emanuelle: Tenho uma balinha aqui do Johnny Walker. Bartô: Não, hoje não, muito obrigado. Rodrigo Nascimento: E aí, o que aconteceu com você? Homem “fantasiado” de Emanuelle: Cê não quer, Bartô? Balinha batizada, ela aqui. Rodrigo Nascimento: E aí, chegou a polícia, chegou a polícia. Cadê a polícia? A polícia... A casa caiu pra Emanuelle. E a Emanuelle, cadê a polícia? A bela do tráfico foi parar atrás das grades, ó, cadeia pra Emanuelle. Caiu a casa, Emanuelle. Caiu a casa, Emanuelle.


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APÊNDICE B - Transcrição da Reportagem 2 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

BETHÂNIA DO CRIME COMPRA DROGAS NA FRONTEIRA PARA VENDER EM SÃO PAULO. ENTENDA ESSA HISTÓRIA: 25 de abril - Tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: Olha só, alguma vez você aí que tá me assistindo já ouviu Maria Bethânia. Quer ver só? Coloca aí na quadrada pra mim, solta o som. Essa é a Bethânia. Pois é, pessoal, essa aí é a Bethânia do bem, é a Bethânia do bem, é uma artista. Agora, a gente tem a Bethânia do crime, quer ver só? Coloca a Bethânia do crime pra mim aqui. Olha a cara da Bethânia do crime. Essa é a Bethânia que saiu lá de São Paulo, foi até Dourados pra comprar a ervinha do capeta. Essa é a Bethânia que é considerada pela guarda municipal de Dourados a patroa do tráfico. Saiu de São Paulo, comprou a ervinha do capeta na fronteira e queria revender lá como uma paulistana. Só aconteceu o que? A casa caiu pra ela. A casa caiu. Lia Nogueira vai contar certinho pra mim, vem aqui comigo, põe na quadrada. Lia Nogueira: Olha Rodrigão, os traficantes tão metendo o louco, apavorando geral aqui na região sul do estado, viu? O tráfico simplesmente não para, os traficantes têm que dar um jeito de escoar toda essa produção que parte do Paraguai de maconha, da ervinha do capeta, é, exatamente. Nesse mesmo ritmo, a polícia também trabalha. O DOF, departamento de operações de fronteira, apreendeu, na madrugada de hoje, mais de uma tonelada e meia de maconha. Detalhe, a droga vinha toda solta, na caruda, na modalidade do tráfico chamada de cavalo doido, em que os traficantes não se dão ao trabalho nem mesmo de esconder, de camuflar a droga. Eles simplesmente coloca no carro e ó, saem chutado, enfrentando a fiscalização. Pois bem, essa apreensão aconteceu na madrugada de hoje, na MS-156, na região de Caarapó. A caminhonete, ela foi encontrada, ela estava atolada numa estrada vicinal, numa rodovia aí, uma estrada vicinal, e o motor ainda estava ligado, exatamente. A impressão que tem é que os traficantes não conseguiram seguir aí com o trajeto e acabaram abandonando o veículo carregado com maconha. Durante checagem ao banco de


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dados, os agentes do DOF descobriram que essa caminhonete, ela foi furtada no interior do Rio Grande do Sul em 2015. Toda droga e o veículo também foram levados para a Defron, a delegacia de fronteira, aqui de Dourados. Falando ainda sobre as apreensões de drogas, a gente vem agora com esse caso dessa mina aí, mina muito louca, Bethânia Maria dos Santos, 19 anos, ó como que ela é bonita. Bonita ou não? Só que não, né? Detalhe que é o seguinte, pra fazer o esqueminha da patifaria, do tráfico, é aquele negócio, né Rodrigo? Mina muito louca aí não quer pegar no cabo do guatambu, caçar um serviço, fazer uma faxola na casa das madames pra ganhar um dinheirinho de forma honesta, né? Não quer. Quer ganhar um dinheirinho fácil. Só que pra poder praticar a patifaria a Bethânia se preparou, se... Ô Adalberto, dá uma olhada aqui, dá um zoom, um close... Ceis viram que eu fiz chapinha, né? Só que a minha chapinha já tá meio caída, meio caidinha, vou ter que fazer outra hoje... Agora a Bethânia não, a Bethânia, ó Rodrigo, se preparou, fez aquela produção, chapou os cabelos e veio pra região de fronteira. Ela que é moradora no interior de São Paulo. Ela veio aqui pra fronteira onde buscou droga, pouco mais de dezesseis quilos de maconha, a Bethânia, ela foi presa, ela foi autuada por uma equipe da guarda municipal no terminal rodoviário de Dourados. Na bagagem dela, vários tabletes de maconha. Agora você quer chamar a Bethânia, mina muito louca, de mula do tráfico? Ô Rodrigão, na boa, sai saindo, tá? Por que a Bethânia não é mula, não. É patroa, rapaz. Patroa, madame do tráfico, aí. Ela disse que pagou sete mil reais, dinheirinho dela, se pá ela tá com muito, hein. Dinheirinho dela, pegou, foi lá, na região de fronteira, comprou aí sete mil reais de maconha, da ervinha do capeta, e a intenção dela era revender. Ou seja, ia triplicar esse valor, lá no interior de São Paulo, só que aí não deu pra ela, a casa caiu. Ah, Bethânia e agora? Como que ela vai fazer a chapinha, vai chapar o cabelo, vai dar um grau na produção na casa da dinda agora? Tem jeito? Acho que não, não é não? Por hoje é isso, Lia Nogueira, de Dourados para o Cidade Alerta. Rodrigo Nascimento: Eita! Ô Sassá, coloca aí na quadrada, então, Bethânia do crime, essa é pra você. Não, essa a do bem, coloca a Bethânia do crime, põe na quadrada. Não mexe comigo, não mexe comigo, que eu não ando só. Grande Maria Bethânia. Agora, a Bethânia do crime tá na cadeia.


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APÊNDICE C - Transcrição da Reportagem 3 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

"NOINHAS" DOMINAM BAIRRO AMAMBAÍ E DEIXAM MORADORES E COMERCIANTES PREOCUPADOS: ALGUNS JÁ DEIXARAM IMÓVEIS NA REGIÃO POR MEDO. 26 de abril - Uso de drogas, furto. Rodrigo Nascimento: Região central de Campo Grande, bairro Amambaí, aquele bairro, um dos principais bairros da capital, aquele bairro que fica em torno da antiga rodoviária e não é de hoje que a gente fala sobre a questão da insegurança do bairro Amambaí, mas especificamente em torno da antiga rodoviária. Imagens que chegam na quadrada do Rodrigão, olha só, os noinhas tão dominando feral lá, os noinhas tão botando medo em moradores e em comerciantes que estão abandonando imóveis, é isso mesmo. E olha, os noinhas são tão cara de pau que eles fumam baseado, fumam ervinha do capeta, em plena luz do dia. Tráfico ali, rola adoidado, pela manhã, pela tarde, pela madrugada, pra eles não têm horário, não. O que têm pra eles é afastar comerciante, é afastar gente do bem. Informação que há, pro Cidade Ms, vem comigo, põe na quadrada. Thiago Bonfim: Casa e mais casas fechadas, essas imagens foram feitas por moradores do bairro Amambaí, da região do antigo terminal rodoviário. São várias casas fechadas que acabam sendo usadas por criminosos para esconder produtos furtados ou até mesmo como ponto de esconderijo. Alguns moradores resolveram colocar grades nas portas. Já nesta casa, que possuía várias janelas, o dono do imóvel resolveu fechar tudo, para evitar aquelas visitas indesejadas. Rosana Nery (pres. Bairro Amambaí): Fica muito tempo fechado, totalmente abandonado. A gente tem o problema da dengue, os quintais todos sujos e o país também tá numa crise que não é de vender, né? Mas eu acho que, se um imóvel tem dono, o dono tem que ser responsabilizado e tomar atitude de cuidar do que é dele. Thiago Bonfim: Além das casas, que estão abandonadas, a gente observa também


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um problema muito grande em relação aos estabelecimentos comerciais. Olha só esse imóvel aqui, a parede completamente pichada, tudo sujo e os usuários de droga arrombaram a porta. É isso mesmo. Aqui acabou virando a moradia de muitos deles. O cinegrafista vai mostrar aqui dentro. Olha só, a gente vê muita sujeira, né? Pedaços de latinhas que são utilizadas ali no consumo do crack, eles fazem uma forma de cachimbo com essas latas. E a gente vê muita sujeira aqui pelo local e uma quantidade enorme de usuários de drogas que ficam por aqui. Eles dizem que já denunciaram, mas até agora, nada foi feito para resolver o problema. Rosana Nery (pres. Bairro Amambaí): A gente tá fazendo um levantamento, né? Pra ver quantos imóveis, que a gente quer passar pra prefeitura, pra que sejam tomadas providências, o dono seja acionado e tome uma providência de lacrar o imóvel dele, de alugar, de vender, que ele tome uma atitude de cuidar do que é dele. Thiago Bonfim: A administração da antiga rodoviária sofre problemas financeiros por conta da inadimplência de alguns proprietários. Sem dinheiro, fica difícil investir no prédio, que cada vez mais recebe usuários de drogas. Rosana Nery (pres. Bairro Amambaí): Eles moram ali, eles fazem pequenos furtos, eles guardam ali, brigam entre eles, causam até mortes, como já aconteceu esse ano. Mas geralmente é entre eles mesmo. Essa insegurança é causada entre eles.


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APÊNDICE D - Transcrição da Reportagem 4 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

IRMÃOS DO TRÁFICO SÃO PRESOS PELA DENAR: DROGA ESTAVA ESCONDIDA NO MICRO-ONDAS DA CASA DOS SUSPEITOS. 26 de abril - Tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: A polícia prendeu dois irmãos, os irmãos do tráfico, em um ponto de drogas aqui da capital. Imagens que chegam na quadrada aqui do Rodrigão, olha só. Na camiseta de um dos irmãos, os irmãos do tráfico, ele homenageou o amigo morto. E o amigo morto, adivinha, também não era flor que se cheirava, não. O amigo morto olha, também tava ligado diretamente ao mundo do crime, que homenagem, hein. Que homenagem é essa? Informação que chega, com Natalie Malulei, põe na tela. Natalie Malulei: Guilherme, de 19 anos e Gabriel, de 21, dois irmãos envolvidos com tráfico de drogas e presos em flagrante pela delegacia especializada de repressão ao narcotráfico. Durante a apresentação da dupla na manhã dessa quarta-feira, uma homenagem ousada foi feita por um dos traficantes. Na camiseta de Guilherme, estava estampado o rosto de Gabriel Fecundes, o jovem também tinha envolvimento com o mundo do crime, foi morto esse mês em confronto com o batalhão de choque, após assaltar uma casa, no bairro Amambaí. Guilherme: Meu amigo desde criança, conheço ele, não tem nada a ver com roubo, não. Natalie Malulei: E o fato de ele estar lá, envolvido na ação? Guilherme: Não, eu não fiz porque ele tava envolvido na ação, eu fiz porque eu gostava dele, ele era meu amigo. Independente se ele tava roubando ou não, ele era meu amigo. Tem mais gente usando essa camiseta? Guilherme: Tem, todo mundo que era amigo dele tava usando. Rodrigo Yassaka (delegado): E ele alega que fizeram essas camisetas aí pra


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homenagear esse amigo, alegando que seria uma pessoa de boa índole e que não teria participação na vida criminosa. Contudo, eles caem em contradição alegando que esse indivíduo realmente participou desse roubo, mas que foi induzido a erro por um outro colega. Natalie Malulei: A polícia chegou até Guilherme e Gabriel após receber uma denúncia. Equipes monitoravam os dois, até que nessa terça-feira houve a prisão. Os dois irmãos foram flagrados na casa da mãe deles, uma residência na rua Isabel Borges Figueiredo, no bairro Jardim Parati, em Campo Grande. Por volta das quatro horas da tarde, os policiais perceberam o momento em que Guilherme vendeu uma porção de maconha para um rapaz que chegou ao local em um veículo e, ao confirmar com o usuário, perceberam que ali era mesmo um ponto de venda de drogas. Na casa foram encontrados oitocentos reais em dinheiro, uma balança de precisão e duzentos gramas de maconha. A droga estava escondida no micro-ondas. De acordo com o delegado, os dois têm passagem pela polícia, Gabriel inclusive cumpre pena por roubo no presídio semiaberto. Dos irmãos, apenas Guilherme confessou o crime. Rodrigo Yassaka (delegado): Na realidade, o Guilherme assumiu a propriedade da droga, confirmando que parte dela seria destinada a seu consumo pessoal e parte seria comercializada para alguns amigos que vão até a casa dele consumir drogas.


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APÊNDICE E - Transcrição da Reportagem 5 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

SEIS TRAFICANTES SÃO PRESOS PELA DENAR NA CAPITAL. ALGUNS DOS SUSPEITOS JÁ TINHAM PASSAGENS PELA POLÍCIA. ASSISTA: 5 de maio - Tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: E olha só, denúncia a partir de agora. Uma denúncia anônima da população acaba com quatro pontos sabe do que? Da venda de ervinha do capeta. A Denar, em um excelente trabalho, deflagrou um limpa aí, sabe aonde? No Mario Covas, no Cristo Redentor, no Universitário, No Tijuca, aqui em Campo Grande. Ao todo, seis traficas, a casa caiu pra seis traficas. E olha, eles foram presos e além de armas e munições, ervinha do capeta e burundanga, viu? E põe ervinha do capeta nessa conta. O Ailton Cezário e o Thiago Bonfim acompanharam apresentações desses fanfarrões lá na Denar, que é destaque a partir de agora, põe na quadrada. Thiago Bonfim: A polícia civil, através da Denar, a delegacia especializada de repressão ao narcotráfico, prendeu seis pessoas e apreendeu drogas, munições e uma arma, em quatro diferentes ações. No primeiro caso, três pessoas foram presas. João Paulo Sartori (delegado): Essa prisão aconteceu na região do Mario Covas, a partir de uma informação de que se estaria ocorrendo uma festa irregrada, drogas no local. As equipes diligenciarias acabaram por surpreender um indivíduo fornecendo uma porção de pasta base para outros dois elementos, sendo que um desses elementos possuía contra si um mandado de prisão em aberto. Esses indivíduos foram abordados e em seguidas as equipes ingressaram nesse imóvel onde localizaram aproximadamente duzentos gramas de pasta base e de cocaína, além de um tablete de maconha e munições de uso restrito. O segundo caso também tem ligação com tráfico de drogas e aconteceu no bairro Cristo Redentor. João Paulo Sartori (delegado): Na tentativa de localizar o indivíduo que iria ser indiciado nessa especializada, as equipes acabaram localizando o imóvel desse indivíduo, onde as informações davam conta de que funcionava um ponto de venda de droga, e por


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ocasião da entrada da equipe aí os policiais acabaram por localizar petrechos para o preparo da droga, notadamente, balanças de precisão, além de uma porção de entorpecente e valores em moeda corrente. E como já havia as informações anteriores dando conta que esse indivíduo estaria até atuando na receptação de objetos furtados, ele foi encaminhado a essa Denar, onde foi autuado em flagrante delito pelo crime de tráfico de drogas. Thiago Bonfim: E a ação da Denar não parou por aí, no bairro Universitário um jovem de 18 anos foi preso com mais drogas. João Paulo Sartori (delegado): As equipes foram até a residêncoa do João Pedro, onde acabaram surpreendendo ali, em poder de 11 papelotes de cocaína, além de 3 porções de maconha e munições calibre 38. Thiago Bonfim: Além das prisões por tráfico de entorpecentes, a polícia também acabou prendendo um homem que foi encontrado com uma arma, um revolver 38 que estava em poder de Rosivaldo dos Santos, de 36 anos. A apreensão aconteceu no bairro Tijuca. Neste caso, ele acabou pagando a fiança, relativa à dois salários mínimos e foi liberado. Porém, os demais presos durante essa ação do Denar não tiveram a mesma sorte. Os suspeitos dos crimes de tráfico de drogas negaram qualquer tipo de envolvimento e afirmaram que seriam apenas usuários. Suspeito1: Só usuário só, não tem mais nada pra falar não. Thiago Bonfim: Cê nunca vendeu droga lá? A droga que a polícia achou era de quem? Suspeito1: Era minha pro meu uso. Thiago Bonfim: E você, vendia droga? Suspeito2: Não. Thiago Bonfim: Mas usa? Suspeito2: Uso. Thiago Bonfim: Ô Hélio, cê já tinha sido preso alguma vez por tráfico de drogas? Hélio: Nada a declarar, senhor. Suspeito4: Já, mas não por droga. Thiago Bonfim: Por que você tinha sido preso? Suspeito4: Por tentativa de 157. Thiago Bonfim: Agora por drogas, você tava na festa, como é que foi? Suspeito4: Tava em lugar nenhum não, só levei o outro aqui pra pagar uma conta, ele falou que ia pagar, aí chegou lá e era negócio de droga. Thiago Bonfim: Você não sabia de nada?


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Suspeito 4: Nada. Thiago Bonfim: De acordo com o delegado, as denúncias por parte da população têm papel fundamental durante as ações de combate ao tráfico. João Paulo Sartori (delegado): As informações dos populares, que orienta os nossos trabalhos, e graças a isso, a ação dessas pessoas aí, acabamos por retirar várias pessoas de circulação. Rodrigo Nascimento: Olha, eu sempre aprendi uma coisa: Quem não deve, não teme. Eu não entendo, se você é inocente, aí vai pro paredão aqui da Denar, baixa à cabeça, né? Aí fica com vergonha, rapaz, se você não fez nada, ergue à cabeça, agora, a historinha que vocês contam pra ludibriar a polícia, ô seus trafica, ô seus trafica, ceis são traficante, ceis não são atores não. Que que é isso? Que absurdo. “Eu não tenho nada à declarar não, senhor”. Engraçado, na hora de comercializar a ervinha do capeta negocia que é uma beleza, né? Fala que é uma beleza. Tem até um flamenguista ali ó, coitado de quem torce pro flamengo, hein.


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APÊNDICE F - Transcrição da Reportagem 6 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

LADRÃO É AMARRADO EM BARRA DE FERRO APÓS TENTATIVA DE ASSALTO A BAR NA CAPITAL. COMERCIANTE PEDIU AJUDA A CLIENTES E POPULARES PARA CONTER O BANDIDO, APÓS A ARMA TER FALHADO DURANTE A TENTATIVA DE ASSALTO. 5 de maio - Roubo. Rodrigo Nascimento: Continuo com as informações policiais a partir de agora. Uma dupla de moto tentou assaltar uma lanchonete no Jardim Panorama, mas o bandido, que desceu armado da moto, se deu bastante mal. Imagens que chegam na quadrada do Rodrigão, olha só essas imagens. O bandido, pif paf, acabou sendo amarrado nessa barra de ferro. E você acha que eu acho coitadinho? Eu acho é pouco, eu acho é pouco. No descuido do ladrão, o dono do bar reagiu, ele pediu ajuda para os clientes do bar que estão ali e também para a vizinhança. Os vizinhos conseguiram desarmar o bandido e o amarraram numa barra de ferro, na calçada, até a polícia chegar. E olha, o preso, cadê a foto do preso? O bandido pif paf, esse fanfarrão já é bastante conhecido da polícia. Será que ele é flor que se cheire? Será que ele é objeto ali, uma pessoa pra gente cuidar em casa? Ah, pelo amor de Deus, né? Destaque de Natalie Malulei, Alex Machado, põe na quadrada. Natalie Malulei: Ao tentar assaltar esse bar, no bairro Jardim Panorama, o bandido acabou amarrado nesta barra de ferro e foi preso pela polícia. Átila Benedito de Paula, de 30 anos, já tem uma extensa ficha criminal com passagens por furto, roubo e tráfico de drogas. Para assaltar o bar, nesta quinta-feira, ele usou este revólver calibre 32. Foi por volta das seis e meia da tarde que o bandido chegou aqui no local, ele estava na garupa de uma moto que era conduzida pelo comparsa, que daria suporte na hora da fuga, no momento em que entrou no bar e rendeu à vítima, ele fez várias ameaças. Foi quando o comerciante reagiu e entrou em luta corporal com o bandido, que chegou a atirar, mas a arma falhou. Como tinham cerca de três clientes no bar, todos eles ajudaram e conseguiram imobilizar o assaltante. O outro, que


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estava na moto, fugiu. O dono do bar é este homem de 54 anos, ele diz que essa é a segunda vez que tentam assaltar o local e que o bandido estava muito nervoso. Reagiu pra se proteger. Dono de bar: Eu passei um dinheiro pra ele, ele não queria, ele, ele “eu quero o da gaveta, eu quero o da gaveta” e me apontando a arma pro meu peito. Eu fui me desvencilhando dele, até acalmar ele um pouquinho e ele, muito nervoso, quando ele levou a mão na gaveta pra pegar o dinheiro maior um pouco, ele abaixou a guarda e foi a hora que eu segurei a mão dele, levantei e entrei em luta corporal. E, graças à Deus, eu consegui vencer. Natalie Malulei: Além dos clientes do bar, amigos próximos, como este outro comerciante, também foram ajudar a imobilizar o assaltante. Ele explica que momentos antes do crime, os bandidos teriam passado de moto em frente à lanchonete dele. E por pouco, também não foi vítima. Dono de bar2: Eles passaram, né? Passaram devagarinho, os dois de moto, olhando pro meu ambiente, mas aí como não tinha ninguém, né? Eu recém tava abrindo o ambiente, eles chegaram aqui na lanchonete do meu amigo, no bar aqui, só que não levaram êxito outra vez, né? É a segunda vez que tentaram assaltar ele. Natalie Malulei: Após o crime, os moradores afirmam que a violência no bairro está grande, comerciantes têm trabalhado inseguros e o único caminho encontrado por aqui é um cuidar do outro. Dono de bar2: A gente tá aí, tentando socorrer um ao outro, olhar o que tá acontecendo no bairro, sabe? Pessoa estranha que passa olhando, a gente fica sempre de olho, né? A gente não cuida só da gente, mas também cuida da família dos outros também, né? Dono de bar1: A violência tá geral, né? A violência é geral e aqui no bairro não também não foge da regra. Campo Grande tá assim mesmo. Medo não, mas você fica temeroso, porque a gente não é de ferro, né? A gente fica temeroso sim. Rodrigo Nascimento: Olha, a gente não deve fazer justiça com as próprias mãos. Mas, em que situação nós chegamos... A que ponto chegamos que, o cidadão de bem, que coloca sua vida em risco, pra amarrar um bandido sem vergonha num cano como esse daqui. Olha a cara do coitadinho aí, olha a cara do coitadinho. Bastante conhecido da polícia.


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APÊNDICE G - Transcrição da Reportagem 7 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

LADRÃO TEM MANDIOCA INTRODUZIDA NO CORPO APÓS FURTO EM PLANTAÇÃO NA CAPITAL. VEJA: 10 de maio - Furto. Rodrigo Nascimento: Esse assunto, quando eu vi, hoje pela manhã, eu fiquei um pouco preocupado. A gente sabe que a gente não pode fazer justiça com as próprias mãos. E o que que aconteceu? Ladrões não estão deixando nem escapar plantações de mandioca. E olha só nessa história, presta atenção nessa história. O homem foi flagrado furtando mandioca. E o que que aconteceu? Esse homem acabou sendo flagrado. O pessoal tava tão revoltado, tão revoltado que pegou e falou o seguinte “Você tá roubando mandioca, você tá furtando mandioca? Quer mandioca?” E o que aconteceu? Pegaram a mandioca e introduziram no corpo desse ladrão. Que absurdo, hein. Natalie Malulei tem as informações, vem comigo, põe na quadrada. Natalie Malulei: A plantação de mandioca de uma chácara, no bairro Monte Alegre, em Campo Grande, foi alvo de um ladrão na noite desta terça-feira. Um homem de 33 anos foi flagrado por populares no momento em que arrancava as ramas e foi agredido pelo grupo. O caso aconteceu por volta das 10 horas da noite, de acordo com o boletim de ocorrência, o ladrão já tinha pego aproximadamente 5 quilos de mandioca e colocado em um saco pra levar com ele, no momento em que os populares chegaram. Pra polícia, ele disse que apanhou muito do grupo e que, inclusive, os agressores chegaram a introduzir uma das mandiocas roubadas nele. O homem foi socorrido, levado pra unidade de pronto atendimento do bairro Jardim Leblon. Ainda de acordo com o boletim de ocorrência, esta área aqui é cuidada por um senhor de aproximadamente 80 anos, e, segundo a vítima, ele não teve nenhuma participação nas agressões. Porém, a gente tentou contato com os responsáveis pela chácara, na manhã desta quarta-feira, mas o local está vazio, nem o senhor de 80 anos estava aqui pra se pronunciar. O caso foi registrado como lesão corporal dolosa e está sendo


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investigado pela polĂ­cia.


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APÊNDICE H - Transcrição da Reportagem 8 Programa Cidade Alerta – policial informativo TV MS – Rede Record Apresentação: Rodrigo Nascimento De segunda a sexta a partir da 17h50 Recorte - Abril e maio de 2017

MINEIRA DO TRÁFICO: JOVEM É PRESA NA RODOVIÁRIA DE DOURADOS COM 30 KG DE MACONHA. ASSISTA: 10 de maio - Tráfico de drogas. Rodrigo Nascimento: Em Dourados, olha só, imagens que chegam na quadrada do Rodrigão. Coloca aqui pra mim a dupla dinâmica. É Sandy e Junior? Não é Sandy e Junior não, viu? Esses que vocês tão vendo aí é o Júlio Cesar Nunes, de 18 anos. Olha a carinha de novinho dele, é um menino de papai. Ele tá com a capivara suja agora, por causa de 75 reais. Sabe que que o Júlio Cesar fazia? Ele traficava, ele levava algumas paradinhas lá em Dourados. Já do lado dele aqui, ó, essa moça bonita... A moça aqui tá brava, né? A moça aqui tá brava. Ela é uma mineirinha, a mineirinha do tráfico. O nome dela, Julye Manuelle, 20 anos. A moça aí, a moça brava, tava com 30 quilos da ervinha do capeta, dentro de seis malas, num busão, lá na rodiviária de Dourados. Vem aqui, volta aqui pra mim. 18 e 20 anos, não pensam em estudar, não pensam em trabalhar, pensam na safadeza, numa maneira de ganhar dinheiro fácil. A casa caiu, estão em cana, estão presos e põe na quadrada. Lia Nogueira: Ô Rodrigão, a molecada tá de patifaria, hein. É, a molecada tá aprontando. Pegar no cabo do guatambu, caça um serviço de forma honesta, eles querem? Estudar, fazer uma faculdade? Não. Querem praticar a patifaria, aí cai aqui, né? A polícia militar prendeu dois casos jovens aqui em Dourados por tráficos de drogas. O primeiro caso é do Júlio Cesar Lemos Nunes, de 18 anos, esse comédia aí, ele que foi preso na região do Parque Rego D’água, aqui em Dourados, com várias paradinhas ali, papelotes de pasta base e de cocaína. Em depoimento, ele confessou que comprou essa droga e iria revender. Na verdade, já tinha ganhado aí 77 reais, uma ...inaudível aí, dinheiro que a PM apreendeu com ele. Aí não deu, a casa caiu, molhou o pé do frango. E molhou o pé do frango também dessa mina muito louca, querendo pagar de que é gatinha, luzes no cabelo, roupinha curta, é... Ela, Julye Manuelle Alves da Mata, de 20 anos. Não é Julie, é Julye, é... Ela que é moradora no


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interior de Minas Gerais. Ela foi presa num ônibus aqui em Dourados. Esse ônibus saiu de Ponta Porã com destino à Campo Grande. A Polícia Militar fez uma batida e acabou descobrindo aí pelo menos seis malas que pertenciam a Julye. Nessas malas, vários tabletes de maconha, da ervinha do capeta. A droga toda totalizou 30 quilos. Em depoimento, a mina muito louca, querendo pagar de ... inaudível confessou que ela iria receber 3500 reais pra levar essa carga até Campo Grande. Aí num deu pra ela, né? O melhor teria sido se ela fosse fazer a faxola das madames, de forma honesta, né? Aprontou, cai onde? Aqui na quadrada. Por hoje é isso. De Dourados, Lia Nogueira.


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