Construção da Identidade Jornalística

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL FACULDADE DE ARTES, LETRAS E COMUNICAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

LEOPOLDO PEDRO NETO

CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE JORNALÍSTICA PELO DOCUMENTÁRIO: UMA ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES DO JORNALISTA EM O MERCADO DE NOTÍCIAS

Campo Grande (MS) Dezembro/2017


CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE JORNALÍSTICA PELO DOCUMENTÁRIO: UMA ANÁLISE DAS REPRESENTAÇÕES DO JORNALISTA EM O MERCADO DE NOTÍCIAS

LEOPOLDO PEDRO NETO

Monografia apresentada como requisito parcial para aprovação na disciplina Projetos Experimentais do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, sob orientação do Prof. Dr. Marcos Paulo da Silva.

COMISSÃO EXAMINADORA: Prof. Drª. Jacira Helena Do Valle Pereira Assis

Prof. Drª. Márcia Gomes Marques

Prof. Dr. Marcos Paulo da Silva (orientador)

UFMS Campo Grande (MS) Dezembro/2017


AGRADECIMENTOS

O fim de um ciclo sempre é um momento de reflexões, nostalgias, esperanças, um pouquinho de ansiedade e planos para o futuro. Somos seres que estão em processo. A partir dos tensionamentos que a vida nos impõe, vamos nos modificando e aguçando nosso olhar e experiência para a maneira como enxergamos o mundo. Terminar este estudo foi um trabalho árduo, porém compensatório. Ler Bourdieu ainda na graduação foi uma experiência densa e, ao mesmo tempo, prazerosa. Quanto a isso, gostaria de agradecer imensamente ao meu querido orientador Marcos Paulo da Silva que cumpriu seu papel de forma muito prestativa e atenciosa. Contudo, não sei se eu conseguiria chegar onde cheguei, com (alguma) maturidade e afetuosidade se não fosse pelas minhas amadas amigas e amigo Leticia Bueno, Lauro Burke, Mylena Rocha, Nayla Brisoti, e Thayná Oliveira. Com vocês eu pude desfrutar a experiência universitária, compartilhar dilemas existenciais, descobrir um novo mundo e sair dessa jornada um ser humano um pouquinho melhor. Obrigado pela compreensão, paciência e pelo amor que vocês me ofereceram nestes quatro anos em que estamos juntos. O tempo pode passar, mas vocês sempre vão ter um lugar guardado nas minhas lembranças mais doces. A minha querida amiga que apelido carinhosamente de baiana, Júlia Verena, um agradecimento especial pelos cafés, papos intelectuais sobre Escola de Franfkurt e desabafos pessoais diante dos imprevistos da vida. Os amigos de fora da faculdade, Júlia, Rafael, Sarah e Fernando, sempre me apoiando, querendo saber mais sobre os estudos, ouvindo meus desabafos e alegrias. Tenho muito amor guardado dentro do peito por vocês. E por último, porém não menos importante, minha querida família. O meu pai e a minha avó Vani, com quem morei e me deram todo o suporte, segurança e amor para com que eu conseguisse desfrutar a experiência universitária da melhor maneira. Minha outra avó, Cida, que sempre me apoiou e sempre quis ouvir mais sobre os meu aprendizados no curso. E, para encerrar com chave de ouro, minha irmã Nathalye e minha mãe Márcia. Eu não sei o que seria de mim sem vocês duas. Nós seremos para sempre os três mosqueteiros. Amo todos vocês, família e amigos (as). Sigamos.


“Todos estamos deitados na sarjeta, só que alguns estão olhando para as estrelas”. (Oscar Wilde)


ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1. Jorge Furtado reunido junto ao elenco da peça.....................................................41 Figura 2. Layout da página do documentário........................................................................42 Figura 3. O documentário de Furtado exibe algumas características expositivas.................49 Figura 4. Montagem comprobatória de Furtado sobre o caso................................................60


ÍNDICE DE QUADROS E TABELAS Tabela 1. Algumas características específicas dos modos do documentário........................44


RESUMO

PEDRO NETO, Leopoldo. Construção da identidade jornalística pelo documentário brasileiro: uma análise da representação dos jornalistas em O Mercado de Notícias. Monografia (Graduação em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo). Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Campo Grande – MS, outubro de 2017.

Esta monografia tem por objetivo desenvolver um estudo sobre as representações da identidade jornalística no documentário brasileiro O Mercado de Notícias (Jorge Furtado/2014/94 min) a partir dos conceitos de habitus e de campo social elaborados pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. No desenvolvimento da análise, as falas dos atores sociais participantes da produção foram transcritas e elaborou-se fichas técnicas com as principais cenas que compõem o corpus da pesquisa. Parte-se do princípio de que as noções bourdieusianas de campo social e de habitus fornecem elementos para se compreender os valores simbólicos compartilhados entre os jornalistas e suas manifestações de identidade no documentário em questão.

Palavras-chave: Jornalismo; Identidade jornalística; Bourdieu; Campo jornalístico; Habitus


ABSTRACT PEDRO NETO, Leopoldo. The construction of the journalistic identity by documentary: an analysis of the representations of journalists in The Staple of News. Monograph (Graduation in Communication – Journalism). Federal University of Mato Grosso do Sul (UFMS). Campo Grande – MS, october 2017.

This paper aims to develop a study on the representations of journalistic identity in the brazilian documentary The Staple of News (Jorge Furtado/ 2014/ 94min) from the concepts of habitus and social field elaborated by the french sociologist Pierre Bourdieu. In the development of the analysis, the speeches of the social actors taking part in the production have been transcribed and technical files have been elaborated with the main scenes which compose the corpus of the research. It is assumed that the bourdieusian notions of social field and habitus provide elements to understand the symbolic values shared between the journalists and their manifestations of identity in this documentary.

Key-words: Journalism, Journalistic Identity, Bourdieu, Journalistic Field, Habitus


SUMÁRIO INTRODUÇÃO.............................................................................................................9

1. PIERRE BOURDIEU, CAMPO SOCIAL E HABITUS.....................................14 1.1 O pensamento de Pierre Bourdieu e seus tensionamentos.................................14 1.2 Habitus e campo social: a renovação da sociologia contemporânea da cultura ....................................................................................................................................21 1.3 Habitus e campo social: a contribuição de Pierre Bourdieu para o campo do jornalismo...................................................................................................................27 2. O DOCUMENTÁRIO COMO FORMA DE REPRESENTAÇÃO DA REALIDADE: UMA MELHOR COMPREENSÃO DE O MERCADO DE NOTÍCIAS................33 2.1 Jornalismo e Cinema: um diálogo possível...........................................................34 2.2 O cinema documentário: definição e suas complexidades ....................................................................................................................................36 2.3 O Mercado de Notícias: o jornalismo discutido sob o viés do documentário e do teatro..........................................................................................................................40 2.4 O Mercado de Notícias e os modos de documentário propostos por Bill Nichols ....................................................................................................................................44 3. O MERCADO DE NOTÍCIAS: UMA INTERFACE ENTRE JORNALISMO E DOCUMENTÁRIO EM UMA PERSPECTIVA BOURDIESIANA................................51 3.1 Jornalismo, campo e habitus................................................................................52 3.1.1 O jornalismo e os tensionamentos intrínsecos no interior do campo.................53 3.1.2 O jornalismo e a relação com os fatos...............................................................58 3.1.3 O jornalismo e seu antônimo, as práticas anti-jornalísticas...............................62 3.1.4 O jornalismo e os tensionamentos extrínsecos com os outros campos............64 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................69 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................................................72 ANEXOS....................................................................................................................75


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INTRODUÇÃO Este estudo monográfico tem por objetivo discutir as representações dos jornalistas no documentário brasileiro O Mercado de Notícias1 (Jorge Furtado/2014/94 min) a partir dos conceitos de habitus e de campo social elaborados pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. A sociologia bourdiesiana é construída a partir de ideias-força que são formuladas, desenvolvidas e reformuladas nas publicações de Bourdieu a partir do desenvolvimento de seu pensamento e, consequentemente, de suas publicações acadêmicas (VALLE, 2007). O fio teórico que conduz as análises do sociólogo francês se estrutura em uma tríplice de conceitos denominada Teoria da Prática – formada pelas ideias de habitus, campo social e capital2 – quadro conceitual que, segundo o autor, permite explicar as problemáticas do mundo social. O Mercado de Notícias, dirigido e roteirizado por Jorge Furtado, traz depoimentos de 13 profissionais brasileiros sobre a profissão de jornalista, seus discursos, práticas e ancora um debate sobre o futuro da profissão. A produção tem como base a peça teatral O Mercado de Notícias (The staple of news, no original), realizada em 1626 pelo dramaturgo inglês Ben Jonson. A peça, que aborda o começo do jornalismo no século XVII, dialoga com a fala dos atores sociais convidados a discutir o fio condutor do documentário – o próprio jornalismo. O pensamento de Bourdieu serve como opção teórico-metodológica capaz de abranger a complexidade do tema e, também, de cumprir os objetivos de análise desta pesquisa: entender as representações da identidade jornalística 3 no documentário a partir das ideias bourdieusianas de campo social e de habitus. Para a realização desta pesquisa, portanto, será criada uma macro-categoria de análise com

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Por opção metodológica decidiu-se utilizar substantivos próprios em itálico ao invés do uso de aspas. Junto aos conceitos de campo social e de habitus, Pierre Bourdieu propõe uma reinterpretação do conceito marxista de capital a partir das relações sociais e culturais. Para o autor, além do capital financeiro, existem os capitais cultural e social, ideias as quais influenciam na autonomia e nos tensionamentos existentes nos diferentes campos sociais que compõem a sociedade. Porém, para efeitos desta monografia, optou-se metodologicamente pela ênfase no conceitos de habitus e de campo jornalístico, em razão do objetivo central da pesquisa de se debater as representações da identidade jornalística. 3 Não é o foco aprofundar numa discussão específica sobre o conceito de identidade como os estudos já realizadas por autores como Stuart Hall (2006) e Zygmunt Bauman (2004). Entende-se por identidade jornalística no contexto desta pesquisa os processos de negociação simbólica, de construção e de tensionamento que moldam, das mesma maneira que são moldados, o estatuto simbólico do grupo dos jornalistas. 2


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o intuito de estabelecer uma interface entre o documentário, habitus e campo social. Esta grande categoria será dividida em quatro micro-categorias: 1) os tensionamentos intrínsecos do campo jornalístico; 2) a relação do jornalismo com os fatos; 3) o jornalismo e o antijornalismo; 4) os tensionamentos extrínsecos do campo jornalístico. Tendo em vista que a plataforma do objeto de estudo é um documentário, é necessário que seja realizada uma breve retomada sobre alguns conceitos que definem o que é cinema documentário. Para isso, serão utilizadas as ideias de Bill Nichols (2016) e sua proposição dos seis modos de documentário: expositivo, poético, participativo, reflexivo e performático. É importante ressaltar que não se pretende esgotar o conceito de documentário e a sua discussão ao usar as categorias propostas pelo autor. Para explicar a relevância do pensamento de Pierre Bourdieu e a razão da escolha de seu edifício teórico como opção metodológica, é preciso esclarecer dois pontos: a importância da Teoria da Prática como contribuição para as ciências sociais e, então, o modo como a teoria bourdiesiana

é aplicada ao jornalismo e pode

colaborar para as pesquisas na área da Comunicação Social. Dentro do campo das Ciências Sociais e Humanas, as ideias de habitus e de campo social são enfaticamente utilizadas para a compreensão das estruturas da sociedade e das projeções das relações simbólicas de poder e de tensionamentos entre diferentes campos sociais – político, econômico, jornalístico, intelectual, artístico, entre outros. Nesse contexto, a obra de Bourdieu tem proporcionado uma nova interpretação sobre a articulação entre cultura e as relações sociais. Martins (2004) defende que Bourdieu gerou uma verdadeira escola de pensamento devido à sua influência no campo das ciências sociais e as ideias bourdieusianas proporcionaram o que Miceli (2003) chama de uma renovação dos estudos em cultura contemporânea. Um fator decisivo para o pensamento de Bourdieu ser tão discutido e utilizado no meio acadêmico se deve ao fato de o autor realizar críticas às teorias deterministas de compreensão da realidade, como a abordagem marxista ortodoxa, que segundo o próprio autor “denuncia sem esclarecer nada” (BOURDIEU, 1997a, p. 56). Para o sociólogo, a noção de habitus serve como “recusa de a toda uma série de alternativas nas quais a ciência social se encerrou, a da consciência (ou do sujeito) e do inconsciente, a do finalismo e do mecanicismo” (BOURDIEU, 2009 p. 60). Na vertente dos meios de comunicação de massa, o próprio Pierre Bourdieu realizou uma análise sobre o funcionamento da mídia em seu ensaio Sobre


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a Televisão (1997). No livro, o sociólogo discute o poder simbólico da televisão e como este influencia o campo jornalístico, além de contribuir com apontamentos sobre as principais características deste campo a partir de sua atração ou repulsa com outros campos sociais – como o literário, o econômico e o jornalístico. Diversos autores estudam

ou

utilizam-se

dos

conceitos de

Pierre

Bourdieu

para

estudar

especificamente a área jornalística. No Brasil, Clóvis de Barros Filho e Luís Sá Martino (2003) trabalham com o conceito de habitus aplicado ao contexto da Comunicação Social e do Jornalismo. Em âmbito internacional, o pesquisador espanhol radicado na França, Ignacio Ramonet (2004), denuncia uma crise na atividade jornalística devido a “uma galopante precarização da profissão” (RAMONET, 2004, p. 51) e utiliza o pensamento de Bourdieu para ancorar um debate sobre como os jornalistas podem colaborar com a crise enfrentada na profissão. Ramonet se apropria do conceito de poder simbólico, o qual é exercido pelos jornalistas que trabalham com a manipulação de palavras no processo construção e difusão de notícias. “Portanto, é controlando o uso das palavras que eles podem limitar os efeitos da violência simbólica que podem exercer nolens volens4 ... Os jornalistas, e aí está sua responsabilidade, participam na circulação dos inconscientes” (BOURDIEU apud RAMONET, 2004, p. 58-59). Por sua vez, o pesquisador português Nelson Traquina (2004) utiliza a ideia bourdieusiana de campo jornalístico para realizar uma discussão sobre o comportamento dos jornalistas e nos processos de construção e de seleção das notícias. Do ponto de vista metodológico, a construção deste estudo sustenta-se em dois pontos principais: a pesquisa bibliográfica e a análise do documentário a partir dos conceitos estudados. A primeira etapa consiste em um estudo referente aos conceitos bourdieusianos, mas, além disso, faz-se necessária uma pesquisa com o objetivo de compreender mais elementos sobre a trajetória acadêmica do autor, a história de seu pensamento e quais foram suas influências e as maiores críticas à sua teoria. Para tal, realizou-se uma pesquisa bibliográfica sobre a Teoria Geral dos Campos assim como de autores que estudam a obra de Pierre Bourdieu para uma melhor compreensão das ideias de habitus e de campo social. Também, em um segundo momento, faz-se necessário um estudo para um entendimento mais amplo sobre os conceitos de cinema documental a partir das ideias de Bill Nichols (2016) com o intuito de uma compreensão mais ampla sobre a estrutura

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Expressão latina que significa querendo ou não querendo


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do documentário que é objeto de análise. Após entender a estrutura do documentário, mostra-se pertinente realizar uma pesquisa sobre os dados técnicos do filme com o objetivo de buscar informações do processo de produção que irão servir como auxílio e complementar a pesquisa para entender quem são os diretores e quais foram os objetivos de enunciação de ambos ao realizar os filmes. O corpo deste trabalho será organizado em três capítulos. O primeiro consiste em uma breve retomada sobre a trajetória e os momentos de inflexão da carreira do sociólogo francês Pierre Bourdieu. Em sua estrutura, pretende-se explorar a carreira acadêmica de Bourdieu e os elementos de sua vida pessoal que se mostraram estruturantes para o desenvolvimento de sua teoria, como também discutir as principais ideias presentes nos conceitos de campo social e de habitus e as críticas e acusações que a teoria bourdieusiana recebe. Para a realização de tal tarefa, foi realizada uma pesquisa bibliográfica com autores que estudam e comentam a obra de Bourdieu, assim como alguns títulos da bibliografia de Bourdieu que serviram para entender o fio condutor de sua teoria. O documentário A Sociologia É Um Esporte de Combate (Pierre Carles/2001/139 min) também serviu como fonte documental para uma melhor compreensão da vida de Bourdieu e de seus posicionamentos sobre o mundo social e sobre o exercício da profissão de sociólogo. Posteriormente, ainda no primeiro capítulo, realiza-se uma discussão sobre os conceitos de habitus e de campo social e sua utilização na área do jornalismo. Como explicitado anteriormente, a sociologia bourdieusiana tem sido amplamente utilizada nos estudos em teorias do jornalismo para explicar como se estabelece uma identidade jornalística e os valores simbólicos que são compartilhados entre os jornalistas no modo de agir e pensar, assim como nos processos de seleção, de construção e de difusão das notícias. É importante que se justifique que no desenvolvimento teórico deste estudo tenha se prevalecido os conceitos de campo social e de habitus, embora a Teoria da Prática, como afirmado anteriormente, como passou a ser conhecida a proposta teórica do autor, se estruture também a partir do conceito de capital. O segundo capítulo discute de forma breve os diálogos existentes entre cinema e jornalismo. Em seguida, procura discutir sobre pontos importantes da sinopse do documentário e o seu processo de produção a partir da visão do diretor, Jorge Furtado. Então, fornece uma breve tessitura conceitual da relação entre os campos do jornalismo e do cinema O capítulo também realiza uma discussão


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conceitual sobre o cinema documental a partir da visão de Nichols (2016) e das seis categorias do cinema documental proposta pelo autor. A última parte se constitui propriamente a análise dos documentários e a aplicação dos conceitos estudados a partir do enquadramento de ambos os diretores e da fala dos atores sociais que participaram das produções. Dessa maneira, os três capítulos se inter-relacionarão e constituirão um corpo teórico eficiente que consiga explorar as problemáticas da teoria de Pierre Bourdieu e do objeto de estudo.


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1.

PIERRE BOURDIEU, CAMPO SOCIAL E HABITUS Este capítulo tem por objetivo realizar uma revisão teórica sobre os

conceitos de habitus e de campo social construídos pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. Parte-se do princípio de que para uma compreensão mais ampla do edifício teórico do autor é importante que se retome momentos de inflexão de suas trajetórias acadêmica e pessoal. Após a explanação sobre o seu local de fala no campo intelectual francês, busca-se estabelecer a base teórica que sustentará a análise que será desenvolvida nos próximos capítulos sobre a representação da identidade jornalística no documentário brasileiro O Mercado de Notícias (Jorge Furtado/2014/94 min) a partir dos conceitos bourdieusianos e suas aplicações no campo jornalístico.

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O pensamento de Pierre Bourdieu e seus tensionamentos

Compreender o pensamento de Pierre Bourdieu é uma tarefa árdua e complexa. Para que se consiga apreender melhor sua teoria, diversa e múltipla, fazse necessário uma breve busca por trajetória, considerada singular (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 9). É sempre importante, para entender as ideias de determinado autor, que se faça um apanhado histórico que contextualize o seu lugar de fala para uma melhor compreensão teórica. Desde o início, porém, mostra-se preciso fazer uma ressalva sobre quaisquer tentativas de escritos biográficos pertinentes à vida de Bourdieu: não se pretende aqui entrar em um paradoxo, recaindo no que o próprio autor chama de ilusão bibliográfica, ou seja, “fazer crer ao leitor que a vida constitui um todo, um conjunto coerente e orientado” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 13). Todavia, tendo em consideração que a natureza deste trabalho é de caráter monográfico, necessita-se que alguns fragmentos da vida de Bourdieu sejam resgatados. Pierre Félix Bourdieu possui uma origem bem distante do campo acadêmico de Paris, local onde se consagrou como um dos maiores nomes da teoria social do século XX. Nascido em 01 de agosto de 1930, o autor é originário de uma pequena cidade, próxima à fronteira com a Espanha, chamada Bearn, que localiza-se na região dos Pirineus Atlânticos. O próprio Bourdieu afirma que seu pai trabalhou como camponês, posteriormente, passou a ser carteiro e então funcionário público.


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Aos dezesseis anos, Bourdieu muda-se para a cidade de Pau, onde conseguiu uma bolsa de estudos no liceu local. Por pertencer a uma região distante das principais cidades francesas, o sotaque de Bourdieu era diferenciado e, ao se mudar para Pau, provocava riso entre os colegas (VALLE, 2007). O próprio sociólogo se lembra de sua experiência no Liceu de Pau em “um edifício fechado, com corredores desertos e com ecos assustadores, onde se debatia para afastar a fatalidade de suas origens” (BOURDIEU apud VALLE, 2007, p. 121). Em seguida, frequentou o Liceu Luis Le Grand, prestigiado na França e, posteriormente, aos 21 anos, Bourdieu passou a estudar na consagrada Escola Normal Superior (ENS), local então destinado à elite intelectual francesa. Ao ser aprovado na ENS, Bourdieu passou a conviver com “alguns dos herdeiros da alta burguesia parisiense” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 15). O fato de pertencer a um local considerado modesto para os padrões da época e, posteriormente, frequentar um dos pontos fulcrais da cena intelectual francesa, fez com que conseguisse observar práticas, regras e formas simbólicas que não eram percebidas pelos agentes sociais que estavam imersos naquele meio. Essa relação é problematizada por Valle (2007):

O distanciamento em relação ao mundo intelectual e o fato de ser constantemente lembrado de seu ‘estrangeirismo’ lhe permitiram ‘ver o que os outros não veem’ e o incitaram a sentir o que os outros não sentem: os código implícitos, as rotinas, os fundamentos que governam o mundo das ideias e orientam as práticas cotidianas. (VALLE, 2007, p. 121)

Segundo Barros Filho e Martino (2003), a partir do convívio com os representantes da cena intelectual de seu país, Bourdieu começou a estabelecer a crítica ao que chamaria de “dominantes e dominados do campo acadêmico” (BARROS FILHOS; MARTINO, 2003, p. 15) e que futuramente se desenvolveria na crítica ao campo intelectual da época a partir da análise de obras literárias como as de JeanPaul Sartre5 e Gustave Flaubert6. Aos 25 anos, Bourdieu licenciou-se em Filosofia e, 5

Jean-Paul Sartre (1905-1980) foi um filósofo e escritor francês conhecido com um dos principais expoentes da corrente filosófica denominada existencialismo. 6 Gustave Flaubert (1821-1880) foi um escritor francês. Suas obras literárias são objeto de estudo e discussão até os dias de hoje. Jean-Paul Sartre realizou um estudo bibliográfico sobre o escritor e sua obra em uma trilogia chamada O Idiota da Família, sendo o primeiro volume publicado em 1971. Dentre as principais obras lançadas por Flaubert, se destacam-se Madame Bovary (1856) e Educação Sentimental (1869).


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em 1955, foi nomeado professor dessa disciplina em nível médio no Liceu de Moulins. Ao precisar completar seu serviço militar, transferiu-se para a Argélia, com pretensões de se tornar professor-assistente na Universidade de Argel, quando passou a realizar suas primeiras pesquisas antropológicas sobre a sociedade do país. As conclusões desses estudos se transformaram no livro A Sociologia na Algéria. Barros Filho e Martino (2007) também apontam que em 1960, aos 26 anos, o autor retornou à França e passou a lecionar filosofia na Universidade de Lille. Após quatro anos, em 1964, com 30 anos de idade, Bourdieu ingressou na École Pratique des hautes études, que futuramente se tornaria a École des hautes études em sciencies sociales (EHESS) como orientador de trabalhos acadêmicos e, a partir de pesquisas junto aos seus orientandos, o autor lançou livros como Le héritiers (1964), Um art moyen (1965) e Amour de l’art (1966). A pesquisa de Bourdieu sobre as sociologias da cultura, arte e educação e sua crítica ao “’idealismo estético’ dos especialistas e dos amantes de arte” (BARROS FILHO; MARTINO, 2007, p. 17) fez com que muitos estudantes e pesquisadores passassem a se interessar pelo instrumental teórico do autor e com que, consequentemente, em 1968, aos 38 anos de idade, o sociólogo fundasse o seu próprio centro de pesquisa, chamado de Centre européen de l’education et de la aculture. O marco simbólico da inauguração dessa instituição foi o lançamento do livro O Ofício de Sociólogo, junto aos autores JeanClaude Chamboredon7 e Jean-Claude Passeron8. A década de 1970, de forma geral, foi muito importante para o desenvolvimento da maturidade intelectual de Bourdieu. Em 1971, os conceitos de habitus e de campo social – que futuramente se mostrarão parte do fio condutor teórico de Bourdieu – começam a ganhar especificações mais claras com o lançamento de Esboço de Uma Teoria da Prática (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 18), livro que desenvolve o método de pesquisa de Bourdieu, denominado conhecimento praxeológico e busca romper epistemologicamente os limites com os métodos de pesquisa interacionista e objetivista. O livro é multidisciplinar e flerta com as diferentes ciências sociais, como a sociologia, a filosofia e a antropologia. Em 1975, é fundada a revista que Bourdieu dirigirá até a sua morte, intitulada Actes de la recherche em sciences sociales, que se tornará “uma verdadeira revolução entre a

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Jean-Claude Chamboredon (1938-) é um sociólogo francês. Jean-Claude Passeron (1930-) é um sociólogo francês conhecido por publicar trabalhos com Chamboredon e Bourdieu. 8


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revistas acadêmicas, quer pela sua forma, tamanho, diagramação, presença de fotos, capa” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 19). Nesse contexto, Bourdieu se consagrou como pesquisador. Livros como La Distinction (1979), em que o autor discute os conceitos de capital financeiro, capital cultural e capital social – que apesar de não serem debatidos neste trabalho por opção metodológica, como já explicitado anteriormente na introdução – são importantes no desenvolvimento da trajetória de seu edifício teórico. O livro foi considerado pela Associação Internacional de Sociologia como um dos dez trabalhos de Sociologia mais importantes publicados no século XX (LOYOLA, 2002, p. 89). Um dos maiores momentos de inflexão de sua carreira, no sentido de reconhecimento teórico, foi o lançamento do livro Questões de Sociologia (1980), em que Bourdieu “parece propor uma relativa vulgarização de sua literatura, até então hermética e restrita a iniciados” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 22). Tal postura expande a sua visibilidade e faz com que o autor seja convidado para dar palestras nas principais instituições europeias de ensino, o que, consequentemente, o leva a receber “o título de doutor honoris causa, outorgado por universidades europeias, em quarenta e duas oportunidades” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 22). A década de 1990 foi um período marcante na trajetória de Bourdieu. Muito se discute sobre seu engajamento político a partir dessa época, em que o sociólogo passa a atuar de forma mais intensa na esfera pública e a discutir assuntos sociais em pauta na França. Segundo Loyola (2002), a publicação de A Miséria do Mundo (1993) foi uma importante denúncia ao sofrimento provocado pela destruição do Estado e dos mecanismos de defesa dos trabalhadores. Nesse contexto, um dos grandes engajamentos políticos de Bourdieu, em 1995, foi o seu suporte no chamado “Apelo dos Intelectuais em Apoio aos Grevistas”. Nos anos de 1998 e 2000, o autor também forneceu solidariedade aos movimentos sociais e apoio aos trabalhadores europeus. Do ponto de vista analítico, pode-se considerar que as ações de Bourdieu nessa mesma década apenas representaram uma preocupação que o sociólogo levou em toda a sua carreira: a violência simbólica existente nos mecanismos de dominação social (VALLE, 2007). Em 1997, o sociólogo lançou o clássico estudo sobre o funcionamento dos meios de comunicação de massa intitulado Sobre a Televisão, em que discute o modo como a televisão pode ser um meio de exercer violência simbólica e as suas relações com o campo do jornalismo.


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Em 23 de janeiro de 2002, Bourdieu morreu na cidade de Paris e deixou um legado único para a teoria social, além de uma sociologia orquestrada de forma crítica e uma malha conceitual imensa que serve como base conceitual e metodológica para diversos trabalhos acadêmicos que buscam uma melhor compreensão das relações estruturais de uma sociedade.

Pode-se fazer sociologia hoje, e muito se tem feito, como ou sem Bourdieu. Mas os que a fizerem a partir de seu trabalho farão sem dúvida uma sociologia crítica, uma sociologia “incômoda”, uma sociologia que contribui para o conhecimento do mundo social e, ao mesmo tempo, para sua transformação – uma sociologia que é um esporte de combate. (LOYOLA, 2002, p. 85)

A partir de uma melhor compreensão da trajetória do autor, se discutirá a partir de agora o seu pensamento e as críticas realizadas à Sociologia dos Campos. As ideias-chave do pensamento de Bourdieu se estruturam em uma tríplice de conceitos intitulada “Sociologia dos Campos”, formada pelas ideias de habitus, campo social e capital. Este quadro conceitual permite explicar as “problemáticas intrínsecas do mundo social” (SILVA, 2013, p. 75). Dessa maneira, o conjunto da obra do sociólogo, que ao longo de sua carreira aplicou sua teoria em diferentes objetos de estudo, pode ser lido e interpretado a partir de diferentes vertentes e abrange uma série de disciplinas da Ciências Sociais e Humanas, como a própria Sociologia, a Filosofia, a Educação, a Antropologia e a Comunicação. De acordo com Ione do Valle (2007), Bourdieu possui mais de 300 publicações e sua obra pode ser lida “como uma análise dos mecanismos de dominação das sociedades modernas, como uma teoria das práticas sociais ou, ainda, como uma análise da produção das ideias e dos sistemas simbólicos” (VALLE, 2007, p. 119). Segundo Silva (2013), um dos parâmetros para medir a importância do autor está relacionado a um grande número de citações que recebe em revistas científicas, trabalhos acadêmicos e livros. Para Martins (2004, p. 63), seu pensamento é considerado “uma verdadeira escola de pensamento”. Na perspectiva bourdieusiana, para se compreender o funcionamento de um determinado espaço de relações humanas, é necessário apreender como se configuram as estruturas invisíveis que dispõem os agentes sociais e suas práticas. O documentário A Sociologia É Um Esporte de Combate (Pierre Carles/2001/139


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min), que pode servir como uma introdução ao pensamento do autor, aborda o cotidiano de Bourdieu, mostra entrevistas fornecidas pelo sociólogo francês à imprensa e realiza questionamentos sobre seu pensamento, o funcionamento do mundo social e a importância da sociologia como uma ferramenta crítica para desvelar os mecanismos de dominação e violência simbólica disseminados socialmente a partir de uma ordem simbólica estabelecida. Em certo ponto do documentário, Bourdieu utiliza a metáfora do “esporte de combate”, uma vez que, nas palavras dele, a sociologia quando “feita de forma correta”, pode servir como uma poderosa arma de combate aos mecanismos de dominação social e, também, para deixar as pessoas conscientes da existência desses instrumentos de opressão. Como anteriormente mencionado, o fio condutor da teoria bourdieusiana se estrutura de uma tríplice conceitual denominada Teoria da Prática, formada pelas ideias de habitus, campo social e de capital. Segundo o sociólogo, essas ideias permitem explicar as problemáticas do mundo social. A visão que Bourdieu possui de sociedade não é baseada em um simples antagonismo de classes, como as teorias marxistas de base mais ortodoxa. O sociólogo percebe a sociedade como um espaço abstrato de relações humanas onde se estruturam diferentes campos sociais, compostos por agentes sociais que exercem maior ou menor influência dentro desses campos. Os campos sociais estão sempre estruturados em relação ao campo do poder e ao campo econômico, todavia embora sofram grandes influências destes, possuem sua própria autonomia em uma relação de tensionamentos. Dessa maneira, os agentes sociais que estão nos determinados campos interiorizam de forma inconsciente costumes, comportamentos, modos de ver o mundo, ou, como evidencia Miceli (2003), “obras, disposições e tomadas de posição”. Esse processo de interiorização das estruturas de um campo social é construído social e historicamente, dispondo os agentes em uma estrutura na qual estes possuem maior ou menor autonomia. Para alguns estudiosos do pensamento de Bourdieu, a obra do autor, quando interpretada de maneira a reduzir sua complexidade, pode ser acusada de estruturalista por simplesmente considerar que os agentes internalizam estruturas objetivas de um campo social, como um mero suporte sem formas de resistência ou reação – crítica que é rebatida pelo próprio sociólogo. Maria Andréa Loyola (2002) defende que a acusação aos conceitos do sociólogo francês como “deterministas” parte de uma análise simplista de sua obra.


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Parte da crítica dirigida a Bourdieu tem como base uma interpretação simplista e literal dos conceitos de habitus e de estratégias de reprodução que pode ser resumida da seguinte maneira: se o habitus é a interiorização da estrutura social e todas as práticas são dirigidas para a reprodução, com explicar por que e com as sociedades mudam? ... Ainda que trace uma imagem fortemente estruturada do mundo social, ele não defende a ideia de que esse mundo evolui segundo leis que as ações humanas que a construíram não possam modificar. (LOYOLA, 2002, p. 82)

Contudo, no desenvolvimento de sua obra, Bourdieu já discutiu as acusações que sofre sobre seu suposto “estruturalismo reducionista”. Em O Poder Simbólico (2009), o teórico argumenta que o conceito de habitus serve como uma “recusa a toda uma série de alternativas nas quais a ciência social se encerrou, a da consciência (ou do sujeito) e do inconsciente, a do finalismo e do mecanicismo, etc” (BOURDIEU, 2012, p. 60). Nesse mesmo livro, o autor defende que a noção de habitus serve para romper com o paradigma estruturalista e com as teorias econômicas deterministas de interpretação da realidade. A revisão teórica desta monografia pretende focar nos conceitos de habitus e de campo social e na contribuição de ambos para a compreensão do campo do jornalismo. Parte-se do princípio de que ao se entender a configuração do que o autor denominou como campo social e habitus e a aplicação desses conceitos na área da Comunicação Social, realizada pelo próprio Bordieu no livro Sobre a Televisão (1997), e também elaborada com a contribuição de Barros Filho e Martino (2003), conseguese apreender elementos compartilhados pelos jornalistas enquanto agentes participantes de um campo social e, consequentemente, obter ferramentas teóricas para análise do objeto de estudo – a representação dos jornalistas no documentário O Mercado de Notícias. É necessário afirmar, antes de quaisquer tentativas de explanar os conceitos de Pierre Bourdieu, que a sociologia desenvolvida pelo autor é complexa a ponto de ser considerada uma escola de pensamento (MARTINS, 2004), portanto sempre corre-se o risco de simplificações. É o que Barros Filho e Martino (2003) comentam antes de iniciar a discussão sobre o habitus no jornalismo.

Dar conta, numa introdução, das intermináveis facetas da obra de Bourdieu seria insano. Optar pelo que mais de perto toca o objeto de nossa tese, o aconselhável. Fazê-lo dentro das


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inúmeras limitações que um quadro teórico introdutório impõe, o possível. (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 32)

Realizar uma discussão sobre a matriz teórica de Pierre Bourdieu é uma tarefa complexa e, desse modo, esgotar a discussão sobre os seus conceitos não é o objetivo deste estudo monográfico. Portanto, o que se torna relevante para a pesquisa são os conceitos bourdieusianos pertinentes ao tema da pesquisa – habitus e campo social – e suas aplicações na área do jornalismo.

1.2 Habitus e campo social: a renovação da sociologia da cultura contemporânea Nesta parte da pesquisa, pretende-se discutir os conceitos de campo social e de habitus de forma mais ampla, com o objetivo de uma melhor compreensão sobre seus funcionamentos para, no próximo tópico, aplicá-los ao jornalismo, que será a base conceitual deste estudo para a análise da representação jornalística nos documentários em questão. Os conceitos de campo social e de habitus, amplamente utilizados na trajetória acadêmica de Bourdieu, proporcionaram para os estudos nas Ciências Sociais e Humanas uma nova interpretação da relação entre indivíduo e sociedade e, de maneira conexa, as novas possibilidades de pesquisa para a compreensão das estruturas de uma sociedade, as suas relações sociais, culturais e institucionais, assim como as relações de poder e os tensionamentos existentes entre seus diferentes grupos. Frisa-se que, em alguns momentos, por motivos didático-metodológicos, irá se discutir e explanar as ideias de habitus e de campo social de maneira separada. Todavia, mostra-se necessário explicitar em um panorama conceitual que ambos os conceitos não são segmentados, e sim, compõem de maneira integral e abrangente, um “um todo ontológico” em que “não há um sem o outro” (BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 12). Para Bourdieu (2002), o mundo social manifesta nos indivíduos de forma holística. Indivíduo e sociedade não são separados e, sim, constituem-se em uma relação de diálogo. “O todo social não se opõe ao indivíduo. Ele está presente em cada um de nós, sob a forma do habitus que se implanta e se impõe a cada um de nós através da educação, da linguagem” (BOURDIEU, 2002, p. 33). A socióloga Maria


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Andréa Loyola (2002), comentadora da obra de Bourdieu, argumenta que ao analisarse a estrutura de uma sociedade, na perspectiva da teoria bourdieusiana, percebe-se diferentes espaços relativamente autônomos, sendo que cada um desses espaços constituem um campo – econômico, cultural, científico, jornalístico. Esses campos sociais são estruturados a partir de relações objetivas que compõem a sua estrutura. Para elucidar a compreensão de campo, Loyola utiliza a metáfora do “campo magnético”. ... à maneira de um campo magnético, é dotado de uma gravidade específica, capaz de impor uma lógica a todos os agentes que nele penetram. Assim, nenhuma ação (ou produto) – seja um enunciado uma criação estética ou uma tomada de posição política – pode ser diretamente relacionada à posição social de seus autores, pois esta é sempre retraduzida em função das regras específicas do campo no interior da qual foi construída. (LOYOLA, 2002, p. 67)

Loyola também ressalta um aspecto importante da organização de um campo social: os tensionamentos existentes entre os seus agentes com o intuito de conservar ou modificar o campo. Dentro desses territórios9, agentes concorrentes disputam, para conservar ou manter, alguma espécie de capital simbólico, financeiro ou social pertinente às relações objetivas do campo. Bourdieu parte do princípio de que diferentes espaços abstratos de relações humanas, construídos socialmente, configuram-se como campo social arquitetado a de partir estruturas objetivas responsáveis por, de certa maneira, moldar o comportamento de seus agentes. Dentro de um campo, os agentes podem exercer maior ou menor influência a partir de sua disposição intrínseca e, também, de forma extrínseca, a partir de sua relação com o campo do poder. No seu clássico ensaio sobre o funcionamento dos meios de comunicação de massa, Sobre a Televisão (1997), Bourdieu realiza uma discussão sobre o campo jornalístico a partir da ideia de microcosmo. Este conceito é retomado por Miceli (2003), que debate o modo como os diferentes campos sociais – religioso, intelectual, político – possuem autonomia com base nas diferentes trocas simbólicas existentes entre os seus agentes. Cada campo possui relações de força, agentes com maior ou menor autonomia, conflitos e concentrações de poder e capital. A palavra “território” não deve ser interpretada com a ideia de delimitação geográfica, mas sim como um “espaço abstrato de relações humanas” (CARVALHO, 2017, p. 3) 9


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O campo equivale a uma estrutura de trocas sociais, dependente de disposições que fazem operar o sistema simbólico que lhe é inerente, ajustado às regras que o definem e que se impõem aos agentes com a força de um constrangimento lógico e social, ou seja, da ordem de uma experiência vivida e reconhecida pelos agentes como preenche de sentido e significação conforme os princípios daquele universo de exceção regrada. (MICELI, 2003, p. 72)

Dessa maneira, nos “campos sociais”, entendidos como “uma forma de vida, ou seja, um espaço social acoplado a um sistema simbólico” (MICELI, 2003, p. 73), os seus componentes passam a operacionalizar um conjunto simbólico de sinais, práticas e modos de ver o mundo que passam a ser internalizados inconscientemente e manifestados a partir de um habitus. Este conceito, nas palavras do próprio Bourdieu (1989, p. 61), pode ser compreendido como um “conhecimento adquirido”. O pesquisador Sergio Miceli (2003) propõe a ideia de campo como um espaço socialmente construído que possui posições estruturadas dos agentes sociais:

O campo constituía, então, um ponto de vista do qual se podia captar posições produtoras de visões, obras e tomadas de posição, a que correspondiam classes de agentes providos de propriedades distintivas, portadores de um habitus, também socialmente construído. (MICELI, 2003, p. 65)

De acordo com Miceli (2003), o conceito de campo social começou a ser elaborado na primeira fase da carreira de Bourdieu, entre os anos 1950 e o começo da década 1970. No livro Ofício de Sociólogo (1973) ocorreram as primeiras tentativas de definição dos conceitos de habitus e de campo social. O sociólogo tinha por objetivo realizar reflexões sobre a configuração do campo intelectual vigente. Nessa época, o desenvolvimento teórico do autor possuía como influência o pensamento de intelectuais como Gustave Flaubert, Jean Paul-Sartre e Erwin Panofsky. Bourdieu criticou a representação da história literária e da crítica de arte em relação à representação dos intelectuais e a maneira como seu trabalho era visto, como uma espécie de unidade, em que as biografias serviam como uma espécie de resgate à vida e a ideologia do gênio criador. O sociólogo alertara ao fato de pensar nas condições simbólicas que modelam o comportamento de todos os intelectuais em um determinado espaço abstrato de relações. Bourdieu, consequentemente, afirmou que para entender como se engendrava o comportamento dos intelectuais e artistas, era


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preciso entender além de sua individualidade, haja vista que, apesar de suas idiossincrasias, todos esses indivíduos pertenciam à mesma cena intelectual e compartilhavam um determinado constructo de sinais. Com esse pensamento, o sociólogo “explorava os fatores incidentes sobre as práticas de todo o escritor, que derivavam da operação do sistema mais inclusivo de relações e posições” (MICELI, 2003, p. 63). Segundo Bourdieu, não é possível entender ou estudar o comportamento dos indivíduos de um determinado campo social a partir de um estudo singular e individual. Em vez de focar nas mediações modeladoras relacionadas ao comportamento, o sociólogo propõe a análise das condições estruturais que são responsáveis por modelar valores simbólicos que se tornam compartilhados entre os membros de certo campo social. Portanto, as características que fazem parte de um agente social são incorporadas inconscientemente por meio de uma estrutura invisível, um campo social, que vai influenciar suas “posições produtoras de visão, obras e tomadas de decisão” (MICELI, 2003, p. 63). Em O Poder Simbólico (2009), Bourdieu realiza um estudo para estabelecer a origem dos conceitos de campo social e habitus. O autor reflete sobre a importância da teoria cientifica como um “programa de percepção e de acção só revelado no trabalho empírico que se realiza” (BOURDIEU, 2009, p. 59) e enfatiza a importância de aplicar os conceitos e teorias já construídos em novos objetos de pesquisa para evitar o que ele chama de “isolacionismo provinciano”. A partir dessa genealogia conceitual, busca o objetivo de “realizar a confluência da diversidade aberta pela pesquisa em acção com a coerência reforçada por um olhar retrospectivo” (BOURDIEU, 2009, p. 59). Nas primeiras tentativas de definir o conceito, o sociólogo elabora uma análise da configuração do trabalho intelectual e artístico desenvolvido até aquele momento, que precisava ser pensado de uma maneira mais ampla, para conseguir compreender as relações e os tensionamentos entre os agentes pertencentes e que fossem analisados de forma a considerar “as relações objectivas entre as posições ocupadas por esses agentes, que determinam a forma de tais intenções” (BOURDIEU, 2009, p. 66). O conceito passou a ser aplicado em diferentes domínios, como a alta costura, a literatura, a filosofia e a política, e a partir das pesquisas realizadas, o autor buscou compreender as idiossincrasias e homologias estruturais existentes nos diferentes campos.


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Bourdieu (2013) discute a orientação de sua pesquisa, os resultados e os conceitos sistematizados a partir de seus estudos sobre o sistema de ensino francês relacionados à sociologia da prática e das formas simbólicas. Ao discutir campo social, o sociólogo propõe que a ideia de campo necessita ser compreendida a partir de uma análise de seus condicionante estruturais, como as leis de funcionamento e os conflitos entre diferentes agentes. Em sua análise dos campos sociais, há uma relação dialética entre a autonomia do campo, suas leis internas, as tomadas de posição de seus agentes e a relação de determinado campo com o campo do poder. Para o autor, analisar, por exemplo, uma obra de arte a partir de seus determinantes sociais é demasiado simplista, tendo em vista que para entender a sua história, precisa-se compreender a disposição da obra no campo artístico. O exame de Bourdieu sobre o campo intelectual do século XX já demonstra a utilidade de se compreender as tomadas de posição estéticas e políticas dos intelectuais a partir de seus posicionamentos no campo do poder e, secundariamente, a posição “dominante, dominada ou neutra que ocupam no campo artístico” (BOURDIEU, 1980, p. 36). Existe uma relação de diálogo entre as divisões objetivas do mundo social e os princípios de visão e divisão de seus agentes, estes que a partir de suas instâncias de socialização – relações sociais e culturais, relações com as instituições sociais e, também, sua própria disposição no espaço estruturado – fazem com que os indivíduos interiorizem essas realidades externas, o que pode-se chamar de habitus. “O habitus constitui um sistema de esquemas de percepção, de apreciação e de ação, quer dizer, um conjunto de conhecimentos práticos adquiridos ao longo do tempo que nos permitem perceber e agir e evoluir com naturalidade num universo social dado” (LOYOLA, 2002, p. 68). Ao definir habitus, o sociólogo buscava romper uma série de teorias deterministas sobre a explicação do mundo social, que fornecem explicações simplistas e deixam de abordar a complexidade dos fenômenos sociais, como a consciência, o inconsciente, o finalismo e o mecanicismo. Evidentemente, a preocupação era fornecer uma alternativa ao pensamento estruturalista, que reduzia os agentes sociais ao papel de suporte de uma estrutura maior. Habitus, dessa maneira, se estabelece como um conceito no qual os indivíduos podem ser considerados agentes sociais em ação, com autonomia relativa, que incorporam práticas construídas histórica e socialmente e, então, passam a ter um conhecimento


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adquirido de forma inconsciente. O conceito se mostrou útil para a aplicação em várias pesquisas dentro das Ciências Sociais e Humanas por considerar a relação entre um indivíduo e uma estrutura social de maneira dialética, sem simplificar a ação de ambos em processos sociais. Tal relação pode ser nomeada de “estruturalismo construtivista” (VALLE, 2007, p. 125):

Contra a maioria dos sociólogos de seu tempo, Pierre Bourdieu propõe o que chama de estruturalismo construtivista. Por estruturalismo, quer dizer que existe no mundo social e não somente nos sistemas simbólicos, linguagens, mitos, estruturas objetivas, independentes da consciência ou da vontade dos agentes, capazes de orientar ou de impor suas práticas ou suas representações. Por construtivismo, entende que há uma gênese social tanto nos esquemas de percepção, de pensamento e de acção, quanto nas estruturas sociais. (VALLE, 2007, p. 125)

A interpretação de Bourdieu sobre o mundo social demonstra-se extremamente interessante e longe de ser considerada reducionista ou determinista. Com base nas reflexões mais amplas dos conceitos de habitus e de campo social estabelecidas pelo sociólogo e por seus comentadores, pretende-se no próximo tópico realizar uma discussão sobre a aplicação do aparato teórico bourdieusiano no campo jornalístico.

1.3 Habitus e campo social: a contribuição de Pierre Bourdieu para o campo do jornalismo Como afirmado anteriormente, Pierre Bourdieu, em sua trajetória, demonstra uma preocupação com as manifestações de violência simbólica que perpetuam relações de desigualdade em diferentes campos sociais. Nesse contexto, o sociólogo deu atenção ao funcionamento dos meios de comunicação de massa com o lançamento do livro Sobre a Televisão (1997), momento em que o autor “reassume ... a postura acadêmica de reaplicar sua teoria geral dos campos em novos objetos” (SILVA, 2013, p. 76). Segundo Barros Filho e Martino (2003), Bourdieu realizou reflexões sobre a mídia sem a preocupação em realizar pesquisas empíricas para a fundamentação de seus argumentos – sendo que a argumentação fundada em pesquisas empíricas detalhadas e diversas entrevistas constituiu uma marca profunda


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da realização de seus projetos. O próprio Bourdieu argumenta que achou necessário debater o assunto e que muitas pesquisas haviam sido realizadas até o momento.

Outros, mas em condição que eu, farão ou já fizeram as demonstrações empíricas necessárias. Eu tinha que falar sobre este assunto e julguei por bem fazê-lo. Quanto ao risco de perda de credibilidade, ele existe. No entanto, as pessoas que realmente importam saberão entender as razões. (BOURDIEU apud BARROS FILHO; MARTINO, 2003, p. 27)

Segundo Carvalho (2017), o lançamento do livro provocou um desconforto entre Bourdieu e os profissionais da imprensa francesa, os quais criticaram a posição do sociólogo e o acusaram de “promover a análise de uma área sobre a qual, em tese, ele não dominava por não possuir nem formação acadêmica, nem prática” (CARVALHO, 2017, p. 5). Bourdieu faz uma crítica sofisticada ao funcionamento do campo jornalístico e ao trabalho desses agentes sociais. O sociólogo aplica a teoria geral dos campos no jornalismo e o interpreta a partir do conceito de microcosmo – ou seja, um pequeno mundo com regras, conflitos e tensionamentos próprios. Nesse cenário, o campo jornalístico é definido a partir de suas leis próprias – conjunto de códigos pertencentes a uma ordem simbólica que são compartilhados pelos seus agentes – e também em uma relação de “atrações e repulsões que sofre da parte dos outros microcosmos” (BOURDIEU, 1997a, p. 55). No interior do campo do jornalismo, encontra-se presente um conjunto de práticas, ações, modos de ver o mundo e representações simbólicas que são incorporadas inconscientemente pelos jornalistas por meio de estruturas objetivas. O autor afirma que as disposições dos jornalistas dentro desses campos podem variar, e que esse espaço se molda em contato com relações internas existentes.

Um campo é um espaço social estruturado, um campo de forças – há dominantes e dominados, há relações constantes, permanentes, de desigualdade, que se exercem no interior desse espaço – que é também um campo de lutas para transformar ou conservar esse espaço de forças. Cada um, no interior desse universo, empenha em sua concorrência com outros a força (relativa) que detém e que define sua posição no campo e, em consequência, suas estratégias. (BOURDIEU, 1997a, p.57)


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Bourdieu evidencia que por mais que se estabeleçam diferenças entre os jornalistas, de acordo com o gênero, grau de instrução e o veículo de comunicação em que esses profissionais trabalham, existem estruturas invisíveis incorporadas em todos os agentes e que moldam o seu olhar. O sociólogo explica as peculiaridades do campo jornalístico com a metáfora dos óculos, segundo a qual “os jornalistas têm óculos especiais a partir dos quais veem certas coisas e não outras; e veem de certa maneira as coisas que veem. Eles operam uma seleção e uma construção do que é selecionado” (BOURDIEU, 1997a, p. 25). A partir da metáfora de óculos, Bourdieu tece algumas considerações sobre o habitus e o campo jornalístico. Primeiramente, o autor critica a busca pela exclusividade, ou, nas palavras do autor, a “perseguição pelo furo”, existente entre os veículos de comunicação concorrentes. Nessa lógica, se determinado jornal irá difundir determinada notícia, os outros jornais também precisam emiti-la, para evitar a perda pela concorrência. A busca pela exclusividade, que originalmente em outros campos é responsável por trazer singularidade, acaba por homogeneizar e banalizar a profissão. Outro aspecto do campo jornalístico apontado pelo autor está relacionado com as categorias de pensamento que os jornalistas possuem, baseadas em um habitus incorporado, que fazem com que o processo de produção e de seleção noticiosa seja baseado na visão desses profissionais do que merece ser pautado e difundido. Ao comentar sobre esse mecanismo próprio do campo, Bourdieu faz uma crítica ao que chama de censura que os jornalistas exercem “sem sequer saber disso” (BOURDIEU, 1997a, p. 67).

Mas não é menos verdade que o campo jornalístico, como os outros campos, baseia-se em um conjunto de pressupostos e de crenças partilhadas (para além das diferenças de posição e de opinião). Esses pressupostos, os que estão inscritos em certo sistema de categorias de pensamento ... Não há discurso (análise científica, manifesto político etc.) nem ação (manifestação, greve etc.) que, para ter acesso ao debate público, não deva submeter-se a essa prova da seleção jornalística, isto é, a essa formidável censura que os jornalistas exercem, sem sequer saber disso, ao reter apenas o que é capaz de lhes interessar, de “prender sua atenção ... (BOURDIEU, 1997a, p. 67).


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A visão conceitual de microcosmo elaborada pelo autor articula-se de maneira interessante para um estudo sobre a identidade jornalística pois evita reducionismos políticos ou econômicos na compreensão da lógica de funcionamento do jornalismo, como as teorias de interpretação marxista ortodoxa que analisam o funcionamento do jornalismo a partir de um reducionismo econômico e não como um processo social complexo em que os próprios jornalistas são autônomos dialeticamente ao mesmo tempo em que tensionam-se com outros campos sociais, como o político, o intelectual, entre outros. Ao refletir sobre o campo do jornalismo, nesse contexto, precisa-se pensar muito além das relações de forças produtivas e materiais de uma sociedade, no espaço que é moldado a partir de estruturas internas e seus conflitos com outro campos. Dessa maneira, por conseguinte, o campo jornalístico arquiteta-se “... muito heterônomo, muito fortemente sujeito às pressões comerciais existentes, exerce, ele próprio, uma pressão sobre todos os outros campos, enquanto estrutura” (BOURDIEU, 1997a, p. 77) Além de um estudo bibliográfico realizado sobre a obra de Bourdieu de uma forma ampla e, depois, da aplicação de sua Sociologia dos Campos no campo do jornalismo, esta pesquisa valeu-se de autores que procuram explicar e entender o funcionamento do jornalismo e que, de certa maneira, apresentam interfaces com Bourdieu. A perspectiva do sociólogo francês sobre os valores simbólicos incorporadas no habitus profissional dos jornalistas a partir de estruturas objetivas do próprio campo dialoga, por vias distintas, com diferentes autores, como Robert Darnton (1990), Ignácio Ramonet (2004), Nelson Traquina (2008) e Wilson Gomes (2009). O critério aqui utilizado para escolher tais autores foi o diálogo deles com conceitos que possuem interlocução com as ideias de Bourdieu em uma tentativa de descrição do campo jornalístico. O objetivo é mostrar como a visão de Bourdieu é extremamente dialogável com estudos já realizados no campo da Comunicação Social. Apesar de não discutir de forma direta os conceitos bordieusianos da sociologia dos campos, a perspectiva de Darnton (1990) sobre as práticas noticiosas das redações jornalísticas dialoga com a visão de Bourdieu sobre habitus e campo social. A partir da descrição de vários exemplos cotidianos em uma sala de redação, o historiador norte-americano Robert Darnton discute o modo como esses profissionais compartilham uma “mitologia própria” que influencia e constrói o relacionamento entre jornalistas, com seus conflitos e hábitos partilhados e, também,


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os processos de seleção e de construção das notícias. “O contexto do trabalho modela o conteúdo da notícia, e as matérias também adquirem forma sob influência de técnicas herdadas de contar histórias” (DARNTON, 1990, p. 96). Outro apontamento pertinente sobre os diálogos encontrados entre as perspectivas de Darnton e de Bourdieu ancora-se no fato de que os autores discutem como os jornalistas sempre escrevem para os próprios colegas de profissão e, no final, leem todos os jornais e observam o modo como os colegas trabalharam com as suas notícias e artigos. Enquanto Darnton alega que “... os repórteres são os leitores mais vorazes, e precisam conquistar seu status diariamente, ao se exporem a seus colegas de profissão” (DARNTON, 1990, p. 72), Bourdieu ressalta que “... ninguém lê tanto jornais quanto os jornalistas” (BOURDIEU,1997a, p. 32). O jornalista espanhol radicado na França, Ignacio Ramonet (2004), assim como Bourdieu, discute a relação entre o jornalismo e o mercado financeiro, espaços onde fronteiras do “muro” – termo utilizado para designar os limites entre a publicidade e o jornalismo – estão cada vez mais fluidas, o que contribui para uma queda na qualidade de produção de jornalismo e um aumento do que Bourdieu nomeia como fatos-ônibus, aquelas notícias que não possuem importância alguma e “não tocam em nada de importante” (BOURDIEU, 1997a, p. 23). Ramonet (2004, p. 51), a partir de uma perspectiva crítica, denuncia uma crise na atividade jornalística devido a “uma galopante precarização da profissão” e utiliza o pensamento de Bourdieu para ancorar um debate sobre como os jornalistas podem colaborar com a crise enfrentada na profissão. Ramonet se apropria do conceito de poder simbólico, o qual é exercido pelos jornalistas que trabalham com a manipulação de palavras no processo construção e difusão de notícias. O teórico português Nelson Traquina (2008), apesar de também não citar diretamente o pensamento bourdieusiano, ao definir o profissional jornalista, passa a ideia de características comuns de um espaço simbólico que servem como mediações modeladoras de comportamentos. Desse modo, Traquina parte do princípio de que esses agentes possuem uma competência profissional específica, uma maneira de agir, de falar e de ver, além de uma cultura profissional. Para o autor português, os jornalistas precisam ser pragmáticos no cotidiano, não há tempo para pensar devido à necessidade de agir que os profissionais precisam ter. Ou seja, a visão desses profissionais é moldada a partir do momento em que passam a conviver em uma redação jornalística, por exemplo. Na argumentação de Traquina sobre o “ser


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jornalista”, mostra-se interessante reparar como em muitos momentos o autor pontua ideias que facilmente podem ser interpretadas sob uma ótica bourdieusiana. O jornalista, argumenta Traquina, em muitos momentos possuem dificuldades para explicar quais são os critérios de noticiabilidade pois “... a maneira de agir dos jornalistas está intimamente ligada ao saber de procedimento” (TRAQUINA, 2008, p. 46). Ideias que se ligam às disposições incorporadas, ou habitus, das estruturas do campo, numa perspectiva eminentemente bourdieusiana. A metáfora dos óculos proposta por Bourdieu (1997a, p. 25) e já explicitada anteriormente relaciona-se com o que o teórico português afirma que são hábitos mentais (TRAQUINA, 2008, p. 47), que fazem com que o jornalista passe a enxergar e selecionar as notícias de maneira que estruture esses acontecimentos do mundo social e histórico a partir de sua visão, formada por uma cultura profissional, ideia encarada como uma manifestação das estruturas objetivas do campo.

Mas a cultura jornalística é também uma cultura rica em mitos, símbolos e representações sociais que fornecem a esta comunidade interpretativa toda uma liturgia de figuras bem claras dos vilões e dos heróis a que os membros da tribo prestam homenagem ou devotam ódio. (TRAQUINA, 2008, p. 51).

Além de Traquina, Wilson Gomes (2009), responsável por estabelecer interessantes diálogos entre o campo filosófico e o campo jornalístico, discute no texto Jornalismo e interesse público a configuração das estruturas objetivas do campo jornalístico naquilo que Bourdieu chama de autonomia relativa, ou seja, o compartilhamento simbólico do campo que possibilita sua autonomia e, também, credibilidade em relação aos outros espaços de relações. Nesse sentido, Gomes (2009) discute a legitimação do discurso jornalístico a partir da ideia de interesse público. No vértice do autor, dentro do espaço social onde existem diferentes campos em tensionamento, é necessário que se prove por qual motivo determinado espaço é relevante – quais são seus valores supremos. O jornalismo enquanto campo social, se legitima socialmente por trabalhar com representações da realidade relacionadas a assuntos que são de interesse público.

... o jornalismo como instituição é imprescindível para as sociedades democráticas justamente porque é capaz de servir ao interesse


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público. E de fazê-lo de maneira frequentemente melhor que outras instituições com a mesma destinação, como a política. Mais que uma função social, o serviço ao interesse público é valor eminente e o princípio que o prescreve torna-se uma determinação moral. (GOMES, 2009, p. 70)

A ligação do pensamento de Bourdieu com autores do campo das teorias da comunicação e das teorias do jornalismo apenas reforça que a malha conceitual do sociólogo francês é dialogável de forma factível com o campo da comunicação e, por conseguinte, a Teoria da Prática serve como base teórico-metodológica para estudos sobre representação e análise do papel dos jornalistas como agentes sociais em diversos contextos. Encerra-se aqui a revisão conceitual de habitus e de campo jornalístico. Uma vez apresentado o edifício teórico que fundamentará a análise deste trabalho, o próximo capítulo irá discutir a plataforma de comunicação utilizada para realizar a representação em ambos os produtos audiovisuais escolhidos: o cinema documentário.


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2. O DOCUMENTÁRIO COMO FORMA DE REPRESENTAÇÃO DA REALIDADE: UMA MELHOR COMPREENSÃO DE O MERCADO DE NOTÍCIAS Este capítulo tem por objetivo realizar uma discussão teórica com a intenção de construir algumas explanações sobre a relação entre jornalismo e cinema e, por conseguinte, realizar uma breve revisão teórica sobre a definição “cinema documentário” e seus desdobramentos conceituais e históricos. Tendo em conta que a plataforma em que o objeto de estudo se manifesta – no caso, as representações dos jornalistas – é um filme documentário, mostra-se importante para um entendimento maior deste estudo que se faça algumas considerações conceituais sobre esse gênero cinematográfico. Nesse sentido, será utilizado o suporte teórico de Bill Nichols (2016). Após a conceituação do cinema documentário e de algumas de suas complexidades, se realizará uma discussão sobre o documentário O Mercado de Notícias: informações sobre o seu processo de produção, seu enredo, os atores sociais participantes e as escolhas estilísticas de seu diretor, Jorge Furtado. Consequentemente, após uma abordagem mais ampla da definição de documentário e uma discussão sobre O Mercado de Notícias, o estudo segue com o objetivo de classificar o documentário em questão nos seis modos de documentário propostos por Nichols (2016). Por opção metodológica, a proposta deste capítulo é apresentar subsídios para a análise empírica. Faz-se importante ressaltar, nesse sentido, que a intenção não é esgotar a discussão sobre o que é documentário, a relação entre jornalismo e cinema e nem aprofundar de forma intensa nos diversos conflitos existentes nas discussões do próprio campo do cinema documentário. O fundamental, aqui, é fornecer elementos para o estudo das representações dos jornalistas presentes no documentário O Mercado de Notícias.


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2.1 O cinema e o jornalismo: um diálogo possível

Diversos trabalhos acadêmicos têm sido realizados na interface entre cinema e jornalismo. Considerando-se que este estudo constitui uma análise das representações dos jornalistas no cinema, é importante que se retome alguns trabalhos feitos sobre o tema e que dialogam em si ao procurar interfaces entre esses dois campos. É pertinente afirmar que as preocupações com esse tipo de estudo se relacionam muito com a representação que o cinema faz da profissão de jornalista, o que auxilia na construção da identidade desse profissional. Um exemplo é Fernanda Lima Lopes (2016). Amparada na Análise do Discurso, a autora procura investigar as representações dos jornalistas investigativos nas películas Todos os Homens do Presidente (1976) e Spotlight (2015) com o objetivo de entender de que forma essas representações interagem com os processos de construção da identidade jornalística. A pesquisadora parte do princípio de que as representações realizadas pelo cinema são importantes, pois ajudam na própria concepção do que é a profissão de jornalista.

O imaginário sobre uma profissão de tanta visibilidade e com um sentido de missão tão largamente evidenciado, assim como fatos da realidade concreta que efetivamente são matéria-prima para o trabalho jornalístico fornecem elementos para filmes que engendram representações sobre a identidade jornalística, não deixando de contribuir, assim, com a própria construção dessa identidade. (LOPES, 2016, p. 1-2)

Em diálogo com Lima Lopes (2016), Marcelle Khouri (2009) realizou um estudo sobre a representação dos jornalistas no cinema hollywoodiano desde 1930 até 2000 e analisou 14 filmes10 baseada no conceito de estereótipo evidenciado por Walter Lippmann11 (1922). A autora cita uma fala do cineasta estadunidense Samuel Fuller que afirma que “jornalismo e cinema são companheiros de cama” (FULLER apud KHOURI, 2009, p. 24). A pesquisadora também menciona Christa Berger (2002),

10

Os filmes analisados por Khouri (2009) foram: Aconteceu Naquela Noite (1934), Fúria (1936), Adorável Vagabundo (1941), Cidadão Kane (1941), A Montanha dos Sete Abutres (1951), A Embriaguez do Sucesso (1957), O Homem que Matou o Facínora (1962), Paixões que Alucinam (1963), A Primeira Página (1974), Rede de Intrigas (1976), Ausência de Malícia (1981), Sob Fogo Cerrado (1983), O Quarto Poder (1997), O Informante (1999). 11 Walter Lippmann (1889-1974) foi um escritor e jornalista nascido nos Estados Unidos. O seu livro A Opinião Pública, publicado em 1922, é muito utilizado em estudos na área de Comunicação Social.


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que aponta que a curiosidade sobre o processo de produção de notícias incentiva a existência de uma grande quantidade de filmes que abordam jornalismo. Para Khouri (2009), parte-se do princípio de que por mais que o cinema e o jornalismo possuam narrativas divergentes, existem aproximações entre essas duas formas de representar a realidade.

Nesse sentido, vale destacar que tanto o cinema quanto o jornalismo reconstroem a realidade e contribuem para criar a imagem que se tem dessa mesma realidade. Como também fazem parte dela, o recorte que nos é apresentado por ambos os produtos é resultado das leituras feitas por seus produtores, os quais reconstroem essa realidade com menor (jornalismo) ou maior (cinema) interferência dos seus pontos de vista. (KHOURI, 2009, p. 47).

Ambrósio et al. (2014) buscam entender a partir das Teorias do Jornalismo a representação dos filmes sobre jornalismo no cinema de Hollywood, que segundo Christa Berger (2002 apud AMBRÓSIO et al., 2014), “com diferentes intensidades, contribuem para a fixação do tipo ‘ideal’ de jornalista”. Os autores realizam uma discussão sobre a questão do cinema a partir dos preceitos jornalísticos evidenciados pelas Teorias do Jornalismo. O que fica considerado nos trabalhos analisados – e, nesse cenário, podese notar uma preocupação dialogável neste estudo – é a importância da compreensão das representações dos jornalistas no cinema, tendo em vista que essas ajudam a construir, como afirma Lopes (2016), a própria construção do jornalismo – concepção que Pierre Bourdieu, ao discorrer sobre a televisão, chama de “um extraordinário instrumento de democracia direta” (BOURDIEU, 1997a, p. 13).


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2.2 O cinema documentário: definição e suas complexidades

O teórico Bill Nichols (2016) propõe elementos em comum no conjunto de filmes denominado “cinema documentário”. O autor, contudo, evidencia que se compreender o documentário de uma forma “concisa e abrangente é possível, mas não fundamental” (NICHOLS, 2010, p. 30). Para o autor, é importante pensar que cada filme contribui para a ideia do que é cinema documentário como um diálogo que está em constante modificação e tensionamento, pois cada filme do gênero possui características em comum e, ao mesmo tempo, pode trazer inovações e assumir “uma forma nova e distinta, como um camaleão em constante mudança” (NICHOLS, 2016, p. 30). Ao discutir documentário neste tópico do capítulo, assume-se a postura teórica do autor, que considera o documentário como representação da realidade. Nichols (2016) coloca três características básicas encontradas no grupo de filmes desse gênero que, por mais que não sejam definições estanques, como afirmado anteriormente, ajudam a elucidar seu entendimento: documentários tratam de algo que realmente aconteceu, tratam de pessoas reais e de histórias que aconteceram no mundo real. Quando coloca essas ideias em discussão, Nichols (2016) pontua que a representação do mundo dada pelos documentaristas possui uma preocupação com “mundo real e histórico”. Ao elucidar de forma mais ampla a definição, Nichols (2016) sempre procura fazer contrastes com a ficção. Para o autor, o documentário busca discutir a realidade a partir do enquadramento de acontecimentos verossímeis, que podem ser comprovados com dados reais, diferentemente da ficção, em que para se discutir a realidade, os personagens e ações são inventados. Nichols (2016) detalha essa relação: Os documentários falam de situações ou acontecimentos reais e honram os fatos conhecidos; não introduzem fatos novos, não comprováveis. Falam sobre o mundo histórico diretamente, não alegoricamente. Narrativas fictícias são fundamentalmente alegorias. Elas criam um mundo para substituir outro, o mundo histórico ... As imagens documentais geralmente capturam pessoas e acontecimentos que pertencem ao mundo que compartilhamos, em vez de apresentar personagens e ações inventados para se referir indiretamente ou alegoricamente a uma história do nosso mundo (NICHOLS, 2016, p. 31)


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Portanto, no cinema documentário, as pessoas e situações representadas pertencem ao mesmo mundo compartilhado pelos espectadores, de maneira que quando um filme do gênero traz dados falsos, põe em perigo o status do cinema dessa natureza. Em relação aos indivíduos representados, Nichols (2016) propõe o conceito de self desenvolvido pelo sociólogo canadense Erving Goffman (2010) no livro A Representação do Eu Na Vida Cotidiana12 para discutir o modo como as pessoas retratadas nos documentários agem como atores sociais e se representam a partir de suas relações com outros indivíduos. Nichols (2016) explica que os indivíduos se apresentam para o cinema documentário como eles mesmos, diferentemente da ficção, em que atores utilizam técnicas de atuação para interpretar um personagem fictício. Os atores sociais representados em um documentário se comportam e interagem com o cineasta e outros indivíduos a partir das respostas que obtêm e das relações existentes e mostram fragmentos de sua personalidade a partir da necessidade contextual da situação. “A apresentação do self entra totalmente em cena quando as pessoas ficam diante da câmera e interagem com os cineastas. Não é a mesma coisa que acatar um papel predeterminado” (NICHOLS, 2016, p. 32). O autor, no último tópico básico que pontua para dar uma definição inicial ao documentário, discute a questão de que os filmes documentários discutem histórias que realmente aconteceram, ou seja, possuem coerência e plausibilidade no modo social e histórico. Dessa forma, Nichols (2016) propõe uma definição inicial de documentário.

O documentário fala de situações e acontecimentos que envolvem pessoas reais (atores sociais) que se apresentam para nós como elas mesmas em histórias que transmitem uma proposta, ou um ponto de vista, plausível sobre as vidas, as situações e os acontecimentos representados. O ponto de vista particular do cineasta molda essa história numa maneira de ver o mundo histórico diretamente, e não numa alegoria fictícia. (NICHOLS, 2016, p. 37).

12

O sociólogo canadense Erving Goffman realizou uma pesquisa etnográfica para a sua tese de doutorado no arquipélago escocês denominado Ilhas Shetland, onde, em uma abordagem microssociológica, estudou as interações sociais existentes entre os habitantes das ilhas. Utilizando a metáfora do teatro, Goffman parte do princípio de que os indivíduos representam a si mesmo utilizando quadros de referência comportamental a partir de determinadas situações contextuais ou de acordo com a resposta que desejam obter. Para o sociólogo, “o indivíduo apresenta, em situações comuns de trabalho, a si mesmo, e a suas atividades às outras pessoas, os meios pelos quais dirige e regula a impressão que formam a eu respeito e as coisas que pode ou não fazer, enquanto realiza seu desempenho diante delas” (GOFFMAN, 2010, p. 9). A partir do material de sua tese, Goffman publicou, originalmente em 1959, o clássico livro intitulado A Representação do Eu Na Vida Cotidiana.


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Nichols (2016) realiza uma ressalva no fato de que existem outros fatores que serão muito importantes na tentativa de conceituar o cinema documentário. O autor evidencia que por mais que essas características em comum propostas sejam importantes para refletir sobre as convenções existentes para definir o documentário como um gênero cinematográfico, tais demarcações estão em constante mudança e tensionamento de acordo com quatro condições colocadas: as instituições, os cineastas, os filmes e o público. A ressalva que Nichols (2016) faz sobre as quatro condições necessárias que são fundamentais para a compreensão e definição de documentário se tornam importantes porque evitam um pensamento reducionista em relação às características compartilhadas entre os diversos filmes do gênero e mostra que sempre há espaço para novas formas de enxergá-lo, pois sua definição está em constante transformação. A primeira é a própria estrutura institucional. Para Nichols (2016), as instituições responsáveis por realizar a produção, a distribuição e o incentivo dos documentários são importantes para estabelecer convenções capazes de definir o que é e o que deixa de ser documentário. Afinal, se uma emissora de televisão ou uma produtora cinematográfica define determinado filme como um documentário, parte-se do princípio de que a película realmente é um filme do gênero. “O contexto dá esse sinal; seria bobagem ignorá-lo, mesmo que a definição não seja exaustiva” (NICHOLS, 2016, p. 39). Logo

em

seguida,

a

comunidade

profissional

constituída

pelos

documentaristas também ajuda a definir o gênero. De acordo com Nichols (2016), os profissionais do documentário se reúnem em festivais de cinema, discutem assuntos políticos e sociais, possuem um vocabulário próprio e discutem questões éticas, estéticas e técnicas em relação ao modus operandi da profissão, fator que também influencia na hora de definir o tipo de cinema em discussão.

Cada profissional molda ou transforma as tradições que herda, mas o faz dialogando com aqueles que compartilham a consciência de uma missão ... nossa ideia do que é um documentário muda conforme muda a ideia dos documentaristas sobre o que fazem. (NICHOLS, 2016, p. 42).


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Um detalhe interessante da proposição de Nichols (2016) acerca da organização profissional dos cineastas é que há um diálogo entre os comportamentos compartilhados entre esses profissionais e o pensamento bourdieusiano de campo social e de habitus, tema que será recuperado à frente. Os filmes são o terceiro elemento proposto pelo autor responsáveis por tensionar e complementar conceitualmente uma definição abrangente. Em diferentes épocas, divergentes movimentos e períodos apontam que o campo do documentário está em constante contraste e modificação, relação que ocorre por influências históricas e até mesmo tecnológicas. Um exemplo apontado pelo autor se remete aos anos 1930 nos Estados Unidos, período em que os filmes compartilhavam uma sensibilidade relacionada à época da Grande Depressão de 1929 que atingiu, dentre vários campos sociais, a mídia. Nos anos 1960, os cineastas já estavam influenciados por câmeras portáteis que os permitiam realizar filmes que acompanhassem o cotidiano dos atores sociais evidenciados. Nesse ponto de seu argumento, Nichols (2016) propõe os seis modos de fazer documentários, ou seja, cada um desses modos propostos pelo teórico são diferentes maneiras de tratar e representar a realidade. As seis principais modalidades propostas por Nichols são: poético, expositivo, observativo, participativo, reflexivo e performático. Como já evidenciado anteriormente, optou-se conceitualmente por esses seis modos de fazer documentário para uma classificação do documentário que será analisado neste estudo, O Mercado de Notícias. Uma maior explanação será realizada no tópico 2.6 deste capítulo, onde será discutido em qual modo o documentário em questão se encaixa. Para finalizar, o quarto tópico evidenciado é o público, que presume o que é um filme documentário quando o assiste. A visão do receptor sobre o filme também é importante porque, como afirma Nichols (2016), as pessoas têm uma certa expectativa em assistir uma interpretação sobre o mundo que possui um compromisso ético de representar uma realidade social e histórica, de mostrar uma perspectiva sobre o mundo. Nichols (2016) propõe que existe um compromisso entre o cineasta e o público que se relaciona com o próprio status do filme documentário de procurar um retrato da realidade. Após definir-se alguns elementos básicos que compõem e definem o que é cinema documentário, contemplando algumas de suas peculiaridades, no próximo


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tópico será discutido o filme documentário que constitui o objeto empírico deste estudo.

2.3 O Mercado de Notícias: o jornalismo discutido sob o viés do documentário e do teatro O Mercado de Notícias é um documentário dirigido e roteirizado pelo cineasta Jorge Furtado13 que discute o papel do jornalismo em uma sociedade democrática. No desenvolvimento de seu argumento, o filme debate os critérios que definem modos de ser e pensar pertencentes ao campo jornalístico, o surgimento da imprensa e o seu papel na construção de uma opinião pública. O fio condutor da produção é a peça homônima14 escrita pelo dramaturgo inglês Ben Jonson15 (15721637), que faz uma crítica ácida e bem humorada sobre o início da atividade jornalística em Londres, no século XVII. A edição em língua portuguesa da peça era inédita até a tradução realizada pelo próprio diretor em parceria com a professora e tradutora Liziane Kugland16. O processo de duração do filme se estendeu por oito anos para a conclusão da produção e da peça, tendo em vista que só para a sua tradução, demandou-se três anos. Na montagem do documentário, são intercaladas entrevistas com 13 jornalistas17 e os atos da peça, composta por 14 atores gaúchos. Segundo Vargas (2015), o projeto do documentário foi contemplado no Edital de Apoio À Produção de Obras Audiovisuais Cinematográficas do Gênero Documental em 2011, do Ministério da Cultura, com apoio individual para obras inéditas no valor de até R$ 500 mil.

13

Jorge Alberto Furtado (1959-) é um cineasta gaúcho, nascido em Porto Alegre. O diretor iniciou sua carreira como repórter da TV Educativa do Rio Grande do Sul na década de 1980 e foi um dos fundadores da Casa de Cinema de Porto Alegre, da qual é integrante até hoje. Ficou reconhecido internacionalmente após dirigir o documentário curta-metragem Ilha das Flores (1989). Já dirigiu e produziu mais de 25 filmes e recebeu premiações em âmbitos nacional e internacional. 14 O título original da peça é The staple of news 15 Ben Jonson (1572-1637) foi um dramaturgo e poeta inglês. Segundo a fala do próprio Jorge Furtado, em O Mercado de Notícias, Jonson se destacou como a segunda figura mais importante do teatro elisabetano, sendo a primeira William Shakespeare (1564-1616). (Ver Anexo D) 16 A tradutora possui Mestrado em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) com ênfase na área de Estudos de Literatura e realiza trabalhos focados na tradução de obras infantis e legendagem cinematográfica 17 O time de jornalistas é composto por Bob Fernandes, Cristiana Lôbo, Fernando Rodrigues, Geneton Moraes Neto, Jânio de Freitas, José Roberto de Toledo, Leandro Fortes, Luis Nassif, Maurício Dias, Mino Carta, Paulo Moreira Leite, Raimundo Pereira e Renata Lo Prete. Os nomes estão expressos nesta nota de rodapé apenas por motivos de complementação haja vista que no próximo capítulo, a análise propriamente dita, os entrevistados serão especificados de forma mais ampla.


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O teatro possui uma função significativa na construção da narrativa do documentário, pois debate um fator muito importante: a transformação da informação em mercadoria. De maneira sucinta, na sinopse da peça18, em Londres, em 1625, um homem chamado Pila Pai simula sua própria morte e, disfarçado de mendigo, vigia seu filho, Pila Junior, que ao completar sua maioridade, começa a gastar a fortuna da família. Dentro desse contexto, uma grande novidade surge no território londrino: o surgimento de um Mercado de Notícias, que cria um grande fluxo de notícias e Pila Júnior faz com que empreguem seu amigo, Tom. O pai desaprova a vida de desperdícios que o filho leva e decide voltar, impondo ao filho a viver como um mendigo. O texto, então, coloca em discussão a curiosidade das personagens pelas notícias, ou, em outros termos, a vontade popular por notícias, que Bourdieu denomina fatos-ônibus, aquelas notícias que não possuem significação alguma para os princípios de um jornalismo preocupado com questões de interesse público, mas informações que mesmo assim são publicadas pelo campo do jornalismo. Ao decorrer desses conflitos e discussões que serão melhor explorados no próximo capítulo, as entrevistas com os jornalistas são entremeadas de forma a construir o que Nichols (2005) chama de montagem comprobatória, ou seja, a formação de um olhar sobre a realidade. Figura 1 – Jorge Furtado reunido junto ao elenco da peça

(Fonte: O Mercado de Notícias)

18

Ver Anexo B


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Um fato interessante do documentário pode ser percebido em sua transmidialidade, haja vista que há uma página na web19 para a produção, que inclusive passou a ser atualizada com conteúdo após o lançamento e processo de divulgação do filme. A página possui uma quantidade satisfatória de conteúdo e disponibiliza as entrevistas realizadas com os jornalistas, os atos das peças em ordem cronológica, informações técnicas sobre o filme, os casos jornalísticos citados na produção, além de imagens dos ensaios da peça e uma vasta bibliográfica sobre jornalismo que embasou a produção do documentário. A relação entre as diferentes plataformas, internet e cinema, exploradas no processo de divulgação do documentário tornou-se objeto de estudo20. Figura 2 – Layout do página do documentário

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/)

A questão de discutir o jornalismo e a sua importância social foi evidenciada por Furtado no processo de divulgação do filme. Em entrevista ao site Rede Brasil Atual21, o diretor explica que decidiu fazer o documentário devido ao fato de acreditar na importância social do jornalismo, que para o diretor é uma profissão “mais do que necessária”.

Sempre quis fazer Jornalismo. Não sei viver sem notícias. Tem gente que não dá bola. O Jorge Luis Borges, por exemplo, dizia que não lia jornais porque não acontecem coisas transcendentes todos os dias. Mas eu não sei viver sem. O jornalismo mudou muito com a internet, e teve muita gente que chegou a dizer que não seriam mais necessários jornalistas nem cursos de Jornalismo. Eu pensava o oposto. Naquele momento é que a gente passou a precisar mais ainda do Jornalismo. O jornalista é uma pessoa necessária .... (FURTADO, Jorge. Mercado de Notícias. O jornalismo no divã do cinema. Disponível em: < http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/98/documentario-de-jorgefurtado-o-mercado-de-noticias-546.html>. <http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/98/documentario-de-

19

Disponível em: http://www.omercadodenoticias.com.br, Acesso em: 01 de nov. 2017. Ver Vargas (2015) 21 Disponível em: http://www.redebrasilatual.com.br. Acesso em: 01 de nov. 2017. 20


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jorge-furtado-o-mercado-de-noticias-546.html>. Acesso em 01 nov. 2017.)

É evidente o posicionamento do diretor22 de valorização do campo jornalístico e da importância de suas características em um período em que o jornalismo tem sofrido, segundo ele, a influência da internet.

Meu filme é basicamente uma defesa da atividade profissional de jornalistas. Com a internet, num determinado momento, ficou parecendo que não precisava mais ter jornalistas, pois todo mundo é: tem Facebook, Twitter — só que eu achei exatamente o oposto. Nesse momento é que a gente precisa de um profissional treinado, com critérios, que saiba checar a informação, que tenha fontes. Gente com compromisso até de se corrigir, num caso de erro. Ouvi uma frase que eu achei muito boa: “Eu não tenho tempo para ler textos tão curtos. (FURTADO, Jorge. "Mercado de notícias", de Jorge Furtado, estreia em mostra paralela do BIFF. Disponível em: < http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-earte/2014/09/01/interna_diversao_arte,444981/mercado-de-noticiasde-jorge-furtado-estreia-em-mostra-paralela-do-biff.shtml>. Acesso em 01 nov. 2017.

Jorge Furtado parte de uma perspectiva normativa, baseada em suas próprias concepções sobre a atividade realizada pela imprensa:

O Mercado de Notícias debate critérios jornalísticos, e este é o seu sentido e o sentido da peça de Jonson. É também uma defesa da atividade jornalística, do bom jornalismo, sem o qual não há democracia. (FURTADO, Jorge. O projeto. Disponível em: < http://www.omercadodenoticias.com.br/o-projeto/>. Acesso em: 01 nov. 2017.

Após uma descrição e contextualização dos elementos referentes ao documentário que será analisado neste estudo, o próximo tópico pretende discutir de forma breve a relação existente entre o filme em si e a questão do teatro. As escolhas de Furtado sob um ponto de vista técnico, éticas e estéticas foram ressaltadas no final deste tópico com a intenção de discutir no seguinte em qual modo de documentário, na visão conceitual de Nichols (2016), O Mercado de Notícias se classifica, e como a visão de mundo do próprio diretor influenciou na representação do campo jornalístico.

22

Entrevista de Jorge Furtado postada na página do Correio Braziliense


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2.4 O Mercado de Notícias e os modos de documentário propostos por Bill Nichols Neste tópico, será realizada uma discussão acerca das características de O Mercado de Notícias (2014) a partir das categorias propostas por Nichols (2016) sobre os modos de documentário. Primeiramente, será feita uma breve retomada dos conceitos do autor para, em seguida, classifica-los de acordo com a análise do documentário e as entrevistas fornecidas pelo seu diretor, Jorge Furtado, no processo de divulgação do filme. Como exposto anteriormente, Nichols (2016) propõe seis modos de documentário: poético, expositivo, observativo, participativo, reflexivo, e performático. Para o autor, cada uma dessas categorias é responsável por uma diferente forma de representação da realidade. O autor define modos como “um conjunto de convenções e filmes prototípicos” (NICHOLS, 2016, p. 166). É importante evidenciar que essas formas propostas pelo autor não são estanques e, sim, apenas uma maneira de melhor estudar o cinema documentário. Os filmes podem ser híbridos e exibir diferentes características dos modos apresentados.

Esses modos identificam as maneiras diferentes de a voz do documentário manifestar-se cinematograficamente. Eles diferenciam os documentários em suas características formais, mas em proporções e com ênfases diferentes. A maioria dos filmes incorpora mais de um modo, embora alguns modos se destaquem mais em um momento ou lugar do que em outro. Esses modos servem como um esqueleto ao qual cada cineasta dá corpo de acordo com a sua própria disposição criativa. (NICHOLS, 2016, p. 154)

As características evidenciadas pelo autor podem ser sistematizadas no seguinte quadro: Quadro 1 – Algumas características específicas dos modos de documentário

Características Modo Expositivo

Uma voz caracterizada por Exatidão e verificabilidade Retórica clássica em históricas; representação busca da verdade e de justa dos outros, evita informar e comover um transformar as pessoas público. em vítimas indefesas; desenvolve a confiança do espectador. Preocupações éticas


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Poético

Observativo

Participativo

Reflexivo

Performático

Uso de pessoas, lugares e coisas reais, sem considerar sua identidade individual; pode distorcer ou exagerar em nome do efeito do estético. Observação passiva de atividade perigosa, prejudicial ou ilegal pode levar a sérias dificuldades para os personagens. Questões de responsabilidade em relação às pessoas filmadas podem se agravar Manipula ou instiga os outros a confissões ou ações de que podem vir a se arrepender, grande responsabilidade para respeitar os direitos e a dignidade das pessoas filmadas. Podem surgir questões de manipulação e distorção. Usa ou abusa das pessoas filmadas para levantar questões que são do cineasta e não delas. Grau de honestidade e autoescritínio versus autoengano; deturpação ou distorção de questões maiores degenera em algo totalmente idiossincrático

Um desejo expressivo de dar novas formas e perspectivas ao mundo representado.

Paciência, modéstia, discrição. Desejo de deixar o púbico decidir por si mesmo sobre o que vê e ouve.

Envolvimento, investimento alto no encontro com os outros ou na apresentação de uma perspectiva histórica.

Autoquestionamento, uma voz de dúvida, mesmo dúvida radical sobre a certeza ou constância do conhecimento. Orador extremamente pessoal, engajado, em busca da verdade do que é vivenciar o mundo de determinada maneira.

Fonte: Introdução ao Documentário. Bill Nichols (2016, p. 218)

O documentário de Furtado enquadra-se no modo participativo, apesar de possuir características expositivas e performáticas; assunto que será melhor discutido no desenvolvimento deste tópico. O primeiro modo descrito por Nichols (2016) é o poético. Segundo o autor, nessa categoria, o mundo histórico serve como fonte para uma construção estética que é mais importante na construção dos filmes do que necessariamente uma


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realidade documental. Em uma produção com viés poético, a preocupação de representar uma determinada realidade a partir de uma perspectiva que a documente e a registre é muito menor em relação à preocupação com as formas e a impressão lírica do próprio cineasta.

Esse modo enfatiza mais o estado de ânimo, o tom e o afeto do que as demonstrações de conhecimento fatual ou os atos de persuasão teórica. O elemento retórico continua pouco desenvolvido, mas a categoria expressiva é vívida. Aprendemos, nesse caso, por afeto ou sentimento, por adquirir a percepção de como é ver e experimentar o mundo de um modo poético, singular. (NICHOLS, 2016, p. 171)

Em seguida, apresenta-se o modo expositivo. De acordo com Nichols (2016), tal modalidade contém o maior número de exemplos, por terem surgido no começo da tradição do documentário. Este modo enquadra e reúne fragmentos do mundo histórico com uma maior preocupação retórica do que estética ou até mesmo poética. É o exemplo clássico do cinema documentário com características como o comentário em voz over23 que fala diretamente como o espectador e a característica de argumentação a fim de convencer o receptor de algum ponto, que será construído ao longo da narrativa.

Os documentários expositivos são extremamente dependentes de uma lógica informativa transmitida verbalmente. Numa inversão da ênfase habitual no cinema, as imagens desempenham papel secundário. Elas ilustram, esclarecem, evocam ou contrapõem o que é dito. O comentário é geralmente apresentado como distinto das imagens do mundo histórico que o acompanham. Ele serve apenas para organizar essas imagens e dar sentido a elas, de maneira semelhante a uma legenda escrita para uma imagem fixa. (NICHOLS, 2016, p. 176).

Nichols (2016) afirma que diferentemente do modo poético que se preocupa com o ritmo e a estética, a montagem do modo expositivo segue no sentido de manter a continuidade da perspectiva desejada. De maneira distinta dos dois primeiros, o modo observativo possui foco maior nos agentes sociais e suas interações do que necessariamente preocupações

23

Os documentários desse gênero são conhecidos por serem narrados por uma voz grossa, masculina e geralmente treinada “cheia suave e em tom e timbre, que se mostrou a marca de autenticidade do modo expositivo” (NICHOLS, 2016, p.175). Essa voz é chamada pelo autor de “voz de Deus”.


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estéticas ou retóricas. Segundo Nichols (2016), devido ao contexto histórico da época – o pós-Segunda Guerra Mundial, aproximadamente nos anos 1960 – surgiram as câmeras 16mm, que possuíam maior portabilidade e permitiram aos cineastas a locomoção e o acompanhamento das rotinas dos agentes sociais. O autor ressalta que este tipo de filme causa algumas polêmicas pelo fato de o cineasta ter uma postura mais neutra, como um mero observador dos acontecimentos, sem um maior filtro para contextualizar a realidade das pessoas representadas. “Já que o cineasta observativo adota um modo peculiar de presença ‘na cena’, em que parece ser invisível e não participante, também se levanta a questão de quando o cineasta tem a responsabilidade de intervir. E se acontecer alguma coisa que prejudique ou fira um dos atores sociais” (NICHOLS, 2016, p. 184). Em total contraste, a quarta categorização discutida pelo autor, o modo participativo, enfatiza a participação ativa do cineasta nos acontecimentos representados. O cineasta procura ser um ator participativo no decorrer da narrativa. Nichols (2016) ressalta que, com o advento da internet, o público pode interagir com o documentário de uma forma mais efetiva, como ocorre no próprio site do O Mercardo de Notícias. Uma das principais formas de interação entre o cineasta e as personagens é a entrevista. O autor faz uma comparação do trabalho do cineasta com o do antropólogo, pois ambos têm necessidade de ir ao campo e interagir com os agentes sociais de seus interesses24. O penúltimo, o modo reflexivo, está relacionado à tentativa de estimular a reflexão no público e fazê-lo refletir sobre o próprio gênero cinema documentário. Explica Nichols (2016, p. 204): “Na melhor das hipóteses, o documentário reflexivo estimula no espectador uma forma mais elevada de consciência a respeito de sua relação com o documentário e com aquilo que ele representa”. Esse modo tem a intenção de realizar questionamentos sobre a própria configuração do gênero, suas convenções e maneiras de estruturação. Além disso, também pode ser reflexivo no sentido político em relação às suposições e expectativas sobre o mundo histórico. Por fim, o modo performático se relaciona com o envolvimento subjetivo do cineasta na obra, no sentido de buscar um envolvimento emocional intenso advindo de seus expectadores. Seu objetivo é mais afetuoso do que persuasivo: “O mundo, conforme é representado nos documentários performáticos, fica inundado de tons 24

Uma melhor discussão sobre esse modo será realizada no final do capítulo, onde se justificará por qual razão o documentário de Furtado se enquadra na modalidade.


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evocativos e nuances expressivas que constantemente nos lembram de que o mundo é mais do que a soma dois sinais visíveis que extraímos dele” (NICHOLS, 2016, p. 212). Como já afirmado anteriormente, a predominância de O Mercado de Notícias como em relação aos modos de documentário propostos por Nichols (2016) é o modo participativo, embora com algumas características expositivas e reflexivas. É manifesta a intenção de Jorge Furtado de propor um ponto de vista, uma interpretação sobre a realidade. Durante o documentário, o diretor deixa evidente seu posicionamento sobre o jornalismo: uma profissão de grande importância social. Nichols (2016, p. 160), ao descrever o modo participativo, elucida que “o cineasta interage com os atores sociais, participa na modelagem do que acontece diante da câmera”. Pode-se fazer um diálogo dessa definição do autor com duas falas de Furtado. A primeira é evidenciada no próprio documentário, na qual, ao se referir ao campo do jornalismo, alega que: Mas eu não queria fazer um filme contra, queria fazer um filme a favor. Então eu pensei assim, eu não vou falar mal dos maus jornalistas, vamos chamar jornalistas que eu respeito, que eu leio, que eu admiro e ver o que eles acham que é... a profissão de jornalista, a gente tá num momento de transformação total no jornalismo.25

Em outro momento, em uma entrevista à página Rede Brasil Atual, o cineasta revela que seu critério de escolha para os jornalistas entrevistados foi pessoal e baseado em sua visão do que é ser um profissional jornalista honesto: Totalmente pessoal. São jornalistas intelectualmente honestos, que eu respeito e acompanho e que representam vários veículos e opiniões. Uma das frases do filme é “se você não está em dúvida, está mal informado”. Porque a dúvida é necessária. Eu queria que as pessoas terminassem o filme com muitas dúvidas, novas dúvidas. Falei por pelo menos uma hora com cada um deles e fui misturando os depoimentos dentro de um planejamento lógico. No site tem as entrevistas inteiras, tem a peça inteira, toda a pesquisa que a gente fez – tudo que tem no filme está ampliado no site. (FURTADO, Jorge. Mercado de Notícias. O jornalismo no divã do cinema. Disponível em: < http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/98/documentario-dejorge-furtado-o-mercado-de-noticias-546.html>. <http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/98/documentario-dejorge-furtado-o-mercado-de-noticias-546.html>. Acesso em: 01 nov. 2017.)

25

Fala de Jorge Furtado. Transcrição do trecho (04:03 - 04:19)


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Furtado, assim como Nichols (2016) expressa em suas descrições, atua como um cineasta em constante diálogo com os agentes sociais. Tal como evidencia o teórico, ao comentar sobre o documentário participativo: A sensação de presença – em vez de ausência – física que emana das trocas em um som sincrônico entre cineasta e personagem coloca o cineasta “na cena”. Supomos que o que aprendemos vai depender da natureza e da qualidade do encontro entre cineasta e personagem. Podemos ver e ouvir o cineasta agir e reagir imediatamente, na mesma arena histórica em que estão os personagens do filme. Surgem as possibilidades de servir de mentor, crítico, interrogador, colaborador ou provocador. (NICHOLS, 2016, p. 191).

Porém, como os modos não são engessados, o documentário possui outras influências expositivas. Ao utilizar imagens de arquivo e comentários em voz over, O Mercado de Notícias exibe características do documentário expositivo. Ao relembrar momentos sobre a história do jornalismo, o diretor recorre aos vídeos de arquivo e narra os acontecimentos. Figura 3 – O documentário de Furtado exibe características expositivas

(Fonte: O Mercado de Notícias)

Quanto à questão reflexiva, é evidente que Jorge Furtado procura provocar e estimular o exame do público em relação à importância social do jornalismo e os perigos de um uso irresponsável da imprensa. É no sentido político do documentário reflexivo que pode-se configurar o filme em seu modo evidenciado por Nichols (2016, p. 206) “como estratégia política, ele nos lembra de como a sociedade funciona de acordo com convenções e códigos que talvez muito facilmente nos passem


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despercebidos”. Essa visão de enxergar códigos despercebidos nos remete a Pierre Bourdieu e faz uma conexão com o próximo capítulo, no qual será realizada a análise do documentário em si.


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3 O MERCADO DE NOTÍCIAS: UMA INTERFACE ENTRE JORNALISMO E DOCUMENTÁRIO EM UMA PERSPECTIVA BOURDIEUSIANA Este capítulo tem por objetivo realizar a análise das representações dos jornalistas a partir dos conceitos bourdieusianos de campo social e de habitus. Antes de realizar uma discussão sobre a vertente metodológica que será utilizada para a realização da análise, se realizará uma retomada do que já foi elaborado até agora com o intuito de construir um fio conectivo para a realização da análise em si. Primeiramente, foi realizado uma recuperação sobre aspectos relevantes das trajetórias biográfica e intelectual de Pierre Bourdieu, seu pensamento e a discussão dos conceitos de habitus e de campo social, tanto em uma perspectiva mais ampla quanto em sua aplicação no vértice dos meios de comunicação de massa. Posteriormente, no segundo capítulo, adotou-se o panorama teórico-conceitual de Bill Nichols (2016) sobre a definição de documentário e sua definição a respeito dos seis modos desta modalidade fílmica. Então, foi realizada uma descrição do enredo de O Mercado de Notícias, uma sucinta discussão sobre seu processo de produção e o modo como a visão do cineasta Jorge Furtado sobre o jornalismo constituiu-se um fator importante no processo de construção da narrativa e de elaboração do que Nichols (2016) denomina montagem comprobatória. Por fim, buscou-se a aplicação das categorias propostas pelo autor no documentário em si. Parte-se do princípio de que a malha conceitual desenvolvida em ambos os capítulos fornecerá subsídios para a realização da análise do documentário em questão. Pretende-se entender a representação da identidade jornalística a partir de uma macro-categoria: a interface entre o documentário, o habitus e o campo social. Dentro dessa categoria mais abrangente, são estabelecidas quatro micro-categorias: 1) o jornalismo e os tensionamentos intrínsecos no interior do campo; 2) o jornalismo e a relação com os fatos; 3) o jornalismo e seu antônimo, as práticas anti-jornalísticas; e 4) o jornalismo e os tensionamentos extrínsecos com os outros campos. O critério utilizado para a escolha dessas quatro divisões foi a própria estrutura do roteiro do documentário, considerando-se que a montagem utilizada pelo cineasta Jorge Furtado pode ser interpretada no viés desses eixos. Parte-se do princípio de que a segmentação dessas seções se mostra plausível para entender o


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documentário e a complexidade do tema que aborda: o campo jornalístico. O embasamento teórico-conceitual desenvolvido no Capítulo 1, que utiliza as ideias de Pierre Bourdieu e de seus comentadores, apresenta-se extremamente importante na construção da pesquisa. Além das próprias ideias sobre a mídia, que Bourdieu utilizou em Sobre a Televisão (1997), a observação empírica também evidencia vários elementos do habitus profissional que são incorporados pela profissão, além de manifestações da estrutura do campo jornalístico, que se evidenciam na montagem do documentário. O habitus se mostra incorporado principalmente no discurso dos jornalistas a respeito da busca pela novidade, na organização da informação e a busca pelo “extra-ordinário”. O campo, por sua vez, evidencia-se a partir da identificação da visão de mundo dos jornalistas, dos tensionamentos com outros campos em questões como as fontes jornalísticas, seus interesses e as mudanças estruturais da profissão.

3.1 Jornalismo, campo e habitus

Segundo Barros Filho e Martino (2003), relação entre campo e habitus constitui um todo ontológico; ou seja, nessa perspectiva, a relação entre ambos os conceitos está sempre ligada em ação. O que se propõe entender no presente estudo é a análise das condições estruturais que são responsáveis por modelar valores simbólicos que se tornam compartilhados entre os membros do campo social do jornalismo a partir de gestos, falas e das escolhas na montagem do filme realizadas por Jorge Furtado. No ponto inicial do documentário, o cineasta posiciona-se em relação ao campo do jornalismo. Anteriormente, no Capítulo 2, destacou-se uma das primeiras falas de Furtado no documentário, que não por acaso encontra similaridade na demarcação de sua posição em diversas entrevistas sobre a curiosidade que possui em relação ao campo do jornalismo: (Furtado conversa com o elenco da peça, todos estão sentados em círculo) Mas eu não queria fazer um filme contra, queria fazer um filme a favor. Então eu pensei assim, eu não vou falar mal dos maus jornalistas, vamos chamar jornalistas que eu respeito, que eu leio, que eu admiro


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e ver o que eles acham que é a profissão de jornalista, a gente tá num momento de transformação total no jornalismo.26

O diretor, de certa maneira, já estrutura em sua fala o fio condutor do documentário. Parte-se, então, do princípio de que as compreensões de uma eventual identidade jornalística construída pelo documentário depende de um fio conectivo de três seções: a própria montagem que Furtado irá tecer sobre o filme e suas provocações ao campo jornalístico a partir de questionamentos aos agentes sociais entrevistados; a peça de teatro que dá origem ao roteiro do filme; e, por fim, as falas dos jornalistas escolhidos para dar entrevistas. Por conseguinte, o desafio desta análise é conseguir discutir a partir dos conceitos bourdieUsianos de habitus e de campo social essas três divisões que Jorge Furtado utiliza a partir das quatro categorias estabelecidas e já evidenciadas anteriormente.

3.1.1 O jornalismo e os tensionamentos intrínsecos no interior do campo

Pode-se pensar – com base em um diálogo entre Pierre Bourdieu e Bill Nichols – que Furtado, como um documentarista, buscou um modo de representar uma realidade divergente da sua, elaborar um ponto de vista sobre o mundo. Para fazer isso na sua área de interesse, o cineasta buscou dar voz ao campo do jornalismo. Ou seja, existem profissionais que compõem um espaço estruturado e abstrato de disposições, visões de mundo e tomadas de posição, que se configura em constante tensionamento com outros espaços em uma sociedade. Esses profissionais possuem práticas, modos de ver o mundo, atitudes e crenças compartilhadas a partir de uma estrutura objetiva estabelecida – o campo jornalístico – e, por consequência, um habitus incorporado a partir de valores simbólicos por esses profissionais. Portanto, Furtado concedeu ao próprio campo uma autorização para se autorreferenciar e se definir. É a partir dessa lógica que é construída a visão de jornalismo pelo próprio campo, representado, também, pelos treze profissionais convidados pelo diretor.

26

Fala de Jorge Furtado. Decupagem: (04:03 - 04:19)


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Retoma-se a definição que Bourdieu (1997a) concede ao campo do jornalismo a partir do conceito de microcosmo. O autor ressalta que o campo jornalístico, por mais que esteja em tensionamento com outros campos sociais, possui sua própria lei, ou seja, os seus protagonistas incorporam um habitus que, de certa maneira, molda comportamentos que são compartilhados entre os próprios jornalistas:

O mundo do jornalismo é um microcosmo, que tem leis próprias e que é definido por sua posição no mundo global e por suas atrações e repulsões que sofre da parte dos outros microcosmos. Dizer que ele é autônomo, que tem sua própria lei, significa que o que se passa nele não pode ser compreendido de maneira direta a partir de fatores externos. (BOURDIEU, 1997a, p. 55)

Em outro trecho de Sobre a Televisão, que dialoga com o evidenciado acima, Bourdieu discute como esse microcosmo gera categorias de pensamento nos jornalistas, que baseadas em um habitus incorporado, faz com que os jornalistas possuam uma visão de mundo compartilhada que vai além das diferenças de opinião. É o mundo visto a partir do que o autor chama de metáfora dos óculos (BOURDIEU, 1997a):

Mas não é menos verdade que o campo jornalístico, como os outros campos, baseia-se em um conjunto de pressupostos e de crenças partilhadas (para além das diferenças de posição e de opinião). Esses pressupostos, os que estão inscritos em certo sistema de categorias de pensamento ... Não há discurso (análise científica, manifesto político etc.) nem ação (manifestação, greve etc.) que, para ter acesso ao debate público, não deva submeter-se a essa prova da seleção jornalística, isto é, a essa formidável censura que os jornalistas exercem, sem sequer saber disso, ao reter apenas o que é capaz de lhes interessar, de “prender sua atenção ... (BOURDIEU, 1997a, p. 67).

As afirmações de Bourdieu evidenciadas acima dialogam com o momento do documentário em que os agentes sociais entrevistados são questionados sobre sua profissão. Com exceção de Jânio de Freitas e Mino Carta, que se autointitulam, respectivamente, “biscateiro”27 e “pau para muitas obras”28, em um tom cômico, todos os profissionais questionados se intitulam “jornalistas”. Inicia-se, desse modo, na construção da narrativa do documentário, a inserção do campo jornalístico, haja vista 27 28

Fala de Jânio de Freitas. Transcrição do trecho: (05:37-05:38) Fala de Mino Carta. Transcrição do trecho: (05:40-05-43)


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que os seus agentes foram apresentados ao público que assiste. Trata-se da primeira manifestação do habitus profissional que carrega valores socialmente incorporados que se manifestam quando os profissionais são questionados por sua profissão. Na sequência, as visões de todos os membros do campo jornalístico dialogam ao definir o que é o próprio jornalismo. Ao realizar uma afirmação desta natureza, pode-se parecer óbvio que jornalistas são capazes de explicar o que um jornalista executa em sua profissão, mas mostra-se suficientemente interessante refletir sobre como tal modalidade de pensamento incorpora-se a partir do momento em que os profissionais frequentaram as redações diariamente; ou, como alega o próprio Bourdieu (2013, p. 38), constitui-se “um sinal incorporado de uma trajetória social”. Os trechos a seguir, extraídos do documentário, mostram como os jornalistas lidam com a organização e estruturação de informação:

Leandro Fortes:

Uma profissão muito antiga e também muito nobre, porque nós proporcionamos às pessoas a compreensão da sociedade, né... e do mundo onde elas vivem29

Mino Carta:

O jornalista, teoricamente, oferece aos leitores, no meu caso eu penso em leitores sempre, a oportunidade de confrontar opiniões, de... ouvir versões, e de, também conhecer aquilo que eu chamo de verdade factual, a fim de informar a sua própria posição em relação aos fatos da vida e do mundo30

Renata Lo Prete: O jornalista vê, escuta e conta. E se não enxergar com atenção e não escutar de fato, contar fica muito difícil.31

Bob Fernandes:

29

Fala de Leandro Fortes. Transcrição do trecho (06:07-06:14) Mino Carta. Transcrição do trecho (06:32-07:04) 31 Renata Lo Prete. Transcrição do trecho (07:06-07:15) 30


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Tem uma coisa que meio que de senso de dever, responsabilidade, é... quase que uma missão que você tem... você pode encarar um pouco assim. Porque o jornalismo pode ser isso e depende de quem faça, outras coisas. Pode ser negócio, pode ser pilantragem, pode ser escada para subir na vida, pode ser tudo...32

Luis Nassif:

Você tem aquele monte de informação, muita informação, sem tá organizada e estruturada não é nada! Então o papel do jornalista é pegar aquele monte de informação, aquele montante de informação, organizar e estruturar e dar uma lógica.33

José Roberto de Toledo:

Certamente passa por ser muito mais alguém que vai garimpar o que é importante e separar o joio do trigo e de preferência publicar o trigo e não o joio. Essa é a parte mais difícil.34

Todavia, como mostra o debate conduzido pelo documentário a partir das falas dos profissionais, não é qualquer informação existente na sociedade que consegue respaldo no campo jornalístico. A busca dos seus agentes é pelo novo. Jornalistas buscam o extraordinário. Maurício Dias contempla essa lógica:

Toda reportagem é uma pergunta. Toda notícia ela responde a uma pergunta. 35

Geneton Moraes Neto36 afirma que sua principal luta é “não perder a inocência que tinha quando começou a trabalhar como jornalista”. Moraes Neto ainda ressalta que os jornalistas, de tanto lidar com o que é extraordinário, passam a achar que os fatos cotidianos que são dissonantes de uma ordem simbólica são simplesmente ordinários. Bourdieu (1997a) comenta a procura constante dos jornalistas pela exclusividade dos fatos e a procura dos jornalistas por situações divergentes. “Eles se interessam pelo extraordinário, pelo que rompe com o ordinário, 32

Bob Fernandes. Transcrição do trecho: (07:16- 07:36) Luis Nassif. Transcrição do trecho: (07:37-07:48) 34 José Roberto de Toledo. Transcrição do trecho: (07:49-08:01) 35 Maurício Dias. Transcrição do trecho: (12:21-12:26) 36 Geneton Moraes Neto. Transcrição do trecho: (13:04-13:16) 33


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pelo que não é cotidiano – os jornais cotidianos devem oferecer cotidianamente o extracotidiano” (BOURDIEU, 1997a, p. 26). Em uma conjectura que dialoga ao mesmo passo em que tensiona as falas dos jornalistas, no desenvolvimento narrativo do documentário, a peça narra o processo inicial de formação do campo jornalístico. No enredo, o personagem Pila Jr., um dos protagonistas da dramaturgia, apara sua barba junto ao alfaiate e ao seu barbeiro, Tom, quando descobre um novo negócio, um local onde vende notícias. Pila Jr. mostra-se surpreso e curioso: (Pila Jr. está sentado, com o alfaiate medindo seus trajes e Tom trabalhando em sua barba) Pila Jr.: O que vem a ser uma agência de notícias, Tom Tom: Foi criada agora pouco senhor, fica aqui perto, ali no Centro. É lá onde vão chegar toda a qualidade de notícias. Onde serão examinadas, registradas e publicadas. O senhor Trombone é o chefe da agência. Ele a criou e mora lá. Transformou as salas maiores em escritórios, com mesas, bancadas, escrivaninhas. Alfaiate: Ele é meu cliente senhor, muito esperto. E tem outros admiráveis e espertos sob sua ordens. Tom: Ah sim, quatro outros repórteres. Pila Jr: Devagar, Tom. Temos uma bela palavra nova. O que vem a ser um repórter (O plano abre, foca nos três personagens. Tom e o Alfaiate fazem uma voz que satiriza as narrações jornalísticas e se insere na cena um GC televisivo. A música de fundo é semelhante àquela dos noticiários). Tom: Homens que trabalham nas ruas, e vão até qualquer lugar em busca da mercadoria. Alfaiate: Onde quer que as melhores notícias sejam fabricadas Tom: Ou divulgadas. Alfaiate: Por meio de troca ou comércio37

Questionada pelo documentarista, a jornalista Renata Lo Prete faz um complemento sobre a peça:

A peça faz uma leitura irônica e de uma crítica muito ácida ao fato de naquele momento a informação ter se transformado numa mercadoria38

37 38

Diálogo entre Pila Jr. e Tom. Decupagem: (15:28-15:37) Fala de Renata Lo Prete. Transcrição: (23:12-23:21)


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Em um momento mais avançado da narrativa teatral, o senhor Trombone descreve o que é O Mercado de Notícias. Nessa parte do roteiro, torna-se mais apreensível o fato de a peça ser importante para se discutir jornalismo: a dramaturgia demonstra as cadeias de relações que são necessárias para que se ocorra fluxo de informação, um dos condicionantes estruturais do campo jornalístico. (Os três estão em pé, discutindo no escritório d’O Mercado de Notícias) Trombone: Correspondentes pelo país Patranha: Todas as patentes e religiões Trombone: Repórteres e agentes Patranha: enviados... enviados que residem temporariamente em vários condados do rei Pila Jr: Isso é ótimo! Uma admirável cadeia de relações39

Um outro aspecto que pode ser relacionado com a cadeia de influencias é a sua relação com a verdade dos fatos, discussão melhor evidenciada no próximo tópico. Uma das manifestações do campo jornalístico que mais se torna evidente na fala dos jornalistas é a preocupação deste profissional com a busca por uma factualidade.

3.1.2 O jornalismo e a relação com os fatos Na montagem do documentário, Furtado busca entender o campo jornalístico e tensioná-lo. É interessante que o modo participativo (NICHOLS, 2016) no qual o cineasta se encaixa permite um diálogo, em sua intenção básica, com a abordagem de Bourdieu para os universos sociais: compreender as regras de funcionamento, as práticas sociais vigentes, as relações de força e os tensionamentos que fazem com que os agentes se disponham em um espaço estruturado de posições. Um dos grandes eixos do documentário que possibilita uma melhor compreensão do campo jornalístico, nessa condição, é a questão dos fatos. Traquina (2008) afirma que uma das definições fundamentais do jornalismo recai sobre a ideia de que tal campo trabalha com a “verdade dos fatos”. Não se pretende, aqui, entrar no vértice filosófico da questão da verdade, tema trabalhado por autores como Gomes (2009), porém

39

Diálogo entre Pila Jr, Trombone e Patranha. Decupagem: (26:32-26:35)


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busca-se refletir a respeito de como o campo se manifesta a partir dos questionamentos que Furtado propõe. Jorge Furtado utiliza casos pautados na mídia para questionar e tensionar o campo e problematizar os valores simbólicos incorporados pelos jornalistas. O primeiro caso evidenciado é o caso da Bolinha de Papel40. Em 2010, os meios de comunicação de massa passaram a pautar que o e então governador do Estado de São Paulo, José Serra41, fora submetido a uma tomografia após por ter sido agredido por um grupo de militantes. No entanto, cinco diferentes câmeras de televisão documentam que o político foi atingido apenas por uma bolinha de papel – possivelmente, vinda de um segurança de sua própria equipe; um homem negro, de camisa de camisa azul com mangas compridas.

(Imagens de arquivo, em ângulos diferentes, das emissoras de televisão que mostram uma bolinha sendo jogada em Serra) Jorge Furtado: Quatro segundos depois que o homem de azul e o homem de vinho são vistos lado a lado, a bolinha atinge Serra. (Outra imagem de arquivo, com um ângulo diferente) Jorge Furtado: Aqui também aparece a mão levantada, e a camisa cor de vinho. E ao lado dela, a manga azul do braço que joga a bolinha. Podemos afirmar com certeza que foi o segurança de Serra que jogou a bolinha de papel? E se nos quatro segundos que a câmera não mostra, um outro homem, também negro, também de camisa azul também de mangas compridas, chegou exatamente naquele ponto, jogou a bolinha e desapareceu? Quanto de certeza o jornalista precisa ter para acusar alguém?42

Numa perspectiva bourdieusiana, os membros do campo jornalístico, a partir de seus esquemas de percepção, respondem e legitimam mais uma manifestação de suas práticas, o habitus, a partir da resposta que dão ao caso. Mais uma regra de um universo simbólico compartilhado é mostrada a partir da fala dos agentes: a definição de que jornalistas trabalham com a factualidade. Essas

40

Ver Anexo E José Serra (1942-) é um político brasileiro afiliado ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Atualmente ocupa o cargo de Senador da República. 42 Fala de Jorge Furtado. Decupagem do trecho (20:56-21:32) 41


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categorias de compreensão de mundo tornam-se aparentes, por exemplo, nas visões de Leandro Fortes e de Renata Lo Prete:

100% [de certeza o jornalista deve ter]. Se não, não é informação jornalística! Esse é um... o trabalho jornalístico mexe com isso... 100%43 Em princípio 100% [de certeza o jornalista deve ter], na realidade é mais complicado do que isso, e sempre envolve alguma dose de aposta, na qual, às vezes você pode tropeçar mesmo agindo naquilo que você considera seu melhor discernimento44 Figura 4 – Montagem comprobatória de Furtado sobre o caso

(Fonte: O Mercado de Notícias)

A ideia de factualidade fica evidente nas falas dos jornalistas em vários pontos do documentário; ou seja, a visão que um jornalista deve atuar na busca por verdades que sejam factíveis com uma realidade fenomênica. A peça teatral que serve de fio condutor para o documentário, por seu turno, também instiga essa discussão em momentos a exemplo da cena na qual o personagem Pila Jr. entra em foco com a sua noiva Pecúnia e pede por notícias novas.

43 44

Fala de Leandro Fortes. Transcrição de trecho: (21:33-21:39) Fala de Renata Lo Prete. Transcrição de trecho: (21:43-21:59)


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(Pila Jr. entra com Pecúnia no local e se dirige a Trombone) Pila Jr: Princesa, este é O Mercado de Notícias. E este é o patrão. Eu peço que deixe a minha princesa ouvir as novidades, caro senhor Trombone Trombone: Senhor, todas essas notícias são igualmente certas e verdadeiras.45

Furtado utiliza esse momento da peça para discutir com os jornalistas entrevistados a questão dos fatos. Leandro Fortes ressalta a importância do fato no trabalho jornalístico, para o jornalista, o ponto fulcral da atividade jornalista centra-se no fato. É o nosso instrumento de trabalho, é o fato, tudo mais, a linguagem, a edição, é floreio. A nossa... o nosso elemento básico de trabalho é a verdade factual.46

Maurício Dias desenvolve o argumento acima, porém parte do princípio de que existem mediações modeladoras que são responsáveis pela interpretação dos fatos pelo público: Eu não acredito que haja um fato bruto na natureza. “Pega aquele fato ali, recolha e tal. Plante!”. Ah, tudo é interpretação.47

Bob Fernandes complementa a fala de Dias a respeito da interpretação e reitera a necessidade de o jornalista, como profissional responsável por lidar com a factualidade do mundo, saber realizar a intermediação entre critérios de isenção e a sua interpretação a respeito do plano dos acontecimentos.

Todo mundo tem sua coisa subjetiva, mas o ideal é que você vá o mais aberto possível. Porque pode acontecer um bilhão de coisas. Você vai cobrir uma invasão de um morro no Rio de Janeiro, você tem que ir aberto, pô. Você tem que ir, senão você vai enxergar pouco.48

A factualidade presente no discurso de legitimação da prática jornalística faz parte de uma característica do campo jornalístico que Bourdieu (1997a), como

45

Fala de Pila Jr. e Trombone. Decupagem do trecho (1:05:59- 1:06:10) Fala de Leandro Fortes. Trecho da transcrição (01:06:31- 01:06:42) 47 Fala de Mauricio Dias. Trecho da transcrição (01:06:42-01:06:52) 48 Fala de Bob Fernandes. Trecho da transcrição (01:06:53-01:07:07) 46


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mencionado anteriormente, denomina de óculos. “Os jornalistas têm óculos especiais a partir dos quais veem as coisas que veem. Eles operam uma seleção e uma construção do que é selecionado” (BOURDIEU, 1997a, p. 25). A metáfora é importante ao refletir-se sobre o fato de que as categorias de interpretação existentes na fala dos jornalistas constituem um habitus incorporado a partir de sua disposição no campo.

3.1.3 O jornalismo e seu antônimo, as práticas anti-jornalísticas

No

tópico

de

discussão

intitulado

Antijornalismo,

Jorge

Furtado

problematiza, a partir de uma fala do criador da Revista People, Richard Stolley, os critérios necessários para a criação de uma capa de sucesso: (música de fundo) (comentário de Furtado em voz over) (exibição de várias capas da Revista People) Furtado: Richard Stolley, um dos criadores da Revista People, definiu em 1974 quais eram seus critérios para compor uma capa de sucesso: “Jovem é melhor que velho. Bonito é melhor que feio. Rico é melhor que pobre. Televisão é melhor que música. Música é melhor que cinema. Cinema é melhor que esporte. Qualquer coisa é melhor que política. E nada é melhor que uma celebridade recentemente falecida.49

O debate introduzido na produção de Furtado sobre um tipo de jornalismo mais sensacionalista, ou, como apontado no próprio filme, sobre uma manifestação do chamado antijornalismo, dialoga de forma coesa com o conceito bourdiesiano de fatos-ônibus (1997a). Quando Bourdieu se refere ao campo jornalístico, os fatosônibus constituem-se um dos elementos destacados pelo autor. De acordo com o sociólogo francês, trata-se daquelas notícias que não são importantes para o interesse público, porém que mesmo assim são utilizadas no campo do jornalismo de forma frequente. O sociólogo ainda reitera que a futilidade desses fatos e a sua exibição constante no campo do jornalismo impede que este deixe de representar coisas que possuem real relevância social.

49

Fala de Furtado. Trancrição do trecho: (51:25-51:59)


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Os fatos-ônibus são fatos que, como se diz, não devem chocar ninguém, que não envolvem disputa, que não dividem, que formam consenso, que interessam a todo mundo, mas de um modo tal que não tocam em nada de importante. As notícias de variedades consistem nessa espécie elementar, rudimentar, da informação que é muito importante porque interessa a todo mundo sem ter consequências e porque ocupa tempo, tempo que poderia ser empregado pra dizer outra coisa. ... é que essas coisas tão fúteis são de fato muito importantes na medida em que ocultam coisas preciosas. (BOURDIEU, 1997a, p. 23)

A fala de Bourdieu vai direto ao encontro das declarações de Mino Carta e de Geneton Moraes Neto no documentário. Em termos práticos, as falas dos jornalistas entrevistados manifestam que o campo possui certa consciência dos valores de legitimação presentes no habitus que é incorporado pelos agentes sociais e, dessa forma, realiza sua auto-defesa: Então essa aspiração que vai ao encontro de uma manchete bombástica leva o jornalista a valorizar fatos que não merecem aquela manchete 50 Aquele buraco que existe entre a força da realidade e a realidade transcrita depois nos jornais ou na TV, frequentemente existe um abismo entre essas duas coisas e isso aí depõe contra o jornalismo e eu diria até que é um risco à sobrevivência do jornalismo.51

Nos depoimentos, os jornalistas argumentam que, no Brasil, tais notícias nomeadas por Bourdieu (1997a) como “fatos-ônibus” relacionam-se com o campo político e com um objetivo claro de ocultar coisas que seriam realmente importantes para o interesse público. No entanto, devido a um habitus incorporado – que faz com que os jornalistas possuam “óculos” especiais que os levam a ver certas coisas e deixem de ver outras – os influencia no processo de seleção e difusão das notícias. Essa conexão entre os processos de produção da notícia e o pensamento bourdieusiano são evidenciados também por Silva (2013). O ponto interessante a se refletir sobre a relação construída por Bourdieu (1997a) em relação aos “fatos-ônibus” é que o autor faz uma crítica muito sofisticada ao habitus incorporado pelos jornalistas e ao processo de seleção das notícias. O sociólogo afirma que o campo jornalístico possui vantagem em relação aos campos

50 51

Fala de Mino Carta. Transcrição: (52:37- 52:48) Fala de Geneton Moraes Neto. Transcrição: (52:49-53:07)


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cultural, intelectual e literário, pois a notoriedade pública, característica intrínseca do campo, contribui em grande escala para a difusão e distribuição de informação, o que “para os políticos e para certos intelectuais, é um prêmio capital” (BOURDIEU, 1997a, p. 66). Por conseguinte, o campo jornalístico legitima-se por ser uma espécie de mediador entre os acontecimentos cotidianos e a opinião pública; ou como afirma Bourdieu, por não existir “discurso (análise científica, manifesto político etc.) nem ação (manifestação, greve etc.) que, para ter acesso ao debate público, não deva submeterse a essa prova da seleção jornalística” (BOURDIEU, 1997, p. 67). Isso faz com que os jornalistas influenciem no processo de construção das notícias a partir de um habitus incorporado (SILVA, 2013); ou, em outros termos, faz com que tais agentes sociais utilizem seus óculos (BOURDIEU, 1997a) e selecionem fatos que não necessariamente são importantes em um viés de interesse público, mas, sim, eventos baseados em suas próprias visões de mundo. 3.1.4 O jornalismo e os tensionamentos extrínsecos com os outros campos

Um debate muito caro a este estudo materializa-se na cena do documentário em que os jornalistas são questionados sobre a posição do jornal52 em relação aos outros campos sociais. Nesse ponto do documentário, os “agentes do campo” debatem a relação entre o microcosmo do jornalismo e as diversas outras interfaces entre os diferentes campos. Bourdieu (1997a) propõe que o campo do jornalismo, apesar de se encontrar em tensionamento com os outros campos sociais – como o econômico, o político e o intelectual – possui autonomia relativa, ou seja, não pode ser interpretado à luz, por exemplo, das teorias de interpretação marxista ortodoxa, que remetem a uma explicação calcada na natureza econômica. O sociólogo deixa evidente a interpretação do campo jornalístico como um espaço de ação do jornalista disposto dentro do campo. Essa visão do campo como “relativamente autônomo” é explicitada de forma clara na fala dos agentes entrevistados no documentário e é evidenciada na discussão deles sobre os tensionamentos que o campo jornalístico enfrenta de forma intrínseca e extrínseca às suas limitações; isto é, nos embates existentes entre o próprio campo e os outros

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Quadro de transição: A posição do jornal (35:00)


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campos sociais. Na fala dos agentes sociais entrevistados, é expressiva a noção de autonomia e tensionamento. A resposta de José Roberto de Toledo ao ser questionado a respeito da frase de Millor Fernandes – “a imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados” – explicita a compreensão do jornalista em relação à autonomia relativa da imprensa. Toledo debate, a partir do viés de seus “óculos” de jornalista (BOURDIEU, 1997a), o papel do campo jornalístico: Imprensa é oposição o resto é secos e molhados Não no sentido de fazer oposição partidária ao governo, ou a qualquer governo, mas no sentido de trazer o ponto de vista oposto ao confronto... provoca um confronto com o que é estabelecido, com o que é o que deveria ser o normal, ou o aceitável no senso comum. Justamente pra provocar dúvida, porque se você não tiver dúvida, você não sai do lugar. 53

Paulo Moreira Leite argumenta a partir da mesma lógica e deixa manifesta a capacidade do campo jornalístico de influenciar os outros campos constituídos na sociedade:

Os jornalistas não gostam de falar disso, mas imprensa é poder. Ela é poder. Não é que ela cobre o poder, “nós cobrimos os fatos, andando na rua, cai o fato eu explico”, não! Você vai atrás de alguns fatos, não vai atrás de outros fatos. Você publica alguns fatos, não publica outros. Você checa muito um fato, e você não checa outro. Um editor que não quer publicar uma notícia e ele não quer dizer que ele não quer publicar uma notícia, ele fala: “vamos checar mais uma vez”54

Mino Carta promove uma autocrítica do campo ao problematizar a crença existente no imaginário popular da imprensa como imparcial. O jornalista evidencia que a mídia no Brasil possui fortes condicionamentos políticos – um notório tensionamento entre campos sociais.

Os jornais repercutem o que interessa a eles, quer dizer, a verdade factual, ele não repercute se não serve ao raciocínio deles. Não é assim na Inglaterra, não é assim na Itália, não é assim na França.55

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Fala de José Roberto de Toledo. Transcrição do trecho: (38:12- 38:34) Fala de Paulo Moreira Leite. Transcrição do trecho: (40:10-40:36) 55 Fala de Mino Carta. Transcrição do trecho: (36:12-36:26) 54


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A influência do campo jornalístico e os tensionamentos com os campos político e econômico é discutida por Bourdieu a partir da ideia de constituição de um microcosmo: trata-se de um espaço “muito heterônomo, muito fortemente sujeito às pressões comerciais existentes, exerce, ele próprio, uma pressão sobre todos os outros campos, enquanto estrutura” (BOURDIEU, 1997a, p. 26). Tal argumento de Bourdieu se mostra aplicável no próprio discurso de Paulo Moreira Leite, que descreve, de forma bastante precisa, os tensionamentos entre os diferentes campos em discussão no contexto brasileiro:

Tem uma coisa que é poder. Que é maior que é maior que interesse. Eu acho que o Brasil essa turma esses 1%, que no Brasil eu acho que é 0,1%... Eles têm um sistema de poder que o pressuposto é uma concentração muito grande da riqueza, muito grande. Quando essa riqueza se desconcentra, automaticamente, vão surgindo sinais de perda de poder que podem se transbordar. Nesse governo aí foram abertas algumas brechas, algumas coisas foram modificadas, mas (indecrífravel) o sistema geral continua o mesmo. Eu acho que é um projeto de país que não tá na cabeça das pessoas. A cabeça das pessoas é... sabe, é um projeto de país exclusivo, um país hierarquizado, sabe, é aquele país onde você tem assim, sabe, um monte de empregadas domésticas, sabe... (...) será que um dia vai mudar um pouco 56

Esse diálogo presente entre as ideias de Bourdieu sobre o jornalismo e a visão dos jornalistas entrevistados no documentário O Mercado de Notícias se mostra importante e pode servir como fonte de muitas discussões. A ideia de “autonomia relativa” proposta pelo sociólogo é plausível para que se possa complexificar as relações existentes entre jornalismo, política e economia – além de problematizar o pensamento reducionista de que a produção e a difusão de notícias funciona apenas como um mero reflexo de forças econômicas. Uma das partes mais importantes desta análise que, de certa maneira, já foi discutida no primeiro capítulo, evidencia que o pensamento de Bourdieu serve de forma útil para aplicação no campo do jornalismo. Trata-se da interpretação do sociólogo para o jornalismo como um campo constituído de agentes que tensionamse entre si e tensionam, também, outros agentes sociais, pois esses agentes possuem ação dentro do campo, e por mais que sejam moldados por ele, também o moldam. Isto é, o entende-se que o jornalismo está em constante tensionamento e em

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Fala de Paulo Moreira Leite. Transcrição do trecho: (1:23:22)


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constante transformação. A fala dos treze jornalistas entrevistados no documentário, em diálogo com a peça teatral que serve de base para o roteiro do filme, propicia uma visão clara de um “estruturalismo construtivista” no pensamento bourdieusiano (VALLE, 2007) que mostra agentes críticos com o próprio campo. Tal circunstância fica evidente na decisão de Jorge Furtado de caracterizar o último tópico de questionamento aos jornalistas como a “Revolução”57, no qual os profissionais ouvidos demostram possuir noção das mudanças em seu campo, causadas por tensionamentos com o campo político, com o campo do poder e com o campo tecnológico – o que tem mudado os modos de visão dos membros dispostos no próprio microcosmo. Constitui-se, assim, uma prova evidente de que um habitus não é engessado em um indivíduo. É interessante, nessa perspectiva, observar o diálogo entre as falas dos jornalistas entrevistados sobre o assunto em questão.

Fernando Rodrigues argumenta: O que tá acontecendo é que a gente passa por um momento agora no início do século XXI de disrupção de uma indústria de mídia jornalística no mundo, o modelo de negócio que sustentou durante muito tempo várias empresas de mídia jornalística já não é mais tão bom como foi, alguns jornais simplesmente desapareceram.58

José Roberto de Toledo, por sua vez:

Eu acho que a minha geração é a última geração que vai ler jornal em papel, todas as pesquisas mostram que as gerações subsequentes com menos de 30 anos, ninguém assina jornal. Ninguém. Então não tem como sobreviver no papel. 59

Renata Lo Prete complementa:

Eu passei muitos anos da minha vida que o meu início de dia era uma leitura sequencial de três ou quatro jornais. Hoje, por exemplo, isso que eu te falei já mudou, meu primeiro contato com o informação normalmente é rolando a timeline do Twitter60

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1:26:00 Fala de Fernando Rodrigues. Trecho da transcrição: (1:26:04-1:26:22) 59 Fala de José Roberto de Toledo. Trecho da transcrição: (1:26:23-1:26:37) 60 Fala de Renata Lo Prete. Trecho da transcrição: (1:26:38-1:26:55) 58


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Fernando Rodrigues novamente: Tá aparecendo, tá surgindo, uma mídia nova, também, que ainda não descobriu um formato pra se sustentar de maneira perene na internet. Então nós vamos saber isso ao longo do tempo. Dizem que é muito difícil entender uma revolução quando ela tá acontecendo, não é...61

Jânio de Freitas: A internet não tem nenhuma culpa pelo que está acontecendo com os jornais diários, daqui e de qualquer lugar. A culpa tá nos jornais 62

Renata Lo Prete conclui: Que ele vai morrer, todo mundo sabe. E é menos importante, eu acho a gente saber exatamente quando vai morrer do que a gente adquirir cada vez mais a consciência de que o nosso negócio não é o papel 63

Assim como o cineasta Jorge Furtado, que por opções de montagem cinematográfica decidiu encerrar seu documentário com o tópico “Revolução”, este estudo, por opções metodológicas e conceituais, também se finaliza neste tópico. A última frase da jornalista Renata Lo Prete ressalta que o fim do papel não irá culminar no fim do jornalismo. Ser jornalista, pela complexidade aqui mostrada, vai muito além disso de uma plataforma tecnológica de ação. Um estudo que tenta entender a construção dessa identidade a partir de categorias sociológicas não deve tentar esgotar a discussão e, sim, estimular o pensamento de que os campos sociais estão em constante tensionamento. Por isso, o futuro está no campo das possibilidades.

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Fala de Fernando Rodrigues. Trecho da transcrição: (1:26:56-1:27:13) Fala de Janio de Freitas. Transcrição do trecho: (1:27:14-1:27:21) 63 Fala de Renata Lo Prete. Transcrição do trecho: (1:27:24-1:27:38) 62


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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A metáfora da Sociologia, que para Bourdieu deve ser um esporte de combate, mostra-se extremamente importante em tempos de cólera e intolerância como os dias atuais. Necessita-se enxergar as estruturas invisíveis que nos cercam, entender seus mecanismos e como isso afeta a vida das pessoas e o convívio em sociedade. É como afirma Renato Ortiz (2013 apud Octávio Ianni) na sinopse de A Sociologia de Bourdieu: “todo intelectual tem um demônio, e sem essa presença obsessiva, seu trabalho seria inócuo”. Talvez o demônio de Bourdieu tenha sido a suspeita, o questionamento e o estranhamento do mundo social e as suas relações intrínsecas. O estudo caminhou nessa direção, na tentativa de realizar uma análise de uma representação identitária construída a partir de um filme documentário sobre um campo que possui importância fundamental em relação aos outros campos sociais e com a constituição da sociedade em si: o jornalismo. Entender os valores simbólicos compartilhados, as categorias de pensamento, os costumes e os modos de enxergar o mundo social – ou, como o próprio Bourdieu (1997a) costuma chamar, os óculos – permite uma compreensão mais ampla dos mecanismos de funcionamento do campo e possibilita uma autocrítica constante no modos operandi da profissão. Do ponto de vista da construção do Capítulo 1, a questão da pesquisa e compreensão da trajetória, das nuances e do cerne do pensamento de Bourdieu foi crucial para a sequência do trabalho. O autor é um daqueles pensadores que sempre deve-se continuar estudando, lendo e relendo, pois a complexidade de seu edifício teórico sempre acrescenta mais e fornece nuances de raciocínio sofisticadas, que exigem um olhar atento e percepção sagaz. O espírito crítico de um sociólogo que possui trajetória singular e influência inquestionável na Teoria Social do século XX deveria ser incorporado em forma de habitus no cotidiano de muitos profissionais, não apenas da Sociologia, mas das diversas áreas das Ciências Humanas que têm por objetivo entender as complexidades da sociedade. A Sociologia bourdieusiana tem em suas origens uma elaboração teórico-conceitual multidisciplinar, com influências da Filosofia, da Educação e da Antropologia, e é importante que essa multidisciplinaridade continue se estabelecendo e que as ideias de Bourdieu possam influenciar e colocar em


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tensionamento diversas disciplinas, como as Ciências da Comunicação e, consequentemente, os Estudos em Jornalismo. A visão do sociólogo francês tem sido operacional para o estudo e a pesquisa das Teorias do Jornalismo e das Teorias da Comunicação, pois fornece subsídios conceituais e teóricos para pensar no universo dos meios de comunicação de massa, seu funcionamento e as suas problemáticas. Nesse sentido, há bons trabalhos publicados sobre o assunto, como Barros Filho e Martino (2003), Silva (2013) e Carvalho (2017). A pesquisa sobre o documentário em si, sua estrutura e as categorias de Nichols (2016) mostraram-se interessantes para realizar uma discussão mais aprofundada do objeto de estudo e enxergá-lo de uma maneira mais crítica e, também, apreender melhor as escolhas do cineasta Jorge Furtado para a construção da narrativa. Aplicar os conceitos de habitus e de campo social no estudo de um documentário foi um desafio, porém a interface entre a Teoria da Prática e a produção de Jorge Furtado rendeu à pesquisa conclusões pertinentes sobre os conceitos. O próprio documentário, por si, ao ser analisado a partir de uma vertente bourdieusiana, nos fornece elementos que provam que habitus e campo social não são conceitos deterministas, que reduzem os agentes sociais a um mero papel de suporte em uma macroestrutura. É evidente que as forças sociais fundamentadas por uma estrutura objetiva constroem uma visão de mundo e costumes compartilhados, porém os agentes possuem categorias de percepção e apreciação que os permitem liberdades de ação e tensionamento. Essa relação é discutida por Valle (2007) ao argumentar sobre o estruturalismo construtivista bourdieusiano. Para a pesquisadora, Bourdieu propõe que por mais que os sistemas simbólicos como linguagens, mitos e estruturas objetivam responsáveis por, de certa forma, moldar os agentes dispostos nos variados campos, estes possuem categorias de pensamento e acção que também tencionam as estruturas sociais. Nesse sentido, o documentário mostra como o campo social e o habitus também estão em tensionamento constante, ao discutir e tentar entender a visão dos próprios membros do campo jornalístico sobre as mudanças existentes na profissão. Este tem se encontrado em tensionamento com o campo tecnológico e econômico, o que faz com que alguns valores da profissão tenham se modificado. Como evidenciado na fala da jornalista Renata Lo Prete, ouvida no documentário, não é, por


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exemplo, devido ao fato de o jornalismo impresso ter acabado que a identidade jornalística acabará. Que ele vai morrer, todo mundo sabe. E é menos importante, eu acho a gente saber exatamente quando vai morrer do que a gente adquirir cada vez mais a consciência de que o nosso negócio não é o papel 64

Ser jornalista se define a partir de amplas categorias de pensamento, construções sociais, valores simbólicos, imaginários, que não estão inertes. A sociedade constitui-se um grande conjunto de campos em tensionamento e compreender o funcionamento dessas estruturas faz com que existam profissionais mais críticos sobre o seu próprio campo. Talvez tenha sido nesse sentido que a pesquisa obteve os seus melhores resultados: uma tentativa de entender as representações de uma identidade a partir de um viés muito específico, que é o do campo e do habitus, além de suas complexidades intrínsecas a partir de uma construção cinematográfica que coloca em questionamento o próprio campo e fornece elementos para a construção de uma identidade jornalística.

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Fala de Renata Lo Prete. Transcrição do trecho: (1:27:24-1:27:38)


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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMBRÓSIO, M. C.; GAVIRATI, V. F. ; SIQUEIRA, G. S. . Cinema e Jornalismo: Uma análise da representação da prática jornalística em filmes. In: XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte, 2014, Belém. Anais do XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Norte. São Paulo: Intercom, 2014. v. 13. BERBEL, G. S.; MACIEL, D. B. A Representação do Eu na Vida Cotidiana. Enciclopédia de Antropologia (EA), 2015 (Verbete). BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 12.ed. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 2009. ________________. Pierre Bourdieu entrevistado por Maria Andréa Loyola. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2002. ________________. Sobre a televisão. Tradução: Maria Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Zahar, 1997a. ________________. A influência do jornalismo. Tradução: Maria Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Zahar, 1997b. BARROS FILHO, Clóvis de, MARTINO, Luis Mauro Sá. O habitus na comunicação. São Paulo: Paulus, 2003. CARVALHO, E. S. Contribuições de Pierre Bourdieu para o Campo Jornalístico. In: In: Anais do CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, XL., 2017, Curitiba (PR). Anais... Curitiba: Universidade Positivo, 2017. 1-13. DARNTON, Roberto. O beijo de Lamourette: mídia, cultura e revolução. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. FURTADO, Jorge. Mercado de Notícias. O jornalismo no divã do cinema. Disponível em: <http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/98/documentario-dejorge-furtado-o-mercado-de-noticias-546.html>. Acesso em: 01 nov. 2017. ____________________. O projeto. Disponível em http://www.omercadodenoticias.com.br/o-projeto/>. Acesso em: 01 nov. 2017.

<

____________________. A peça. Disponível em http://www.omercadodenoticias.com.br/a-peca/#sinopse. Acesso em: 01 nov. 2017. ____________________. "Mercado de notícias", de Jorge Furtado, estreia em mostra paralela do BIFF. Disponível em: < http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/diversao-e-


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arte/2014/09/01/interna_diversao_arte,444981/mercado-de-noticias-de-jorge-furtadoestreia-em-mostra-paralela-do-biff.shtml>. Acesso em: 01 nov. 2017. GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis, RJ: Vozes, 2010. GOMES, Wilson. Jornalismo Fatos e Interesses: Ensaios de teoria do jornalismo. Florianópolis: Insular, 2009. 112 p. MICELI, Sérgio. Bourdieu e a renovação da sociologia contemporânea da cultura. In: Tempo Social. Revista de Sociologia da Universidade de São Paulo. Departamento de Sociologia, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. Vol. 15. N. 1, abril, 2003. MARTINS, Maurício Vieira. Bourdieu e o fenômeno estético: ganhos e limites de seu conceito de campo literário. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 19. N. 56, outubro, 2004. LOPES, F. L.. Construção da identidade jornalística pelo cinema: uma análise das representações do jornalista investigativo nos filmes Todos os Homens do Presidente (1976) e Spotlight (2015). In: INTERCOM 2016, 2016, São Paulo. Anais do XXXIX Congresso Nacional Intercom, 2016. p. 1-15. ORTIZ, Renato. A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’água, 2013. RAMONET, Ignacio. A tirania da comunicação. 3.ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 2004. SANTOS, Macelle Khouri. Um olhar sobre jornalismo: Análise da Representação do Jornalismo no Cinema Hollywoodiano, de 1930 a 2000. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, 2009. SILVA, Marcos Paulo da. As dissonâncias cotidianas nas rotinas dos jornais: o habitus jornalístico e a atribuição de um sentido hegemônico às notícias. Estudos em Jornalismo e Mídia (UFSC), v. 10, p. 69-84, 2013. ___________. Campo jornalístico e seleção noticiosa: uma leitura da concepção de noticiabilidade a partir da sociologia dos campos de Pierre Bordieu. In: Anais do CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, XXXV., 2012, Fortaleza (CE). Anais... Universidade de Fortaleza, 2012. NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. 6.ed. São Paulo: Papirus, 2016. TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo. A tribo jornalística – uma comunidade interpretativa transnacional. Florianópolis: Insular, 2. ed., 2008. 216p.


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VALLE, Ione Ribeiro. A obra do sociólogo Pierre Bourdieu: uma irradiação incontestável. Educação e Pesquisa, v.33, n.1, p.117-134. São Paulo: jan/abr 2007. VARGAS, Renato Miranda. As narrativas do projeto “O Mercado de Notícias”. 2015. 65 f. Monografia (Graduação em Publicidade e Propaganda). Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2015.


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ANEXOS

ANEXO A – CD-DVD do documentário65

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A cópia do documentário para o CD-DVD foi realizada para fins estritamente acadêmico, de modo a complementar a análise desenvolvida nesta monografia. Não está autorizada qualquer utilização para exibição.


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ANEXO B – Sinopse: O Mercado de Notícias

O filme traz os depoimentos de treze importantes jornalistas brasileiros sobre o sentido e a prática de sua profissão, as mudanças na maneira de consumir notícias, o futuro do jornalismo, e também sobre casos recentes da política brasileira, onde a cobertura da imprensa teve papel de grande destaque. O surgimento do jornalismo, no século 17, é apresentado pelo humor da peça “O Mercado de Notícias”, escrita pelo dramaturgo inglês Ben Jonson em 1625. Trechos da comédia de Jonson, montada e encenada para a produção do filme, revelam sua espantosa visão crítica, capaz de perceber na imprensa de notícias, recém-nascida, uma invenção de grande poder e grandes riscos.

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/o-projeto/)


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ANEXO C – Sinopse: The Staple of News

A peça se passa em um dia, em Londres, em 1625. Um homem, Pila Pai, simula a própria morte e volta, disfarçado de mendigo, para vigiar os passos do filho, Pila Júnior. No exato dia em que chega a sua maioridade, Pila Júnior começa a torrar sua fortuna, com roupas de luxo, jantares e festas. Faz uma semana que ele recebeu, através de um mendigo, a notícia de que seu pai havia morrido em terras distantes. Pila Pai, antes de partir em sua última viagem, deixou documento firmado e entregue ao advogado Gazua, condicionando a posse de sua herança ao casamento com Pecúnia, riquíssima herdeira. Tio Pila, usurário, vive às custas de Pecúnia. Ele vende os suprimentos de sua cozinha e empresta dinheiro a juros. Tio Pila mantém Pecúnia e suas amas – Hipoteca, Norma, Promissória e Taxa – em cativeiro, vivendo em condições precárias. Ele administra a casa com mão de ferro e a ajuda de Notário. Em Londres a novidade é um Mercado de Notícias, comandado pelo senhor Trombone, seu sócio Patranha e seus repórteres. A agência cria um intenso comércio de notícias e, para que mais prospere, o senhor Trombone pretende em casamento a senhorita Pecúnia, também cortejada por Pila Junior. Enfim, todos querem Pecúnia. Pila Júnior descobre como funciona e para que serve uma agência de notícias e nela emprega seu amigo, Tom, um barbeiro. O Pai desaprova o comportamento do filho perdulário, sua vida de dissipação e luxo com seus amigos boêmios, um grupo de desaforados que vive nas abas da nobreza e da nova burguesia: Almanaque (o médico), Timorato (o militar), Madrigal (o poeta) e Heraldo (o homem de sociedade). Despindo a fantasia de mendigo, Pila Pai revela sua identidade, seus planos e impõe ao filho o castigo de viver como mendigo. Comovido com a solidariedade (não inteiramente desinteressada) do filho na disputa contra Gazua, o advogado inescrupuloso, e tendo expulsado os amigos oportunistas do filho, o pai acaba por perdoá-lo, entregando-lhe a mão da cobiçada Pecúnia. Tio Pila


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arrepende-se de sua avareza, liberta seus cães. Os oportunistas fogem, Gazua é processado e preso. A paz se restaura no casamento de Pila Júnior e Pecúnia.

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/a-peca/#sinopse)


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ANEXO D – BEN JONSON

Ben Jonson (Westminster, 11 de Junho de 1572 — Londres, 6 de Agosto de 1637) foi um dos grandes dramaturgos da Renascença inglesa, contemporâneo de Shakespeare. Entre suas peças mais conhecidas estão Volpone e O Alquimista. Embora sem curso universitário, Ben Jonson se tornou um dos homens de maior cultura de seu tempo, chegando a merecer títulos honorários das Universidades de Oxford e Cambridge. Dotado de uma genialidade multiforme, sua obra conta não apenas com peças teatrais, mas com a poesia lírica, o epigrama, a crônica, o gênero epistolar, as traduções e até a gramática. Foi também mestre na produção de mascaradas, entretenimentos festivos que utilizavam a música, a dança e o canto em cuidadosa coreografia. Falava grego, latim, espanhol, italiano, além de inglês e francês. Além disso, teve uma vida totalmente aventuresca: foi pedreiro, soldado, professor e ator. Ben Jonson faleceu em agosto de 1637 e está enterrado na Abadia de Westminster, em Londres. (Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/a-peca/#sinopse)


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ANEXO E – O CASO DA BOLINHA DE PAPEL

No dia 20 de outubro de 2010, pouco antes do segundo turno da eleição presidencial brasileira, a campanha eleitoral foi marcada por um incidente. O candidato de oposição, José Serra, interrompeu sua agenda para ser submetido a uma tomografia e a exames clínicos. O motivo: uma suposta agressão por militantes governistas, amplamente divulgada nos veículos de comunicação, nas redes sociais e no programa de televisão do candidato. Foram muitas as tentativas, nos telejornais e nas redes sociais, de provar que algum objeto pesado realmente atingira o candidato, nenhuma com sucesso. O fato é que, poucos minutos antes da suposta agressão, o candidato foi atingido por uma bolinha de papel. Este fato foi documentado por, pelo menos, cinco câmeras de televisão. A imprensa, que tanto discutiu a agressão que ninguém viu, nunca se interessou por investigar quem foi o homem que, diante de cinco câmeras de tevê, jogou a bolinha de papel em José Serra. (Fonte: papel)

http://www.omercadodenoticias.com.br/casos-jornalisticos/#bolinha-de-


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ANEXO F – Bob Fernandes

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)

Bob Fernandes, natural de Barretos (SP), é descendente de baianos e foi na Bahia que iniciou sua carreira e passou uma grande parte de sua vida. É formado em jornalismo pela Universidade Federal da Bahia. Trabalhou entre 1978 e 1979 na Rádio Jornal do Brasil. Entre 1979 e 1982, foi repórter da sucursal da revista Veja no Nordeste, e escreveu colunas para o jornal Tribuna da Bahia. Entre 1983 e 1986 foi repórter do Jornal do Brasil, em Brasília. Foi sub-editor da Revista Status em São Paulo. Em 1988, foi repórter da Folha de S. Paulo, na sucursal de Brasília. Entre abril de 1989 e dezembro de 1991 foi diretor da sucursal da revista IstoÉ, em Brasília, tornando-se correspondente da revista nos Estados Unidos entre 1992 e 1993. Nessa época cobriu as eleições presidenciais entre George Bush e Bill Clinton. Dos EUA, foi para a Angola cobrir a guerra civil do país. Também cobriu diversas Copas de Mundo e Olimpíadas.


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De volta ao Brasil, foi repórter especial da Folha de S. Paulo até se tornar um dos fundadores da revista Carta Capital, em 1994. Foi editor da revista por dois anos e seu editor-chefe por oito, tendo saído dessa revista em dezembro de 2005. Atualmente é editor-chefe do site Terra Magazine e comentarista de política do Jornal da Gazeta, na TV Gazeta, e da Rádio Metrópolis, de Salvador. É co-autor de O complo que elegeu Tancredo (Editora JB, 1985), junto com Ricardo Noblat, Gilberto Dimenstein. José Negreiros, e Roberto Lopes; e autor de Bora Bahêeea!, a história do Bahia contada por quem a viveu (Editora DBA, 2003), da coleção Camisa 13.

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)


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ANEXO G – Cristiana Lôbo

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)

Cristiana Lôbo nasceu em Goiânia (GO), em 1958. Estudou Comunicação Social na Universidade Federal de Goiás (UFG). Ainda estudante, começou a escrever para a Folha de Goiás. Em 1978, foi contratada como estagiária, para a editoria de Política. Em 1979, foi para a sucursal do jornal O Globo, em Brasília, onde ficou dois anos cobrindo vários Ministérios. Em 1984, passou a fazer a cobertura do Congresso Nacional. Dois anos depois, tornou-se assistente de Tereza Cruvinel e passou a escrever na coluna Panorama Político do jornal O Globo. Em 1992, trabalhou com Ricardo Boechat. Nesse mesmo ano, assumiu uma coluna no jornal O Estado de S.Paulo, onde ficou até 1998. Em seguida, passou para a Globo News, e desde então comanda o programa Fatos e Versões, que trata dos bastidores da política em Brasília. Por cobrir o Palácio do Planalto durante muito tempo, já acompanhou várias viagens de presidentes, como a de João Baptista de Figueiredo à África, a de José Sarney à China, a de Fernando Collor à Portugal e a de Fernando Henrique Cardoso à Índia.


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Em

2011,

sagrou-se

finalista

do

Prêmio

Comunique-se

categoria Jornalista Nacional Mídia Eletrônica, por sua atuação na Globo News. (Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)

na


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ANEXO H – Fernando Rodrigues

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)

Fernando Rodrigues nasceu em 1963 e formou-se em jornalismo na Universidade Metodista de São Paulo, em São Bernardo do Campo, em 1985. Entre 1986 e 1987, fez mestrado em jornalismo internacional na City University, em Londres, no Reino Unido. Na Folha de S.Paulo desde 1987, foi repórter, editor de Economia, correspondente em Nova York (1988), Tóquio (1990) e Washington (1990-91). Na sucursal de Brasília da Folha desde 1996, assina a coluna Brasília, na página 2 do jornal, às quartas e sábados. Mantém uma página de política no UOL desde o ano 2000 com informações estatísticas e analíticas sobre eleições, pesquisas de opinião e partidos políticos. Em 2007 recebeu uma fellowship da Fundação Nieman, na Universidade Harvard (Cambridge, MA, nos Estados Unidos). É autor dos livros Políticos do Brasil (Publifolha, 2006), Racismo Cordial (Ática, 1994) e coautor de Os Donos do Congresso – A Farsa na CPI do Orçamento (Ática,1995), vencedor do Prêmio Jabuti de Livro-reportagem 1995. Ganhou 4 prêmios Esso: Prêmio Esso de Jornalismo de 1997 (reportagem sobre a compra de votos na votação da emenda da reeleição); Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa em 2002 (reportagens e o banco de dados Controle Público,


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que tem mais de 6.000 declarações de bens de políticos); Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa em 2003 (relato sobre venda reportagem na mídia do Estado do Paraná) e Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa em 2006 (livro e site Políticos do Brasil). O trabalho Controle Público (que atualmente é o Políticos do Brasil) também foi premiado em 2002 com o Líbero Badaró de Webjornalismo e com o Prêmio para Internet da Fundación Nuevo Periodismo Internacional, presidida pelo escritor colombiano Gabriel García Márquez. (Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)


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ANEXO I – Geneton Moraes Neto

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)

Geneton Moraes Neto nasceu no Recife (PE), em 1956. Iniciou a carreira de repórter com 16 anos, no Diário de Pernambuco. Formou-se em Jornalismo na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), em 1977. Entre 1975 e 1980, foi repórter da sucursal Nordeste do jornal O Estado de S. Paulo. Participou do movimento de cinema Super-8 de Pernambuco. Passou uma temporada em Paris, em 1980/1981, estudando Cinema na Sorbonne. De volta ao Brasil, entrou na TV Globo Nordeste (PE) em 1981 como repórter e editor. Em 1984/85, outra temporada europeia, dessa vez como editor freeelancer no escritório da Rede Globo em Londres. Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1985 como editor do RJTV. Em maio de 1986, tornou-se editor-executivo do Jornal da Globo. Em 1987, passou a colaborar regularmente com o caderno Idéias, do Jornal do Brasil, com entrevistas com escritores brasileiros e estrangeiros. De volta à Globo em 1988, trabalhou na edição do programa Pequenas Empresas, Grandes Negócios. Entre 1990 e 91, foi editor-executivo do Jornal Nacional. Em seguida, foi para o Fantástico e em 1994 passou a editor-chefe do programa.


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Em 1995, novamente em Londres, atuou no escritório da TV Globo. Em, seguida, trabalhou como correspondente em Londres do jornal O Globo e da Globonews, além de gravar e editar regularmente entrevistas para o programa Milênio. Retornou ao Brasil em 1998, quando fez parte da equipe do programa Muvuca, comandado por Regina Casé. Em setembro do mesmo ano, voltou a ocupar o cargo de editor-chefe do Fantástico. Em 2006, abriu mão do posto de editor-chefe do Fantástico e passou a se dedicar exclusivamente à reportagem.Transferiu-se para a Globonews em 2009, onde passou a entrevistar personalidades de várias áreas para o programa Dossiê Globonews. Com as entrevistas com os generais Newton Cruz – ex-chefe do SNI – e Leônidas Pires Gonçalves – ex-chefe do DOI-CODI e ex-ministro do Exército – , ganhou o Prêmio Embratel de Telejornalismo, em 2010. Dirigiu os documentários: Canções do exílio – a labareda que lambeu tudo (2010, para o Canal Brasil), e, pela Globonews, Garrafas ao Mar – a Víbora Manda Lembranças (2012), com entrevistas gravadas ao longo de vinte anos de convivência com o jornalista Joel Silveira; e Dossiê 50 – Comício a Favor dos Náufragos (2013), com gravações feitas com todos os onze jogadores que enfrentaram a Uruguai na decisão da Copa de 1950, no Maracanã. É autor dos livros: Caderno de Confissões Brasileiras – Dez depoimentos, palavra por palavra (Comunicarte, 1983); Cartas ao Planeta Brasil (Revan, 1988); Hitler-Stalin: o Pacto Maldito (Editora Record, 1990) e Nitroglicerina Pura (Record, 1992), em parceria com Joel Silveira; Dossiê Drummond (Globo, 1994 e 2007); Dossiê Brasil: As histórias por trás da história recente do Brasil (Objetiva, 1997); Dossiê 50: um repórter em busca dos onze jogadores que entraram em campo para serem campeões do mundo em 1950, mas se tornaram personagens do maior drama da história do futebol brasileiro (Objetiva, 2000 e Editora Maquinária, 2013); Dossiê Moscou: Um repórter brasileiro acompanha o desfecho da mais fascinante reviravolta política do século XX: O dia em que começou a busca por uma nova utopia (Geração Editorial, 2004); Dossiê Brasília: os segredos dos presidentes (Globo, 2005); Dossiê História (Globo, 2007); e Dossiê Gabeira: o filme que nunca foi feito (Globo, 2009). Em 2012, recebeu da Academia Brasileira de Letras a Medalha João Ribeiro, concedida a personalidades que se destacam na área da cultura.


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ANEXO J – JANIO DE FREITAS

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Janio de Freitas iniciou como jornalista no Diário Carioca. Desde então foi diagramador, repórter, fotógrafo, redator, editor e reformador de jornais (Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Última Hora-RJ, nestes dois últimos como diretor-geral). Trabalhou também nas revistas Manchete e O Cruzeiro. Como colunista do jornal Folha de S.Paulo, criou uma modalidade de comprovação de fraudes em concorrências de obras públicas, revelando e anulando licitações de bilhões de dólares. Recebeu numerosos prêmios no Brasil e no exterior, como o Prêmio Internacional de Jornalismo Rei de Espanha. Entre outros, recebeu também a Medalha Chico Mendes, concedida aos que se destacam na luta pelos direitos humanos e por uma sociedade mais justa.

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ANEXO K – José Roberto de Toledo

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José Roberto de Toledo é jornalista, formado pela ECA/USP em 1986. É um dos fundadores da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, da qual é o atual presidente. É colunista de política do jornal O Estado de S.Paulo, em cujo portal mantém o blog Vox Publica. Criou e coordena o Estadão Dados, primeiro núcleo de jornalismo de dados da imprensa brasileira. É também comentarista do telejornal RedeTV News e entrevistador do programa É Notícia. Trabalhou por 13 anos na Folha de S.Paulo, onde atuou como editor da coluna Painel de 1991 a 1996, e como repórter especial de 1996 a 2000. Criou e foi editor-chefe do Jornal do Terra, no portal do mesmo nome, de 2002 a 2006. Pioneiro das técnicas de Reportagem com Auxílio do Computador (RAC) no Brasil, dá cursos sobre o tema no Brasil e no exterior para instituições como: Knight Center for Journalism in the Americas, Abraji, ECA-USP, FGV e redações como Rede Globo, Folha de S.Paulo, O Globo, O Estado de S. Paulo, entre outras.


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Co-autor de Era FHC: um Balanço (Editora Cultura, 2002), Persuasão e Marketing Eleitoral (Konrad Adenauer, 2000) e organizador da série de livros SP21 para a Editora Brasiliense. (Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)


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ANEXO L – Leandro Fortes

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Leandro Fortes formou-se em Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e construiu a sua carreira em Brasília (DF). Trabalhou para o Correio Braziliense e foi correspondente na capital federal dos jornais O Estado de S.Paulo, Zero Hora, Jornal do Brasil e O Globo. Atuou também na revista Época, na TV Globo, na Agência Brasil, e foi comentarista da Voz do Brasil, da rádio Nacional. Foi repórter correspondente da revista CartaCapital, em Brasília, durante oito anos – período em que manteve um blog referência em cobertura política, na versão digital da revista. Deixou a publicação em novembro de 2013 e assumiu na agência digital Pepper Interativa como consultor para a produção de conteúdo. É o criador da Escola Livre de Jornalismo, em Brasília, e do curso de Jornalismo Online do Serviço Nacional do Comércio do Distrito Federal (Senac/DF). Publicou 2002);

Fragmentos

os

livros da

Cayman

Grande

Guerra

O

dossiê (Record,

do

medo

2004);

(Record, Jornalismo

Investigativo (Contexto, 2005) e Os Segredos das Redações – O que os jornalistas só descobrem no dia a dia (Contexto, 2008). Participou também como coautor dos


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livros O Brasil no Contexto (Contexto, 2007), organizado por Jaime Pinsky; Políticos ao Entardecer (Cultura Editora Associados, 2007), organizado por Ney Figueiredo; e Reportagem, Pesquisa e Investigação (Editora Insular, 2012), organizado por Rogério Christofoletti e Samuel Lima.

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ANEXO M – Luis Nassif

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Luís Nassif teve seu primeiro contato com o jornalismo aos 13 anos, editando o jornal do Grupo Gente Nova, em sua cidade natal, Poços de Caldas (MG). Em 1969, passou no vestibular de jornalismo da ECA-USP e começou a trabalhar profissionalmente em 1970, como estagiário da revista Veja. Em 1974, tornou-se repórter de Economia da revista. No ano seguinte, ficou responsável pelo caderno de Finanças. Em 1979, transferiu-se para o Jornal da Tarde. Lá criou a seção Seu Dinheiro, primeira experiência de economia pessoal da imprensa brasileira, e o caderno Jornal do Carro. Em 1983, mudou-se para a Folha de S.Paulo, onde criou a seção Dinheiro Vivo e participou do projeto de criação do Datafolha. Criou em 1985 o programa Dinheiro Vivo, na TV Gazeta, e a partir dele fundou, em 1987, a Agência Dinheiro Vivo, que desde então veicula na internet informações de Economia e Negócios. Foi comentarista econômico da TV Bandeirantes e da TV Cultura de São Paulo. Também atuou no rádio, como um dos apresentadores do Jornal Gente, na Bandeirantes de São Paulo. Em 1987 saiu da Folha, por pressão do então Ministro da Justiça Saulo


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Ramos. A saída deu-se seis meses após receber o Prêmio Esso, por denúncias contra Saulo. Retornou ao veículo em 1991 como colunista de Economia, função que exerceu até 2006. Desde 2005 mantém o Blog do Nassif (hospedado em vários portais), em que escreve sobre os mais variados assuntos, incluindo críticas à própria imprensa. Atualmente apresenta o programa Brasilianas.org, na TV Brasil, que discute políticas públicas aliando TV e internet. Autor dos livros: Menino do São Benedito e outras crônicas (Ed. Senac, 2001); O jornalismo dos anos 90 (Ed. Futura, 2003); e Os Cabeças-dePlanilha (Ediouro, 2007), sobre a economia nos governos de FHC.

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ANEXO N – Maurício Dias

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Maurício Dias é formado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e atua como jornalista desde o início da década de 1970. Trabalhou nas revistas Veja (1972/1981) e IstoÉ (1981/1994), nessa última como chefe da sucursal do Rio de Janeiro. Na TV Educativa do Rio de Janeiro foi apresentador de programas políticos nos anos de 1987 e 1988. Foi Editor de Política do Jornal do Brasil entre 1994 e 1998, editor da coluna Informe JB, entre 1998 e 2000, e editor-chefe do Jornal do Brasil, de 2000 a 2002. Integrou o quadro de comentaristas políticos da GloboNews no período de 1998 a 2000. Atualmente é Editor Especial e colunista político da revista CartaCapital. É autor do texto do documentário Jango, como quando e porque se depõe um presidente (Direção de Sílvio Tendler, 1984) e dos livros: A Mentira das Urnas – Crônica sobre dinheiro e fraudes nas eleições(Record/2004); Relatório da Cia – Che Guevara – Documentos inéditos dos arquivos secretos, junto com Mario J. Cereghino (Ediouro/2007); eEntrevistas – Raymundo Faoro, A Democracia Traída – Organização e Notas (Ed. Globo/2008 – a sair).


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ANEXO O – Mino Carta

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Demetrio Giuliano Gianni Carta é jornalista, editor, escritor, e pintor ítalobrasileiro. Chegou ao Brasil em 1946, aos 13 anos. Prestou vestibular para Direito, mas abandonou o curso antes de se formar. Em 1950, aos 15 anos, cobriu para jornais italianos os preparativos para a Copa do Mundo de Futebol no Brasil. Foi tradutor na agência de notícias Ansa e, depois, já em 1956, passou uma temporada na Itália, como redator dos jornais La Gazeta del Popolo, de Turim, e Il Messaggero de Roma. De volta ao Brasil, dirigiu as equipes de criação de importantes publicações da

imprensa

brasileira

como

Quatro

Rodas,

o

Jornal

da

Tarde,

Veja,

IstoÉ e CartaCapital, da qual ainda é diretor de redação. Foi colunista do jornal Folha de S.Paulo em dois períodos: entre 1976 e 1977 e entre 1981 e 1982. Manteve um blog no portal iG – o Blog do Mino, direto da Olivetti –, de 2006 a 2008. Retomou o blog ainda em 2008, alocado no siteda revista CartaCapital, mas acabou por descontinuá-lo. Ganhou dois Prêmios Esso de Jornalismo, o primeiro em 1964, pela matéria São Paulo, publicada em Quatro Rodas; o segundo em 1968, pela matéria Casamento de Pelé, publicada no Jornal da Tarde. Recebeu, em 2006, na


100

Itália, o Premio Borgo Val di Toro, instituído para homenagear e prestigiar italianos que fazem sucesso fora do país. É autor dos livros O Castelo de Âmbar (Record, 2000), A Sombra do Silêncio (Francis, 2003), Histórias da Mooca, Com as Bênçãos de San Gennaro (Berlendis & Vertecch, 1982), O Restaurante Fasano e a Cozinha de Luciano Boseggia, em parceria com Rogério Fasano (DBA, 1996) e O Brasil (Record, 2013). É doutor honoris causa pela Faculdade Cásper Líbero (SP), título que lhe foi entregue em maio de 1998. Dedica-se também à pintura, tendo realizado mostras individuais em Milão (1957), no Museu de Arte de São Paulo (1975, 1983 e 1994), em Londres (1993) e na Antuérpia (1995), entre outras.

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ANEXO P – Paulo Moreira Leite

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Paulo Moreira Leite é jornalista desde os 17 anos, tendo começado a carreira na editoria de Esportes do Jornal da Tarde (SP). Estudou Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP/SP). Depois de trabalhar cinco anos no Jornal da Tarde, foi para a Folha de S.Paulo, onde ficou pouco mais de um ano. Em seguida, foi para a revista Veja e lá desempenhou as funções de redator-chefe e correspondente em Paris. Morou dois anos na capital francesa. Em duas passagens, somou 17 anos na revista. Em 1999, foi contratado pela Gazeta Mercantil para ser correspondente em Washington. Dois anos depois, em setembro de 2001, assumiu o cargo de diretor de redação da revista Época e, depois, do Diário de S.Paulo. Também foi repórter especial de O Estado de S.Paulo, em Brasília e, durante oito meses, vice-presidente da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo. Atuou também no portal iG e retornou à Época em 2008, onde foi repórter especial e colunista. Em janeiro de 2013, assumiu a direção da sucursal da revista IstoÉ em Brasília.


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É autor dos livros A mulher que era o general da casa – Histórias da resistência

civil

à

ditadura

(Arquipélago,

2012)

e

A

Outra

Mensalão (Geração, 2013).

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História

do


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ANEXO Q – Raimundo Pereira

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Raimundo Rodrigues Pereira nasceu em 1940, no município de Exu, sertão pernambucano. Iniciou a carreira aos 12 anos, quando foi cronista esportivo, num serviço de auto-falantes no interior de São Paulo. Seu primeiro grande sonho foi ser jogador de futebol. Na universidade, o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) entre 1960 e 1964, foi diretor e cronista de uma publicação interna, que fez certo sucesso entre a estudantada e até, por azar, entre as famílias dos militares que moravam por perto. Em 1964 foi preso e expulso do ITA, por causa do trabalho no jornal, que era muito debochado, anarquista. Quando saiu da prisão, viveu uns tempos de dar aulas, formou-se em Física pela Universidade de São Paulo (USP), mas acabou achando um emprego de repórter, por sinal com um amigo seu, a quem dava aulas de matemática e que depois se tornaria professor na Unicamp, o Ítalo Tronca, na ocasião editor de O Médico Moderno, uma revista especializada.


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Integrou a equipe que lançou a revista Veja, dirigiu os jornais Opinião e Movimento, a enciclopédia e o jornal Retratos do Brasil. Foi, também, repórter da revista Realidade, da Ciência Ilustrada, da revista IstoÉ e do Jornal da Tarde. Criou a Oficina da Informação, projeto que surgiu, em meados de 1997, apenas com um site de informações diárias na Internet e que em 2001 passou a editar também a revista mensal Reportagem. Desde 2007 é supervisor editorial da revista mensal Retrato do Brasil. Autor do livro Escândalo Daniel Dantas – Duas Investigações (Editora Manifesto, 2010).

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ANEXO R – Renata Lo Prete

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Renata Lo Prete nasceu em São Paulo. Formou-se em jornalismo pela USP. Desde 1986, trabalhou na Folha de S. Paulo, onde exerceu, entre outras funções, as de repórter da Ilustrada e de política, correspondente em Nova York, editora de ciência, editora da Primeira Página e ombudsman. Ainda no jornal, editou, a partir de 2003, a coluna Painel Político. Em 2005, fez as entrevistas com o então deputado Roberto Jefferson que revelaram o esquema do mensalão. Por esse trabalho, recebeu o Grande Prêmio Esso de Jornalismo. Em 2011, estreou como comentariata na GloboNews. Em 2012, transferiuse para o canal, onde atualmente é editora de política do Jornal das Dez.

(Fonte: http://www.omercadodenoticias.com.br/entrevistas/)


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