L A P I C I N U M O R T A E T Z I U L O SÃ A R B A D A C A R B A : A Q U IN TA- F E IR 13 A 16 F E V E R E I R O 2 0 2 0 C L Á U D IA D IA S TE AT RO
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PT
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© Alípio Padilha
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Lança o teu raio até à morte
que já não sirvam, que já tenham dado o que tinham a dar, que estejam inutilizadas, mas precisamente o contrário: quanto mais as palavras circulam, menos peso têm, e mais não valem nada. A propaganda política, a publicidade comercial, as notícias televisivas, até a ficção dramática faz das palavras um guarda-roupa tão leve que qualquer um vê e todos podem dizer que o rei vai nu: o rei, o presidente, o primeiro-ministro, os ministros, os deputados, os artistas, e até os que escrevem textos sobre espetáculos continuam a usar as palavras como se elas tivessem peso, comprimento, largura, altura, cor, textura. O que não têm, muitas vezes, é sentido. No princípio era o verbo, ou o logos, depois as palavras de ordem, os slogans, os soundbites, que parecem sobrepor-se como máscaras à substância das coisas e permitir que as coisas sejam o contrário do nome que têm. A palavra não é suficiente e é preciso chamar as coisas pelos nomes verdadeiros, ou até pelos pré-nomes: a coisa que as coisas são autenticamente, não as que as chamámos este tempo todo. Claro, dir-se-á que a coisa só é ela mesma depois de ser nomeada, por alguém, tal como ela é. Mas há ainda muito caminho a fazer para refazer o nexo entre as coisas e os nomes. As duas mulheres criadoras desta peça procuram dar novos usos às palavras gastas, começando do zero, para voltarem a combinar com toda a gente presente
Jorge Louraço Figueira
O subtítulo dos dias da semana que dão nome a cada uma das sete peças deste ciclo costuma dar a chave para descodificar o trabalho de Cláudia Dias. Este espetáculo tem uma palavra mágica no subtítulo, que não é Abre-te, Sésamo, mas até parece: Abracadabra. O que as artistas Cláudia Dias e Idoia Zabaleta fazem é procurar as palavras certas para mover mundos, experimentando, como Ali Baba fez com o nome de todos os cereais, até acertar no nome do grão, para mover a rocha e abrir a caverna do tesouro dos 40 ladrões. As palavras estão gastas, repete o poeta num dos seus poemas mais populares, o mesmo poeta que trabalha como inspector administrativo no Ministério da Saúde durante o dia. Gastámos as palavras, meu amor. Que palavras? A paz, o pão, habitação, saúde, educação? As palavras que o inspetor separa para usar nos poemas e as palavras que o poeta usa no dia-a-dia serão as mesmas? Hoje, num mundo de palavras-tecladas, palavras-gravadas, palavras-copiadas, palavras digitais e electrónicas, quem estabelece a cotação de cada palavra? As palavras podem estar muito gastas, mas continuam a ser usadas à mesma. Quando as palavras estão gastas, isso não quer dizer 2
e o amuleto original onde a palavra é inscrita. Mas esses poderes não são aqueles que nos têm regido nas últimas dezenas de anos. Pelo contrário, com as rotações das palavras e dos corpos, Cláudia e Idoia querem a revolução.
os sentidos mínimos de cada palavra, visto que já nos esquecemos dos sentidos originais. Paz, pão, trabalho, educação querem dizer o quê, mais propriamente? Não são só palavras, atenção. O espetáculo traça um caminho para encontrar a expressão física, gestual e facial do desejo de liberdade e de emancipação mais propriamente, a peça traça o caminho para a desorganização das coisas como elas estão agora, começando pelas palavras e avançando até chegar a um lugar anterior às palavras, posto em todo o corpo. É urgente dançar, poderia ter dito o poeta. As duas criadores encarnam uma prática de renovação, de desfazimento, de mudança da ordem das coisas, que está para lá da ordem das palavras. Este mesmo ensaio escrito é uma tentativa obsoleta de desfazer as coisas, quando comparado com o baile convocado por Cláudia Dias e Idoia Zabaleta quase no fim do espectáculo.
“Lança o teu raio até à morte”, seria a tradução da fórmula em hebraico abreg ad hâbra que deu origem ao popular Abracadabra. A expressão costuma ser inscrita num talismã, feito para usar ao peito, com o fim de afastar doenças, com a forma de pirâmide invertida: ABRACADABRA ABRACADABR ABRACADAB ABRACADA ABRACAD ABRACA ABRAC ABRA ABR AB A
As duas criadoras vão citando palavras, e dali a pouco citam atitudes, mas organizando-as de modo inesperado, com a finalidade de provocar a identificação do público com os detalhes, por um lado, e o estranhamento do todo, por outro. A função de Quinta-feira: Abracadabra é proporcionar um sentimento de proteção, em harmonia com as leis misteriosas que regem o mundo, e em relação com os poderes superiores, tal como faz a palavra
Este Abracadabra é dito para atacar, não para defender. O propósito geral da enunciação das palavras é desfazer e refazer o mundo, demonstrando a relação verdadeira entre as coisas e as palavras, os nomes ocultos da injustiça, da desigualdade, da opressão, dos assassinatos que vitimam os nossos companheiros no dia-a-dia e na poesia, e que não podem continuar a ser calados. 3
© Alípio Padilha
13 a 16 fevereiro dança
QUINTA-FEIRA: ABRACADABRA CLÁUDIA DIAS estreia nacional
Quinta, 20h; sexta e sábado, 21h; domingo, 17h30 Sala Mário Viegas m/12 Duração: 1h €12 com descontos
Direção artística: Cláudia Dias; Artista convidada: Idoia Zabaleta; Intérpretes: Cláudia Dias e Idoia Zabaleta; Assistente artístico: Karas; Desenho de luz, Direção técnica e Cenografia: Nuno Borda de Água; Vídeo: Bruno Canas; Fotografia: Alípio Padilha; Música: Fuego de Bomba Estéreo, Banho de Elza Soares, De Dentro do Ap de Bia Ferreira, Canción Total de Maria Arnal & Marcel Bagés; Acompanhamento crítico: Jorge Louraço Figueira; Produção: Alkantara; Difusão: Something Great; Residências artísticas e Apoio: Azala, L’animal à l’esquena, O Espaço do Tempo Agradecimentos: Mursego, María Arnal y Marcel Bagés, Hélder Azinheirinha Alkantara é uma estrutura financiada por República Portuguesa | Cultura/ Direção-Geral das Artes. Azala y Moare Danza são estruturas financiadas pelo Departamento de Cultura do Governo Basco. Coprodução: Teatro Municipal do Porto, Moare Danza e São Luiz Teatro Municipal
Direção Artística Aida Tavares Direção Executiva Ana Rita Osório Programação Mais Novos Susana Duarte Assistente da Direção Artística Tiza Gonçalves Adjunta Direção Executiva Margarida Pacheco Secretária de Direção Soraia Amarelinho Direção de Comunicação Elsa Barão Comunicação Ana Ferreira, Gabriela Lourenço, Nuno Santos Direção de Produção Mafalda Santos Produção Executiva Andreia Luís, Catarina Ferreira, Mónica Talina, Tiago Antunes Direção Técnica Hernâni Saúde Adjunto da Direção Técnica João Nunes Produção Técnica Margarida Sousa Dias Iluminação Carlos Tiago, Ricardo Campos, Tiago Pedro, Sérgio Joaquim Maquinaria António Palma, Vasco Ferreira, Vítor Madeira Som João Caldeira, Gonçalo Sousa, Nuno Saias, Ricardo Fernandes, Rui Lopes Operação Vídeo João Van Zelst Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Coordenação da Direção de Cena Marta Pedroso Direção de Cena Maria Tavora, Sara Garrinhas Assistente da Direção de Cena Ana Cristina Lucas Bilheteira Cristina Santos, Diana Bento, Renato Botão
TEATROSAOLUIZ.PT