Folha de sala IF MUSIC BE THE FOOD OF LOVE 2016

Page 1

G LO R I OS O V E R ÃO — 8 J U L A 13 AG O U M A PA R C E R I A D. M A R I A I I E SÃO LU IZ COM O APOIO DO BRITISH COU NCIl

são lu i z te atro m u n i c i pal

TO DA A P RO G R A M AÇÃO : w w w.teatro - dmaria . pt e w w w.teatrosaolui z . pt

20 A 23 JUL BY HEART De Tiago Rodrigues Teatro Nacional D. Maria II, Sala Estúdio 21 A 24 JUL hOtelo Direcção de Pedro Lacerda Criação e Interpretação: Paula Diogo, Pedro Lacerda e Vitor d’Andrade; Uma leitura a partir de Otelo de William Shakespeare Teatro São Luiz, Sala Mário Viegas Co-produção: Negócio ZDB ainda no Glorioso Verão 14 A 23 JUL ROMEU E JULIETA Direcção Rui Horta Teatro Nacional D. Maria II, Sala Garrett 15 A 17 JUL ANTÓNIO E CLEÓPATRA Texto e encenação: Tiago Rodrigues Teatro São Luiz, Sala Luis Miguel Cintra 18 A 23 JUL TROCAVA A MINHA FAMA POR UMA CANECA DE CERVEJA Criação e interpretação: Rui Neto e Teresa Sobral Teatro São Luiz, Jardim de Inverno

28 JUL LANÇAMENTO DE LIVRO MUITO BARULHO POR NADA Tradução Sophia de Mello Breyner Andresen; edição Assírio & Alvim Teatro Nacional D. Maria II, átrio 28 A 31 JUL SHAKE, SHAKE, SHAKE MEU AMOR Encenação Francisco Salgado; A partir da tradução de Muito barulho por nada de Sofia de Mello Breyner Andresen; Exercício final da Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa Teatro Nacional D. Maria II, Sala Garrett 3 A 13 AGO Ruínas do Convento do Carmo CIMBELINO Encenação: António Pires

16 e 17 jul

recital Inserido no Glorioso Verão

IF MUSIC BE THE FOOD OF LOVE

Direcção de Nuno Vieira de Almeida Sábado e domingo às 18h30 Jardim de Inverno; M/6 €12 (com descontos €5 a €8,40)

Susana Gaspar soprano Rita Blanco recitação Nuno Vieira de Almeida piano Uma produção São Luiz Teatro Municipal

PROGRAMA Purcell/Tippett If music be the food of love An Epithalamium

bilhete suspenso Começa por ser uma forma de oferecer a quem não se conhece a oportunidade de assistir a um espectáculo no Teatro São Luiz. O bilhete custa 7 euros sendo o restante valor suportado pelo teatro e fica suspenso na bilheteira para usufruto de pessoas apoiadas pelas entidades às quais estamos associados: Associação Coração Amarelo, Associação Gulliver, Lar Jorbalán, Fundação Luís António de Oliveira ou Casa de Abrigo da APAV. Mais informações: bilheteira@teatrosaoluiz.pt tel: 213 257 650

São luiz teatro municipal Direcção Artística Aida Tavares Direcção Executiva Joaquim René Programação Mais Novos Susana Duarte Adjunta Direcção Executiva Margarida Pacheco Secretariado de Direcção Olga Santos Direcção de Produção Tiza Gonçalves (Directora), Susana Duarte (Adjunta), Andreia Luís, Margarida Sousa Dias Direcção Técnica Hernâni Saúde (Director), João Nunes (Adjunto), Iluminação Carlos Tiago, Ricardo

Campos, Sara Garrinhas, Sérgio Joaquim Maquinistas António Palma, Cláudio Ramos, Paulo Mira, Vasco Ferreira Som João Caldeira, Nuno Saias, Ricardo Fernandes, Rui Lopes Responsável de Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Secretariado Técnico Sónia Rosa Direcção de Cena José Calixto, Maria Távora, Marta Pedroso, Ana Cristina Lucas (Assistente) Direcção de Comunicação Ana Pereira (Directora), Elsa Barão, Nuno Santos Design Gráfico silvadesigners Registo e Edição vídeo Tiago Fernandes Bilheteira Cristina Santos, Hugo Henriques, Soraia Amarelinho Frente de Casa Letras e Partituras Coordenação Ana Luísa Andrade, Cristiano Varela, Teresa Magalhães Assistentes de Sala Ana Catarina Bento, Ana Sofia Martins, Catarina Ribeiro, Daniela Magalhães, Domingos Teixeira, Helena Malaquias, Helena Nascimento, Hernâni Baptista, João Cunha, João Pedro, Manuela Andrade, Paulo Daniel Pereira, Raquel Pratas, Sara Fernandes Segurança Securitas LIMPEZA Astrolimpa

Haydn She never told her love Schubert An Silvia Berlioz La mort d’Ophelie Korngold Come away, Death Richard Strauss 3 Ofelia Lieder Korngold Under the Greenwood tree Desdemona’s song Verdi Ave Maria (Otello)

j u lho 2016


Shakespeare na música Nuno Vieira de Almeida

Purcell/ Tippett

O tratamento musical da obra de William Shakespeare não teve a sorte de alguns outros poetas maiores. Grande parte dos compositores agarrou apenas na trama para fabricar objectos musicais que não correspondem em grandeza ao tamanho global da obra do grande escritor. Poetas como Goethe ou Verlaine tiveram mais sorte e os seus textos foram postos em música de forma exemplar por Schubert, Wolf, Debussy ou Fauré. Basta pensarmos na diferença entre o Romeu e Julieta de Shakespeare ou o do Gounod para nos darmos conta desse facto. Há no entanto excepções e todo o Verdi, a culminar no Otello, e o Romeu e Julieta de Berlioz fazem jus ao autor que os inspirou. Ao organizar este recital não pude deixar de ter isso em mente. Pus-me também frequentemente a questão: como foi possível que nenhum compositor maior, a começar por Britten, tivesse deixado de fora a obra prima poética que são os sonetos de Shakespeare? Como parti do pressuposto da sua inclusão achei que era possível imaginar um recital dentro do qual os sonetos funcionariam como uma espécie de reflexão ao muito que é dito nas peças. É por isso que usei bocados de texto de algumas peças sem ter preocupação com o seu seguimento lógico/ dramático. Dois fragmentos do Hamlet aparecem por isso propositadamente desirmanados. Aproveitei compositores que puseram em música fragmentos poéticos de peças tal qual como foram escritas, em tradução como é o caso de Schubert e Strauss, ou no original como faz Haydn e Korngold. Na impossibilidade de usar um fragmento do Romeu e Julieta de Berlioz utilizei uma fantasia baseada na Ophelia e escrita para canto e piano. Quis começar e terminar este recital com duas obras que partem de Shakespeare sem verdadeiramente o seguirem à letra: a primeira é a canção de Purcell If music be the food of love, cujo texto de Henry Heveningham cita a primeira linha da Twelfth Night; essa primeira linha é tão apropriada e bela que me deu o título do recital. Termino com a Ave Maria do Otello de Verdi. Na peça homónima Desdémona não tem nenhuma Ave Maria e limita-se à canção do Salgueiro. No entanto a invenção de Boito é tão genial e a música de Verdi tão completamente extraordinária que senti que, apesar das palavras não serem de Shakespeare, a homenagem a este não poderia ser maior na condensação da doçura e bondade da personagem feita por esses dois outros génios: Boito e Verdi. Utilizei as traduções de Vasco Graça Moura dos sonetos pela sua intrínseca qualidade e porque acho que uma homenagem ao grande escritor e teórico é mais do que merecida. As pessoas são depressa esquecidas. Tenho pena desse facto. 2

If Music be the Food of Love

Se a Música é o Alimento do Amor

If music be the food of love, Sing on till I am fill’d with joy; For then my list’ning soul you move To pleasures that can never cloy. Your eyes, your mien, your tongue declare That you are music ev’rywhere.

Se a música é o alimento do amor, Canta até que me encha a alegria; Levarás assim a minha alma de ouvidor A um prazer que jamais enfastiaria. Proclamam teus olhos, língua, semblante, Que música és a todo o instante.

Pleasures invade both eye and ear, So fierce the transports are, they wound, And all my senses feasted are, Tho’ yet the treat is only sound, Sure I must perish by your charms, Unless you save me in your arms

Os prazeres invadem olhos e ouvidos, Ferem os arroubos em sua louca dança E é pleno o deleite dos meus sentidos, Embora seja ainda puro som a folgança, Pelos teus encantos morrerei decerto, A menos que de ti me guardes perto.

An Epithalamium

Um Epitalâmio

Thrice happy lovers, may you be For ever, ever free, From the tormenting devil, Jealousy. From all the anxious Care and Strife, That attends a married Life: Be to one another true, Kind to her as she to you. And since the Errors of this Night are past, May he be ever Constant, she for ever Chast.

Sejam triplamente felizes os amantes, Libertos em todos os instantes Dos Ciúmes, demónios torturantes. Da ânsia do Cuidado e do Conflito Que da Vida casada é signo aflito: Sejam sinceros entre si, Tu amável para ela como ela para ti. E, passados os Erros desta Noite vasta, Seja ele sempre Constante e ela Casta.

Haydn She never told her love

Ela nunca contou ao seu amor

She never told her love, But let concealment, like a worm in the bud, Feed on her damask cheek…; She sat, like Patience on a monument, Smiling at grief.

Ela nunca contou ao seu amor Mas deixou que o disfarce, como uma lagarta na flor, Se alimentasse da sua face rosada...; Sentada, como a Paciência num monumento, Ia sorrindo à dor.

Schubert An Silvia

Para Sílvia

Who is Silvia? What is she, That all our swains commend her? Holy, fair, and wise is she; The heaven such grace did lend her, That she might admirèd be.

Quem é Sílvia? O que é ela, Para a louvar toda a juventude? Piedosa, formosa e sábia é ela; Os céus lhe doam tal magnitude, Para que seja admirada, a bela.

Is she kind as she is fair? For beauty lives with kindness. Love doth to her eyes repair, To help him of his blindness, And, being helped, inhabits there.

Bondade quanto formosura nela há? Pois da bondade a beleza vai a par. Conserto aos seus olhos o amor dá, Para a cegueira dele remediar, E, logrado o remédio, habita lá.

Then to Silvia let us sing, That Silvia is excelling; She excels each mortal thing Upon the dull earth dwelling: To her let us garlands bring.

Para Sílvia então o nosso canto, Pois Sílvia tudo supera em espanto; Das coisas mortais é desencanto Nesta terrestre morada em pranto; Façamos-lhe de grinaldas um manto.

Berlioz La Mort d’Ophélie

A Morte de Ofélia

Auprès d’un torrent Ophélie Cueillait, tout en suivant le bord, Dans sa douce et tendre folie, Des pervenches, des boutons d’or, Des iris aux couleurs d’opale, Et de ces fleurs d’un rose pâle Qu’on appelle des doigts de mort.

Ofélia junto de uma torrente Colhia, pela margem que explode, Doce e ternamente demente, Pervincas, botões d’ouro qual ode, Lírios muitos às opalinas cores, E de um rosa pálido essas flores A que chamam barba de bode.

Ah!

Ah!

Puis, élevant sur ses mains blanches Les riants trésors du matin, Elle les suspendait aux branches, Aux branches d’un saule voisin. Mais trop faible le rameau plie, Se brise, et la pauvre Ophélie Tombe, sa guirlande à la main.

Depois, nas mãos brancas erguia Os risonhos tesouros do torrão Para os suspender da ramaria, Da fronde de um salgueiro irmão. Mas a ramaria pende, debilitada, Parte-se e Ofélia, coitada, Cai de grinalda na mão.

Quelques instants sa robe enflée La tint encor sur le courant Et, comme une voile gonflée, Elle flottait toujours chantant, Chantant quelque vieille ballade, Chantant ainsi qu’une naïade Née au milieu de ce torrent.

Por instantes o vestido enfunado Mantém-na presa à corrente E, como um véu insuflado, Segue cantando e fluente, Canta uma velha balada, Canta como náiade gerada Do coração dessa torrente.

Mais cette étrange mélodie Passa, rapide comme un son. Par les flots la robe alourdie Bientôt dans l’abîme profond Entraîna la pauvre insensée, Laissant à peine commencée Sa mélodieuse chanson.

Mas essa estranha melodia Passou, rápida como um bordão. Com os borbotões o vestido pesado Depressa para o abismo malsão Quer a pobre insensata arrastar, Mal a deixando assim iniciar A sua melodiosa canção.

Ah!

Ah!

3


Korngold Come away, Death

Vem, Morte

Come away, Death Come away, come away, death, And in sad cypress let me be laid; Fly away, fly away, breath; I am slain by a fair cruel maid. My shroud of white, stuck all with yew, O prepare it! My part of death, no one so true Did share it.

Vem, morte, tens de vir Depor-me num cipreste desolado; Foge, hálito, tens de fugir; Fui por cruel donzela assassinado. Cravada de teixo, minha mortalha branca, Oh, tende-a à mão! Meu quinhão de morte, alma nenhuma franca Fez comigo a divisão!

Not a flower, not a flower sweet, On my black coffin let there be strown; Not a friend, not a friend greet My poor corpse, where my bones shall be thrown: A thousand, [thousand]* sighs to save, Lay me, O where [Sad]* true lover never find my grave, To weep there!

Nem uma flor, nem uma flor gentil, Deixai ao negro caixão ser lançada; Amigo nenhum saúde, de entre mil, Meu cadáver, onde tenha a sua morada: Para que se poupe um ror de ais, Deitai-me nesse lugar Onde a amada a tumba não encontre mais, Para lá ir chorar!

(From: Twelfth Night, Act II, Scene 4)

(From: Twelfth Night, Act II, Scene 4)

Richard Strauss 3 Ofelia Lieder

3 Ofelia Lieder

Wie erkenn ich mein treulieb vor andern nun?

Como distinguir o meu verdadeiro amor de outros então?

Wie erkenn ich mein treulieb Vor andern nun? An dem muschelhut und Stab Und den Sandalschuh’n. Er ist tot und lange hin. Tot und hin, Fraülein! Ihm zu Häupten grünes Gras. Ihm zu Fuss ein Stein. Oho. Auf seinem Bahrtuch, weiss wie schnee, Viel liebe Blumen tauern. Sie gehn zu Grabe nass, O weh! vor Liebesschauern.

Como distinguir o meu verdadeiro amor De outros então? Pelo chapéu de amêijoa e sandálias, E pelo seu bordão. Morreu e foi-se há muito. Foi-se a donzela de lés a lés; Na sua cabeça a relva verde, Uma pedra aos seus pés. A sua mortalha, branca como neve, Atavia-se de amáveis flores; As quais molhadas vão para a campa, Com, ai, chuvas de amores.

Guten Morgen, s’ist Sankt Valentinstag

Bom Dia, é Dia de São Valentim

Guten Morgen, s’ist Sankt Valentinstag So früh vor Sonnenschein. Ich junge Maid am Fenstersclag Will Euer Valentin sein. Der junge Mann tut Hosen an. Tät auf die Kammertür. Liess ein die Maid, die als Maid Ging nimmermehr herfür. Bei Sankt Niklas und Charitas! Ein unverschämt Geschlecht! Ein junger Mann tut’s wenn er kann, Fürwahr, das ist nich recht. Sie sprach: Eh Ihr gescherzt mit mir, Verspracht Ihr mich zu frein. Ich Brächt’s auch nicht beim Sonnenlicht, Wärst du nicht kommen herein.

Bom dia, é Dia de São Valentim, Muito antes da alvorada. Eu, jovem donzela, bato à janela, Para ser tua namorada. Veste o rapaz as calças. Abriu do aposento a porta. Faz entrar a donzela, que como tal Nunca mais se comporta. Por São Nicolau e pela Caridade! Que laia descarada! Um rapaz fá-lo sempre que pode, Não é atitude avisada. Ah, brincaste comigo, disse ela, Casamento me tinhas jurado. Não me desdiria ao raiar a manhã, Se não tivesses cá entrado.

Sie trugen ihn auf der Bahre bloss

Levaram-no Nu Até à Tumba

Sie trugen ihn auf der Bahre bloss, Leider, ach leider, den Liebsten! Manche Träne fiel in des Grabes SchossFahr wohl, fahr wohl, meine Taube. Mein junger frisher Hansel ist’s, Der mir gefällt Und kommt er nimmermehr? Er ist tot, o weh! In dein Todbett geh. Er kommt dir nimmermehr. Sein Bart war weiss wie Schnee, Sein Haupt wie Flachs dazu. Er ist hin, er ist hin, Kein Trauern bringt Gewinn: Mit seiner Seele Ruh Und mit allen Christenseelen! Darum bet ich! Gott sei mit euch!

Levaram-no nu até à tumba, Ai, que pena, ao bem-amado! Caiu no túmulo um mar de lágrimas; Adeus, adeus, minha pomba. É ele o meu jovem alegre, A alegria do meu coração. Será que nunca mais volta? Ai que está morto! Desce ao funéreo horto. Para ti nunca mais volta. Sua barba era branca como neve, Sua cabeça como linho. Ele foi-se, ele foi-se, Nenhum luto traz proveito: Paz à sua alma E às de todos os cristãos! Rogo que Deus esteja convosco!

Korngold Under the Greenwood tree

Sob a Árvore Viçosa

Under the greenwood tree Who loves to lie with me, And [turn]1 [his]2 merry note Unto the sweet bird’s throat, Come hither, come hither, come hither: Here shall he see No enemy But winter and rough weather.

Sob a árvore viçosa Quem quer deitar-se comigo, E doar sua nota jocosa À goela do pássaro amigo, Que saia da sua casca: Não há-de encontrar Com quem rivalizar, Só o Inverno e a borrasca.

Who doth ambition shun, And loves to live i’ the sun,

Quem vira costas à ambição, E do sol quer fartura,

4

Seeking the food he eats, And pleas’d with what he gets, Come hither, come hither, come hither: Here shall he see No enemy But winter and rough weather.

E da boca procura o pão, Feliz da respigadura, Que saia da sua casca: Não há-de encontrar Com quem rivalizar, Só o Inverno e a borrasca.

If it do come to pass That any man turn ass, Leaving his wealth and ease, A stubborn will to please, Ducdame, ducdame, ducdame: Here shall he see Gross fools as he, An if he will come to me. Under the greenwood tree Who loves to lie with me.

Se tal vier a suceder, Que alguém tonto se faça, Abdicando de ouro e prazer, De ávida e vazia taça, Ducdamer, ducdamer, ducdamer: Aqui poderá ver Valentes tolos crescer, Se comigo vier ter. Sob a árvore viçosa Quem quer deitar-se comigo.

Desdemona’s song

Canção de Desdémona

Desdemona’s Song The poor soul sat sighing by a sycamore tree, Sing all a green willow: Her hand on her bosom, her head on her knee, Sing willow, willow, willow: The fresh streams ran by her, and murmur’d her moans; Sing willow, willow, willow; Her salt tears fell from her, and soften’d the stones; Sing willow, willow, willow; Sing all a green willow, must be my garland. Sing all a green willow; Let nobody blame him; his scorn I approve. Sing willow, willow, willow, I call’d my love false love; but what said he then? Sing willow, willow, willow: If I court moe women, you’ll couch with moe men! Sing willow, willow, willow.

Junto de um sicómoro, a pobre alma suspirava, Cantemos um verde salgueiro: A mão no regaço, a cabeça nos joelhos apoiava, Cantemos esse verde salgueiro: Límpidos ribeiros passavam, solidários do seu mal; Cantemos esse verde salgueiro: Lágrimas salgadas se verteram, amaciando o seixal; Cantemos esse verde salgueiro; Cantemos um verde salgueiro, minha grinalda será. Cantemos um verde salgueiro; Que ninguém o censure; o seu desdém aprovo. Cantemos esse verde salgueiro: Chamei falso ao meu amor; mas o que disse ele então? Cantemos esse verde salgueiro: Se mais mulheres cortejo, mais homens contigo se deitarão! Cantemos esse verde salgueiro.

(From: Othello, Act IV, Scene 3)

(From: Othello, Act IV, Scene 3)

Verdi Ave Maria (Otello)

Ave Maria (Otello)

Ave Maria, piena di grazia, eletta Fra le spose e le vergini sei tu, Sia benedetto il frutto, o benedetta, Di tue materne viscere, Gesù.

Ave Maria, cheia de graça, adorada Foste entre as virgens e as esposas, Abençoado seja Jesus, ó abençoada, Fruto das tuas entranhas maternas. Roga por quem te adorando se prostra, Roga pelo pecador, pelo inculposo, E pelo fraco oprimido e pelo poderoso, Pelo infeliz ainda, tua piedade demonstra. Roga por quem perante o ultraje afoga A testa e perante a malvada sorte; Por nós, roga por nós, roga Sempre e na hora da nossa morte, Roga por nós, roga por nós, roga. Ave Maria . . . Na hora da nossa morte. Ave! . . . Ámen!

Prega per chi adorando a te si prostra, Prega nel peccator, per l’innocente, E pel debole oppresso e pel possente, Misero anch’esso, tua pietà dimostra. Prega per chi sotto l’oltraggio piega La fronte e sotto la malvagia sorte; Per noi, per noi tu prega, prega Sempre e nell’ora della morte nostra, Prega per noi, prega per noi, prega. Ave Maria . . . Nell’ora della morte. Ave!. . .Amen!

SONETOS

Tradução de Vasco Graça Moura XV

XV

When I consider everything that grows Holds in perfection but a little moment, That this huge stage presenteth nought but shows Whereon the stars in secret influence comment; When I perceive that men as plants increase, Cheered and check’d even by the selfsame sky, Vaunt in their youthful sap, at height decrease, And wear their brave state out of memory; Then the conceit of this inconstant stay Sets you most rich in youth before my sight, Where wasteful Time debateth with Decay To change your day of youth to sullied night; And all in war with Time for love of you, As he takes from you, I engraft you new.

Se considero tudo quanto cresce e apenas por um fugaz momento na perfeição avulta, e se este palco enorme não mostra mais que cenas que os astros acompanham por influência oculta; se vejo que igual céu anima e desanima tanto homens como plantas que a par se desenvolvem, juvenil seiva eleva-os e ao fim tombam de cima E logo da lembrança tais glórias se dissolvem; então o conceber desta inconstante essência te põe ante meus olhos mais rico em juventude, enquanto o tempo pródigo se alia à decadência pra que o teu jovem dia na treva vil se mude, Só por amor de ti, co Tempo guerreando, quanto ele te roubar te vou reenxertando.

5


CXXXVIII

CXXXVIII

II

II

When my love swears that she is made of truth I do believe her, though I know she lies, That she might think me some untutor’d youth, Unlearned in the world’s false subtleties. Thus vainly thinking that she thinks me young, Although she knows my days are past the best, Simply I credit her false speaking tongue: On both sides thus is simple truth suppress’d. But wherefore says she not she is unjust? And wherefore say not I that I am old? O, love’s best habit is in seeming trust, And age in love loves not to have years told: Therefore I lie with her and she with me, And in our faults by lies we flatter’d be.

Ao jurar-me ela seu fiel amor, Palavra que acredito e sei que mente; Deve pensar-me um jovem sem tutor, Nos enganos do mundo inexperiente. Assim, pensando em vão que me crê jovem, Saiba embora já fui melhor do que hoje, As suas falas mansas me comovem E a verdade de parte a parte foge. Mas porque não dirá ser ela injusta? Porque não digo minha idade avança? No amor, idade e anos dizer custa E é costume de amor fingir confiança. Deitamo-nos, mentimos, mente, minto. Mentir em culpa é-nos lisonja, sinto.

CXXX

CXXX

My mistress’ eyes are nothing like the sun; Coral is far more red than her lips’ red; If snow be white, why then her breasts are dun; If hairs be wires, black wires grow on her head. I have seen roses damask’d, red and white, But no such roses see I in her cheeks; And in some perfumes is there more delight Than in the breath that from my mistress reeks. I love to hear her speak, yet well I know That music hath a far more pleasing sound; I grant I never saw a goddess go; My mistress, when she walks, treads on the ground: And yet, by heaven, I think my love as rare As any she belied with false compare.

Os olhos como o sol o meu amor não tem E é mais rubro o coral que a sua rubra boca, E então se a neve é alva, seu peito é ´scuro e bem, Se os cabelos são fios, só fio negro a touca. Vi rosas-de-damasco, brancas e encarnadas, Mas tais rosas nas faces não vejo ao contemplá-la. E têm alguns perfumes essências delicadas Mais que as do meu amor no hálito que exala. De ouvi-la falar gosto, contudo, bem no sei, Na música ressoa mais doce afinação: Uma deusa a passar, confesso, nunca olhei, a minha dama, andando, põe os seus pés no chão. E eu penso o meu amor tão raro todavia Como os mais que de enganos gera a falsa poesia.

When forty winters shall beseige thy brow, And dig deep trenches in thy beauty’s field, Thy youth’s proud livery, so gazed on now, Will be a tatter’d weed, of small worth held: Then being ask’d where all thy beauty lies, Where all the treasure of thy lusty days; To say, within thine own deep-sunken eyes, Were an all-eating shame and thriftless praise. How much more praise deserved thy beauty’s use, If thou couldst answer ‘This fair child of mine Shall sum my count and make my old excuse,’ Proving his beauty by succession thine! This were to be new made when thou art old, And see thy blood warm when thou feel’st it cold.

Quando quarenta invernos a fronte te assaltarem, No campo da beleza cavando fundas valas, de bem pouca valia serão, por se rasgarem, de tua juventude as orgulhosas galas. Então a quem pergunte por tua formosura E onde esteja o tesouro ardente de teus dias, responder que em teus olhos cavados na fundura, era vergonha omnívora, louvor de ninharias. Maior louvor mer`cias se da beleza outro uso Responder te deixasse: «neste bela criança Fecharei minhas contas, minha velhice escuso», Provando em ser formosa que é tua por herança. Isto era renovar`s-te ao ser`s velho e sombrio E ver´s quente o teu sangue quando o sentisse frio.

LXXI

LXXI

No longer mourn for me when I am dead Then you shall hear the surly sullen bell Give warning to the world that I am fled From this vile world, with vilest worms to dwell: Nay, if you read this line, remember not The hand that writ it; for I love you so That I in your sweet thoughts would be forgot If thinking on me then should make you woe. O, if, I say, you look upon this verse When I perhaps compounded am with clay, Do not so much as my poor name rehearse. But let your love even with my life decay, Lest the wise world should look into your moan And mock you with me after I am gone.

Não chores mais por mim quando eu morrer Do que ouças sino lúgubre que diz Aviso ao mundo de que fui viver, Ido do mundo vil, como vermes vis. Nem o ler deste verso te recorde A mão que o escreveu, pois te amo tanto, Que em teu doce pensar eu não acorde Se o pensar em mim te causar pranto Ou se (digo eu) olhares esta linha, Quando eu já for (talvez) lama abatida, Não repitas o nome que eu já tinha E caia o teu amor com minha vida. Se não o mundo ao ver-te em luto pôr Há-de troçar de ti quando eu me for.

LXIV

LXIV

When I have seen by Time’s fell hand defac’d The rich-proud cost of outworn buried age; When sometime lofty towers I see down-razed And brass eternal, slave to mortal rage; When I have seen the hungry ocean gain Advantage on the kingdom of the shore, And the firm soil win of the wat’ry main, Increasing store with loss, and loss with store; When I have seen such interchange of state, Or state itself confounded to decay; Ruin hath taught me thus to ruminate -- That Time will come and take my love away. This thought is as a death, which cannot choose But weep to have that which it fears to lose.

De ver que a mão cruel do Tempo desfigura Soberbas pompas ricas da mais remota idade, De ver por terra as torres que tinham mais altura E o bronze eterno escravo desta ferocidade; De ver que o oceano faminto, se violenta O reino à terra firme, já por esta é vencido Seu líquido domínio e assim que se acrescenta Quer perdido com ganho quer ganho com perdido; De ver que entre si mudam estados e até vendo Que o estado mais alto também se deteriora, A meditar assim eu da ruína aprendo Que o tempo há-de levar o meu amor embora. E tal pensar é morte, pois só chorar lhe é dado Por ter o que ele teme venha a ser-lhe levado.

XXIII

XXIII

As an unperfect actor on the stage, Who with his fear is put besides his part, Or some fierce thing replete with too much rage, Whose strength’s abundance weakens his own heart; So I, for fear of trust, forget to say The perfect ceremony of love’s rite, And in mine own love’s strength seem to decay, O’ercharg’d with burden of mine own love’s might. O let my books be then the eloquence And dumb presagers of my speaking breast, Who plead for love and look for recompense More than that tongue that more hath more express’d. O, learn to read what silent love hath writ: To hear with eyes belongs to love’s fine wit.

Como imperfeito actor sobre o proscénio Com medo sai da parte que lhe dão, Ou fúria a mais nalgum mais feroz génio Sendo excessiva afrouxa o coração. Com medo da verdade até me esquece Dizer do amor o claro ritual E a força o meu amor perder parece Co`a carga a mais do meu amor total. Oh deixa que em meu livro, eloquente, Fale meu peito num presságio mudo Que o amor defende, espera a paga urgente, Mais que a língua que disse tudo e tudo. Saibas ler o silente amor escrito! Olhos ouvir, do amor é fino esprito.

LXVI

LXVI

Tir’d with all these, for restful death I cry, As, to behold desert a beggar born, And needy nothing trimm’d in jollity, And purest faith unhappily forsworn, And guilded honour shamefully misplaced, And maiden virtue rudely strumpeted, And right perfection wrongfully disgraced, And strength by limping sway disabled, And art made tongue-tied by authority, And folly (doctor-like) controlling skill, And simple truth miscall’d simplicity, And captive good attending captain ill: Tired with all these, from these would I be gone, Save that, to die, I leave my love alone.

À morte peço a paz, já farto disto tudo, Farto de ver o mérito a mendigar o pão, E ornar a inanidade o mais rico veludo, E a mais ingénua fé rasgada na traição, E o ouro de honrarias em despejados bustos, E a toda a virgindade à bruta rebentada, E a justa perfeição nos tratos mais injustos, E o valor contra a inépcia já não valer de nada, E à força a autoridade na arte pôr mordaça, E doutorais pedantes dar ao talento lei, E a mais simples verdade por lorpa como passa, e no cativo bem o mal ser sempre rei. Já farto disto tudo, não mudo de caminho Pra não deixar, morrendo, o meu amor sozinho.

6

7


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.