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TRADUZIR AS LIÇÕES DA PANDEMIA EM MELHORES CUIDADOS DE SAÚDE TENDÊNCIAS PARA O SECTOR EM 2023

A PANDEMIA DE COVID-19 MUDOU PERMANENTEMENTE OS CUIDADOS DE SAÚDE, DESDE A ACELERAÇÃO DA ADOPÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS E DE NOVOS MODELOS DE ENTREGA DE CUIDADOS AO MAIOR FOCO NA SUSTENTABILIDADE E NA RESILIÊNCIA. AO MESMO TEMPO, ACENTUOU OS DESAFIOS RELACIONADOS COM OS RECURSOS HUMANOS E AS DISPARIDADES GLOBAIS EM TERMOS DE IGUALDADE NO ACESSO À SAÚDE. COM MAIS DE 70% DA POPULAÇÃO MUNDIAL A TER RECEBIDO, PELO MENOS, UMA DOSE DA VACINA CONTRA A COVID-19, O SECTOR ENFRENTA AGORA QUESTÕES CRÍTICAS QUE MOLDARÃO O SEU FUTURO. EIS AS TENDÊNCIAS QUE IRÃO INFLUENCIAR 2023, DE ACORDO COM A CONSULTORA DELOITTE.

Este ano, os prestadores de cuidados de saúde, outras partes interessadas do sector, os governos e os reguladores deverão questionar-se sobre como podem:

• Traduzir as lições sobre digitalização aprendidas durante a pandemia na melhoria do tratamento e dos cuidados prestados aos pacientes;

• Alavancar a tecnologia para reduzir custos e ir ao encontro das exigências dos profissionais de saúde, ao mesmo tempo que se melhoram os cuidados prestados;

• Reduzir a pegada de carbono e, assim, ajudar a mitigar algumas das ameaças ambientais à saúde pública;

• Aliviar a pressão sobre recursos humanos cada vez mais stressados, reformulando o âmbito das necessidades laborais;

• Preparar melhor as instalações, as cadeias de abastecimento e as parcerias para enfrentar futuras pandemias, outros eventos de saúde pública ou desastres naturais.

A Covid-19 não desapareceu, mas os profissionais de saúde pública estão cada vez mais optimistas de que está a tornar-se endémica, o que significa que, apesar do vírus ainda estar presente, está a tornar-se mais previsível e gerível, tal como a gripe sazonal. Apesar de, no final de 2022, várias centenas de milhar de novas infecções terem sido reportadas diariamente em todo o mundo, as novas vacinas reduziram drasticamente o número de mortes. Durante o ano passado, nenhuma nova estirpe foi declarada como “variante de preocupação” pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Isto não significa, contudo, que os “stakeholders” do sector da saúde não devam permanecer alerta, ágeis, flexíveis e preparados para eventuais picos de casos de Covid-19, assim como de outras doenças transmissíveis.

A pandemia ensinou os profissionais de saúde a adaptarem-se ao trabalho remoto, às consultas virtuais e à escassez de material médico, de recursos humanos e de serviços.

Na verdade, o impacto duradouro da Covid-19 poderá representar uma oportunidade para o sector da saúde se reinventar e capitalizar as tendências que estavam a emergir ainda antes da pandemia, como a mudança nas preferências dos consumidores, nos comportamentos dos pacientes e a rápida evolução da tecnologia. O sector também deverá continuar a explorar a inovação clínica e novos modelos de prestação de cuidados, alguns dos quais, como a telemedicina, usados com sucesso numa base generalizada durante a pandemia. Se o sector da saúde aproveitar estas oportunidades, poderá transformar a prestação de cuidados, a experiência do paciente e as formas de trabalho em hospitais e noutras instalações sanitárias e, ao mesmo tempo, reduzir as desigualdades no acesso à saúde. Nesta perspectiva de 2023, a consultora Deloitte revê cinco áreas-chave que serão cruciais para esta transformação.

Saúde virtual

A Covid-19 levantou novas preocupações sobre a sustentabilidade dos actuais modelos de cuidados de saúde, em particular, dos baseados em taxas de serviço, os quais a pandemia revelou a rapidez com que podem ficar sobrecarregados. Ao mesmo tempo, demonstrou como as interacções remotas podem melhorar os cuidados aos pacientes e reduzir os custos para os prestadores, tanto nos cuidados diários, como potencialmente durante uma nova crise sanitária. Mais importante ainda, a Covid-19 acelerou o interesse do sector e a aceitação do público da saúde virtual, em grande parte por necessidade. A saúde mental é um bom exemplo, com a pandemia a empurrar muitos tratamentos para uma configuração virtual, que acabou por colher a preferência de muitos pacientes.

O investimento neste novo futuro dos cuidados de saúde já se iniciou. De acordo com a Deloitte, os gastos com estas soluções terão aumentado 39%, em 2022. Mas, embora o apetite dos pacientes por estas ferramentas esteja a crescer, alguns profissionais de saúde não têm ainda a certeza de como melhor utilizar a tecnologia em ambiente clínico. Outros preocupam-se em poder perder a ligação humana, que é parte integrante da prestação de cuidados. Muito simplesmente, diz a Deloitte, “a saúde virtual tem o potencial de informar, personalizar, acelerar e aumentar a capacidade das pessoas de cuidarem umas das outras, mas só poderá ser eficaz se se mantiver o elemento humano na prestação de cuidados”

A prestação de cuidados de saúde virtuais vai além das videoconsultas. Os seus principais objectivos são expandir o acesso dos pacientes e dos profissionais a serviços de saúde críticos, melhorar os resultados clínicos e a coordenação dos cuidados, reduzir custos e incrementar a eficiência. A saúde virtual oferece também o potencial de proporcionar aos pacientes um melhor acesso a cuidados preventivos, que podem ajudar a impedir que fiquem, efectivamente, doentes.

Além destes aspectos, as soluções de saúde virtual têm ainda o potencial de abordar alguns dos maiores desafios que os cuidados de saúde enfrentam, hoje em dia, incluindo um acesso mais equitativo ao diagnóstico e tratamento para os grupos vulneráveis e um menor impacto ambiental, ao reduzir a necessidade de transportar pacientes para diferentes locais. Na Suíça, onde os cuidados domiciliários estão bem estabelecidos, os prestadores estão a elevar a fasquia, com o Hospital em Casa. Sob este modelo, os pacientes que normalmente teriam de ser hospitalizados recebem monitorização e supervisão 24 horas por dia, através de sensores e dispositivos “wearable”, comunicam com os médicos via telemedicina e, se necessário, as equipas de enfermagem especializadas fazem as visitas presenciais. Esta tecnologia pode também complementar o tratamento existente, ao oferecer aos pacientes, por exemplo, a opção de recuperarem em casa das grandes cirurgias. Todo o processo é realizado em colaboração com farmácias, seguradoras e outras partes interessadas.

Os sistemas de monitorização domiciliária também podem ajudar a aligeirar o crescimento da procura de cuidados de saúde por parte de uma população global cada vez mais envelhecida. Por exemplo, a ligação de “smartwatches” a sensores remotos e monitores poderia reduzir a ida aos serviços de urgência, melhorar a saúde mental dos doentes e a qualidade dos cuidados prestados. Como resultado, o mercado global de dispositivos de monitorização remota deverá crescer para mais de 101 mil milhões de dólares, em 2028, ou seja, 18,9% ao ano.

Os serviços de saúde mental estiveram na vanguarda da saúde virtual durante a pandemia. Hoje, proliferam as apps para ajudar a gerir condições como a ansiedade ou a depressão. Actualmente, estão disponíveis cerca de 20 mil aplicações de saúde mental. A Deloitte prevê que os gastos globais nestas aplicações, que aumentaram 32% nos primeiros 10 meses de 2020, continuarão a crescer cerca de 20% ao ano.

Mas se a saúde virtual vai transformar a forma como os cuidados são prestados, deverá ser desenvolvida com base no feedback dos profissionais de saúde. E há um ingrediente que é essencial para qualquer forma de envolvimento digital, e ainda mais vital para a saúde virtual: a confiança.

Transformação digital

A pandemia sobrecarregou os sistemas de saúde em todo o mundo, resultando num aumento do número de pacientes, das exigências de cuidados, da escassez de recursos humanos e dos desafios da cadeia de abastecimento.

Ao mesmo tempo, um em cada três adultos em todo o mundo tem condições crónicas que representam encargos acrescidos para os sistemas de saúde, estima-se que um em cada quatro irá sofrer doenças mentais em dado momento da sua vida e mais de 75% dos consumidores de saúde espera um cuidado mais personalizado. O custo deste cuidado será significativo: só para a saúde mental, o acumulado, durante o período de 20 anos que terminará em 2030 deverá ser de 16,3 biliões de dólares. Mesmo com o levantamento dos confinamentos e de outras restrições associadas à Covid-19 em muitas partes do mundo, o uso da tele saúde permanece acima dos níveis pré-pandemia. Mais de 40% dos pacientes expressou o desejo de continuar a usar estas soluções à distância, uma procura que irá incentivar os prestadores de cuidados de saúde a investir na transformação digital, para conectarem os pacientes com os serviços que se adequam às suas necessidades e preferências.

Muitos países estão a fazer progressos na adopção de registos electrónicos de saúde. O serviço nacional de saúde do Reino Unido, por exemplo, planeia adoptá-los em todos os hospitais e centros de saúde, até 2025. O serviço de saúde da Estónia, por seu lado, é digital já há 12 anos e mais de 99% dos dados gerados por médicos e hospitais é electrónico. Os pacientes podem aceder aos seus registos médicos através de portais online e as videoconsultas e prescrições electrónicas são prática comum. Não só os pacientes renovam as suas receitas sem terem de visitar um médico pessoalmente, como também não têm de ir à farmácia, já que a maioria dos medicamentos é entregue nas suas casas. Mas as pressões financeiras são uma espada de dois gumes na transformação digital dos cuidados de saúde. Por um lado, a tecnologia pode melhorar a eficiência e reduzir os custos. Por outro, a despesa da mudança de sistemas para novas plataformas digitais pode atrasar a adopção de novas soluções, como as baseadas na Cloud. No Reino Unido e nos países escandinavos, as preocupações com a rentabilidade no sector da saúde estão a impulsionar a digitalização, mas nos Estados Unidos da América e na Austrália passase o oposto.

No entanto, a maioria dos gestores na área da saúde reconhece os benefícios a longo prazo da digitalização. Um inquérito conduzido junto de 400 gestores em seis países apurou que dois terços dos inquiridos esperam mover a sua infraestrutura de tecnologias da informação para a Cloud dentro um ano e 96% espera fazê-lo dentro de três.

Grande parte do foco em torno da digitalização tem sido, especificamente, na gestão e prestação de cuidados, mas a tecnologia, e a automação, em concreto, estão também a reduzir custos e a melhorar os processos de backoffice, tais como a codificação, a facturação, o agendamento, os pagamentos e os contratos públicos. Globalmente, em 2021, os investimentos em tecnologia na saúde ultrapassaram os 44 mil milhões de dólares, o dobro do ano anterior. No entanto, migrar para a Cloud poderá levantar preocupações ambientais. Algumas estimativas mostram que a computação baseada na nuvem gera uma maior pegada de carbono do que a indústria pacientes receberem cuidados. Os algoritmos podem diagnosticar e fornecer aconselhamento e suporte personalizado em canais automatizados, como call centers, mensagens de texto, chatbots e videoconsultas. Um estudo realizado num estabelecimento de atendimento urgente em São Paulo, no Brasil, durante a pandemia, concluiu que a implementação de um sistema de registo através de inteligência artificial reduziu os tempos de espera, em média, 12 minutos e poupou mais de 2.500 horas por ano. A inteligência artificial já está a ser usada para melhorar os diagnósticos e tornar a medicina preditiva mais precisa. Investigadores no DeepMind Health da Google desenharam um algoritmo para identificar factores de risco de falência renal e prevê-la com 48 horas de aérea e que um único centro de dados pode consumir tanta energia quanto 50 mil casas. Tecnologias emergentes, como a inteligência artificial, a tele saúde, o Blockchain e os dispositivos de monitorização, tais como sensores e “wearables”, estão a fornecer dados contínuos e em tempo real sobre a nossa saúde e o ambiente. Isto é, em última instância, uma redefinição do futuro, já que os prestadores de cuidados de saúde podem usar estas inovações para oferecer diagnósticos mais precisos, prever riscos e intervir precocemente.

Nem todas as condições de saúde requerem uma consulta presencial. A inteligência artificial está a aumentar as opções para os antecedência. No geral, o algoritmo teve uma taxa de precisão de 55,8%, mas, em casos graves o suficiente para, mais tarde, exigirem diálise, a sua taxa foi de 90,2%.

Equidade em saúde

Grandes disparidades baseadas na idade, localização, sexo, rendimento, raça, religião e orientação sexual persistem no ecossistema global da saúde, apesar dos esforços significativos por parte dos prestadores de cuidados, das seguradoras, das agências governamentais, das organizações humanitárias, entre outros, para as eliminar. Mais de um quarto da população mundial não tem acesso a medicamentos essenciais e, para mais de dois mil milhões de pessoas em todo o mundo, os medicamentos podem ser incomportáveis do ponto de vista financeiro, estar indisponíveis ou inacessíveis ou ser de má qualidade ou de qualidade não regulamentada. O rendimento, a educação e as condições de vida e de trabalho podem moldar a saúde física e comportamental. Em muitos casos, os indivíduos têm pouco ou nenhum controlo sobre factores que podem afectar directa ou indirectamente a sua saúde, tais como a poluição, a escassez de fontes alimentares ou a segurança. E os problemas não são novos. Há cinco décadas, as organizações de saúde pública nos Estados Unidos da América começaram a documentar as disparidades na mortalidade materna com base na etnia. Nas décadas seguintes, a investigação desenvolveu muitas outras ligações entre estes factores não clínicos e os resultados de saúde a longo prazo. Por exemplo, as crianças expostas a circunstâncias stressantes no dia-a-dia são mais propensas a adoptar comportamentos de risco, como o tabagismo e o abuso de drogas e/ou álcool. Estudos também descobriram que privar os bebés de um ambiente amoroso causa danos duradouros ao seu bemestar emocional, inteligência e capacidade de desenvolvimento. No entanto, os esforços para reduzir ou eliminar sistematicamente estas disparidades têm-se revelado difíceis.

A pandemia sublinhou ainda mais a falta de igualdade na saúde. O vírus afectou desproporcionalmente os grupos mais vulneráveis e focou a atenção do público sobre como as comunidades são tão fortes quanto os seus membros mais fragilizados. Como resultado, muitas organizações de saúde estão a repensar a forma de lidar com a desigualdade.

Uma medida-chave da equidade em saúde é a esperança média de vida. Se pessoas que vivem na mesma área geográfica têm diferenças significativas em termos de esperança de vida, tal se pode dever a estes impulsionadores das desigualdades em matéria de saúde. A Etiópia, por exemplo, tem uma esperança média de vida de 65,6 anos, cerca de três anos mais do que o vizinho Quénia. Nos últimos anos, a Etiópia adoptou estratégias de saúde baseadas na comunidade, melhorou o acesso a água potável e expandiu as iniciativas de educação e capacitação das mulheres. As disparidades na prestação e acesso aos cuidados fazem parte de um sistema maior que envolve preconceito, racismo e enviesamento. No Verão de 2020, 75% dos novos casos de Covid-19 na Arábia Saudita e 95% em Singapura eram de trabalhadores migrantes. Isto segue um padrão visto noutros surtos de doenças, em que a discriminação em relação aos migrantes reforçou as barreiras no acesso aos cuidados de saúde. A desigualdade na saúde também influencia onde as instalações estão localizadas e as lacunas na formação dos médicos. Estas desigualdades não são apenas um problema de saúde pública ou social, são também um problema económico. O Parlamento Europeu, por exemplo, estimou que, todos os anos, as desigualdades em saúde na União Europeia custam cerca de 1,4% do Produto Interno Bruto, quase igualando os gastos em matéria de defesa (1,6%).

Recursos humanos

A pandemia exacerbou também os desafios de recursos humanos existentes nos cuidados de saúde. De certa forma, as mudanças demográficas globais nos cuidados de saúde que ocorreram após a pandemia sempre existiram, mas foram agravadas. Até 2030, o sector, a nível global, precisará de mais 80 milhões de trabalhadores e cerca de 18 milhões serão necessários nos países de baixos rendimentos. 83 países da África Subsaariana, Sudeste Asiático, Sul da Ásia e

Oceânia não cumprem actualmente os padrões básicos de 23 profissionais de saúde qualificados por 10 mil pessoas.

A nível global, os enfermeiros representam o maior segmento da força de trabalho no sector dos cuidados de saúde e cerca de 90% das associações internacionais que representam esta classe está preocupado com o facto das elevadas cargas de trabalho, da escassez de recursos e do stress relacionado com a pandemia estar a levar cada mais enfermeiros a abandonarem a profissão. As organizações de saúde cada vez mais dependem da inovação para recrutar e reter trabalhadores. A maioria destas inovações envolve digitalizar processos, adaptando-se a necessidades futuras, e a personalização da compensação e dos benefícios dos colaboradores, tais como a oferta de reembolsos de empréstimos estudantis, subsídios para creches e assistência no pagamento das prestações da casa.

As organizações de saúde não são imunes às mesmas questões relacionadas com os recursos humanos que enfrentam outros sectores desde a pandemia. Muitos trabalhadores habituaram-se ao trabalho remoto e já não querem estar no local de trabalho cinco dias por semana. Como resultado, está-se a apostar na criação de ambientes de trabalho mais apelativos e sustentáveis e a adoptar estratégias de retenção personalizadas, tais como a adaptação da remuneração e dos benefícios às necessidades individuais, além de oferecer maior flexibilidade de horários e iniciativas de diversidade, equidade e inclusão, que apelam a trabalhadores de saúde mais jovens. As organizações precisam de uma nova reflexão sobre a gestão dos seus recursos humanos e sobre a sua estruturação. As velhas hierarquias já não funcionam e os profissionais precisam de mais apoio, tanto da automação como de outros profissionais. Estes novos os modelos ajudarão a tornar os cuidados de saúde mais sustentáveis e eficazes para os recursos humanos e a produzir melhores resultados para os pacientes. De facto, outros profissionais, como os farmacêuticos, podem desempenhar um papel mais alargado na melhoria dos cuidados prestados aos doentes. Hoje, os farmacêuticos cumprem uma função baseada no produto. No entanto, podem mover-se na direcção dos serviços clínicos ou dos cuidados primários e do bem-estar, prestando apoio especializado.

Sustentabilidade

As alterações climáticas representam a maior ameaça à saúde da humanidade, colocando em risco o acesso a ar limpo, a água potável, a alimentação adequada e a abrigo seguro, à escala global. Entre 2000 e 2016, o número de pessoas expostas, em todo o mundo, ao calor extremo aumentou em cerca de 125 milhões. As ondas de calor pressionam os serviços de saúde e de emergência, o abastecimento de água e de energia e os serviços de transporte. A segurança alimentar também pode ser comprometida se as pessoas perderem as suas colheitas ou gado por causa do calor extremo.

As consequências, a longo prazo, são ainda mais severas. O aumento das temperaturas deverá causar cerca de um quarto de milhão de mortes, em todo o mundo, por desnutrição, malária, diarreia e stress térmico, entre 2030 e 2050. Além disso, emissões de carbono mais elevadas podem desencadear questões meteorológicas e ambientais que, por sua vez, influenciam a saúde, como a maior frequência de secas, incêndios florestais, poluição atmosférica e subida do nível do mar. Estas, por sua vez, podem levar ao aumento dos alergénios, conduzir a problemas respiratórios e a doenças infecciosas. Mais de 90% do mundo respira ar pouco saudável, resultando em 13 milhões de mortes por efeitos ambientais, todos os anos. As ondas de calor têm sido também associadas ao aumento das taxas de internamento hospitalar para distúrbios mentais. Estima-se que o custo destes riscos acrescidos para a saúde pública se situará entre dois mil milhões e quatro mil milhões de dólares por ano, em 2030. Responder a estas ameaças requer sistemas de saúde mais resistentes e sustentáveis.

Enquanto as organizações de saúde carregam os encargos de tratar o número crescente de doenças relacionadas com as alterações climáticas, o impacto também afecta os próprios profissionais de saúde. Como testemunhado durante a pandemia de Covid-19, a procura crescente dos serviços de saúde poderá tornar o desempenho das suas funções mais desafiante. Mas ao mesmo tempo que o tratamento das consequências das alterações climáticas recai sobre o sector dos cuidados de saúde, também este contribui para o aumento dos níveis de carbono que impulsionam as alterações climáticas. Se o sector da saúde global fosse um país, seria o quinto maior emissor de gases com efeito de estufa, representando até 5% das emissões.

Nesse sentido, 45 países comprometeram-se em reduzir a produção de carbono relacionada com os cuidados de saúde e em tornar os seus sistemas de saúde mais sustentáveis, como parte do Programa de Saúde COP26 da OMS. 14 dos países fixaram atingir a neutralidade carbono antes ou até 2050.

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