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COMPOSIÇÃO DE UM REPERTÓRIO AFRO DE MATRIZ BRASILEIRA

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Depois que os painéis semânticos revelaram que a pesquisa de referências da turma ainda precisava de aprimoramento, o professor Anderson Penha propôs um novo exercício: a criação de dioramas em grupo, reproduzindo um experimento de composição de cena que ele havia vivenciado no workshop de direção de arte ministrado pelo estilista Jum Nakao. A sala deveria recriar o momento do encontro entre Akin e Moss, do conto Cangoma, num cenário feito de papel pluma com três níveis de profundidade. Mais importante do que garantir o material de papelaria necessário, porém, era assegurar o aprofundamento da pesquisa. Desta vez, os alunos teriam de procurar suas fontes na cultura afro brasileira. Nesse ponto da aula, Michel Cena7 explicou a simbologia do ideograma sankofa, a figura do pássaro que olha para trás: “retornar ao passado para ressignificar o presente e construir o futuro”. A ancestralidade, portanto, era um elemento importante a ser buscado.

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A construção de um repertório sobre Afrofuturismo de matriz brasileira passa por entender que aqui chegaram povos africanos de origens diversas: Angola, Congo, Moçambique e da região do Golfo de Benim, entre Gana e Nigéria 1 . Essas nações são o berço de elementos culturais que evoluíram no Brasil, como capoeira, candomblé, acarajé, vatapá, caruru, feijão preto, festividades, linguagem e música, embora, devido ao sincretismo, nem sempre seja possível fazer a associação direta com os países citados.

Diante dessa gama de manifestações, compreende-se que a cultura afro resistiu e também foi influenciada pelos indígenas e europeus, dando, assim, origem a novas expressões. É nesse pano de fundo que o afro brasileiro surge, se constrói e se estabelece como cultura; que não é só negra, mas é essencialmente brasileira.

Na nova pesquisa de imagens para a composição dos dioramas, os alunos seguiram sugestões de fontes dadas pelos convidados ou trilharam caminhos próprios. Nas próximas páginas, alguns depoimentos da sala:

1 Era da Escravidão

Uma discussão que me marcou nas aulas foi sobre como era impossível criar uma estética afrofuturista brasileira sem levar em conta nossa miscigenação histórica. O maracatu me veio à mente como uma das manifestações mais ricas nessa mistura da cultura negra, indígena e branca e pensei que o caboclo de lança seria uma ótima personificação da Moss e seu estilo guerreiro. Para compor o cenário, imaginei transformar tudo numa guerrilha de favela. Então, misturei referências do maracatu, da quebrada e de artistas contemporâneos, como Cemfreio, Edgar e André Firmiano. Bruno Lindolfo “ ”

Maracatu.

Mulheres Ngqoko, África do Sul.

Por indicação da Carla Andrade, iniciei a leitura de Um Defeito de Cor, de Ana Maria Gonçalves, e me apaixonei pela prosa da autora. No texto, procuro observar vários pontos levantados ao longo das aulas, como o simbolismo dos elementos da natureza, os rituais e as questões do corpo negro, especialmente da mulher. Lúcia Gurovitz “ ”

“Comecei a pesquisar músicas, movimentos artísticos, visitei o ateliê do Michel Cena7 e fui também ao Museu Afro Brasil, cheio de referências que me ajudaram a mergulhar no contexto afro brasileiro. No museu, as referências às religiões de matrizes africanas chamaram a minha atenção. Essas manifestações carregam muitos elementos culturais presentes na realidade brasileira.”

Ciro Koshiyama

“Vinha de uma trajetória de desenvolvimento individual, a partir da experiência com os orixás cultuados na umbanda. Foi quando percebi que o que eu sabia precisava ser ampliado e aprofundado em outras esferas, integrando ao espírito o corpo e a mente. Ao corpo, uni o início da formação em dança afrobrasileira, podendo experimentar na materialidade, a origem. E à mente, o início de um processo de investigação psíquica com base nos arquétipos, que sinto que existirá por muito tempo.”

Roberta de Barros Barreto

No dia do exercício, cada aluno trouxe seu material de criação (imagens impressas). A sala foi dividida em seis equipes, e dentro de cada grupo, os integrantes compartilharam sua pesquisa com os demais integrantes para chegar a um consenso a respeito dos elementos que comporiam o diorama. Michel orientou a turma ao longo do processo, dando sugestões de como distribuir e equilibrar formas e cores dentro da espacialidade do cenário. Ao final da aula, Anderson pediu que a sala elegesse os dois dioramos favoritos e se dividisse novamente, desta vez em dois grupos, para passar à fase seguinte — a criação de duas experiências físicas com base nas cenas eleitas. Havia ainda um desafio extra, colocado desde o primeiro dia de aula da disciplina: ambos os grupos deveriam explorar o gelo como materialidade em algum momento de suas narrativas.

Criação dos dioramas na sala de aula.

Ilustração de Iemanjá.

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