IDEIAS LÍVIA SAMPAIO E UMA EXPERIÊNCIA ELABORADA NO CINEMA
atarde.com.br/muito muito@grupoatarde.com.br
DOM
SALVADOR 22/12/2019
7
Uendel Galter / Ag. A TARDE
TATIANA MENDONÇA
C
«
hegou o novo hit dos paredões, bebê”, anuncia uma voz de mulher enquanto a câmera mostra do alto a Baixinha de São Gonçalo, em Salvador. Com um black imponente, jeito marrento e top prateado, Alana Ramos, 24, se enrosca com um homem enquanto canta: “Ai, pai, pirraça / A dama gosta quando você pega e maltrata”. Lançado no dia 14 de novembro, o clipe de Pirraça tem quase 800 mil visualizações.
Quando chegou para a gravação, Alana, mais conhecida como A Dama, mesmo nome da sua banda, conta que não tinha muita noção do que fazer ali. “Falei logo para o cara não encostar muito em mim. Eu, sinceramente, não sabia ser sensual em momento algum. Foi ele que guiou a cena”, ri. Lésbica e negra, Alana é hoje o maior nome de uma cena que ainda engatinha, a de mulheres à frente de grupos de pagode baianos. O gênero, que começou a ganhar força no estado na década de 1990 com o Gera Samba, que depois
Pagode das
virou o É o Tchan, teve, desde sempre, comando masculino. A elas eram reservados os papéis de dançarinas ou backing vocals em trajes mínimos, duas funções que Alana ocupou no começo da carreira. Agora, diz, é chegada a hora da “revolução”. “Eu tava cansada de depender de homem para fazer sucesso”. Nos palcos desde os 17, há dois anos ela resolveu seguir carreira solo. Conta que no começo fez muita participação em shows de outros grupos ganhando uma água ou o dinheiro do transporte e que levou
CULTURA Cantoras abrem caminho numa cena marcadamente masculina
meninas
“
Eu, sinceramente, não sabia ser sensual em momento algum” Alana Ramos, líder da banda A Dama
muita porta na cara de empresários que não acreditavam no seu projeto. Mas, sabe como é, “você é o único representante do seu sonho na face da terra”, canta Emicida, e Alana continuou acreditando no seu. Rap é um negócio que ela ama. Bem mais que pagode. “Não curto pagode pra escutar. Minhas ideologias são outras. Mas dentro de Salvador o pagode é a única oportunidade que você tem de chegar a algum lugar”. Ela começou a achar que estava chegando a esse lugar quando recebeu uma ligação a caminho do Salvador Fest, o maior festival de pagode da cidade, que aconteceu em setembro. Era um amigo avisando que Tony Salles, do Parangolé, estava cantando Pirraça. Foi a primeira vez que pensou: “Tô famosa”. Ela não estava na grade da festa, embora acredite que devesse estar. Foi fazer uma participação no show d’O Poeta, seu colega na Inocentes Produções, e acabou ovacionada pelo público.
Direitos iguais
Antes de viver de música, Alana, que mora em São Marcos, ganhava a vida como garçonete e assistente de cozinha. Compõe desde os 15 e acredita que foi o seu discurso, “uma parada diferente”, que fez com que ganhasse projeção numa cena marcada por letras machistas. “Eu faço a defesa das mulheres, dos direitos iguais”, diz, antes de cantarolar uma de suas músicas. “Ela fica com quem quiser / Pare de falar besteira / Ela não é puta / ela é solteira”. Em algumas composições suas, é como se certa agressividade tivesse trocado de sinal, sido autorizada. Numa, pede “dá murrinho, dá”, em outra, “bate na minha cara”. Para Alana, “entre quatro paredes, vale tudo”. “No particular, gosto de sexo violento. Mas isso não quer dizer que tô fazendo apologia ao crime, que o homem tem que chegar fora da cama e espancar a mulher”. Durante a sessão de fotos para esta reportagem, no Farol da Barra, uma menina se aproxima, tímida, e pede uma selfie. “Eu tô toda me tremendo”, diz, depois de ganhar a imagem e um abraço. Em fevereiro do próximo ano, Alana vai iniciar ali seu desfile de estreia no Carnaval de Salvador. Tem grandes planos para o verão, e além. “Quero Brasil. Pagode é muito Bahia. Quero fazer um pagopop. Não tenho muita técnica musical. Tipo voz, e tal. Mas agora tenho fono, tô estudando para cantar outros estilos”. CONTINUA NA PÁGINA 2
Adilton Venegeroles / Ag. A TARDE