EDITORIAL
Paulo Paiva Presidente da Direção apatlis@apat.pt
Parece que a nossa vida passou a reger-se por eventos fraturantes, que obrigam a mudanças de paradigma, mas a realidade é que esses eventos têm forçado a maior rapidez com que se operam as mudanças, que antes seriam porventura mais faseadas e estendidas no tempo. Enfrentamos uma emergência sanitária, a que se adiciona uma emergência humanitária, com a diferença que esta última (guerra) está a acontecer à porta da União Europeia - o que nos dá uma maior amplitude na perceção da gravidade, no sentimento de perigo e na ameaça efetiva ao nosso modo de vida. Na vida dos Transitários, além de partilharmos as agruras dos eventos que a todos atingem sem exceção, enfrentamos grandes desafios logísticos, amplamente conhecidos dos mais atentos a este setor. No entanto, não posso deixar de manifestar a minha total indignação e condenação sobre algo que está a acontecer desde janeiro de 2022 e que afeta todas as empresas cujo CAE as coloque no âmbito da atividade transitária: Os Transitários estão a ser alvo de discriminação por parte de uma companhia
marítima que os impede de oferecer soluções logísticas baseadas no respetivo serviço de transporte de contentores. Discriminação ocorre sempre que se reúnem os seguintes fatores: há uma capacidade de reconhecer ou estabelecer diferenças entre pessoas, grupos, objetos e situações; existe uma forma desigual de tratamento dispensado a pessoas, grupos ou entidades em comparação com a maneira como as restantes são tratadas; há um tratamento desfavorável imposto a pessoa ou grupo de pessoas, em razão de determinado critério. Pois bem, depois de largos anos de relacionamento com excelentes resultados para ambas as partes, a Hamburg Süd decidiu, unilateralmente, que os transitários deixaram de ser elegíveis para manter relações comerciais no serviço de transporte de contentores. Ou seja, passámos a ser alvo de recusa de serviço, porque somos Transitários! A Hamburg Süd mantém as suas operações, com a “nuance” de passar a oferecer serviço diretamente aos clientes dos transitários, recorrendo a informação comercial privilegiada e confidencial, que apenas era partilhada por nós com a finalidade de cumprir exigências e obrigações aduaneiras e ao nível do contrato de transporte. Falo em clientes dos transitários, e não
da companhia marítima, no sentido em que esta é somente uma parte integrante do serviço de logística internacional, providenciado pelo transitário (Operador de Logística Internacional) e que inclui muitas outras etapas/fases, em que o transporte é apenas uma delas. Esta última situação de oferta direta de serviços não é inédita, existindo concorrência entre armadores, agentes de navegação, transitários e despachantes. O que é condenável, e motivo de forte protesto, é que seja vedado aos transitários, pela discriminação ao nível do CAE, o acesso ao serviço que a Hamburg Süd continua a prestar. Tenho esperança que também esta decisão unilateral seja revertida rapidamente, pois os clientes precisam de poder contar com todas as soluções existentes, sem mais constrangimentos e ‘chico-espertismos’, que só contribuem para dificultar ainda mais a vida de todos os intervenientes na logística internacional. É moralmente desonesto, social e economicamente inaceitável que no século XXI nos deparemos com esta forma degenerada de atuar em sociedade, sobretudo partindo, como neste caso, de uma organização com forte responsabilidade e beneficiando de um prestígio intocável, até agora!