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INTENÇÕES PARADIGMÁTICAS
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Paradigmas e antecedentes ambientais Subterrâneos
glossário; glossário; paradigma; paradigma; pensamento pensamento concreto. concreto.
paradigmas paradigmas e antecedentes e antecedentes ambientais ambientais subterrâneos subterrâneos
INTENÇÕES INTENÇÕES PARADIGMÁTICAS PARADIGMÁTICAS
Estruturo um pensamento concreto. Caminho por entre ideias que são experimentadas e incorporadas. As ideias se refletem em ações concretas no espaço habitado pelo corpo. Essas ações concretas retornam ao corpo em forma de registros. Os elementos registrados alimentam a integração do corpo. Esse corpo constitui pensamentos pensados com o corpo. Pensamentos concretos. Ao caminhar durante anos pelas veredas das questões do corpo nos espaços da Cidade, principalmente em pesquisas acadêmicas e atividades pedagógicas, houve uma aproximação natural e fortuita com a Fenomenologia de Merleau-Ponty, Martin Heidegger, Gaston Bachelard, Christian Norberg-Schulz e Juhani Pallasmaa. A Fenomenologia das percepções e relações corporais e ambientais estabelecidas pelos autores fazia sentido, sendo até difícil precisar com exatidão qual e em quais circunstâncias; e, por isso, foram assumidas como sistema zero para uma visão de mundo da corporeidade do homem na Cidade. Poderiam existir outras, que provavelmente são assumidas por mim em menor grau, mas optei por caminhar por este caminho. E como dito anteriormente, os conceitos presentes no caminho são incorporados, transformados em pensamentos concretos. Com o passar do tempo, a incorporação fica mais profunda, subterrânea, pois sobre ela vão se sedimentado outros novos pensamentos concretos, ação natural gerada pela passagem do tempo. Em virtude disso, aquelas primeiras incorporações são assumidas e absorvidas, já não sendo algo externo colocado sobre o corpo, mas uma parte dele, uma constituição do eu, do meu. Como postura consciente e metodológica, desviando dos positivismos de algumas ciências, tais conceitos subterrâneos são resgatados como vestígios de sua ação sobre o corpo e traduzidos em forma de um glossário, um agrupamento de anotações primitivas sobre termos encontrados nesses vestígios. Termos obscuros e estranhos (unheimlich), típicos dos glossários enfeixados em volumes anexos, durante a Idade Média.
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Anotações que não têm o intuito de esclarecer o termo destacado – motivo pelo qual chamo de um falso glossário – mas sim configurar um encadeamento de ideias, como passos de uma caminhada. Por isso, diferente de um glossário, onde os termos são organizados de forma alfabética, tornando-os independentes entre si, aqui os termos são postos sequencialmente, com o anterior apontando para o próximo, como nos passos de uma caminhada. O recuo de um pé anuncia a chegada, o retorno, do outro, encadeandoos. O recuo do primeiro só é possível por causa da passagem e presença do outro que vem chegando.
Fenômeno (do grego phainómenon)
Estar no mundo é um ato concreto, um posicionamento perante uma sequencia de inúmeros acontecimentos que se desenvolvem ao nosso redor. Acontecimentos naturais, vindos da natureza, e acontecimentos decorrentes da ação do próprio homem ou de algum outro. Acontecimentos que afetam a vida humana, em qualquer grau. Chamo-os de fenômenos. Da chuva ao barulho de uma torneira pingando sobre a pia de metal. Da brisa ao movimento hipnotizante do ponteiro de segundos de um relógio. Da árvore ao reflexo distorcido gerado pela superfície polida de uma tigela metálica de salada. Da cidade ao vestígio de cheiro de um pão assado saindo do forno quente da cozinha que atravessa cômodos e andares. Da morte a lembrança de uma memória de infância. De todos os possíveis fenômenos, me detenho aos acontecimentos do mundo da vida cotidiana, extraordinários ou banais, que provocam, impactam, atritam, solicitam a ação e constituição do corpo.
Corpo (do latim cörpus)
Maneira concreta de estar no mundo da vida cotidiana, receptáculo físico e psíquico com o qual o Eu se apresenta e interage com os fenômenos, o corpo é a presença do Eu no mundo. É com o corpo que o Eu busca e recebe estímulos do mundo, independente se tais fenômenos forem reais ou simulados. Um corpo que faz parte da constituição do sujeito, onde o Eu deposita suas relações com o mundo, suas memórias, suas intelectualidades, suas vivências, seus traumas, seus sofrimentos, seus conflitos, internos e externos. Um corpo que pode ser pleno, total, sem órgãos, vazio, quente, frio, passivo, fragmentado, dócil, cordial, abstrato, ideal, mecanizado, maquínico, universal, unidimensional, errante, sedentário, temporal, espacial. Uma constituição que ocupa um espaço concreto. Uma presença que transforma esse espaço. Um espaço transformado em Lugar. Um Lugar.
Lugar
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(do latim locus)
Antes havia apenas a Natureza, e dentro dela o homem. Em algum determinado momento, o homem começou a assumir a sua presença dentro da Natureza, o que gerou, consequentemente, um processo de distanciamento do homem da Natureza e uma compreensão e assimilação do mundo. O mundo, ou melhor, a Natureza, se torna algo externo ao homem. E nessa externalização, ele experimenta novas configurações de Natureza. Ele percebe, sem é claro intelectualizar sobre, que ela é composta de tempo e de espaço, e que seu corpo tem posição dentro do sistema; o que faz com que esse corpo tenha a capacidade de preencher um espaço e um tempo. O homem retorna, assim, à Natureza, mas desta vez construindo artificializações dela. Ele delimita espaços e preenche o tempo com memórias. Começa a habitar a Natureza com artificializações.
Cria assentamentos, diz “aqui nesse espaço eu permaneço durante um tempo”. Estabelece relações com o tempo e o espaço. Artificializa. Nessa permanência, percebe, com o corpo, características espaço-temporais daquele local assentado. Constitui o caráter dali, e com ele aprofunda sua condição dentro do sistema. Faz uso conceitual do caráter do espaço para a sua orientação, e do caráter do tempo para sua identificação. Transforma a Natureza exterior, genérica, apenas paisagem, em seu domínio interior, específico, habitat. Um habitat aonde seu corpo pertence, faz parte. Nesse pertencimento, constrói uma fronteira, uma separação entre paisagem e assentamento, natural e artificial, fora e dentro. Ou seja, aquele espaço-tempo natural, com a presença e permanência do corpo, se transforma em Lugar. Sintetizando, só há Lugar se houver corpo. E não apenas um corpo físico, mas também um corpo sensível, apto a reconhecer sensivelmente o caráter que condiciona o Lugar, percebê-lo. Para o Lugar existir, é necessário ao corpo uma ação de percepção.
Percepção (do latim perceptivo)
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Para constituir um Lugar no mundo, o homem configura um campo possível aonde especular ações sensíveis. Para construir um lugar identitário, o homem procede uma ativação do corpo que sente. Dá valor a sua capacidade corporal de sentir o mundo. Encontra em seu corpo mecanismos para “ler” as características ambientais fornecidas. Para isso, estabelece em seu corpo as respostas para tais características: cheiro, sabor, som, textura, aparência. Respostas que dão sentido ao mundo: respostas sensoriais. Sensações. Dizemos: “este lugar é cheiroso”, “aquele lugar é barulhento”, “um lugar escuro”. Sentimos o lugar. Mas o sentir não basta. O corpo responde fisiologicamente ao estímulo externo, uma resposta involuntária. O ambiente tem cheiro; esse cheiro estimula nosso corpo e sentimos o cheiro não porque queremos, mas porque podemos. A sensação acaba se configurando como um procedimento passivo, condicionado a uma questão externa. A transformação desse estímulo externo em algo particular e específico ao sujeito passa justamente pelo aprofundamento da noção de sensação para a de percepção. Perceber o cheiro do lugar é uma construção ativa. Sentimos o cheiro, involuntariamente, e o transformamos, ativamente, em uma percepção de cheiro ao processá-lo em nosso corpo, em nossa mente, em nossa memória. Decidimos perceber um cheiro, dar-lhe importância, marca-lo no lugar. Por isso vamos dos cinco sentidos aos sistemas perceptivos. Sistemas mais complexos e profundos onde intensificamos as sensações, misturando-as entre si e com nossa memória, nossa subjetividade. Um mesmo cheiro é percebido de maneiras diferentes em ambientes com texturas diferentes, luminosidades diferentes, dimensões diferentes, memórias diferentes. Somamos os estímulos sensoriais e os transformamos em percepção. E para tal transformação precisamos ativar o corpo todo, é evidente. Sentimos o som de um ambiente com o ouvido, mas percebemos o som de um ambiente com todo o corpo. Ainda mais quando tratamos de construir percepções espaciais, tridimensionais. Essa percepção só tem lugar porque colocamos ativamente todo o corpo para perceber. E não só o corpo delimitado pela pele, mas toda uma extensão corporal “invisível”. Ativamos um sistema perceptivo amplo e complexo, o sistema háptico.
Sistema háptico (do grego haptikós)
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Talvez a maneira mais essencial de experiência de um espaço tridimensional. A percepção do mundo, do nosso lugar no mundo, certamente é mais rica, profunda, constituinte e complexa se levada a cabo por todo o corpo. O sistema perceptivo háptico é nossa ferramenta fundamental para ler a Cidade, construir a Cidade, estar na Cidade, incorporar a Cidade.
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