TREVL 19 — Verão 2019 (amostra)

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Scrambling

Florida

André sousA numA 125

triumpH scrAmblEr 1200 Em mArrocos

HArlEy-dAvidson sportstEr 1200

4,50€ (Continente) IVA Inc.

TREVL#19 | Verão 2019 — Quadrimestral

América do Sul

Austrália • Cazaquistão • Florida • Mongólia


Destinos

África

3 África do Sul Angola Argélia Botsuana Congo (R. D.) Egipto Etiópia Gâmbia Malaui Marrocos 6 10 14 10 13 1 2 Mauritânia 4 9 Moçambique 3 Namíbia Quénia Ruanda Sahara Ocidental 1 São Tomé e Príncipe Senegal (Dakar) Sudão Sri Lanka Tanzânia 3 Zâmbia

9 15 17 4 9 1 3 15 17 9 10 9 18 9 18 9 17 4 15 16 17 19 14 9 17 15 17 18 4 15 17 4 9 18 9 10 14 9 17 5 2 9 17 2 9 18 10 9 15 18 4 15 17

Ásia

Arménia Azerbeijão Burma (Myanmar) Camboja Cazaquistão China Geórgia 3 Índia Indonésia Irão Iraque Japão Laos Malásia Mongólia Nepal Paquistão Quirguistão Tailândia Tajiquistão Timor-Leste Turquemenistão Usbequistão Vietname

Oceânia

Austrália Nova Zelândia

América

Conhece aqui quais os destinos de viagem de moto sobre os quais já publicámos, tanto na TREVL, como na REV.

Nesta edição

Os destinos incluídos nesta edição estão destacados com um fundo amarelo.

Edições passadas

Cada entrada nas tabelas seguintes tem a indicação de qual o número onde foi publicada (a amarelo na TREVL, a azul na REV).

Interactivo

Para uma experiência mais interactiva com visualização sobre o mapa-mundo, sugerimos visitar o nosso site na secção «Destinos».

98

«Alasca» (EUA) 4 Argentina Belize Bolívia 4 6 7 Brasil Canadá 4 Chile Colômbia Costa Rica El Salvador Equador 6 5 EUA Guatemala México Nicarágua Panamá Paraguai 6 Peru 6 Uruguai Venezuela

7

8 15 16 6 7 9 11 9 12 15 16 7 8 9 11

5 7 8 11 4 9 7 8 9 8 9 14 15 9 9 9 7

8 8 9 13 19 7 17 14 17 14 9 9 13 9 19 11 18 11 9 9 16 11 11 13

7 19 18

5 11 6 13 7 10 11 12 17 18 19 5 4 11 7 11 12 8 16 17 18 19 5 10 11 12 17 19 4 5 7 8 5 8 17 5 8 17 4 7 17 7 12 15 16 19 2 5 8 17 12 16 17 5 8 17 5 8 17 6 11 19 5 4 7 11 12 4 7 10 11 17 4 8

Europa

7 Albânia Alpes 3 Balcãs Bielorússia Bósnia e Herzegovina Bulgária Córsega Croácia Dinamarca 1 Espanha 1 Escócia Eslovénia Gales Grécia Georgia Inglaterra Irlanda Islândia Itália Letónia Kosovo Moldávia Montenegro 1 Noruega Pirenéus Polónia Roménia 3 7 8 Rússia Sérvia Suécia 2 7 8 11 Turquia

Portugal

10 11 15 1 2 17 7 15 17 9 7 15 7 1 7 8 14 4 5 7 5 6 12 7 2 7 11 17 2 6 2 1 3 5 7 9 2 7 15 17 7 15 8 13 14 1 5 7 9 14 16 17 11 14 19 2 7 15 14 12 14 17

Açores Alto Alentejo Alta Estremadura Alto Douro Beira Baixa Madeira (ilha da) Serra Algarvia Serra da Arrábida S. de Aires e Candeeiros Tejo dos Castelinhos

Espanha

Deserto de Bardenas Galiza Picos de Europa Ruta de la Plata Sierra Norte

12 7 13 3 2 10 13 17 1 1 7 10 1

5 12 1 5 4 7 7


Editorial

Lilliput

R

egressei onde passei muitos momentos da minha infância e juventude. A um sítio onde as árvores eram grandes, os espaços imensos, as distâncias infindas. Onde, para chegar ao figo maduro, precisava de pular. Mas hoje regressei já crescido, de outro tamanho. E agora, tudo parece pequeno. Sobre todas as coisas há uma nova perspectiva, um ângulo distinto. Algumas não as reconheço sequer. Da pena de Jonathan Swift nasceu Gulliver, um viajante que enviou para destinos remotos. E para este, quando tudo era novo, ele encontrou Brobdingnag onde se sentia pequeno e tudo era grande. Como aquela sensação que temos quando viajamos e parece que não vai caber tudo na nossa mochila de memórias, de tão enormes os sentimentos e experiências. Como Gulliver, deixamo-nos por vezes carregar na palma da mão de desconhecidos, que nos querem guardar no bolso do casaco e correr a mostrar aos amigos. Somos muitas vezes atracções nos destinos onde éramos nós quem queria ver as atracções. Somos fotografados em animados grupos que se pasmam pelo arrojo das nossas viagens e a estranheza das nossas feições. Somos nós os alienígenas e assim seremos lembrados, grandes mas a sentirmo-nos pequenos. Voltar a casa de uma viagem é ser Gulliver na imaginária ilha índica de Lilliput. Sem que o tenhamos forçosamente percebido na altura em cada dia passado a viajar, fomos crescendo muito com o que vimos, com as pessoas que conhecemos tão magnânimes e as enormes partilhas. E por isso, regressado, observa tudo com o alcance que a sua nova dimensão lhe permite. Porque eu sou do tamanho do que vejo E não, do tamanho da minha altura... (Alberto Caeiro, «O Guardador de Rebanhos») Das viagens regressamos gigantes, capazes de escrever histórias de fantasias vividas. Somos maiores agora e vemos bem mais longe. Crescemos

José Bragança Pinheiro Director — jbpinheiro@trevl.pt

19

América do Sul

Scrambling

Florida

ANDRÉ SOUSA NUMA 125

TRIUMPH SCRAMBLER 1200 EM MARROCOS

HARLEY-DAVIDSON SPORTSTER 1200

Foto Filipe Elias 4,50€ (Continente) IVA Inc.

Jun - Ago 2019

TREVL#19| Jun - Ago 2019 — Quadrimestral

AUSTRÁLIA — AMÉRICA DO SUL — CAZAQUISTÃO — FLORIDA, EUA — MONGÓLIA

Capa A Triumph Scrambler 1200 a contemplar a paisagem no topo da Gara Medouar perto de Errachidia. Conhecida por muitos como a Prisão Portuguesa, um lugar que tradicionalmente todos os aventureiros visitam em Marrocos.

Austrália • Cazaquistão • Florida • Mongólia

3


página

Director e Revisão José Bragança Pinheiro jbpinheiro@trevl.pt Viajantes e colaboradores André Conchinha André Sousa António Rosado Filipe Elias José Bragança Pinheiro Mário Sobral Renato Braz Tiago Braz Vitor Martins

Editor Geral Hugo Ramos

O António Rosado regressa a Dili para retomar a viagem pela Austrália. Timor-Leste e Austrália

84

38

O Filipe Elias leva a nova «amante» até Marrocos, onde se diverte no deserto e montanhas do Atlas. Marrocos

10

50

Arte Rita Pereira José Bragança Pinheiro Publicidade António Albuquerque antonio.albuquerque@fast-lane.pt Telefone: (+351) 939 551 559

O Renato e o Tiago Braz foram onde todos diziam para não ir. Cazaquistão

Assinaturas: assinaturas@vasp.pt

O André Conchinha parte de Santo André para chegar à Mongólia. Rússia e Mongólia

O André Sousa na América do Sul na sua 125. América do Sul

74

26

A TREVL regressa aos EUA pela mão do José Bragança Pinheiro na terra dos crocodilos e palmeiras. Florida, EUA

Proprietário e editor FAST LANE II, LDA Sede: Rua Quinta do Morgado, 50 - 1800-323 Lisboa

NIPC: 514870613 Gerência: Hugo Ramos e Marcos Leal Periodicidade: trimestral Nº de inscrição na ERC: 127215 Tiragem: 12.000 exemplares

BMW R850 GS

por António Rosado 84 50

Administração, Redacção e Publicidade: Av. Infante D. Henrique, Ed. Beira Rio, Fracção T 1950-408 Lisboa Telefone: (+351) 218 650 244

Yamaha XT 600E

por André Conchinha

Depósito Legal: 357231/13 ISSN: 2182-8911

Distribuição:

74

Triumph Scrambler 1200 XE por Filipe Elias

por André Sousa

38

Impressão e acabamento:Grafisol Produção Gráfica: Finepaper

Honda CG 125

Suzuki DR 650

por Renato e Tiago Braz

10

VASP – Distribuidora de Publicações, Lda. Quinta do Grajal – Venda Seca 2739-511 Agualva-Cacém

Todos os direitos reservados de reprodução fotográfica ou escrita para todos os países. Estatuto Editorial TREVL é uma revista lúdica e informativa sobre a temática do motociclismo nas suas vertentes de lazer, mobilidade e transporte, desportiva, cultural e, especialmente, turística. TREVL dará especial relevo ao rigor da escrita e à componente artística do desenho gráfico e da fotografia. TREVL empenhar-se-á num jornalismo apaixonado e comprometido com a temática que é seu objecto. TREVL é independente do poder político, económico e de quaisquer grupos de pressão. TREVL defende e respeita o pluralismo de opinião sem prejuízo de assumir as suas próprias posições. TREVL assumirá uma postura formativa. TREVL respeita os direitos e deveres constitucionais da liberdade de expressão e de informação e cumpre a Lei de Imprensa.

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Kawasaki Versys 1000

por Mário Sobral

Harley-Davidson «Sportster» 1200 por José Bragança Pinheiro

22

18

Ducati Multistrada 950 S por Vitor Martins


«Austrália»

Darwin

@Austrália, por António Rosado 84 «É frequente vermos árvores com sacos plásticos e baldes pendurados — são as «Árvores das Placentas», onde as mulheres depois de parir depositam a placenta, informando assim a natureza que dois corpos foram separados, mãe e filho.»

«Scrambler de Emoções»

@Marrocos, por Filipe Elias 10

«Todos os dias de manhã, no final do pequeno-almoço «roubava» umas bolachinhas, antecipando que durante o dia alguém lhes iria dar o verdadeiro valor… e não seria eu. Como era habitual, sempre que os miúdos se aproximavam lá se iam as bolachas em troca daqueles maravilhosos sorrisos.»

«América do Sul de 125» — final @América do Sul, por André Sousa

Melbourne

50

«Foram 120 dias, num total de 24.250 km, com passagem pelo Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana e regresso ao Brasil.»

do acotarescrita

Revis uguês. t em por ÃO foi , Logo N acordo do o adopta ráfico. o t r o g

Orlando

26

«Florida»

@EUA, por José Bragança Pinheiro

«Não se vai de moto à Florida pelas estradas, radares de velocidade e carros de xerife. Nem pela comida saturada de açúcar. Nem pelos mosquitos. Vai-se pelo Sol, pelos crocodilos e garças, pelo mar.»

74

«Cazaquistão»

@Cazaquistão, por Renato e Tiago Braz

«A língua cazaque — bem como o russo — são as línguas da região. Inglês? Zero. Nós entre os seis falamos várias línguas, mas russo e cazaque... duas ou três palavras, no máximo. Diálogos de uma complexidade avançada, como devem imaginar.»

38 Key West

«Mongólia»

@Rússia e Mongólia, por André Conchinha

«A viagem foi o meio que escolhi para tentar alcançar a liberdade, de romper com a rotina, de viver sem ter que me reger pelo tempo. Nesta jornada vim a descobrir que o que mais importa não são só os lugares por onde passei e onde parei, mas também as pessoas com quem tive a oportunidade de partilhar experiências.»

Ulan Baatar

Santo André

Índice de Destinos

98

5 página


1

E.U.A.

ESTA

Para entrar no país, é preciso uma aprovação prévia «online» até 72 horas antes do vôo, emitida pelos serviços de imigração dos EUA. 1 Orlando

Florida Oceano Atlântico Tampa

Golfo do México

6 Lago Okeechobee

Naples está longe de ser o sítio ideal para encontrar um motel barato, obrigando a continuar, prolongando a viagem durante a noite. Fort Meyers

5 6

A Harley queixa-se do calor excessivo no trânsito de Miami e desliga-se em pleno viaduto. Uma visita à oficina resolveria?

Naples

Parque Nacional de Everglades

2 4 Um ponte encerrrada para obras obriga a uma espera demorada. A boa notícia é que deu para ficar à conversa e na brincadeira com os demais viajantes.

Os mergulhos ao largo da ilha Key West no naufrágio USS Vandenberg e no recife de coral são um ponto alto difícil de superar.

Baía de Biscayne

2

Homestead

Os mosquitos em final de dia a chegar às ilhas Keys testam os óculos, enquanto alguns aproveitam a barba para nova residência.

Austrália Arquipélago Florida Keys

3

Key Largo

Islamorada

4 Marathon Key West 3

28

Miami

5

Estreito da Florida


é negada a sua entrada em solo norte-americano, sendo junta a outras ameaças à segurança nacional, como terra, caracóis e culturas de células.

Orlando

Recomendado

Pedi à Jen algumas recomendações para comer em Key West. Ela — como habitual — excedeu-se no empenho e deu-me uma lista. Os que experimentei estiveram à altura.

Eaton Street Seafood Market 801, Eaton Street

BO’s Fish Wagon 801, Caroline St.

Garbo’s Grill

409, Caroline Street

Frita’s

425, Southard Street

Bad Boy Burrito

1128, Simonton Street

Grande Bahama

Keys on!

Escolho o essencial para levar comigo, distribuído entre a mochila e os dois pequenos alforges de pele que equipam a Sportster 1200. Camilla entrega-me as chaves, enquanto me vai explicando o óbvio. Ligo o motor que balbucia e faz tremer toda a moto, quase como se fosse propositadamente trapalhão. Arranco, acenando um adeus a Camilla. Opto pelo capacete aberto e os «óculos de aviador» confiando que, apesar de não ter qualquer protecção aerodinâmica, as velocidades seriam moderadas, controladas pelos muitos «carros de xerife» ao longo das monótonas estradas da Florida.

Oceano Atlântico

Nassau

Bahamas Brisbane

A caminho da Harley-Davidson de Orlando, pela janela do pequeno UberX Acura conduzido pelo dominicano Edwin, vou contando os muitos parques temáticos de diversão — Disney, Universal Studios, Sea World ou mesmo o menos conhecido «Holy Land Experience»… Reduzir a cidade de Orlando a apenas isso seria injusto, mas são as experiências mais promovidas e que mobilizam hordas de pequenos e graúdos. A escala da cidade é desconfortável, construída para os carros e onde sem eles as distâncias são insuportáveis, espraiando-se em milhas infindas de armazéns e edifícios comerciais e industriais, polvilhados com as mesmas cadeias de comida que o cinema foi trazendo para as nossas vidas. Num placard gigante à beira da estrada a cadeia Wendy relembra o seu lema «Quality is Our Recipe», indiferente à contradição que a sua campanha actual parece trazer, convidando o candidato a obeso a encher um saco de comida com tudo o que lá couber, por apenas 5 dólares. A viagem termina à porta da delegação da EagleRider na cidade, paredes-meias com uma impressionante loja da conhecida marca norte-americana. As motos transbordam para o parque de estacionamento fronteiro, deixando o interior do espaço cuidadosamente desenhado com bom-gosto para os vendedores se movimentarem nos modelos lustrosos e brilhantes da gama variada criada pelos amigos de infância William Harley e Arthur Davidson. Sofás cómodos de cabedal e café de saco são cortesia da casa enquanto se espera — tudo o resto está para venda, sonhos e cromados incluídos.

No meu primeiro dia, decido chegar a Key West, bem no final do arquipélago que separa a península da Florida das Caraíbas. Para compensar o aborrecimento do caminho indiferenciado vou atentando nas pequenas coisas que a berma de estrada oferece. Como o cartaz onde se lê «Be a Man — Buy Land!», num encorajamento algo desesperado à virilidade, enquanto poucos metros à frente uma igreja baptista incita a correr para Jesus. O curioso nome do maior lago a caminho do Sul — Okeechobee — lembra que são territórios com uma herança nativo-americana forte. Da estrada não se avista o espelho de água, envolto por um dique elevado. Envolve-se de casas pobres e caravanas promovidas a habitação, onde não falta a pequena lancha ou bote para tirar partido do lago. Florida, EUA

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Finlândia Noruega Suécia

Rússia

Rezekne Moscovo Polónia

Reino Unido

Bielorússia

Holanda Rep. Checa

Ucrânia

Praga

Paris Suíça

Aústria

França Itália

Espanha Santo André Portugal

Barcelona

Valência

Argélia Marrocos

Rússia

Olhando para trás e volvido quase um ano, fica o sentimento de que só comecei a encontrar o que procurava quando entrei na Rússia. Aí deparei-me, pela primeira vez, com a barreira linguística e um abismo cultural. Dito isto, o caminho até este ponto foi marcado igualmente por estradas desafiantes, paisagens deslumbrantes e pessoas fantásticas. Já na Rússia, pouco tempo depois de ter passado a fronteira, encontro um carro onde viajava um pai com dois filhos que me acenam do banco traseiro, tentando chamar a minha atenção. Distraído, acabo por os ultrapassar e parar um pouco mais à frente na estrada. Mas esta família pára propositadamente para me abordar com curiosidade, e através de gestos e desenhos consegui explicar que vinha de Portugal

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— a reacção foi obviamente um entusiasmado «Cristiano Ronaldo!»… rio-me, claro. Recuso o convite para almoçar, pois pretendia chegar a Moscovo ainda nesse dia. Amantes de motas, levavam o motor para a mota que o filho mais novo iria construir, e fizeram questão de partilhar comigo alguma da comida que tinham. Foi neste momento que o meu parecer sobre o povo russo começou a mudar, quebrando-me os estereótipos que por cá temos, demonstrando-me serem pessoas extremamente amáveis e acolhedoras. Um outro episódio — o qual cimentou esta noção — foi nos arredores de Moscovo, depois de uma noite bem passada numa pensão à moda da antiga era comunista e de um acolhimento exemplar por parte dos funcionários. Meto-me ao caminho com o combustível já na reserva,


Rússia

Novosibirsk

Irkutsk

Astana

Mongólia

Cazaquistão

Uzbequistão

Quirguistão

abastecendo numa bomba meio refundida. Já a caminho de Tcheboksary acabo por me aperceber que tinha acabado de colocar combustível de má qualidade, o que me obrigou a parar e procurar ajuda. Acabei por conhecer o Nikolai, que fez questão de rebocar-me com a sua mota até casa, onde procedemos à limpeza do depósito. Ao perceber que eu ia a caminho da Mongólia, insistiu em dar-me um jerricã de reserva e um conselho para o encher e transportar comigo, dados os poucos pontos de abastecimento em território mongol — Dica #2. Continuando viagem, acabei por passar essa noite em Dzerjinsk, perto de Novgorod. Pela manhã tive dificuldade ao ligar a mota, facto que associei à falta de limpeza do carburador. Fui novamente ajudado por pessoas que se limitavam a estar ali por acaso,

China

Ulaan Baatar

Dalandzadgad

e prontamente pegaram em mim e na mota e, numa carrinha branca, levaram-nos para uma zona tipo industrial meio abandonada numa parte remota da cidade. Largaram-nos à porta de uma das garagens e deram a entender que deveria esperar ali por alguém chamado Aleksi, um dos mais famosos mecânicos de «motocross» da região. E ali fico, sozinho durante uns momentos, meio apreensivo com a situação, afinal estava no meio do nada, num sítio que não conhecia, rodeado por garagens fechadas, sem outra opção se não confiar e esperar. O Aleksi foi tudo o que tinham prometido — óptimo profissional e perito na matéria, mesmo comunicando-nos à base de google translator — e detecta rapidamente o problema, reparando-o e indo mais além ao fazer um pequeno «check-up» rápido à mota, alertando-me para algumas questões mecânicas presentes que se poderiam vir

Dica #1

Dar preferência ao combustível das bombas de abastecimento «Lukoil», tanto na Rússia, como na Mongólia.

Portugal — Mongólia

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50


Em viagem

No centro

doRecorde mundo batido A pequena Honda CG 125 do André Sousa atravessa desertos, montanhas, lagos salgados, pântanos, animais selvagens com muitas peripécias. Completa a viagem e bate o recorde — 24 mil quilómetros. André Sousa Mototurismo Viagem Continente Sul Americano de 125 cc ÚltimaParte

A

pág. Anterior Salar de Uyuni (@Bolívia)

o 25.º dia de viagem e com mais de 6000 quilómetros já acumulados, chego a Santiago, no Chile. Mais uma fronteira passada e um novo país para conhecer. Parti pela manhã rumo a Paso Los Libertadores, com muito gelo na estrada, devido às temperaturas negativas como consequência da altitude, que fez com que a minha moto não passasse dos 40 km/h a fundo. Foi uma das estradas mais bonitas por onde já passei. Pelo caminho visitei a Puente del Inca, o Mirador do Aconcagua, a Laguna del Inca e os famosos «Caracoles» que descem os Andes, do lado chileno. Chegado à fronteira com o Chile, antes da entrada para o túnel, deparo-me com o trânsito parado e uma fila enorme. Decido passar toda a gente e coloco a moto no meio da estrada para tirar umas fotos na fronteira, altamente entusiasmado por ter chegado ao topo da montanha. Entusiasmei-me um pouco com as poses e o resultado foi uma risada geral, com muita gente a querer tirar umas fotos comigo. Depois de ter passado os Andes, a moto

não ficou nas melhores condições e não aguentava o «ralenti». Fui ao principal vendedor de motos em Santiago, ligaram a moto à máquina e disseram que estava com problemas na injecção electrónica e que não havia solução — tinha de esperar um mês pela peça, visto que vinha do Brasil… Optei por levar a moto a outro mecânico que, no dia seguinte, informou que a moto já estava melhor. Não estava a 100%, mas já se desligava menos vezes, pelo menos já dava para seguir caminho. Antes de voltar aos Andes, aproveitei para visitar o centro da capital do Chile. Passei pela represa El Yeso, que fica a 2500 m de altitude. O objectivo passava pela visita das termas Colina, mas a acumulação de neve impediu-me de prosseguir o caminho. Consegui ajudar um rapaz que estava preso na neve com o jipe, num local onde não passava ninguém — a minha boa acção do dia. Obrigado, Patricio, por me teres recebido vários dias em tua casa em Santiago e acompanhado em parte da viagem nas montanhas. Dia 32 - Algarrobo, Valparaíso e Viña del Mar, Chile

Fazia oficialmente um mês de viagem. América do Sul

51


74


Em viagem

Taukum Para onde ninguém vai ou quem o faz se arrepende, este deserto no Cazaquistão é terreno fértil... de peripécias. Renato Braz

Renato e Tiago Braz

M

eio dia. Calor abrasador. Deixo a moto cair outra vez no trilho de areia do deserto de Taukum. Depois de chamar vários nomes à óptima Suzuki DR 650, lembro as palavras de aviso que tivemos... O Marat, dono das motos que alugámos — bem como todas as outras pessoas mais independentes a quem perguntámos —, todos nos avisaram para não ir para lá. — Sempre que vai para aí alguém de moto, há problemas. — repetiam-se. — Perdem-se e ficam sem gasolina. Caem e magoam-se, ou partem as motos. Ainda por cima há reservas de caça na área e isso também pode dar chatices. Melhor não ir — rematam. Sensatos, decidimos ir na mesma. Afinal, até me preparei... andei a nadar, a correr e até fiz pilates. Mas a única coisa que nos prepara para andar com uma moto carregada na areia é... andar de moto carregada na areia. Mais nada! Suspeito que o corpo humano tem alguns músculos exclusivos para este fim e que portanto são impossíveis de treinar de outra forma.

Deserto

Para esta travessia, a rota que escolhemos é um pequeno troço de cerca de 100 km de areia, e fora do trilho, com arbustos espinhosos — um sonho. Há quem pratique alguns minutos de mindfullness por dia... por aqui são horas. A atenção plena é essencial para conseguir levar as motos por estes trilhos arenosos. À mínima distracção — chão! E podem ser várias as distracções… olhar pelos amigos, olhar para a paisagem ou Cazaquistão

75


Em viagem

Austrália

Indonésia

Depois de ligar Moura a Baucau, em Timor Leste, na sua BMW R850 GS, António rumou à Austrália. António Rosado

E

m Dili há um Soldado da Fortuna e quem lá vive provavelmente não sabe, mas existe. Conheci-o há dois dias, de sorriso aberto e alma gigante, atravessou-se-me ao caminho e, ao vê-lo, apresentei-me. Um cumprimento, uma breve troca de palavras, e eis que dispara dizendo-me — Vou ajudar-te! Aquelas palavras encheram-me! Como é que, em poucos minutos, me tocava tão grande sorte. Há anos que perfilho a minha teoria dos «anjos no caminho» e este é seguramente mais um. — Ajudo-te porque me olhaste nos olhos — justificava assim ele a sua decisão — e assim vi quem és! Eu de coração cheio ouvia-o, num misto de incredulidade e reconhecimento. Disse-lhe que não sou assim, de ficar sem palavras para explicar o que significa para mim a sua atitude. Homens grandes como este ainda os há, e em toda a parte. São esses Homens bons que me fazem nunca perder a Fé na Humanidade e continuar a minha longa viagem. Observo-o a comandar um pequeno exército com cerca de 30 homens — bravos mecânicos, moços de oficina, administrativos e ajudantes — os quais trata disciplinando, formando, respeitando e, como resultado inevitável, sendo respeitado. Mas o Soldado da Fortuna cobra — cobra, sim — uma foto no fim. Pensando eu que essa foto era uma foto que caberia no seu álbum, onde se enalteceria pelo bem que faz, mas reparo que não. Hoje, após o almoço observo o ritual da foto na despedida de um colega alemão, já com a mota limpa e a brilhar, tudo graças à boa ajuda deste comando. É, na verdade, mais um filho dos Comandos portugueses, o qual muito honra a sua bandeira. Ritual da foto iniciado, é vê-lo começar a chamar a sua tropa — ele atrás de todos, quase não se vê. No momento do disparo manda suspender — faltava o mais humilde de todos os funcionários, chamado com orgulho. Enquanto ele

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Perth

BMW R850 GS E como é conduzir esta «R850 GS» em viagem? Ao raio-X, na TREVL 14.


Papua Nova Guiné Dili Timor-Leste

Mar de Arafura

Mar de Timor Darwin

Kakadu Katherine

Mar de Coral

Alice Springs

Austrália

Uluru

Austrália

Brisbane

Port Augusta

Adelaide

Sidney

Great Australian Bight

Melbourne

Tasmânia

Timor-Leste — Austrália

85


Campanha

%

30

desconto exclusivo para assinantes TREVL

R

econhecerás o Gonçalo Luz das histórias publicadas nas primeiras TREVL. Viajava então pelos territórios que começou a ver como segunda morada. Na bagagem levava consigo uma proximidade forte ao yoga e à meditação, encontrando nas montanhas altas dos Himalaias indianos os ensinamentos tântricos e do budismo tibetano, que tiveram algumas das suas origens em Caxemira e nos antigos mosteiros de Ladakh.

6

Os caminhos que tomou — de auto-conhecimento e aprofundamento espiritual — por vezes desafiantes, foram actos de coragem que implicaram alguns sacrifícios pessoais e muita bagagem deixada para trás. A sua formação e experiência profissional como realizador durante duas décadas em Portugal, antes de «vender o sofá» e partir para outras aventuras, deu-nos uma perspectiva única sobre esses ambientes. Mas melhor que ver um filme é viver a experiência. Por isso, hoje volvidos


alguns anos, agora a viver no sudoeste asiático e durante os quais desenvolveu o seu trabalho como professor de Yoga e Tantra, Gonçalo decide lançar a primeira expedição do projecto que chamou «Journey to Ladakh». Um retiro único, só para homens, com Yoga, meditação, círculos de partilha e irmandade. Na edição inaugural que arranca a 10 de Agosto deste ano, o itinerário recria as vivências e espaços que o apaixonaram desde a primeira visita.

Os motores das Royal Enfield Classic 500 arrancarão em Chandigarh, rumo a Manali, Sarchu e Leh, onde volvidos seis dias de viagem se descansará em Leh, capital de Ladakh. Uma envolvente de excepção, antes de se viajar até Lamayuru para dois dias em silêncio junto ao mosteiro com o mesmo nome. Outros mosteiros tibetanos farão parte da viagem, um estágio espiritual para partir para a mais alta estrada no mundo e o passo de montanha de Khardung La (5602 m de altitude) e rumar ao vale de Nubra, passagem esquecida da antiga rota da Seda, entre a China e a Índia.

Vídeo

Vê aqui o vídeo promocional da viagem, produzido pelo Gonçalo.

Campanha «Journey to Ladakh»

7


China

Turtuk

Vale de Nubra Khardung La

Afeganistão Tibete Sarchur Leh Paquistão

Chandigarh

Delhi

Nepal Butão

Índia Bangladeche

«Contem COmigo!»

Segue este «link» para aderir à campanha da TREVL para a expedição inaugural do «Journey to Ladakh» e usa o teu desconto de assinante TREVL.

trevl.pt/qr.asp?id=195

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Ladakh é a região mais inacessível e mais inabitada da Índia. Chamam-lhe «Pequeno Tibete», por estar localizado na extremidade oeste do planalto tibetano, e está imerso em picos nevados, mosteiros ancestrais e vales encantados. Não se andará longe do Paquistão, ao chegar à remota aldeia de Turtuk, a poucos quilómetros da fronteira, e a poucos mais da base do «K2». Desenhou esta viagem para motociclistas que procurem aprofundar a sua prática espritual, mesmo que não tenham grande experiência ainda, para encontrar o Dragão e o Herói interiores, e uma prática diária que levarão consigo no regresso desta jornada. Sessões práticas de Yoga, círculo de partilha e meditação, adaptadas ao grupo de participantes, farão parte do

programa diário. Os viajantes terão o apoio de uma viatura e assistência mecânica, dormindo em alojamentos familiares locais, encorajando a economia local sustentável, com uma noite ocasional acampando a 4290 m de altitude. As vagas são muito limitadas ao tamanho máximo de onze. A «TREVL — de moto pelo mundo» orgulha-se de se aliar a este excitante projecto do viajante de moto, yogui e autor português, criando uma linha de desconto para os assinantes da revista que lhes permite aceder a 30% de desconto. Segue o QRCode para te inscreveres, indicando a tua qualidade de assinante TREVL, a qual será confirmada connosco para a organização


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