F RE N T E V E R SO
PU BL ICAÇÃO POL ÍTICO- CU LTU RA L , GA S TRONÔMICA E L ITERÁ RIA DE A RMAÇÃO DOS BÚ ZIOS
O U T U B RO 2 01 8
#003
CULTURA POLÍTICA:
Celebrar Niemeyer é celebrar o
Brasil como possibilidade e projeto civilizatório. - PG 13
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ZARZUELA: Rodrigo Codesso, cantor, guitarrista,
compositor e professor promete, para o final deste ano, o lançamento do seu trabalho, 13 luas. - PG 05
AR. DOS BÚZIOS: Memória oral da cultura buziana. - PG 06
UMA CIDADE BIBLIOTECA, POR QUE NÃO? EDUCAÇÃO: Sabemos que
a política de livro e leitura, ainda que deva ser provocada pelos amantes da literatura e pelo movimento social, deve, antes, ser projeto de Estado. Com recurso e prioridade. Não apenas um sonho de Don Quijote ou Robin Hood. - PG 03
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
EDITORIAL
traços & troços MATTIAS
Chargista
#ELENÃO Ainda há, no ar da chamada grande mídia brasileira, o peso desconcertante da hesitação editorial frente ao risco de uma tragédia devastadora com o retorno despudorado do fascismo de farda à Presidência da República, três décadas após o fim da ditadura militar e a conquista da nossa frágil democracia. Não houve, ainda, por parte dos grandes veículos, manifestações veementes de discordância com uma candidatura que se exibe para o voto popular com o perigoso relincho do elogio a torturadores, do desrespeito às regras eleitorais e suspeição sobre os eventuais resultados do pleito, do ódio incitado contra os direitos humanos, da ameaça de um declarado “autogolpe” ou de uma invasão violenta à carta constitucional sem autorização ou participação do conjunto da população. Argumentos não faltam, sob qualquer ângulo das lentes, para que qualquer órgão responsável da imprensa livre, em defesa dos seus princípios básicos, endosse a campanha que endossamos, neste editorial, ao deixar, com todas as letras, o nosso “Ele não”. No Frente e Verso, reunimos colunistas de diversas matrizes de pensamento, com diferentes e, por vezes, divergentes opiniões políticas, com todo respeito à pluralidade, aceitando o livre debate de propostas e ideias. Porém, afirmamos que, das onze candidaturas ao cargo de presidente, a de Jair Bolsonaro (PSL) deve ser rejeitada por todas e todos que prezam pelas garantias fundamentais que regem a civilização e impedem o curso da barbárie. Por todas e todos que dizem não ao preconceito, à intolerância, ao machismo, ao racismo, à LGBTfobia, à discriminação religiosa, ao extremismo retrógrado que tantos desastres já legou à humanidade e que não deveria ter mais serventia a esta altura de um novo século. Ele não, porque os erros do passado ficam melhores retidos apenas aos limites dos livros de História. Não se trata de uma questão partidária ou de defesa de um ou outro projeto para o país. Inclusive, coube à imprensa internacional externar sua avaliação sobre este momento da vida política brasileira. No New
York Times, um artigo revelou que o Brasil “flerta com seus dias sombrios”. Na revista britânica “The Economist”, a suposta eleição de Bolsonaro é vista como uma ameaça não somente ao país, mas a toda a América Latina. São análises de veículos insuspeitos em relação ao seu posicionamento e que não podem ser acusados de fazer coro ideológico às forças “bolivarianas” ou de esquerda que são o alvo principal dos ataques do candidato autoritário. Não é apenas um partido ou uma corrente de pensamento que rejeita essa candidatura. É o bom senso. O maior exemplo é a mobilização das mulheres brasileiras que, em poucos dias, reuniram-se em um grupo com mais de três milhões de integrantes no Facebook, para demonstrar a gigantesca unidade feminina contra essa candidatura e as ideias que representa. Sendo a maior parcela do eleitorado brasileiro, as mulheres parecem estar prontas para barrar as pretensões daquele que já defendeu salários inferiores para elas em relação a eles e que já inferiorizou até mesmo a própria filha, descrevendo-a como fruto de uma “fraquejada” sua. Ele não! Este é o recado desta publicação que está ainda em sua terceira edição, mas já nasceu sabendo se posicionar na hora certa. Por falar nisso, agradecemos a adesão da população de Búzios ao nosso projeto e ao crescimento do Frente e Verso. Temos agora quatro páginas a mais por aqui, com mais conteúdo e opinião sobre o que acontece na cidade, no estado e no país. Trazemos, nas próximas páginas, entre outros destaques, uma bela matéria sobre os ventos na nossa região e suas intempéries. Também um olhar sobre a proposta de um projeto de Lei para a Política Municipal de Leitura e Escrita em Búzios, uma reflexão acerca do projeto urbano do município, a crônica buziana da vez, o espaço de representação cultura canábica, a palavra dos quilombolas e da população negra local e uma entrevista com o colunista e grande amigo Joaquim Bento Ribeiro Dantas. Seguimos e resistimos. Boa leitura.
EXPEDIENTE FRENTE E VERSO É UMA PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS. JORNALISTA RESPONSÁVEL: Artênius Daniel - Contra Regras (DRT/MG 08816JP) COLUNISTAS: Alexandre Santini, Bento Ribeiro Dantas, Gessiane Nazario, Gustavo Guterman, Hamber Cannabico Carvalho, Hélio Coelho, Leandro Araújo, Léa Gonçalves, Luisa Barbosa, Manolo Molinari, Maria Fernanda Quintela, Pedro Campolina, Sandro Peixoto, Sheila Saidon, Tiago Alves Ferreira, Tonio Carvalho. CHARGE: Mattias. REVISÃO: Maria Cristina Pimentel TIRAGEM: 3.000 – Distribuição gratuita PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO: Vinicius Lourenço Costa - Vico Design ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO: Contra Regras Produção e Comunicação ENDEREÇO: Feira Livre Periurbana de Búzios, Praça da Ferradura, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 FALE COM A FRENTE E VERSO: frenteverso@contraregras.com.br
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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
Educação
UMA CIDADE BIBLIOTECA, POR QUE NÃO? É grave a crise. O Brasil tem 29% de jovens e adultos analfabetos funcionais, ou seja, pessoas que, mesmo capacitadas a decodificar minimamente as letras, frases, textos curtos e números, não desenvolvem habilidade de interpretação e de realizar operações matemáticas. A proporção de analfabetos funcionais, na população, que registrava tendência à queda, entre 2001 e 2009, mudou de figura. Entre os brasileiros adultos que chegaram ao segundo ciclo do ensino fundamental, há hoje um percentual de 34% de analfabetos funcionais. Em 2011, era 26%. Os dados foram apresentados na segunda semana de agosto pelo Indicador de Alfabetismo Funcional, o INAF. O problema não será solucionado com propostas simples. É preciso considerar a qualidade das escolas e do ensino nelas ministrado, a carga horária, a valorização do professor, financiamento, projeto, política de Estado. Mas há ainda um recurso simples e antigo, que pode nos afastar da sombra desse tipo de analfabetismo e que precisa ser utilizado: o livro. Uma pesquisa inédita, realizada pela JLeiva Cultura & Esporte, em parceria com o Datafolha e a Fundação Roberto Marinho, mostra que, em números gerais, a leitura de livros é a atividade cultural mais comum entre os brasileiros: 68% das pessoas leram ao menos uma obra literária no último ano.[i] O dado indica uma questão importante: ainda
que nossa média de leitura esteja baixa, a capacidade de reversão desses dados, através da adoção de uma política pública de estímulo à leitura e escrita, é efetiva. Armação dos Búzios, nesse sentido, tem alguns motivos para se orgulhar. Desde 2014, uma turma de educadores, ativistas e, sobretudo, leitores, iniciou o Projeto Cidade Biblioteca, de estímulo ao livro e à leitura. O ponto de encontro natural foi a nossa acolhedora Biblioteca Municipal Dona Chica, muito bem cuidada pela Clau, Gi e Dona Ritinha. De lá saiu o Sarau de 5ª, o Sarau da Praça, os Clubes de Leitura, os Pontos de Leitura e Empréstimo Gratuito de Livros, a Bicicloteca, Contação de História sobre Folclore Buziano, o Cine Biblioteca, o Minuto da Poesia, a oficina de Bordados e Poemas, a ação Esqueça um Livro... atualmente o Cidade Biblioteca conta com um acervo de centenas de obras e realiza diferentes ações em toda a cidade, sem nunca ter contado com qualquer tipo de financiamento do poder público municipal - o que não nos causa inveja (dos projetos e ações financiados pelo poder público municipal) e, menos ainda, orgulha. Sabemos que a política de livro e leitura, ainda que deva ser provocada pelos amantes da literatura e pelo movimento social, deve, antes, ser projeto de Estado. Com recurso e prioridade. Não apenas um sonho de Don Quijote ou Robin Hood. Hoje, a sociedade brasileira está convocada a este chamado. Foi aprovada
LUISA BARBOSA
Professora doutora de filosofia e sociologia do C. M. Paulo Freire e do C. E. João de Oliveira Botas em 13 de julho último a Lei que cria a Política Nacional de Leitura e Escrita (Lei 13.696/18) e que tem como diretrizes a universalização do direito de acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas. As metas e ações definidas pela nova política serão implementadas pelos ministérios, em cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e com a participação da sociedade civil e de instituições privadas. Cidades como a nossa estão convocadas a elaborar seus Planos Municipais a partir de quatro eixos fundamentais, já estabelecidos no Plano Nacional de Livro e Leitura, aprovado em 2006: Democratização do acesso ao livro; Fomento à leitura e à formação de mediadores; Valorização institucional da leitura e incremento de seu valor simbólico; Desenvolvimento da economia do livro. O Projeto Cidade Biblioteca, com o objetivo de regulamentar essa política, também na cidade, tem realizado encontros e reuniões com o Executivo e o Legislativo, já com uma minuta de Lei Municipal, a ser discutida com a sociedade. O último encontro, ocorrido no dia 17/09, apontou para a realização de
uma reunião com o Executivo, apresentação do PL Municipal da Política Municipal de Leitura e Escrita e de uma agenda da “Caravana do Livro e da Leitura” para debate da Lei e elaboração do Plano Municipal de Livro e Leitura. O Vereador Dida Gabarito, da Comissão de Educação da Câmara dos Vereadores, também se comprometeu a analisar a possibilidade de transformar a campanha do Cidade Biblioteca - Esqueça um livro - a um dia do calendário municipal. Muito se fala sobre a vocação turística da cidade: gastronomia, cinema, esporte, meditação, ecologia... Na leitura cabem todos, cabe tudo. Imaginem uma pequena biblioteca em cada restaurante, no cinema e academia? Nos centros religiosos e pagãos? Biblioteca caiçara dentro de uma biblioteca-barco na praia, para moradores e turistas? Muita literatura e livros sobre saúde no hospital e nos postinhos, para distrair a cabeça e tapear a dor? Livros nos Bancos e bancos. Nas praças. Livros para fazer pensar. Essa necessidade é urgente.
i. Pesquisa publicada no Jornal O Globo em 24/07/2018
O projeto Cidade Biblioteca é uma iniciativa sem fins lucrativos de promoção da cultura, da leitura e do acesso ao conhecimento em Búzios. Nosso sonho é que os livros estejam sempre ao alcance das mãos, seja na procura do ócio, na espera do café, do transporte público ou do pôr-do-sol. Os livros transformam o intelecto e a sensibilidade, fazem do mundo um lugar melhor. O Cidade Biblioteca promove ações como saraus, clubes de leitura, distribuição de livros pelos espaços públicos, bibliotecas itinerantes.
SEGUNDA-FEIRA - 15/10 e 29/10
SÁBADOS
SÁBADOS
1a QUARTA-FEIRA DO MÊS - 03/10
Praça da Lagoa dos Ossos
Feira Livre Periurbana de Búzio
Feira Livre Periurbana de Búzio
Praça Santos Dumont
19h às 21h
11h às 12h
DOE SEU TEMPO. DOE SEU LIVRO
8h às 13h @cidadebiblioteca
19h às 21h
cidadebiblioteca@gmail.com
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
CRÔNICA BUZIANA SANDRO PEIXOTO
Empresário e jornalista
NADA A PERDER
Depois de 20 anos em Búzios, finalmente fui roubado. E por incrível que pareça, eu que levei o ladrão para dentro de minha casa. Claro que não tinha ideia de suas intenções. Na verdade, caí numa armadilha. Sim, havia uma mulher na jogada. Ela foi a isca. E eu caí como um patinho. Nada a reclamar, afinal, é preciso cuidado com certas mulheres. Principalmente com aquelas carinhosas demais. Fáceis demais.
Moro há 12 anos no centro da cidade, num sobrado ao lado da Praça Santos Dumont. A janela da sala - ornamentada por um bonsai - jamais foi fechada. Esse detalhe me proporcionou uma casa sempre arejada e uma imensa impressão de liberdade e de segurança. Afinal, não é em todo lugar que se pode viver 24 horas de janela aberta e sem medo. A porta de entrada de minha casa dá na rua. Literalmente na rua. Também não costumo trancar com chave. Deixo-a sempre encostada, mesmo à noite quando vou dormir. Não acredito que numa cidade, com
tantas casas chiques, qualquer ladrão vá escolher logo a de um pobre burguês como a minha. E também porque nada tenho de valor. A não ser meus livros, nada que alguém me leve, vai fazer falta. Afinal, tudo que é sólido se desmancha no ar. Ela chegou sorrateira a minha loja. Depois de acender um cigarro e jogar a fumaça no ar perguntou: já comeu uma índia? Foi então que percebi seus traços e sua negra cabeleira. - Não! Nunca transei com uma índia. - Não sei se a respondi ou pensei. - Então: quer me comer hoje? Confesso que jamais havia recebido cantada igual. Lembrei-me dos meus antepassados portugueses nas praias da Bahia - que nem assim se chamava. Acostumados com suas esposas portuguesas peludas - que até bigodes tinham - ao se depararem com as índias baianas peladas e sem pelos, afinal índio não
tem pentelho, qual não foi a alegria. Estava solteiro. Nada me impedia um sexo casual. Topei. Afinal a oferta era rara. Só que ela não estava sozinha. Apresentou-me um primo e sua namorada. A cabeça de cima já não comandava nada e aceitei levar o trio para casa. Enquanto era seduzido no quarto, o primo me roubava na sala. Armadilha perfeita. Fui roubado sem violência, enquanto recebia um carinho interesseiro de minha isca debaixo dos lençóis. O bom de tudo é que não me levaram nada. Nada que me faça falta. Que me faça, por medo, tentar mudar a rotina, trancar a porta, fechar a janela, ficar paranoico. Se a dupla tivesse conseguido mudar meu comportamento, minha crença na raça humana, aí sim, eles teriam me roubado algo verdadeiro, teriam me vencido. Quem conhece minha casa vai lembrar. Após a porta, se chega a uma escada estreita e íngreme. Íngreme mesmo. Não recomendada depois de umas e outras. Pois bem: no último degrau antes de se chegar ao piso da sala, ao lado esquerdo da escada, havia uma caixinha transparente de acrílico. Com muitas moedas e algumas cédulas. A caixinha estava quase cheia. Pesada mesmo. Essa era a minha isca.
Sempre achei que se alguém adentrasse minha casa para levar algo, notaria de imediato aquela caixa transparente “cheia de dinheiro.” Deixava-a bem aparente. Pronta para ser levada. E não deu outra. Carteira com dinheiro em cima da mesa, máquina fotográfica novinha ao lado do home, TV de 65 polegadas, laptop novo. Nada disso atraiu o larápio. A grana aparente, mesmo em forma de simples moedas, chamou-lhe mais atenção. Afinal, ladrão adora dinheiro fácil. Vamos ao prejuízo: na tal caixinha havia muitas, mas muitas moedas de 5 e de 10 centavos de Reais; algumas moedas da China; de Euros; Pesos argentinos e uruguaios - lugares que visitei como Correspondente Internacional do Perú Molhado. Havia algumas notas de 1 dólar, outras, de 1 Real, fora de circulação, e uma nota de 5 Euros. Somando tudo, não dava 50 reais. A caixinha tinha mais valor sentimental que financeiro e, quando acordei, e dei falta dela, percebi que nem isso. Mais uma vez, tive a certeza de que não me apego a nada material, principalmente a dinheiro. Ao perceber o roubo, fiz de tudo para entender o outro lado da história. Não, ninguém iria roubar o que realmente importa para mim, a coisa mais valiosa que encontrei em Búzios: a tranquilidade.
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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
Cris Anila Paramita
Marlene Gonçalves de Freitas
Fábio Ferreira
Martha Pessôa Côrtes
Gessiane Ambrosio Nazario
Pap Antônio
Glamour Zero
Pedro Campolina Marques
PARTICIPE DO FINANCIAMENTO COLETIVO
Gustavo da Cunha Guterman
Sheila Saidon
Júnia Prosdocimi
Tiago Alves Ferreira
Este espaço será dedicado ao nome das pessoas que
Leandro Silva de Araújo
Vinícius Lourenço Costa
mensalmente contribuem para que o Frente e Verso
Luisa Barbosa Pereira
Xexe de Búzios
possa ser publicado e distribuído gratuitamente.
Luisa Regina Pessôa
www.catarse.me/frenteeverso
Maria Cristina Pimentel
EU FINANCIO O
Teatro
Zarzuela TONIO CARVALHO Autor, ator e diretor teatral
O TEATRO BEDENGÓ Todos sabem e conhecem: fica na Rua da Amnésia, número tal, esquina das Ruas do Abandono com a Rua da Ignorância. Uma encruzilhada, local de dúvidas, que caminhos seguir? A Rua da Amnésia é lugar seguro, já que o passado que vive ali, há séculos, ninguém olha para ele. É uma coisa de museu, velharia. Para que perder tempo com o que já era? Os que perambulam pela Rua do Abandono, que cruza a da Amnésia, não se dão conta de que o velho Teatro Bedengó está caindo aos pedaços, com infiltrações, fios desencapados, goteiras e cupins, e que poderá ruir ou morrer numa fogueira a qualquer momento. Dão de ombros e seguem adiante, porque o presente retrata transeuntes sem rosto. Deles, vemos apenas o cocuruto, pois os olhos estão mortos dentro de um objeto celular, abjeto. A Rua da Ignorância, que compõem a magnífica encruzilhada da bestialidade humana, mira o futuro, sem ter noção de até onde tal rua poderá chegar. O futuro é incerto. Mas é certo que chegará a belos campos de capim, que serão devorados por famintos descendentes da barbárie, responsável pela destruição das ciências, das artes, da cultura. As Ruas dessa encruzilhada são muitas e estão espalhadas por todo o País, assim como o Teatro Bedengó, que leva esse nome porque existe no coração e na memória dos que praticam e teimam em se manter vivos, dentro e fora das paredes que os sustentam e os acolhem com espetáculos de rara beleza: é nos Teatros Bedengó que existem e resistem os artistas, olhos ao alto, perscrutando os céus, tentando entender quais
meteoritos também chegaram de um tempo passado, milenar. São esses seres mágicos, mãos dadas em fé e ciência que impulsionam o Saber e o Conhecimento rumo à contínua evolução da espécie. Contudo, esses seres estão de luto. Bedengó, o meteorito, resistiu a uma viagem cósmica num tempo e espaço inimagináveis. E lá está, à entrada de um Museu destroçado pelo descaso, simbolizando a fabulosa aventura do conhecimento, da descoberta, do mistério, da finitude, enquanto transeuntes, nesta encruzilhada, continuam sem tirar os olhos dos celulares. Os Teatros Bedengós, entretanto, não resistirão. Não são feitos da matéria do admirável meteoro. Os Bedengós teatrais são frágeis. Assim como seus moradores nômades, ciganos, que formam famílias temporárias. Assim é a vida dos que cuidam das feridas da sociedade e consequentemente da História da Humanidade, através do Teatro. É bom saber que, dentro de cada cientista, de cada artista, de cada estagiário das ciências e das artes, em cada pesquisador e estudioso das matérias culturais, existe um coração Bedengó. Indestrutível. Corações que viajam através do tempo e do espaço qual meteoros. Mas é bom saber também que as paredes que guardam seus corações são frágeis e delicadas e morrem, a cada bem cultural destruído. Aqui ou na Síria. Aqui ou no Iraque. Aqui ou na Palestina. O que não morre é a burrice. Esta, sabemos muito bem onde mora: não rasga dinheiro jamais! Mas come cocô. Para ocupar o lugar da massa cinzenta.
“VOU PARA O INFERNO, MAS VOU PARA LÁ TOCANDO PIANO” (em resposta ao seu primo pastor que queria convertê-lo) - Jerry Lee Lewis (29/09/1935)
Aconteceu, no último dia 13/09, no Audio Rebel, em Botafogo, RJ, o Festival Internacional de compositoras, o Sonora, com a participação de Paloma Roriz, Deya e a queridíssima Kalu Coelho. O projeto surgiu em 2016, a fim de dar visibilidade e legitimar a presença da mulher compositora, no cenário musical, estimulando o seu fortalecimento, no âmbito individual e por meio da coletividade, para romper o imaginário de que existem poucas compositoras. O processo de gestão e produção do festival é todo executado por mulheres (cis e transgênero), de forma colaborativa, a partir da construção de uma rede de compositoras-produtoras. O Sonora é organizado através de um núcleo de coordenação geral/mundial e de um núcleo de produção local, em cada cidade onde é realizado. Informações e próximos shows: @sonorafestivalbrasil Tem novidade na área: Rodrigo Codesso, cantor, guitarrista, compositor e professor promete, para o final deste ano, o lançamento do seu trabalho, 13 luas, uma referência ao calendário lunar, e uma homenagem a sua filha, Luna, que nasceu no dia 13. Há 30 anos na estrada, Rodrigo é Bacharel em guitarra e canto e possui licenciatura em Música. Em Búzios, é professor da Escola Villa Lobos e do Instituto Dominus de Educação. Na semana passada, o músico se apresentou na 5ª Edição do Canta Autoria, no Espaço Cultural Usin4, em Cabo Frio, uma oportunidade para conhecermos o que há de novo na música autoral.
LÉA GONÇALVES
Radialista, DJ e programadora musical
O álbum 13 luas conta com a participação de figuras geniais da música brasileira: Edson Costa no baixo; Marcos Amorim na guitarra; Ivo Senra no teclado; Robertinho Silva na percussão e Kalu Coelho no violão. Na tracklist, composições próprias e grandes parcerias: Andar Andei, Bastará (Igor Codeço), Na terra da garoa, Pano de fundo, Parábolas, Inscrito na areia (Rodrigo Codesso, Fernando Codeço, Hélio Coelho e Kalu Coelho), Minas luze, Sumir no mundo, Frevo Pocado, O Patriarca. Para os curiosos, algumas de suas faixas estão disponíveis no You Tube, que tem, na produção audiovisual, a assinatura de Julian Mourin, Augustin Galiano e Léo Dioli. Contatos com o artista: Tel.: (22) 98111-6897 - Facebook/rodrigo.codesso.7, e-mail rodrigocodesso@ gmail.com “a música que é feita ela merece ser ouvida e quer ser ouvida”. Até a próxima. Mande-nos uma mensagem, participe conosco: A coluna Zarzuela gostaria de saber quais são as dez músicas de todos os tempos? lea.leadj@gmail.com http://facebook.com/lea.leadj
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
Guanabara
Ar dos Búzios
A ÚLTIMA PERNADA O Museu Nacional foi oló, de morte matada. O crime atiçou a pulga que mora atrás da orelha de todos que se preocupam com a preservação do patrimônio histórico-cultural de Búzios. Quando se pensa em patrimônio histórico a atenção imediata vai a prédios e locais de memória que precisam de tombamento, mas em Búzios a urgência maior talvez não seja a manutenção do acervo material. Tomemos o prédio do Museu como exemplo. A residência da família imperial, a Versalhes tropical, um monumento em si, ainda assim era café pequeno se comparado ao acervo que abrigava. Para além das famosas peças do Egito e Grécia antigos, havia lá um acervo imaterial gigantesco, com registros únicos de povos indígenas já extintos em corpo físico. Com o fogo aquelas culturas tiveram uma segunda morte, a simbólica. Em comunidades tradicionais brasileiras, sobretudo as de origem banto, os conceitos de vida e a morte transcendem a condição biológica e se apresentam como subjetividades. Você conta a história dos seus antepassados para que eles sigam vivos, da mesma forma que você sobrevive na memória dos que virão. A morte se manifesta no esquecimento e a vida se perpetua na lembrança. A reverência à ancestralidade e as relações comunitárias são fundamentais para a sobrevivência: se ninguém conta a sua história, você simplesmente deixa de existir.
LEANDRO ARAÚJO
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ANDRÉ MARGULIES, O URSO QUE ME INSPIROU MARIA FERNANDA QUINTELA Jornalista
Esse é o drama de Armação dos Búzios. Numa cidade com escassos registros historiográficos, a oralidade de seu povo, maior riqueza cultural, se apaga pouco a pouco nos cortejos rumo a Sant’Anna. Um Museu Nacional queima a cada velho que se vai sem ter sua ancestralidade perpetuada. É nosso dever ouvir e contar as histórias dos antigos, registrá-la em letras, vídeo e som, para que eles não morram nunca.
Já faz um tempo, perguntei ao meu amigo André Urso, se ele tinha uma foto da placa de sua moto. Não da nova, mas da antiga DT 180 da Yamaha, a valente que o carregou por toda a península durante anos. Hora como Urso, que sempre foi (dado seu “shape” e sua paixão por coca-cola, um verdadeiro urso polar de cabelos brancos), hora como Papai Noel, que inventou ser e foi mesmo, alegria de muitas crianças daqui.
É preciso tirar os velhos do cantos das salas e trazê-los para o centro da vida comunitária. Eles são os donos da história. É preciso valorizar e disseminar o trabalho de Maria Fernanda Quintela e Nenéu Menezes, que há 25 anos constroem um acervo audiovisual da memória oral buziana, a despeito do desinteresse geral de governos e empresas.
Pedi a foto da placa e nem me surpreendi quando ele me disse que ainda tinha a própria placa, pendurada na parede de sua sala. Uma recordação da companheira de rodas e do tempo em que Búzios era mais a nossa cara. Tão a nossa cara, que as motos eram emplacadas com o nome da cidade abreviado para Ar. dos Búzios. Lindo não? Uma licença poética que traduz perfeitamente a sensação plena de se estar em Búzios! Uma delícia. Tão verdadeira, tão em sintonia que pulou direto para o título desta coluna. Isso foi há mais de dez anos, quando André deslizava por aí, no Ar. dos Búzios. Mas a foto da placa, que agora identifica a coluna, ele só me deu no final de 2016, quando aposentou a velha DT.
O destino utiliza de ironia para aplicar lições. O Museu queimou um pouco antes de ter a verba para prevenção de incêndios liberada pelo BNDES. Nesta edição do Frente e Verso, a entrevistada da página dupla seria Michelle Malvile, a Mimi. Uma das grandes personagens da brilhante noite buziana dos anos 80, a franco-martinicana proprietária da boîte Marruelle recepcionava os clientes com a mesma energia com que espantava os arruaceiros a pernadas de capoeira. Mimi foi oló dias antes da entrevista - e a última pernada foi a gente que levou. Aprendamos.
Esta história é hoje uma pequena homenagem que presto ao meu amigo Urso, que me inspirou e que infelizmente não está mais ao alcance do meu abraço. Vai Papai Noel motoqueiro, segue a sua trilha, nós seguimos nessa Aldeia, na esperan-
ça que os bons ventos nos cerquem sempre com o Ar. dos Búzios! Cem braça de terra para onze filhos É com grande alegria que trago a coluna para este bonito espaço de ideias que é o jornal Frente e Verso, apresentando o relato de Natalino Alves da Fonseca, morador de Tucuns (In Memoriam). “O meu bisavô veio para o Brasil, adquiriu uma propriedade e montou um engenho de cachaça. A esposa do meu bisavô só deu uma filha. Essa filha chamava-se Mocinha Custódio. Muitas pessoas da minha idade conheceram ela ainda. Então meu bisavô tirou uma negra da senzala, uma negra nova, e colocou numa casa para viver como mulher dele. Botou um casal de negros maduros já, para tomar conta, e ali ele foi indo... e adquiriu com essa negra 11 filhos. Então, ele tirou da propriedade dele cem braças de terra, foi no cartório, registrou a negra com o nome Ana Maria Antônia de São José, e colocou esta propriedade em nome da negra, para que mais tarde os filhos tivessem aonde habitar. Era cem braças de largura e o comprimento era do canto esquerdo da praia de Tucuns, no caminho da Armação. Essa área ficou titulada como Cem Braças”.
Biblioteca Pública Municipal Francisca Maria de Souza Funcionamento: segunda-feira a sexta-feira de 8h às 17h Praça da Ferradura s/n, Ferradura, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil CEP 28950-000 Fone (22) 2623-2510
PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
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Convidado
BÚZIOS:
UMA CIDADE SEM SAÍDAS??? “Construímos muros demais e pontes de menos” Isaac Newton
Acho linda esta cidade, ou melhor, acho lindo este lugar. Há dez anos, escolhi morar aqui e, há nove, fixei residência. Comemoramos o aniversário de dois anos de meu filho, já em Geribá, bairro que nos acolheu generosamente em nossos primeiros anos. Quando chegamos, não entendia muito bem as curvas da cidade. O fato de não ser reta ou linear, deixava-me ainda mais fascinado, embora, muitas vezes, confuso. Entrava numa rua que era cheia de curvas, saía em outra, também sinuosa, e quando pensava ter chegado aonde queria, estava num lugar novo, diferente, inusitado. Outras vezes, percebia que voltara ao ponto de partida ou próximo a ele. De qualquer modo, os recortes da península, com suas praias secretas, discretas e/ou exibidas, se uniam em mosaicos poéticos em minha reconstrução. Passado um tempo, já numa rotina de trabalho diário, passei a conhecer melhor as ruas, travessas, alamedas, avenidas, becos, altos, morros, vilas, periferias, tanto na península quanto na parte continental, que passou a me abrigar em anos mais recentes. Então, circulando mais intensamente pra lá e pra cá, um novo aspecto chamou minha atenção: a quantidade de ruas sem saída e a grande falta de comunicação entre boa parte dos logradouros. A Avenida José Bento Ribeiro Dantas - coitada(!) - que corta o Município, desde a Rasa, cruzando Geribá e Manguinhos, para chegar ao Centro (ficando famosa como “Rua das Pedras”) e se estender até os Ossos, tendo que dar conta de fazer essa ligação, de ponta a ponta, quase que exclusivamente, em diversos trechos, fica sobrecarregada! Quando menos se espera, o motorista - residente ou turista - tem que voltar a ela para chegar ao seu destino.
Quantas vezes, ouvi que Búzios é uma cidade cercada de mar por todos os lados, onde dificilmente se avista o Mar. Quantas vezes parei para dar informações da localização da praia de Geribá a turistas que vagavam perdidos na própria Avenida Jonas Talbert, paralela à praia, ou mesmo da localização da praia da Ferradura, àqueles que já se encontravam na Avenida do Contorno ou Atlântica, paralela à Ferradura? Tenho certeza de que não fui o único. Do lado peninsular, que não é de mar aberto, ainda é mais complicado. Da Vila Caranga não se acessa a Tartaruga, sua vizinha, de onde não se chega à praia ao lado, Manguinhos, senão, voltando à Bento Ribeiro Dantas. Nem mesmo uma trilha segura ou uma ciclovia urbanizada que permita um passeio e/ou deslocamento prazeroso por lugares tão lindos. O que vemos são mais e mais muros, cercas, construções de ares clandestinos, irregulares ou suspeitas de serem atentados ao ambiente ou às próprias regras que visam a uma cidade mais ordenada e harmoniosa. Recentemente, um fato me marcou bastante: a retirada da Ponte da Marina. Primeiro, veio a obra bilionária do supercondomínio que, segundo alguns, mudará até o nome do bairro em virtude do empreendimento. Obra, aliás, com divergências quanto ao verdadeiro impacto ambiental que provocará a curto, médio e longo prazo. Haverá também, impacto no trânsito. Qualquer morador da Rasa ou de outro ponto da área continental, que se desloca com frequência para a península, sente, a cada semestre, o aumento do fluxo de carros nesse sentido, convivendo com o trânsito pesado, em vários momentos do dia. Imagine quando essas centenas de casas (alguns chegam a dizer milhares) previstas, ficarem
prontas, com seus milhares de moradores? Todos tendo que passar por uma via sem duplicação, todos entrando na península? Não cabe. Não dá. Não precisa ser assim. Voltando à Ponte - acabei dando uma volta, como àquelas das ruas tortuosas - , ela era um marco turístico, era um elo entre a Rasa, o Arpoador, “o outro lado da Marina” e a Marina, a Baía Formosa (também chamada de “Maria Farinha”), sem precisar passar pela sobrecarregada Avenida José Bento Ribeiro Dantas. Lembro-me, certa vez, que essa via ficou interrompida por uma noite, na altura da curva do Aeroporto, e todo o trânsito aconteceu pela Ponte. Se não fosse ela, tanto quem chegava quanto quem saía da cidade, ficaria em maus lençóis. Mesmo depois de sua interdição, nos últimos dias do governo Mirinho, ela continuou sendo de muita serventia para os moradores, seus caseiros e funcionários. Diariamente, cedinho pela manhã, na hora do almoço e à tardinha, dezenas de pais e mães a atravessavam, com suas crianças, para esperar o ônibus escolar. Homens e Mulheres iam para o ponto “do outro lado da Ponte” para pegar a Van Vila Verde e ir ao comércio, correio, farmácia da Rasa. Na volta, a mesma coisa. Lá do alto, olhavam aquela beleza toda, pra frente, pra trás, pra todos os lados, agradeciam ao Criador pela beleza ou, no mínimo, por concluírem aquela passagem. Mesmo pra quem não tinha compromisso, mas gostava de caminhar e passear, era um bonito ponto de contemplação. Pontes são inspiradoras, pontos de ligação entre duas margens. Comunicam. Aproximam. Reúnem. Mas tudo isso foi desconsiderado em prol da passagem de alguns milionários em seus veleiros que, vez ou outra, passarão por ali em direção às suas Mansões. Con-
HÉLIO COELHO FILHO Professor de Tai Chi
fesso que tenho dificuldades em compreender essa lógica. Logo depois que comecei a morar aqui, ouvi com entusiasmo sobre um Plano de Mobilidade, achei o máximo. Uma cidade pequena e tão linda, dá vontade de andar a pé e de bicicleta, de se locomover por meios de transportes públicos eficientes que permitam uma maior interação entre os moradores e turistas. Mas até agora, praticamente nada foi feito de prático. Foram feitos até outros planos de mobilidade, caros, inclusive, e mais caros ainda por não saíram do papel. Com o tempo, percebo que a falta de comunicação não é apenas entre os logradouros. Ela se reflete entre os moradores dos diferentes bairros, entre os políticos e suas trincheiras (ou partidos - palavra sugestiva, né?), entre os empresários e seus bunkers em uma cidade resort fictícia e decadente. Todavia, a natureza continua resistindo, apesar da falta de saneamento, do avanço dos muros nas áreas verdes, dos loteamentos irregulares em áreas de preservação permanente, da falta de lixeiras e do excesso de lixo em diferentes perspectivas. E nós, poetas, artistas, antigos, crianças, quilombolas, amantes, amados, nativos, turistas, estrangeiros, buzianos e buzianas de coração, continuamos com esperança e oração, sonhando com uma Búzios com mais pontes, menos muros e mais saídas...
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Preto no branco
DAS ASAS DOS AVIÕES ÀS VELAS D BARCOS: BENTINHO ENTRE O CÉU
A
migo dos peixes. Um grande especialista em generalidade. Filho de uma “mistura explosiva”. Advogado, adminis-
trador, velejador, escritor e, sobretudo, leitor. De livros e da vida. Este é Joaquim Bento Ribeiro Dantas, um homem elegante, que caminha todas as manhãs na praia de Manguinhos, frequenta os grupos e clubes literários do Cidade Biblioteca, acaba de completar 85 anos e tem o privilégio natural de ser chamado de “Bentinho”, um apelido carinhoso que ressalta o menino que este grande homem – de 1m e 80 de altura – ainda é.
Prata da casa, colunista e entusiasta do Frente & Verso. Uma pessoa fundamental para a cidade e que nos recebeu em um dos seus restaurantes preferidos para comer o prato do dia de terça-feira: uma língua “muito bem feita”, uma torta de merengue de banana e um café. Bento gosta muito de doce e traz também doçura em cada um dos seus gestos e palavras.
Conte-nos sobre a sua origem familiar, onde você nasceu, estudou, a profissão dos seus pais... Eu sou carioca, nasci no Rio, de pai gaúcho e mãe paulista. Uma mistura quase explosiva: pessoas, culturas bastante diferentes. Se bem que meu pai veio muito jovem para o Rio. Minha mãe era uma paulista de 400 anos... (ri) de uma família muito tradicional. O meu bisavô veio à cidade do Rio de Janeiro para ser prefeito, a convite do Presidente Hermes da Fonseca. Havia tido uma carreira muito parecida com a do Rondon (Cândido Mariano da Silva Rondon, o Marechal Rondon), fazendo estrada e linha telegráfica a vida toda. Meu pai foi criado por esse bisavô, pois tinha apenas seis meses quando o seu pai, meu avô, morreu. Ele e a minha avó, a pessoa mais maravilhosa que eu conheci na vida, criaram o meu pai. Ela, viúva, depois que o meu pai fez 26 anos de idade, virou freira. Carmelita descalça. Começou em Santa Teresa, naquele casarão maravilhoso, que tem uma vista espetacular. Depois foi uma das fundadoras do Convento em Teresópolis. Eu cresci em Ipanema. Minha mãe fez o meu pai comprar uma casinha nesse bairro que, há 80 anos, era longe de tudo, e onde não tinha nada, na época. Estudei num ginásio chamado Padre Antônio Vieira, formado por um educador que tinha paixão pelos textos do Padre Antô-
nio Vieira. Um colégio relativamente pequeno, que existe até hoje. Entrei no 2o ano primário e fui até o clássico. Depois, fiz direito na Pontifícia Universidade Católica (PUC). Meu irmão era Engenheiro, mas eu sou um analfabeto profundo em Ciências Exatas. Eu adoro Direito e o usei muito durante o meu trabalho. Mas, quando eu terminei a faculdade já trabalhava na aviação. Todos os cursos que fiz na vida foram sempre na área de administração de empresas, mas voei muito, muito, como passageiro, através da Cruzeiro do Sul. Eu tinha que administrar aquilo tudo. Os problemas das pistas, essas coisas todas. E sempre quando eu chegava numa cidade que eu nunca tinha ido, descia do avião e a conhecia. É assustador o que aconteceu no Brasil. Assustador, para bom. Por exemplo: eu fui construir um hotel em Macapá e não tinha nem uma rua calçada. Campo Grande, tinha pouquíssimos habitante. Hoje tudo mudou. Assim, eu acabei me tornando um “especialista em generalidades”. O administrador de empresa é isso. Tem que saber de tudo da empresa, resolvendo problema e planejando para frente. Fiz curso de planejamento na Escola Superior de Guerra, na própria PUC. Trabalhei, depois da Cruzeiro, na Secretaria de Planejamento de Estado do Rio de Janeiro, o que foi uma experiência boa, ainda que frustrante, como sempre, porque você planeja tudo, direitinho, mas então muda o governo e muda tudo. A maior parte do que você faz não tem continuidade. A política,
muitas vezes, é frustrante. Você não tem continuidade em nada. E vemos isso em todo o lado. Conte-nos melhor a história da Cruzeiro do Sul. Existia uma companhia subsidiária da Lufthansa alemã que se chamava Condor. Essa Condor, quando o Brasil declarou guerra à Alemanha, foi tomada pelo governo brasileiro não só pela guerra, mas pelos submarinos afundados pela Alemanha. Então o governo brasileiro tinha toda a condição de expropriar a Condor e outras propriedades alemãs. E ninguém queria aquilo. Os aviões eram alemães. As peças impossíveis de conseguir. Naquela época o Oswaldo Aranha (Ministro de Getúlio Vargas e Presidente da Primeira Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações Unidas em 1947) era uma pessoa que meu pai gostava muito. Meu pai era Advogado dessa empresa, a Condor. E o Osvaldo Aranha propôs que o meu pai comprasse a Condor com um grupo de investidores. Era uma dificuldade monumental durante a guerra (2a Guerra Mundial). Imagina gerir uma empresa alemã na guerra? A sorte é que tivemos um Engenheiro que fez os cálculos e adaptou os motores e as peças alemães às americanas. O meu pai foi para os EUA e convenceu os americanos, em plena guerra, a vender dois DC3. E foi com esses aviões que a Cruzeiro do Sul operou. Logo a seguir à guerra, vende-se avião a um preço muito baixo. Esses aviões fizeram as empresas de aviação do Brasil. Muitos pensam que você veio à cidade pelo seu pai, sua família, mas
na verdade foi você quem os trouxe. Eu tinha uns 14 anos quando vim para cá. O meu pai deve ter vindo no fim da década de 1950. Eu frequentava um clube nada elegante de Engenheiros da Light. Eu ia lá jogar tênis. Um clube de ingleses em Ipanema, um lugar longe de tudo. E lá, eu conheci o Boy Sampaio que vinha para cá pescar de mergulho. Vim com ele a Búzios, em 1947. Aqui estava tudo à venda, barato. Gostei e comprei um pedacinho de terreno aqui, na praia de Manguinhos. Eu já tinha 20 e poucos anos e um fusquinha. E meu pai disse que queria ver esse lugar que eu ia tanto. Ele tinha um carro, um troço desses americano, enorme. Aí o carro teve uma batida na estrada e quebrou. Veio capengando até aqui e eu pensei: “nunca mais ele, meu pai, volta”. Mas a verdade foi o contrário, ele nunca mais voltou para o Rio (ri)! Ele não se adaptava bem aos climas extremos: muito calor e muito frio. Para o meu pai o clima de Búzios era perfeito. Depois disso, ele me expulsou da minha casa, foi aumentando-a, lá da cabeça dele, cheia de remendo, o que não tinha nada haver com arquitetura. No meio da casa era a minha casa original. E eu, da casa, fiquei dono de um quarto e olhe lá. Depois eu fui expulso para o lado de fora. Chegava tarde da noite e entrava direto pelo meu quarto (ri). Essa casa vendemos há bem pouco tempo, e ela foi demolida. Búzios era na verdade duas cidades: até a maneira de falar era diferente uma em Manguinhos, outra no Cen-
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DOS U E O MAR
de Cabo Frio, e que gostava muito do meu pai. Meu pai, na época, foi uma espécie de assistente da Prefeitura e não ganhava nada por isso, nem um real por mês, mas gostava disso demais. Pela sua influência, ele foi fazendo as obras, a praça dos Ossos, a escola (E.M. Bento Ribeiro Dantas), posto de saúde... Ele conseguiu que a Marinha mandasse um médico, uma vez por semana para dar consulta. E depois que ele morreu, em 1969, o Médico nunca mais voltou. Ele fez também as ruas, estradas... A estrada do Pórtico até a RJ foi aberta por ele. Antes, as pessoas vinham da Rasa ao centro a pé. Trazer mandioca, abacate para vender, no fim de semana. Quando a gestão da prefeitura mudou, meu pai saiu. Mas a receita já existia. Naquela época, a coisa era flagrante: Cabo Frio, muito poucas vezes, ligava para Búzios. Eleger um vereador de Búzios, em Cabo frio, era uma façanha. Assim, das poucas vezes que o Prefeito de Cabo Frio deu atenção a Búzios, foi por causa do meu pai. Por isso, a emancipação foi tão importante para a cidade.
tro. E, quando chovia, era impossível acessar os dois bairros. A Rasa, então, nem se fala. Era uma comunidade de negros, totalmente original, que não se comunicava com o resto. Eu vim pra cá por causa do mar. Primeiro, pescar de mergulho. Depois, fiquei amigo dos peixes para velejar. A vela é uma asa de avião. O princípio físico é exatamente o mesmo. Do veleiro e do avião. A curvatura da vela é a curvatura da asa. O que faz o barco “voar” é o que faz a vela “andar”. A principal avenida da cidade leva o nome do seu pai. Uma das primeiras escolas também. O que acha dessa homenagem? Olha, eu não posso desdenhar uma homenagem ao meu pai, ainda mais um pai que eu admirava tanto. Mas, no fundo, eu não acho correto. As ruas têm que adotar os seus nomes genuínos. Quem, em Búzios, sabe quem foi Bento Ribeiro Dantas? Ninguém. E tem coisa mais gostosa do que ter uma rua que chama “Rua da Linguiça”? (Ri). Muitas vezes, as pessoas me perguntam se eu era parente do Bento Ribeiro Dantas, perguntam se ele era um Médico ou um Professor... e têm toda razão. As pessoas, como o meu pai, em suas épocas, tiveram a sua importância. Mas não acho que isso deva ser perpetuado. Por que a escola não se chama Escola de Manguinhos? Por que não? O meu pai doou a parte de levantamento aéreo de Cabo Frio, o que contribuiu para a regularização fundiária, e fez a receita do município crescer assustadoramente. Isso na gestão do Antônio Castro, Prefeito
Há muito pouco tempo tivemos uma das maiores tragédias da história do Brasil, do ponto de vista do patrimônio: o incêndio do Museu Histórico Nacional. Você é membro do Conselho de Patrimônio da cidade. Como acha que Búzios cuida do seu patrimônio material e imaterial? Não cuidamos. Até as poucas casas históricas, antigas, foram incendiadas. Derrubadas. Quando a prefeitura pensou em tombar, o proprietário derrubou. Mas Búzios é uma cidade muito nova... E sobre escrever a história de Búzios, você sente esta carência? Totalmente. Existe uma longa história escrita por pesquisadores. O Werneck (historiador Márcio Werneck) tem um trabalho muito significativo, que não foi publicado, mas que foi inclusive financiado pela cidade. O Werneck era um grande pesquisador. E até me pediu para fazer o prefácio de um livro dele de fotografia. Mas o livro sobre a história de Búzios ainda não saiu. Ele ficou doente e faleceu, antes de publicá-lo. O livro é precioso, mas precisa ainda ser depurado. Minha ideia é que a Penha (companheira de Werneck) e a Maria (filha) façam um resumo. Transforme-o num livro de história. A Penha fez as entrevistas e tem toda a condição intelectual de fazer. Também a Maria, que é jornalista, e pode colocá-lo numa linguagem moderna. Tem que publicar esse livro, estudá-lo nas escolas, e colocá-lo em formato digital, na biblioteca. As duas têm que fazer isso porque têm capacidade e são as herdeiras. Eu estou tentando fazer a minha parte: a história de Búzios para as crianças, com a escritora Flávia Rosas e a artista plástica Adri Di Macedo, nas ilustrações. E a sua relação com a literatura? Fale-nos sobre seus livros e contos e como
você entende o papel do livro e da leitura na construção da sociedade. Eu sempre gostei muito de ler. Sempre tive paixão pela leitura. Tinha uma coisa desde jovem que não era comum: ler e gostar de música clássica (ri). Com essa coisa de gostar de ler, eu, uma vez, escrevi um conto e o deixei no canto. Um dia, eu encontrei a Iara (Rosa) e ela me incentivou. Havia um projeto de um livro, dos Anarquintas, e eu comecei a participar dos encontros do grupo. Ela me incentivou a continuar escrevendo, e eu gostei.
tema? Existe uma área de desenvolvimento econômico para Búzios? O desenvolvimento de Búzios aconteceu. Quando eu cheguei aqui os garotos, quando faziam 14, 15 anos, iam para a pesca e muitas vezes só voltavam para aposentar. Saiam daqui porque não tinham nada. Um lugar onde não havia um futuro possível. E deixavam as mulheres.
O bom livro é aquele que as pessoas gostam de ler. O Paulo Coelho, por exemplo, eu acho um horror. Mas as pessoas gostam de ler. Então tá bem, é bom. Tem um autor mineiro que eu adoro: o Autran Dourado. Ele tem aquele tom seco do mineiro, quase sem “que”. Um autor que quase não se fala mais.
Agora o que se precisa fazer é uma defesa intransigente do meio ambiente. Porque esse é o nosso sustento. Como é que você joga esgoto no mar, no seu sustento? Jogar esgoto no mar é como jogar esgoto na sua comida. E as pessoas não conseguem enxergar isso.... Como pode um administrador admitir jogar esgoto no mar...
Eu escrevi um livro sobre a história da aviação, mas ele é muito chato (ri). O que você acha dessa dicotomia entre o nativo, da tradicional família buziana, e o morador que escolheu a cidade para viver? Isso não existe. Búzios não foi uma cidade feita só com o pessoal da terra, mas com os imigrantes. Pode chamar de imigrante de luxo – eu, você – mas também o imigrante do nordeste do Brasil e do norte do Rio de Janeiro. São esses que construíram Búzios. Essa história do “de fora” e dos “daqui” acabou. Uma parte veio pelas belezas naturais e trouxe o dinheiro. A medida que trouxe o dinheiro, trouxe emprego. Outra parte veio pelo emprego que esse dinheiro trazia. Pessoas, no interior do Brasil, e mesmo do Rio, ganhavam ¼ de salário para trabalhar de sol a sol. Quando mudam para cá, rapidamente arrumam uma coisa para fazer e trazem logo a família. Hoje, esses pioneiros já compraram sua casa, seu carro, construíram um patrimônio... agora isso tudo foi feito sem nenhum critério de urbanização. Há bairros aqui que são um negócio tétrico. A quantidade de construção desordenada é absurda. Muito se fala sobre a vocação da cidade, um rumo, um projeto político ao qual a cidade poderia seguir. Qual é a sua opinião sobre esse
De repente, com a vocação turística natural da cidade, pelas suas belezas naturais, ela se desenvolveu e hoje tem mais de 300 pousadas.
Outra coisa interessante era trazer um campo universitário, estimular o âmbito do conhecimento, e que não se mexa, claro, no meio ambiente. Trazer uma indústria para cá seria um tiro no pé, porque aqui é um canto, uma península. Mas o mais importante de tudo é que as pessoas tenham educação e através da educação consigam eleger bem os seus representantes. A cidade tem apenas 11 autoridades: os nove vereadores, o prefeito e os dois juízes. Com os juízes não há jeito, eles são concursados. Os vereadores e o prefeito são nossa responsabilidade. Eu conheci uma cidade, no Estado do Amazonas, chamada Eirunepé, a 1160 km de Manaus, onde se levava quase 30 dias para se chegar. Esses dias, descobri que a cidade é um exemplo para a educação. O que isso quer dizer? Que se pode fazer uma educação de bom nível em qualquer lugar. Contanto que você valorize os professores, as escolas... contanto que você trate a educação como um programa de Estado. Se você não acha que pode fazer isso no Brasil todo, faça pelo menos na sua cidade.
Luisa Barbosa Pereira entrevista Joaquim Bento Ribeiro Dantas
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CIDADE
NOSSAS CIDADES PEDEM SOCORRO! PEDRO CAMPOLINA Arquiteto e urbanista
Este é o título da Carta-aberta aos candidatos de 2018, desenvolvida pelos arquitetos participantes do Seminário Nacional de Política Urbana, promovido pelo CAU-BR, IAB-SP e CAU-SP, tema da coluna há 2 edições. O tema da cidade é pouco ou nada abordado pelos candidatos nas campanhas. A pouca atenção dada a este tema faz com que tenhamos cidades não planejadas, sem o devido combate aos desequilíbrios de infraestrutura e investimentos que o processo atual consolidou e que se tornam cada vez mais complicados de serem reparados.
LIVROS Brasil: Uma biografia Autoras: Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Murgel Starling Capa: Victor Burton Editora: Companhia das Letras Páginas: 808 Aliando texto acessível e agradável, vasta documentação original e rica iconografia, Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Starling propõem uma nova (e pouco convencional) história do Brasil. Nessa travessia de mais de quinhentos anos, se debruçam não somente sobre a “grande história” mas também sobre o cotidiano, a expressão artística e a cultura, as minorias, os ciclos econômicos e os conflitos sociais (muitas vezes subvertendo as datas e os eventos consagrados pela tradição). No fundo da cena, mantêm ainda diálogo constante com aqueles autores que, antes delas, se lançaram na difícil empreitada de tentar interpretar ou, pelo menos, entender o Brasil. A história que surge dessas páginas é a de um longo processo de embates e avanços sociais inconclusos, em que a construção falhada da cidadania, a herança contraditória da mestiçagem e a violência aparecem como traços persistentes.
Ressaltando a importância do momento das eleições para debater e assegurar o comprometimento dos candidatos com a criação de uma agenda que garanta a criação de Planejamento Urbano Solidário e Inclusivo, a carta resume muito bem nossa condição urbana no Brasil:
implementar políticas eficazes de mobilidade e de enfrentamento da carência de infraestrutura, da degradação dos espaços públicos, da fragilidade da relação cidade-meio ambiente, do espraiamento das periferias com urbanização incompleta e do crescente déficit habitacional. ”
“Em um país continental, onde 85% da população vivem em cidades, dos mais diferentes portes, marcadas por desigualdades territoriais, econômicas e injustiças sociais, é fundamental que se avance na reforma urbana baseada na função social da cidade prevista na Constituição e regulamentada pelo Estatuto da Cidade. Reforma urbana que deve se contrapor ao urbanismo que privatiza e fecha as nossas cidades, sem evitar que a violência alastre-se, ante à incapacidade do Estado de
Ao todo são 53 propostas, divididas em três eixos, destacando-se:
COLEÇÃO LIVROS PARA O AMANHÃ Os livros fazem parte da Coleção Livros para o Amanhã, vencedora do Bologna Ragazzi Award de 2016, prêmio concedido pela maior feira de livros infantis do mundo, lançada originalmente em 1977, pela extinta editora catalã La Gaya Ciencia, de Barcelona, logo depois da queda do ditador espanhol Franco. Foi pensada para crianças entre 8 e 10 anos de idade e discute a maneira como as pessoas se relacionam em sociedade.
Editora: Boitatá Páginas: 52
A democracia pode ser assim Autor: Equipo Plantel Colaborador: Flavio Aguiar e Og Doria (orgs.) Textos: Leandro Konder Ilustrador: Marta Pina Tradutora: Thaisa Burani Editora: Boitatá Páginas: 52 Na democracia, somos livres para fazer o que queremos - mas, para que ninguém acabe injustiçado, precisamos, antes, conhecer as regras do jogo. A ditadura é assim Autor: Equipo Plantel Ilustrador: Luci Gutiérrez Tradutora: Thaisa Burani
1 - Projeto nacional baseado na territorialização das políticas públicas O elevado número de cidades espalhadas por todo o território nacional, com características específicas e grandes diversidades, impõe um planejamento descentralizado e adequado a cada realidade, priorizando a qualidade de vida nas cidades para que a população tenha condições dignas em toda extensão do país.
O cotidiano de um emburrado Ditador ilustra como funciona a sociedade dentro de um regime autoritário. As mulheres e os homens Autor: Equipo Plantel Ilustrador: Luci Gutiérrez Tradutora: Thaisa Burani Editora: Boitatá Páginas: 52 Meninas usam rosa e meninos usam azul? De forma divertida e inteligente, o livro procura abordar questões de gênero por um viés de igualdade e em respeito à pluralidade. O que são classes sociais? Autor: Equipo Plantel Ilustrador: Joan Negrescolor Tradutora: Thaisa Burani Editora: Boitatá Páginas: 52 Partindo da premissa de que todas as pessoas são iguais, mas que existem coisas que as tornam desiguais, o livro expõe de um jeito simples a complexidade das dinâmicas sociais e do mundo do trabalho.
2 - Governança urbana inovadora A diversidade dos problemas dos 5.570 municípios brasileiros requer o apoio efetivo dos governos estaduais e federal, porém a decisão do governo local deve prevalecer, sem prejuízo do desenvolvimento regional e nacional. Fortalecer o governo local para a administração das cidades é fortalecer o pacto federativo e reconhecer as diversidades regionais. 3 - Democratização da gestão dos territórios, em especial Pioneiro em iniciativas como o orçamento participativo, o Brasil, no entanto, tem progredido pouco na democratização da gestão de seu território urbano. Em parte, isso explica por que muitos planos e leis deixaram de ser implementados, total ou parcialmente, por falta de legitimidade nos processos de discussão e tomada de decisões, com participação ativa das comunidades impactadas. A carta reforça a ideia de que devemos pensar globalmente e agir localmente. Que ela também sirva de alerta para a necessidade de se rever nossas políticas públicas, buscando caminhos mais ágeis para adequar os espaços e melhorar a condição da população de nossa cidade.
TIAGO ALVES FERREIRA Produtor cultural
Meu livro de cordel Autora: Cora Coralina Editora: Global Páginas: 112 ‘Meu livro de cordel’ traduz a ligação obstinada e profunda de Cora Coralina com os anônimos poetas nordestinos. A literatura de cordel, enquanto gênero literário, é trabalhada neste livro em 43 poemas. Cora Coralina homenageia os menestréis nordestinos, que para ela são ‘irmãos do nordeste rude’. Com a simplicidade e a sabedoria de quem teve como grande mestra a própria vida, o que, em suas palavras, justifica a autenticidade de sua poesia arrancada aos pedaços do fundo de sua sensibilidade. Aqui ela apresenta-nos a alma dos rios, das pedras, dos gestos exaustos das lavadeiras; a simplicidade da vida, do amor e da morte. Cora revela sua profunda compreensão dos seres humanos, desde os atos mais rotineiros até os atos de heroísmo, nos versos do Meu Livro de Cordel.
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Eu financio o Frente & Verso
TODA A SUPERFÍCIE DO PAPEL. ESTAMOS NA FRENTE. ESTAMOS NO VERSO.
ACESSE E CONTRIBUA CATARSE.ME/FRENTEEVERSO
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
Entre
SHEILA SAIDON
Psiquiatra e psicoterapeuta De que calada maneira Você chega assim sorrindo Como se fosse a primavera Eu morrendo E de que modo sutil Me derramou na camisa Todas as flores de abril Quem lhe disse que eu era Riso sempre e nunca pranto? Como se fosse a primavera Não sou tanto No entanto, que espiritual Você me dar uma rosa De seu rosal principal De que calada maneira Você chega assim sorrindo Como se fosse a primavera Eu morrendo Eu morrendo Nicolás Guillén-Pablo Milanés Desde que tenho memória, esta música produz em mim uma magia, desperta uma alegria singela e potente, um efeito, um afeto, uma modificação no corpo. Quando era adolescente, eu e minha irmã tínhamos um ritual. Nos dias frios e tristes, colocávamos a música no toca-discos e nos deixávamos embalar por essa belíssima canção, na voz do
COMO SE FOSSE A
PRIMAVERA
Chico. Bailávamos, cantávamos, e a Primavera entrava pela janela. Estava tudo bem.
Saí de casa entusiasmada. Era dia de Fórum Permanente de Orientação Sexual e Prevenção ao Uso indevido de Drogas, no Colégio Estadual João de Oliveira Botas. O tema, escolhido pelos alunos, giraria em torno da automutilação, depressão e suicídio.
questões ligadas à saúde, sexualidade e drogas. No início, a modalidade era uma roda de perguntas e respostas. Queríamos ouvir os jovens e abrir um espaço de troca de informações, livre de tabus e preconceitos. Com o tempo, o Fórum do Botas foi se transformando em um espaço de diálogo, confiança e acolhimento. Um espaço onde a palavra circula abertamente e o silêncio também. Um ente, formado por alunos, professores, profissionais da saúde e da cultura.
O Fórum nasceu, há 4 anos, a partir de um convite da Cris Paramita. Junto a ela e três mulheres profissionais da área de Saúde Pública, iniciamos uma série de encontros com os alunos, onde abordávamos
O Fórum é uma experiência que se renova a cada encontro. O que vi hoje nos gestos e nas vozes jovens, foi algo próprio, novo. Longe dos discursos de intolerância, ódio e ressentimento, ouvi meninos e me-
Hoje, com a chegada da estação das flores, ela voltou como um presente.
ninas, falando de suas dores com muita sensibilidade. Enfrentando seus conflitos, se posicionando. Acolhendo a dor do outro, sendo empáticos. Oferecendo uma escuta amorosa, sem julgamento. Jovens tentando construir sua existência desde um outro lugar possível, querendo fazer diferente. Buscando na Filosofia e na Literatura caminhos para se ligar à vida, a projetos. Encontrando alegria na amizade. Abrindo possibilidades. O que vivemos, hoje, foi um acontecimento, um banho de humanidade. Foi nas vozes desses jovens que a Primavera chegou. Ela não chegou calada. Elxs têm muito a dizer. Vamos ouvi-los! Essa gente nova, essa nova voz. Vocês são a Primavera. Obrigada.
Diálogos Quilombolas GESSIANE NAZARIO
ELEIÇÕES E DIREITOS QUILOMBOLAS
Quilombola da Rasa e doutoranda em Educação pela UFRJ
Estamos em momento decisivo para o futuro de nosso país. Está em jogo um país em que poderemos reivindicar nossos direitos, enquanto quilombolas, livremente, ou ficarmos bem quietinhos em nosso canto para não sermos reprimidos. Acho que alguns, até aqui, já entendem o que pretendo dizer, mas para quem ainda não entendeu, vou ser mais objetiva: tenho visto em nossa cidade a inclinação de muitas pessoas a votarem em um candidato cujas propostas estão completamente alinhadas aos anseios do mercado e que não incluem a população mais pobre. O que eu gostaria de tratar é sobre a maneira como ele se dirigiu às comunidades quilombolas, ao dizer que,
no quilombo em que esteve, “havia um quilombola que pesava sete arrobas e que eles não faziam nada”. Tais palavras justificam sua postura racista e perversa ao nos comparar com bois. Dizer que “não servimos nem para procriar” seria o mesmo que nos classificar de preguiçosos e desqualificar a nossa luta pela titulação de nossas terras. Vejamos, nos últimos anos, o movimento quilombola obteve importantes avanços com relação à legislação territorial. O principal foi o decreto 4887/03, assinado pelo então presidente Lula. O decreto fundamentou o respeito à diversidade dos modos de vida das comunidades quilombolas, contrariamente a uma visão restritiva, baseada em concepções preconceituosas, ligadas a noções de cultura e de identidade como conjunto estático e estereotipado de tradições imutáveis e exóticas. As lutas das comunidades negras (rurais e urbanas) por terra objetivam manter suas formas próprias de existência e sustentabilidade, ali-
cerçadas em muito trabalho e contra a expropriação de seus recursos naturais básicos. Os quilombolas não são preguiçosos, são trabalhadores e guerreiros, são pessoas dignas que merecem respeito, cujos direitos duramente conquistados, nas últimas décadas de democratização do país, estão agora ameaçados pelo avanço do fascismo e do estímulo ao ódio e intolerância políticas, por uma mídia corporativa, comandada pelos interesses do capital financeiro (nacional e internacional), do agronegócio latifundiário e dos projetos de dominação global do imperialismo norte-americano. Cabe lembrar que nossa democracia foi golpeada em 2016 por tais interesses. A declaração do candidato comprova um total desconhecimento das diversas comunidades existentes no Brasil. Precisamos estar atentos e decidir, nas urnas, se continuamos com nossos direitos ou abriremos mão deles ao votar neste candidato.
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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
cultura Política
A EXPERIÊNCIA
NIEMEYER Conhecida, celebrada e admirada em todo o mundo, a obra de Niemeyer é em si uma escola, um estilo de arquitetura. O traço do arquiteto representa a própria cultura brasileira, expressão da nossa modernidade e do jeito brasileiro: espetacular, não-linear, imponente e glorioso. Niemeyer é orgulho e inspiração, expressão do que o Brasil tem de melhor. Não estudei arquitetura nem sou especialista no assunto. Vivo a arquitetura como experiência, como um corpo no espaço: cidadão, transeunte, visitante, viajante, residente. Tenho tido o imenso privilégio de, no último ano e meio, dirigir e trabalhar em um teatro popular, público, construído e projetado por Niemeyer, que leva seu nome, em Niterói. A cidade onde nasci e vivo
atualmente reúne o segundo maior conjunto arquitetônico projetado pelo arquiteto em todo o mundo, atrás apenas de Brasília. É um orgulho e privilégio de niteroienses.
Em minha infância e adolescência, acompanhei por anos e de longe o espetáculo da construção, desde as fundações, do Museu de Arte Contemporânea (MAC), hoje um símbolo da cidade, e, logo em seguida, do próprio Teatro Popular. As obras de grande porte tiveram um longo percurso da prancheta do arquiteto até a sua materialização e ocupação pelo público. Mas acompanhar a construção destes equipamentos marcou a passagem do tempo, o meu próprio crescimento e formação, estabelecendo a minha relação afetiva, ainda que inconsciente, com a obra e a estética de Oscar Niemeyer.
A consciência desta relação com a “experiência Niemeyer” aconteceu no período em que morei na capital federal. Aí eu fui entender o “céu de Brasília, traço do arquiteto” da canção de Djavan. No horizonte infinito do cerrado, o céu nos envolve e nos domina. Não é à toa que o planalto central é lugar de refúgio e encontro das mais variadas correntes espirituais e religiosas, de Dom Bosco ao Prem Baba. E é neste cenário que a obra de Niemeyer alcança o seu apogeu e encontra a sua mística: em uma cidade imaginada, planejada entre a imensidão do céu e da terra, a obra humana se projeta em escala grandiosa, dialogando com o infinito. Ao construir os edifícios-monumentos de Brasília, o comunista e materialista Niemeyer dá um
ALEXANDRE SANTINI
Dramaturgo e gestor do Teatro Popular Oscar Niemeyer de Niterói
recado ao divino sobre a grandeza da experiência humana em coletivo. Celebrar Niemeyer é celebrar o Brasil como possibilidade e projeto civilizatório. É encarnar a exuberância e fortalecer a autoestima do povo brasileiro em sua singularidade enquanto projeto de nação. A funcionalidade e a eficiência, conceitos tão caros à “ética protestante e ao espírito do capitalismo” do Atlântico Norte não serão, no matriarcado de Pindorama, mais importantes que a nossa beleza, a nossa grandeza e a nossa exuberância. O céu de Brasília e os traços de Niemeyer estão aí para nos lembrar da nossa força, guerreira e brasileira, contra os dragões da maldade e da mediocridade que insistem em nos rodear.
Teatro Popular Oscar Niemeyer, foto Vitor Vogel
Praça da Ferradura, Centro Armação dos Búzios Rio de Janeiro, Brasil SÁBADO DE 7H ÀS 15H Hortifrutigranjeiro, alimentação, DJ Léa, artesanato e livros QUINTA-FEIRA DE 19H ÀS 23H Alimentação, DJ Léa, música ao vivo e artesanato
@feiraperiurbanadebuzios
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
Cinema
CLASSE DE HISTÓRIA CLASSES NA HISTÓRIA
MANOLO MOLINARI
Historiador Rosarino Buziano
Hoje estou decidido, vou escrever sobre história que, afinal de contas, junto com a de andarilho, é a minha profissão.
Valor: R$ 5,00
Ao longo da História, o mais corriqueiro, na hora de falar em classes sociais, é a simples divisão da humanidade em pobres e ricos, esquecendo-se que, ainda que esses elementos materiais sejam fundamentais, não se limita só a eles o pertencimento a qualquer grupo. O Ocidente utilizou formas e valores diferentes do que os do Oriente para estabelecer as dessemelhanças, se bem que tanto numa parte do mundo quanto na outra, materialmente falando, os efeitos operaram de maneira equivalente. Serve aclarar que a escravidão não forma parte de nenhuma classificação, desde que, antropologicamente, a figura do escravo, coitados deles, era despersonalizada, dessocializada e dessexuada. Na Grécia antiga, entrando nos tempos da chamada democracia (circa sec. VIII antes de Cristo), o pertencimento à cidade-estado ou polis (exceção da Esparta) era dado, justamente pela categoria de cidadão, podendo esses serem campesinos (a maioria) ou moradores da cidade. Lá funcionava mais a igualdade, apesar de que os ricos tinham maiores possibilidades de ocuparem os cargos públicos e de serem eleitos para isso, podendo participar mais facilmente das reuniões, na Ágora, que ficava no centro urbano, ou pagar mestres de oratória, ou comprar vontades etc. A decadência da polis acabou num Império e a ideia de isonomia (igualdade ante a lei) foi junto com ele, porém, a possibilidade de enriquecer continuou, inclusive entre os escravos e estrangeiros.
Travessa dos Pescadores, nº 88, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000
Já Roma foi bem diferente e nunca esteve isenta dos problemas sociais, que foram se acrescentando ao ritmo da sua expansão. No início, monárquica (Rómulo foi o primeiro rei), passou a ser república no século V a. C., para acabar em Império no século I a. C. Então, já tinha nobreza, magistrados, équites (hominis novis) etc., com diferentes catego-
GRAND CINE BARDOT Quinta-feira às 21h Sexta-feira às 21h Sábado às 19h e 21h Domingo às 19h e 21h Valor: R$ 30,00 @grancinebardot.buzios CINE CLUB GRAND CINE BARDOT Sexta-feira 5 de outubro 12 de outubro 19 de outubro 26 de outubro Valor: R$ 10,00 CINECLUBINHO CINE KIDS CASAS BRANCAS Domingo
rias, onde a fortuna pesava (e muito), para cidadãos livres, urbanos ou campesinos, miseráveis e estrangeiros. Claro, também escravos pra burro, a tal ponto, que o sistema de produção foi escravista até o século II d. C.. Isso só existe quando a parte mais grossa do produto econômico depende do trabalho deles. Também Brasil e o sul dos Estados Unidos de América sabem bem disso.
Fazendo uma análise da forma econômica e social da época tardo-romana, vemos que a cidadania estava dividida em dois grupos: os honestiores, título que correspondia, como é de imaginar, aos mais favorecidos, detentores do poder e que pagavam algum imposto, mas que também usufruíam das suas benesses, através do Estado, e os humiliores, massa numerosa de gente, dentro da qual figuravam os trabalhadores e os excluídos, enfim, o povão ou a ralé, que pagava impostos cada vez mais altos e diversos, sem obter retorno algum, fora os jogos do circo, já que o pão começava a rarear. Esses trabalhadores, a grande maioria morando no campo e dedicado a trabalhos agrícolas, foram se transformando em colonos e, mais tarde, em servos, enquanto os bárbaros avançavam, dando fim ao mundo antigo (invasão de Roma em 476) e abrindo a passagem para a idade média, momento este do qual não sabemos muita coisa - como fala Chris Wickman de modo tão bonito - tanta foi a poeira que a queda do Império levantou, impedindo-nos de ver. É nessa transição (circa sec. VIII) que começam a aparecer as grandes abadias e os senhores feudais, mais tarde os reis (primus inter pares), e os servos ficam afetados às terras que trabalham pagando, já não mais impostos, mas agora uma renda, recebida esta pelos donos do senhorio. As antigas formas econômico-sociais transformam-se então em três estamentos diferentes: os que rezam (oratori), os que guerreiam (bellatori) e os que trabalham (lavoratori). Todos os impostos e tributos, desde as talhas até o dízimo
para a Igreja, acabaram sendo pagos por estes últimos, que, dessa forma, converteram-se na forma de sustento da nobreza guerreira e ordens eclesiásticas e, mais tarde (sec. XV), dos Estados e suas cortes. Se bem que o regime não mudou muita coisa, o mundo ocidental foi modificando suas formas de acumulação e entrando assim na modernidade, deslumbrado com as descobertas de todo tipo, desde continentes desconhecidos, como a América, o espaço celeste e até as funções do corpo humano. A burguesia então, nova categoria social em cujas mãos estava a parte mais importante do capital, provocou, através de uma mudança nas mentalidades, novas ideias e formas de conhecimento, uma revolução na França, que acabaria com o feudalismo (ancien régime) e liberaria definitivamente a expansão do capitalismo, tal como o conhecemos. Eis então quando, conforme Karl Marx estabelece, aparece, pela primeira vez na história, a verdadeira sociedade de classes: burguesia e proletariado, a primeira, agora hegemônica e detentora dos meios de produção e a segunda, despojada de tudo menos da sua prole, vendendo a mão de obra em troca de um salário. Esta classe abreviada, é só para aclarar que o uso da palavra “classe”, só é correta quando falarmos em capitalismo. Claro que a gente toma emprestada a expressão para referenciar qualquer outra formação econômica social da história, em virtude das suas posses ou status. Temos no Brasil, como novidade histórica, outros tipos de categorização, muito presentes nesta época de eleições: o “nós” ou “eles” e “coxinhas” ou “petralhas” que, se bem podem ter uma conotação política que se associe, mal, com as econômicas, vêm mais encharcadas ideologicamente entre esquerda e direita. Eu acrescentaria, vista a realidade, “fascistas” ou “antifascistas”, situação que se deu também no mundo dos anos 1930 do século passado. Quero ver quem vai sair do armário atirando a esmo!
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PUBLICAÇÃO POLÍTICO-CULTURAL, GASTRONÔMICA E LITERÁRIA DE ARMAÇÃO DOS BÚZIOS
Cultura Canábica
HAMBER CANNABICO CARVALHO
HÁBITOS E COSTUMES COMO FONTE DO DIREITO. LEGALIZE JÁ
Ativista da maconha medicinal
forma, o que se busca é um paliativo para o enfrentamento da realidade social e psíquica, em contraposição ao uso de remédios convencionais que trazem mais malefícios ao organismo, que a cura ou amenização do sofrimento. Em conversações com os organizadores do evento, alinhavamos a realização deste ciclo de palestra para o mês de novembro, com o apoio da OAB de Búzios, com a mesma carga horária de 6 horas, ampliando-se para 12 horas, em um final de semana, apartado do evento principal com as entidades civis do Rio de Janeiro, onde serão relatados os atendimentos em andamento, através do estudo de casos e noções de cultivo e cuidados com as pragas, com especialistas em agroecologia do Instituto Vital Brazil e cultivadores da Abracannabis.
Nesta quinta que passou, participei de um ciclo de palestras sobre o uso do canabidiol na Ordem dos Advogados do Brasil Seção Rio de Janeiro (OAB/ RJ), onde estiveram presentes os principais atores envolvidos na utilização desta terapia alternativa no Brasil. O órgão regulador, a Agência nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), o Ministério Público Federal (MPF) e a OAB atentos aos aspectos jurídicos, os especialistas em neurologia, debruçados nas experiências e estudos de casos mais recentes, a Fiocruz no campo das pesquisas no Brasil na produção de fitoterápicos à base de cannabis, a Farmacanabis da Universidade Federal do Rio de Janeiro, envolvida na análise dos componentes medicinais da planta, e as entidades civis, que já fazem uso da produção nacional na apli-
cação de pacientes de todas as faixas etárias, através de seu ativismo, como mola propulsora face a inércia do Estado brasileiro. O que podemos depreender desta iniciativa é o grande imbróglio institucional, onde o passar de bola é uma constante, em função do impasse criado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), cuja convenção o Brasil é signatário e no qual a maconha é tratada ainda como uma droga não permitida para fins medicinais. Resultado: para que ela seja admitida como remédio em território nacional, é necessário que o congresso nacional aprove a baixa da saída do Brasil, especificamente neste item, o que encontra uma severa resistência, pois esta casa legislativa, em sua maioria, é composta de parlamentares extrema-
Shopping Aldeia da Praia, Avenida José Bento Ribeiro Dantas, nº 5350, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 Fone: (22) 98111-7510
mente conservadores, ou ainda, por parlamentares comprometidos com a o lado mais obscuro do tráfico. Mesmo assim, este cenário não é motivo para nenhuma manifestação de desânimo, pois cabe a nós, ativistas, advogados, pacientes e profissionais da saúde imprimir com suas ações e intervenções diárias, o ritmo cadenciado para que o estado Brasileiro construa seu arcabouço jurídico através de uma regulamentação que seja a interpretação da necessidade real de seus cidadãos. Plantar será sempre um crime menor, quando o que se pleiteia é o direito à saúde e à qualidade de vida, e não o uso simples para fins recreativos, o que em sua essência, não está dissociado do uso medicinal, se entendermos que, mesmo desta
ZANINE
O grande destaque, porém, deste evento, foi o depoimento das entidades APEPI e Mãesconha, que promovem o tratamento de crianças autistas e com paralisia cerebral, e cujas lideranças serão convidadas especialmente para dar seu testemunho no uso do canabidiol. Nosso propósito, ao realizar este evento na cidade, foca principalmente em desmistificar o uso dos derivados da maconha e, assim, disponibilizar conhecimentos para que o cidadão decida, juntamente com os profissionais da área médica, qual a forma adequada de garantir sua qualidade de vida de forma consciente e barateando os custos e o acesso na utilização de remédios. A dor e a qualidade de vida não podem esperar, nós também podemos legalizar.
Caó Diverso de 5 a 28 out - Reginaldo Caó
FUNCIONAMENTO: SEGUNDA-FEIRA A SEXTA-FEIRA DE 9H ÀS 18H, SÁBADO, DOMINGO E FERIADO 11H ÀS 19H @nucleodedancaodiliacuiabano
Estrada da Usina (ao lado da Prefeitura), Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000 - Fone: (22) 2623-6502
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EDIÇÃO 003 – ANO 01 – OUTUBR0 2018
Roda Cultural do C.U.B. Coletivo Urbano Buziano Batalha do Quilombo DATA: 04 e 18 de outubro, quinta-feira
CircoLo Social
HORA: 18h às 22h LOCAL: Praça Velha da Rasa
Educar e transformar
@coletivourbanobuziano
Memória Buziana
O mais importante, sem dúvida, é o nordeste. Podemos chamá-lo de “nosso vento”, pela frequência que nos visita. Responsável por temperaturas amenas e regulares, espanta nuvens e traz dias de sol. Também noites luminosas. Vento alegre, que faz música com plantas, lhes dá movimento e alimenta, pela grande fotossíntese que propicia. Os velejadores encontram em nossas águas as condições ideais para sua prática. Mas ele tem lá seus dias de zanga. Especialmente em agosto, ronda um pouco para o leste, com céu nublado, sopra forte, chega a força 7, irrita, revolve o mar, sacode as árvores e assobia pelas ruas e desvãos. Sua antítese é o sudoeste, que vem do lado contrário da rosa dos ventos, não dura muito, mas traz as nuvens, e em seu bojo as chuvas que revigoram nossa natureza. Após a sua passagem, por uns dias, o tempo permanece cinzento, o que também tem seu encanto. A briga com o nordeste ocasiona uma singular mudança pelo atrito com superfície. Os ventos movem a camada superior do mar na direção que sopram. O nordeste, portanto, ao encontrar a resistência da parte norte nordeste da península, ensaca a água do mar de encontro a mesma, fazendo com que ela pare de se mover, e que o Sol a aqueça. O efeito contrário, a ressurgência, acontece no outro lado, aberto para o sul e para o oceano, fazendo com que a camada superior mova-se para o mar aberto. Pelo princípio dos vasos
@SocialCircoLo
Gastronomia
SER COZINHEIRO OU COZINHEIRA NO BRASIL
VENTOS DE BÚZIOS Os ventos benéficos, que varrem nossa cidade, fizeram de Búzios um lugar mágico. Seus ares são mais límpidos, o clima é agradável, chove pouco, as temperaturas mais baixas e o tempo mais seco e saudável. Aqui o vento tem morada. Sem ele a vida seria outra.
Estrada da Usina Velha, nº 179, Centro, Armação dos Búzios, Rio de Janeiro, Brasil, CEP 28950-000
BENTO RIBEIRO DANTAS
Escritor
comunicantes quando a camada superior, aquecida pelo Sol se move, a água do fundo, muito mais fria, toma o seu lugar. Com o vento sudoeste o fenômeno se inverte e as praias oceânicas têm suas águas aquecidas. Já as de dentro sofrem uma considerável baixa. Em dezembro, e às vezes por todo primeiro semestre afora, recebemos a visita da “viração” nome que os pescadores dão à brisa de sudeste. Começa pela manhã como uma leve aragem, aumenta de intensidade com o calor do Sol para quase morrer ao crepúsculo. Os dias ficam lindos, nada de nuvens, a água do mar se torna límpida, de grande transparência, mesmo de cima de um barco, pode-se ver os detalhes do fundo. Sem dúvida, é um vento ameno e glorioso, por onde passa traz beleza e paz. Por fim temos o oeste-noroeste, o mal humorado dos nossos amigos ventos, é um terral, vem do interior, quente, forte e zangado, sopra em rajadas irregulares em intensidade e direção, traz um tempo enfarruscado, prenuncia o sudoeste e as chuvas. A entrada da enseada dos Ossos é orientada para o noroeste e é abrigo e fundeadouro para muitos barcos com os outros ventos. Ele, quando sopra, não encontra obstáculos, atinge a praia de frente, causa ondas de mais de meio metro e desorganiza o ancoradouro. Muitos barcos já afundaram, dentro da enseada dos Ossos, por sua causa. Por sorte, não dura muito e é também o mais raro dos nossos ventos.
Você não sabe o que é ser um(a) cozinheiro(a) no Brasil? Eu vou te contar. Ser cozinheiro(a), no Brasil, é ser um sonhador. É ter vindo do Norte e do Nordeste do país atrás de um chão para deitar e um teto para se proteger e ter encontrado a vocação de uma vida. Ser cozinheiro(a), no Brasil, é encontrar, diante de todas as possibilidades de trabalho, as panelas como uma forma de subsistência. Mesmo sabendo que é uma profissão que procura seu lugar e luta pelos seus direitos mínimos. E, para isso, anda na corda bamba do alto investimento em uma educação profissional que não remunera nem metade das mensalidades pagas e, mesmo assim, segue em frente. Ser cozinheiro(a) (Chef), no Brasil, é conviver com essas duas histórias dentro de uma mesma cozinha e, mesmo assim, fazer com que o amor pela profissão fale mais alto. E mediante altos e baixos, entender que é possível formar uma brigada tão incrível, que dá medo de perder (mesmo que, às vezes, demore décadas para acontecer). Ser cozinheiro(a), no Brasil, é começar a entender que produto bom não tem perna e nem paga passagem. E aceitar que não é o produto que é bom. E sim a pessoa que semeou ou transformou algo simples em um ingrediente reverenciado pelo mundo! Entender que somos nós (cozinheiros e cozinheiras) os responsáveis por uma cadeia produtiva e pela vida destas pessoas, não somente por um prato bonito.
GUSTAVO GUTERMAN
Professor do curso de Gastronomia do Instituto Federal Fluminense de Cabo Frio
Ser cozinheiro ou cozinheira, no Brasil, é saber que a gastronomia está em franca expansão e mudança. E essa luta pertence a todos nós e está só começando. Entender que restaurante não é somente um local que se come bem. De forma geral ele representa a cultura de um povo, e é justamente essa representatividade que cria a identidade necessária para o sucesso do empreendimento. Eu não queria estar em lugar algum, senão aqui e agora!! Estamos vivendo algo incrível!! Somos agentes de um período histórico na gastronomia, que será estudada pelas futuras gerações de profissionais. É só parar um minuto, analisar nossa realidade e acreditar que podemos ir além! Hoje, além de cozinheiro, sou professor. E acreditem: o Brasil é um dos maiores ícones da gastronomia mundial. Pois não somos somente cozinheiros e cozinheiras. Somos cozinheiros dentro de um dos mais incríveis biomas do mundo!! Um cozinheiro ou cozinheira que não é um ambientalista por essência é um(a) estúpido(a). Um ambientalista que não é um cozinheiro (mesmo que amador), é uma pessoa triste! Eu acredito em cada de vocês. MUITO.