Entrevista: Luiz Carlos Azenha_Mesmo
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na internet, mídia grande impõe seu poder
anos!
Vírus Porque neutro nem sabonete, nem a Suíça
R$2 edição nº 23 maio 2013
Planetário
ura.. . c u lo é o m lis a it p Se desafiar o ca
o c u o l e d o d n a b m u m e t i u
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antimanic No mês da luta
Com conteúdo do
FAZENDO
EDIÇÃO DIGITAL
nº22
MEDIA
ade e o direito à cid ra cu u lo a s o m omial, discuti
o i e r l r a o r C Vi >Envie colaborações (textos, desenhos, fotos), críticas, dúvidas, sugestões, opiniões gerais e sobre nossas reportagens para
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Afinal, o que é a Vírus Planetário? Muitos não entendem o que é a Vírus Planetário, principalmente o nome. Então, fazemos essa explicação maçante, mas necessária para os virgens de Vírus Planetário: Jornalismo pela diferença, não pela desigualdade. Esse é nosso lema. Em nosso primeiro editorial, anunciamos nosso estilo; usar primeira pessoa do singular, assumir nossa parcialidade, afinal “Neutro nem sabonete, nem a Suíça.” Somos, sim, parciais, com orgulho de darmos visibilidade a pessoas excluídas, de batalharmos contra as mais diversas formas de opressão. Rimos de nossa própria desgraça e sempre que possível gozamos com a cara de alguns algozes do povo. O bom humor é necessário para enfrentarmos com alegria as mais árduas batalhas do cotidiano.
O homem é o vírus do homem e do planeta. Daí, vem o nome da revista, que faz a provocação de que mesmo a humanidade destruindo a Terra e sua própria espécie, acreditamos que com mobilização social, uma sociedade em que haja felicidade para todos e todas é possível.
Recentemente, unificamos os esforços com o jornal alternativo Fazendo Media (www.fazendomedia.com) e nos tornamos um único coletivo e uma única publicação impressa. Seguimos, assim, mais fortes na luta pela democratização da comunicação para a construção de um jornalismo pela diferença, contra a desigualdade.
Expediente: Rio de Janeiro: Aline Rochedo, Ana Chagas, Artur Romeu, Beatriz Noronha, Caio Amorim, Catherine Lira, Chico Motta, Eduardo Sá, Gabriel Bernardo, Ingrid Simpson, Julia Maria Ferreira, Livia Valle, Maria Luiza Baldez, Mariana Gomes, Miguel Tiriba, Noelia Pereira, Raquel Junia, Seiji Nomura e William Alexandre | Mato Grosso do Sul: Marina Duarte, Tainá Jara, Jones Mário, Fernanda Palheta, Eva Cruz e Juliane Garcez | Brasília: Alina Freitas, Luana Luizy, Mariane Sanches e Thiago Vilela | São Paulo: Ana Carolina Gomes, Bruna Barlach , Duna Rodríguez, Jéssica Ipólito, Luka Franca e Sueli Feliziani | Minas Gerais: Ana Malaco, Laura Ralola e Paulo Dias Diagramação e projeto gráfico: Caio Amorim Ilustrações: Carlos Latuff (RJ), Paulo Marcelo Oz (MG) e Adriano Kitani (SP) Revisão: Bruna Barlach e Jones Mário Colaborações: Juliana Rocha Capa: Arte sobre foto original de Ben Heine
Conselho Editorial: Adriana Facina, Amanda Gurgel, Ana Enne, André Guimarães, Carlos Latuff, Claudia Santiago, Dênis de Moraes, Eduardo Sá, Gizele Martins, Gustavo Barreto, Henrique Carneiro, João Roberto Pinto, João Tancredo, Larissa Dahmer, Leon Diniz, MC Leonardo, Marcelo Yuka, Marcos Alvito, Mauro Iasi, Michael Löwy, Miguel Baldez, Orlando Zaccone, Oswaldo Munteal, Paulo Passarinho, Repper Fiell, Sandra Quintela, Tarcisio Carvalho, Virginia Fontes, Vito Gianotti e Diretoria de Imprensa do Sindicato Estadual dos Profissionais de Edução do Rio de Janeiro (SEPE-RJ) Siga-nos: twitter.com/virusplanetario Curta nossa página! facebook.com/virusplanetario
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Comunicação e Editora A Revista Vírus Planetário - ISSN 2236-7969 é uma publicação da Malungo Comunicação e Editora com sede no Rio de Janeiro. Telefone: 3164-3716
Editorial O que é a comunicação? O documentário “Levante sua Voz – 2009 – Direção: Pedro Ekman / Produção: Intervozes” (assista aqui – www.tinyurl.com/levantesuavoz) define a comunicação como, acima de tudo, um direito humano. Os cinco últimos anos para nós da Vírus foi um aprendizado na prática em como compreender 100% essa concepção (e continua sendo). Obviamente que, literalmente, essa concepção é clara. Mas é preciso ir além (ou mais profundamente). Entender a comunicação como direito humano é entender que nós, seres humanos, cheios de imperfeições, podemos nos desenvolver dentro de uma lógica que nos leva à desumanização. Mas, por outro lado, podemos também, por meio de conscientização, de muita militância (a luta pela democratização da comunicação é uma delas) fortalecer nosso lado mais belo, aquele que nos conforta, nos transborda de emoção e preenchimento – mesmo que por poucos instantes – e assim lembramos de correr para a rua, olhar e lembrar que “a tua dor é minha, e minha dor é tua”. Portanto, compreender a comunicação como direito humano e que “direitos se conquistam”, como lembra o “filme-bíblia” do jornalismo militante, é compreender que existe em todas as outras pessoas a mesma matéria que te constitui e que constitui tod@s aqueles que lutam diariamente (com todos os defeitos e contradições que existem) para destruir todo o mal inventado pelo ser humano e seus mirabolantes sistemas de injustiça, do capitalismo selvagem ao pós-moderno. Como dizia Rousseau, o ser humano nasce bom, a sociedade que o corrompe. E assim vem sendo desde 15 de maio de 2008, quando fomos pegar nossa primeira edição na gráfica e levar para o evento de lançamento. Entender que devemos colocar sempre toda nossa emoção, sentimento e potência em cada letra que digitamos ou cada traço que desenhamos; abdicar de facilidades, aceitar a dureza de noites viradas, de construir com pouquíssimo apoio e dinheiro algo que custa muito caro. Só que, para nós, é maior o ainda o valor de manter viva uma alternativa de comunicação que inspire as pessoas a construir um mundo em que sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres. Onde haja felicidade para tod@s! Há exatamente cinco anos, nós estávamos animados, eufóricos e nervosos enviando nossa primeira edição da querida Vírus Planetário para uma gráfica que hoje nem existe mais. Além dos detalhes da edição, acertávamos também os detalhes do evento de lançamento na Vila dos Diretórios (onde ficam os Centro Acadêmicos e DCE) da PUC-Rio. Correria para organizar para os shows, exibição de curtas e sarau de poesia que fizeram parte do evento de lançamento. Nesse exato instante em que fechamos esta 23ª edição, estamos tão ou mais à flor da pele quanto há cinco anos. A felicidade é de transbordar cada sorriso em nossos rostos. O que para muitos parecia não passar de uma brincadeira (coisa que uma revista com humor pode sofrer) de um grupinho de estudantes politizado (vistos como “rebeldes sem causa”), já na distribuição de sua primeira edição, mostrou que a Vírus vinha ao mundo (ainda num papel-jornal bem do vagabundo) para ficar. Ganhávamos a atenção de estudantes das principais universidades públicas e privadas do Rio de Janeiro, e até de São Paulo. Em 23 edições, xingamos, criticamos, exaltamos revoluções vitoriosas ou em processo, debochamos dos algozes do povo, sempre berrando, gritando, pois “pedras e pedras são nossas únicas armas, e se as pedras não voam os sonhos são em vão”. Então, vambora fazer voar nossos sonhos de todas as maneiras possíveis. Fechamos um ciclo de cinco anos, e entramos agora em uma nova fase, com ainda mais responsabilidades, falando pra cada vez mais gente (são milhões por semana em nosso facebook), mais vigor, mais ânimo e fagulhas no peito. Ainda é só começo! “Vamos caminhando, aqui se respira luta!” Que cada palavra, cada imagem, cada emoção aqui impressa ecoe em nós como uma batida forte de tambor de todas as músicas que tanto expressam luta e expiram alegria. Guiando como um metrônomo para que não percamos o tempo, não percamos o ritmo que deve ser seguido. Mesmo com tanta barbárie, sabemos que outra humanidade quer emergir e vamos, assim, caminhando por uma estrada à esquerda, mal sinalizada, tortuosa e longa. Mas vamos cada vez mais unidos e assim, cada vez mais nos libertando, semeando, a cada parada, verbos à flor da pele que plantamos no chão do céu de cada boca que aqui grita, canta, dança, pula, xinga, enfim, ama. Emanemo-nos amor! *Citações das músicas: “Os Assaltimbancos” “Pedras e Sonhos” - El Efecto. “Verbos à Flor da Pele” - F.Ur.T.O e “Da entrega” - Teatro Mágico
Sumário 5
Traço livre
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Sociedade_À mercê da boa vontade polícia - resoluçao 013
10 Sórdidos Detalhes 12
Movimentos Sociais_A Vitória do Povo de Porto Alegre
15 Bula Cultural_Indicações e Contraindicações
16
Bula Cultural_Uma História de Amor e Fúria
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Internacional_O movimento estudantil e a guerra na Colômbia .
22 CAPA_Sociedade_O que é ser antimanicomial?
26 Fazendo Media_5 anos da Vírus 28 Fazendo Media_Entrevista: Luiz Carlos Azenha
32 Minas Gerais_Dandara resiste! 34 Ensaio fotográfico 40
O sensacional repórter sensacionalista
41 Passatempos Virais 42 Traço Livre
Em defesa do projeto dos movimentos sociais para o petróleo, com monopólio estatal, Petrobrás 100% pública e investimento em energias limpas.
Vamos barrar os leilões do petróleo! organização:
Participe do abaixo-assinado: www.tinyurl.com/nao11leilao Notícias da campanha:
www.sindipetro.org.br
www.apn.org.br | www.tvpetroleira.tv
De 20 a 24 de maio com PARALISAÇÃO
em 22 de maio
Participe! Um a mais é muito mais! Reunindo forças, conquistamos direitos.
traรงo livre
Por Gus Morais / Veja mais em: www.gusmorais.com
sociedade
À mercê da
vontade
da polícia
Zero-Treze, a resolução utilizada para inviabilizar a realização de eventos, entra em debate
Por Catherine Lira Editada no início do governo de Sérgio Cabral e assinada em 2007 pelo atual Secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, a Resolução 013 proíbe a realização de eventos de cunho cultural, esportivo e social sem a autorização prévia das autoridades da polícia civil e militar no estado. A resolução regulamenta o decreto nº. 39.355 de 24 de maio de 2006, que determina sobre a atuação conjunta de órgãos de segurança pública na realização de tais eventos. O documento provoca cada vez mais indignação na sociedade por criar uma série de dificuldades burocráticas e legais para a realização de eventos de pequeno e médio porte em favelas e espaços populares. Apesar de discorrer sobre a garantia da paz e da tranquilidade, na prática, a Resolução 013 deixa o organizador de evento na mão da autoridade policial, não estabelece requisitos bem definidos a serem cumpridos pelo organizador, nem critérios claros para a proibição ou autorização do evento. O 8
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parágrafo único do artigo 2º dá poderes para a polícia proibir eventos por qualquer motivo. Além de abusiva, a norma abre brechas para a corrupção, pois os organizadores ficam submetidos à vontade e à discricionariedade da autoridade policial de cada local.
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favelas da cidade. Ele afirma ainda que existem relatos da 013 sendo utilizada para extorquir os organizadores dos eventos.
“A Resolução dá aos policias o poder de decidir segundo critérios próprios e subjetivos, e a enorme burocracia exigida aumenta a possibilidade de corrupção, já que o Estado coloca a dificuldade para depois vender Existem relatos da 013 a facilidade”, explica Guilhersendo utilizada para me.
extorquir os organizadores dos eventos.”
A Zero-Treze e o abuso de poder Assessor da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Guilherme Pimentel conta que casos de intervenção de autoridades policias na realização de eventos se tornaram comuns nas
A norma exige uma série de requisitos burocráticos e documentos que dificultam muito a realização dos eventos. O procedimento é todo descentralizado e o organizador deve passar por uma série de órgãos diferente antes de completar a solicitação do “nada-a-opor” das autoridades. Da mesma forma, a Resolução 013 prejudica os eventos de menor orçamento, pois não diferencia economias, portes e geografias diferentes. A mesma norma regula desde festas com 50 pes-
Manifestantes no “Rio Parada Funk” - 2012 no centro do Rio de Janeiro | Foto: Maria Buzanovsky
soas a shows com mais de 100.000 pessoas. Determina o mesmo procedimento para áreas pobres e bairros ricos. Um parecer que analisa as leis de eventos do Rio de Janeiro feito pela Fundação Getúlio Vargas, aponta a ausência de critérios de corte para definir quais eventos estarão sujeitos às exigências mencionadas. A Resolução 013 cita como referência eventos realizados na Apoteose, no Maracanã e no Riocentro, mas ao não definir limites objetivos, confere poder às autoridades para elevar ou reduzir o nível das exigências. O parecer afirma ainda: “No que diz respeito aos eventos de menor porte, a impossibilidade de respeitar todas as exigências previstas acaba por gerar, fatalmente, efeitos desastrosos. Isso porque o empreendedor de pequeno porte não possui qualquer incentivo para formalizar a sua atividade ou sequer informar os órgãos de segurança sobre eventos que irá realizar, já ciente de que não será possível atender os requisitos legais.”
O movimento funk em luta contra a Zero-Treza A Associação dos Profissionais e Amigos do Funk (Apafunk) foi a primeira organização a apontar os efeitos perversos da Resolução 013, em especial nas áreas já militarizadas com a presença das Unidades de Polícia Pacificadora. A Apafunk teve um papel fundamental na conquista da Lei Estadual nº 5.543 de 22 de setembro de 2009, que define o funk como movimento cultural e musical de caráter popular, impondo ao Poder Público a competência de assegurar a esse movimento a realização de suas manifestações próprias e proibindo a discriminação contra o movimento funk e seus integrantes
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O baile funk por ser expressão cultural das favelas é quem mais sofre mais com a norma.”
Apesar da vitória, o presidente da Apafunk, MC Leonardo, conta que assim que ganharam a batalha pela lei que oficialmente descriminalizava o funk, se depararam com outros muros. “A Resolução 013 vale para a realização de todos os eventos culturais, esportivos ou sociais no estado do Rio. Ou seja, tudo! Mas pelo baile funk ser atualmente a maior expressão cultural das favelas, somos o gênero que sofre mais com a norma. Se quem atua com cultura no estado não pressionar pela revogação da resolução também estará sujeito a maiores dificuldades no futuro”, afirma o MC. O poder público deveria estar nas comunidades garantindo as condições para a realização e produção de manifestações culturais, no entanto, a resolução deixa tudo nas mãos da população, que fica à mercê da vontade policial e da disponibilidade de recursos. Guilherme Pimentel conta que muitas vezes os organizadores são avisados com poucos dias de antecedência ao seu evento, que este não poderá acontecer e os trabalhadores perdem todo seu investimento. “Além dos organizadores, outros pequenos comerciantes, o vendedor de cachorro-quente, o salão de beleza local, diversas pessoas que fazem girar a economia durante os bailes perdem seus locais de trabalho”, afirma Guilherme. Nenhum produtor ou consumidor de cultura foi consultado sobre a resolução em momento alguma a sociedade foi consultada. Entendendo a necessidade de unir outros setores e tornar a resolução visível a todos, a Apafunk iniciou no ano passado, junto à ONG Meu Rio, uma campanha pela revogação da Resolução 013. Apostando na força das redes socais e da mobilização de rua, foram realizadas diversas Rodas de Funk, debates em Universidades e ainda a criação de uma petição que exige a revogação imediata da resolução. Este ano a campanha continua. Raphael Calazans, MC e membro da Apafunk, destaca que não se pode perder de vista a garantia de locais onde os bailes e eventos de todos os gêneros aconteçam. “Foram nos bailes que decidimos viver do funk, escolher nossas referências e acreditar que seria possível dizer nossa realidade naqueles palcos. Ali nos tornamos funkeiros convictos e confessos. Mais que isso, fizemos com que o surgimento de Mc’s, tipos de funks, grupos, batidas continuassem a todo vapor. São os bailes, na minha opinião, a principal fonte de renovação do movimento funk”.
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A verdade varrida pra debaixo do tapete
s o d i d r ó s . . . s e h l a det
Só esperando o óleo quente transbordar, os professores de São Paulo que já trabalham em condições precárias (como aliás é o caso dos professores de escolas públicas de todo o país), entraram em greve para lutar por um aumento é possível, sim, mudar de verdade a vida das pessoas. minimamente digno. Não bastasse a falta de vontade do Estado de dialogar com os professores eles ainda foram surpreendidos, na assembleia do dia 10 de maio, com um golpe da direção que decretou o fim da greve, mesmo com 70% dos presentes votando pela continuidade. O que é pior: fim da greve sem nenhuma garantia do aumento esperado, necessário e fundamental. Não bastasse o golpe da diretoria pelega, o nosso mais conhecido aparelho de repressão do Estado, a força policial, desceu porrada nos professores, sem dó. E a mídia grande ainda teve coragem de noticiar que os professores que atacaram a polícia. Afinal, que crime horrendo é querer um salário digno para uma profissão tão desnecessária quanto essa.
drogas e drogas... A política de drogas no Brasil tem sido realmente muito eficiente: estamos em segundo lugar mundial na venda de ritalina (e outros medicamentos para TDAH - Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), criando uma linda geração de pequenos zumbis viciados. Sucesso empresarial estrelado pelas grandes indústrias farmacêuticas. Enquanto isso o debate sobre a legalização da maconha continua sendo um tabu. Não é estranho que haja juízo de valor entre as drogas? Ou será que o juízo é de quem gera dinheiro pras grandes empresas. Mundialmente, a legalização da maconha (para fins medicinais ou mesmo recreativos) tem avançado, enquanto aqui, até mesmo as Marchas da Maconha tem que enfrentar o Estado para acontecerem. Se você está do lado daqueles que são contra o proibicionismo e por uma nova política sobre as drogas, neste mês e no próximo participe da Marcha da Maconha e ajude a levar ao público esse debate. Saiba quando e onde será a marcha mais próxima de você:
www.marchadamaconha.org
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Estupra. E também mata. Defensor e entusiasta da política de Feliciano, o pastor Marcos Pereira foi preso acusado de estupro. Além de fazer suas pregações, enclausurava mulheres na sua igreja para se dedicarem à oração. Só que o que ele queria mesmo era estuprá-las, alegando que esta era uma forma de “livrá-las do demônio”. Ele também teria ameaçado de morte fiéis que queriam denunciar as orgias que ele organizava. Além disso, também é investigado por homicídio, associação ao tráfico de drogas e lavagem de dinheiro. Pra fechar com chave de ouro a história, nosso velho conhecido, Marquito, o Feliciano, defendeu seu colega no twitter. Afinal de contas, alguém tinha que ser representado pelo Feliciano, não é mesmo?
MaraKEike Escândalo após escândalo a história recente do Maracanã faz chorar qualquer amante do futebol ou dos nossos patrimônios culturais. Em troca de um estádio de “magnitude olímpica” e “perfeito para a Copa”, o Maracanã conhecido e amado pelos brasileiros simplesmente se foi. E, junto com ele, foram destruídos outros locais importantes ao seu redor, afinal, nada disso dá lucro. O que dá lucro é pegar o dinheiro público pra fazer o estádio que fique bonito na TV e depois, adivinhem, privatizá-lo. Agora que o dinheiro público já foi usurpado, nada como entregá-lo para a iniciativa privada. Por 35 anos a concessão do estádio estará na mãos de pessoas muito bem intencionadas, como Eike Batista e a Odebrecht. Engraçado que sendo patrimônio público talvez o povo devesse ter sido consultado, mas, quem é que se importa com a opinião do povo quando se pode ter milhões no bolso, não é mesmo? Bem que tentaram impedir a assinatura deste contrato, mas em poucos dias a liminar que impedia a assinatura foi caçada. E ao que tudo indica, é bye-bye Maraca para o povo.
Ilustrações: Carlos Latuff
Entre a cruz e a espada (e em cima danosfrigideira) Vivendo Horizontes
Se ser livre é ser vadia... vamos seguir em marcha! Bem que queríamos dizer que 2012, com o grande cataclismo, o mundo mudou completamente: o machismo acabou, a opressão contra as mulheres se foi junto com ele e agora todas podem viver suas vidas as forma que quiserem, sem sofrer violências, sem sofrer abusos e mais, sem serem culpabilizadas por isso. Mas como a virada do ano não nos trouxe nada de novo, estamos em maio, o mês que ocorrem a maioria das Marchas das Vadias. Mesmo jovem, esse movimento tem ganhou tanta força que a cada ano reúne mais mulheres que não aguentam mais sofrer abusos, não aguentam mais serem vistas como objeto, não aguentam mais que a sociedade as diga que elas tem que “se proteger”. Vamos lá, de uma vez por todas: o único culpado pelo estupro é o estuprador! Não entendeu? Leia de novo a frase anterior tantas vezes quanto for necessário. E você, mulher, homem, que acredita na liberdade de autodeterminação da mulher e é contra a violência de gênero, fique ligado e participe da Marcha das Vadias na sua cidade. www.marchadasvadias. org
Polícia + favela = uma salva de tiros OPERAÇÃO MILITAR NA FAVELA
vista pela classe média
vista pelo morador da favela
“Deve ser ele, deve ser ele!”; “Tá parecendo ele, hein?”; “É isso aí. Parece mesmo”. Foi assim que os agentes da Polícia Civil do Rio de Janeiro “identificaram”, à noite e a partir de um helicóptero a dezenas de metros do solo, o traficante Márcio José Sabino Pereira, conhecido como Matemático. O piloto do helicóptero declarou: “apesar de a imagem ser feita a uma distância muito longa e à noite, pelo biotipo a gente tinha certeza de que era o Matemático”. Fica a primeira pergunta: à noite e a dezenas de metros de distância, qual o biotipo observado pelos policiais para “identificar” o suspeito? Teria havido alguma característica determinante para além do fato de ser um homem caminhando nas ruas de uma favela? Observando as imagens gravadas pela equipe policial, facilmente perceberemos que, SE ninguém foi atingido, foi puro acaso: os disparos foram efetuados a esmo e atingiram diversas casas e prédios. Daí fica a segunda pergunta: a Polícia Civil realizaria uma operação deste tipo, efetuaria disparos deste modo, em uma região habitada pela classe média, na Avenida Vieira Souto ou no Leblon? Leia mais sobre o caso em nosso site:
www.tinyurl.com/matematico123
Quero ver a medicina sambar nos rincões do Brasil Que o Brasil é um país de proporções continentais, com diferentes realidades, culturas e dificuldades, ninguém precisa dizer. Agora, o que parece que não tem sido ensinado nas faculdades de medicina no Brasil é bom senso. Depois do anúncio da importação de médicos de outros países (incluindo Cuba), o CFM não parou de dar declarações que temos médicos sobrando e que não precisamos importar profissionais. Afinal de conta, estamos cheios de médicos. Realmente, não faltam consultórios particulares de médicos cobrando algumas centenas de reais para 5 minutos de consulta. Agora no SUS falta, no sudeste, no sul e principalmente no norte e nordeste. Claro que precisamos investir em melhores condições de trabalho para todos os médicos mas, e as melhores condições de vida para todas as pessoas que não tem nenhum tipo de assistência médica? Os médicos cubanos são conhecidos, MUNDIALMENTE, por serem os melhores em condições precárias. São especialistas em saúde da família, exatamente o que precisamos. Mas não, o ego dos médicos brasileiros é grande demais. Preferem deixar milhares de pessoas morrendo de diarreia, desnutrição, desidratação, bebês morrendo ao nascer por falta de assistência, do que abrir mão do seu status de seres superiores. Imagina, se até um CUBANO pode ser médico...
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movimentos sociais
Foto: Naian Meneghetti
A vitória do povo de Porto Alegre Por Matheus Lara e Bruna Barlach Esta é uma cidade com transporte público deficiente, cujos funcionários ganham mal e são submetidos a escalas de trabalho desumanas, uma cidade onde existe um prefeito autoritário que decide aumentar o valor da tarifa do transporte sem consultar a população ou ter qualquer amparo legal. E nesta cidade existe uma luta. As características acima podem ser adaptadas hoje a quase todas as cidades do Brasil, mas uma em especial merece atenção diferenciada. Tal atenção não se deve ao tamanho do absurdo que motivou a luta, mas pela capacidade de mobilização de 12
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Como a união dos trabalhadores, estudantes e de todo povo mobilizado AINDA constrói vitórias seu povo que marchou pela vitória. É uma cidade que não se contenta em vencer a batalha contra um aumento, mas que não se cala perante aumentos abusivos ocorridos em anos anteriores, que não se satisfaz em impedir o aumento de uma tarifa enquanto existem funcionários mal tratados e a é população mal atendida, que não se cala enquanto não são garantidos o direito de ir e vir do estudante e do idoso através do passe livre. E não há força policial que contenha a mobilização, nem liminar inconstitucional ou crucificação de militantes que os pare. Enquanto houver opressão haverá luta!
A comemoração da vitória No dia 03 de abril o Brasil ficou emocionado com as ruas da capital do Rio Grande do Sul repleta de manifestantes em marcha pelo transporte público. Uma mobilização que não se vê no Brasil de hoje sem que haja militantes pagos, lanche ou shows, que levou, de acordo com os números dos militantes, mais de 10 mil pessoas a gritarem contra o aumento da tarifa de R$2,85 para R$3,05, o que tornaria a cidade de Porto Alegre, ao lado do Rio de Janeiro, a cidade com o transporte público mais caro do país.
Ilustração: Carlos Latuff
Era possível ver a população presente em peso na luta. Fosse essa população anarquista, socialista, estudante, trabalhador, torcedor do Grêmio ou do Inter, todos estavam lá, representando a indignação do povo como um todo: eram 15 mil que representavam toda uma cidade. Todos cantando em uníssono, juntos por um ideal: “Vem! Vem! Vem pra luta, vem!!!”. Como resultado, o aumento foi barrado e o protesto se tornou a marcha da vitória. Aqueles que participam das lutas pelo Brasil podem se perguntar como, mas como conseguiram isso tudo?
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A origem e evolução do movimento A luta começou pequena, para marcar posição e mostrar a indignação. Foi na época de outro aumento que ocorreu em 2010 quando 15 ciclistas da massa crítica (um movimento capaz de mobilizar até 11 mil pessoas) decidiram pedalar sozinhos para protestar. Em 2011 a mobilização já contou com 50 pessoas e em 2012 atingiram 500 pessoas lutando contra os sucessivos aumentos na tarifa. A esta altura não eram apenas os ciclistas da Massa lutando por
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“A gente não pode esquecer que as empresas de ônibus como outras empresas, são elas que bancam campanha de prefeito, deputado, governador... então os políticos devem favores aos empresários. Por isso que entre escolher entre a opinião dos passageiros e do empresário, o poder público, obviamente vai quedar pelo empresário.” (Carlos Latuff)
Não há força policial que contenha a mobilização”
um transporte público melhor e tentando impedir os aumentos da tarifa. A sociedade civil havia se organizado em diferentes grupos e tinha lutas separadas, grêmios, movimentos sociais, rodoviários, partidos políticos e o Bloco de Luta Pelo Transporte Público, principal responsável pela união destes movimentos.
Nas ruas a rotina dos protestos era constante e na câmara dos vereadores a luta parlamentar não parava, as bancadas do PSOL e do PT estavam unidas, somado ao apoio do PSTU (que não tem vereadores na cidade) em favor da população, contra o aumento. As discussões aconteciam nas ruas e na câmara até o dia 21 de março, quando o Conselho Municipal de Transporte Urbano (COMTU) aprovou o aumento. O dia D do movimento foi o dia 25, quando o aumento da passagem entrou em vigor e estudantes bloquearam durante quatro horas a avenida Ipiranga, em frente à PUCRS. A polícia agiu, como sempre, de forma violenta a mando da prefeitura, usando o batalhão do choque como seu escudo. A ação repressiva deixou a todos mais indignados e não foi difícil mobilizar centenas de pessoas para a frente da prefeitura, numa marcha que durou 3 horas até o Palácio da Polícia, na mesma avenida Ipiranga onde acontecera a repressão violenta dois dias antes. A partir daí a mobilização cresceu assustadoramente. No dia 1º de Abril a mobilização atingiu o número de 6 mil pessoas. Enquanto isso, o prefeito Fortunati (PDT) recebia grupos de estudantes pelegos para fazerem um teatrinho, ao qual deram o nome de reunião. Uma reunião pro forma fingindo discutir com o movimento estu-
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movimentos sociais
A luta é todo dia... e não é só em Porto Alegre! Nós temos muito orgulho de tod@s @s lutadores de Porto Alegre, mas é importante ressaltar que o que aconteceu em Porto Alegre pode acontecer em qualquer cidade de qualquer estado brasileiro. Separamos alguns elementos que foram essenciais para a vitória dos militantes porto alegrenses para que você leve a diante a ideia de que a luta pode sim mudar a vida, seja a luta contra o aumento da tarifa e pela qualidade do transporte público ou por qualquer outra pauta que seja importante na sua cidade. 1) Não importa o tamanho, o importante é começar! Em Porto Alegre eles começaram com 15 e chegaram em... 15 mil! 2) Persistência sempre! Ano após ano a luta de Porto Alegre prosseguiu, mesmo sem conseguir atingir seus objetivos, mas se eles tivessem desistido jamais teriam construído essa vitória. 3) Sempre mobilize mais gente: Localize onde você pode angariar mais gente e faça trabalho de base. Lá em Porto Alegre, o trabalho junto aos grêmios fez toda a diferença, mostrando desde cedo a importância da organização e da luta. 4) Não seja sectário! É importante ver quais grupos, movimentos, partidos e organizações de trabalhadores, estudantes, movimentos populares e sindicatos podem contribuir com o movimento que está sendo construído. Em Porto Alegre até as torcidas organizadas participaram! 5) Não deixe a repressão policial (ou do Estado, em geral) vencer o movimento. Toda vez que houve repressão, eles agiam em, no máximo, dois dias. Agiam organizando marchas até a sede da polícia, por exemplo, mostrando que não ficariam calados quando seus direitos de manifestação e organização estavam sendo ameaçados pela força policial. 6) Consiga ajuda de outras esferas. Além da luta nas ruas, conseguir também lutar nas instâncias políticas pertinentes ao objetivo pode ser bastante importante, como a luta de Porto Alegre, que era feita na frente parlamentar (e jurídica) e social. 7) Comunicação é fundamental. Tenha um grupo responsável por mostrar o que está acontecendo com o movimento para o mundo, através de vídeos, matérias em sites, revistas e jornais (conte sempre com a Vírus para isso). Não se esqueça também de informar aos manifestantes (atuais e futuros), onde serão os próximos atos, chamá-los para a construção do movimento e etc. (veja o exemplo do coletivo Catarse) 8) te, o pela uma
Ter em vista um horizonte maior. Se a sua luta é pelo transpordireito de ir e vir amplo e irrestrito tem que estar no horizonte. Se é educação, educação de qualidade, pública e gratuita, atendendo a finalidade de transformação social tem que fazer parte do debate.
dantil sobre as decisões da cidade. Deixando de fora, é claro, a principal força estudantil local, o DCE da UFRGS, grande ator na luta contra o aumento.
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Foi nas ruas que a decisão judicial que dava vitória à luta popular seria anunciada”
No dia 03 de abril, mesmo dia em que 6 mil pessoas foram às ruas no maior protesto até então, os vereadores do PSOL, Pedro Ruas e Fernanda Melchionna, protocolaram a Ação Cautelar exigindo revogação do aumento das passagens de ônibus na cidade. O dia 04 prometia fortes emoções. Neste dia o protesto emocionou e inspirou todo o país, levando 15 mil pessoas às ruas. E foi nas ruas que a decisão judicial que dava vitória à luta popular seria anunciada. Como dignos heróis de uma luta, o povo de Porto Alegre não se satisfez em conter o aumento e anunciou que permanecerá em luta, desta vez para a redução da passagem e não apenas contra o aumento, pela garantia do direito de ir e vir através do passe livre, pelo respeito ao rodoviário e pelo usuário do transporte público.
Bula cultural
algumas recomendações médico-artísticas
Indicações CD “Pedagogia da Dominação” - Repper Fiell
Contraindicações Canal Parafernalha
O novo cd do Fiell, Repper Pedagogia da Dominação , é composto por 20 faixas de música pura de luta e consc i e n t i z a ç ã o. Um álbum que bebe das fontes do marxismo para se dizer socialista e que defende as ideias de Paulo Freire para dizer ao povo da favela que ele deve participar da política para transformar sua vida. Tendo como ídolos Carlos Prestes, Marighella, Vito Giannotti, Florestan Fernandes, Che Guevara, Rosa Luxemburgo, entre outros, Repper Fiell não tem medo de polemizar quando inicia seu álbum com a afirmativa de que Jesus foi o primeiro sociao lista, morto nas mãos da burguesia de sua época, e confronta o conteúd do ação organiz a chama quando escolas das ensino das escolas de Pedagogia dos Dominantes.
O Canal costuma ser um primor (para não dizer o contrário) em suas publicações de um “humor” agressivo, justamente contra aqueles que já são hostilizados na sociedade, como o povo nordestino, em fevereiro. Os vídeos seriam uma resposta ao dito “povo do politicamente correto”. A história consiste em um nordestino que é demitido do canal, justamente por ser nordestino, e que é impossível fazer piadas politicamente corretas contendo alguém que faça parte de uma MINORIA. O diálogo prossegue e chega-se à conclusão de que todos seriam demitidos, exceto a ‘gostosa’ do lado (garantindo toque de machismo). O(a) leitor(a) da Vírus Planetário, crítico, da categoria dos seres pensantes, é capaz de fazer seu próprio juízo do vídeo e concluir se é possível, ou não, fazer um humor que, ao invés de sufocar o oprimido, agrida o status quo da sociedade.
Daí para a frente ele reivindica direitos, fala das regras da favela e surpreende mais ainda ao adicionar um discurso do Presidente João Goulart em defesa da reforma agrária e um poema de Galeano (escritor socialista uruguaio), tudo isso em um som de agradar aos ouvidos, de uma que é um show a parte. A produção conta com parcerias gloriosas como a de Mara, celo Yuka e se estende às contribuições de Michel, ProraRu Bianca Felix, Mc Kapella, Dudu Nascimento, Dj, Jaci e Marcelo x Jerry, O Levante, Dj Metal da CDD, Bonde da Cultura e Vinima (que manda bem em todos os vocais e chama particularmen faixas). s diversa em te atenção Ou seja, um cd que fala da luta do povo e do socialismo, o fala da esperança e homenageia grandes heróis, contand para nsável indispe CD um É cia. excelên de o produçã com uma qualquer pessoa que aprecie boa música e tenha ao menos um pequeno nível de empatia pelo sofrimento do pobre, nas favelas ou no campo. Leia mais sobre o CD - www.tinyurl.com/resenhacdfiell
POSOLOGIA ingerir em caso de marasmo ingerir em caso de repetição cultural ingerir em caso de alienação
manter fora do alcance das crianças nocivo, ingerir apenas com acompanhamento médico extremamente nocivo, não ingerir nem com prescrição médica Vírus Planetário - maio 2013
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Bula cultural
algumas recomendações médico-artísticas
Uma História de Amor e Fúria
“Viver sem conhecer o passado é andar no escuro” Por Aline Rochedo
Nós, brasileiros, travamos todos os dias uma luta. Nossa é trajetória é muito mais rica e intensa do que a versão que muitos livros didáticos querem nos fazer aceitar e acreditar. Questionar as “verdades absolutas” significa revelar a identidade secreta de muitos heróis e da História que realmente deve ser conhecida. O longa de animação “Uma história de amor e fúria” retrata o amor entre um guerreiro Tupinambá imortal e Janaína, a mulher por quem é apaixonado. Durante seis séculos a história do casal sobrevive, atravessando momentos significativos da história do Brasil.
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Com estética de Histórias em Quadrinho, o diretor e roteirista Luiz Bolognesi apresenta a narrativa pela ótica e atuação dos personagens esquecidos da nossa história. Desconstrói a versão oficial dos “vencedores” e a ideia de uma nação harmoniosa e um povo pacífico e desarticulado Destinado ao público jovem e adulto, o filme traz Selton Mello e Camila Pitanga dublando os protagonistas. Conta ainda com a participação de Rodrigo Santoro, como o chefe indígena Piatã e guerrilheiro Júnior. Amor e Fúria é um dos raros longas de animação brasileiros para
jovens e adultos. “Há outros poucos exemplos, como o ótimo Wood & Stock: Sexo, Orégano e Rock in Roll, mas é incomum este tipo de produção no Brasil. Desta forma, tanto o espectador não está acostumado quanto o mercado não entende ainda muito bem o lugar do desenho animado adulto”, comenta Bolognesi sobre a dificuldade em lançar e mantê-lo em circuito.
O conhecimento histórico para a compreensão do presente e transformação do futuro A narrativa tem início no período da colonização no século XVI, em um breve relato sobre os costumes dos indígenas e os primeiros con-
divulgação
tatos entre europeus, Tupiniquins e Tupinambás. Mostra como tais etnias indígenas foram dizimadas no Rio de Janeiro. No período da escravidão e das revoltas suscitadas pela população, o enredo apresenta uma das mais intensas, a “Balaiada” (18381841). A revolta uniu negros e pobres livres contra o monopólio político de um grupo de fazendeiros da região do atual estado do Maranhão e a ação violenta da polícia. O nome de “Balaiada” provém do apelido de um de seus principais líderes, Manuel Francisco dos Anjos Ferreira (Manuel Balaio), fabricante de balaios, que foi vítima da violência policial, na qual foram violentadas duas de suas filhas.
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O filme é um dos raros longas de animação brasileiros para jovens e adultos”
de memória e Patrimônio Cultural, deslocamento de moradores, dentre outras atrocidades, são subentendidas. Retrata um suposto “futuro”, projetado em 2096, quando haverá uma guerra pela água. Nesta realidade a cidade é controlada por milícias particulares e a água torna-se um privilégio da classe dominante. Em todos estes períodos, os dois personagens lutam contra a opressão, repletos de sentimentos intensos e muita fúria.
“Meus heróis não viraram estátuas, morreram lutando contra aqueles que viraram”
No período do regime militar (1964-1985), retrata ação da esquerda no Brasil através dos movimentos de luta dos estudantes (1968) e as formas de tortura que o regime aplicava aos resistentes. Aborda ainda, já na década de 1980, a ação de militantes dentro das favelas.
Nos vários episódios temáticos, o filme aborda aspectos da história nacional e discute a atuação dos cidadãos brasileiros em diferentes períodos, embasado em relatos de historiadores e outros formadores de opinião. Apesar de alguns críticos terem interpretado o enredo como um tanto sombrio, a reação do público ao sair da exibição é outra: “Agora eu sei que Somos nós indígenas os protagonistas desta iniciativa. O Brasil é uma das grandes usinas culturais do mundo, e isso se deve, principalmente pela diversidade de seu povo e suas raízes. A desapropriação do museu indígena não condiz com a lógica da diversidade cultural que tanto se preza nos dias de hoje. Precisamos voltar e reaprender o que foi esquecido. Reivindicar uma sociedade na qual as potencialidades e possibilidades de se viver a vida são respeitadas, compreendidas e legitimadas. Não é questão para sermos imparciais somos nós, brasileiros, os protagonistas deste processo”, relata Vanessa Monteiro ao sair do cinema.
No último momento, uma crítica ao “projeto” de cidade ao qual a cidade do Rio de Janeiro está sendo submetida: transformação em um grande shopping Center. Remoções, destruição dos locais
O Brasil é o país da biodiversidade abundante, das culturas suscitadas na diversidade de seu povo. Precisamos reaprender o que foi esquecido. Reivindicar, como sempre fizemos, uma sociedade na qual as potencialidades e possibilidades de se viver a vida são respeitadas, compreendidas e legitimadas. Porque, “viver sem conhecer o passado é andar no escuro”.
A animação sinaliza ainda os motivos do surgimento do “Cangaço” no sertão do país e uma crítica sobre a atuação truculenta do general do exército, Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias.
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internacional
O movimento estudantil e a
guerra na Por Matheus Lobo Pismel e Rodrigo Simões Chagas Quando um estrangeiro entra pela primeira vez na Universidade Nacional (UN), em Bogotá, logo percebe que a insurgência armada está presente no cotidiano universitário. As paredes da maior universidade da Colômbia, com 27 mil estudantes, estão cobertas por manifestações das duas maiores guerrilhas do país: as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo (FARC-EP) e o Exército de Libertação Nacional (ELN). Depois de frequentar a UN por mais de um mês, qualquer um percebe que a clandestinidade vai além das paredes. Mês passado, na praça Che - espaço central da universidade - militantes clandestinos apareceram 18
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Clandestinidade na universidade: reflexo das condições sociais colombianas vestidos de preto, da cabeça aos pés. Um deles lançava no chão papas-bomba, explosivos caseiros feitos de batata. As bombas anunciavam aos estudantes que algum grupo clandestino estava na universidade. Entre uma explosão e outra, o encapuchado, como são chamados os clandestinos, convidava os colegas no entorno da praça a participar de um debate sobre os problemas universitários no auditório León de Greiff, que haviam ocupado momentos antes. Nem todos os clandestinos têm ligação direta com as FARC-EP ou com o ELN. Os que ocuparam o auditório, se autodefinem como Estudiantes UN e têm o discurso vol-
tado às questões universitárias. As principais bandeiras do grupo são a renúncia do reitor Ignacio Mantilla e a implementação de uma constituinte universitária, para a construção de uma nova UN, “que sirva para a paz, para a maioria dos colombianos e para a edificação de um novo país; para que seja alma acadêmica e científica e, ao mesmo tempo, consciência crítica da nação”, afirmavam em comunicado que justificava a ação. Além dos encapuchados, a mesa da assembleia reuniu três representantes estudantis, dois professores e um dos trabalhadores, que foram convidados após a ocupação do auditório. Estiveram presentes aproxi-
Estudantes cobrem completamente o corpo para não serem reconhecidos
madamente mil estudantes, que, depois das falas dos participantes da mesa, interviram com sugestões para o movimento estudantil. “A universidade está desmoronando aos nossos olhos. Não concordo com este tipo de ocupação, mas estou de acordo com todas as reivindicações”, advertiu o professor Plínio Teran, representante no Conselho Superior Universitário (CSU), durante seu discurso. Ainda que os Estudiantes UN sejam um grupo clandestino, as ações organizadas por outros encapuchados, ligados às FARC-EP ou ao ELN, costumam ter um impacto maior na rotina estudantil. É comum que apareçam ao menos uma vez por mês, quando divulgam comunicados e propaganda revolucionária. Também costumam bloquear o tráfego de avenidas e não são raros os enfrentamentos com as forças de segurança pública nas imediações da universidade. “Os estudantes têm o direito de simpatizar com as ideias que quiserem. É o valor da universidade”, defende Jairo Rivera, porta-voz da Federação de Estudantes Universitários (FEU) e da Mesa Ampla Nacional Estudantil (MANE), frente estudantil de unidade que reúne diversos coletivos e organizações. A relação entre universidade e insurgência sempre existiu. Muitos dos comandantes das FARC e do
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Essa mesma repressão foi uma escola. Também serve para politizar o movimento social.”
ELN foram estudantes universitários. O mais célebre deles, Alfonso Cano, assassinado em novembro de 2011, estudou Antropologia na Universidade Nacional de 1968 a 1973. No início da década seguinte, integrou-se ao exército das FARC. Para Rivera, a relação entre as guerrilhas e a universidade é basicamente a mesma de 50 anos atrás, apesar de a visibilidade ter diminuído, especialmente, depois do governo de Álvaro Uribe Vélez (2002-2010), que classificou a insurgência como mero terrorismo e intensificou os ataques militares. “Nos anos 70, era uma época mais aberta e pública, inclusive. Haviam assembleias de guerrilheiros, onde os estudantes decidiam ali mesmo ir ao monte com eles. Mas hoje seria impensável, pelas circunstâncias. Já não é uma coisa pública, tem que ser mais clandestina”, relata. O estudante Boris Duarte, do Coletivo Identidad e também portavoz da MANE, acredita que a clandestinidade na universidade é reflexo das condições sociais do país. “Para falar sobre isso tem que se pensar na causas estruturais do conflito armado: a configuração excludente e antidemocrática do sistema político, da posse da terra e das políticas de despejo. Nas universidades, essa realidade também se evidencia e são caldo de cultivo para essas organizações”, explica Duarte A Colômbia vive uma guerra entre Estado e guerrilhas que dura mais de meio século. O conflito é historicamente centrado no tema da terra. Foi como uma forma de defesa territorial que surgiu a insurgência armada e, ainda hoje, é no meio rural onde a guerra colombiana é mais intensa.
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Não podemos correr o risco de virar intelectuais de escritório, afastados da práxis.”
Capuchas: “Resistir e combater pela universidade, que é do povo colombiano.”
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É na praça Che da UN onde acontecem as principais manifestações de grupos estudantis
Durante o governo de Uribe, a militarização do país atingiu o ápice. Hoje, os gastos com segurança nacional representam aproximadamente 15% do orçamento do governo – só ficam atrás das despesas com a dívida pública.
A política repressiva também atinge o movimento estudantil. Acumulam-se casos de ameaças, atentados e detenções a estudantes militantes. O defensor de direitos humanos da fundação Lazos, Gustavo Gallardo, é responsável por uma investigação que estima que, entre prisioneiros de guerra e vítimas de montagens judiciais, a Colômbia tenha 9,5 mil presos políticos, de um total de 140 mil detentos no sistema carcerário. Segundo ele, o governo dificulta o acompanhamento desses casos, com a justificativa de que não existem presos políticos na Colômbia. “Dizem que nas prisões colombianas há delinquentes, terroristas, criminosos de lesahumanidade, mas não há presos políticos”, explica.
Mesmo com o esforço militar, as guerrilhas não foram derrotadas. A miséria e a repressão no campo colombiano continuam impulsionando a luta armada. As FARC lutam pela reforma agrária em um país onde um terço das terras estão nas mãos de 3% dos proprietários. A concentração de propriedade faz com que, hoje, 65% dos camponeses vivam na pobreza, de acordo com dados da revista Semana.
Ele relembra o caso de dez estudantes da FEU detidos durante uma manifestação em 2010, que ainda não tiveram seus casos julgados e nem sequer considerados os pedidos de habeas corpus. “É
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Os gastos com segurança nacional representam cerca de 15% do orçamento do governo.”
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Forum pela paz da Colômbia Nos próximos dias 24, 25 e 26 de maio, Porto Alegre sediará o Fórum Pela Paz na Colômbia que vai reunir centenas de movimentos sociais e populares latino-americanos. O Fórum está sendo organizado pela Marcha Patriótica que integra duas mil organizações colombianas comprometidas com a resolução do conflito no país. Os três eixos de discussão utilizados para definir o conceito de paz que vem sendo utilizado pelo Fórum são: democracia, soberania e justiça social. Saiba mais sobre a Marcha Patriótica no blog parceiro da Vírus Planetário: www.colombiaemmarcha.virusplanetario.net
uma nova modalidade de captura massiva e arbitrária, mas já um pouco mais seletivas, para desmembrar organizações sociais”, alega o defensor. O ex-dirigente da FEU e um dos fundadores da MANE, David Florez, conta que as organizações estudantis já estão acostumadas a lidar com ameaças e estigmatização pública. “Hoje, um líder estudantil já teve facilmente 10 ou 15 ameaças, ou pelo menos teve algum amigo preso. Aprendemos na prática a construir estratégias de blindagem política, de acompanhamento jurídi-
co. Essa mesma repressão foi uma escola. Também serve para politizar o movimento social”, afirma Florez. Apesar de tudo isso, os estudantes não deixam de sair das salas de aula para construir o país, como diz David Garzón, do coletivo Conciencia Crítica. “Não podemos correr o risco de virar intelectuais de escritório, que se formam muito mas nunca levam a cabo a práxis”, afirma. A ideia do coletivo é pensar como os estudantes podem apoiar os outros setores sociais, especialmente nos espaços de resistência camponesa. Assim, por exemplo,
os estudantes de Medicina criaram brigadas de saúde; os futuros advogados, assessoria jurídica popular; e os alunos de Engenharia ajudam a melhorar os sistemas elétricos e hidráulicos das casas camponesas. “Para isso precisamos começar defendendo a universidade pública como espaço crítico e transformador”, defende Garzón. “Precisamos que o estudante tenha trabalho, comida e bem-estar, e que a universidade seja autônoma para formar um estudante crítico, que possa sair para construir o país”.
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sociedade
Ilustração: Ben Heine
O que é ser
antimanicomial? No mês da luta, mostramos como você tem mais a ver com isso do que pensa. Por Livia Valle Rosa Luxemburgo certa vez disse que quem não se movimenta não sente as correntes que o prendem. A potência desta frase encontra-se no exercício que ela nos abre: de pensar a sociedade em que vivemos. Qual o sentido de existir correntes e quais correntes nos constituem? O ocidente especializou-se em produzir na modernidade formas gerir a população a partir dos comportamentos dos grupos e indivíduos. Escolas, fábricas, prisões, hospitais e manicômios, surgem como instituições encarregadas de regular os corpos assim distribuídos nestes espaços, destinados a uma vigilância. Como dispositivo de aprimoramento ou exclusão dos comportamentos, esta era presente também
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nas ruas através da polícia, e dentro dos lares privados pela família. Consolidando-se para além de seus muros, as instituições disciplinares passaram a fazer parte do cotidiano, moldando silenciosamente nossos hábitos. Modos de convívio produziam-se então junto ao ordenamento da sociedade industrial em desenvolvimento no século XVIII. Com o capitalismo em ascensão, os corpos enquanto força de trabalho foram escolhidos como seu primeiro objeto de controle, e assim, ciências nasciam para estudar e sofisticar seu desempenho. A infância surgia como um saber e parte da ideologia burguesa de uma família nuclear, até hoje típica: heteronormativa e constituída pela propriedade privada, a herança e a
tutela, apoiada nas normas da sexualidade e na orientação ‘correta’ para vida adulta e o trabalho, em preparo também através da escola. Para a gestão liberal funcionar, havia então toda uma normatividade e linearidade, que ia da vida organizada desde o nascimento até a esteira fabril, e por todos os espaços. O controle dos gestos, desde os mínimos, torna-se algo contínuo, imperceptível e realizado por todos. O corpo é assim docilizado por toda a malha social. Produzindo modos de sentir, agir, relacionar e pensar, a norma nos atravessa desde as pequenas liberdades, por ela acorrentadas ou acorrentáveis. Todas as esferas da vida passam a estar dominadas e organizadas, capilarizando-se o po-
der que o filósofo francês Michel Foucault tanto quis nos mostrar. Como produtos, tornamo-nos tão serializados quanto os sabonetes. O filme “Clube da luta”, ao eleger o sabonete como analisador desta sociedade, foi mais brilhante do que previa. Valores capitalistas influenciam até em nossa maneira de desejar, de amar. Queremos ser proprietários e cópias, além de constantemente disponíveis para o consumo: não só de itens de supermercado, mas acima de tudo de modos de ser. Esgotamos nossos corpos pelo trabalho enquanto temos que nos encaixar cada vez mais em padrões que não conseguimos sustentar. Se conseguimos, raro é sem sintomas. Em condições desiguais, uns estão claramente melhor preparados ou adaptados que outros. E a culpabilização destes outros, descar-
táveis pelo sistema, é universalizada em nossa cultura meritocrática, algo que legitima práticas excludentes e violentas. Os que desviam dos ideais são considerados incapazes ou, no mínimo, aqueles que precisam ser corrigidos. Assim, uma eficaz exploração avança sem resistências ou questionamentos. Somos produtores de nossa própria anestesia (não só pelos remédios). E o capitalismo, deu certo? Perfeitamente. Pois nos tornamos uma sociedade manicomial: feita para homogeneizar o corpo coletivo, aprisionando subjetividades em suas referências e excluindo qualquer manifestação que fuja disso, desde a sexualidade, passando pela loucura.
A loucura pede passagem! Os manicômios surgem na modernidade tendo como princípio a loucura enquanto desrazão, sustentando assim o poder da ciência de dizer o que ela é, quem é o louco, e por que se deve deixar de sê-lo, como uma verdade intocável formada junto ao status quo geral da sociedade. Sabe-se que, a forma de tratar a loucura que a colocou historicamente em primeiro plano como doença mental, estigmatizou-a como sinônimo de um corpo doente e incapaz, legitimando o manicômio por séculos como o espaço destinado aos tidos anormais. Isolando os loucos da sociedade e produzindo impedimentos violentos aos modos de expressão que então apareciam como diferentes, estes locais preci-
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Cartazes de 2012 e 2013 do bloco de carnaval “Tá pirando, pirado, pirou” que leva a alegria e diversão para mostrar que todos podem conviver nas ruas
saram começar a ser olhados com estranhamento. E eis que de repente é proposta uma ousadia, a de perguntar: porque a loucura afinal não pode ser vista, ou experimentada? É aqui que surge a defesa antimanicomial. Segundo Beatriz Adura, militante da luta e pesquisadora, é preciso entender e afirmar a loucura como uma experiência. Em entrevista à Vírus Planetário, a psicóloga nos propõe questionar: por que a loucura não pode circular, sendo enclausurada? Por que ela nos constrange tanto enquanto diversidade? Isso significa que precisamos enxergá-la como uma manifestação da vida, assim como outras, composta de afetos que expressam sim uma diferença. Defendendo uma positivação da loucura, a luta antimanicomial surge então não mais para escondê-la, negativizando-a de antemão; mas aceitando-a como possibilidade.
A luta antimanicomial no Brasil
O manifesto de Bauru, feito na ocasião do Encontro dos trabalhadores da Saúde Mental em 18 de Maio de 1987 – no calendário brasileiro, dia da luta antimanicomial – mostra o que está em jogo na luta por uma sociedade sem manicômios. Acreditando que o Estado que gerencia tais serviços de saúde é o mesmo que sustenta os mecanismos de exploração e de produção social da violência, o movimento antimanicomial inaugura uma ruptura e ao mesmo tempo uma aliança, juntando-se ao movimento popular e a classe trabalhadora, dizendo: “O manicômio é expressão de uma estrutura, presente nos diversos mecanismos de opressão desse tipo de sociedade: a opressão nas fábricas, nas instituições de adolescentes, nos cárceres, a discriminação contra negros, homossexuais, índios, mulheres”. A luta antimanicomial coloca então o manicômio como lugar a ser combatido, superado e questionado em suas finalidades, num contexto mais geral das instituições sociais. Foi assim que os serviços psiquiátricos brasileiros passaram por uma 24
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transformação – a Reforma Psiquiátrica. Esta surge paralelamente ao Sistema Único de Saúde (SUS) na redemocratização. Com a experiência de desinstitucionalização da psiquiatria na Itália por Franco Basaglia, a militância brasileira redireciona a assistência em saúde mental, privilegiando o oferecimento de uma rede de acolhimento público de base comunitária, quando implementam os CAPS (centros de atenção psicossocial). Dispondo sobre os direitos das pessoas atendidas, e tendo a promoção da autonomia como princípio, iniciou-se uma progressiva extinção dos manicômios. Indo além de uma luta por novos serviços, e retirando-se do âmbito das curas e finalismos, a discussão antimanicomial passa antes pela defesa de uma vida não enclausurada, possível de criações: passa pelo tempo capitalista e seu imperativo de instituir todas as práticas. Tratase de podermos nos relacionar com a loucura, e em espaços menos hospitalares. Assim nascem grupos como o Pirando, Pirado, Pirou; do Rio, e o TAMTAM. Este último, surgido em 1989 pela iniciativa de Renato Di Renzo, é uma experiência de Santos, revolucionária no campo das artes e da saúde mental. Propondo as tais ações TAMTAM (nome escolhido durante um exercício de poesia dadaísta), abrange intervenções urbanas junto a população, através de diferentes artes como pintura, rádio, jornal, teatro e dança. Com o lema “somos loucos pela vida”, o grupo até 1996 fez parte da política pública municipal, passando depois a atuar em galpões e prédios abandonados, e mais tarde, em 2003, ocupando o terceiro piso do Teatro Municipal de Santos. A loucura assim vai ao espaço público e ao encontro com a arte. A prática antimanicomial, portanto, entende-se como feita de encontros para a loucura poder se dizer: e se dizer precisando ou não
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Qual o sentido de existir correntes? Quais correntes nos prendem?”
de ajuda, ou como experiência que enfrenta ou não sofrimento – passa antes pelo reconhecimento do seu lugar de fala. Mas uma concepção tão radical, acima de tudo sobre relações livres, não poderia ser posta em prática sem dificuldades.
vessado por um novo capitalismo. Entre privatizações, trabalhadores não conseguem se articular, têm medo da demissão e sentem culpa por serem levados a atuar sob outra lógica, considerando suas relações de poder.
Em meio a burocratização inerente às políticas públicas, e apesar de suas conquistas, um dos maiores desafios da luta é ainda a construção da autonomia, tanto dos usuários da rede quanto dos trabalhadores. Na busca por relações menos institucionalizadas, o que nos resta na ponta, enquanto sustentáculo cotidiano de uma política cada vez mais desinvestida?
A sociedade manicomial ainda persiste em resquícios e atualizações das mais explícitas às mais camufladas – estas pelas quais a tortura ou a medicalização excessiva ainda são naturalizadas. Em tempos de internações compulsórias e outros aprisionamentos, práticas perigam em erguer rotinas por onde trabalhadores podem cada vez mais se calar ou perder a crítica – e até sensibilidades. O risco da repetição diária da tolerância àquilo que nos é claramente intolerável; desde condições insalubres à correntes, passando pelos preconceitos aparentemente inofensivos; leva-nos a uma fatal possibilidade de extinção: da nossa própria faculdade de estranhar e querer transformar. O silenciamento aprisiona.
Um dos maiores problemas encontrados hoje, além da formação profissional, é a terceirização e a persistente angústia do desemprego, que coloca em cheque práticas que acabam se tornando reféns de modos já há tanto tempo combatidos. O capitalismo estruturante da instabilidade, da exclusão e da violência, tensiona as relações trabalhistas e atravessa suas práticas quando incide de forma vertical e precária nos locais destinados ao cuidado daqueles que por ele são produzidos.
A cidade, enfim: lugar de luta e criação A luta antimanicomial tinha a ideia inicial de promover pelos bairros algo como sovietes, comunas dedicadas a uma saúde comunitária em microterritórios. A saúde como prática na contramão do controle era um sonho que hoje se vê atra-
Desse modo, ser antimanicomial é antes de tudo acreditar que podemos ocupar a cidade com aquilo que é diferente. É acreditar que podemos criar, como e com os loucos, afetos outros, abrindo passagem à diversidade não mais impedida pela violência. Se de perto ninguém é normal, todos podem resistir. Ser antimanicomial é libertar para tentar uma nova sociedade, com espaço para o múltiplo. Ainda que em nossa frente haja um estranho deserto de plásticos, andaimes, ritalinas e shoppings...
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FAZENDO
*É isso mesmo, caro leitor, agora a Vìrus e o Fazendo Media são um veículo único!
MEDIA
Março de 2013 | Ano 10 | Número 104 | www.fazendomedia.com | contato@fazendomedia.com
a média que a mídia faz
Revista Vírus Planetário completa cinco anos Pela equipe Vírus Planetário A primeira edição da Revista Vírus Planetário foi lançada no dia 15 de maio de 2008, no Centro Acadêmico de Comunicação Social da PUC-Rio. Nos últimos cinco anos, a revista tornou-se uma das principais referências da comunicação alternativa no Rio de Janeiro. Com o apoio do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos (DDH) e do jornal Fazendo Media, a Vírus Planetário se estabeleceu como publicação mensal desde dezembro do ano passado. Nosso próximo desafio é montar uma cooperativa de comunicadores populares para atuar junto das organizações e movimentos sociais. Com equipes regionais no Rio de Janeiro, Brasília, São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul, a Vírus Planetário se consolidou como um espaço de convergência para estudantes, profissionais e militantes que atuam e pensam a comunicação politicamente. Aos poucos, a ideia de construir uma rede entre os diversos colaboradores da revista foi tomando forma entorno da editora Malungo. Criada para dar suporte jurídico formal à publicação e venda da Vírus Planetário, a editora começou a receber diversas demandas de sindicatos e outros coletivos para prestar serviços na área de comunicação, como diagramação, desenho gráfico, criação de sites e publicação de livros. Motivados pela ideia de que a Vírus Planetário deve se reconhecer também como organização política,
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não só como uma revista, os seus membros estão criando de uma cooperativa de comunicadores populares para ampliar a sua frente de atuação. Por um lado, o objetivo é agir de forma mais estratégica em parceria com organizações e movimentos sociais para fortalecer as
lutas pela defesa de uma sociedade mais justa e o compromisso com os direitos humanos. Por outro, mobilizar projetos próprios, principalmente voltados para formação, na área da comunicação, cultura e política. Em ambas as iniciativas, permeia o desejo de ver crescer a comuni-
cação alternativa e consequentemente a democracia. Esses novos sonhos e desafios são o resultado da forma que a Vírus Planetário vem se desenhando nos últimos anos. Sempre abertos a receber novos membros que queiram participar da construção da revista, tivemos o prazer de ver circular pelas mesas de reuniões e páginas de cada edição mais de 50 pessoas que deixaram suas marcas, impressas ou não. Essa abertura garantiu que a Vírus se tornasse um ambiente de aprendizado, de debate político e experiências práticas, sem nunca perder os princípios fundamentais que movem a passos lentos o avanço desse grupo desde o primeiro momento. A revista nasceu da iniciativa de estudantes universitários de comunicação, direito e ciências sociais da PUC-Rio. A ideia de fazer uma mídia que conciliasse humor e reportagens fictícias com artigos mais sérios tem inspiração em publicações como O Pasquim, a MAD e a Caros Amigos. Tudo misturado. Outra característica fundadora da revista é a crítica ao discurso da imparcialidade jornalística na mídia comercial. A Vírus Planetário assumiu desde a primeira edição a transparência editorial e ideológica com seus leitores, deixando sempre claro uma perspectiva que valoriza os movimentos sociais e os princípios dos direitos humanos. Rapidamente outras pessoas uniram-se ao projeto, especialmente estudantes universitários de comunicação e de humanas das universidades da cidade. Nos anos seguintes, vieram com mais força a colaboração de outros estados ampliando a necessidade que a revista abrigasse cada vez mais temáticas nacionais. Ao todo foram 23 edições com os mais variados assuntos. Nas Entrevistas Inclusivas falaram grandes nomes da política brasilei-
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A Vírus se consolidou como um espaço de convergência para aqueles que pensam a comunicação com um viés político”
ra, como Vladimir Palmeira, Marcelo Freixo e Ivan Pinheiro; da cultura, como Marcelo Yuka, Carlos Latuff e Silvio Tendler; e até do futebol, como Petkovic. Falamos da luta do funk por respeito e contra a criminalização da pobreza, da luta pelo direito à cidade e contras as remoções, da luta pela reforma agrária e contra os agrotóxicos, entre tantas e tantas outras lutas que acontecem todos os dias. Também escrevemos uma edição especial inteira dedicada às vitórias e utopias, inteiramente financiada de forma colaborativa. Atualmente, a Vírus Planetário é um dos veículos de comunicação alternativa com maior presença nas redes sociais, com mais de 47 mil seguidores no Facebook, tendo estabelecido periodicidade mensal na versão impressa. Além da atuação enquanto publicação, a Vírus Planetário também participou de dezenas de debates e seminários. Alguns exemplos são o Encontro Nacional de Estudantes de Comunicação (2008), o Estágio Inderdisciplinar de Vivências em áreas de Assentamento da Reforma Agrária (2011), o Curso de Formação de Agentes Culturais Populares da Universidade Federal Fluminense (2010-2011) e o Curso de Formação Popular em Direitos Humanos da ONG Educap (2012) no Complexo do Alemão. Com frequência os lançamentos das edições são marcados por eventos políticos culturais, entre eles os realizados na ocupação do Canecão e na Aldeia Maracanã, são os mais marcantes. Queremos aproveitar esse espaço para agradecer a todos os fiéis leitores e apoiadores da comunicação alternativa, popular e comunitária, que de muitas formas ajudam a aprofundar a democracia no país e a fortalecer pequenas e persistentes organizações como a nossa. Essa história, ainda breve, não foi construída só de avanços, mas nem por isso deixamos de caminhar.
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FAZENDO
MEDIA Entrevista:
Luiz Carlos Azenha Vi o mundo resiste na blogosfera Foto: Arquivo pessoal
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As redes sociais têm capacidade e ameaçam os monopólios da comunicação”
Por Eduardo Sá O blog Vi o mundo (www.viomundo.com.br) está, como outros produzidos por jornalistas independentes, entre os mais conceituados no Brasil. Sustentado desde 2005 pelo jornalista Luiz Carlos Azenha, que já passou por diversos veículos de comunicação, inclusive a Rede Globo, publica informações diariamente sobre a política brasileira e do mundo. Sempre mantendo seu espírito crítico, é também alvo de ação judicial, realidade enfrentada por outros jornalistas da blogosfera. Na entrevista ele comenta porque não fechou o blog, como está sustentando seu trabalho na internet, e a necessidade de regulamentação a mídia no Brasil. Repórter da TV Record desde outubro de 2008, Azenha considera seu blog um espaço dos movimentos sociais e de contraponto à mídia tradicional. Seu site chega a 40 mil acessos diários, e no facebook e twitter somados chega a quase 50 mil seguidores. A equipe é formada pela jornalista Conceição Lemos, Leandro Guedes (vendas), a Agência Café Azul e Kauê Linden, da Hostnet (tecnologia), mas conta com centenas de ajudantes informais, que sugerem ou escrevem textos e divulgam a produção nas redes sociais.
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Ilustração: Carlos Latuff
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Qual a sua situação atual com a justiça, após as ações que foram movidas contra você, e como está o funcionamento do seu blog? A única ação em andamento é a que foi movida pelo atual diretor de Jornalismo da TV Globo, Ali Kamel. Ele argumentou que foi citado várias vezes em meu blog de forma crítica, o que seria parte de uma campanha de difamação. Replicamos que se trata de figura pública, já que além de dirigir o Jornalismo da emissora Kamel nunca evitou debates públicos, com artigos publicados em O Globo e livros como Não Somos Racistas. Ele argumentou que não tem tanto poder assim na Globo, o que rejeito completamente, já que trabalhei subordinado a ele e sei quanto ele manda, diretamente ou através de prepostos. Finalmente, ele teria sido citado como ator de pornochanchada, já que nos créditos do filme Solar das Taras Proibidas, disponível nas redes sociais, consta o crédito de um ator chamado Ali Kamel. Rebatemos lembrando que a única citação assinada por mim foi para dizer que se tratava de um homônimo e que este homônimo poderia se sentir ofendido se comparado ao diretor da Globo. A título de explicar o absurdo deste último ponto – que foi a base para a condenação do blogueiro Rodrigo Vianna – conto sempre o seguinte caso: quando o chefe do tráfico na Rocinha, Nem, foi preso, descobri que o advogado dele se chamava Luiz Carlos Cavalcante Azenha.
Os processos são uma forma de atacar nossa credibilidade, de tentar nos calar e de intimidar outros blogueiros”
A Record o entrevistou e colocou na TV o crédito Luiz Carlos Azenha, advogado do traficante Nem. Por conta disso, muitas piadas foram feitas a meu respeito nas redes sociais. Era só o que faltava eu processar quem fez piadas a respeito! Da mesma forma, Kamel processou outro colega, o blogueiro Marco Aurélio Mello, por causa de uma peça de ficção. Depois de processar uma piada e uma peça de ficção, só falta o Kamel processar os irmãos Grimm por se identificar com personagens deles! Fui condenado em primeira instância, mas recorremos e vamos levar ao STF, se for o caso. Atribuo os processos a uma tentativa de judicializar a política, já que eu e outros processados estivemos na linha de frente das denúncias de manipulação do noticiário da Globo – e temos credibilidade para fazê-lo porque todos vimos o processo por dentro, na campanha eleitoral de 2006. Os processos são uma forma de atacar nossa credibilidade, tentar nos calar e de intimidar outros blogueiros para que não reproduzam nossas denúncias sobre a emissora. Porém, é importante lembrar que o que testemunhamos também foi testemunhado por muitos outros colegas da Globo, alguns dos quais muito em breve talvez falem a respeito.
Partindo da sua experiência em relação às ações judiciais sofridas por seu blog, como você vê a atividade da mídia alternativa na internet?
Presumo que as ações, dezenas delas, movidas em todo o Brasil contra blogueiros, demonstram que as redes sociais têm capacidade e ameaçam os monopólios da comunicação, sejam locais, regionais ou nacionais. Refletem a incapacidade da elite brasileira de aceitar o contraditório, e a insatisfação dos leitores, ouvintes e telespectadores, cansados do discurso repetitivo da grande mídia, que criminaliza os movimentos sociais, detona a Política e prega a destruição do Estado. Existe um fosso entre o discurso milenarista da mídia em relação a governos trabalhistas – “fim do mundo”, “comunismo”, “mar de lama”, “república sindicalista” – e a melhoria real na vida das pessoas. É neste descompasso que crescem os blogs que oferecem informação alternativa. Na campanha de 2010 fomos taxados de “blogs sujos” por um dos candidatos. A mídia embarcou nessa. E passou a nos atacar como “patrocinados pelo governo”, “blogs chapa branca” ou “blogs petistas”. No entanto, quando se abriram as contas do patrocínio oficial descobriu-se que... a Globo, só a emissora de TV, sem contar as emissoras a cabo da Globo, abocanha 43% das verbas oficiais; os portais ficam com a maior parte do patrocínio na internet. Blogs como o meu não aceitam patrocínio de empresas públicas, estatais ou governos em qualquer esfera. Já pensaram se a Globo, a Veja, a Folha
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FAZENDO
MEDIA
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Regulamentar não é censurar (...) É dotar a sociedade de meios para evitar a concentração do poder midiático na mão de poucos
e o Estado fizessem o mesmo? Quanto o contribuinte brasileiro não economizaria? É importante lembrar que o senador Roberto Requião, quando governador do Paraná, cortou todas as verbas publicitárias. Economizou um bocado de dinheiro e o mundo não acabou. Advogo que outros governos façam o mesmo.
Em sua carta de despedida do blog cita as dificuldades financeiras. Quais seriam as soluções nesse sentido para criação de mídias independentes? O blog continua funcionando, depois que a reação dos internautas me fez voltar atrás. Decidimos implantar o crowdfunding, um esquema pelo qual os leitores financiam a produção de conteúdo próprio. Desde o primeiro encontro nacional de blogueiros eu defendo que a gente desenvolva produção própria de conteúdo, que nos livre da reprodução de notícias dos grandes meios, ao mesmo tempo nos livrando da pauta formulada nas grandes redações. Mas, para isso, precisamos de dinheiro. Jornalismo custa caro. Nossa solução foi recorrer aos leitores. As doações não cobrem todos os custos, mas pelo menos permitem que a gente mantenha o blog funcionando, arcando com os custos de advogados e outros enquanto buscamos as soluções de financiamento de longo prazo. Acreditamos que há espaço para outras iniciativas, como fundações público-privadas que financiem o jornalismo investigativo ou cooperativas de jornalistas. Acho que a gente vai encontrar soluções fazendo.
Você e um grupo de jornalistas mais críticos têm participado de diversos movimentos, como o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. Quais são as reivindicações do movimento, inclusive no campo das políticas públicas para o setor? São muito amplas e cada jornalista ou blogueiro tem seu próprio elenco de prioridades. Eu diria que me empenho especialmente pelo Direito de Resposta e pela Lei de Iniciativa Popular, que busca recolher 1,5 milhão de assinaturas para um projeto de regulamentação dos meios eletrônicos.
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Por quê? O Direito de Resposta, extinto quando se derrubou a Lei de Imprensa, é uma forma de inibir os assassinatos de caráter que a mídia usa contra dissidentes. A inexistência do Direito de Resposta é essencial para a mídia manter intacto seu poder de coação e de extorsão em relação a anunciantes, governos, partidos, políticos e autoridades em geral. Quem sai da linha é submetido ao assassinato de caráter. De outra parte, até a ONG conservadora Repórteres Sem Fronteira já diz que o Brasil é o país dos 30 Berlusconis, onde uma única emissora de TV – sem contar suas emissoras na TV fechada – abocanha 43% de todas as verbas do governo federal. Uma enormidade! Por que regular? Porque os meios eletrônicos são concessões públicas, pertencem ao povo brasileiro, não aos concessionários. Se regulamos a energia elétrica, o gás e o serviço de telefonia, por que não regular a comunicação? É preciso ter regras sobre a renovação de concessões, por exemplo, sobre a propriedade de emissoras de rádio e TV por membros do Congresso e sobre punições para quem desrespeitar as regras. No Reino Unido, uma democracia, o Ofcom desempenha este papel desde o início dos anos 2000, inclusive debatendo os conteúdos disseminados por emissoras de rádio e TV. Censura? Os britânicos acreditam que não e não é, já que
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os casos de manipulação ou de infração dos códigos de conduta só são considerados depois que o conteúdo foi ao ar. Exemplo? Se uma emissora viola a lei para fazer uma reportagem, ela fica sujeita a receber sanções. Não deveria ser assim? A mídia deveria ficar acima da lei? Os britânicos acham que não. Mais que isso, agora, depois do escândalo causado pelo jornalismo de Rupert Murdoch, o barão da mídia cujos subordinados violaram o sigilo telefônico de fontes, os britânicos debatem a criação de um órgão independente que tenha poder de sancionar conteúdo impresso! Não estamos falando disso, ainda, no Brasil, mas na regulamentação de emissoras de rádio e TV, que são concessões públicas, nos pertencem e devem satisfação, sim, à sociedade.
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Nos fale sobre sua passagem pela Globo e a pressão exercida por ela depois no seu trabalho jornalístico? Tudo o que posso dizer é que, na Record, embora do pontode-vista de hierarquia eu esteja no mesmo patamar da Globo, ou seja, de um simples repórter, posso opinar muito mais sobre minhas reportagens e definir o ângulo delas, a pauta e o próprio texto com uma liberdade que nunca tive na Globo. Na Record, por exemplo, escrevo o texto e, a não ser pelas críticas normais de uma redação, feitas por colegas – o produtor ou editor que trabalham comigo naquela tarefa –, não preciso submetê-lo à censura prévia. Na Globo, até mesmo aquelas entradas ao vivo, nas quais você imagina que o repórter está improvisando, são précombinadas nos mínimos detalhes com a hierarquia da emissora. Na cobertura política, então...
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io
minas gerais
Dandara
resiste!
Referência nacional na luta por moradia, comunidade terá sua história registrada em documentário.
Por Ana Malaco Esse ano a comunidade Dandara comemora seus 4 anos de (r)existência. Em homenagem a essa luta a ocupação recebeu, durante uma intensa semana de filmagens, o diretor argentino Carlos Pronzato. A convite das Brigadas Populares, organização política que trabalha na auto-organização da Dandara, Pronzato e sua equipe mergulharam nas ruas e nas casas da comunidade em busca de depoimentos e memórias que tecessem a história do local. A ocupação foi batizada com o nome da guerreira Dandara, símbolo da resistência negra e feminina no país. Com cerca de 6 mil moradores a comunidade está localizada na região da Pampulha, área de amplo interesse do mercado imobiliário, conhecida pelo conjunto arquitetônico
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projetado por Oscar Niemeyer e por abrigar o Mineirão, estádio que será sede de jogos da Copa de 2014. Para Wagna Vieira Lima, moradora que vivencia e constrói a história de luta da comunidade desde o princípio (em abril de 2009), o documentário será muito importante para o reconhecimento da luta dos moradores. Através da divulgação desse trabalho “a comunidade e o cotidiano do povo que quer simplesmente o direito de morar e se organizar por outro projeto de sociedade ganhará visibilidade”, afirma.
Uma semana de muito trabalho Foram 30 entrevistados, entre moradores e militantes populares. Com recursos básicos das Brigadas Populares e deles próprios, a equi-
pe: Cristiane Rabelo, Carlos Pronzato, Fabiana Leite, Xeno Veloso, Richardson Pontone e moradores que acompanharam o processo, seja na filmagem, fotografia ou emprestando sua casa como QG, fizeram um trabalho pesado para retratar os 4 anos de luta. O documentário abordará desde o dia da chegada dos moradores ao espaço, à repressão policial, a questão da identidade da organização da comunidade e o que significa a Dandara para o morador. “Uma luta muito mais ampla que não acaba na moradia, um espaço de organização política e enfrentamento a quem se constitui como governo na sociedade, e que reproduz um modelo que oprime. Diante disso, a Dandara se configura como outra possibilidade de organização popular.” Relata Pronzato.
Vista panorâmica da comunidade Dandara Fotos: Fabiana Leite
Acostumado ao orçamento curto, o diretor é cineasta e militante, há quase 10 anos viaja pela América Latina. Durante esses anos, realizou mais de 30 documentários, todos eles resgatando histórias de movimentos sociais, manifestações e lutas populares ou biografias de lutadores da América Latina. O que mais se aproxima com a narrativa proposta do documentário sobre a Dandara é o Pinheirinho, Tiraram minha casa, tiraram minha vida. Segundo Pronzato, nos relatos dos moradores para o documentário, muitos trouxeram esse paralelo, sobre a forma violenta do despejo vivenciado na
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Os depoimentos são relatos mu ito humanos, não ocupam apenas o espaço geográfico da comunidade, transcendem ess e espaço.”
comunidade de Pinheirinho e o receio que o mesmo aconteça com eles. Além de retratar a história da Dandara, Pronzato acredita que o documentário servirá como exemplo para outras organizações, como um instrumento de luta, para o estudo acadêmico e para militantes sociais que trabalham com temas similares. “Os depoimentos são relatos muito humanos, não ocupam apenas o espaço geográfico da comunidade, transcendem esse espaço”, completa.
O maior inimigo da ocupação, de acordo com Sammer Siman, é a construtora Modelo que reivindica o terreno da comunidade. “Por mais de 20 anos que o possuiu, era inadimplente com o IPTU do lote.” Segundo Sammer o terreno era “abandonado” e usado pra cometer crimes, como estupros, desova de cadáveres, assaltos e uso de drogas. Hoje a região tem um índice de violência expressivamente menor que nas Brigadas Populares é uma organização política com represendemais comunidades que não tiveram suas tação nacional, atuando em quatro frentes em Minas Gerais: ocupações organizadas.
As Brigadas Populares
Frente da Juventude, que trabalha com a auto-organização dos jovens. Na Dandara, tem projetos para construção de um cursinho pré-vestibular e cursos de produção audiovisual, além da realização de festas para aprofundar a relação do jovem com a localidade; a Frente Pela Reforma Urbana tem a atuação mais direta, realizando ocupações, debates sobre a questão da cidade e de conquistas que vão pra além da regularização de área, como o bem estar dos moradores; a Frente de Mulheres busca valorizar o protagonismo das mulheres. Atualmente a Frente trabalha com a construção da creche na comunidade; a Frente Antiprisional, que trabalha com as pessoas que estão em privação da liberdade e seus familiares na comunidade.
A região é um espaço de valorização crescente e o capital imobiliário se articula com os poderes políticos. “Você tem uma correlação na câmara dos vereadores completamente desfavorável às causas da comunidade e um prefeito que é surdo às causas. E que teria uma vontade de liderar uma ação organizada para a desocupação, mas que sabe que isso seria um preço político muito alto.” Compara Sammer com a perda política vivida na desocupação de Pinheirinho, em São José dos Campos.
>> Confira o ensaio fotográfico de Fabiana Leite na Comunidade Dandara a seguir >> Vírus Planetário - maio 2013
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ensaio fotogrรกfico
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Por Chico Motta
*Improvável, mas não impossível. Reportagem por Jailson Bolsonazi
Jesus Cristo assume autoria do assassinato do traficante Matemático Após um debate intenso na sociedade, Jesus Cristo desceu dos céus nesta terça-feira para colocar um ponto final na discussão sobre a operação da polícia do Rio de Janeiro que alvejou de balas executando friamente o traficante Matemático bem como as casas de diversos moradores da região.
Jesus Cristo pego em flagrante, segundo reconstituição feita pela empresa de vídeo de Marco Feliciano
Em conferência à imprensa nacional, convocada pelo pastor Marco Feliciano, Jesus afirmou que apesar dos diversos disparos feitos, apesar de ter colocado em risco a vida de centenas de moradores da favela da Coreia, o único atingido foi o traficante, e que você não estaria defendendo bandido se sua irmã tivesse sido estuprada por ele. “Essas balas “Essas balas foram guiadas foram guiadas por Deus, quando apertava por Deus, quano gatilho estava fazendo a do apertava o gatilho estava vontade dele, afinal todos fazendo a vonsabemos que a matemática é tade dele, afinal uma ciência do demônio” todos sabemos que a matemática é uma ciência do demônio” afirmou o homem de Nazaré. Após a confissão bombástica o Ministério Público do Estado Rio de Janeiro imediatamente abriu novo inquérito contra Jesus, que também está sendo investigado pelas mortes de John Lenon e dos Mamonas Assassinas. “Ninguém zomba de Deus e sobrevive” ressaltou o Cristo, enquanto seus advogados informavam a imprensa que colocariam as mortes na conta do Papa.
No Vaticano, o Papa Francisco negou ter qualquer ligação com esse Jesus. “Não é esse o Cristo em que acreditamos, ele não me representa”, Ratzinger que passava pelo local, pareceu não muito feliz com a afirmação. Após as declarações Marco Feliciano e Jair Bol-
sonaro acusaram o Papa de Cristofobia e prometem levá-lo ao tribunal de Haia por seus crimes contra a humanidade.
*ATENÇÃO: Essa seção é fictícia. Não levem a mensagem a sério.
passatempos virais Ligue os pastores evangÊlicos a suas respectivas acusaçþes
via facebook.com/emnomedotroll
traço livre
Por Aroeira | Créditos: Aroeira - jornal O Dia
Por Andrício de Souza | Veja mais em www.andriciodesouza.com | Fonte: facebook.com/MariaNanquim
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Educação Estadual
na luta!
Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio de Janeiro
Educação estadual vai realizar paralisação no dia da votação de reajuste na Alerj A rede estadual do Rio vai paralisar as atividades no dia da votação na Assembleia Legislativa do projeto de lei do governador Sergio Cabral, que propõe um reajuste salarial de 7% para a educação. O projeto será votado em maio. O Sepe orienta a categoria para que fique atenta à convocação do sindicato sobre a futura data da votação. Os professores e funcionários administrativos continuam em estado de greve.
estadual se reuniram na Hebraica, em Profissionais de educação da rede | Foto: Samuel Tosta/Sepe maio Laranjeiras, no dia 8 de
O Sepe apresentará emendas ao PL do governador, com o objetivo de adequar o projeto às principais reivindicações da educação. A categoria não aceita o reajuste de 7% proposto por Cabral. Este índice não recompõe as perdas salariais dos últimos anos e está muito abaixo do que os profissionais de educação reivindicam: piso salarial de cinco salários mínimos para o professor e 3,5 salários mínimos para funcionários. Apenas nos mandatos de Cabral, as perdas da educação ficaram acima de 20% (IPCA). Outro problema é que o piso salarial do professor é muito baixo: R$ 1.001,82 (cargo: professor docente 1 de 16 horas). Com este salário inicial, um reajuste de 7% será irrisório. A pesquisa feita pelo Sepe no Diário Oficial do estado confirma que, de janeiro a abril, 308 professores pediram exoneração – média de duas exonerações por dia. Os baixos salários e as más condições de trabalho são os causadores dessa verdadeira sangria.
>>Escolas municipais do Rio de Janeiro paralisam atividades dia 22 de maio Os profissionais das escolas municipais do Rio de Janeiro vão paralisar as atividades no dia 22 de maio. A categoria realiza no mesmo dia um ato na prefeitura, às 11h, e assembleia, às 14h, no Clube Municipal (Rua Haddock Lobo, nº 359, na Tijuca). No dia 18 de abril, a categoria realizou uma paralisação de 24 horas, com um ato em frente à prefeitura e assembleia no Instituto de Educação (foto de Rafael Gonzaga). Veja as principais reivindicações da rede municipal: 1) Reajuste salarial: 5 salários mínimos para professor e 3,5 salários para funcionários; 2) Plano de Carreira Unificado, com valorização pelo tempo de serviço e formação; 3) Fim dos projetos e da meritocracia. Em defesa da autonomia pedagógica.
Plebiscito da rede municipal foi prorrogado!! O Plebiscito para avaliação da política educacional do governo municipal foi prorrogado até 22 de maio. A enquete, iniciada em abril, foi prorrogada devido a uma série de tentativas da SME de impedir a realização da consulta nas escolas, iniciada em abril. O Sepe mantém em seu site (www.seperj.org.br) o link eletrônico para que a categoria possa participar da votação pela internet e dizer o que acha da política educacional do prefeito Eduardo Paes e da secretária de Educação Cláudia Costin.
www.seperj.org.br
10% DO PIB PARA A EDUCAÇÃO PÚBLICA JÁ! Andes-SN
Central Sindical e Popular - Conlutas