Caderno da Homenageada - Bernadette Lyra - 26º Festival de Cinema de Vitória

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Ministério da Cidadania ArcelorMittal apresentam:

CADERNO DO FESTIVAL DE CINEMA DE VITÓRIA

Bernadette Lyra HOMENAGEADA CAPIXABA 9ª EDIÇÃO


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Bernadette Lyra


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Pode ser um gesto, um olhar de relance, um modo de alguém passar a mão nos cabelos, uma cena assistida em um filme ou uma lembrança súbita e inesperada que fere a memória.


Bernadette Lyra nasceu em Conceição da Barra e se orgulha de ter suas raízes na “areia clara e fina”, se orgulha da Cabula e de seu Tatá do vento. A escritora, pesquisadora e educadora tem pós-doutorado em Sorbonne e derrama sua gratidão à Universidade Federal do Espírito Santo por ter sido a base de sua carreira acadêmica. A valorização da educação é um dever social, e urgente. É preciso homenagear uma mulher que dedica sua vida à academia e à literatura. É importante homenagear uma mulher que desbravou, em tempos obscuros, o caminho das mulheres pesquisadoras. Esse caminho que Bernadette traçou, levou consigo várias mulheres que produzem e realizam o audiovisual brasileiro. Suas pesquisas sobre cinema como arte, análise fílmica e cinema e comunicação são referências para estudiosos em todo o território nacional. Seus estudos em comunicação reacendem o interesse público pelos seus temas. Bernadette cunhou o termo Cinema de Bordas, que hoje é denominação para um tipo de cinema periférico com narrativas e estéticas específicas. Sua mais recente pesquisa investiga o cinema Queer. Em 2018, recebeu da Socine, o prêmio de Pesquisadora do Ano. No meio literário tem reconhecimento internacional. Bernadette também ocupa a cadeira número 1 na Academia Espirito-santense de Letras, e seu livro Memórias das Ruínas de Creta foi indicado ao Prêmio Jabuti, o mais importante prêmio literário do Brasil. Várias instituições do país prestaram homenagens à maravilhosa Bernadette Lyra porque é uma homenagem mais que necessária. Mas para nós, homenagear Bernadette é retribuir com amor o amor que ela sempre dedicou e dedica ao Festival de Cinema de Vitória. Viva Bernadette Lyra! Lucia Caus Diretora do 26º Festival de Cinema de Vitória

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Cadernos de Cinema Bernadette Lyra Em conversa com Lucia Caus, diretora do Festival de Cinema de Vitória, em busca de nome para receber a homenagem deste ano, eis que salta da manga, vindo diretamente do meio do peito, das bordas do coração: Bernadette Lyra. Nossos olhos brilharam juntos: era ela e pronto. Bernadette é dessas mulheres que ocupam todas as pontas de uma estrela e brilha em cada uma delas. Não se olha para a escritora sem que recebamos de volta fachos de luz como aqueles com que, ainda menina, no Cine Glória, na década de 50, ela se encantava assistindo aos clássicos de Hollywood. A escolha do seu nome passa pela importância da sua presença na cultura capixaba, essa senhora, frágil, mas resistente, todos os livros que publicou, os prêmios, honrarias e títulos acadêmicos, as aulas de literatura e cinema que deram suporte intelectual e emocional para tantas gerações. O olhar de Bernadette ao sorrir é um filete com toques orientais, e naquela linha minúscula, deixando quase que só os cílios à mostra, concentra a imensidão do seu amor pelas pessoas, coisas, lugares. Conversar com ela é como sair por mundos longínquos, cafundós perdidos por estradas e ruas sem saída. E não é preciso que se ache a trilha para o escape, porque queremos mesmo nos perder no meio das suas palavras, navegar sem rumo pelos mares por onde ela nos leva. Escrever sobre Bernadette Lyra é brincar nas cinco pontas da estrela. Tenho com ela o mínimo convívio, mas é como se a nossa história houvesse andado em par por vidas outras. Afinidade. Bem-querer. Amor resume. Tê-la como homenageada no 26º Festival de Cinema de Vitória é honraria para todos nós, porque ela nos representa, do alto dos seus 80 anos (eu sempre acho que são 18), como a lua do Fernando Pessoa, que “em todo lago brilha, porque alta vive”. 6

No meu livro “A Palavra que Apalavra”, eu a descrevo depois de uma palestra sobre o romance A Capitoa: “diante da plateia, a mulher com raízes tão fortemente fincadas no seu terreiro, a mulher de tambores no peito, chorou. Bernadette Lyra nos ajuda a cultivar faíscas, acende em nós o que poderia se apagar; impulsiona, a quem nela tocar, a sair da epiderme para o coração da vida, para matéria do sonho”. “Eu sou desdobrável em muitas Bernadettes, que convivem muito bem entre si”, ela diz, e se esquiva de autodefinições, citando Samuel Beckett: “devo falar agora de mim, isso seria um passo na direção do silêncio”. Mesmo no breve intervalo do seu silêncio, abriremos aspas neste Caderno para as suas palavras.

A Barra “Tudo o que sou eu devo à Conceição da Barra”, a fala é recorrente em Bernadette Lyra. A lembrança dos pés na areia da praia e a lama até os joelhos


são marcos de fundação do que viria a ser a grande mulher e intelectual. Ali, nas idas e vindas das ondas e no murmúrio do rio Cricaré, que ficava em frente ao jardim de jacintos da casa dos pais, seu Álvaro e dona Dora, Bernadette desabrochava em sensibilidade e com olhos livres para as coisas do mundo. Sem pretensões futuras, fincava as vigas da sua extensa obra. Naquela paisagem, podia-se pressentir o ritmo da escritora, a inauguração da têmpera artística. “Minha terra, minha terra, já navegavas em meu sangue antes deles. Enraizadas, as raízes do meu corpo, lastraram por tua areia clara e fina de cristal. Tua areia praiana, onde meus pés aprenderam, no começo, a caminhada que por mais que eu caminhasse por terras de estranhas gentes meu passo, de forma tal, suspira pelo teu chão”. (Canção do Amor à Minha Terra, em Água Salobra) A natureza da Barra foi sua régua e compasso. O vento e o céu lhe deram fúria e leveza, o mar trazia o tempero de sargaço e sal das suas palavras, e o rio, as ondulações mansas a esconder sob as águas barrentas os redemoinhos por onde mergulhariam seus personagens. Mulheres fortes, homens vivazes ou entristecidos, tias afetuosas, crianças sem freios atrás do ineditismo da vida. Um tanto da escritora distribuído no arco das personagens. “Minha obra é quase autobiográfica, mistura de ficção e realidade, não sei onde começa e termina uma coisa e outra. Eu estou minimamente interessada na realidade, porque não acredito nessa história de que literatura tem a ver com realidade”. Alfabetizada aos cinco anos, Bernadette começa a escrever aos sete. O avô Manuel Cunha foi quem lhe abriu as janelas do conhecimento e serviu para a menina os pratos em que ela saboreou as primeiras letras. Seu Cunha era um mulato autodidata, neto de ex-escrava, que sabia ler em espanhol e francês e deixava a menina folheando A Cigarra, revista que tinha Monteiro Lobato e Oswald Andrade entre seus colaboradores. Ela juntava letras em revistas e livros, e ia desfolhando o bem-me-quer das palavras: “rosas em la calle”, lembra da leitura em espanhol nos livros da estante do avô, “eu não sabia o que era, mas juntava vogais e consoantes e ia aprendendo aos poucos”. O avô, segundo a neta, se dizia um pobre quitandeiro. Veio do sertão de Itaúnas, ainda criança, órfão aos doze anos, enrolando cigarros de palha como meio de ganhar a vida. “Mas, na verdade, era dessas raras criaturas a quem os deuses concederam o dom extraordinário da sabedoria. Às próprias custas, acabou versado em literatura, línguas e entendimentos tais da natureza que ninguém saía imune de uma conversa com ele ao pé do lampião”.

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Aos sete anos, escreveu “Z”, peça em que todas as personagens femininas tinham nomes começados por Z: Zuleica, Zenaide... Ela conta na crônica “Essa coisa tão estranha”: “não sei que fim levou aquela obra primeira. Dou graças aos deuses que ninguém se lembrou de guardá-la. Creio mesmo que meu pai a queimou, junto aos cupins que uma vez descobriu roendo a prateleira onde se amontoavam velhas revistas e jornais. Mas o fato é que, depois dela, eu desandei a inventar mais histórias e a literatura nunca mais deixou de ser o sal que dá gosto a minha vida”. O chão da venda do avô servia de esteio para as leituras de Bernadette, enquanto as outras crianças brincavam. “Eu era a menina esquisita que só ficava lendo e juntava-se a isso o fato de eu ser ruiva, zombavam de mim horrores, sofria bullying”. Hoje ela conta de forma jocosa: “ainda sou ruiva de maneira indiscreta em algumas partes”.

Da Cabula ao Convento A Cabula era a religião da Barra trazida pelos bantos, e é equivalente ao candomblé. A diferença é que no lugar do orixá tem o tatá, o tatá do mar, do vento, protetores espirituais. “Eu tenho meu tatá, que, curiosamente, equivale a minha Iansã, a senhora dos ventos e das tempestades. Naquela época, os padres desancavam os cultos afro-brasileiros, e a cabula, muito perseguida pela polícia, foi completamente dizimada. Uma religião linda”.

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Quando o seu Álvaro Lyra sonhou com novos ares para a menina, o tradicional Colégio do Carmo, em Vitória, foi a escolha do pai. O tom de uma despedida está na ficção, no conto Letícia, do livro “A vida secreta das enceradeiras”: “Tanto mais eu chorava, mais meu pai, teso ao lado, resguardava as palavras. Chorei meio espantada dessa vontade dele ter filha instruída, falando línguas estranhas, que me arrancou dos braços de nhá Vitória, de minha mãe que rezava e rezava para o senhor seu marido desistir de tal ideia. A irmã me recebeu: que gracinha! Depois me carregou até a capela onde anjos cacheados despencavam do teto. Achei tudo bonito, achei tudo tão claro. Mas comigo estavam minhas dores, coração apertado sangrando. Ficaram”. O confinamento no internato, aos 12 anos, foi angustiante no início para quem carregava a liberdade como lanterna pelas trilhas da Barra. O rio Cricaré, o mar e o céu da sua terra tinham ficado para trás, pelo menos na visão, porque a força dos elementais permanecia nas sensações e lembranças. Com o tempo, as coisas se normalizaram, sobretudo pelas amigas que conquistou, mais o incentivo de algumas freiras do colégio. “Eu aprendi muito o sentido do misticismo, sempre fui encantada por rituais místicos. Na capelinha tinha uma santa e das suas mãos saía uma luz azul com raios nas mãos. Eu achava linda aquela imagem. E no convento do Carmo, tinha uma gruta com a santa com meu nome”. A identificação foi imediata com a santa Bernadete e com algumas colegas de internato: “ali encontrei a minha turma, eram meninas tão esquisitas quanto eu”.


No escurinho do cinema Mais uma vez, seu Cunha, o avô, influenciaria Bernadette na paixão pela Sétima Arte. Ele montou um cinema na Barra, num galpão alugado. E sem estrada, sem nada, os filmes chegavam da Bahia de navio pelo rio Cricaré, porque na época todo o comércio da Barra era feito com a Bahia. “Ele comprou um filme, ‘Máscaras Brancas’, que, quando o navio não podia entrar por causa do vento sul, meu avô repetia e mudava o título para chamar o público: ‘Máscaras Negras’. E todo mundo ia ver de novo como se fosse a primeira vez”. Bem pequena, com 3 ou 4 anos, a menina ia no colo da mãe Dora, das tias, figuras sempre muito presentes na sua vida e obra. “A lembrança do cineminha com bancos de madeira, as imagens se movendo eram o máximo para mim. Eu tenho ainda a lente, hoje quebrada, do refletor do cinema do meu avô, presente da tia Glorinha”. Quando a menina do internato entrava na sala do Cine Glória, onde ela é homenageada agora, seu mundo de restrições no colégio abria as portas para a imaginação. Nas matinês de domingo, o facho de luz do refletor dando vida à tela e diante dos olhos de descoberta, o ineditismo aflorando em tudo que via e vivia, a menina Bernadette bordava por dentro o encanto com os dramas, faroestes, comédias e musicais, os filmes a que assistia. O bordado não perderia a mão nos anos futuros. O cinema foi o espelho de Alice por onde ela atravessava para outra dimensão. Quando Alan Ladd, astro dos anos 1940 e 1950, ocupava a tela sobre seu cavalo em “Os brutos também amam”, seu personagem, Shane, misturado à própria persona do ator, deixava o coração da mocinha remexido de emoções, “explodindo em diamantes”. A flor do sexo desabrochava à visão do moço loiro de pele ensolarada. O cavaleiro solitário, sem par, e ela na plateia sonhando com o moço baixinho (Ladd tinha 1,68m) sob as lentes de aumento do Cinemascope, a nova tecnologia de filmagem que surgia em 1953. Nunca houve uma mulher como Gilda... e como Bernadette. Os cabelos ruivos da menina da Barra espelharam-se nos de Rita Hayworth quando ela assistiu pela primeira vez ao clássico Gilda, de 1946. Diante das imagens em preto e branco, sua imaginação era cartela de cores. A famosa cena em que Gilda/Rita canta “Put the Blame on Mame” e retira as luvas, jogando-a para a plateia, pode ter sido a primeira aula de sedução que a menina presenciou. O striptease das luvas, sem nudez, era motivo de brincadeira improvisada entre as colegas do internato. No Colégio do Carmo, ela tinha seu fã-clube. As amigas se juntavam para ouvir as histórias que Bernadette inventava, e ali a influência do cinema entrava nas brincadeiras. Quantas cenas de filmes, quantas Gildas ela não reinterpretaria ao seu modo para as colegas? O talento emergia, era provavelmente o sentimento daquela plateia do colégio. A menina era “sacudida e movimentosa”, dizia a tia Glorinha, com quem foi morar depois de quatro anos de internato.

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Bernadette e sua paixão pelo cinema estavam seladas para sempre nas matinês do Cine Glória. A memória afetiva avivada pela fumaça mágica da infância, o tempo dos filmes que o avô apresentava no galpão da Barra e agora o encantamento da menina com a sofisticação da imagem, a tela amplificada de sonhos, os bancos de madeira substituídos pelas cadeiras com encosto. Na inauguração do cine São Luiz, em 3 de maio de 1951, ela veste a saia mais rodada, com duas anáguas por baixo, escolhe o suéter cor de jambo para combinar com o sapato boneca e as meias soquetes. Com figurino elegante, a mocinha parte toda serelepe para assistir “Aviso aos Navegantes”, com Anselmo Duarte, Oscarito e Grande Otelo. Ir ao cinema era ritual domingueiro e, depois das sessões, o infalível milk-shake, delicioso modismo entre os estudantes dos anos dourados.

Estrela da literatura A literatura foi a estrela-guia da nossa homenageada desde sempre. Quem a colocou na roda para que seu talento ganhasse mais adeptos foi Guilherme Santos Neves, a quem Bernadette venera. Guilherme lhe disse ao ler seus escritos: “menina, você é uma estrela”. E a estrela foi se firmando na constelação dos grandes da nossa literatura. Da sopa de letrinhas dos livros do avô ao pós-doutorado em cinema pela Sorbonne, na França, sua trajetória inclui 15 livros publicados, com indicação de “Memórias das ruínas de Creta” ao Jabuti, maior prêmio da literatura brasileira. Foi secretária de Estado da Cultura, Capixaba do Ano pelo jornal A Gazeta, eleita por especialistas e leitores, Pesquisadora do Ano pela Sociedade Brasileira de Cinema e Audiovisual, e ocupa a cadeira número 01 da Academia Espírito-santense de Letras.

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“Eu sempre li tantos livros que começar a escrever foi a consequência mais natural. Faz parte da minha aprendizagem do mundo. Assim, digo que escrevo porque preciso aprender as razões de estar viva (…) E, de quebra, sempre deixo um espaço em meus textos para ser preenchido pela imaginação. Pois, algum dia, ao ler uma dessas histórias que escrevo, alguém talvez sinta um estranho arrepio na espinha dorsal (como diz Vladimir Nabokov) e comece a jogar o jogo da leitura com o mesmo delicioso e intenso prazer que eu tenho em escrever os meus livros. Quem sabe?”. (Do livro “Por que você escreve?”) Muitas foram as homenagens e reverências ao seu trabalho, mas Bernadette não perde o ar da menina sestrosa e cheia de vida da Barra. Há nela, no seu sorriso, luminosa espontaneidade que atrai velhos e jovens amigos, todos querendo compartilhar conhecimento e ideias porque ela está sempre à frente. O tempo não é inimigo, ao contrário, a remoça e a joga em constante giro e renovação na roda da vida. Para cada queda, imediata recuperação. Ao fel dos dias, empresta doçura e renega as caixas impostas. Dança na própria caixinha de música, bailarina afeita a suavidades e saltos mortais.


Ditadura: censurada Bernadette Lyra não passou ilesa pela tesoura dos censores da ditadura militar nos anos 1970. No velho DEC, Departamento Estadual de Cultura, alguns poetas capixabas foram escolhidos para publicação de coletânea e, posteriormente, um recital com os poemas selecionados. Mas os artistas não contavam que alguns censores estavam de olho no teor das obras. Ela conta: “Milson Henriques ia ler o meu poema Ômega e, no dia do recital, no Teatro Carlos Gomes, estávamos animadíssimos com o frisson da apresentação. Antes do espetáculo, recebi a notícia de que era esperada na Fafi, onde se instalara o QG da ditadura, e um deles foi imperativo: ‘Sente-se! A senhora é autora disso aqui?’. Eu toda feliz: sim, é meu o poema e vai ter um recital agora. ‘Se disserem isso, a senhora sai de lá presa’. O choque foi muito grande porque, quando não se tem a mínima intenção de atacar, como era o caso, o susto é maior. Eu contra-argumentei: mas já foi publicado. O censor ironizou: ‘ninguém lê, não tem problema’ ”. Os primeiros versos de Ômega: “não, não me peçam canções, porque meus mortos estão mortos e os ratos roeram seus ossos”. O verso censurado viria adiante: “há papoulas vazias nos campos vermelhos”. Papoulas-ópio, campos vermelhos-China, os censores, com sua inteligência enviesada, farejaram erroneamente o comunismo da autora. “Ele usou esse argumento para justificar a censura. No entanto, eu apenas usei a técnica literária de inversão dos adjetivos, o vermelho da papoula com o vazio dos campos.” Mas quem haveria de convencer o esperto censor de que ela dizia a verdade? Bernadette lembra a piada sobre o general João Figueiredo, em 1979, que ameaçou prender quem escrevera os versos “o navio está no mar, e o cavalo nas montanhas”. O último presidente da ditadura militar acreditou ser gozação com seu amor pelos equinos, já que ficou famosa a frase de Figueiredo declarando preferência pelo cheiro de cavalo ao cheiro do povo. Mas o verso do cavalo nas montanhas era do poeta espanhol Federico Garcia Lorca, assassinado no longínquo ano de 1936, vítima da Guerra Civil Espanhola.

A arte do atraso Para quem passou pelas agruras da ditadura, artistas censurados e vidas ceifadas, um tempo em que a arte viveu sob escombros, Bernadette se transporta aos dias de hoje. “Hoje, o que nos resta é fazer o melhor que podemos para que a arte sobreviva, não há outra saída. Estamos sendo massacrados, os artistas demonizados, instituições públicas destroçadas, as privadas demitindo. Quando Chico Buarque recebe o prêmio Camões de Literatura, em Portugal, soa como resposta a quem o joga na lama no Brasil. A opção é a resistência, temos que reconstruir porque a arte é o lugar da resistência”. Nessas circunstâncias, convites não faltam para que ela vá morar fora do Brasil, mas a escritora ainda acredita que a mudança tem de ser feita aqui, e ela

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quer fazer parte da reconstrução. A dor está presente: “É uma tristeza, já chorei várias vezes este ano, muitas. Gente desvairada, mal-intencionada, é uma crueldade. Não consigo entender como o povo brasileiro votou em massa em certas pessoas. Eu não quero desistir do país, não. Mas dói, dói demais (a voz de Bernadette, nesse momento, perde a força, vira uma linha frágil de dolorida emoção). Minha situação é de dor, mas eu tenho esperança, essa fadinha verde que está se afogando. Eu não perco a esperança, a roda dos dias vai girar.” O Festival de Cinema Vitória sempre homenageia atores e diretores. Bernadette é a primeira acadêmica a ser lembrada por seus trabalhos de doutorado e pós-doutorado em cinema, como professora em universidades, os prêmios e títulos, seu envolvimento pioneiro com o Cinema de Bordas e como amante da Sétima Arte. “No meio de todas essas dores, receber essa homenagem é um bálsamo, como foi receber o de Pesquisadora do Ano pela Socine em 2018. Quando Lucia Caus me ligou, eu fiquei assim: eu, porque eu? O que eu fiz para merecer? Fiquei totalmente siderada”. Num momento de desmonte artístico, quando o desprezo por produtores culturais em todas as áreas é alimentado em muitas instâncias oficiais, a homenagem inspira e acelera o ânimo da escritora: “Quando a gente faz 80 anos (ela nasceu em 21 de outubro de 1938) estamos a caminho da morte, e viver isso agora... essas homenagens são pequenos rituais que alegram o coração”.

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Festivais estão colados à Bernadette, seja como realizadora, curadora ou jurada. Entre 1991 e 1993, Vitória foi sede do Festival Nacional de Vídeo, Fenavi. E a terceira edição do Vitória CineVideo, em 1996, contou com a participação atuante da escritora, então Secretária de Estado da Cultura. Ela juntou-se a outros cineastas e a ideia foi dar um cunho latinoamericano ao festival com filmes chilenos, argentinos e de outros países da América do Sul. Vinte e seis anos depois, a idade atual do Festival de Cinema de Vitória, ela volta ao Cine Glória da infância para ser a grande homenageada capixaba. “Então, o coração deles tremeu e a saliva engasgou-se em suas gargantas. Pensaram: oh adorável, oh amada, onde iremos repousar na velhice? Quase sem se dar conta, os lemes curvaram de modo suave. As naus tornaram ao porto, como pássaros d’água que à noite necessitam se refugiar nos rochedos” (“Memórias das ruínas de Creta”, livro finalista do Prêmio Jabuti de Literatura).

Literatura e/é Cinema Em entrevista ao site Outros 300, em 2013, Bernadette revelou que as duas esferas criativas, literatura e cinema, são, para ela, partes indissociáveis, reconhecendo a natureza autônoma de cada uma em sua condição artística. “O cinema é arte da narrativa como a literatura. A técnica e o estilo são outra coisa, porque a escritura é diferente e é o modo particular de quem produz”. O jornalista e crítico de cinema, Amylton de Almeida, considerava cinema-


tográficos os contos e romances da escritora, embora implicasse com sua dissertação de mestrado sobre Julio Bressane, que classificava como um cineasta “descuidado”. Faltou a ele a compreensão de que o desejo de Bernadette naquele trabalho acadêmico foi justamente sair do cultuado padrão do Cinema Novo para desvendar o universo do Cinema Udigrudi (como Glauber ironicamente apelidou as obras de Bressane, Rogério Sganzerla e Ivan Cardoso). Dois estetas gabaritados, Amylton e Glauber, mas ela seguiu na contramão sem se importar com as críticas. Provou estar no caminho certo. Sobre a interseção das expressões artísticas, literatura e cinema, ela cita o livro “A Nave Extraviada” como exemplo de encontros das narrativas: “Nele, tento traçar paralelas (que nunca se encontram no horizonte) sobre a obra do cineasta Júlio Bressane e do escritor Machado de Assis. E penso que o cinema me atrai primordialmente pela fascinante possibilidade que ele tem de representar o movimento, ou seja, de registrar o sopro da vida, em oposição à imobilidade da morte.” Se o cinema acende nela a chama da vida, é na literatura que sente os pés no chão e a pulsação das ideias lhe conferindo baticuns vitais – lembram talvez a energia pulsante do Ticumbi da Barra: “Na literatura é que está o sal de minha existência! Muito mais que ensinar e estudar literatura, eu não posso nem mesmo respirar e nem viver sem ela”. Nos seus livros, as personagens femininas ganham as páginas com poder absoluto, embora a escritora rechace a ideia de uma escrita feminina em contraponto à literatura feita por homens. “Existem escritores tão, mas tão machos que beiram o exagero, soa com estranheza a insistência da fala machista”. As mulheres de Bernadette são atravessadas por cargas de vigor e sagacidade, são infelizes e ardorosas a um só tempo, lidam com as miudezas do cotidiano ou empunham armas para luta. Bernadette é o tipo de escritora que não se considera dona incondicional das suas obras e o que se nota na escritura lyriana é o jogo proposital a conduzir o leitor para ser coautor das aventuras e vivências dos personagens. “Quando o leitor tem acesso à obra já não é mais o que eu produzi e sim o que provoca nele, suas sensações e emoções”. Da mesma forma, o espectador também faz interferências pessoais e emotivas ao ver um filme. “Para mim, ver filme é jogar. O filme joga com o espectador, que recria o próprio filme, o dele. O filme dá uma vida ao espectador, está te recriando, é um encontro tão amoroso, a pele do teu olho roça na película, é quase um orgasmo entre filme e espectador. É inexplicável esse encontro, mesmo que você deteste um filme, o afeto estará lá, porque afeto não é só amor, é raiva também, é desamor”. Em “O jogo dos Filmes” ela ensina: “uma sessão de cinema pode oferecer ao espectador uma oportunidade de divertimento e evasão, enquanto que a sua consciência oscila, ludicamente, entre a realidade cotidiana, suspensa por momentos, e aquela realidade artificial que predomina no filme. O espectador que trapaceia dormindo durante a exibição também pode interromper o jogo, saindo da sala”.

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A crítica literária Leticia Malard define à perfeição a aproximação do livro “A Panelinha de Breu” com a narrativa cinematográfica: “Na transposição do discurso cinematográfico para o literário, Bernadette ilumina seu texto em cores fortes, em takes replicantes e na configuração de personagens que representam pelo menos dois papéis: na ação romanesca propriamente dita e no filme/teatro que vai sendo gradativamente construído dentro do romance. A descrição do trabalho profissional de Jair, o iluminador, espelha o trabalho da escritora com a linguagem: “(...) tinha posto gelatina vermelha com âmbar no aro do ciclorama. Ele usava gelatina amarelo-laranja para as tardes românticas, gelatina azul -prata para as noites de lua. Gelatina vermelha com âmbar nos spots conferiam uma bela atmosfera sangrenta às batalhas. São essas as cores de transparências gelatinosas de ‘A panelinha de Breu’: batalhas sangrentas em tardes de abandono e noites de amor, fragmentos históricos da condição feminina encenados em estórias e experiências de muita dor.”

Cinema de Bordas: Bernadette à margem A inquietude de Bernadette Lyra não se rende ao tempo. Quando as crianças só queriam brincar de bonecas, ela se deleitava na sopa de letrinhas dos livros. Enquanto as mocinhas se distraíam entre agulhas e prendas do lar, lá estava ela, ingresso na mão, para ver os clássicos de Hollywood ou as chanchadas brasileiras. Adulta, quando doutoranda na USP, se só havia lugar nos meios intelectuais para Glauber e o Cinema Novo, optou por trabalhos que desvelassem o cinema marginal de Bressane. 14

Igualmente na contramão Bernadette se postou quando, na Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual, Socine, onde é sócia-fundadora, propôs em um dos encontros a discussão sobre um tipo de cinema feito pelo Brasil afora e desprezado pelos circuitos cult. Um cinema invisível aos olhos dos estudiosos e pesquisadores. O nome nasceu da sua cabeça: Cinema de Bordas. “É um cinema pobre, feito por pessoas sem formação, autodidatas, sem traquejo fílmico e muito simples, diferentemente do cinema marginal feito por intelectuais”, explica. “Eles repetem a ficção que viram na tela, quase sempre filmes de Hollywood, e traduzem ao seu modo, o modo regional. Ali são mostrados os muitos sotaques de um Brasil profundo. É uma espécie de paracinema”. Embora considere Glauber Rocha um gênio, estava cansada de ouvir os participantes das mostras discutindo exaustivamente sobre o diretor de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. “Apresentei na Socine esse tipo de cinema que nem era considerado cinema, de tão pobre que é, e já conhecia alguns cineastas, incluindo seu Manoelzinho, de Mantenópolis, que morreu. Sugeri: vamos


fazer uma mesa sobre esse tipo de filme que ninguém dá a mínima. Eu já tinha feito uma mesa sobre chanchada, que também sempre foi menosprezada pelos “doutos” em cinema, e outra sobre pornochanchada.” A mesa se chamou “Juntando os Cacos, Reciclando os Lixos”, e foi um escândalo. “Era um tal de mitificar Glauber, Buñuel e outros, que falar sobre essa ‘pobreza’ cinematográfica era quase um acinte. Eu saí catando filmes e nem precisou muito, porque os cineastas descobriram que havia alguém interessado naquelas obras, e choveu filme”. A partir daí o Itaú Cultural, em São Paulo, a convidou para fazer curadoria da primeira mostra naquele espaço e foi um sucesso. Durante seis anos atuou como curadora e, um ano após outro, os filmes e o público iam crescendo, as salas lotando. Eles vinham de todos os lugares do Brasil. “E fazem os filmes com uma garra, uma energia que eu chamo de desejo de cinema. Eles não têm técnica, eles copiam e fazem com o que têm, os atores são pessoas do local, vizinhos, amigos, parentes”. Entre esses personagens, o Rambú da Amazônia tem lugar cativo nas mostras. Como o nome sugere, é uma recriação do Rambo de Stallone, aclimatado ao sabor regional, tendo a região amazônica como cenário. O humor advém pelo trash da obra, mas não há intenção dos realizadores em arrancar gargalhadas da plateia. O capixaba Seu Manoelzinho dizia “eu faço filme sério, não faço para as pessoas rirem, mas elas riem, eu adoro”. Na citada entrevista de 2013, ela avalia esse tipo de cinema: “A cinematografia das bordas está perpassada por três ondas. A primeira origina-se em realizadores autodidatas que vêm do uso das primeiras câmeras VHS e que fizeram filmes em torno de histórias e lendas de sua comunidade. A segunda localiza-se na geração que viveu a época dos fanzines e que trocava desenhos, filmes e atividades com temas e imagens comuns à cena underground. A terceira decorre de cinéfilos apaixonados por filmes de gênero antigos e que têm acesso às novíssimas câmeras e processos digitais que permitem que cada um faça seu próprio cinema”. O 26º Festival de Cinema de Vitória terá mostra com filmes de bordeiros, como são chamados os realizadores do Cinema de Bordas. Serão alguns filmes em um dia de exibição. Bons pretextos para ter Bernadette Lyra em dois tempos no Festival: a mostra e a homenagem. E onde estão presentes o seu trabalho, a inteligência e seu ímpeto de vida o tempo nunca se dará por perdido. A crônica “Onde mora o coração” dá indicações afetivas sobre a nossa homenageada: “Peregrina do mundo, ando sempre à cata de não sei qual país encantado a que nunca se chega. Muitas vezes me pego brigando com moinhos de vento, dando uma daquele Cavaleiro da Triste Figura, de que Miguel de Cervantes falou. No entanto sinto que deveria parar com essa correria pelos quatro cantos do planeta; escolher uma pousada amena; deitar a cabeça sem cuidar que no dia seguinte, um avião me espera no aeroporto […]. É dessa

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maneira que eu posso sossegar o desassossego. Quando sonho com tantos dourados verões que passei em Conceição da Barra, a minha flor de areia. Na verdade, é lá que está agarrado, para sempre, o meu coração”.

Trechos de livros:

Memórias das Ruínas de Creta “Onde à terra faltava consistência, ao ar luz e brilho, ao mar fluidez, ali a única verdade era a face da ilha […]. Cavaleiros os mais lindamente luzentes em suas armaduras gravadas com asas de aves e hibiscos e serpentes, selvagens emplumados, sacerdotes que obravam maravilhas... Sangue. Suor. Sussurros. Horas incestuosas em que os homens se ocupariam apenas da embriaguez”. “E havia no centro da ilha uma altíssima rocha e no centro da rocha uma grande caverna que queimava com chamas diversas. Pela diversidade das cores das chamas conhecia-se o tempo se seria frio ou quente, acre ou doce, seco ou úmido, tenro ou duro, temperado ou ardente, e em todas as mais diversas maneiras nas quais o tempo costumava mudar. Enroscada na topografia a ilha navegava a bombordo do nada, enquanto nas suas entranhas os escorpiões se picavam do próprio veneno”.

Tormentos Ocasionais:

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“Os resíduos do tempo se apresentam diante de mim como escoriações maquiadas por tiras de band aid. A escada que subo em direção aos fatos é trôpega, com degraus que vacilam. É verdade que, aqui e ali, sempre alguma coisa mais sólida flutua”. “São sinistras as relações humanas. São sinistras e bastante preciosas. E eu apenas liquido estas laudas como se queimassem as mãos. Não importa. No fim, quando nada, terei tido este consolo. Terei sentido o doce tremor de meus dedos, à medida que as palavras vão deslizando sobre o papel brilhante”.

Jardim das Delícias: “De repente, um anjo negro de calça Lee suada, asas como veludo e o zíper da jaqueta brilhando mais que a luz de mercúrio, vai saltar de sua moto. Com rajadas de metralhadoras vai estraçalhar toda a suavidade desses deuses de plástico”. “O madeireiro Stan vem a trote. Passa investigando a casa, com os olhos trespassando as paredes. O coração do menino é um grilo pequeno. Quer galopar com o madeireiro. Quer voar para ele. Quer pular na garupa do lindo cavalo.


Mas a avó quer que fique (…) O madeireiro passa. Alguma coisa espreita pela fresta dos olhos. Como a asa de um pássaro, roça leve. Toca no coração do menino... há de o tempo chegar. O menino, só, espera”. “Quero Nelma de volta. Quero beijar os bicos dos peitos escurinhos e duros. Nelma, Nelma, Nelminha. Pegou a soda cáustica na área, botou duas colheres num copo. Faz de conta que é água doce. Mas não teve coragem. Arrancou com a pinça as asinhas de uma mariposa. Esmagou a cabeça do inseto entre os dedos. Mato ela – pensou”.

Corações de cristal ou A vida secreta das enceradeiras: “Essa velha maluca – pensava o porteiro. Toda quinta essa mesma comédia. Bota a mesa, se arruma para o chá com as amigas. Nunca veio nenhuma. Ela fica lá dentro, sozinha, trancada. Que será que ela faz com aqueles doces todos depois? Julieta foi ao quarto. Retirou os bobs. Escovou os cabelos. Lá fora o sol esfrangalhava as vidraças. Quando voltou à sala, sentou-se e esperou”. “Naquele reino de anos com chá e bolinhos, quase morrem estatelados contra as paredes do forno. Penetram no leito do feliz matrimônio. Rolam nos cortinados. Dão corridinhas leves por cima do xenil. Avançam pelos braços. Fazem cócegas na sola dos pés. Comem o canto dos olhos. Sugam o sumo da boca. Cravam os dentes nos pulsos. Chupam a força dos seus tornozelos. Porém não vão jamais encontrá-la dormindo. Algum dia, alguém tem de ficar acordado”.

Aqui Começa a Dança: “Tinha um cara vestido de seda rosada levando um cãozinho, uma espécie de poodle muito branco e peludo, debaixo do braço. Ele trocava toques fantásticos de língua com o cão. Alguém veio por trás e afagou os meus seios. Era a tal energia circulante que evaporava moscas no asfalto. Todos riam e choravam e experimentavam tocar-se muito sensualmente. E assim, rindo e chorando e pegando uns nos outros com o máximo de excitação, o que ocorreu depois, de maneira casual, sem maldade, foi inacreditável, foi um orgasmo cósmico, foi – bem, agora passemos aos sanduíches.” “Foi largar o aparelho, a mãe de Ana deu de cara com o tédio. Dessa vez, a mãe de Ana tremia. Contudo, dando um largo bocejo em que os dentes afiados faiscaram feito pequenos diamantes, a tigresa do tédio saltou por cima dela. Foi parar na estante. Sobre a encadernação luxuosa da Bíblia, entre pilhas de bonecas de vários países e uma penca de prata de balangandãs, a tigresa do tédio fitava a mãe de Ana com os olhos amornados de puro fastio”.

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A Panelinha de Breu: “O jovem está só. O vento bole nos cabelos ruivos e, à medida em que subo esfrangalhando os joelhos, o filete róseo da fronte do jovem vai se transformando em um fio de sangue. A mancha sobre a camisa, no peito, se mudando em gangrena de uma ferida já com as bordas horripilantemente arroxeadas. Tento mover os lábios, chamá-lo. É em vão. Estou prisioneiro do horror e do medo”. “Tinha eu doze anos. Já peitinhos brotavam, botõezinhos de carne, pequenos e duros, doídos, roçando a camisa de fino algodão. A cada lua nova, mornamente, eu sangrava. Na verdade, já podiam-me chamar donzela”.

Ulpiana “A sala de cinema está quase deserta. A garota está sentada no escuro. Sente o cheiro da água de barba no rosto do rapaz. O cheiro da água da barba tem um toque de folhas de capim molhado. Os dedos do rapaz se movem com suavidade, entram pelo decote, sobem e descem, apertam os biquinhos dos seios. As coxas da garota se desmancham como uma geleia. Ela morde o drops de hortelã com força”.

“Eu queria muito não ter de contar. Não foi nada agradável surpreender Luka e Natasha aos abraços e beijos no pequeno sofá! A bandeja que eu trazia espatifou-se no chão. Os sanduíches de hortelã e pepino se espalharam por todo o tapete de sisal. Golpear Natasha com os cacos dos copos de suco gengibre e maçã era o que eu mais desejava naquele momento (…) Eu boiava na maré do ódio como um cadáver nas ondas, com os olhos, a boca, os ouvidos entupidos de algas”. 18

“O marido de dona Tude chegou bêbado em casa, em uma noite em que ela estava debruçada na mesa, escrevendo, e se enfureceu porque nessa de querer escrever ela tinha esquecido de fritar bem o bife e ele não admitia que o bife ficasse cru, gordurento ou que não estivesse no ponto em que ele gostava. Então foi lá, arrancou dona Tude da frente da escrivaninha, tirou da mão dela a caneta, deu-lhe umas lambadas com a fivela do cinto e rasgou uma a uma as páginas que ela estava escrevendo. Depois, fez uma fogueira com a papelada toda, no meio da sala”.

A Capitoa “Aos vinte anos de Luiza, Vasco lhe pôs anel de casamento no dedo. No quarto dedo. Aquele de onde partia uma veia de sangue que ia ao coração. Era um compromisso. Não um ato de amor. Naquela época, o amor não contava. Apenas os loucos e os poetas davam importância ao amor. O amor era um sentimento menor. Bem menor que o medo”.


“Quando entrou na sala dom Miguel de Azeredo, o marido da prima, o coração de Luiza latiu como um cão assustado... À Luiza pareceu que lhe entrava pela porta adentro um anjo guerreiro, todo posto em armas. Uma geleia de diamantes invadiu-lhe os ossos diante dessa visão”. “Confinadas no castelo da popa, as duas criadas fazem o sinal da cruz. A mais nova se agarra a seus santos, a mais velha aperta contra o peito o rosário, ajoelhada junto ao leito de sua senhora que, desde a partida, deitou-se, e assim permanece, assim vai calada, conduzida no seio da nau, com os olhos fechados, as mãos entrelaçadas no peito e o coração levado por cima das águas como um pequeno rochedo sem vida”.

Água Salobra “O sabor dos abricós fica muito mais deleitoso quando vale pelas lembranças. Que, em Russel, são registradas historicamente; em mim, gravadas no imaginário da menina que fui. O tempo dispara, deixa a vida para trás. E escrever pode emaranhar a memória das coisas. Mas escrever também pode vencer a correria do tempo. Por isso, a cada vez que escrevo, sou como os abricós: eu amadureço em qualidade de fruta”. “Afeto talvez seja pouco. Por que não dizer amor? Amor verdadeiro. Amor sem segundas intenções. Amor que nada quer em troca. A não ser a certeza de que basta esse sentimento que carrego como um agradecimento aos deuses por me terem deixado nascer em uma terra geometricamente plana, sem montes ou montanhas, conectada diretamente com o céu de estrelas límpidas no norte capixaba”.

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Não importa se o conto é longo ou curto. Importa que no conto tudo é como um relâmpago. Mas seja conto, novela ou romance, eu corto e reescrevo; corto e reescrevo; corto e reescrevo.


Livros Publicados: As Contas do Conto (1981) O Jardim das Delícias (1983) Coração de Cristal ou A Vida Secreta das Enceradeiras (1984) Aqui Começa a Dança (1985) A Panelinha de Breu (1992) Memórias das Ruínas de Creta (1997 e 2ª ed. 2018) Tormentos Ocasionais (1998) Tradução de Aden, Arábia, de Paul Nizan (1994) A Nave Extraviada (1995) O Parque das Felicidades (2009) A Capitoa (2014) Fotogramas do Brasil: As Chanchadas (2014) Água Salobra (2017) O Jogo dos Filmes (2018) Ulpiana (2019)

Participações em Antologias: Poetas do Espírito Santo – Fundação Cultural do Espírito Santo (1974) Cariocas de todos os contos (1987) As Melhores Contistas do Brasil – Holanda (1991) Um Jato na Contramão – Buñuel no México (1993) Urdiduras de Sigilos – Ensaios sobre o cinema de Almodóvar (1996) Corpo e Sentido – A escuta do sensível (1996) Antologia de Escritoras Capixabas, de Francisco Aurélio Ribeiro (1998) Cinema de Bordas 1 (2006) Cinema de Bordas 2 (2008) Cinema de Bordas 3 (2012) Sem a Loucura não dá – A poesia de Sérgio Sampaio em prosa (2017) Coletânea Escritos de Vitória (1993)

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Perfil Biográfico Possui graduação em Letras Português/Francês, pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), mestrado em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutorado em Artes/Cinema pela Universidade de São Paulo (USP). Tem pós-doutorado na Université René Descartes/Sorbonne/Paris V. Atualmente é Professora Visitante no PPGCom em Comunicação e Territorialidades da Universidade Federal do Espírito Santo. Foi Professora no Departamento de Letras da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Atualmente é Professora Emérita da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Foi professora no Departamento de Cinema da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Criou, estruturou o projeto acadêmico, montou o corpo docente e foi a primeira Coordenadora do PPGCom em Comunicação Audiovisual da Universidade Anhembi Morumbi. Foi Professora no PPGCom da UAM. Foi Professora do PPGCom da Universidade Tuiti do Paraná (UTP). Foi professora do PPGCom da Universidade Paulista (UNIP). Foi Professora Visitante da Universidade do Algarve, Portugal. É sócia-fundadora, foi várias vezes membro do Conselho Deliberativo e, atualmente, é membro do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Cinema e Audiovisual (Socine). Foi Coordenadora do GT Cinema, Fotografia e Vídeo da Associação de Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós).

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É escritora, ocupando a cadeira 1 da Academia Espírito-Santense de Letras. Foi Secretária de Estado da Cultura do Espírito Santo. Recebeu medalha de mérito cultural Rubem Braga, da Secretaria de Cultura do ES e da Assembleia Legislativa do Espírito Santo; medalha de mérito cultural Renato Pacheco, do Instituto Histórico Geográfico do Espirito Santo. Foi escolhida Capixaba do Ano/2014, pelo Conselho de Leitores do jornal A Gazeta, Vitória, ES. Recebeu homenagem de pesquisadora do ano, no XXII Encontro da Socine/2018. Tem experiência na área de Comunicação e de Artes, com ênfase em Cinema, atuando, principalmente, nos seguintes temas: cinema brasileiro, cinema periférico de bordas, cinema queer, análise fílmica, cinema como arte, cinema e comunicação. É autora de “O jogo dos filmes”, Fotogramas do Brasil: as chanchadas”, tem outros livros, capítulos de livros e artigos sobre cinema e audiovisual, publicados no Brasil e no exterior. É escritora várias vezes premiada, autora de livros de ficção (contos, romances), também com publicações no Brasil e no exterior. Foi indicada para o Prêmio Jabuti de Literatura. É cronista de jornais e revistas. É curadora de Mostras de Cinema, tendo organizado e feito a curadoria de seis Mostras de Cinema de Bordas junto ao Instituto Itaú Cultural, São Paulo/ SP. Foi jurada de Mostras e Festivais de Cinema em todo o país, tais como o Festival de Cinema de Tiradentes e Festival de Cinema de Vitória.


• DEPOIMENTOS •

DUAS OU TRÊS COISAS SOBRE NÓS DOIS Utilizei esse trecho como epígrafe para um dos meus livros de poemas. Surrupiado da primeira publicação de Bernadette Lyra: As Contas no Canto (FCAA/ UFES - 1981). Abro aspas. Dois pontos. “Não há nada demais em esconder o anjo morto por debaixo das folhas, as formigas descobrem. O mais prático, porém, é abrir uma cova junto ao pé de abricó, pois assim se evita o inconveniente de que alguém venha vindo varrer folhas secas, ache o anjo já meio roído, se assuste e comece a espalhar que a gente está aqui acabando com os anjos.” E então o vento sul assovia a notícia que já lá se vão mais de trinta anos. De amizade, afetos datados, livros e estórias feitas com gargalhadas e lágrimas. Bernadette é colecionadora de miudezas, quinquilharias, penduricalhos, escolhe com o dedo minguinho a sílaba exata, cata verbo na lata de lixo, colhe a palavra certa que rima com luxo. A memória me traz nosso primeiro encontro na livraria Mandala no centro histórico de Vitória. Noites de autógrafos e vinhos na Livraria da Ilha dentro do furacão de um Shopping. Uma matinê com Woody Allen & Amylton de Almeida no Cine Paz da Avenida Princesa Izabel. E muitos - tantos - livros: nossos amantes comuns. Livros sobre asas esquecidas no caminho. E querubins pousados no Penedo da Avenida Beira-Mar. Espiando o tempo que escorre em nossas mãos: dadas. Sérgio Blank escritor “Conheci Bernadette Lyra, quando entrei como professor na Ufes, em 1982, mas desde quando estava em Cachoeiro já ouvira falar dela como escritora e professora da Ufes, antenadíssima com os novos tempos. Acompanhei sua produção literária desde a publicação de “As Contas no Canto” e “o Jardim das Delícias”, na década de 1980.Naquela época, tínhamos um amigo em comum, o professor e jornalista José Arthur Bogea, o primeiro grande especialista de sua obra. Ele me levou a ler profundezas no texto de Bernadette e juntos percorremos cidades do Espírito Santo, falando para jovens leitores sobre a obra de Bernadette indicada para o Vest-Ufes, como “A Panelinha de Breu”, que tanta polêmica causou. Ainda na década de 1980, escrevi minha tese de doutoramento, “A modernidade das letras capixabas”, e um capítulo foi dedicado à voz da mulher, a escrita de Bernadette Lyra. Naquele tempo, os estudos literários descobriram as alteridades e minha tese já enfocava essa mudança de olhar.Na década de 1990, criamos o Programa de Pós-Graduação em Letras, na Ufes, e Bernadette se juntou a nós como professora visitante, já que se aposentara. Em São Paulo, continuou a docência, agora na área de Cinema, e continuou a publicar seus livros em grandes editoras como a Companhia das

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A gente talvez até chore. Mas continua a viver, a sobreviver e a escrever, porque sabe que, em algum lugar de afetos e resistência, ainda existe refúgio para obliterar esse mundo sem coração.


Letras, na qual saiu o “Tormentos Ocasionais”.Agora, de volta à terra capixaba, lança seu mais recente romance “Ulpiana”, uma delicada mirada para a morte e suas garras e se juntou a outras mulheres combativas como ela na Academia Espírito-santense de Letras.. Com sua produção literária e sua ação cultural nas áreas de literatura e cinema, Bernadette Lyra representa o que há de melhor na cultura de nosso estado e, por isso, nada mais justa a homenagem que ora recebe”. Prof. Dr. Francisco Aurelio Ribeiro (Presidente da Academia Espírito-santense de Letras) Memória é ficção, prenunciou Bernadette Lyra, provocando a plateia (silêncio). O tempo, quanto mais distante, menor... A minha ficção com Bernadette Lyra começa no arranjo que entrelaça os nossos nomes. Em vida. Ainda jovem, eu treinava assinar uma autoria. A essa época, na calada dos meus 20, havia aqueles que, nem tão íntimos – por esquecimento ou dúvida –me apelidavam de “Bebeth”,“Guette”, ou, quando em vez, de “Bernadete”, proporcionais à minha significância em suas vidas. Gostava do Lírio no meu nome. E dialogava com isso. Daí a sombra de Bernadette. Orfeônica, consorte optei pelo Taqueti, que trouxe ritmo ao meu nome e impulso para chegar ao cinema. Ela também (Doutora em Cinema pela Escola de Comunicação e Artes da USP e as outras vias também). Numa elipse de tempo e lugares, nos encontramos em um curso de Semiótica em Vitória. Fui sua aluna e, não sei se estava pronta para a Mestra que (re) significou o meu estar/star,aqui. Desde então, leio quase tudo o que ela escreve. Não gosto de tudo, quando leio. Alguns só me acometem ao tempo. E há aquelas passagens labirínticas, torpes, trôpegas, trêmulas e cheias de pavor e confissões femininas que não me abandonam. Quando fala para uma plateia procura as primeiras filas. Ela remoça uns 20 anos e costuma nos trazer consigo. E eu acredito na ficção que ela edita. Margarete Taqueti Cineasta Em abril de 2019, a escritora Bernadette Lyra convidou um grupo de escritores para, juntamente com ela, desbravarem a “Capitania Perdida”. A expedição partiu cedinho do Centro de Vitória rumo à Conceição da Barra. Fui uma das convidadas dessa aventura amorosa-histórica e literária que permitiu um breve mergulho na vida desta escritora que é uma das escritoras mais queridas do ES. Fomos recebidos com festa pela população barrense e pelas Pastorinhas de Reis que, durante gerações, encantam com seu canto e vestidos adornados com

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Minha avĂł bordando rendas, meu avĂ´ contando lendas, eu sentada no balcĂŁo - Era uma vez uma linda princesinha como tu.


flores e fitas coloridas. Visitamos o Cais e, emocionados, ficamos escutando as “cantigas do vaivém das ondas” do mar encontrando o rio. O Rio “Dorminhoco”, como era conhecido pelos índios, para Bernadette, é “território mágico”, e tudo mais em Conceição da Barra pulsa aquecido pela memória viva da escritora. Bernadette é uma “partícula preciosa”, ou seja, é uma inspiração para quem a conhece pessoalmente, ou por meio das suas obras, o amor que sente pela literatura, pelas pessoas e pela vida é contagiante. Estou certa que, tanto eu, quanto os amigos e amigas que tiveram o privilégio de desbravar essa Capitania imaginada com a escritora voltou para casa um pouco barrense também. Bernadette, obrigada por existir nas nossas vidas! Renata Bomfim escritora ASSIM COMEÇOU A DANÇA Meu primeiro livro de Bernadette Lyra foi Tormentos ocasionais. Eu tinha 20 anos de idade e todas as energias voltadas à literatura, especialmente a leitura. A autora de Tormentos ocasionais era do meu estado e estava em uma editora que eu amava (e amo): a Companhia das Letras. Estudante de história na Ufes, não demorei a perceber que o prédio ao lado do meu centro de estudos homenageava a escritora. Fui colecionando seus livros, lendo tudo, acompanhando as crônicas na revista Você. Eu me sentia perto. Sinto. Primeiro pela dança. Ler um livro de Bernadette é dançar com a autora. Segundo, quando meus pais me levaram para Pedro Canário em 1978, o distrito pertencia a Conceição da Barra, emancipando-se apenas em 1986. Assim, mais que uma identidade de estado, de região norte, sou do mesmo barro, mesma areia, mesmo vento nas barrancas do Itaúnas. Não obstante tanta proximidade existencial, eu fugia. Via Bernadette e corria. Uma vez eu estava em um supermercado, Centro Histórico de Vitória,ela na sessão de iogurtes, um potinho em cada mão, comparando as marcas. Eu cheguei perto, mas fiquei mudo. E corri. Anos depois, na rua Coronel Monjardim, também no Centro, tomei coragem e parei minha moto ao lado dela, que caminhava na calçada e se assustou um pouco. Achou que era sequestro, assalto. Eu levantei o capacete e desabafei a frase que guardei por anos: “Bernadette, sou seu fã. Amo você e seus livros!”. Dez anos depois eu virei o editor de Água salobra, crônicas quem ela constrói uma Conceição da Barra universal. Valeu a pena. Saulo Ribeiro Escritor e editor Conheci Bernadette Lyra primeiro na biblioteca de uma amiga, emprestando livros e conectando ao nome de um prédio da Universidade. Mas acho que conheci mesmo a Bernadette tomando gim na mesa do bar e conversando Blow Up, Creta e o Kosovo. Sobre martini, caju amigo e pessoas lindas. Sobre

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Ao sondar minha infância, tentando ir além dos relâmpagos iniciais, percebo que o tempo é uma prisão limitada e esférica. E que aquilo a que chamamos vida é só um intervalo entre um começo e um fim.


a Barra, Vitória e São Paulo. É impressionante ver a generosidade das histórias que ela fala nas mesas e na atenção com que as ouve também. Fico lisonjeado de estar por perto e vermelho sempre que conversamos. Espero sermos muito mais vermelhos daqui pra frente. João Chagas Escritor O que dizer de Bernadette Lyra? Que ela é a dama da literatura do Espírito Santo? Uma das nossas mais talentosas romancistas e contistas, a cronista adorável que durante anos brindou os leitores com seus textos no Caderno Dois? A pesquisadora de cinema, a estudiosa do Cinema de Bordas, a respeitada professora universitária que recebeu o título de Professora Emérita da Ufes? A Bernadette de “O Jardim das Delícias”, “A Panelinha de Breu”, a romancista histórica de “A Capitoa”, a secretária de Cultura do Espírito Santo? Bernadette Lyra é tudo isso e muito mais. Mas neste breve depoimento irei revelar algo de que ela sempre fala com emoção: foi o meu avô, Guilherme Santos Neves, de quem ela foi aluna, quem a incentivou a realizar o sonho de ser escritora. Por mais de uma vez, Bernadette confidenciou-me, com carinho, que Mestre Guilherme dizia que ela era a filha que ele gostaria de ter. De onde posso concluir, orgulhosamente, que posso chamar de “tia honorária” a escritora que aprendi a admirar desde a mais tenra infância. Salve, Bernadette! Você merece todas as homenagens!​​ José Roberto Santos Neves Jornalista, escritor e membro da Academia Espírito-Santense de Letras Certas palavras caem como uma luva em determinadas pessoas, soam naturalmente na companhia de seus nomes e sobrenomes, combinam à perfeição com o texto, o contexto, as cores e o sentimento que as definem. Gentileza, generosidade, leveza, afetuosidade e delicadeza com Bernadette Lyra, por exemplo. É um privilégio ouvi-la narrar episódios prosaicos, ler seus romances ou assistir ao que ela diz sobre o cinema, a literatura, o passado e quem sabe o que virá. É um privilégio vê-la praticar a gentileza no jeito de falar, a leveza no modo de escrever, a generosidade na maneira como canta sua aldeia, conta suas aventuras e costura sua trajetória acadêmica. É um privilégio compartilhar do afeto que ela espalha e testemunhar o movimento que ela inspira com a força de sua presença. É um privilégio ter Bernadette Lyra por perto. Ana Laura Nahas jornalista e escritora

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O filme dá uma vida ao espectador, está te recriando, é um encontro tão amoroso, a pele do teu olho roça na película, é quase um orgasmo entre filme e espectador.


CADERNO DO FESTIVAL DE CINEMA DE VITÓRIA HOMENAGEADO CAPIXABA /9ª Edição Projeto Editorial - Lucia Caus e Paulo Gois Bastos Reportagem - Jace Theodoro Projeto Gráfico, Capa e Diagramação - Paulo Prot Revisão de Texto - Karine Nobre Edição e Revisão final - Jace Theodoro Foto de capa: Sérgio Cardoso Especificações Gráficas Tipografia - Gandhi Serif (opensource) Papéis - Offset 180 g/m² para miolo e Supreme 250g/m² para a capa Impresso em Vitória|ES O Caderno do Festival de Cinema de Vitória - Homenageado Capixaba é uma publicação do 26º Festival de Cinema de Vitória, evento realizado de 24 a 29 de setembro de 2019 em Vitória-ES. O Festival é uma realização da Galpão Produções e do Instituto Brasil de Cultura e Arte. Nosso endereço e contatos: Rua Professora Maria Candida da Silva, nº 115-A Bairro República - Vitória/ES, CEP 29.070-210 Tel: +55 27 3327 2751 / producaofcv@ibcavix.org.br www.festivaldecinemadevitoria.com.br Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG) Theodoro, Jace, 1967-. T388c Caderno do Festival de Cinema de Vitória: Bernadette Lyra: homenageada capixaba / Reportagem e edição Jace Theodoro, projeto editorial Lucia Caus, Paulo Gois. – 10.ed. – Vitória, ES: Ministério da Cidadania; ArcelorMittal, 2019. 32 p. : foto. ; 22 x 31 cm

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1. Lyra, Bernadette, 1938- – Entrevista. 2. Cinema – Vitória (ES). I. Caus, Lucia, 1962-. II. Gois, Paulo, 1981-. III. Título. CDD 791.43098152 Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422

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FESTIVAL DE CINEMA DE VITORIA

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