Voz Lumiar 08/12

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Os novos desafios para os periódicos em Direito, o estatuto científico do Direito, a Revista do CAAP e o que a comunidade acadêmica tem a ver com isso Conselho Editorial da Revista do CAAP A política institucional de avaliação de periódicos científicos na área do Direito tem passado por mudanças estruturais nos últimos anos, mudanças que vêm para melhor. A expectativa é que as regras de avaliação mais rigorosas tragam mais profissionalismo para a gestão dos periódicos e, consequentemente, pressionem os programas de pósgraduação e os seus pesquisadores por um aumento na qualidade da pesquisa. Já era hora: com as facilidades trazidas pelas novas mídias e a proliferação de revistas impressas ou online, a publicação de um artigo acadêmico se tornou acessível demais. Some-se a isso o estágio de “relativo atraso” da pesquisa em Direito em relação ao das demais disciplinas das ciências humanas, como o caracterizou Marcos Nobre, e tem-se uma primeira visão do cenário crítico atual dos periódicos jurídicos brasileiros. Parágrafo. A função dos periódicos científicos de todas as áreas do conhecimento sempre foi a de veicular pesquisas que reflitam o estado da arte atual de uma disciplina. O que acontece hoje no Brasil é que as revistas acadêmicas jurídicas deixaram de representar esse canal de fluxo de pesquisas pioneiras para se tornar palco de um falatório cuja relevância diz menos respeito à ciência jurídica do que ao intumescimento dos currículos lattes dos acadêmicos e à ilustração dos currículos profissionais de advogados, promotores e magistrados. Uma das principais mudanças trazidas pelo último documento da área do Direito do Qualis – sistema de avaliação de periódicos mantido

pela CAPES – é o fortalecimento das regras de exogenia. Isso significa que um periódico é tão melhor qualificado quanto maior é a presença de pesquisadores de outras unidades da federação em seu conselho editorial, entre seus pareceristas (conselho científico) e entre seus autores. A medida descentraliza a e procedimentaliza o processo de seleção de artigos para publicação, tendendo a um aumento no nível geral de qualidade. Até pouco tempo, os periódicos jurídicos serviam à divulgação da pesquisa do próprio programa de pós-graduação a que são vinculados. Muitas vezes, o que é pior, serviam apenas à divulgação da pesquisa do grupo de poder que tinha controle sob o periódico. Na medida em que o nível de exogenia deixa de ser critério material para elevação do estrato e se torna critério formal de qualificação de periódico científico enquanto tal, a tendência é o desaparecimento desse tipo de prática personalista. Publicar em periódicos que não atendam aos requisitos da Qualis é pior do que não publicar: não conta pontos nem para o pesquisador, nem para o programa de pós-graduação ao qual está inscrito, e ainda retira o ineditismo do texto. Na medida em que os periódicos passam a buscar artigos de pesquisadores de fora do seu estado, a melhor estratégia para autores passa a ser, igualmente, enviar seus artigos para periódicos de outros estados. Com a consolidação do procedimento de avaliação cega por pares (double blind review) e a despersonalização da seleção dos artigos, a tendência é que as revistas jurídicas voltem a

REUNIÕES DAS DIRETORIAS DO CAAP Segundas – Diretoria de Assistência (14h) Terças – Diretoria de Extensão (14h) Quartas – Reunião Geral (alternando entre 11:10h e 17:30h) Diretoria de Ensino e Pesquisa (11h10) Quintas – Diretoria de Imprensa (11h10 às 13h) Sextas – Diretoria de Relações Públicas (alternando entre 11:10h e 17:30h) Reuniões da AJUP (alternando entre 11:10h e 17:30h) 16

refletir o que há de mais avançado na pesquisa, e, tornando mais difícil a publicação qualificada (isto é, aquela em revistas de estratos mais altos), pressionem por um aumento no nível das pesquisas nos programas de pós de todo o Brasil. A Revista do CAAP, publicada com maior ou menor regularidade deste de 1996, vem buscando se adaptar às mudanças. Desde seu início, a Revista do CAAP entendeu-se como veículo de divulgação da produção científica dos graduandos desta faculdade, com o objetivo de fomentá-la. As mudanças trazidas pelas novas políticas institucionais implicam em grandes desafios a um periódico neste formato, desafios que os últimos conselhos editoriais não têm se furtado a enfrentar. Parágrafo. A primeira e mais significativa mudança foi a transição para o formato online. Todos os volumes da revista podem hoje ser encontrados no endereço <www2.direito.ufmg.br/ revistadocaap>, juntamente outras informações acerca do Periódico. Além disso, a Revista abriu-se ao recebimento de artigos, resenhas ou traduções de pesquisadores de qualquer universidade, de qualquer país ou disciplina das ciências humanas ou sociais aplicadas, condicionado a admissão apenas à pertinência temática: o direito. Os artigos recebidos têm sido cada vez mais avaliados por pareceristas de outros estados ou mesmo de outros países. Por fim, estuda-se a ampliação do conselho editorial com a inclusão de pesquisadores de outros estados. Espera-se assim

que a Revista possa finalmente alcançar estratos mais elevados na avaliação Qualis. Se analisadas superficialmente, tais mudanças parecem implicar um prejuízo para a comunidade acadêmica desta faculdade, já que o espaço institucional da Revista do CAAP deixa de ser reservado à publicação de graduandos. Esse prejuízo é meramente aparente. A publicação num periódico de estrato C1, o mais baixo, onde a Revista do CAAP se localiza atualmente, não possui o valor de título, de modo que o artigo ali publicado tornase irrelevante em concursos como o ingresso na pós-graduação, por exemplo. Ainda que o espaço da Revista deixe de estar reservado exclusivamente à comunidade desta vetusta casa, ele não lhe foi, no entanto, fechado – como é o caso na grossa maioria dos periódicos sérios, que não aceitam artigos de graduandos. Aqueles que vierem a publicar na Revista do CAAP terão o valor de seus artigos devidamente apreciado pela qualificação em estrato mais elevado que o periódico espera alcançar nas próximas avaliações. A contribuição dos alunos da Faculdade de Direito da UFMG é indispensável e sempre bemvinda. Lembramos, portanto, que se encontram abertas as chamadas de trabalho para composição dos dois números referentes ao ano 2012. O edital pode ser encontrado no site da Revista do CAAP, citado acima, e os prazos são 15 de agosto para o primeiro número e 30 de setembro para o segundo número.

“EDIÇÃO JUNHO 2012”

Voz em Voga

A concertação social e a mediação dos conflitos socioambientais no agronegócio: gestão territorial e empoderamento das partes.P. 06

Uma releitura da sustentabilidade empresarial. P. 12

Quarenta anos de Direito Internacional Ambiental: de Estocolmo ao Rio. P. 13

UFMG recebe prêmio na American University Os alunos Steevan Oliveira (10º período), Juliana Alcântara (8º período) e Lívia Lages (4º período), todos integrantes do GEDI-DH, participaram da 17ª edição da InterAmerican Human Rights Moot Court Competition que aconteceu no Washington College of Law (Washingon DC, USA) no mês de maio. Além das universidades das três americas o eventou contou com a participação de instituições de ensino superior da Europa e Oceania, totalizando mais

de 100 universidades de quase trinta países. A presença brasileira foi marcada por universidades como USP, UFPA, UFES, UFPB, UEA, UFAL, PUC-Rio e outras. A equipe da UFMG chegou na semi-final das rodadas orais da competição, encerrando sua participação como a segunda colocada dentre as representantes da defesa. No que tange os memoriais, parte escrita da competição, a UFMG recebeu nota máxima no score e o respectivo prêmio de melhor memorial.

ÓRGÃO OFICIAL DO CENTRO ACADÊMICO AFONSO PENA – Entidade Representativa dos Alunos de Direito da UFMG


Voz do Leitor

Sumário Voz do Leitor..........................................02 Editorial..................................................03 Solte a Voz.............................................03 Voz Informa Sobre a greve dos professores......04 Artigo Afinal, o que é Direito Ambiental...05 A Sociedade Civil na Rio +20: a necessidade de princípios não regressivos............................................05 A concertação social e a mediação dos conflitos socioambientais no agronegócio: gestão territorial e empoderamento das partes..............06 (Des)envolver, resistir e consolidar................................................07 Vozes Malditas.....................................08 Separados pelo Nascimento................08 Voz Ilustrada Dica do mês: Dexter........................09 Uma certa Voz Hipotermia.................................................09

Voz Cinema A pele que habito.............................10 Voz Literatura Festa no covil........................................10 Voz da Gestão sem título.........................11 Voz Ciências do Estado Tecendo a manhã nas Ciências do Estado..................................................11 Artigo Uma releitura da sustentabilidade empresarial.......................................12 Quarenta anos de Direito Internacional Ambiental: de Estocolmo ao Rio.............................13 Voz em Voga Os novos desafios para os periódicos em Direito, o estatuto científico do Direito, a Revista do CAAP e o que a comunidade acadêmica tem a ver com isso......16

Voz do Leitor

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Coca ou Fanta, é tudo refrigerante

Clara Coutinho

Todo ano surgem novos times de futebol na Vetusta, que se somam aos demais, com um único objetivo: conquistar o caneco do Vetustão, o campeonato interno de futebol da faculdade. Os times muitas vezes representam amigos de uma sala, colegas de um grupo de estudo ou simplesmente pessoas que estavam disponíveis e dispostas a dividir uma bola nos finais de semana. Dizem pelos corredores, os jogadores do Vetustão correspondem com uma frequência assustadora ao estereótipo do atleta do superior incompleto: inteligente, bem apessoado, faz sucesso na balada e, por último, mas não menos relevante, é heterossexual. O ano é 2012, e a Vetusta resolveu viver algo diferente. Alguns rapazes resolveram formar um time de futebol para competir com os demais pelo Vetustão. O nome? Fanta Uva Desportivos Unidos, ou, pela sigla, F.U.DE.U. O jogador padrão desse time é inteligente, bem apessoado, faz sucesso na balada e, agora mais importante, é gay: o F.U.DE.U. não aceita jogadores hétero. Conheço alguns dos jogadores do Fanta Uva e posso afirmar, com certa precisão, que muitos não se importam com o futebol, nem com o Vetustão. Estão no jogo pelo protesto, e pretendem incomodar. Cada aparição do F.U.DE.U. é um tapa na cara da sociedade e da Tradicional Família Mineira: numa Universidade tradicional e num dos cursos mais tradicionais, os heterossexuais

dividem com os gays (ou com as gay, em termos apropriados) as salas de aula e as quadras de futebol. Pelo simples fato de que ninguém pode os obrigar a ser qualquer coisa que não sejam, em qualquer lugar. Por cartazes provocativos, com fotos de belos rapazes descamisados, o Fanta convoca ao time rapazes que gostam de rapazes, uma metáfora para que se assumam gays frente à faculdade e que lutem por uma causa muito mais política do que futebolística. Penso ser indiscutível que o Fanta representa uma vitória da comunidade acadêmica, mas penso também ser necessário cuidado para que o time não seja reconhecido como o único espaço legítimo desses colegas em nossa faculdade. É necessário que as convocações ao time sejam espontâneas, e não por provocação (do F.U.DE.U. ou de outros times), porque cada um tem seu tempo, seu espaço, sua intimidade e seu futebol. É preciso que o time não seja a institucionalização de perversos preconceitos, mas um veículo de comunicação direto de demandas e anseios. Por fim, é importantíssimo que o Fanta permaneça como um protesto, divertido, bem humorado, cheio de rapazes bonitos e inteligentes. E, acima de tudo, é preciso deixar claro que o que diferencia o F.U.DE.U. dos outros alunos é tão somente a camisa roxa - e o futebol, que ainda tem deixado um pouco a desejar...

Expediente Primeira Moderadora: Jamilla Monteiro Sarkis Segunda Moderadora: Jennyffer Almeida Santos Conselho Editorial: Arthur Castro (CACE) Daniel Antônio da Cunha (Extensão - DAJ) Olívia Paixão (CAAP) Raphaella Gonçalves(Graduação) Rafael Augusto dos Santos (Diretoria de Imprensa) Mário Luiz do Nascimento Junior (Diretoria de Imprensa) Renan Sales de Meira (CAAP) Primeira Repórter: Lívia Almeida Lemos Segundo Repórter: Paulo Morais Milan de Oliveira Diretoria de Imprensa: Jamilla Monteiro Sarkis Jennyffer Almeida Santos Lívia Almeida Santos

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Mário Luiz do Nascimento Junior Paulo Morais Milan de Oliveira Rafael Augusto dos Santos Thais Lopes Santana Isaías Realização: Centro Acadêmico Afonso Pena - CAAP Presidência: Letícia Birchal Domingues Thalles Melo Batista Pieroni Gestão: Lumiar Contato: e-mail: jornalvozacademica@gmail.com Tiragem: 1.500 exemplares Diagramação: Vivian Bernardes viiihbernardes@gmail.com

Artigo princípios, como a Declaração do Rio. São reafirmados compromissos assumidos em relação ao desenvolvimento sustentável, à Declaração do Rio, à Agenda 21 e aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Por isso, a declaração não teve um significante papel no desenvolvimento do Direito Ambiental Internacional. A intenção da Cúpula de Johanesburgo não foi negociar novos acordos governamentais, mas sim organizar e articular cerca de 300 iniciativas de parceria. Essas parcerias seriam os principais instrumentos para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e dos novos objetivos estabelecidos pelo plano de Implementação. Diferentes instituições e atores estabeleceram parcerias durante a Cúpula, num esforço de “agir localmente.” A Comissão de Desenvolvimento Sustentável foi eleita a responsável pela fiscalização da implementação das iniciativas firmadas durante a Cúpula. 5. A Rio+20 A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável foi convocada em 24 de Dezembro de 2009, pela Assembleia Geral, que também determinou a realização de três reuniões do Comitê Preparatório antes da realização da Conferência. O primeiro encontro do Comitê Preparatório foi realizado em Nova York, de 17 a 19 de maio de 2009. Neste encontro foi analisado o progresso em relação ao desenvolvimento sustentável até o momento e as lacunas remanescentes quanto a sua adoção. Discutiu-se, igualmente, os desafios da economia verde no contexto da erradicação da pobreza e o quadro institucional do desenvolvimento sustentável. O segundo encontro, realizado de 7 a 8 de março de 2011, também em Nova York, definiu o processo de preparação do rascunho do documento final da Convenção. O “rascunho zero” da Convenção começou a ser elaborado em um encontro realizado de 25 a 27 de janeiro de 2012, em Nova York. O texto inicial possuía mais de 200 páginas e 420 parágrafos. Na segunda reunião das consultas informais, realizadas de 23 de abril a 4 de maio, os delegados concordaram ad referendum com 21 dos parágrafos e decidiram que seria necessária a realização de uma terceira rodada de consultas antes da Conferência. A terceira rodada de negociações ocorreu de 29 de maio a 2 de junho e os delegados discutiram um rascunho revisado e reduzido a 80 páginas. Foram criados dois grupos de trabalho e, ao final, 70 parágrafos foram concordados ad referendum, enquanto 259 continham parênteses. Os parênteses contém os pontos nos quais há controvérsias entre os países e que ainda devem ser negociados.

O terceiro comitê preparatório foi realizado no Rio de Janeiro, de 13 a 15 de junho, mantendo-se os grupos de trabalho da rodada de consultas anterior. Após o dia 15, o Brasil assumiu a direção das negociações, apresentando a primeira versão de seu texto consolidado no dia 19 de junho. Dos dias 20 a 22 de junho reuniramse no Riocentro representantes de 191 Estados Membros das Nações Unidas, incluindo 79 chefes de Estado. O resultado final da conferência do Rio foi o documento Nosso Futuro Comum que, assim como na Conferência de Johanesburgo, não foi uma declaração de princípios, mas uma afirmação de compromissos políticos. Assim como nas cúpulas anteriores, não houveram muitos avanços no texto, mas sim a reafirmação de compromissos anteriores. O texto final possui 50 páginas de promessas de discussão e não de implementação, sendo este um dos principais pontos de críticas. O acordo adotado no Rio solicita que a Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua próxima sessão, decida sobre: a designação de um órgão para a operacionalização do quadro de 10 anos de programas sobre consumo e produção sustentáveis; a identificação do formato e dos aspectos organizacionais do Fórum de Alto Nível que substituirá a Comissão de Desenvolvimento Sustentável; o fortalecimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente; a constituição um grupo de trabalho para desenvolver as metas globais de desenvolvimento sustentável; além de ações envolvendo a definição de uma estratégia de financiamento do desenvolvimento sustentável e de um mecanismo de facilitação de transferência de tecnologias limpas e sustentáveis. As expectativas quanto à Rio+20 eram de que esta iria estabelecer um novo processo e alterar significativamente o quadro institucional atual, contudo, os resultados da Conferência, como apresentados, foram modestos. Almejava-se o estabelecimento de um Comissário para as Gerações Futuras, uma elevação do status do PNUMA para agência especializada e o estabelecimento de metas claras e meios de implementação para a economia verde. Nenhuma destas expectativas foi atendida. Não foi estabelecido um Comissário para as Gerações Futuras, embora o major group de crianças e jovens tenha mobilizado diversos países. O PNUMA, em decorrência de pressões americanas, não teve seu status elevado à agência especializada, mas sua adesão se tornou universal. Quanto à economia verde, foram estabelecidas diretrizes, mas nenhum meio de implementação efetivo. O Global Environmental Outlook, relatório elaborado pelo PNUMA sobre a situação ambiental atual,

lançado duas semanas antes da Rio+20, alertou os delegados quanto às ameaças ambientais. Apenas quatro dos 90 objetivos estabelecidos em nível internacional apresentaram progresso significativo. O Relatório, elaborado após três anos de pesquisa, demanda que os países adotem metas mais ambiciosas ou que fortaleçam as metas anteriores. Entretanto, como exposto, o resultado da Rio+20 não representou o avanço necessário neste momento de crise ambiental. Em relação a grande parte dos temas tratados na convenção, o que houve foi, mais uma vez, uma afirmação de velhos compromissos, que vem sendo reafirmados há quarenta anos. Houveram, sim, avanços, como o reconhecimento dos direitos à alimentação e à água, dos direitos dos povos indígenas e uma ampla referência ao direito de participação e informação. Os nove major groups estabelecidos pela conferência para representar a sociedade civil apresentaram, no último dia da Conferência, uma carta afirmando que não apoiam o texto final e que este não representa o “Futuro que queremos”. O discurso final elaborado pelo major group de crianças e jovens para ser lido no encerramento da Conferência, questionava se algum dos representantes ali presentes realmente acreditava no futuro que haviam acordado e alertou que já sofremos hoje as consequências que nos comprometemos a evitar há vinte anos. A Rio+20, como parte de um processo de desenvolvimento do Direito Ambiental Internacional que teve início na década de 1970, deve servir de reflexão. A crítica em relação à Rio+20 é que esta não foi ambiciosa o suficiente, contudo, mesmo os acordos ambientais considerados ambiciosos tem demonstrado que são incapazes de perseguir seus próprios fins, como os tratados sobre a biodiversidade, mudanças climáticas e desertificação. Desde 1990, as emissões anuais de dióxido de carbono aumentaram 45%. A extinção de espécies atingiu números alarmantes, sendo 30% dos anfíbios, 21% das aves e 25% das espécies marinhas consideradas em risco de extinção. Quanto à desertificação, a percentagem de áreas degradadas cresceu de 15%,e m 1991, para 24%, em 2008. A razão de o documento final ser apenas uma reafirmação de compromissos antigos e uma promessa de discussão para o futuro é a falta de vontade política dos estados diante de um contexto de crise econômica. Todavia, se quanto aos Estados faltou comprometimento, a Rio+20 foi um marco em relação ao comprometimento de outros setores, como a sociedade civil, indústria e comunidades locais.

A Rio+20 reuniu 44.000 participantes e promoveu uma série de fóruns, cursos e mais de 500 eventos paralelos à conferência. Foram estabelecidos nove grupos de interesses (major groups) que participaram ativamente das negociações, desde as primeiras reuniões em Nova York. Foi realizada a Cúpula dos Povos, o Congresso sobre Justiça, Governança e Direito para a Sustentabilidade Ambiental, além de fóruns de negócios, como o que resultou no comprometimento das 30 maiores seguradoras mundiais com os Princípios para a Sustentabilidade de Seguros e do Congresso de Cidades, que reuniu prefeitos das principais cidades mundiais em Belo Horizonte. Os demais atores estão bem articulados, informados e dispostos a conquistar, eles mesmos, o que os Estados se recusaram a se comprometer. Um exemplo é o estabelecimento de um Comissário para as Gerações Futuras. Após a grande mobilização realizada pelo major group de crianças e jovens, diversos países apoiaram e se comprometeram a adotar comissários para as gerações futuras em seus próprios Estados. Ademais, o SecretárioGeral da ONU se reuniu com os jovens e anunciou que irá estabelecer um Comissário para as Gerações Futuras no Secretariado da organização. Os quarenta anos de Direito Internacional Ambiental demonstraram que apesar de terem integrado o desenvolvimento sustentável em seus discursos, os Estados não implementaram meios para que seu desenvolvimento econômico integrasse a proteção ambiental e o desenvolvimento social. Apesar do grande desenvolvimento que sofreu nos últimos quarenta anos e da proliferação de acordos ambientais multilaterais, o Relatório do PNUMA demonstra que o Direito Ambiental Internacional não é eficaz. A era pós-Rio+20 deve ser marcada por mudanças. O grande mérito da Rio+20 foi demonstrar que existem outros atores, além dos Estados, interessados em conduzir tais mudanças. Após quarenta anos reafirmando compromissos e renovando metas, é hora de implementar soluções inovadoras, capazes de fato de garantir um desenvolvimento econômico que integre proteção ambiental e desenvolvimento social. Se este não é um compromisso dos Estados, é um compromisso que a sociedade civil representada na Rio+20 decidiu assumir. “Nós iremos avançar por vocês.” Princípio 7 da Declaração do Rio HUNTER, D.; SALZMAN, J.; ZAELKE, D. International Environmental Law and Policy. Minneapolis: West Publishing Company, 2007. Trecho do discurso final elaborado pelo Major Group de crianças e jovens para o encerramento da Conferência. Não houve espaço para discurso dos major groups, mas o texto foi lido e aplaudido de pé na reunião dos Major Groups.

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Editorial

Artigo a definição de políticas públicas, desde o fim da II Guerra Mundial. O desenvolvimento econômico foi definido como a solução para diversos problemas sociais, sobretudo a miséria. Durante décadas, instituições internacionais e programas de ajuda destinaram seus fundos para o desenvolvimento de infraestrutura industrial nos países menos desenvolvidos. Contudo, este modelo de desenvolvimento não foi compatível com a sustentabilidade ambiental. Muitos países em desenvolvimento sofrem hoje com a degradação ambiental, a qual contribui também para a degradação da qualidade de vida de sua população. O desenvolvimento econômico não deve se subordinar à proteção ambiental e nem ao menos negligenciála. É necessário que desenvolvimento e proteção ambiental sejam integrados, esta integração é a essência do conceito de “desenvolvimento sustentável”. Tal conceito foi abordado pela doutrina desde os anos 1970, contudo, os atores políticos só se envolveram na discussão a partir da publicação do Relatório Nosso Futuro Comum (Our Common Future). Em 1983, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu uma comissão independente para formular uma agenda de ação de longo prazo para questões ambientais, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Em 1987 a Comissão publicou o Relatório “Nosso Futuro Comum”, conhecido como Relatório Brundtland, devido à Presidente da Comissão, a Ministra norueguesa Herlem Gro Brundtland. O relatório é reconhecido por ter cunhado o termo “desenvolvimento sustentável” e o definido como “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.” O relatório Brundtland é um marco para o desenvolvimento posterior do Direito Ambiental Internacional. No relatório, pela primeira vez, o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental foram abordados com a mesma importância. Embora a comissão não tenha criado o termo “desenvolvimento sustentável”, ela é a responsável por sua popularização, sendo este conceito central nos discursos ambientais até os dias de hoje. Um importante avanço do Relatório foi relacionar a proteção ambiental ao combate à pobreza e ao crescimento econômico, conciliando, desse modo, as divergências que haviam entre os interesses dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Ao estabelecer o objetivo do “desenvolvimento sustentável”, o Professor David Hunter aponta três desafios que devem ser enfrentados. O primeiro é o desafio da escala, como manter as atividades econômicas dentro de uma escala que a biosfera seja capaz de suportar. O segundo é o desafio da distribuição justa, como

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distribuir os benefícios do crescimento econômico, não apenas entre os pobres e ricos, mas também entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento e entre a geração atual e as gerações futuras. O terceiro desafio é o da alocação inteligente, como alocar os recursos escassos de modo eficiente. Em dezembro de 1989, a Assembleia Geral das Nações Unidas convocou a Convenção das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que foi realizada em Junho de 1992, no Rio de Janeiro. O contexto político desta Conferência é profundamente distinto do contexto em que ocorreu a Conferência de Estocolmo, com o fim da Guerra Fria. Contudo, as divergências entre os países desenvolvidos e em desenvolvimentos eram ainda mais fortes. A Convenção reuniu 100 chefes de Estado, representantes de 178 países e 17.000 participantes. A época era de otimismo e os planos para a conferência eram ambiciosos. Esperava-se a assinatura de três tratados ambientais, consenso político e um aumento substancial dos financiamentos para se atingir um desenvolvimento sustentável. Ao contrário da Conferência anterior, 115 Chefes de Estado compareceram ao Rio, o que demonstra não apenas uma maior preocupação com a questão ambiental, como também uma maior vontade política. Os conflitos entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento tiveram início com a definição do tema da conferência: seria uma conferência sobre desenvolvimento ou uma conferência sobre meio ambiente? Os países em desenvolvimento tinham como principal interesse assegurar que a proteção ambiental não se constituísse em entrave ao seu desenvolvimento econômico. Além disso, queriam colocar na pauta matérias como: acesso à água potável, segurança alimentar, desertificação, a responsabilidade dos países desenvolvidos em relação aos problemas ambientais, financiamento para que pudessem cooperar para a solução de problemas globais aos quais não deram causa e livre acesso aos mercados dos países desenvolvidos. Além dos conflitos de interesses entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, a posição dos EUA era outro desafio que deveria ser superado. Os EUA estavam isolados e relutantes quanto a todas as grandes questões. Alguns dias antes da Conferência o governo declarou que não iria assinar a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), apesar de terem participado e adotado o rascunho da convenção, elaborado uma semana antes. Apesar disso, na abertura da Conferência, em seu discurso oficial, o representante dos EUA afirmou que iriam doar US$150mi para apoiar a proteção de florestas nos países em desenvolvimento. Tal iniciativa foi amplamente criticada,

face a declaração de que os EUA não assinariam a CDB. Os principais resultados da Conferência foram a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Agenda 21 e a Declaração das Florestas. Ainda, dois tratados vinculantes foram abertos para assinatura durante a Conferência: a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e a Convenção sobre a Diversidade Biológica. Foi estabelecida a Comissão de Desenvolvimento Sustentável para monitorar a implementação dos acordos firmados no Rio e a Agenda 21. No início das negociações, os organizadores da conferência esperavam que fosse elaborado um documento vinculante baseado nas recomendações do Relatório Brundtland. Contudo, com o avanço das negociações, esta aspiração demonstrou-se irreal. Ao fim, o documento produzido pela Conferência do Rio fora uma declaração de princípios nãovinculante. Apesar de ser um instrumento do soft law, a Declaração do Rio é um importante documento para o Direito Internacional Ambiental, uma vez contém o consenso dos países desenvolvidos e em desenvolvimento quanto a suas responsabilidades “comuns, mas diferenciadas.” Além disso, a Declaração estabelece princípios importantes, como o da prevenção, da precaução, e do poluidor-pagador, além de reconhecer os direitos das comunidades indígenas e o papel de mulheres e jovens para o desenvolvimento sustentável. A Agenda 21 é um documento constituído por quarenta capítulos e mais de oitocentas páginas. É um importante projeto para a futura implementação de um modelo de desenvolvimento sustentável. A intenção da Agenda 21 era subsidiar a cooperação internacional para o desenvolvimento sustentável. Após a Conferência do Rio, em 1992, o Direito Internacional Ambiental continuou a se desenvolver consideravelmente. Pelo menos dez acordos multilaterais importantes entravam em força, entre eles a Convenção sobre a Diversidade Biológica, o Protocolo de Montreal, a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, o Protocolo de Quioto e a Convenção sobre Desertificação, todos com mais de 150 Estados-parte. Testemunhava-se um grande compromisso político em relação a questões ambientais e a popularização do termo “desenvolvimento sustentável”. Contudo, os indicadores ambientais declinavam, demonstrando que os acordos não estavam sendo implementados de modo eficaz. Diante de tais dados, a Assembleia Geral das Nações Unidas convocou uma sessão especial,

denominada “Rio+5” para avaliar os avanços após a Conferência do Rio. 4. A Conferência de Johanesburgo Em setembro de 2002, ocorreu em Johanesburgo a Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável. O objetivo da cúpula era realizar uma avaliação das ações adotadas após a Conferência do Rio e reafirmar os compromissos ambientais assumidos globalmente. Os resultados desta Convenção foram o Plano de Implementação de Johanesburgo e a Declaração de Johanesburgo sobre Desenvolvimento Sustentável. A conclusão da cúpula foi de que muito pouco ou nada tinha progredido desde a Conferência, em 1992. Diante de tais resultados, os delegados reafirmaram os objetivos da Agenda 21 e da Declaração do Rio. Após a Conferência do Rio, a vontade política daquela época deu lugar à falta de liderança. Os EUA representavam um entrave às negociações de tratados ambientais, principalmente as negociações da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. O paradigma econômico global deixou de ser o desenvolvimento sustentável e tornou-se a globalização econômica e o livre comércio. Após a Conferência do Rio o conceito de “desenvolvimento sustentável” foi aceito universalmente, ao menos nos discursos. Ele passou a figurar em todos os tratados referentes a meio ambiente e desenvolvimento. Foi retomado pelas legislações internas dos países e utilizado para a definição de políticas públicas. Instituições financeiras, como o Banco Mundial, começaram a utilizar tal conceito para guiar suas políticas. A indústria também adotou o termo e a sustentabilidade tornou-se estratégia de marketing. Paralelamente, a década de 1990 se caracterizou pela emergência da globalização dos modos de produção e consumo, a qual é contrária aos objetivos do desenvolvimento sustentável. Dez anos após a Conferência do Rio, não haviam sido alcançados progressos efetivos, apesar da proliferação de tratados e outros instrumentos internacionais. Neste contexto, foi convocada a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, em 2002. Os organizadores da cúpula esperavam que um encontro com foco maior nas áreas críticas encorajaria os governos a potencializarem seus esforços em direção a um desenvolvimento sustentável. A Cúpula foi precedida por quatro encontros preparatórios. Foram definidas cinco áreas principais: água e saneamento, energia, saúde, agricultura e biodiversidade. Cem chefes de Estado compareceram à Cúpula, que teve como resultado a adoção da Declaração de Johanesburgo e o Plano de Implementação. A Declaração de Johanesburgo é constituída por afirmações de compromissos políticos e não por

Todas as nossas crises Jamilla Monteiro Sarkis

A menina Mafalda, no início da década de 1960, já dizia: o mundo é um desastre. O discurso da canadense Severn Suzuki, que calou o mundo na Eco 92, seguiu a mesma linha: “Sou apenas uma criança e não tenho todas as soluções, mas quero que saibam que vocês também não têm”. O que e mudou de lá pra cá? Quais foram as maiores conquistas da luta ambiental? como se os líderes dissessem que não querem resolver”. A sociedade civil, representada “Sou apenas uma na Cúpula dos Povos, mostrouse extremamente insatifesta criança e não tenho com os resultados da Rio +20 em pleno ano de 2012, todas as soluções, que, repetiu o falido roteiro de falsas soluções defendidas mas quero que pelos mesmos atores que saibam que vocês provocaram a crise global. retórica ambientalista que também não têm”. - Aseduzia com a promessa de Severn Suzuki novas soluções caiu por terra. É interessante perceber que a questão ambiental não A Rio + 20, evento que se restringe à ecologia e tem movimentou as discusões recebido um cada vez maior ambientais em um âmbito enfoque econômico, político internacional, provou que Severn e jurídico. A transição da estava certa. O documento chamada “economia marrom” oficial da conferência é um claro para a “economia verde”, exemplo disso, sendo que, nas sustentável, está sempre em palavras do coordenador do pauta e cada vez mais distante Greenpeace, Márcio Astrini, trata- de um consenso. Proporcional se de um texto é catastrófico. ao aumento dos conflitos “Os problemas estão aí e é

gerados pelas discussões ambientais está a consolidação do Direito Ambiental como matéria regulamentadora e, muitas vezes, “apaziguadora”, capaz de resolver questões que fogem da esfera administrativa. Não menos importante e provavelmente mais próximo da nossa reatlizade é o debate sobre outra crise que enfrentamos: a greve dos professores e servidores das universidades públicas. Não existem perspectivas de resolução e as propostas de acordo oferecidas pelo Governo são tidas como insatisfatórias. Mais do que uma atitude positiva, é extremamente necessária a busca do estudante pelo conhecimento e por iformações acerca da situação. Para que se tomem lados, é preciso conhecê-los. Para esclarecer essas

questões e suscitar debates sobre esses temas, cada vez mais em voga, é que o Conselho Editorial, junto à Diretoria de Imprensa do Centro Acadêmico Afonso Pena, tem o prazer de apresentar a edição de Junho/2012 do Voz Acadêmica e presta, aqui, os mais sinceros agradecimentos aos que contribuiram, com suas vozes ou não, de maneira crucial para a confecção desse jornal.

“Os problemas estão aí e é como se os líderes dissessem que não querem resolver”. Márcio Astrini

Solte a Voz Final de semestre é sinônimo de FÉRIAS.

Falta da biblioteca no final do semestre.

Adesão dos professores e apoio dos alunos à greve.

Professores que se recusaram a lançar no Diário Online as notas das provas finais.

A presença de grandes nomes do Direito Internacional no VII Curso de Inverno, realizado pelo CEDIN.

Portaria baixada pela direção que proibe a afixação de cartazes nas paredes da Faculdade. Todos os cartazes que estavam colados foram recolhidos e jogados no lixo sem quaisquer aviso prévio.

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Voz Informa

Artigo

Sobre a greve dos professores

Quarenta anos de Direito Internacional Ambiental: de Estocolmo ao Rio. Lívia Almeida Lemos

Oficialmente, a greve dos docentes começou no dia 17 de maio de 2012, mas nós, os alunos da Faculdade de Direito UFMG, pelo bom senso dos professores, não entramos na lista daqueles que perderam o primeiro semestre de 2012. São mais de 90 % das universidades federais que aderem a uma greve que ocorre agora, ao contrário do descaso com a educação no Brasil, que já existe faz tempo. Professores das universidades paralisaram suas atividades na tentativa de reivindicar a reestruturação da carreira e melhoria das condições de trabalho, o que significa muito mais que simplesmente um direcionamento de verbas para um setor específico. A luta desses servidores públicos significa que a educação no Brasil não é prioridade para o governo, o que pode ser um dos indicadores das mazelas sociais, visto que a educação é, certamente, quem consegue fazer com que um país tenha capacidade efetiva de crescimento e de erradicação da pobreza. Ocorrem no Brasil, nesse momento, situações esdrúxulas, como professores extremamente qualificados que recebem um salário muito menor que se esperaria para uma pessoa que se qualificou durante tantos anos. Para se ter uma ideia dessa situação basta entrar neste site: http://

especialização. Nenhum professor precisa fazer “voto de pobreza”* e se a situação continuar como está, as universidades federais deixarão de ser polos de conhecimento, pesquisa e berço de tantas criações e descobertas positivas para a sociedade. Há, no entanto, aqueles que acreditam que a greve seja ineficaz. Uma das questões apontadas pela mídia, que é também a visão de alguns professores, é o fato de uma greve como essa ter um ‘patrão’ não atingido por ela. Geralmente as paralisações são extremamente eficazes e fazem diferença muito rapidamente. Como exemplo disso temos as greves dos operadores dos meios de transporte, que prestam um serviço direto e essencial para a população e cuja greve gera prejuízos visíveis, simultâneos e o que mais pesa na visão do Estado: financeiros. Contudo, uma greve de professores e servidores das universidades federais não afeta o Estado efetivamente em nada, no máximo o governo sofre pressão social para que as faculdades voltem ao expediente normal, mas, prejuízos calculáveis não aparecem. Talvez seja essa a grande diferença: o ‘patrão’, como dito anteriormente, é o Estado que não tem o setor da educação como prioridade, o que faz a greve durar muito mais que deveria, o que acaba por prejudicar efetivamente apenas os alunos.

www.portaltransparencia. gov.br/servidores/ServidorO que deve ser levado em conta, ListaServidores.asp, digitar o ainda que o Estado não esteja sendo nome do professor que você mais admira na UFMG e, pronto, você descobrirá qual o salário dele e terá uma ideia da insatisfação dos docentes. Basicamente, um professor na Faculdade de Direito da UFMG, com dedicação exclusiva, mestrado e doutorado pode ter um salário por volta de três vezes menor que de um juiz ou promotor. É fato que mudanças são necessárias. As universidades federais estão sucateadas, os professores não tem um plano de carreira com efetivas possibilidades de crescimento. Se a situação continuar como está, certamente perderemos nossos docentes, já que lecionar em uma universidade como a UFMG significa fazer uma escolha por salários ínfimos perto do que poderiam receber em outra Universidade ou exercendo outra atividade na mesma área de

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atingido diretamente pela greve, é o fato de as negociações com o governo na busca pela valorização no setor, defendida pelos professores, datarem de 2010. Não houve, no entanto, nenhuma mudança efetivamente favorável às reivindicações dos docentes e, em meio a esse descaso, a greve fez-se necessária. É importante destacar que mesmo que as paralisações terem começado em maio de 2012, ainda não houve uma negociação com o governo que desse sinais de que esse cederia. É uma greve que não tem, portanto, hora para acabar. Revoltados com o descaso estatal e para protestar contra o sucateamento das universidades, alunos das Faculdades de Música e Arquitetura da UFMG aderiram à greve estudantil, recusandose a frequentar as aulas. A ideia

Luísa Sette Câmara parece engraçada à primeira vista. Quem já não pensou em deixar a faculdade e fazer greve estudantil por algumas semanas? Certamente muitos já pensaram nisso, contudo, a paralisação dos estudantes não é tão superficial assim e tem fundamentos tão nobres quanto à dos docentes, pois demonstram a insatisfação dos alunos que compartilham da mesma vontade de melhora nas universidades. Ainda que o corpo discente da Faculdade de Direito da UFMG não tenha participado da greve estudantil (também pelo fato de nossos professores estarem em pleno semestre letivo, dando aulas regularmente), os alunos, representados pelo CAAP, apoiam a greve dos docentes, para que haja a valorização da profissão e todos os benefícios decorrentes dela. Essa valorização levará estímulo aos professores para que continuem se dedicando à educação, a qual não se resume ao ensino, mas inclui outros projetos desenvolvidos pelo corpo docente juntamente com os alunos. O corpo discente quer que a luta em favor das melhorias reivindicadas pelos professores sejam, de fato, atendidas pelo governo. É nosso desejo que a profissão seja admirada, tanto pelos que a exercem, para que no futuro tenhamos orgulho de ser

professores, quanto para toda a sociedade. Para muitos dos alunos, fazer uma graduação, mestrado, doutorado, prestar um concurso para dar aulas em uma faculdade federal e tornar-se professor e pesquisador é, uma meta na vida. Talvez não seja a única, mas uma delas. Admiramos imensamente os nossos professores que se dedicam a trabalhar nas condições atuais que o Estado lhes oferece. Nossa vontade é que lecionar seja prazeroso, digno e suficientemente remunerado para todos aqueles que escolherem essa carreira na rede pública. Queremos que o fato de exercer essa profissão não inclua a necessidade de uma carreira paralela para suprir financeiramente as lacunas deixadas pela péssima remuneração estatal. Que ser professor não inclua o “voto de pobreza”. *Expressão retirada da NOTA DE APOIO DO CAAP ÀS GREVES NO ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO. http:// caapufmg.com/artigo/nota-de-apoiodo-caap-as-greves-no-ensino-superiorbrasileiro/ Para consulta: sobe a adesão dos professores da FDUFMG: ASSEMBLEIA DOS PROFESSORES. http://caapufmg. com/artigo/relatoria-da-assembleiados-professores-do-dia-030712/

O início do século XXI é marcado por mudanças ambientais que representam, muitas vezes, riscos irreversíveis e que impactam a qualidade de vida humana. A poluição, a degradação da biodiversidade, enchentes e a desertificação são apenas alguns exemplos dos diversos problemas que enfrentamos hoje. A Cruz Vermelha prevê que existem, atualmente, mais refugiados ambientais que refugiados de guerra. É evidente, portanto, que a preservação de um ambiente saudável é essencial para a garantia de direitos humanos. A constatação de que é necessário preservar o meio ambiente não é característica do século XXI. Nos séculos XVIII e XIX já haviam tratados relativos ao meio ambiente, sobretudo em relação à proteção de espécies migratórias. Contudo, apenas nas últimas décadas tornaram-se aparentes as consequências que as atividades humanas podem ter no meio ambiente. No passado, as pressões antropogênicas sobre os recursos ambientais eram suportadas pelo meio ambiente. Entretanto, com os avanços tecnológicos, os modos de produção e consumo se intensificaram de tal maneira que o ambiente não é mais capaz de se recuperar. O resultado é a ampla degradação ambiental, que afeta sobretudo as populações mais vulneráveis. Essas ameaças aos ecossistemas levaram as comunidades científica e política a, juntas, buscarem soluções para mitigar e prevenir os efeitos adversos das atividades humanas sobre o meio ambiente. Esta é uma característica fundamental do direito ambiental internacional, a multidisciplinariedade. O meio ambiente e as atividades humanas formam um sistema complexo que deve ser abordado de ponto de vista científico, político, jurídico, econômico, entre outros. A multiplicidade de atores e interesses é o principal desafio deste campo do direito que evoluiu de maneira rápida nas últimas décadas. 1. Os primeiros esforços de proteção internacional do meio ambiente O desenvolvimento do direito internacional ambiental está intimamente ligado ao desenvolvimento industrial. Com os avanços tecnológicos, os modos de produção tornam-se progressivamente mais intensos, consumindo mais recursos em um período de tempo menor, o qual não permite que o ambiente se recupere. São as consequências ambientais dos modos de produção e consumo que impulsionam a regulamentação das atividades humanas sobre o meio ambiente. Uma das disputas internacionais em matéria ambiental mais célebres é o

caso da Fundição Trail (Trail Smelter case), entre Estados Unidos e Canadá, que data da década de 1930. O caso tem início quando os EUA apresentam queixa à Comissão Mista Internacional contra o Canadá, em decorrência de emissões de gases por uma empresa canadense que poluíam o território americano. Foi estabelecido um tribunal arbitral que, em 1941, proferiu sentença favorável aos EUA e estabeleceu as bases para a definição do princípio da prevenção de danos transfronteiriços. Os primeiros esforços de internacionalização da regulamentação ambiental decorrem da criação da Organização das Nações Unidas, em 1945. A criação da ONU dá origem a um fenômeno de institucionalização do Direito Internacional. Este fenômeno consiste no estabelecimento de organizações internacionais nos níveis regionais e global para a persecução de fins específicos. Embora não haja nenhuma organização internacional a nível global destinada à proteção ambiental, as atividades de diversas outras organizações, como a Organização Mundial do Comércio (OMG) e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), irão impactar no campo ambiental. É neste contexto que terá início, embora timidamente, o reconhecimento da relação entre meio ambiente e economia. Em 1947, uma resolução do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC) convocou a Conferência das Nações Unidas sobre a Conservação e Utilização de Recursos. Tal conferência teve caráter fortemente científico, sobretudo devido aos esforços do ECOSOC em estabelecer uma conexão com a comunidade científica e as Organizações Não Governamentais (ONG). O resultado da Conferência foi o reconhecimento de que era necessário estabelecer uma abordagem intergovernamental quanto à conservação dos recursos naturais. A resolução do ECOSOC que convocou a conferência é de extrema importância por afirmar a competência da ONU em matéria ambiental. Apesar destes primeiros esforços, foi apenas na década de 1970 que surgiu, de fato, o campo do direito ambiental internacional, paralelamente à abordagem das questões ambientais pelo direito interno de diversos países. Principalmente nos países industrializados, grupos ambientalistas se mobilizavam para lutar contra problemas como a poluição. Na Europa, como a poluição tinha caráter comumente transfronteiriço, os movimentos ambientalistas logo se tornaram internacionais. Não é surpresa, portanto, que um país europeu, a Suécia, preocupada com a questão dos danos ambientais

transfronteiriços, em especial a chuva ácida, tenha proposto a realização de uma Conferência Internacional sobre o meio ambiente, em 1968. Quatro anos depois, esta recepcionaria a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Homem. 2. A Conferência de Estocolmo A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Homem foi realizada em Estocolmo, de 5 a 16 de Junho de 1972. A Conferência foi uma das mais bem sucedidas à época. Estiveram presentes representantes de 130 países, embora apenas a Suécia e a Índia tenham sido representados por seus chefes de Estado. Durante os anos de preparação da Conferência, era clara a oposição entre os países desenvolvidos, do Norte, e os países em desenvolvimento, do Sul. Os países do Sul estavam iniciando seus processos de industrialização e, por isso, ainda não sofriam problemas como a poluição. Muitos dos países do sul haviam recentemente conquistado sua independência e seu maior interesse era defender sua soberania e seu direito de estabelecer seus próprios padrões de desenvolvimento. Seis meses antes da Conferência de Estocolmo, após grande esforço e pressão dos países do G-77, foi aprovada a Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente. A resolução reafirma o direito soberano dos Estados sobre seus recursos naturais e seu direito ao desenvolvimento. O documento tinha como fim influenciar as decisões a serem tomadas na Conferência de Estocolmo. Ao convocar a Conferência, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu que o seu principal objetivo era encorajar e estabelecer diretrizes para que os governos e organizações internacionais pudessem desenvolver ações de proteção ambiental. Com este fim, foi elaborado um Relatório para a conferência denominado Only One Earth, o qual já invocava a necessidade de proteger o meio ambiente para as futuras gerações. O resultado da Conferência é um reflexo dos diferentes interesses entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento. Os países desenvolvidos defendiam o controle populacional e a adoção de um novo modelo de desenvolvimento econômico. Os países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, afirmavam que estes objetivos eram uma tentativa de perpetuação da submissão dos países do Sul aos países do Norte. Em face desta divergência, foram incluídos artigos que reafirmavam a soberania sobre os recursos naturais e o direito ao

desenvolvimento. Apesar das divergências, a Conferência teve como resultado três documentos: a Declaração de Estocolmo, o Plano de Ação de Estocolmo e a elaboração de 109 recomendações para Estados e organizações internacionais de medidas contra degradação ambiental. Ademais, foram criados o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e o fundo ambiental. O PNUMA tinha como principal missão coordenar a elaboração de tratados em matéria ambiental e fomentar a cooperação internacional. A Declaração de Estocolmo é considerada um importante documento, apesar de não ser vinculante. Ela influenciou o desenvolvimento tanto do direito ambiental internacional, quanto do direito ambiental interno de diversos países. Apesar de não ter utilizado o termo “desenvolvimento sustentável”, a Declaração é considerada uma das bases para o desenvolvimento deste conceito, uma vez que enfatiza a importância de integrar o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, resultado da compatibilização entre os interesses divergentes entre os Estados. A responsabilidade primária de proteção ambiental foi conferida aos Estados, em âmbito nacional. Todavia, o preambulo da Declaração enumerou três áreas nas quais a responsabilidade dos países é de âmbito internacional, quais sejam, (1) recursos para apoiar os países em desenvolvimento a atenderem suas responsabilidades, (2) cooperação entre as nações e (3) ações de organizações internacionais em prol do interesse comum. O período posterior a Estocolmo foi marcado pela proliferação de organizações internacionais em matéria ambiental e por maiores esforços das instituições já existentes de integrarem as questões ambientais em seus trabalhos, sobretudo em relação à poluição e conservação da vida selvagem. Diversos tratados ambientais foram assinados e novas técnicas, como o Estudo de Impacto Ambiental, foram desenvolvidas. 3. O conceito de Desenvolvimento Sustentável e a Conferência do Rio Na década de 1980, após todos os esforços de combate à poluição e conservação de espécies, tem início o que o Professor Lynton Caldwell denomina de “segunda geração” de questões ambientais. Essa segunda geração corresponde a tópicos mais complexos, relacionados ao desenvolvimento. Exemplos destas questões ambientais de “segunda geração” são a Convenção de Viena sobre a Proteção da Camada de Ozônio, de 1985, e seu Protocolo de Montreal, de 1987. O conceito de desenvolvimento é de fundamental importância para

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Artigo

Uma releitura da sustentabilidade empresarial

Afinal, o que é Direito Ambiental? Bernardo Vianna Freitas Evaristo Dumont de Lucena Pereira Fernanda Valle Versiani

A questão ambiental vem a décadas sendo debatida por todo o mundo, sendo o desenvolvimento sustentável um dos focos dessa discussão. O Rio+20, conferência das Nações Unidas, realizada entre os dias 13 e 22 de junho de 2012, demonstrou grande atenção em relação à forma de realização da atividade empresarial. Destacou-se ao longo do evento a necessidade de as companhias observarem, durante a consecução de seu objeto, a função social da empresa. De fato, o Direito Societário busca com seus institutos jurídicos servir aos interesses da coletividade na medida em que incentiva a perpetuidade da empresa e permite que sua função social seja cumprida. No entanto, qual seria essa função social? A existência da empresa pode ser vista como indispensável em uma sociedade fundamentada na liberdade econômica. É óbvio que o contexto econômico livre a que se faz referência traz em si os princípios do Estado Democrático de Direito, nos quais o Estado é responsável não apenas por garantir a liberdade, mas também por dar eficácia aos direitos de natureza social. O desafio do Direito, portanto, é equacionar o desenvolvimento sustentável com a finalidade lucrativa inerente da atividade empresarial. A empresa apresenta-se como a soma organizada dos fatores de produção para o desenvolvimento de atividades econômicas que resultem na criação de bens e serviços (art. 966 do Código Civil). Esse é o papel essencial da empresa em um contexto de liberdade econômica: produzir bens e serviços necessários ou úteis à comunidade. Diante da redução do mundo pela globalização, os efeitos de uma determinada atividade empresarial passaram a alcançar diversas comunidades, independentemente das fronteiras nacionais, o que acentuou a preocupação com consequências nocivas que as grandes companhias geram e podem gerar sobre as comunidades ao desenvolver suas atividades. Entretanto, a responsabilidade social da empresa tem sido vista como a grande e incontestável solução para todos os males da atividade econômica. Em geral, discordar desses ideais toma conotações politicamente incorretas por haver uma carga emocional e política no discurso¹. Assim, algumas considerações merecem ser tecidas na análise da sustentabilidade que

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vem sendo amplamente difundida pela mídia. Como já mencionado, o papel da empresa é produzir bens e serviços. Essa é a essência da tão discutida função social da empresa: cumprir seu papel de fornecedora de bens e serviços necessários ou úteis à comunidade e, por consequência, remunerar os demais fatores de produção, gerar empregos, pagar tributos, desenvolver ou incentivar o desenvolvimento de novas tecnologias, circular riquezas e, principalmente, garantir o desenvolvimento socioeconômico. É nesse sentido que a empresa deve atuar, é assim que deve funcionar¸ exercer sua função social. Assim, o Direito deve servir ao interesse da coletividade ao mesmo tempo em que observa os fatores socioeconômicos, pois caso aqueles com maiores competências, mais disposição para o trabalho e melhores habilidades para desenvolver novos empreendimentos não possam auferir os ganhos decorrentes, não haverá razão para que invistam seu tempo, esforços e recursos em tais atividades. O incentivo seria de que quanto menos esforço se fizesse, melhor seria para o indivíduo, uma vez que a riqueza gerada pelos outros seria redistribuída independentemente da participação que cada um teve em sua produção. O mercado seria ineficiente por desestimular a atividade econômica e, assim, a comunidade seria mais pobre, menos inovadora e mais autoritária. Em sua aplicação, o Direito não pode preterir a apreensão de sua finalidade no plano socioeconômico, ou seja, deve o aplicador do Direito verificar qual o fundo teleológico em que se baseia a existência do instituto jurídico em análise. O Direito conferiu às sociedades uma estrutura direcionada à busca pelo lucro e esse deve ser o seu fim social. No regime das pessoas

jurídicas, cada tipo legalmente previsto é destinado a um propósito específico. Enquanto as associações e fundações têm fins essencialmente não lucrativos, portanto distanciados da ideia de busca e repartição de lucro, as sociedades são instrumentos jurídicos criados para atender à intenção lucrativa de seus sócios. No entanto, devese ressaltar que a sistemática da irreversível liberdade econômica constitucionalmente garantida não significa “que o egoísmo absoluto seja desejável e nem que deva ser premiado, mas sim que o interesse individual deve ser reconhecido e admitido, pois as pessoas reagem conforme incentivos que lhes são oferecidos”². Assim, o acionista arrisca seu dinheiro como proprietário do capital da companhia em troca do lucro que seu investimento pode gerar. Essa remuneração é compatível com o nível de risco que o acionista assume ao fornecer seus recursos ao desenvolvimento de atividades econômicas que não têm garantia total de sucesso, por mais seguro que seja considerado o investimento. Não há nada de errado no foco ao lucro até porque essa situação reproduz-se quando se visualiza os interesses das demais partes relacionas com a empresa (os stakeholders): o trabalhador busca ter o maior salário, o fornecedor busca cobrar o maior preço, o consumidor busca negociar o menor preço e assim em diante. É preciso, portanto, desvendar uma forma de se compatibilizar a busca pelo lucro em favor do acionista com a ideia de que a empresa tem uma função social mais ampla e imediata do que o simples fornecimento de bens e serviços à comunidade. A Lei das S/A, ao tratar do acionista controlador como detentor da gestão sobre a propriedade da

Uma análise histórica deste “novo” ramo do Direito Ana Clara Discacciati

companhia, emprega expressamente a ideia de que a companhia “tem deveres e responsabilidades” com seus trabalhadores e com a comunidade (arts. 116, parágrafo único, e 154, caput e § 4º). Contudo, se o Estado não regula uma determinada conduta, não há que se falar em deveres jurídicos oponíveis ao controlador da gestão da empresa no sentido de limitar suas decisões ao interesse genérico da coletividade. E quando o Estado decide regular – impor condutas ou estabelecer vedações à ação – não há que se falar em responsabilidade social, mas em obrigação legal. Se não há uma obrigação legal imposta pelo Estado, não há a contrapartida do direito de a coletividade exigir certa conduta das companhias (ou melhor, dos controladores da gestão da empresa). Em suma, enquanto ao acionista é conferido o direito de exigir a busca pelo lucro, à coletividade resta apenas exigir os deveres negativos decorrentes do princípio de não ofender a ninguém, consubstanciado no regime jurídico dos atos ilícitos (arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, dentre outros). Dessa forma, a companhia não pode ser coagida a praticar atos que extrapolem aquelas condutas previstas como obrigatórias na regulamentação de sua atividade. Nesse sentido, órgãos reguladores e entidades privadas desempenham função importantíssima ao determinar algumas condutas que tenham força coercitiva. A BM&FBovespa, por exemplo, já vem dando sinais que exigirá como prérequisito para listagem de empresas a publicação de relatórios de sustentabilidade. Assim, cabe ao Estado e às entidades com competência para tal estabelecer incentivos e obrigações para tornar pleno o desenvolvimento sustentável, ao harmonizar o lucro e a função social da empresa.

O Direito Ambiental não é, ao contrário do que se pensa, um ramo jurídico novo ou que foi criado recentemente. O primeiro Código Florestal brasileiro foi a Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, o Código das Águas é de 1934, o Código das Minas de 1967, entre diversas outras leis. Mas por que somente agora estamos pensando sobre a “economia verde”, tema da Rio+20, que foi realizada este mês no Rio de Janeiro e contou com a presença de mais de 100 chefes de Estado e 50 mil participantes? Pode-se dizer que a preocupação com o meio ambiente se tornou uma questão mundial e tema atual após a Conferência de Estocolmo, em 1972, quando foi discutida a proibição do gás CFC (clorofluorcarboneto), emitido por aparelhos de ar condicionado e aerossóis. A frase da à época primeira-ministra da Noruega, Gro Brudtland, se tornou o slogan do movimento ambientalista da década de 80: “Pensar globalmente, agir localmente”. Como resposta a esse movimento, em 1981 foi promulgada

no Brasil a Lei 6.938, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente e trouxe diversos instrumentos para sua efetivação, como o licenciamento ambiental e o zoneamento ambiental. O ponto culminante da importância do meio ambiente veio com a Constituição da República de 1988, que dedicou um capítulo para esta temática. O art. 225, caput, traz a seguinte redação: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” O legislador optou por uma gerência conjunta entre governo e população, de modo que todos se tornam responsáveis pela preservação e conservação do meio ambiente, por ser um bem coletivo. Além disso, o referido artigo possui um rol de objetivos que devem ser alcançados pelo Poder Público e menciona a responsabilidade

da pessoa jurídica em crimes ambientais – pela responsabilidade objetiva –, a importância da educação ambiental em todos os níveis de ensino e a obrigação de reparar por aquele que polui ou degrada. Esse direito material não poderia mais ser interpretado por juristas do Direito Administrativo, tendo em vista seus princípios próprios, como os do usuário-pagador e da prevenção, além das diversas referências a conceitos de biologia, química, geografia, etc. Tornou-se imperativo um novo ramo, especializado nas questões ambientais. Mas quais são as questões ambientais? Segundo José Afonso da Silva, o Direito Ambiental inclui o meio ambiente natural, o meio ambiente artificial (urbano), o meio ambiente do trabalho e o meio ambiente cultural, ou seja, tudo o que envolve o ser humano. Até porque são o bem-estar e a qualidade de vida do ser humano os bens jurídicos resguardados pela legislação, uma vez que a preservação do meio ambiente

natural, a regulação do espaço urbano, a proteção do trabalhador e a conservação dos bens móveis e imóveis com valor histórico são imprescindíveis para esse fim. A conscientização das pessoas também mudou ao longo dos anos, o que poderia justificar o crescimento do “mercado verde”: consumidores mais exigentes preferem produtos e serviços de empresas com projetos de preservação ambiental ou selos e certificados de gestão ambiental, na qual se incluem planos de gerenciamento de resíduos, da água, dos insumos utilizados, entre outros critérios. O interesse das empresas pode ser econômico, pode ser que elas não se importem com o meio ambiente e só queiram passar uma imagem de “preocupada com a natureza”; mas é certo que o Direito Ambiental ganha força a cada dia, e com isso todos nós ganhamos. 1_SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional

A Sociedade Civil na Rio+20: a necessidade de princípios não-regressivos Vanessa Lemgruber Multiplicidade: a única definição que encontro para os dias nos quais o Rio foi cede das três vias da Rio+20: o processo oficial com os Major Groups e Side events; o semi-oficial , como a Arena Socioambiental e outros espaços organizados pelo Governo Brasileiro; e o autônomo, sendo a Cúpula dos Povos e o Youth Blast as principais iniciativas organizadas pela sociedade civil. Mas voltando às definições e às dificuldades em estabelecê-las; delimitar os contornos do que foi a Cúpula dos Povos é elevar essa multiplicidade ao expoente. Fazer um recorte do evento pode ser considerado tão árduo trabalho quanto o de escolher uma única paisagem do Rio de Janeiro para ser emoldurada na eternidade. Numa atmosfera quase poética, pessoas de todas as nações se reuniram, buscando se fazer escutar pelas autoridades envolvidas na Rio+20: Agricultores de associações campesinas das Filipinas, Índia e Camboja mostravam que é possível uma forma alternativa de produção agrária; grupo de jovens mulheres ativistas do Canadá levantava sua voz em defesa da Pacha Mama;organizações como a TEBTEBBA(Indigenous Peoples’Internacional Centre for Police Research and Education) defendiam a necessidade de um substrato protetivo e de autodeterminação indigenista;hare

Krishnas,padres Agostinianos e pajés indígenas mostraram como o Sagrado pode estar alinhado às questões da natureza;stands em defesa da conservação do Cerrado se destacavam; estudantes e pesquisadores universitários posicionavam-se de forma ativa nos debates; incansáveis discussões, muitas vezes lideradas por representantes da “La Vía Campesina”, em oposição à economia verde... Uma atmosfera quase poética, demasiada pluralidade. A economia verde, modelo de desenvolvimento descrido pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) como “aquele que resulta em melhoria do bem-estar humano e da igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos ambientais e a escassez ecológica.” pondera que o crescimento na renda e no emprego deve ser puxado por investimentos públicos e privados que reduziriam emissões de carbono e poluição. Essa rota de desenvolvimento deve manter, aprimorar e recuperar o capital natural degradado, traduzindo-o como ativo econômico e fonte de benefícios públicos, “especialmente para a população pobre cuja sobrevivência e segurança são mais direta e imediatamente afetadas por desequilíbrios nos sistemas naturais”(vide efeitos das secas em regiões pobres)

A sociedade civil tem baseado suas críticas à esse modelo em,basicamente, dois eixos. A crítica feita por um deles pode ser sintetizada no que diz respeito a uma nova etapa ineficaz do ciclo capitalista em relação ao meioambiente, o que acabaria por transformar bens comuns como as florestas e os oceanos em objetos de especulação,acumulação e apropriação.Com benefícios em curto prazo,na garantia de maior ganho econômico, essa usurpação dos bens comuns de todos os seres vivos, segundo os que defendem essa crítica, tende a impedir que soluções realmente inovadoras venham a se consolidar, pois mantém a mesma estrutura evidenciadora de desigualdades sob um nova roupagem verde. O segundo eixo pode ser descrito como ceticismo em relação ao termo e sua relevância, ou seja, haveria real necessidade de criar um novo termo sendo que não se tem uma definição clara e precisa do mesmo?Muita energia seria gasta em processos nem tão produtivos ao invés de manter o foco em questões já conhecidas que de fato poderiam evidenciar mudanças. Mas,observando-se por uma outra óptica a problemática em questão, alguns afirmam que, apesar das críticas serem importantes, elas não seriam capazes de reduzir ao mínimo a potência da Economia

Verde como fator de solução para demandas ambientais e sociais. Ao interligar práticas econômicas a pleitos ambientais, esse modelo econômico levaria a uma rápida incorporação de ações “verdes” ao cotidiano de empresas e governos. Essa posição, adotada por personalidades como o presidente francês François Hollande, pode muitas das vezes esconder um discurso falacioso para a defesa da queda de medidas protetivas em relação ao meio-ambiente que alguns países emergentes podem vir a adotar. É defender o prisma do deslocamento de recursos e responsabilidades;é aplicar, em mais consumo, os recursos economizados no decoupling, o que pode vir a criar pressões adicionais sobre os ecossistemas dos países do sul. Bem, isso é o que me parece. Transcrevo o que afirmou Hollande quando questionado sobre a Rio+20: “O desenvolvimento sustentável também é uma maneira de sairmos da crise, embora não nos proteja dela. Para isso, devemos combater o protecionismo.Não é um entrave, mas uma oportunidade. Não é uma ferramenta de protecionismo para favorecer países’’ Pois bem,se na declaração final os governantes presentes na Rio+20 parecem ter concordado apenas nos pontos mínimos,deixando as grandes questões para a agenda pós-evento de 2015; acho correto concordar

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OSREV

Artigo em uma das pontuações de Amalio de Marichalar,presidente do Foro Soria 21 para o Desenvolvimento Sustentável:se não fosse pela iniciativa da sociedade civil, a problemática ambiental ainda estaria estagnada em discussões teóricas. É sob essa mesma óptica de valoração da sociedade civil que Jérôme Fromageau, participante da Rio+20, seguiu em seus ajuizamentos. Ações importantes a serem desenvolvidas pela coletividade podem ser exemplificadas pela necessidade de se pensar a criação de um Tribunal Penal Ambiental Internacional e também de um organismo específico (à exemplo da OIT e UNESCO)para questões pró-ambiente mediante a ineficácia muitas das vezes encontrada no PNUMA;ponderando se essa concessão maior de poder seria bem utilizada pelo órgão a ser criado. Além disso, também caberia à coletividade o papel de fiscalizar a aplicação do Princípio da nãoregressão. Essa irreversibilidade em matéria de direito ambiental pode ser entendida como a aplicação de um direito progressivo, não comprometedor de gerações futuras.Um direito de eficácia real, que apesar de pautado em lentas transformações,seriam elas qualitativas e relevantes.

Voz da Gestão Olha o CAAP aí! Olívia Paixão

Jérôme vai defender ainda uma questão que está em consonância com o defendido pelos presentes na tarde de quarta-feira na Arena Rio 20: a necessidade de volta às origens e valoração de conexões regionais. O retorno às tradições indigenistas em respeito e valoração da Terra, bem como a importância de um desenvolvimento regional, que busca inspiração em comunidades com similaridade histórica e natural se faz urgente. O Brasil não deve, por exemplo, buscar adequar nossa realidade ao sistema protetivo da Finlândia, cujas florestas e extensão territorial em pouco se assemelham às brasileiras.Um retorno a tradição de povos nativos ou de valoração da cultura de comunidades interioranas como a das quebradeiras-de-coco poderia se mostrar mais eficaz.

Não que se deva desconsiderar a experiência estrangeira, mas sim que haja uma melhor adequação à realidade do nosso país: que seja - como já diriam os modernistas de 1922- uma real antropofagia do que é produzido fora daqui. Exemplos como a Constituição de 2008 do Equador que trata a natureza como sujeito de direitos ao valorizar as raízes ancestrais do povo; e da do Butão que instituiu o dever de preservar no mínimo 60% das florestas na eternidade não só podem, como devem, ser levados em consideração. Vinte anos se passaram desde a Eco92 e da Agenda 21. É verdade que a conscientização ambiental se mostra muito mais recorrente do que há anos atrás, mas pouco de concreto aconteceu desde então.

Cabe, mais uma vez, à sociedade civil ser protagonista de um processo fundamental para sua própria perpetuação. 2015 será o ano de fechamento das natimortas “8 metas do milênio” e data mágica para entrar em vigor os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que deverão ganhar contornos mais bem definidos a partir de 2013.

Nos vemos lá! Visite:

http://www.rio20.gov.br http://vitacivilis.org.br http://tebtebba.org

A concertação social e a mediação dos conflitos socioambientais no agronegócio: gestão territorial e empoderamento das partes. Profa. Fernanda Aparecida Mendes e Silva Garcia Assumpção*

1- Introdução: A atividade agrícola está, atualmente, em destaque no cenário socioambiental, político e econômico no Brasil. Tratase de um ramo da economia que tem grande representação no PIB (Produto Interno Bruto), destacando-se como o setor que mais cresceu em 2011, além de representar a história e cultura do país. No entanto, é também fator de preocupação para grande parte da sociedade, tendo em vista a questão socioambiental. Como decorrência destes conflitos de interesses, está ainda em curso a “novela” Código Florestal Brasileiro – Lei 12.651/2012, com possíveis alterações em discussão no Congresso Nacional. Estes impasses representam a veridicidade da assertiva de que a tomada de decisão política deve ser embasada na busca da equidade entre Custo Marginal Social (CMS) e Benefício Marginal Social (BMS), analisando-se, para tanto, o risco ambiental. Retoma-se, com esta breve introdução sobre o assunto, a busca por um método de formulação de políticas públicas que efetivamente consiga abranger: aspectos técnicos,

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realidade fática socioeconômica e ambiental, além da harmonização do tratamento jurídico dado com as normas constitucionais e infraconstitucionais vigentes no país. Com a formulação de uma política pública com esta qualidade de atendimento a estes critérios, a prevenção e a resolução dos conflitos se dará de maneira mais efetiva. Falar em conflitos socioambientais no setor do agronegócio é bastante perigoso nos dias de hoje, uma vez que a “ala” do “Veta Dilma” é considerada politicamente correta, e a “ala” do “Sanciona Dilma” é considerada politicamente incorreta. Porém, é um assunto que deve ser discutido de maneira mais sóbria, sem paixões e emoções. Deve-se pautar pela análise técnica e jurídica da questão, não se olvidando da realidade fática, ao buscar uma solução executável, em conformidade com as possibilidades político-institucionais da nação. 2- Método para a construção de políticas públicas eficientes e eficazes. Ao objetivar a formulação de

políticas públicas que efetivamente serão implementadas, de forma legítima e democrática, surtindo efeitos positivos no mercado e no bem-estar social, é interessante retomar estudos acerca do Método Analítico Substancial, de autoria do Prof. Emérito da UFMG, Washington Peluso Albino de Souza. Busca-se, conforme seus ensinamentos, iniciar o conhecimento da problemática social, ambiental e econômica por meio de estudiosos especializados nestas áreas, os quais devem fazer o diagnóstico da situação e a proposição de alternativas técnicas que viabilizem melhorias. Após a realização das hipóteses, atuam os juristas, buscando identificação das propostas com os princípios gerais de direito, com nas normas constitucionais e infraconstitucionais e, por fim, sintetiza as regras que serão aplicadas aos conflitos que venham a se manifestar. O conflito de interesses que permeia a sociedade agrícola e a não agrícola é evidente, não apenas quanto aos termos aos quais o Código Florestal deveria apresentar,

Junho veio, chegou com tudo e logo passou. É de se admitir que junho é o mês da correria e do estresse para todos nós, alunos. Fim de semestre: textos intermináveis, páginas e mais páginas de livros, provas e trabalhos. Ainda há aqueles que, além de tudo isso, leva uma rotina de estágios. Pois é, apesar de toda essa correria, ainda encontramos tempo para planejar atividades e participar de eventos que, na maioria das vezes, são para descontrair e aliviar as tensões. Já falando no alívio de tensões , no início do mês a Diretoria de Relações Públicas promoveu o “Boteco Parahybano” para divulgar o Encontro Nacional dos Estudantes de Direito. Além da cerveja amiga de sempre, o evento contou com um clima diferente, embalando por sons como o de Alceu Valença, já antecipando a espera dos alunos rumo ao Nordeste. Este ano, o ENED acontecerá entre os dias 23 e 30 de julho em João Pessoa e contará com a presença de palestras ministrada por profissionais de destaque, como Roberto Efrem e Rodrigo Faria, ciclo de debates e festas temáticas; isso sem contar com a beleza natural de João Pessoa: com certeza o evento garante as melhores expectativas. Segundo a comissão organizadora, a delegação mineira sairá de BH no dia 20 de julho. No dia 15 de junho, o Território Livre, contou com o encerramento da Oficina de TO (Teatro do Oprimido). Ministrada

por Nuno, multiplicador de Teatro do Oprimido,a oficina teve início no mês de abril e contou com a presença de “espectadores”, não apenas da Vetusta, mas de todos ao cantos da cidade. Para fechar as atividades do semestre, os integrantes apresentaram uma peça do Teatro Fórum – uma das modalidades da única vertente teatral idealizada por um brasileiro. Essa iniciativa da Diretoria de Extensão em trazer para Vetusta as técnicas e filosofia de Augusto Boal (o precursor do TO), foi tão bem recebida que o projeto para dar continuidade às oficinas, com novas turmas e módulos, já está em andamento. Além do Boteco e da Apresentação do Teatro Fórum, foi também promovido no 3º andar, pela Gestão Lumiar, uma Assembleia Estudantil para debater a greve dos professores e servidores técnico- administrativos, deflagrada em grande parte das universidades públicas. Realizada no dia 26 de junho, estiveram presentes no Território Livre, os estudantes da Faculdade de Direito e de outras unidades da UFMG; representantes da APUBH ( sindicato dos professores universitários); do SINDIFES (sindicato dos trabalhadores das instituições federais de ensino) e do DCE. Durante a Assembleia, foi exposta a forma como se dá o diálogo entre os docentes, bem como as principais reivindicações dos professores universitários e servidores

públicos; podendo-se citar, entre elas, a reestruturação da carreira, melhores condições de trabalho e infraestrutura e a crítica ao processo de sucateamento vivido pelas universidades. Assim, conscientes da necessidade de muitos alunos, em vista a paralisação do COLGRAD, o CAAP se disponibilizou a recolher pedidos e documentos de urgência, para serem levados ao órgão colegiado. À pedido do Centro Acadêmico, o Colegiado foi reaberto por algumas horas, recebendo todos os pedidos urgentes encaminhados pelos alunos. Ainda atentos ao mês de junho, é impossível não falar sobre os principais eventos recepcionados pelo Rio de Janeiro: Cúpula dos Povos e a Rio +20. O objetivo da Conferência, que aconteceu após 20 anos da Eco92, foi a renovação do compromisso político com o desenvolvimento sustentável, tendo em vista analisar os avanços e retrocessos da atuação de muito países, analisando ainda, as necessidades de outros, para propor soluções e efetivá-las. Entretanto, sabe-se que muitos assuntos de interesse mundial foram sendo deixados de lado, excluídos das pautas de discussões. E é justamente aí que entra a Cúpula dos Povos, realizada paralelamente à Rio +20. O intuito da iniciativa é dar visibilidade aos vários temas não tratados na Rio +20 e, ainda,

produzir convergências entre movimentos de mulheres, indígenas, negros, juventudes, quilombolas, entre tantos outros grupos e parcelas da sociedade. Muitos estudantes da FDUFMG, entre eles membros do Polos e do CAAP, foram ao Aterro do Flamengo para participar das discussões e debates; ajudando a compor o cenário de multiculturas, diversidade e cores. Como se afirmou na Declaração Final do evento, as assembleias, mobilização e a Grande Marcha dos Povos foram os momentos de expressão máxima dos interesses de todos que ali estavam. Bem, depois de toda essa correria, de tantas atividades e também estudos, devemos admitir o quanto julho é esperado por todos. É certo que alguns dias de descanso e paz é tudo o que nós merecemos por agora. Apesar de ainda não sabermos, ao certo, como será nossa rotina de aulas no segundo semestre (devido à paralisação dos professores universitários), as próximas semanas serão dedicadas exclusivamente a nós, afinal, as férias é o melhor momento para pôr nossa vida em ordem, recuperar o fôlego e esperar pelo que virá. Sendo assim, é hora de querer e desejar bons dias assim para todos, ótimos momentos de descontração e intermináveis horas de sono, de muito sono!

Voz Ciências do Estado Tecendo a manhã nas ciências do Estado Vander Rabelo

como também sobre a legislação a ser aplicada em cada caso concreto: se a legislação federal ou a estadual. No caso de Minas Gerais, temos a lei 14.309/2002, a qual era extremamente criticada pela “ala” do “Veta Dilma”, e que agora está defendendo a sua aplicação, tendo em vista ser menos permissiva que a Lei Federal 12.651/2012. Percebe-se, então, uma insegurança jurídica quanto à forma como se deve agir. Por exemplo: No antigo Código Florestal (Lei 4.771/65), a APP – Área de Preservação Permanente só poderia sofrer intervenções em casos de Utilidade Pública, Interesse Social e Baixo Impacto, tendo sido regulamentada pela Resolução CONAMA 369/2006. Outra regulamentação federal é a Resolução CONAMA 302 e 303/2002, as quais caracterizam a APP. No entanto, a Lei Mineira 18.365/2009, modificadora da Lei 14.309/2002, inseriu o conceito de área agrícola consolidada, possibilitando o “direito adquirido” de permanecer lavouras em APP. Pergunta-se: qual lei deve ser respeitada? Nota-se que não há a adoção de

* Mestre em Direito Empresarial. Professora e Coordenadora-adjunta dos cursos de pós-graduação em Direito Ambiental e em Regime Jurídico dos Recursos Minerais da Faculdade de Direito Milton Campos. Advogada.

João Cabral de Mello Neto, poeta brasileiro, nascido em Recife, passou a infância nos engenhos de açúcar. Ingressou, já adulto, na carreira diplomática, servindo em vários pontos do mundo, como Londres, Barcelona, Madri, Porto, Sevilha e Rio de Janeiro. Mas seu canto literário, sua linha-mestra e seu engenho poético transcenderam fronteiras diplomáticas e fronteiras métricas e foram encontrar asilo no tempo cotidiano, no exercício da linguagem enquanto ato temporal imprescindível. Em um de seus mais belos poemas, intitulado “Tecendo a manhã”, João Cabral articulava que “um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos” que cruzem os “fios de sol de seus gritos” para que a manhã, desde uma “teia tênue, se vá tecendo”. E é esse poema, “Tecendo a manhã”, que deve ser dedicado às alunas e alunos do curso de Ciências do Estado, para que os fios solares da democracia revelem a manhã (mesmo que tênue), sobrepondo a noite da ditadura acadêmica ainda presente na mentalidade frágil de quantos insistem em vilipendiar e extinguir um curso ainda promissor e prenhe de desafios.

Ainda bem que algum canto, tecido coletivamente, despertou o movimento de manifesto em prol do curso, pois já não nos cabe mais o papel de bobos da corte acadêmica. É preciso mais transparência e informação real sobre a manobra política por trás do fechamento do curso. O tempo que agora escoa, líquido como a fluidez de um voo raro, não deve ser gasto com simulações políticas de etiquetismo social e silêncio ingênuo. Não é hora de vendar os olhos e fingir não enxergar o óbvio: que tudo não passa de um jogo político orquestrado em desalinho com a democracia e desafinado com a cidadania, que só pode ser regida sob a maestria da transparência. O boato sobre o fechamento do curso, os murmúrios sob as sombras dos corredores da faculdade, o eco fantasmagórico de um juridiquês perverso e malsão, as ameaças e retaliações grunhidas pelos desafetos gratuitos do curso de Ciências do Estado, são o anticanto, o antidespertar, a extensão torturante da sombra, negando a insofismável manhã. Aos boatos de antão, respondemos com o canto tecido em cidadania desperta, amanhecida sob a luz tênue,

quase invisível, do canto sufocado de cada aluna e cada aluno engasgados com o sorriso fúnebre de quem pensou sepultar o curso e enterrar vivo o percurso acadêmico de cada estudante das Ciências do Estado. É um exercício mental funesto pensar que o nosso curso viveria seus últimos suspiros, moribundo, vítima do vírus da antidemocracia, de institucionalismos baratos e antiéticos, dos dogmas do politiquismo acadêmico. Dogmas servem de muletas para aqueles que ironizam as guerrilhas, as reais como a do Araguaia ou as simbólicas como as das salas de aula do curso de Ciências do Estado. Muletas só têm serventia para quem já não se movimenta! Muletas institucionais, muletas verbais, muletas para quem imagina ter a alma vestida de terno e gravata, embora não tenha sequer a força de um canto preambulando a tênue mas inevitável manhã. É que não contavam com uma nova manhã, ou com o canto de um galo acordando outros, e com o grito afinado de galo a galo, sufocando boatos e terrorrismos institucionalizados... Não contavam com a dialética da própria noite, que diz que não há como atravessar duas vezes a mesma sombra

acadêmica, mesmo porque toda sombra é introdução para o manifesto solar... Cada manifesto das alunas e alunos das Ciências do Estado é o solar da democracia suada dia após dia em aprendizado e provas, exercícios de tessitura libertária e textura cidadã. Tudo isso é o que a banda desafinada do poder transitório, a reitoria sem maestria e a diretoria da faculdade, em solfejos e assobios fascistas, não queriam. O que eles queriam é nosso eterno silêncio no funeral de nós mesmos! Acontece que não haverá mais funeral enquanto o canto matutino persistir e o fio tênue da democracia servir de toldo para a nova manhã. E a nova manhã já se aproxima, pois não há mais lugar para os velhismos dogmáticos e para o militarismo acadêmico. O agora é a ágora onde o grande convidado para a festa da democracia é o cantor cotidiano das melodias interdisciplinares, da pluralidade epistemológica e da pedagogia do bom senso democrático. Às alunas e alunos de Ciências do Estado, emprestemos o canto de galo apanhado do grito e do olhar de esperança e luta de quem tece, coletivamente, a tenda e o toldo aéreo de uma labuta democrática que se eleva no ar. Cantemos, que a manhã já vem chegando!

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FRENTE

Voz Cinema

Artigo

Resenha de A Pele Que Habito Valmerson B. Nunes

Ninguém está a salvo de si mesmo Pedro Almodóvar é um cineasta de excessos. Não lhe interessa o Cinema que transpareça controle, que se amolde a um gênero específico ou que seja refreado por convenções. No entanto, desde o deslumbrante “Fale com Ela”, o maior excesso de Almodóvar tem sido seu nome. Tal e qual cineastas tão diferentes quanto Woody Allen, os irmãos Dardenne e Ken Loach, Almodóvar tornou-se uma grife do “Cinema de Arte”, uma marca que atrai pelas expectativas que, justificadamente, funda. No entanto, diferentemente dos colegas citados, Almodóvar parece se incomodar com essa zona de conforto. Ele busca, a cada obra, subverter nossas expectativas, reelaborando seu sistema de referências e as particularidades que tornam peculiar a sua filmografia. Almodóvar não quer, enfim, estar sob a sombra de Almodóvar. O estilo “transbordante”, aliado à necessidade de surpreender, funciona bem quando se volta ao singelo (como no ótimo “Volver”), mas gera uma verdadeira implosão criativa quando é superlativo e excessivamente ambicioso – “Abraços Partidos”, nesse sentido, é seu maior fracasso. Já “A Pele que Habito” se encaixa a essa lógica de maneira estranha. Muito se alardeia a incursão de Almodóvar pelos gêneros de terror e ficção científica; o espectador habitual do diretor, entretanto,

sabe que, sim, verá terror e ficção científica, mas também suspense, e pastiche, e melodrama, e crítica social. A bricolagem de gêneros é um dos sentidos que se dá ao adjetivo “almodovariano” e faz todo sentido em “A Pele...”, um filme que trata, literalmente, da sobreposição de identidades, ou melhor, da identidade que surge a partir dos fragmentos de várias outras. Pouco se pode dizer do roteiro, sob pena de se estragar surpresas. Basta saber que se trata da história de um médico, Robert (Antônio Banderas, soberbo), uma mistura de Dr. Phibes com Dr. Frankenstein, que perde a esposa num incêndio e resolve criar uma pele resistente à dor e ao fogo. Para tanto, ele realiza seus experimentos numa cobaia humana, Vera (Elena Anaya). Em segundos, Almodóvar é capaz de se valer de acordes que remetem a “Psicose”, reformular a estética da “tortura pornô” e chegar ao bizarro de Cronenberg, fazendo o que parece ser simples, muito mais complexo. Complexo também porque esse é um filme sobre a vingança e sobre o passado. É como se a possibilidade de nos sentirmos em paz só fosse exequível se pudéssemos implantar o pretérito no presente, num processo intrincado de mutilação e de vingança contra aquilo que fez do passado tudo o que ele não deveria ter sido.

Voz Literatura

Resenha de Festa no Covil, de Juan Pablo Villalobos Jamilla Monteiro Sarkis

Sórdido, nefasto, pulcro, patético e fulminante. Essas são algumas das palavras exóticas que fazem parte da coleção de Tochtli, uma criança de idade indeterminada criada pelo pai Yocault, “el rey del narcotráfico”, em um verdadeiro castelo nos confins do México. Essas palavras são, também, poderosos adjetivos para a narrativa, construída a partir da busca do pequeno príncipe Tochtli por um valioso item capaz de completar seu mini zoológico: um casal de hipopótamos anões da libéria. O menino, que conhece menos de quinze pessoas e gosta de filmes de samurais, chapéus e franceses vive isolado, refém de uma rotina desconcertante. Sua solidão é compensada pelo pai

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com presentes caros – até aqui, nada anormal – e seus caprichos, como a manutenção de leões e aves raras em seu jardim, em vez de cachorros e periquitos, são sempre realizados. Seus relatos são perturbadores, pairam entre a inocência e uma crueldade madura ao extremo, entre uma doçura infantil e uma frieza mórbida. Ao longo da história, Totchili desperta no leitor pena e repugnância, simpatia e estranheza. O mesmo acontece com Yocault, ora o pai que tenta proteger seu filho dos males de um mundo tão violento, ora traficante sanguinário e psicótico. É um texto acima do bem e do mal, envolvente e divertido ao extremo, da maneira mais bizarra possível. Trata-se de um livro infantil

para adultos. O rei, um traficante; o príncipe, uma criança assustadora; o castelo, decorado por armas pesadas e palco de negociações criminosas. Em menos de 90 páginas, a narco-novela de Juan Pablo Villalobos, mexicano que vive atualmente no Brasil, ultrapassou as barreiras continentais e foi editada originalmente na Espanha, traduzida para diversos idiomas e selecionada pelo jornal inglês The Guardian entre os cinco finalistas do First Book Awards. É um panorama perfeito, feito à distância e de maneira brilhantemente metafórica, da atual conjuntura mexicana, um país imerso pelo caos da guerra contra as drogas e das controversas atitudes governamentais.

Vingança, passado e identidade afluem para a necessidade de se estar a salvo das próprias obsessões e temores. Poderíamos, então, dizer que “A Pele que Habito” também é um filme sobre segurança íntima. Câmeras de vigilância interna, uma clínica isolada, uma jaula, um tigre, os quadros de corpos sem rostos, o sexo sem penetração, há vários elementos que remetem ao ideário do “estar seguro”, mas que contribuem para o inevitável descontrole. Porque a segurança que se constrói sem liberdade é como a pele que aparentemente protege, mas que, na verdade, reveste um corpo amorfo de medo, insegurança e violência. Tantos temas a se imiscuir costumam levar Almodóvar ou à obra-prima, “Fale com Ela”, ou ao fracasso, “Abraços Partidos”. E aí entra a decepção desse “A Pele que Habito”. Entre rupturas e anomalias, o filme caminha de maneira desequilibrada: o começo e o final são avassaladores, mas o segundo terço não conduz o espectador de maneira orgânica, ora perdendo-se em reminiscências que comprometem o tempo cinematográfico, ora mastigando o óbvio, ora tangenciando temas periféricos. Ainda que passe longe de ser ruim, “A Pele...” não é capaz de cumprir a contento a tarefa de ser Almodóvar, sem ser apenas mais um “de Almodóvar”. Como aponta o filme, ninguém está a salvo de si; e pelo visto, nem mesmo seu diretor.

um método eficiente para a produção, formulação de políticas públicas no Brasil, causando verdadeiro caos legislativo e a sensação de injustiça para todas as partes e interesses envolvidos, os quais gostariam de ver aplicada a lei (no caso, a que lhe favorece). A resolução da questão acima abordada inicia-se, necessariamente, no campo jurídico, pela análise das competências constitucionais (legislativa e administrativa), caracterizando-se, no caso do meio ambiente, como competência comum e concorrente. No entanto, a jurisprudência têm se assentado no uso da lei menos permissiva e mais protetiva do meio ambiente, contrariando, obrigatoriamente, a observância de um dispositivo legal, com consequente revolta e descontentamento por parte daqueles que se julgam injustiçados. 3- A concertação social como instrumento para gestão territorial e empoderamento das partes.

A concertação social é um instrumento de gestão territorial, utilizado em França, conforme explicitado pelo Instituto Comédie. Trata-se de um sistema de ampla democracia, no qual há o empoderamento das partes e o fomento ao diálogo, para a efetivação da pacificação social. Este empoderamento é importante para que as partes possam equilibrar os poderes, havendo, assim, possibilidades de firmarem um acordo justo para ambas. Este sistema deveria ser executado no Brasil, especialmente no conflito referente aos interesses socioambientais e econômicos que permeiam o agronegócio e meio ambiente, possibilitando amplo diálogo, com empoderamento técnico-jurídico de ambas as partes, tornando a discussão mais plausível de nos levar a um acordo executável, sem emoções e paixões. Para tanto, a utilização do Método Analítico

Substancial, para fins de formulação do Novo Código Florestal e suas alterações seria um importante instrumento para se chegar a uma solução justa e plausível. 4- A mediação de conflitos socioambientais: Os conflitos de ordem socioambiental sempre envolvem, também, o interesse econômico, uma vez que, pelo menos o produtor rural, necessita do lucro para sobreviver, pretendendo continuar suas atividades. No entanto, apesar de ser um importante setor econômico para o Brasil, não há investimento em educação, inovação de ideias (não tecnológica), sem uma sociedade extremamente conservadora, desunida (principalmente os pequenos produtores) e desinformada (exemplo disso é a falta de conhecimento, por parte dos pequenos proprietários, de

que existem programas estatais de regularização ambiental gratuito para eles). Assim sendo, tornam-se massacrados pelos discursos do ambientalmente correto e da impossibilidade de se regularizarem, tendo em vista a desinformação, a desunião da classe, além da falta de condições financeiras (para o pequeno produtor), para custear procedimentos caros e burocráticos. Assim, a instituição de Câmaras de Mediação de Conflitos Socioambientais é interessante, na medida em que se trabalha com equipe multidisciplinar, estudando profundamente os casos, em busca da melhor solução técnica e jurídica para o caso. Além, é claro, de ser mais rápida, menos amedrontadora para aqueles sem costume de lidar com juízes, togas etc, implementando, em sua sistemática, a concertação social, com consequente gestão territorial e empoderamento das partes.

(Des)envolver, resistir e consolidar Eduarda Figueiredo Certa vez, tive a feliz oportunidade de ouvir Virgílio M. Viana, irmão do nosso querido Professor Márcio Túlio, e, dentre todas colocações interessantes que fez, uma palavra mereceu destaque: (Des) envolvimento. Um tempo esquecida em minhas reflexões, pode reaparecer num momento muito oportuno, a Cúpula dos Povos, encontro

paralelo à Rio +20 por contestar suas pautas oficiais, a economia verde e institucionalidade global. Desenvolvimento sustentável foi o discurso orientador da Conferência que reuniu Chefes de Estado de todo mundo, mas até que ponto é possível pensar em sustentabilidade no sistema de produção no qual estamos inseridos?

Dividir os espaços e discussões da Cúpula com pessoas de diversos lugares e trajetórias me fizeram retomar aquela palavra que uma vez escutei, envolvimento. Pela definição trazida pelo dicionário ao verbete desenvolver, Virgílio demonstra que “desenvolver uma pessoa ou comunidade significa retirála do seu invólucro ou contexto ambiental; descomprometê-la com o seu ambiente.” Isto é, fragilizar os laços que a pessoa possui com seu lugar de origem, seja da região ou do grupo ao qual pertence. Com a mercantilização dos recursos naturais, dos meios de produção, da vida dos povos, pensar nesse retorno, nesse envolvimento é crucial, pensar e realizar o envolvimento sustentável. “Por envolvimento sustentável poderíamos entender o conjunto de políticas e ações direcionadas para fortalecer o envolvimento das sociedades com os ecossistemas locais, fortalecendo e expandindo os seus laços sociais, econômicos, culturais, espirituais e ecológicos; com o objetivo de buscar a sustentabilidade em todas essas dimensões.”, é o que ensina Virgílio. Portanto, o envolvimento é uma idéia que se amplia para além da relação saudável entre pessoa e meio ambiente, ela pressupõe a sustentabilidade também nas relações humanas. Requer o convívio, a troca, o reconhecimento do outro para que sejam concretos projetos comuns de convivência construídos de forma cooperativa. Isto perpassou toda a diversidade

que lá esteve presente, movimentos de mulheres, pelo direito a cidade, indígenas, negros, juventudes, agricultores familiares e camponeses, trabalhadores, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, enfim, lutadores do povo e para o povo. Todos, a seu modo, buscam voltar ao lugar que nos unia, um lugar de comunhão, no qual nos sentimos parte e de onde não somos expropriados do que é caro à vida. Envolver significa também voltar ao início, à raiz. Na radicalidade que estavam centradas as discussões, no sentido de atacar a fonte, o princípio gerador, pois, na Cúpula dos Povos se negavam as falsas soluções, estas que não pautam as contradições do capital que se impõe sobre as demais esferas da vida, que não analisam a economia verde como uma das expressões da atual fase financeira do capitalismo. Envolver também é democracia, são os oitenta mil que foram as ruas, cada qual com sua bandeira que, no fim, convergem-se numa só, na solidariedade e luta dos povos do mundo. E, especialmente, dentre outros vários significados que aqui não caberiam, envolver para mim foi perceber que este momento tempestivo pelo qual o curso de Ciências do Estado passa, de discursos superficiais e verticais, fez com que @s estudantes voltassem, como nunca, ao curso, à nossa história, à reunião, ao diálogo, à cooperação e ao (muito!) trabalho. Envolver-se também é Resistir e Consolidar.

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Vozes Malditas

Voz Ilustrada

“Heráclito foi aquele que disse: nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia.” Renato Cardoso.

“Não é inconstitucional, é sacangem mesmo. Fere o principio supraconstitucional de que não se deve sacanear ninguém” Túlio Viana.

“Isso de colocar frases fora de contexto é coisa de jornal de quinta categoria, tipo

Super, Aqui...”

Professor Fábio Gabriel (Empresarial II), em seu último semestre na Vestusta, comparando o Voz Acadêmica aos Jornais mais sangrentos da cidade.

“A pessoa que fez essas pilastras nas salas devia ser condenada e presa num tribunal penal internacional, em Haia!” Leonardo Nemer Caldeira Brant, discursando sobre o uso arquitetônico do direito penal.

“Quem manda aqui é o Canedo: qualquer disposição contrária, vide artigo 3 do Código Penal.”

Dica do Mês Resenha de Dexter “Tonight’s the night. And it’s going to happen again and again. It has to happen.” (Essa é a noite. E irá acontecer de novo e de novo. Tem que acontecer.) Dexter é uma série de romances do autor Jeff Lindsay que teve sua adaptação para a televisão em uma série homônima. Tanto o livro quanto a série centramse em Dexter Morgan, um serial killer que possui vida dupla. Durante o dia, Dexter trabalha como analista forense especialista em padrões de dispersão de sangue no departamento de polícia do Condado de Miami-Dade, durante a noite, desperta seu “dark passenger” assassinando aquelas pessoas que são comprovadamente homicidas e que, por um motivo ou outro, não foram penalizados por seus crimes. Em um primeiro olhar, a série parece um tanto macabra, mas, na verdade, está longe disso. A narrativa foca, sobretudo, na humanidade de seu protagonista que, por mais que insista em se afirmar “vazio por dentro”, à medida que a série vai caminhando enfrenta diversos conflitos ao descobrir que também pode ter sentimentos. A sua necessidade de matar é, então, justificada por um grande trauma de infância que vai sendo explorado ao longo da narrativa, o que contribui para que o personagem, adquirindo um cromatismo que o distancia da estrutura plana dos personagens maniqueístas, torne-se verdadeiramente carismático. E não é só por tudo o que envolve o protagonista, mas pelo enredo, a riqueza de detalhes, os demais personagens, o suspense, as diversas tramas que se desenvolvem a cada temporada e a cada livro que vale a pena não só ler como também assistir Dexter.

Uma certa Voz

Canedo lembrando a todos qual artigo disciplina o regime jurídico especial dele.

“Não me venha com essas “idéias” no direito empresarial não!” Eduardo Pimenta falando o que pensa sobre essas idéias de “voto democrático e igualitário”.

“Ai gente, não gostei de sair no Voz Acadêmica ao lado daquela bruxinha feia de Harry Potter. Vou é fazer uma boa plástica, para que da próxima vez me comparem com a Barbie.” Sheila Selim, mostrando seu descontentamento com a comparação feita no Separados pelo Nascimento. .

Hipotermia Morreu. Entre folhas de jornal esquecido sob as letras manchadas que em breve tornariam pública sua morte solitária. Morreu. No frio do esquecimento e do banco da praça. No frio do homem. Morreu.

Separados pelo Nascimento

Oculto pela noite e pela não-vida sob as folhas de jornal. Morreu. Sem deixar lágrima,

herança ou epitáfio. Talvez fosse um vira-lata, Sem deixar nada talvez, um monte de entulho além de uma nota ou um bicho qualquer. no canto esquerdo do jornal, Morreu. Invisível sob as folhas de jornal. ao lado da coluna de esportes.

Sheila Selim

Barbie

X 08

Marcelo Maciel Ramos

X

Danilo Gentili

Thomas Bustamant

Ringo Starr

X

Sem nome, sem número, sem lenço. - se ao menos tivesse um lenço, talvez não tivesse morrido. Morreu.

Morreu. Tão e somente morreu. Sozinho. Frio. Oculto sob as letras do jornal.

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