Competências Profissionais Laureate - Módulo 1 - Introdução

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Competências Profissionais Laureate

Módulo 1 - Introdução

Claudia Kober

CODESE Coordenadoria de Desenvolvimento Educacional Competências Profissionais Laureate · 1


2 路 Compet锚ncias Profissionais Laureate


Módulo 1 Introdução às Competências Profissionais Laureate Claudia Kober

O CONCEITO DE COMPETÊNCIA: �oliss�mico e com�le�o Quando dizemos que alguém é competente nos referimos a uma pessoa que desempenha com maestria o seu trabalho: que tem os conhecimentos e habilidades necessários a entregar um resultado adequado às demandas. E, quando se trata de enfrentar uma sociedade e um ambiente de trabalho complexos e em permanente mudança, tem um conjunto de atitudes e comportamentos que permita uma convivência saudável, respeitosa e criativa com os demais. Parece relativamente claro e simples, mas como adverte Perrenoud (RODA VIVA, 2001), não é. Não há consenso sobre o que significam as competências, nem no plano ideológico, nem no plano teórico e conceitual -- talvez por ser um conceito ainda em construção, como aponta Le Boterf (apud FLEURY E FLEURY, 2001, p. 194). No entanto, o fato de não haver consenso sobre o significado de competências não as torna menos importantes, seja no campo de trabalho, seja no campo da educação. Mas torna necessário entender o processo de construção e de assimilação desse conceito nesses dois campos. A noção de competência ganha força para dar conta das transformações do mundo do trabalho ocorridas principalmente a partir dos anos 1980-90. Para enfrentar um mercado em crise e uma sociedade crescentemente complexa foram introduzidas novas formas de organização do trabalho e novas formas de gestão, modificando de modo crescente e gradual o modo taylorista de produção. Para fazer face às novas organizações do trabalho, que vêm substituir as funções repetitivas, mecânicas e sem iniciativa, típicas do período fordista, é necessário um trabalhador que além de “saber fazer” seja capaz de pensar soluções criativas, transmitir com eficiência suas ideias, de modo escrito e oralmente; seja capaz de interpretar dados e tomar decisões fundamentadas; saiba trabalhar em grupo e tenha iniciativa, entre outras características desejáveis. Ou seja, além das habilidades e saberes diretamente relacionados ao posto de trabalho, é necessário o desenvolvimento de aspectos mais comportamentais, ligados à subjetividade. Não é de estranhar, pois, que essa noção tenha nascido no interior do mundo corporativo e tenha migrado para o campo da educação por meio das orientações de organismos internacionais como a OCDE, UNESCO, BIE (Bureau International de l’EduCompetências Profissionais Laureate · 3


cation) e Organização Mundial do Trabalho, sendo incorporada, no Brasil, nas diretrizes nacionais do Ministério da Educação para os diferentes níveis de ensino. Justamente em função dessa sua origem, o conceito recebe críticas do campo da educação, especialmente daqueles envolvidos no Ensino Fundamental e Médio, que julgam questionável a ideia de que a educação deva ter um caráter utilitarista e voltar-se para a preparação para o mundo do trabalho desde cedo. No entanto, quando pensamos na formação profissional e no Ensino Superior, a abordagem de um ensino por meio das competências não chega a ser nem muito nova e nem questionável, uma vez que “sempre se tentou analisar as tarefas e, portanto, os recursos necessários para o trabalho”, como aponta Perrenoud (RODA VIVA, 2001). Nesse nível de formação, é imprescindível que se tenha um olhar para o mercado de trabalho e suas demandas, sob pena de se formar profissionais que não apresentem as características indispensáveis à inserção no mundo do trabalho. Embora necessárias, as credenciais formais, como certificados e diplomas não são mais suficientes para o ingresso e a permanência no mercado de trabalho. A segurança proporcionada pela obtenção de um diploma universitário, que parecia tão óbvia, não mais existe. Hoje, um diploma não garante mais um emprego, muito menos para a vida toda. Por isso, “no mundo do trabalho, desenvolver as próprias competências deixou de ser uma escolha, passando a ser uma simples condição. São cada vez mais raros os setores nos quais é possível sobreviver sem aprender” (PERRENOUD, 2013, p. 31). Essa evolução exige das instituições que formam profissionais uma nova visão do ensino, que crie oportunidades aos seus estudantes para que desenvolvam as competências necessárias a essa nova organização do trabalho. E mais do que isso: tenham uma atitude de autodesenvolvimento permanente. Mas afinal, o que são competências? Perrenoud (2013) adverte que a noção de competência, não apenas faz parte da linguagem comum, mas se insere nos campos conceituais específicos das diferentes áreas, tais como economia, educação, psicologia, sociologia e linguística, trazendo definições muitas vezes próximas, mas não idênticas. No entanto, ele aponta um consenso nas áreas da educação e do trabalho em torno da definição: “a competência é o poder de agir com eficácia em uma situação, mobilizando e combinando, em tempo real e de modo pertinente, os recursos intelectuais e emocionais” (PERRENOUD, 2013, p. 45). Ou, conforme alguns importantes autores: Tardif (1996, apud PERRENOUD, 2013, p. 45): A competência é um sistema de conhecimentos, tanto declarativos (do que se trata) quanto condicionais (o quando e o porquê) ou processuais (o como), organizados em esquemas operatórios e permitindo, no interior de um conjunto de situações, não apenas a identificação de problemas, mas também a sua resolução, por meio de uma ação eficaz. 4 · Competências Profissionais Laureate


Ou de documentos da educação brasileira: Capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessárias para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho. (Parecer CNE/CEB nº16/99 e Resolução CNE/CEB nº4/99) Competências enquanto ações e operações mentais, (que) articulam os conhecimentos (o “saber”, as informações articuladas operatoriamente), as habilidades (psicomotoras, ou seja, o “saber fazer” elaborado cognitivamente e socio-afetivamente) e os valores, as atitudes (o “saber ser”, as predisposições para decisões e ações, construídas a partir de referenciais estéticos, políticos e éticos) constituídos de forma articulada e mobilizados em realizações profissionais com padrões de qualidade requeridos, normal ou distintivamente, das produções de uma área profissional. (Referenciais Curriculares Nacionais da Educação Profissional de Nível Técnico) Como se pode observar, as definições de competências convergem em diversos aspectos, especialmente no que se refere à articulação própria e única do “CHA” (conhecimentos, habilidades e atitudes), para o enfrentamento de situações ou solução de problemas no campo do trabalho, crescentemente complexo. Nesse sentido, “competência é inseparável da ação (...). A competência baseia-se nos resultados.” (DESAULNIERS, 1997, p. 56. Grifo do autor) Nesse sentido, como apontam Ropé e Tanguy (1997, p. 16), “a competência é um atributo que só pode ser apreciado e avaliado em uma situação dada”. Hoje, mesmo trabalhos menos qualificados exigem do trabalhador uma capacidade de julgamento e de decisão frente a situações imprevistas, que acontecem o tempo todo. Como aponta Zarifian (2001, p. 40-50), são três as principais mutações no conteúdo do trabalho, que impulsionam a necessidade de se pensar o próprio trabalho sob a ótica das competências: a noção de evento, comunicação e serviço. Evento é o que acontece de “maneira parcialmente imprevista, inesperada, vindo perturbar o desenrolar normal do sistema de produção” (ZARIFIAN, 2001, p. 41) ou de prestação de serviço, gerando a necessidade de uma antecipação parcial, por meio da percepção de indícios de sua próxima ocorrência, de uma resposta ou intervenção ativa e pertinente, em curto prazo, no momento da ocorrência, bem como a uma análise posterior das suas causas, para que não volte a ocorrer. Os eventos acontecem em todos os campos de trabalho, seja o do operador de caixa do supermercado, do operário da linha de produção, do professor ou do gerente. Certamente, se você refletir sobre a sua atuação na sala de aula conseguirá identificar inúmeros momentos em que a imprevisibilidade esteve presente. Seja na falta de entendimento dos estudantes sobre um assunto abordado, que exige uma nova explicação ou abordagem, seja na ocorrênCompetências Profissionais Laureate · 5


cia de uma situação de bullying, que exige que o professor faça uma intervenção junto ao grupo. Os eventos exigem uma ação que não consta das prescrições do posto de trabalho. É preciso “inventar respostas a serem dadas num ambiente social complexo e instável” (ZARIFIAN, 2001, p. 42). Nesse sentido, a situação exige uma competência profissional: a capacidade automobilização de recursos cognitivos, mas também sociais, afetivos, motivacionais e de iniciativa. Exige ainda, com frequência, a capacidade de mobilização de uma rede de atores em torno da ação necessária, o que conduz à questão da comunicação. Como afirma Zarifian, “trabalhar é, em parte pelo menos, comunicar-se” (2001, p. 45). Comunicar-se, para esse autor, é construir bases de entendimento e compromisso que garantam o sucesso das ações. E para isso, é necessário que o trabalhador entenda suas obrigações para com os outros e a interdependência das ações, consiga avaliar o impacto das suas ações sobre os demais, chegar a acordos sobre objetivos, regras e compromissos assumidos pelo grupo e compartilhar as informações necessárias para que o trabalho torne-se significativo e alcance a qualidade necessária. Outra grande modificação do conteúdo do trabalho refere-se à questão do serviço. Não do “serviço” como oposição ao setor industrial, mas como intrínseco ao próprio trabalho: “trabalhar é gerar um serviço, ou seja, é uma modificação no estado ou nas condições de atividade de outro ser humano, ou de uma instituição, que chamaremos de destinatários do serviço (o cliente, no setor privado, o usuário, no setor público).” (ZARIFIAN, 2001, p. 48, grifos do autor). Esse destinatário e os serviços prestados podem ser de muitos tipos. Pode tratar-se do fornecimento de abrasivos especificamente desenvolvidos por uma indústria para outra, da elaboração da folha de pagamento pelo departamento de Recursos Humanos ou do trabalho do professor na universidade. Todos esses trabalhos exigem que se conheçam as necessidades, expectativas e modos de pensar do destinatário para que se possa adequar o serviço a ser entregue. Nessa nova concepção de trabalho, podemos dizer, com Perrenoud (2001, entrevista), que o reconhecimento do conceito de competência traz em seu bojo o reconhecimento da complexidade do trabalho e a valorização do sujeito inteligente que pensa em situações complexas, que decide em situações incertas, que age rapidamente e que assume riscos. Frente a esse cenário, cabe a nós, como Universidade e como docentes, ajudar nossos estudantes a dar conta dessa complexidade, levando-os a aprender os saberes e as habilidades necessárias ao seu ofício, mas também a trabalhar a mobilização de recursos cognitivos e afetivos para que possam articulá-los e utilizá-los na vida real. Para um maior aprofundamento sobre a construção do conceito de competência, leia agora dois textos bastante complementares:

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Para saber mais

FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso. Construindo o conceito de competência. Rev. adm. contemp., Curitiba , v. 5, n. spe, 2001 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-65552001000500010&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 07 jan. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-65552001000500010. Nesse texto você encontrará um resumo do debate teórico a respeito da noção de competência, bem como o que significa a competência individual e como ela se relaciona à competência organizacional. Traz também um bom resumo sobre a questão de competências e aprendizagem, que, embora com foco no desenvolvimento das competências dentro das organizações, ilumina o seu desenvolvimento nas instituições de ensino, explorando a noção de competência como agregando valor às organizações, ao mesmo tempo em que traz desenvolvimento pessoal. Philippe Perrenoud: Memória Roda Viva. Transcrição de entrevista realizada no Programa Roda Viva da TV Cultura, em 19/11/2001. http:// www.rodaviva.fapesp.br/materia/250/entrevistados/philippe_perrenoud_2001.htm. Acesso em 07 jan. 2014. Nessa entrevista Perrenoud debate não apenas o conceito de competência e as críticas que se faz a essa noção, mas também a formação de professores (especialmente daqueles que atuam no Ensino Fundamental e Médio) e a necessidade de formar profissionais mais preparados para as demandas da vida.

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BIBLIOGRAFIA DESAULNIERS, Julieta Beatriz Ramos. Formação, competência e cidadania. Educ. Soc., Campinas , v. 18, n. 60, dez. 1997 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0101-73301997000300004&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 11 jan. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73301997000300004 FLEURY, Maria Tereza Leme; FLEURY, Afonso. Construindo o conceito de competência. Rev. adm. contemp., Curitiba , v. 5, n. spe, 2001 . Disponível em <http://www.scielo. br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-65552001000500010&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 07 jan. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-65552001000500010 KOBER, Claudia. Didática: ação pedagógica e avaliação. Unidade 3. Disciplina on-line. Universidade Anhembi Morumbi, 2012. LOPEZ, Maria José Terron, QUINTANA, Paloma V. e GARCIA, Maria José G. Guía para el diseño de recursos docentes que fomenten el desarrollo y evaluación de las competências transversales em educación. Málaga: Fundación Vértice, 2012. PERRENOUD, Philippe. Desenvolver competências ou ensinar saberes? A escola que prepara para a vida. Tradução: Laura Solange Pereira. Porto Alegre: Penso, 2013. PERRENOUD, Philippe. Philippe Perrenoud: Memória Roda Viva. Transcrição de entrevista realizada no Programa Roda Viva da TV Cultura, em 19/11/2001. http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/250/entrevistados/philippe_perrenoud_2001.htm. Acesso em 07 jan. 2014. ROPÉ, Françoise e TANGUY, Lucie (org). Saberes e Competências: o uso de tais noções na escola e na empresa. Tradução: Patrícia C. Ramos e equipe do ILA_PUC/RS. Campinas, SP: Papirus, 1997. ZARIFIAN, Philippe. Objetivo competência: por uma nova lógica. Tradução: Maria Helena Trylinski. São Paulo: Atlas, 2001.

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