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Esse tal do Rock "Enrow"

Por Belinha Almendra

Ícones do rock nacional falam sobre o surgimento do gênero no país e sua representatividade no cenário musical atual.

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Em 1975, Rita Lee já queria saber como andava “Esse tal de roque enrow”. Gravado no clássico álbum “Fruto Proibido” (Rita Lee/Paul Coelho), o hit é o mote para o bate-papo que tivemos com craques do riscado. Com o rock perto de completar 70 anos, a Revista da Abramus convidou roqueiros de diferentes gerações para nos ajudar a saber como anda o rock’n roll em terras brasileiras e como eles têm convivido com os efeitos da pandemia.

Para muitos, os Beatles foram a porta de entrada para o rock. Foi o caso do cantor, compositor e guitarrista Roberto Frejat: “Tinha uns quatro ou cinco anos e pedi para o meu pai comprar o disco Rubber Soul para mim”. Para Digão, da banda Raimundos, sua mãe foi fundamental: “Ela me deu uma coleção de greatest hits dos Beatles e na sequência ganhei a do Queen. Depois minha irmã trouxe dos EUA o ‘Back in Black’, do AC/DC, que me fez gostar mesmo de rock pesado!”. O mesmo aconteceu com Rodrigo Santos, baixista, cantor e compositor: “Eu tinha cinco anos quando ouvi no rádio “Help”, fui perguntar e meu pai tinha aquele disco, era o ‘A Hard Day’s Night’. Eles e Bob Dylan me fizeram chegar ao rock.” O rock dos anos 60 era a trilha sonora da casa do baixista e compositor Fernando Magalhães, do Barão Vermelho: “Sou o caçula de 4 irmãos e nasci em 1964. Não teve jeito, o rock entrou quase por osmose!”, brinca.

O quarteto de Liverpool também foi definitivo para Sergio Britto e Tony Bellotto, dos Titãs. “Eu era mais ligado em pintura, música clássica, mas ao ouvir o disco Help pela primeira vez, aquilo me pegou”, relembra Britto. Companheiro de banda, Bellotto inclui outras referências: “Quando eu tinha uns oito, dez anos, meus ídolos eram Roberto Carlos e Erasmo Carlos, Beatles, Rolling Stones, Jimi Hendrix, e depois The Who, Led Zeppelin, Rita Lee, Raul Seixas... São muitos, mas esses já dão uma boa ideia de como eu comecei bem”, completa.

Roberto e Erasmo, ícones da Jovem Guarda, estão no topo da lista de Paulo Ricardo: “Sem dúvida o filme ‘Roberto Carlos em Ritmo de Aventura’ foi um marco. Aquilo mudou a minha vida. Pensei, ‘é isso que eu quero fazer quando crescer’.” Badauí, vocalista do grupo CPM 22, bebeu em outra fonte: “Comecei a curtir rock, mais precisamente punk rock, aos 12 anos, com bandas como Dead Kennedy, The Clash, Ramones, e aqui no Brasil Ratos de Porão, Cólera, Garotos Podres, Camisa de Vênus.”

A travessia de um século trouxe mudanças. Será que o rock perdeu a energia, prestes a se tornar setentão? “Pela sonoridade, por ter sua própria liberdade, o rock sempre vai ser jovem, contestador e diferente. É o que o mantém cada vez mais forte e vivo”, garante Badauí. Digão confirma: “Algo que dá vontade de escutar todos os dias jamais envelhece e mantém nossa alma eternamente jovem e pura!”. Tony Bellotto destaca a criatividade do rock made in Brazil, ao longo das décadas: “O rock brasileiro sempre teve uma personalidade própria muito interessante. Lá no começo, o iê-iê-iê misturava Beatles com música popular, rock italiano Depois vieram Tropicalistas, Rita Lee, Novos Baianos, Mutantes, a geração dos anos 80”.

“Eu diria que o rock amadureceu e caminha para se tornar um clássico, como o jazz e o blues. Ele transcende as fronteiras da música, está nas artes plásticas, no cinema, na literatura, na moda. Rock é atitude”, avalia Paulo Ricardo. Para Rodrigo Santos o setentão continua abusado: “Pode ser mais eletrônico ou com influências do rap, mas o rock continua fundamental.” A questão da pouca presença na mídia também foi lembrada. “É uma pena que essa garotada talentosa que está aí não esteja tão presente nos meios de comunicação quanto a minha geração e a própria geração dos anos 90 ainda esteve”, pondera Roberto Frejat. Para Sérgio Britto, o rock vive um período de renovação: “Eu vejo muitas bandas que trabalham com fusões, com vários gêneros musicais diferentes se entrelaçando. Artistas deste segmento não têm tido tanta projeção como tinham nas décadas de 1960, 1970 e 1980, daqui a pouco a gente vai ver novidades e coisas interessantes desabrochando”, acredita.

“Como somos um país grande e diverso, acho que o rock daqui sempre será uma fusão permanente”, pontua Fernando Magalhães. Paulo Ricardo, que foi jurado do programa Superstar da TV Globo, conta que se surpreendeu com a variedade e a criatividade das bandas que viu por lá. Frejat lista algumas: “Eu particularmente gosto muito de bandas como O Terno, The Baggios, Jonata Doll, Garotos Solventes, Facção Caipira, Bugarins, tem muita gente legal”.

A pandemia veio trazer um dado novo à cena: a interrupção de estreias e turnês. Lives, shows sem plateia ou em drive-ins surgiram como alternativas. Para Badauí, algumas dessas alternativas devem se manter: “São boas possibilidades, acredito que as lives na internet e shows virtuais vão permanecer no futuro. Somos uma banda dos anos 1990, não nascemos na internet, mas vamos dar uma aprimorada nisso, mesmo pós-pandemia”. Digão faz coro: “As lives estão nos salvando. O importante é nos mantermos vivos pra que quando isso passar, a gente aprenda o valor que cada coisa realmente tem”. Para Rodrigo Santos, é hora de aproveitar as novas possibilidades: “Já fiz mais de 30 lives e gravei um disco inteiro em casa. Meu filho Leo me ajudou a montar um estúdio”, conta.

Tony Belloto é receptivo a caminhos que deem fim à paralização: “As soluções vão sendo encontradas assim, quase de improviso. O importante é o pessoal ter trabalho, técnicos, músicos, toda essa classe não pode ficar parada até que os shows voltem à normalidade”. Para Sergio Britto, o contato direto com o público é algo que a tecnologia e os novos formatos não substituem: “Lives e drive-ins são paliativos, dificilmente vão ocupar os espaços de shows e grandes eventos. Espero que ano que vem as pessoas possam frequentá-los livremente, depois das vacinas. Eu sou bem otimista de que as coisas voltarão a ser o que eram”. Paulo Ricardo concorda: “Fiz algumas lives e um show de drive in, tudo muito interessante sob o ponto de vista da integração entre música e tecnologia, na busca por alternativas seguras. Mas nada substitui a catarse e a experiência intensa e explosiva de um show ao vivo” E longo período de quarentena? Alterou ou contribuiu no processo criativo? Badauí conta que o CPM 22 já estava compondo quando veio o isolamento: “Com certeza, algumas das músicas feitas nesse período terão esta inspiração. Talvez não diretamente nas letras, mas no sentimento na hora de compô-las”. Tony Bellotto fez uma música especialmente inspirada nesta situação: “A gente que compõe está sempre respondendo aos estímulos da realidade, sejam eles quais forem: a pandemia não poderia deixar de afetar de alguma maneira o trabalho, mas sem o tamanho e a grandeza que ela tem na realidade prática”. Outro que não parou de produzir é Rodrigo Santos: “Fiz mais e 70 músicas e uma parceria com o Over Drive Duo e o Andy Summer, faixas que fiz com eles já tem mais de 4 milhões de views”, comemora.

Paulo Ricardo compôs e lançou “Tempo de Espera”, que fala da pandemia: “Minha mulher, a fotógrafa Isabella Pinheiro, dirigiu o clipe da música. O single já está nas rádios e nos apps de música. Foi um verdadeiro exorcismo e é um retrato fiel da quarentena”. Sergio Britto, por sua vez, já vinha trabalhando em um disco solo: “Tenho refletido muito sobre o que a gente está vivendo, mas não acho que isso tenha me inspirado diretamente a fazer uma música falando sobre o que vem acontecendo”.

E o quando a pandemia acabar, o que todos querem fazer? Tocar, claro! O desejo é unânime: todos querem pegar a estrada e voltar aos shows ao vivo. Paulo Ricardo planeja um mergulho no mar, Badauí sonha em reabrir o seu bar, o Cão Veio, e Digão não vê a hora de voltar a surfar.

O QUE ELES ESTÃO OUVINDO?

Fernando Magalhães: “Dos novos, The Dead Tongues, e os clássicos de sempre.”

Frejat: “Eu gosto muito das coisas solo do Jack White, no White Stripes, do Wilco, o guitarrista Mark Ford, ligado à história dos Black Crows. Entre os consagrados, tenho escutado muito Cat Stevens, Elton John, e continuo ouvindo os meus Hendrix, Stones, The Who da vida, sempre.. Badauí: “Eu gosto de música boa, mano, tenho um perfil no Spotify com várias playlists de punk rock, jazz, blues, reggae, samba, chorinho.”

Digão: “Escuto o velho e bom rock'n'roll de sempre. Se não me jogar na parede com a força de 1000 megatons, não toca duas vezes na minha playlist”.

Tony Bellotto: ‘Eu assisti um documentário sobre o Eric Clapton, então andei ouvindo toda a trajetória musical dele. Mas ouço muito Miles Davis, principalmente o disco Kind of Blue”.

Paulo Ricardo: “Gosto de Billie Eilish, Weekend, do folk-MPB de Anavitória, do Emicida. De um modo geral, procuro ouvir de tudo sem preconceito.”

Sérgio Britto: “Ando ouvindo a obra do Elton John, pois comecei a ler a biografia dele, vi o filme, é incrível a quantidade de sucessos e músicas maravilhosas que ele compôs, fora ele tocar piano, que é meu instrumento também.”

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