COLÔNIA LEOPOLDINA (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015).
(relatos e visões críticas)
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COLEÇÃO - COLÔNIA LEOPOLDINA SÉRIE 1 - HISTÓRIA E FILOSOFIA Volume 1 - História imperial e pós-modernidade (alguns elementos para discussão). Alexandre Gilberto Sobreira Sílvio César da Silva de Carvalho SÉRIE 2 - GEOGRAFIA E CIÊNCIAS NATURAIS Volume 1 - Colônia Leopoldina (AL): situações político-ambientais. Maria Betânia Alves dos Passos Marília Gabriela da C. Gomes José Francisco de Melo Neto Volume 2 - Colônia Leopoldina (AL): situações político-ambientais (vol II) Andréa Marques Silva Elizabete M. do N. G. Veloso Paulo Edson de Araújo Valquíria Maria da Silva José Francisco de Melo Neto SÉRIE 3 - SOCIOLOGIA E POLÍTICA Volume 1 - Colônia Leopoldina (AL): 30 anos de lutas populares por mudanças e cidadania (1983-2013). José Francisco de Melo Neto Volume 2 - Colônia Leopoldina (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015). (relatos e visões críticas) José Francisco de Melo Neto Osvaldo Batista Acioly Maciel Sílvio César da Silva de Carvalho
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José Francisco de Melo Neto Osvaldo Batista Acioly Maciel Sílvio César da Silva de Carvalho
EDITORA DO CCTA - UFPB JOÃO PESSOA 2016 3
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Fundadoras e fundadores da Academia de Cultura de ColĂ´nia Leopoldina - AL.
DEDICATÓR I A
Este livro é dedicado aos antepassados guerreiros índios “cariri” das aldeias do Rio Jacuípe, aos negros “papa-méis”, moradores nas florestas e fugitivos da senzala, e a alguns brancos, que juntos, na Guerra dos Cabanos, ocorrida por estas terras de matas, já lutavam pela libertação dos escravos das mãos sangrentas de senhores de engenho. E também, às trabalhadoras e aos trabalhadores que, com muita força e luta, conseguiram forjar a cultura da cana e, ainda hoje, sobreviver à amarga doçura do seu mel.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE COMUNICAÇÃO, TURISMO E ARTES REITORA MARGARETH DE FÁTIMA FORMIGA DINIZ VICE-REITOR EDUARDO RABENHORST Diretor do CCTA JOSÉ DAVID CAMPOS FERNANDES Vice-Diretor ELI-ERI LUIZ DE MOURA
Conselho Editorial CARLOS JOSÉ CARTAXO GABRIEL BECHARA FILHO HILDEBERTO BARBOSA DE ARAÚJO JOSÉ DAVID CAMPOS FERNANDES MARCÍLIO FAGNER ONOFRE Editor JOSÉ DAVID CAMPOS FERNANDES Secretário do Conselho Editorial PAULO VIEIRA Laboratório de Jornalismo e Editoração Coordenador PEDRO NUNES FILHO Projeto gráfico: Luiz Alberto Capa: R. Alberto Ficha catalográfica elaborada na Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba M528c
Melo Neto, José Francisco de. Colônia Leopoldina (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015) (relatos e visões críticas) / José Francisco de Melo Neto, Osvaldo Batista Acioly Maciel, Sílvio César da Silva de Carvalho.- João Pessoa-PB: Editora do CCTA, 2016. 269p. ISBN: 1. História política - Alagoas. 2. Política partidária. 3. Memórias. 4. Relatos históricos. I. Maciel, Osvaldo Batista Acioly. II. Carvalho, Sílvio César da Silva de. CDU: 94:32(813.5)
Foi feito depósito legal Todos os direitos e responsabilidades dos autores. Direitos desta edição reservados à: EDITORA DO CCTA/UFPB Cidade Universitária – João Pessoa – Paraíba – Brasil Impresso no Brasil Printed in Brazil
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SU M ÁR IO DEDICATÓR I A.........................................................................................5 A PRESEN TAÇÃO.....................................................................................9 1. I N T RODUÇÃO José Francisco de Melo Neto..................................................................11 2. ELEMENTOS HISTÓR ICOS DA CI DADE: ensaio de história sobre o dilúculo do município de Colônia Leopoldina Sílvio César da Silva de Carvalho.........................................................19 3. M EMÓR I A S DA POLÍT ICA PA RT I DÁR I A
Relato Histórico 1 Maria Lúriva Fagundes de Lima (NININHA)........................................69
Relato Histórico 2 Ricardo Pereira Brasilino..............................................................................83
Relato Histórico 3 Severino Inácio da Rocha.......................................................................95
Relato Histórico 4 Ernane Santana Santos...............................................................................115 4. PROBLEMÁTICAS DO CAMPO POLÍTICO: visões críticas a) DI SC US SÃO S OBRE A POLÍT ICA PA RT I DÁR I A DOM I NA N T E NO RECORT E T EM POR AL EN T RE 1950 e 2015 Sílvio César da Silva de Carvalho.............................................................155 7
COLÔNIA LEOPOLDINA (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015). (relatos e visões críticas)
b) U M OLH A R DI ALÉT ICO PA R A A POLÍT ICA DOM I NA N T E EM COLÔN I A LEOPOLDI NA: visão crítica. José Francisco de Melo Neto.................................................................191 c) COM EN TÁR IO S A RESPEI TO DA M EMÓR I A POLÍT ICA DE COLÔN I A LEOPOLDI NA Osvaldo Batista Acioly Maciel ................................................................247 5. CONSI DER AÇÕES ........................................................................263 6. NOTA S S OBRE O S AU TORES................................................265
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A PRESEN TAÇÃO Este livro expressa o desejo de registro de 65 anos da política partidária dominante, passados no município de Colônia Leopoldina, no Estado de Alagoas, no período de 1950 a 2015. A historiografia dos grupos que lideraram essa política é muito escassa. Poucos são os documentos existentes na Câmara de Vereadores. Outros tipos de arquivos não foram encontrados. Então, este livro propõe o registro de parte dessa história, visando contribuir para melhores análises que poderão advir, atendendo a futuros pesquisadores e à organização da política crítica local. A sua metodologia de construção aponta para a seguinte orientação: num primeiro momento, uma análise histórica da origem da cidade; num segundo momento, a quase ausência de registros conduziu para a coleta empírica por meio da entrevista com aquela e aqueles que estiveram presentes naquele momento histórico. E, ainda, num terceiro momento, por meio de análises críticas de dois professores da área de humanas - história e filosofia - foi possível a composição desse todo. Cada texto que compõe o livro mostra a visão de cada autor sem comprometer o conjunto da obra. O final é um esforço de transcendência da política dominante estabelecida pelo senso comum, expressando a necessária organização dos setores subalternizados da sociedade. O conjunto do livro pode ser visto em um triplo movimento que expressa síntese inicial do ambiente onde se desenvolveram aquelas práticas políticas - Colônia Leopoldina, no Estado de Alagoas. Num segundo movimento, destacam-se as análises
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realizadas por esses docentes, a partir de suas especificidades de seus campos de estudo. E, finalmente, uma nova síntese em que possibilita proposituras para além das situações concretas, inicialmente, encontradas. Pode-se ver no todo do corpo do livro a presença da tríade dialética: síntese, análise e nova síntese ou, de uma maneira marxiana destacar um concreto, a abstração sobre esse concreto e, como produto, um algo de superação do estabelecido, cheio de novos pensamentos ou um concreto pensado. Os que participaram deste livro desejam a todos/as os leitores e leitoras, interessados nesse debate político, em particular os que buscam organização política partidária no lugar, que lhes seja útil. É um livro pensado para contribuir à ação política. Aos demais, esperam que a leitura dos registros históricos e das reflexões apresentadas lhes sejam, pelo menos, prazerosa. Os autores
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1. I N T RODUÇÃO José Francisco de Melo Neto
A política Pode-se comumente de ouvir que trabalhador é para trabalhar, que estudante é para estudar ou que professor é para ensinar. E assim muito se escuta, traduzindo uma compreensão muito específica de que fazer política não seria para essas pessoas. Mas, também, há posicionamentos que convidam todos à participação na vida de seu lugar, à participação política ou mesmo a conquista de sua cidadania própria. Cidadão entendido como essa condição de que a pessoa precisa dizer, dar palpites e, não só isso, definir os caminhos do seu lugar onde vive ou onde trabalha. A política passa a ser compreendida ou mostrada como algo muito específico: política é para aqueles que se profissionalizam na política ou política é para político. Mas, também adquire, numa visão mais ampla, as diferenciadas possibilidades de se apresentar como por exemplo: a política acadêmica, a política sindical, a política da saúde, a política educacional... a política econômica. Tudo isto passa a indicar a política como expressão ou maneira de como uma instituição deve conduzir o seu caminho e o modo de participação das pessoas, defendidas pela própria instituição, sua gestão e recursos a serem utilizados na sua efetivação. Como se vê, política parece traduzir tudo que envolva relações de poder, organização e administração de grupos.
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Com uma perspectiva mais específica, pode-se dizer que a política envolve três significados, quais sejam, o de governo entendido aí a administração e direção do poder público. Uma prefeitura se insere nessa visão como um órgão em condição de assegurar direção de poder em base municipal. Nessa visão, a política refere-se às ações de governadores, prefeitos, parlamentares que constituem o Estado ou o Município. Também se insere nessa compreensão as ações coletivas que se movem em apoio ou contrários aos governos ou ao Estado. Um segundo sentido é quando se vê a política como atividades específicas daqueles que administram as coisas do lugar por meio de processos eleitorais, normalmente, mas inseridos em instituições específicas, denominadas de partidos políticos. Estes disputam, por meio de processos eleitorais, o direito de governar e gerir a coisa pública ou os postos do Estado. Um terceiro significado de política pode ser traduzido pelas atividades ilícitas, duvidosas, e acompanhada de interesses particulares ou mesmo para busca de vantagens próprias nas relações entre essas organizações, ou setores públicos, e as empresas privadas. A ideia central de que o Estado torna-se algo privado ou assenhorado por alguém ou por um grupo, como vê Marilena Chauí, no livro Convite à Filosofia. Há nessa compreensão uma desconfiança generalizada tanto daqueles que estão no comando do Estado como dos que estão em oposição. Quando, portanto, as pessoas não apostam em qualquer tipo de político. O que se gera dessas compreensões é a operacionalidade de cada conceito a partir das intenções ou interesses específicos de cada grupo. A República brasileira, em sendo constituída de três poderes - o legislativo, o executivo e o judiciário -, todos
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poderes do Estado, nenhum deles escapa à política e, assim, todos estes poderes são profundamente políticos. Não se pode pensar, portanto, o exercício do executivo e em especial do judiciário fora da política. Todas as decisões jurídicas estão permeadas da política. Não precisa nem destacar a ação parlamentar, pois dele originase a legislação, portanto, são os fazedores da legislação por ações estritamente políticas. Assim, é que, qualquer lei, a ser assegurada pelo legislativo, pertença a que grupo for, está permeada da dimensão política. Não se segura, portanto, o discurso de que decisões jurídicas sejam unicamente técnicas. Nessas possibilidades interpretativas da política há estranhamento ou paradoxos no próprio campo das políticas que é quando ela mesma se contrapõe a si própria. Para se superar um poder que se tornou nefasto, só se apresenta um caminho: o da ação política. Essa ação pode ser realizada tanto nos campos da normalidade jurídica ou mesmo fora dela, mesmo assim, quaisquer possibilidades expressam política. A política pode está sendo ativada contra si mesmo. Mas, de repente as pessoas tornaram-se muito aborrecidas com as suas representações ou mesmo com os seus dirigentes. Sem verem possibilidades de superarem-nos, preferem a apatia ou mesmo os dizeres de que na política nada presta, nada serve, ou que todos são iguais. Uma situação de falta de crendice geral para com os políticos. Contudo, mesmo que haja expressão de verdade de várias dessas afirmações, na generalização é onde ocorre o erro. Mas, não só isso: quando se decide pela apatia e desconhecimento total das ações dos políticos, esquecem que isto também é uma política.
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A política vem de polis, cidade, com a compreensão de uma comunidade. Mas pode estar na origem da civitas, tradução latina para a polis, expressando ente público e coletivo. Aí acompanha a res publica como a modalidade de um governo em que as coisas do Estado e, claro, de um município, são públicas. Há governantes, em especial, nos municípios em que essa coisa pública passa diretamente como coisa própria. Em um linguajar regionalizado, poder-se-ia dizer a transformação de um município em uma bodega. Aquele algo da propriedade do executivo detentor de poder. Um poder que pode ser traduzido como expressão despótica ou um poder despótico, em que aquilo que é desejo do rei, do soberano, do prefeito, é a lei. Expressa a lei. As coisas existentes são todas propriedades do soberano ou domínio pessoal daquele patriarca, chefe patriarcal. Esse poder fora exercido pelo chefe de família em relação às demais famílias que se assegurava por meio de alianças matrimoniais e pela força militar. Seu poder é inquestionável e tem força total, decidindo sobre a economia, os impostos, a religião e a vida das pessoas. A autoridade está centrada no corpo daquele dirigente ou do rei que expressava todo o seu poder: a cabeça era sua autoridade, seu peito expressava a vontade, os membros superiores, os seus delegados, sejam sacerdotes ou militares, e os membros inferiores àqueles obrigados ao cumprimento de suas leis, ou os seus súditos. Uma organização extremamente hierarquizada e vertical. Mas, há o poder mágico quando se aceitam as ordens dos deuses ou quando alguém possui força sobrenatural. São as pessoas que lhes conferem tal poder. Seus gestos expressam ordens para viver ou para matar e podiam amaldiçoar tudo. Este é um poder transcendental considerando que os reis eram expressão
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de divindades e muitos apostam, inclusive, em sua imortalidade. O império estava acima da comunidade. Mas, há o poder hereditário quando o poder era transmitido ao primogênito, havendo inclusive aqueles que a conquistava por usurpação. E, mesmo hoje, essas modalidades de poder ainda podem estar expressas em todo o mundo. Diante dessas possibilidades variadas do exercício de poder, pode-se ver que política também adquire diferenciações de sentido. Em Aristóteles, a política passava por uma visão de que deve-se expressar a busca do bem e o bem supremo - em seu livro sobre Ética. Em outro livro, Política, esta passa a ter duas funções, quais seja, a de descrever a forma do Estado ideal; a outra, a determinação forma do melhor Estado, a depender de cada circunstância. Também se discutiu sobre a permanência no poder pela política, algo que talvez tenha vindo a influenciar o pensamento de Maquiavel, em seu livro o Príncipe. Há ainda uma dimensão na Política, agora contida em Platão, assumida também por Aristóteles, que consistia em ver a política como arte e ciência de um governo. Estas ideias até hoje têm seus espaço nas investigações e na pesquisa sobre política. Mas, é em Comte que se tem uma quarta dimensão da política, em sua obra Sistema de Política Positiva, em que para ele, a política detinha leis invariáveis que poderiam ser definidas e acompanhadas. Parece evidente, contudo, independente das discussões acerca das ideias sobre política é que ela repousa sob a expressão dos distintos modos de expressar o poder, seja ele, o poder econômico, o poder ideológico e o poder político. O poder econômico é gerado por aqueles que têm abundância de bens e, assim, expressam seu poder sobre os demais. O poder ideológico
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expressa as tantas possibilidades de interpretação do mundo, inclusive as ideologias científicas e as religiosas. Mais das vezes, caminham para expressarem sectarismos geradores inclusive de guerras como decorrência. E, ainda o poder político, em que alguém se assenhora dos bens geradores da força e, assim, assume o exercício do poder, gerando os superiores e inferiores. Para o marxismo, o poder econômico é central no exercício da força de dominação. Expressa a organização de classes a partir do modo de produção estabelecido. Inferiores e superiores estiveram presentes, portanto, em todo o modo de produção, seja no comunismo primitivo, no escravismo, no feudalismo e, em especial, no capitalismo que se vive. Com a denominação explicitada nos termos proletariados, setores médios e a burguesa. Estas duas, proletariado e burguesia, como expressão máxima do distanciamento das posses dos produtos culturais gerados pelos trabalhadores. No capitalismo, há a separação de forma explícita do ente cultural produzido, da coisa produzida, e da posse dessa coisa. A classe trabalhadora expressa o trabalho e produz esses entes, mas os mesmos são apropriadas em suas ideias e em suas materialidades pela classe hegemônica, a burguesia. Detém assim o poder político, apropriando-se para sua própria defesa do seu Estado e de si mesmo pelas forças militarizadas. Estas estão nas mãos dos que detêm os recursos econômicos do lugar. Em ambientes de usinagem, é clara a concretude desse tipo de poder: a usina e os trabalhadores da cana. A ultra concentração da riqueza entre as mãos da burguesa e a concentração do trabalho entre os trabalhadores. Hoje, superada a ditadura militar do pós 1964, ainda se trabalha com os discursos de democracia. Mas, vive-se em uma
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democracia liberal burguesa, apesar das condições de escolha de representantes. Os momentos atuais do país mostram a debilidade desse estilo de viver democracia, uma democracia representativa. Aquela democracia em que o eleitor assina um cheque em branco ao candidato e ele, eleito, passa a exercer poder à sua moda ou ao estilo de sua conveniência. A representação, contudo, foi muito esquecida e passa a representar, tão somente, a si mesmo, a exemplo do momento do “impeachment” da Presidenta Dilma. Esse modelo de democracia enfraquece. A política não tem um fim em si mesmo, como visto, mas passa a ter fins de acordo com as metas que um grupo organizado se proponha, de acordo com o tempo e as condições efetivas. Cabe a máxima marxiana de que os trabalhadores precisam da união para fazer valer seus desejos e atender suas necessidades. A política tem muito de relação do tipo amigo e inimigo, isto defendida, sobretudo, por Carl Schmitt. É comum que se assegure ao inimigo a lei e ao amigo, os benefícios da lei. Para ele, a política necessariamente divide a comunidade em amigos e inimigos. Mas, a política é expressão de social, fazendo coincidir toda a sorte de relações sociais, na cidade. Acompanha um pouco essa perspectiva a condição de política também na sua relação com a moral. Aí, hoje, vive-se um conjunto de golpes e contragolpes à surdina e nos bastidores legais quando se promove por grupos a retirada da Presidenta do País. Ficam às claras ainda a cara de um Legislativo totalmente acuado diante do seu “modus operandi” em seus esforços de se manter no poder a custa de atividades tidas como ilícitas e, por isso, os movimentos das pessoas pelo fim da corrupção. Não escapa sequer o poder judiciário das armadilhas para seu controle. Portanto, é um esforço de definição de valores, de princípios éticos que acompanhem a prática política. Parece,
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todavia, que essas preocupações se tornam mais agudas em nível municipal. Aqui parece haver fortemente um contraste entre a ética política e a ética do grupo. Não se pode chegar à afirmação de que a política se transforme na razão do Estado enquanto que a moral se torna a razão do indivíduo. Como se vê, nos tempos atuais se colocam grandes expectativas nas mãos do Estado e parece que não é possível viver sem ele. Nunca os Estados foram tão poderosos e tão cheios de esperança de democracia e de liberdades. Carrega consigo as contradições de mãos de grupos dominantes e em possibilidade da promoção de emancipação das pessoas. Sobre sua necessidade, muitas ilusões percorrem mentes e corações e apostam no mesmo. Sobre sua ausência, no momento, quase impossível, mas nada impede que se mantenham os sonhos de construção de outros caminhos para a sua superação. Esta parece ser uma interessante política. Mas, como veio se construindo a história de Colônia Leopoldina e como desenvolveu-se a política, eleitoralmente vitoriosa, na cidade, nesses últimos 65 anos?
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2. ELEMENTOS HISTÓR ICOS DA CI DADE: ensaio de história sobre o dilúculo do município de Colônia Leopoldina
Sílvio César da Silva de Carvalho
Pequeno introito Este texto, sob o prisma da análise histórica, tem a finalidade de discutir a história genética da cidade de Colônia Leopoldina. Em outras palavras, o autor busca apresentar como se constituiu em uma expressão de racionalidade instrumental, utilizada pelo poder provincial alagoano, a instalação, em 1852, da Colônia Militar Leopoldina. Foi desta estrutura política, que meados do século XIX se constituía na mais nova forma de controle social do Estado brasileiro, que não só representou, mas personificou os interesses de determinado poder político dominante, que a cidade de Colônia Leopoldina se originou. A hipótese trabalhada no texto é que o germe da política partidária dominante, objeto da obra, já pode ser identificado e demarcado na caracterização institucional do sistema sesmeiro-escravista, que sistematizou o processo histórico de constituição da Colônia Militar Leopoldina. Inicialmente se trabalha no texto com algumas questões metodológicas, na medida em que o texto não tem a pretensão de se tornar uma plataforma límpida e sem equívocos. Por sinal, o texto afirma, de forma peremptória, que não busca a Verdade, mas, unicamente, recontar a nossa história.
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Em seguida, aborda-se, de maneira sintética, a Guerra dos Cabanos, posto que a possibilidade de se efetivar a ideologia cabana será, em 1850, a essencial razão para a criação da Colônia Militar Leopoldina. É que a concepção de sociedade do ponto de vista da ideologia cabana poderia afetar a infraestrutura da produção açucareira, a propriedade latifundiária e o sistema escravista. Concomitantemente, o texto tenciona despotencializar algo que o autor chama de ingenuidade colonialista que, reproduzida por todos nós, sendo culpa de um processo de socialização o qual fomos obrigados a aprender, pode ser identificada nos discursos e nos rituais municipais, não permitindo, na contemporaneidade, a compreensão de que a Colônia Militar Leopoldina se deteve em concretizar a sua função institucional, o seu programa de celebração do poder oligárquico. A narrativa do texto procura fazer-se compreender que a instalação da Colônia Militar Leopoldina não deve e não precisa ser vista pelo espectro da alegria ou por uma equivocada sensação anacrônica de nobreza, pois a Colônia Militar Leopoldina foi instalada no Vale do Jacuípe com o objetivo de travar as lutas das gentes pobres que habitavam as matas, dos escravos que não mais aguentavam o ardor de múltiplos castigos físicos e a debilitação moral que a atividade no canavial produzia, dos posseiros que, ao longo da história, viram suas terras serem tomadas pelo capital açucareiro e dos índios que desejavam verem restituídas as terras de seus ancestrais. Finalmente, o que existiu onde hoje é a cidade de Colônia Leopoldina não foi, metaforicamente, uma “Princesa”, porém, uma instituição política responsável por dores e sofrimentos para as gentes pobres.
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Questões metodológicas Não é incomum, nos dias atuais, se ouvir determinadas sentenças pelas quais se tenta colocar em dúvida a importância do conhecimento histórico. Com efeito, a preocupação básica do tempo hodierno parece ser mesmo consubstanciada com o presente e com o futuro, pois a determinação do cenário deste depende das decisões aquele. Parece-me que este argumento é demasiadamente frágil, na medida em que, não colocando o passado como temporalidade fundamental, deixa-se de reconhecer que foi em sua dimensão que as decisões do presente foram pensadas e originadas, assim como refletidas e executadas. Entretanto, diminuta parte do senso comum já absorveu o axioma que coloca o conhecimento do passado na condição de elemento relevante para o presente e para o futuro, desde que, quando não há o pensamento e a reflexão sobre o passado, é bem provável que os erros e os equívocos plasmados no tempo podem se repetir indistintamente. No entanto, a legitimidade do conhecimento histórico não é encontrada em si ou por si mesmo. Em outros termos, o fundamento da validade do conhecimento histórico não pode estar no mesmo conhecimento histórico. Ele é legítimo porque realiza uma finalidade eticamente válida. Por certo, a estreita relação com a ética, principalmente por ser a ética conditio sine qua non do conhecimento histórico, faz com que se permita o reconhecimento de que, mesmo não sendo fundamento, torna-se cogente que o conhecimento histórico se volte sobre si mesmo para desconstruir as suas contradições internas. Percebe-se, assim, que a autocrítica histórica é equivalente a críticas como instrumento da História. É sob essa perspectiva, para
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não adentrar no campo da investigação metafísica do conhecimento histórico, que diversos historiadores colocam a perquirição sobre o papel social do historiador como uma das formas mais palpáveis para se avaliar o conhecimento histórico. A despeito de múltiplas percepções e de intencionalidades associadas ao trabalho da investigação histórica, a provável heterogeneidade das respostas, relativas ao seu papel ou ao seu ofício na contemporaneidade, podem ser agrupadas, seguramente, em duas categorias ou modalidades, cada qual com uma episteme1 correspondentemente específica. Assim, se tem uma categoria que trabalha como o fundamento da permanência, e outra modalidade que coloca a movimentação como seu baldrame. Apesar de não ser a finalidade deste texto se intentar sobre a estrutura ontológica dessas modalidades historiográficas, o que implicaria em escavar as suas evoluções ao longo do tempo, não resta dúvida de que se torna necessária à correta apreensão do fato de cada modalidade epistemológica ser estruturada à determinada concepção ideológica do campo político. Assim, na categoria da permanência, o historiador tem o papel de fazer com que, nos dias atuais, a História e sua narrativa se tornem uma episteme (saber) da durabilidade e da imutabilidade, sendo o sentido próprio do texto histórico apresentar-se como estando pronto e acabado. Nessa concepção, o conteúdo do texto histórico se caracteriza como fazendo parte de uma superfície lisa e plana, dada a crença de que os eventos do passado, refletidos nessa superfície textual perfeita, correspondem à realidade concreta e objetiva. 1 O termo episteme aqui empregado não denota exatidão como quando empregado no modo histórico explicativo anteriormente mencionado e fundado em certa objetividade da Ciência, porém apenas no sentido de processo de determinado território do conhecimento.
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Por seu turno, opostamente na segunda acepção o historiador tem a preocupação de tornar a História e o seu conteúdo textual uma episteme da mutabilidade, na direção de um saber comprometido com a transformação de si mesma. Essa concepção tem como pressuposto o tratamento metodológico diferenciado sobre seus próprios objetos de pesquisa, sendo que eles são apreensíveis como em estado de contingência. Este segundo tipo de historiador compreende que o texto histórico também é uma superfície, mas não é límpida e lisa, a ponto de vê-lo como uma superfície repleta de problemas, de silêncios e de lacunas. Assim, com efeito, o texto histórico precisa ser interrogado constantemente. Essas características são entendidas não tão somente como elementos constitutivos, porém inerentes da narrativa histórica, pelo simples fato da necessidade de se ter a crítica radical e sistemática sobre o passado. Nessa superfície de fatos e de acontecimentos históricos, muitos deles silenciados e suprimidos, enquanto outros são acrescentados, a verdade2 é provisoriamente política e social, sendo que, até a possível realização de posteriores investigações e análises, o que pode possibilitar o surgimento, por outras interpretações, de novos sentidos à tessitura da história, ela continua vigente política e socialmente. Por certo, o conhecimento ou o saber histórico na primeira episteme e a sua narrativa peculiar serve, em geral, a manutenção compacta do fenômeno-passado3 e de suas implicações além da 2 A noção de verdade política se afasta, peremptoriamente, das clássicas acepções da verdade que dominam o pensamento ocidental (alètheia, veritas e emunah). Ela está mais próxima da concretude das relações sociais, na medida em que parte do pressuposto de ser a verdade o instrumento ideológico mais profícuo para a manutenção das condições históricas nas sociedades de classes. 3 O fenômeno-passado é o substrato da ideologia. Desde a tradição grega, o termo fenômeno (phainomenon) tem o sentido de “aparecer”. Na filosofia kantiana o fenômeno representa o objeto da experiência do sujeito do conhecimento. Dessa forma, o fenômeno-passado, como elemento central da ideologia, representa o modo como os
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sua existência temporal a posteriori, sendo que o próprio sentido do fenômeno-passado se encontra conhecido e legitimado conforme uma concepção absoluta. Por outro lado, na segunda episteme histórica o objetivo é diametralmente contrário, ou seja, tenta-se compreender o fenômeno-passado como possível e passível de alteridade em sua interpretação e em seu sentido, onde se afirma ser uma tarefa impossível a ação de legitimar por completo a descrição e a interpretação históricas. É um conhecimento relativo ou dependentemente variável, oposto ao primeiro tipo. Dessa forma, o entendimento do fenômeno-passado e, sobretudo, o seu sentido, pode variar entre os historiadores, estando, no primeiro posicionamento (da permanência) mencionado numa qualidade de necessidade, enquanto no segundo posicionamento (da mutabilidade) o historiador entende o fenômeno-passado como possibilidade. É através dessa diferença categorial, mas principalmente no interior da segunda categoria, que a História, as suas narrativas e os seus sentidos interpretativos podem receber conotações diferentes e implicações sociais divergentes, já que o fato da escrita da história ser uma ação subjetiva torna-se diferente da pretensão de se obter uma objetividade da história. É relevante destacar que uma das consequências do entendimento do conhecimento histórico como necessidade (mesmo perdendo o seu sentido formal de objetividade epistemológica, fundada na metodologia da ciência) para a contemporaneidade é que é ainda uma manutenção relativa da objetividade desse mesmo conhecimento, enquanto condição dependente de pelo menos à vida política. acontecimentos do passado são percepcionados pelo sujeito.
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Daí a necessidade da radicalidade e da sistematicidade nas análises históricas. Desse modo, o fenômeno-passado, como necessidade, apresenta-se como simples leitura de si mesmo, o que impossibilita o encontro de novas significações advindas de novas e diferentes descrições e de análises. O fenômeno-passado, como possibilidade, destaca a importância de processos constantes de releituras da história que podem gerar novos sentidos. A epitome é que o fenômenopassado, descrito e analisado na categoria da possibilidade, ao contrário do fenômeno-passado como categoria da necessidade, assenta na História o elemento da transitoriedade, através de uma episteme que afeta o conjunto metodológico no seu todo, assim à sua significação e o sentido da história. Nesse ínterim, é razoavelmente aceitável que a ação do historiador, que busca por meio da episteme da transitoriedade um saber histórico e assinalado pela postura investigativa da possibilidade, é mesmo o de reescrever a própria história, os seus eventos e os seus acontecimentos. E assim, o historiador, preocupado com um saber transitório, reescreve a história, talvez, por duas razões. Em primeiro lugar, pela especificidade mesma do objeto do conhecimento histórico, porque o homem e as formas de organização social estão atrelados em certos sentidos e significados históricos fomentados longo do tempo. O argumento é que a reescrita da história acontece, geralmente, porque o sentido dos processos e dos eventos humanos, que se encontram na dimensão temporal do presente, não é conhecível de forma imediata e total. Conquanto, cabe destacar que, mesmo que o homem e a sua sociedade se tornassem mais visíveis e compreensíveis,
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perspectivamente, e a partir de um perfil subjetivo, com a sucessão temporal, a visibilidade ainda não qualificaria o conhecimento histórico como sendo absoluto ou definitivo. O conhecimento não se daria numa superfície lisa, pronta e acabada com a distância temporal entre a análise e o evento. Mesmo assim, o afastamento temporal pode permitir o desvelamento de novas inquirições e de novos interesses da parte do historiador sobre o homem e suas formas sociais de vida, qualificando a possibilidade de abordar a história de modo diferenciado, gerando as condições para o surgimento de outros significados e de outras interpretações a partir de púberes escritos da história. Mas, afinal, porque é relativamente importante um afastamento temporal entre os eventos e os acontecimentos históricos e o conjunto de análises implementadas pelo historiador? Qual a condição que permite a aceitação do afastamento temporal? Essas perguntas, apesar de suas aparentes complexidades, têm uma simples resposta que é: a preposição de que os contemporâneos estão imersos no tempo vivido e, assim, podem ter dificuldades para ascender ou ultrapassar este mesmo tempo através da reflexão analítica sobre seus fundamentos. Esta resposta não significa que a história (não sendo transparente e não se deixar interpretar imediatamente) enquanto é vivida, não impeça que os contemporâneos dos eventos históricos esquematizem reflexões sobre o seu tempo vivido e sobre os seus fundamentos, sendo esse o argumento dos historiadores que se interessam pela vertente historiográfica da História Imediata4. 4 A corrente historiográfica denominada de História Imediata vem crescendo nas últimas décadas, consistindo em um campo de estudo em que um considerável número de pesquisadores tenta alocá-la com status de legitimidade. Sobre essa vertente do conhecimento histórico, merecem destaques as reflexões de Calil (2005, p. 4) quando o mesmo diz: “(...) A história imediata é a que mais suscita desconfiança, pois é a
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Posto de outra forma, o problema não está na capacidade intelectiva (enquanto se vive determinado desdobramento histórico) de refletir sobre os próprios eventos em seu processo existencial, mas no fato de que o distanciamento temporal pode possibilitar outras visões e outros sentidos. Patentemente que no tempo vivido podem surgir diferentes interpretações sobre as peripécias humanas históricas e que, ao mesmo tempo em que o tempo passado é refletido, se pode constatar uma série de lacunas. Afinal de contas, se não fosse assim teríamos o conhecimento detalhado e esmiuçado das épocas mais remotas e as dificuldades de apreensão das mesmas desapareciam na medida em que houvesse profundas investigações. Portanto, a questão não é esta. A premissa é que no tempo presente o dogmatismo sobre o conhecimento histórico pode ser mais forte do que quando ocorre à fluidez do tempo, o que pode, consequentemente, ser atuante no sentido de ser principalmente punitivo socialmente. Apesar da corrente de interpretação imediata da história ser uma das mais utilizadas atualmente, a sua forma de reflexão sobre o tempo vivido no presente pode sofrer (mais do que a reflexão do tempo passado) influências de personagens, de gestos, de ações, de discursos e de estruturas espaciais, criando uma interpretação correspondente a determinados interesses, o que pode ocorrer, similarmente, com a estrutura do passado, diferenciando-se, talvez, no tocante a presença do poder de coação. que parece engendrar o maior paradoxo fazendo rimar dois termos contraditórios: imediato e história. Pode-se falar de uma história do imediato? Esta história é legítima? O fator cronológico não é nem suficiente, nem satisfatório para embasar uma definição de história imediata. Percebe-se a dificuldade quando se quer especificar com precisão o espaço cronológico que cobre o imediato. E caso se faça uma escolha, ela logo parece arbitrária. A noção é obstinadamente fluida: algumas horas? Algumas semanas? Alguns anos? Parece que pode ser tudo isso ao mesmo tempo. (...) Se nos restringirmos a essa visão das coisas, a história imediata não existe... (...) De fato, o procedimento da história imediata é mais parecido com as técnicas jornalísticas do que com as da ciência histórica”.
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É
dessa
forma
que
o
distanciamento
temporal
é
relativamente importante para qualquer tipo de interpretação histórica do homem e das formas de convivência social, embora esse fato permita reconhecer também que é possível ocorrer influências dos fatores descritos acima que possam afetá-la num tempo precedente. No entanto, tudo indica que a maioria dos escritos históricos contemporâneos das correntes historiográficas caminha na direção do rompimento de qualquer forma de anacronismo5. Em contrapartida, o tempo onde ocorrem os eventos históricos não se revela de uma só vez. Os eventos da história só têm fundamentação a partir do entendimento da história como sucessão processual, ou seja, os acontecimentos emergem, submergem, explodem, adormecem, dependendo do seu próprio ritmo e da sua própria dinâmica inerente. Assim, por este aspecto de não definitivo, é que qualquer evento histórico pode ser insignificante, secundário e paliativo no tempo presente, porém ser capital e decisivo no futuro, e vice-versa. Isto não representa uma variante sobre o conceito do anacronismo, mas simplesmente a possibilidade de se ter novos significados em eventos temporal e culturalmente ocorridos. Dessa maneira, um acontecimento ou evento que era secundário e sem importância e que não era percebido no tempo passado, pode ter uma importância no presente e no futuro. Sob outro ponto de vista, o que era visível e importante pode perder eficácia histórica com o passar do tempo. É um processo em que não há razões para se acreditar em “acontecimentos fundamentais” na constituição da história, pois, na verdade, sob a lente da ontologia, não existem tais acontecimentos. 5 Nas últimas décadas, o campo social da pesquisa histórica vem aprimorando a forma de tratar os fatos do passado de tal maneira que o anticronismo seja inexistente, possibilitando, assim, uma maior legitimidade para o texto histórico.
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A partir daí percebe-se que as obras históricas e suas interpretações são também históricas, tendo uma duração relativamente determinada, partindo de que essa estrutura histórica de ambas determina a rearticulação entre as interpretações e as obras históricas nas dimensões do tempo. Com o passar do tempo presente as interpretações do passado mudam consideravelmente, como também o sentido que o futuro pode receber com a relação entre as bases vividas sobre o processo histórico. Em outros termos, cada homem e cada sociedade no tempo presente amálgama o tempo passado e esse próprio tempo presente para, a partir de uma elaboração e articulação peculiar, projetar o tempo futuro. Este tempo presente exige a reinterpretação do passado para se representar, se localizar e projetar o seu futuro, mesmo sendo a história escrita e reescrita a partir das posições desse mesmo presente, lugar da manifestação do próprio problema da pesquisa e de existência do sujeito que a formula e a aprofunda. Mas, o papel ou o ofício do historiador em reescrever a história, em segundo lugar, é reconhecer que a reescrita histórica se fundamenta no próprio fato de que o conhecimento histórico muda acompanhando o surgimento de novas fontes, de técnicas e de conceitos. A partir de novos aportes conceituais, outras visões são apresentadas, proporcionando não apenas a reescrita da história, mas também, e principalmente, a sua reinterpretação. Estas novas visões permitem dar um novo significado ao passado, formulando novas questões e problemáticas a partir das questões clássicas e tradicionais, construindo novas respostas, sendo muitas surpreendentes, afetando profundamente a representação que a sociedade e os homens têm sobre a história e seus eventos.
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De tal modo, o corolário que pode ser extraído é que, qualquer historiador lúdico deve assentir, a partir destas duas colocações, isto é, da especificidade do objeto (eventos) do conhecimento histórico e das possibilidades de reinterpretações desse mesmo objeto, que o seu trabalho não é definitivo e que é impossível pensar no esgotamento do conhecimento da História. Partindo dessas premissas, aceitas como condições básicas e fundamentais ao desdobramento argumentativo, este texto busca apresentar, através da reescrita da história como possibilidade e transitoriedade, um diferente discurso interpretativo sobre as razões que lograram a instalação da Colônia Militar Leopoldina. Em outras palavras, o texto aborda as condições históricas, tomadas como relativas, tanto no campo das condições materiais, quanto nas condições ideológicas, referentes à criação da Colônia Militar Leopoldina, em 1852, e de sua função politicamente social, apontando para aproximações sucessivas da própria ideia ou concepção de verdade. (...) a leitura e a interpretação do passado levam, praticamente, numa viagem diferente, ao mesmo desconhecido que se encontra no futuro, sendo que a grande assimetria entre ambos está no fato de que o futuro é uma probabilidade, enquanto o passado é um evento, no sentido de que se efetivou6.
Desse modo, o passado é sempre uma certeza, mas essa constatação em nada qualifica essa mesma certeza, visto que a história anda de ronda sobre esse passado e é em rondas que vai construindo o seu próprio modo de ser. Finalmente, couberam essas questões de ordem metodológica porque, embora sendo uma 6 ALMEIDA, Sávio de. Memorial biográfico de Vicente de Paula, o capitão de todas as matas: guerrilha e sociedade alternativa na mata alagoana. Maceió: EDUFAL, 2008, p. 27.
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realidade ontológica7, o passado não comporta uma única visão e, assim, essa investigação histórica sobre os motivos da instalação da Colônia Militar Leopoldina, em 1852, não tem o pejo de ser absoluta.
A Guerra dos Cabanos: a copulação e o nascimento da Princesa A hipótese fundante e defendida nesse texto é que a instalação da Colônia Militar Leopoldina, em 1852, teve como motivação principal o controle total sobre a ameaçadora ideologia cabana. Se fosse possível defini-la em uma simples expressão, poder-se-ia dizer que “a Colônia Militar Leopoldina representou um sofisticado e estratégico projeto de poder institucional contra as pretensões políticas das gentes pobres do Vale do Jacuípe”. Será visto adiante que o ideário político cabano, desde meados da década de 1830, foi capaz de englobar um conjunto de propostas e de práxis sociais que visava à organização de uma sociedade em que as relações sociais fossem livres e isonômicas. Com efeito, a aversão ao projeto social cabano, por parte das forças legalistas, se fez na medida em que o movimento cabano permitia a atração de homens e de mulheres pobres, de negros, de brancos, de escravos e de índios em torno da luta pela transformação de uma sociedade assentada no mando das oligarquias canavieiras. Finalmente, a materialização8 das ideias cabanas, não esgotadas pelos conflitos de 1832 a 1835, obteve influxos profundos 7 Sobre o fato de ser o conhecimento histórico ontologicamente verdadeiro, Leon (2002) afirma que “a história é uma realidade ontológica na medida em que se assenta em três premissas básicas: que os eventos, ações e ocorrências individuais do passado realmente ocorreram; que as proposições históricas ou fatos históricos verdadeiros são proposições sobre algumas dessas ocorrências; e que essas proposições são conhecidas porque dispomos no presente de suficientes indícios delas”. POMPA, Leon. Filosofia da história. In: BUNNIN, Nicholas; TSUI-JAMES, E. P. Compêndio de filosofia. Trad. Luiz Paulo Rouanet. ed. 2. São Paulo: Loyola, 2002, p. 461. 8 Materialização no sentido de organização política, de instalação de uma estrutura concreta de luta contra o poder instituído.
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na matriz econômica e na plataforma política da sociedade senhorial, principalmente na região das matas atlânticas que ligavam as províncias de Pernambuco e de Alagoas. É por isso que um dos principais pressupostos do texto é que a ideologia cabana não se fechou nas lutas políticas da primeira metade da década de 1830. De tal modo, há de ser reconhecer que a mentalidade e a consciência política cabana conseguiram sobreviver às intempéries do tempo e das investidas dos poderes anticabanos. Pode-se dizer, inclusive, que a ideologia cabana, em nosso tempo, está plasmada nos movimentos populares que lutam pelo estabelecimento de melhorias nas condições de vida das pessoas, pela preservação dos recursos do meio ambiente, pelos direitos das mulheres, dentre outras bandeiras. Outro importante fato é que o pensamento cabano, na contemporaneidade, se reveste da transgressão do discurso da preponderância do voto9, tendo em sua agenda de luta a busca pela participação efetiva dos pobres no cenário político. Nesta perspectiva, é que o conhecimento da Guerra dos Cabanos10 se torna proeminente à compreensão da conjuntura em que ocorreu a instalação da Colônia Militar Leopoldina. As concepções ideológicas do projeto cabano, que ainda eram percebidos na época da instalação da Colônia Militar Leopoldina, em uma região onde a miséria e as desigualdades sociais ainda são problemas profundos, principalmente por causa da institucionalização de um paradigma de poder econômico, 9 As correntes revolucionárias tradicionais e contemporâneas trabalham com o argumento de que é uma falácia liberal se considerar o voto como instrumento de participação política, pois ele nada mais é do que uma ilusão do poder institucionalizado que encobre a real luta social. 10 Não há a pretensão de escrever sobre a Guerra dos Cabanos, tratando-se unicamente de conhecer o contexto geral desse conflito fundamental, por que ele é essencial ao entendimento das razões e dos motivos substanciais da instalação da Colônia Militar Leopoldina.
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foram os móveis genéticos para que, no centro das matas do Tombo Real, fosse fincada uma estrutura de natureza produtiva e militar que visava não apenas controlar o espaço físico, mas, sobretudo, a dimensão das manifestações culturais e ideológicas das gentes indigentes. A Guerra dos Cabanos11 foi um conflito, entre 1832 e 1835, que ocorreu em uma área geográfica entre as províncias de Pernambuco e de Alagoas, e que envolveu setores políticos oligárquicos e populares em torno da desconstrução e da construção de modelos societários divergentes, constituindo-se em uma das principais revoltas sociais ocorridas durante o Brasil regencial12. Em termos historiográficos13, a Guerra dos Cabanos ou simplesmente Cabanada foi abordada, até o momento, por um incipiente grupo de pesquisadores que, preocupados com a sua investigação, objetivaram realçar a sua relevância histórica. Não obstante, nem por isso não se implicou ou se obstruiu a construção de uma visão sedimentada sobre a revolta popular da Cabanada que foi composta, sobretudo, pelos pobres da região que ligava as províncias de Pernambuco e das Alagoas.
11 A Guerra dos Cabanos recebeu esse nome porque a maioria dos revolucionários vivia em cabanas e em palhoças de terra batida no interior das matas em condições de existência deploráveis. 12 Há poucos estudos sobre a guerra dos cabanos. Por décadas, o conhecimento histórico sobre o movimento cabano ficou restrito ao discurso historiográfico composto pelo poder das elites políticas e econômicas da região onde ela se desenvolveu. 13 Historiografia, em seu sentido amplo, significa o estudo e a escrita da História. Em sentido restrito, representa o estudo de determinado evento ou período histórico. No caso, o emprego do termo representa o estudo do movimento cabano.
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Polígono cabano
A história da revolta cabana permaneceu aprisionada em uma oficial epistemologia historiográfica até 1965, quando Manoel Correia de Andrade (1922-2007), com a obra A Guerra dos Cabanos, estabeleceu o rompimento da visão e da percepção históricotextual policialesca sobre o movimento cabano. O idoso e ínclito Thomaz do Bomfim-Espíndola, que fundou os estudos históricos e geográficos na província das Alagoas, titulou, num aresto de terrível consequência, essa insurrecionalidade popular de cabanada selvagem. No Opúsculo de Discripção Geographica, de 1844, atribuído a Antônio Joaquim de Moura, os cabanos são apodados de matilha de feras desumanas mui bem armada, desde modo se iniciando na historiografia estamental o discurso historiográfico que encerrou as realidades insurrecionais cabanas num cárcere textual14. 14 LINDOSO, Dirceu. A utopia armada: rebeliões de pobres nas matas do Tombo Real. ed. 2. Maceió: EDUFAL, 2005, p. 17.
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Para Andrade, a canonização da versão oficial sobre o movimento cabano, implementada por forças políticas dominantes, fez com que, ao longo das décadas seguintes, ela se cristalizasse no discurso histórico, imputando a condição de bandidos, salteadores e criminosos aos adeptos da ideologia cabana. Com efeito, a primeira forma de controlar a memória das lutas das centenas de cabanos e de cabanas contra o establishment da oligarquia da cana-de-açúcar não foi através tão somente das vis corporalis e das vis moralis, porém foi por meio da imputação de termos abjetos e depreciativos que figuravam nos documentos oficiais e na própria construção textual anticabana15. Sob este contexto é que A Guerra dos Cabanos se revela fundamental, pois é com ela, pela primeira vez, que aparece na historiografia sobre o movimento cabano uma fulgente identidade política com os seus representantes. Em outros termos, a hipótese de Andrade é que o movimento cabano foi o resultado imediato e direto de uma dialética política que se configurou com a sedimentação da conjuntura regencial16. Já com o texto Cabanos: os Guerrilheiros do Imperador, de 1978, sustentado em forte instrumental marxista, Décio Freitas (19222004) aborda o movimento cabano enquanto integrado às questões políticas nacionais. Assim, o autor impetra visualizar as demandas políticas locais das províncias de Pernambuco e das Alagoas, como foi o caso da repressão institucional ao movimento cabano, 15 Caso interessante diz respeito à criação do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, em 1800. Ele surge com a finalidade única de construir uma historiografia provincial em que o tema principal é a celebração do poder e do mando dos “homens bons” que governavam a política local. Nesse tipo de historiografia não há o devido espaço para as abordagens das demandas das gentes pobres. 16 O período regencial (1831-1840) foi de fundamental importância para o estabelecimento de uma racionalidade administrativa no Império. Por causa dos vários movimentos anti-imperialistas, visando, sobretudo, a descentralização do poder, a segunda metade do século XIX, no Brasil, vai ser marcada pela adoção de diversas estratégias de contenção de rebeliões. A Guerra dos Cabanos foi uma dessas rebeliões políticas essenciais para a mudança de paradigma administrativo por parte do Império.
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como processos políticos e sociais de lutas em sinergia à agenda centralista do governo regencial. De tal forma, a guerra dos cabanos é vista por Freitas por uma lente analítica muito particular, onde a revolta cabana surge como sendo um dos resultados da dinâmica política em nível nacional e relacionada com as problemáticas específicas17 que refletiam a conjuntura do sul de Pernambuco e norte das Alagoas. O terceiro autor na historiografia do movimento cabano que merece ser destacado é Dirceu Lindoso (1932). Em A Utopia Armada: rebeliões de pobres nas matas do Tombo Real, publicado em 1983, o autor levanta a tese que os cabanos não só apenas representavam os marginalizados de uma sociedade caracterizada pelo poder estamental. Na realidade, os cabanos buscaram a construção de sociedade diferente, com força e em condições para a sua formatação livre do poder e do mando das oligarquias escravagistas e da imposição da civilidade indigenista. Por fim, Luiz Sávio de Almeida e o seu Memorial Biográfico de Vicente de Paula, com publicação em 2005, consubstancia o corpus historiográfico de maior relevância para o entendimento da dinâmica, das causas e das consequências do movimento cabano. No Memorial o autor particulariza os eventos da Guerra dos Cabanos, com o intuito de compreendê-los a partir do estudo da configuração e da sedimentação política na província das Alagoas.
17 Deve ser salientado que a conjuntura política do período regencial é fator determinante ao entendimento da Guerra dos Cabanos. Essa conjuntura, em termos ideológicos, era composta por sobreposições de concepções sociais, com destaque para a ideologia conservadora, representada pelo Partido Caramuru, e para a ideologia liberal, personificada na dualidade moderada e exaltada. Assim, a Cabanada aconteceu em tempo histórico em que se achava insuflado um cenário social onde estas concepções ideologias buscavam espaço na sociedade. Portanto, embora ainda carente de estudos, a fase regencial conteve importantes movimentos de luta social, sendo essencial para a compreensão da história política brasileira.
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Ao mesmo tempo, ele trabalha com a linha de pesquisa em que os cabanos constituíram sociedades alternativas ao modelo societário predominante. Ademais, há uma confluência dos pontos fundamentais dos outros textos, sendo que as matas, com a particular posição da Mata do Riacho do Mato, continuaram sendo o espaço da luta política cabana. Não obstante, há no centro da esfera e do debate historiográfico da subversão cabana uma disputa pela configuração da natureza da revolta. Essa controvérsia se refere à hipótese de que a Cabanada foi a única revolta social na história do Brasil em que houve uma alternância de direção ideológica e política no transcurso dos seus acontecimentos. Desse modo, a Guerra dos Cabanos, que foi iniciada como ideologia absolutista (permanência do sistema escravagista e da grande propriedade latifundiária, mas, principalmente do retorno de D. Pedro I ao poder, etc), teria absorvido, em seguida, as aspirações ideológicas das camadas populares, depois que os chefes absolutistas foram mortos ou presos pelas forças legalistas. Sávio de Almeida é o único teórico a discordar dessa tese. Assim, em sua perspectiva não aconteceu a união de camponeses, negros, índios e de senhores de engenho com interesses divergentes aos dos chefes oligárquicos hegemônicos em torno do reestabelecimento de novos caminhos para a sociedade oficial. Ele consegue formular a tese de que houve uma confluência momentânea de interesses entre os setores populares e os setores absolutistas. Por conseguinte, Sávio de Almeida pressupõe que, até certo ponto, as proposições políticas absolutistas e os interesses sociais das camadas populares e de camponeses, de escravos e
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de índios caminharam simultaneamente por causa da específica conjuntura política possibilitar e mesmo exigir a ocorrência dessa simetria. Entretanto, ele adverte que a chefia e o gerenciamento do movimento cabano ficaram, em seguida, unicamente sob o poder de homens pobres e humildes que representaram as camadas marginalizadas da região. Portanto, apesar da simetria de muitos aportes teóricos trabalhados por Andrade, Freitas e Lindoso, Sávio de Almeida inova em sua abordagem textual ao realçar que a “verdadeira autonomia”18 do movimento cabano somente acontece com os pobres, na medida em que a configuração da sociedade cabana é totalmente diferente da visão absolutista. Com Andrade, tem-se o impedimento da imputação e a demonstração da marginalidade, especialmente quando comenta o final da guerra sob o comando de Vicente de Paula, que emerge após Timóteo e que será o Capitão de Todas as Matas. Andrade considera que o movimento cabano propriamente dito aflora com Timóteo e isso é repassado para Lindoso e para Freitas, enfatizando-se a transição pela retirada da liderança absolutista. Podemos considerar que a Cabanada era a continuidade de um processo político em que os dois movimentos distintos e paralelos convergiam por razões circunstanciais e táticas. Desse modo, não aceitaremos que uma elite assumisse o comando e depois desse lugar para que os cabanos partissem sozinhos para a luta19. 18 O emprego da expressão “verdadeira autonomia” quer dizer que o movimento cabano propriamente dito se organiza quando se efetua a hegemonia da agenda e da pauta popular no conflito, principalmente quando ocorrem as prisões dos primeiros chefes, o que permitiu assunção da liderança de Vicente de Paula. 19 ALMEIDA, Sávio de. Memorial biográfico de Vicente de Paula, o capitão de todas as matas: guerrilha e sociedade alternativa na mata alagoana. Maceió: EDUFAL, 2008, p. 22.
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Com a interpelação de Sávio Almeida se afirma o fato da relação dos cabanos com os restauradores absolutistas ser estratégica, pois quando os interesses das camadas pobres e populares, principalmente sob o comando de Vicente Ferreira de Paula, se tornam hegemônicas, quando as proposituras conservadoras são derrogadas, é que se percebe claramente a autonomia dos interesses cabanos. Será, assim, a partir de Vicente de Paula que os matutos da região em conflito adquiriram uma identidade política própria. É comum na historiografia da Cabanada a afirmação de que o começo das revoltas políticas que mais tarde culminariam no movimento cabano propriamente dito foi a Abrilada, quando, na noite de 14 de abril de 1832, o Batalhão 53º de Caçadores de 2ª Linha, sob o comando do Coronel Francisco José Martins e do Sargentomor José Gabriel de Moraes Maier, se revoltou contra o governo de Pernambuco em face da situação política daquela província20. O conflito não ficou restrito ao espaço urbano e gerenciado pelos militares, pois Domingos Lourenço Torres Galindo, Capitãomor da vila de Santo Antão e pequeno proprietário de terras nas proximidades da Vila de Bonito, aproveitou a conturbação política da Província e se rebelou contra o governo central do Rio de Janeiro. Torres Galindo era defensor convicto da política monarquista e desejava o retorno21 de D. Pedro I ao trono do Brasil. 20 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 45. 21 Nas palavras de Gomes (2007, p. 78) quatro razões contribuíram de forma decisiva para a abdicação de Dom Pedro. As duas primeiras foram os escândalos da vida privada e sua notória oscilação entre os interesses brasileiros e portugueses. O envolvimento com a Marquesa de Santos e a morte da popular imperatriz Leopoldina, chorada até pelos escravos e pessoas mais humildes, causaram revolta em um país ainda muito católico e conservador, cuja população considerava esse tipo de comportamento intolerável. Um terceiro motivo para a abdicação foi a longa e desgastante guerra com a Argentina pelo controle da província Cisplatina, o atual Uruguai, também chamada de Banda Oriental pela sua localização geográfica, a leste do Rio da Prata. O império acabou derrotado de forma humilhante em 1827, quando as forças argentinas e uruguaias massacraram os brasileiros na localidade de Ituzaingó. Todas essas dificuldades convergiram na quarta e definitiva razão para a impopularidade do imperador: a permanente instabilidade política do Primeiro Reinado, resultante, em grande parte,
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A força do discurso restaurador de Torres Galindo e de outros absolutistas se estendeu na região que ligava as províncias de Pernambuco e de Alagoas, principalmente com a ajuda de João Batista de Araújo, incipiente proprietário de terras em Barra Grande. É nesse contexto que os índios do Jacuípe22, sob a influência de João Batista de Araújo entram para engrossar as fileiras dos revoltosos. Sob o lema da restauração de D. Pedro I, os principais senhores de engenho e proprietários de latifúndios passaram a diversas incursões contra as forças federalistas regenciais. Há um consenso historiográfico de que com as ações de Antônio Timóteo23, pequeno proprietário de glebas de Panelas do Miranda, as massas pobres ingressaram definitivamente no movimento revoltoso. É este o momento apontado por Almeida (2005) quando fala que há um paralelismo de interesses entre os camponeses pobres, os índios aldeados e mais tarde os escravos e os interesses absolutistas. Com Antônio Timóteo, e com os índios do Jacuípe, ganhou a revolta o apoio das massas, das camadas mais pobres da população, que a continuaram por muitos anos, enfrentando as maiores dificuldades, ao mesmo tempo em que do gênio impulsivo e autoritário do soberano. A dissolução da constituinte, em 1823, a censura à imprensa, a perseguição aos jornalistas, ex-companheiros da maçonaria e adversários políticos em geral, o cruel tratamento aos mártires da Confederação do Equador e outras decisões minaram rapidamente a já precária rede de apoio que o imperador conseguira tecer no início de seu reinado. 22 Em Dantas (2014, p. 118) se percebe que a participação indígena nas lutas cabanas, diferentemente da participação dos negros, estava correlacionada mais com a questão da posse da terra do que com a privação da liberdade. Desde o início da colonização brasileira o elemento indígena foi tratado como sem legitimidade para a posse territorial. No entanto, até a implantação do sistema escravista, foi ele o responsável pelo desenvolvimento da produção colonial. Assim, desde o século XVI a política de aldeias foi uma forma recorrente de presidiar o índio. Os índios do aldeamentopresídio do Jacuípe aderiram a guerra dos cabanos porque esperaram com ela a obter as suas terras, apropriadas pelos senhores de engenho para o plantio da cana-deaçúcar. 23 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 61.
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os homens poderosos que a tramaram, que a organizaram, ou foram presos ou depuseram as armas. É que iniciaram uma simples quartelada, uma revolução para ser vitoriosa em poucos dias, mas a plebe, os índios e mais tarde os escravos, iniciada a luta, fugiram ao seu comando, ao seu controle, e se colocaram sob as ordens de chefes humildes como eles, saídos da própria plebe24.
Deve-se entender a expressão “massas pobres” como o contingente social excluído da vivência do poder na sociedade açucareira, sendo que, com o aumento do número de revoltosos, os governos provinciais de Pernambuco e das Alagoas tiveram que dispor de todos os possíveis mecanismos repressivos. Ao espaço geográfico conflagrado foram deslocados inúmeros destacamentos legalistas e peças de artilharias, além de terem adotados estratégias de controle logístico de portos por aonde chegavam os mantimentos, as armas e as munições para a continuidade da revolta. No entanto, as ações legalistas não surtiram os efeitos esperados, principalmente porque os revoltosos, especialmente aqueles que habitavam as matas, tinham o conhecimento topográfico da região e, assim, adotando as ações de guerrilhas25, os revoltosos conseguiam impetrar múltiplas derrotas às forças repressoras provinciais. As populações pobres das matas não contribuíam com as forças legalistas apenas porque eram influenciadas pelos proprietários de terras da região que aderiram ao movimento 24 ANDRADE, op cit. 61. 25 Em setembro de 1832, com a prisão dos primeiros chefes cabanos, a organização do movimento fica ao encargo das gentes pobres das matas. Sob o comando de Vicente de Paula, ocorre uma mudança fundamental nas estratégias cabanas. Assim, passaram os cabanos a adotar a forma de luta denominada de guerrilha, que constituía na construção de arraiais nos interiores das matas e na composição de acampamentos móveis. Podiam os cabanos, por meio dos acampamentos móveis, atacar as forças legalistas de surpresa, enquanto os arraiais, localizados em lugares de difícil acesso, eram desenvolvidas diversas agriculturas de subsistência.
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cabano, que sob a égide do mando e do poder que dispunham poderiam punir aqueles que ajudassem as tropas provinciais, mas também porque faziam uma leitura daquela conjuntura política como uma possibilidade de transformação social26. Os meses se prolongavam e a revolta cabana trazia consequências prejudiciais para as economias das províncias de Pernambuco e das Alagoas. Não é incomum que em uma guerra em região produtiva e relevante para a economia agrícola o seu prolongamento trouxesse consequências simultâneas para a infraestrutura econômica, afetando os demais setores da sociedade. Exemplo claro do agravamento da economia da região em guerra por conta da Cabanada se fez sobre a produção da farinha na região. O abandono de várias áreas, devido à luta e à diminuição de braços no cuidado das lavouras, fez com que houvesse em Pernambuco grande falta de farinha de mandioca, acarretando o aumento do preço do produto para 9$600 o alqueire na capital e 12$800 nas regiões vizinhas à zona conflagrada27.
Em meados de julho de 1833, o governo central do Rio de Janeiro, através de instrumento público, ordena aos presidentes das províncias de Pernambuco e de Alagoas que se unifique o comando da guerra, visando alcançar maior organização na luta contra os cabanos. O comando pernambucano ficou sob a responsabilidade do Tenente-Coronel Joaquim Coelho, enquanto nas Alagoas ficou sob os auspícios do Major Joaquim José Luiz de Sousa28. A 26 A historiografia cabana é repleta de relatos de casos de estupros e de apropriações de bens da população pobre na área em guerra, por parte das forças legalistas, despertando a simpatia dos pobres para a causa cabana. 27 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 81. 28 ANDRADE, op cit. p. 95.
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finalidade era racionalizar29 as estratégias do confronto, erradicar a ajuda que senhores oligárquicos ofereciam aos revoltosos cabanos e buscar a adesão das populações pobres para que ajudassem no aprisionamento dos revoltosos. Com a unificação militar os cabanos passaram a perder espaço e força, sendo que uma das primeiras ações foi oferecer anistia política aos revoltosos cabanos que resolvessem abandonar a luta. Além disso, as populações pobres da área em guerra eram cooptadas pelas forças legalistas. Para que deixassem de auxiliar os cabanos, aos pobres eram oferecidas doações de terras e a concessão jurídica do perdão público. Nesse quadro, os cabanos pareciam caminhar para a derrota, principalmente depois que várias autoridades oligárquicas, notadamente as alagoanas, foram identificadas e presas. Não obstante, a luta cabana foi perdendo força na medida em que, a partir de 1834, as forças legalistas passaram a adotar a estratégia de enfrentar os cabanos no próprio território das matas. Assim, os piquetes conseguiram enfraquecer a luta cabana, pois, além de imobilizar as possibilidades de deslocamento dos cabanos e obstruir a circulação de armas e de munições, os arraiais e os roçados cabanos eram destruídos30. A hipótese histórica de que a luta cabana não se confundia com os interesses absolutistas defendidos por alguns senhores oligárquicos no início da sublevação em 1931, sendo apenas uma 29 Merece ser frisado que o termo racionalizar aqui empregado se refere a adoção de medidas de controle eficientes das ações de combate, desde a logística armamentista, o deslocamento de mais soldados, até a implementação de política de anistia e de perdão judicial e distribuição de recursos materiais. 30 Os piquetes se definiam por explorações das matas do Tombo Real e foram de fundamental importância para o enfraquecimento da luta cabana. Muitas localidades da nossa região surgiram a partir das explorações das matas contra os cabanos, como foi o caso da localidade Cavaco. Se esta localidade foi inicialmente um ponto cabano, onde possuía diversas lavouras para a subsistência dos revoltosos, se tornou ponto estratégico e fundamental para as forças legalistas.
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confluência de forças circunstanciais, se confirma quando da morte de D. Pedro I. As forças legalistas esperavam que com a morte do antigo imperador do Brasil os cabanos deixassem de lutar, visto ser o retorno de D. Pedro I a razão fundamental da luta cabana. A morte de D. Pedro I e o estado de fraqueza em que estavam os cabanos levaram o presidente Manuel de Carvalho a lançar uma última proclamação aos mesmos para se apresentarem aos pontos de Água Preta, Porto Calvo e outros que fossem designados pelo Comandante-emChefe, comprometendo-se o governo a conseguir da Assembleia Legislativa a anistia para todos31.
Depois da política de anistiar os que lutavam contra os interesses do Governo Central, muitos cabanos abandonaram a área conflagrada e depuseram as armas. Outros receberam lotes de terras para recomeçarem suas vidas em outras localidades, afastados da ideologização cabana de que a sociedade senhorial precisava ser alterada, sendo que, o final de 1834 dava sinais de que o processo de luta contra os cabanos já estava no seu término. No
entanto,
apesar
das
medidas
surtirem
efeitos
consideráveis, os principais líderes cabanos continuavam em luta, pois a redução do contingente cabano não se fez sentir na convicção da ideologia cabana. Ela estava intacta e, assim, as forças legalistas perceberam que deveriam atacá-la no plano do sobrenatural. Precisavam, de uma vez por todas, acabar com a insegurança econômica e política que reina na região. Muitos cabanos, com destaque especial para Vicente Ferreira de Paula, viviam no interior das matas e ainda ocasionam receios. Os estratagemas de cooptação dos cabanos e das cabanas 31 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 185.
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que relutantes em abandonar a crença cabana poderiam ainda promover problemas ao status quo fez com que se adotassem diversos tipos de cooptação.
Antigo muro do Arraial do Cafundó, em Lagoa dos Gatos, PE32
Foi assim que, a partir de fevereiro de 1935, achou por bem o governo provincial de Pernambuco enviar à região do polígono cabano o Bispo de Olinda, D. João Marques da Purificação Perdigão. A finalidade do religioso católico era convencer os escravos, os índios e as gentes pobres que ainda se orientavam pelos líderes cabanos para deixarem aquele modo de vida, porque não correspondiam à vontade de Deus, na medida em que “assegurava aos cabanos que eles viviam em pecado e deviam depor as armas para obterem o perdão de Deus33”. A permanência do religioso na área dos conflitos cabanos acarretou consequências positivas para os chefes legalistas. Por 32 Fotografia tirada e enviada por José Fernando, colega de sala no curso de graduação em História, na Famasul. Ele é professor de História e é um estudioso, no município de Lagoa dos Gatos, do movimento cabano. 33 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 209.
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onde passava o bispo em questão, eram frequentes as cerimônias de crisma e de batizados. Ao lado desse serviço espiritual, os presidentes das províncias de Pernambuco e de Alagoas tinham autorizado que se fizesse a entrega de comidas, de roupas e de ferramentas para aquelas famílias que abandonassem a luta cabana, além de oferecer pagamento em dinheiro pela captura e entrega de armas, munição e escravos e escravas34. Finalmente, em meados de 1835, os governos de Pernambuco e das Alagoas declararam o término da guerra contra os cabanos. De fato, entre o final de 1834 e meados de 1835 o movimento cabano perdeu muito de sua força em função das deserções conseguidas pela política de cooptação legalista. Se quase todo o contingente indígena foi cooptado, assim como muitas famílias pobres foram absorvidas pelo poder senhorial, os negros continuaram lutando pelo sonho da liberdade. Entretanto, foi quando o movimento cabano aparentou abrandado, sem condições de transformar a sociedade senhorial, foi que ele se mostrou mais dinâmico e atuante para a concreta modificação das bases sociais, principalmente depois que Vicente Ferreira de Paula, liderando o temível grupo de negros papaméis35, abalou as estruturas do poder na região fronteiriça entre as províncias de Pernambuco e das Alagoas. A instalação da Colônia Militar Leopoldina foi uma das consequências referentes às ações políticas de Vicente Ferreira de Paula. Do final de 1835 até a sua morte, em 1870, Vicente de Paula, o 34 ANDRADE, op cit. p. 211. 35 Os negros papa-méis são apresentados na historiografia cabana como aqueles escravos que fugiam do poderio dos senhores de engenho e estabeleciam moralidade nas matas atlânticas. Foram inúmeros os mocambos de negros papa-méis na territorialidade que, no século XVII, abrigou o Quilombo dos Palmares. Os negros papa-méis, denominação dada em função da alimentação nas matas ser parca, o que forçava o consumo de todo tipo de alimentação a volta, como o mel. No entanto, sociologicamente, pode-se dizer que eram assim denominados porque invadiam engenhos e fazendas para libertar outros escravos.
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“capitão de todas as matas”, como era chamado na época da guerra dos cabanos, se envolveu, direta ou indiretamente, nos principais acontecimentos políticos nas duas províncias, sendo, por isso, elemento chave para o entendimento da fundação da Colônia Militar Leopoldina. (...) a Província de Pernambuco, prodiga em lutas armadas, concorreu para que os vencidos naturalmentemprocurassem distância dos vencedores embrenhando-se pelo interior para ficar a salvo do revide dos mais fortes e está constatado, através de documentos, que o aparecimento de grupos extremados nesta região (no território de Colônia Leopoldina) fez com que o Governo Imperial criasse uma Colônia Militar com a função de protegêla do ingresso nestas bandas, de tais grupos armados. Há citação de que Vicente Ferreira de Paula foi participante ativo da revolta que foi uma continuação da Abrilada e da Cabanada que duraram de 1832 a 1835 e as Províncias de Pernambuco e das Alagoas foram palcos de mais um movimento pela restauração de D. Pedro I. (...) os constantes movimentos armados, que perfuraram com outros nomes, fizeram com que o Governo tomasse sua posição de defesa e assim houve por bem, o Imperador D. Pedro II, com o Decreto nº 729, de 09 de novembro de 1850, criar a Colônia Militar36.
Depois de 1835, Vicente de Paula estabeleceu uma “miserável povoação nos limites entre Pernambuco e Alagoas, às margens do Rio Jacuípe, a qual foi denominada de Riacho do Mato37”. Lindoso 36 SILVA, Everaldo Araújo. A colônia da princesa. Maceió: IGASA, 1982, pp. 35-36. 37 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 222.
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(2005) também comenta a localização do capitão de todas as matas, dizendo que “se recolhera precavido, com a sua tropa papa-mel e de matutos combatentes (...) ao arraial que erguera, por cuidado, na ribeira de um afluente do Jacuípe, que se chamou de Riacho do Mato Frio”38. No Riacho do Mato, Vicente de Paula permaneceu sem qualquer contato com os principais personagens políticos da região até 1841, quando recebeu, em seu acampamento no Riacho do Mato, a missão político-religiosa do Frade Plácido Messina, representante de Barão da Boa Vista. O capuchinho Messina permaneceu no arraial do Riacho do Mato por 20 dias. O Riacho do Mato é descrito na historiografia como um lugar onde os seus moradores, sob a liderança de Vicente de Paula, exploravam os seus recursos naturais. Utilizavam as férteis terras das matas para extrair madeira que eram destinadas a construção de jangadas as quais eram comercializadas. Há também a menção de que no Riacho do Mato os seus moradores plantavam algodão para a confecção de indumentárias e para um incipiente comércio39. Parece que, conforme se depreende da leitura Andrade (2005), a visita do religioso serviu de atestado público de que o antigo inimigo da forma com que a política provincial se organizava não mais estava interessado em sublevações sociais. Será Lindoso (2005), no entanto, que comunicará o fato de que a presença do capuchinho Messina serviu para que vários acordos fossem firmados: restabelecimento das missões católicas no polígono cabano; proibição dos ritos religiosos não católicos; proibição do despique, etc40. Após um longo período intenso de 38 LINDOSO, Dirceu. A utopia armada: rebeliões de pobres nas matas do Tombo Real. ed. 2. Maceió: EDUFAL, 2005, p. 321. 39 ANDRADE, Manoel Correia de. A guerra dos cabanos. ed. 2. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2005, p. 223. 40 Mereceu destaque, por parte de Lindoso (2005, pp. 325) a prática corrente do despique entre os cabanos do arraial do Riacho do Mato. O despique funcionava como uma instituição social, em que os encontros eróticos a constituição familiar não eram fixos. Assim, a troca de casais, ou seja, a poligamia, herdada dos índios cariris, foi
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lutas, as autoridades militares de Pernambuco cogitaram que os cabanos do Riacho do Mato e dos demais recantos da área do polígono cabano poderiam esquecer o passado de lutas, através da conversão social, por meio da fé nos dogmas católicos. De fato, parecia que o homem que comandou o temível grupo de negros papa-méis estava acalmado, querendo apenas viver em paz o restante do tempo de sua vida, a ponto dele fazer uma declaração41, por influência do frade Messina, publicada, em 10 de janeiro de 1842, no Diário de Pernambuco.
Riacho do Mato nos dias atuais42
Não obstante, esse acordo entre os cabanos e o sistema sesmeiro-escravista estava fadado à ineficiência. Compreendeu Vicente de Paula que não podia coibir as práticas culturais deslegitimada pelo religioso Messina. 41 Nessa declaração, nas palavras de Andrade (2005, p. 224) “Vicente Ferreira de Paula pede perdão ao Imperador do Brasil pelos crimes a ele atribuídos, assim como jura fidelidade ao supremo governante do Brasil”. 42 Na temporalidade presente, o lugar Riacho do Mato não tem mais as matas que abrigaram a comunidade cabana de Vicente de Paula. No entanto, Riacho do Mato é ainda a expressão visível de uma sociedade em que a desigualdade social é predominante.
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seculares de pobres mocambeiros e de índios, pois eram eles que constituíam a organização cabana. Assim, os cabanos aceitaram os termos do acordo de forma estratégica, sendo uma maneira de ganhar tempo43. A sua aparente inatividade política não fez com que ele perdesse o prestígio, a estima e o respeito das gentes pobres que vivam as margens da sociedade canavial. A partir de 1843, afirma a historiografia sobre a Cabanada, Vicente de Paula começa a participar, novamente, da política local das duas províncias. Coerente com as suas ideias, continua acolhendo os negros fugidos dos engenhos, amparando mulheres, homens e crianças que, desprovidos de recursos materiais, necessitavam de um pedaço de terra para trabalhar e sobreviver. O ponto auge do recrudescimento político de Vicente de Paula se dá em 21 de outubro de 184444. Liderando um pequeno agrupamento de negros papa-méis de toda sorte de pobres da região do Jacuípe, ataca o nervo central da política alagoana, o centro administrativo de Maceió, especificamente o consulado da Inglaterra, fazendo prisioneiro o Cônsul inglês, M. Brunnet45. Tal fato foi visto como absurdo, pois um matuto das brenhas do Jacuípe não poderia continuar aterrorizando uma região em que a produção econômica assentava e estabelecia o crescimento da província alagoana. Em 1848 ele volta à cena política, participando 43 LINDOSO, Dirceu. A utopia armada: rebeliões de pobres nas matas do Tombo Real. ed. 2. Maceió: EDUFAL, 2005, p. 27. 44 O retorno de Vicente de Paula na cena política alagoana se dá quando da participação no conflito entre os Lisos e Cabeludos. Os lisos constituíam a facção política conservadora, sob a orientação de Tavares Bastos, enquanto os cabeludos personificavam a agenda política do império e a dominação de D. Pedro II, sob a proteção de Cansanção de Sinimbu. Ambas as facções lutavam pela hegemonia política na província das Alagoas, sendo que os seus parentes ainda travam, na atualidade, violentas batalhas políticas nos currais do estado. 45 PONTES, Carlos. Tavares Bastos (Aureliano Cândido): 1831-1875. Coleção Brasileira, 1. vol. São Paulo: Companhia Nacional, 1939, p. 51.
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da Revolução Praieira46 contra os liberais. No entanto, por ter se negado a se aliar a política centralista, e por sempre está envolvido com as fugas e o acolhimento de negros, ajudando-os, muitas vezes, na organização de quilombolas, foi preso, em 2 de abril de 1850, sendo, em seguida, remetido ao sistema prisional de Fernando de Noronha. Com a prisão de Vicente de Paula, as próprias matas estavam sendo aprisionadas. Estradas rompiam o intricado das pequenas veredas, a produção chegaria em termos de uma agricultura, casas surgiriam, e onde era o esconderijo nasceria uma vila de casas47. De qualquer forma, a prisão dele causou alvoroço entre os moradores dos territórios cabanos, pois se sabia que não mais teriam a disposição o líder das gentes pobres, sempre pronto a defender os interesses daqueles que precisam das matas para subsistir. O capitão de todas as matas foi solto em 1861. Embora velho e sem a força de parte dos aliados cabanos, Vicente de Paula ainda metia medo nas autoridades pernambucanas e alagoanas. No entanto, ele foi vencido pelo tempo e morreu em 1868, deixando à memória oligárquica a mensagem de que, as gentes pobres, quando organizadas e confiantes do seu poder, a transformação social é possível.
46 A Revolução Praieira é mais uma daquelas impropriedades semânticas que demarcam o campo historiográfico nacional. Ocorrida entre 1848 a 1850, na província de Pernambuco, representou o conflito, sob a inspiração das concepções liberais europeias, entre conservadores e liberais. Tratou-se de um movimento em que a luta social se resumiu a manutenção da propriedade privada e dos privilégios oligárquicos, sem qualquer vinculação com os pobres. No caso, a participação de Vicente de Paula, nesse conflito, verificou-se como uma estratégia para avaliar a composição do poder na região cabana. 47 ALMEIDA, Sávio de. Memorial biográfico de Vicente de Paula, o capitão de todas as matas: guerrilha e sociedade alternativa na mata alagoana. Maceió: EDUFAL, 2008, p. 323.
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Despotencialização da ingenuidade colonialista Afirmou-se no começo do texto que a hipótese referente ao entendimento das circunstâncias do surgimento da Colônia Militar Leopoldina foi o controle das ideias e das práxis cabanas que ainda tinham força para sublevar a ordem política e social. Concomitantemente, afirmamos que a Colônia Militar Leopoldina se constituiu numa forma estrategicamente elaborada de controle e de dominação social. Na realidade, a forma de dominar as populações através de instituições formalmente constituídas pelo poder central, como foi o caso das Colônias Militares, não foi uma novidade na forma política de administrar as populações brasileiras. Desde os primeiros anos da colonização portuguesa no continente americano, as amplas extensões do território brasileiro impuseram grandes dificuldades aos administradores da coroa portuguesa e, mais tarde, aos do império brasileiro, na medida em que a busca por explorar a potencialidade de todo o território se chocou, inicialmente, com o desconhecimento de toda a sua extensão e, mais tarde, com o despertar da consciência política em agrupamentos sociais que visavam desarticular o domínio administrativo, político e econômico das elites regionais. Contudo, desde as últimas décadas do século XVIII, o ato de governar ultrapassou os limites impostos pela defesa do território. Era necessário, a partir daquele momento, administrar também as populações e os contingentes sociais que viviam a margem da riqueza produzida no Brasil. No início do século XIX, o conceito de governar, até então bastante relacionado à noção de ordenar, conservar e defender territórios mudou consideravelmente.
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Desse modo, no contexto político de meados do século XIX o governo imperial dispõe de uma série de medidas e de estratégias para a dominação não apenas dos territórios onde o poder ainda não tinha chegado, visando, com isto, a implementação da organização e da exploração econômica, mas, sobretudo, à dominação ideológico-política sobre as populações marginalizadas que poderiam se revoltar contra a ordem e o status quo imperante. Um desses mecanismos seria a instalação de colônias militares por todo o território. O projeto de instalação de um conjunto de colônias militares espalhadas pelo interior do território brasileiro ilustra bem esse cenário de mudanças na forma de governar, o qual foi empreendido pelo governo imperial de Dom Pedro II. O estabelecimento de uma rede de colônias militares e de presídios foi, portanto, um dos meios de penetração, de domínio e de povoamento de uma grande extensão de terras no Brasil independente48. Com isso, as colônias militares tornavam-se um instrumento da centralização política do império brasileiro, pois, como previa esse projeto, seria submetido um número maior de pessoas ao controle da Corte no Rio de Janeiro: o comando das colônias militares estava intimamente relacionado à presidência das províncias, e estas, vinculadas diretamente à Corte na cidade do Rio de Janeiro49.
As colônias militares, apesar das recorrentes dificuldades de manutenção, sobreviveram durante todo o período imperial e serviram para a criação de novos núcleos de povoamento e para 48 BRÜGGEMAN, Adelson André. A sentinela isolada: o cotidiano da colônia militar de Santa Thereza (1854-1883). Florianópolis: UFSC, 2013, p. 27. 49 BRÜGGEMAN, op cit. 28.
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a expansão das áreas dedicadas à agricultura. Nesse contexto, Campos (2011) afirma que: (...) as colônias militares eram instituições que consistiam em um universo social em que as ações específicas do Estado Nacional brasileiro objetivavam o controle daqueles grupos sociais marginalizados (pobres livres, quilombolas, etnias indígenas, etc.) situados nas comunidades locais, assim como trazer para o interior das tramas burocráticas provinciais e imperiais os elementos sociais marginalizados espalhados pelo império. Sendo assim, essa instituição militar configurou-se a partir de uma política que tinha como objetivo a centralização das decisões políticas do Estado imperial brasileiro50.
Sob esse ponto de vista deve-se entender a função social e política da Colônia Militar Leopoldina51. A sua instalação não adveio do desejo humanitário do Governo Central e dos políticos das elites da Província das Alagoas. Ademais, em 1850, ano em que Vicente de Paula é preso, o governo do Rio de Janeiro promulga a Lei de Terras52. Assim, com a prisão do temível guerrilheiro cabano e com a instituição de uma legislação oligárquica sobre 50 CAMPOS, Rafael Ramos. A atuação militar da colônia militar de São Pedro de Alcântara no Maranhão oitocentista. Anais do 35º Encontro Anual da Associação Nacional de PósGraduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS). São Luís, 2011, p. 11. 51 A fundação da Colônia Militar Leopoldina foi um ato do Estado brasileiro cuja relevância ultrapassa o meramente econômico e o político, haja vista que, em termos jurídicos, serviu de paradigma para a instalação de outras colônias militares no território nacional. Em trabalho sobre o sistema de colônias militares, Santos (2009, pp. 3-4), afirma que “me remeto, especificamente, ao Decreto n° 820, de 12 de setembro de 1851, que aprova o regulamento da Colônia Militar Leopoldina, na província de Alagoas, e que serviu de base para os regulamentos de várias das colônias militares criadas posteriormente”. 52 Importante documento jurídico que tinha o objetivo de regulamentar o direito agrário brasileiro, com destaque para a proteção da propriedade privada. No contexto da época em que é criada a Colônia Militar Leopoldina, a Lei de Terras vai representar a tentativa do Estado em apossasse das terras em que os cabanos, por décadas, desenvolveram a luta contra o sistema sesmeiro.
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as terras, “legalizou-se o avanço dos engenhos de açúcar sobre as terras devolutas que ainda se encontravam nas mãos de pequenos posseiros”53. Por conseguinte, a instalação da Colônia Militar Leopoldina correspondeu ao fato de que a produção econômica da cana-deaçúcar deveria avançar sobre os territórios das matas que em décadas serviram de espaço de lutas dos cabanos. Além disso, a Colônia Militar Leopoldina prestou-se ao estabelecimento do constante estado de atalaia, necessário para o controle de possíveis sublevações sociais. Era esse o momento em que a civilização adentraria em espaços selváticos nunca antes explorados. Desse modo, se do ponto de vista das classes dominantes os arraiais, os agrupamentos de negros mocambeiros e demais espaços de lutas nas matas representavam o ambiente da selvageria, os engenhos instalados para a produção do açúcar representavam o avanço da polidez branca.
Planta da povoação da Colônia Militar Leopoldina
53 MELLO, Janaina Cardoso. Matas Temoratas: resistência e medo na Guerra dos Cabanos (Alagoas – Pernambuco/ 1832-1850). XXIII Simpósio Nacional de História. Londrina: ANPUH, 2005, p. 7.
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Entretanto, a compreensão histórica que assentou e fundamentou a instalação e o estabelecimento da Colônia Militar Leopoldina, em 1852, ainda é marcada, no espaço público leopoldinense, por buchichos e inconsistências históricas ou não quanto pelo próprio desconhecimento. De tal modo, quando não há, assim, o total desconhecimento do que se buscou com a instalação da Colônia Militar Leopoldina, do seu projeto político e social, assim como da sua finalidade econômica, o que se predomina é um conjunto de assertivas que se afasta, peremptoriamente, do que de fato aconteceu em seu processo. Quanto aos burburinhos e as inconsistências históricas, estas podem ser desfeitas, na medida em que, a partir dos instrumentais próprios da investigação histórica, pode-se se chegar ao conhecimento do porque acharam por bem os representantes da política e do poder dominantes da província alagoana instalar uma colônia militar as margens do Rio Jacuípe. Assim sendo, pela pesquisa histórica se tem a possibilidade e a oportunidade de desvendar os conteúdos discursivos que, ao longo do tempo, se tornaram metanarrativas54 na incipiente historiografia local e que ainda são substratos justificatórios que fundamentam a parte semiótica da comunidade municipal leopoldinense e que, em geral, povoam o seu imaginário social. Cabe ressaltar que esse imaginário social é composto não exclusivamente por uma parte discursiva, mas também constituído por uma miríade de símbolos e rituais.
54 O termo metanarrativa tem o sentido de se apresentar como sendo um discurso absoluto ou meta-discurso sobre determinados campo do saber. O conhecimento meta-discursivo caracteriza-se por ser composto por asserções globalizantes e totalizantes sobre a história, prescrevendo o que pode ser considerado verdadeiro e falso. Aplicadas no campo da pesquisa histórica, as metanarrativas têm o condão de estabelecer falsos consensos universais sobre os acontecimentos históricos.
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São várias as inconsistências históricas em torno da instalação da Colônia Militar Leopoldina. A título de ilustração, são os casos em que, se por um lado, se afirma ter sido a sua instalação uma necessidade e uma medida político-criminal para conter o avanço dos “facínoras” cabanos, por outro lado, muitos ainda acreditam que, em 1860, quando da visita de D. Pedro II à Colônia Militar Leopoldina, a princesa Leopoldina estava presente. São essas crenças algo distorcido e que, ao longo do tempo, tornaramse naturais no discurso oficial da cidade. Nessa perspectiva, a desarticulação dessas metanarrativas, incorporadas ao senso comum por um projeto historiográfico e político, precisa ser implementada pela criticidade de seus conteúdos. Depois de se investigar historicamente, chegase a certeza de que a princesa Leopoldina não conheceu, pessoalmente, a instalação econômica e militar que tinha o seu nome e que, principalmente, a instalação da Colônia Militar Leopoldina não se constituiu em uma exteriorização institucional do poder dominante para solapar os bandidos, os “selvagens” e os criminosos cabanos, não porque visava desenvolver economicamente o lugar, ou mesmo civiliza-lo. A verdade é que a Colônia Militar Leopoldina tinha a finalidade de sistematizar a ocupação das terras para a ampliação da produção do capital açucareiro e impedir, ao mesmo tempo, o surgimento e a expansão de concepções políticas com capacidade de modificar as bases sociais, como foi vista durante a Cabanada. Se em décadas anteriores as ideias cabanas tiveram a potencialidade de transformar a realidade social de escravos, de índios e de pobres posseiros que sobreviviam às margens da sociedade formada na fronteira entre as províncias de Pernambuco
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e das Alagoas, quando da instalação da Colônia Militar Leopoldina a ideologia cabana e o seu projeto social ainda estava vivo, o que acabou promovendo o temor nas elites políticas das duas províncias. Por seu turno, no que tange a ignorância, ao desconhecimento das razões históricas sobre a origem do município de Colônia Leopoldina, é cogente afirmar que essa condição tem como responsável uma profunda engenharia social e política sobre a produção historiográfica do século XIX1. Paulatinamente a elite alagoana conseguiu desenvolver não tão apenas uma visão alterada da concepção social que o movimento cabano defendia, pois outro resultado urdido foi a promoção de um completo estado de esquecimento. Na realidade, o estado de desconhecimento se refere ao fato de que, mesmo com a rescisão everaldiana2, a grande maioria dos munícipes ainda não sabe o que se escondeu por detrás do discurso do desenvolvimento econômico e do policiamento preventivo e repressivo contra os cabanos que realizados pelo poder dominante, fundamentou a instalação da Colônia Militar Leopoldina. No entanto, a superação dessa condição de ignorância nos exigirá uma qualidade fundamental para o efetivo desenvolvimento social de nossa cidade, haja vista que, quando se toma conhecimento da conjuntura histórica e dos motivos que determinaram a instalação da Colônia Militar Leopoldina, evidencia-se o porquê 1 A história da luta cabana, por longo período de tempo, até o rompimento do seu aprisionamento gráfico-textual nos moldes da escrita oligárquica alagoana, foi tratada como objeto de estudo de instituições e personagens acadêmicos sob o prisma do banditismo. 2 Refere-se ao livro A Colônia da Princesa, do professor Everaldo Araújo Silva, publicado em 1982 e que inaugurou a historiografia do município de Colônia Leopoldina. Entretanto, é preciso explanar que o autor da obra não se preocupou em justificar as razões que levaram à instalação da Colônia Leopoldina. De tal modo, apesar de forte instrumental documental, A Colônia da Princesa obedece e tem como metodologia o instrumental da crônica.
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da política partidária dominante ainda vigorar em nosso meio social de muitas formas. Se pela criticidade se pode enfrentar as confusões e as inconsistências históricas, será pela coragem que a ignorância será superada, sendo que a coragem é necessária para desvencilharmos da “postura natural” que adotamos, quando o assunto é a origem de Colônia Leopoldina, já que da falta da coragem crítica se perpetua, no mínimo, algo que denominamos de “ingenuidade colonialista”. A ingenuidade colonialista é a crença acrítica e equivocada que coloca a instalação da Colônia Militar Leopoldina com o objetivo de desenvolver o lugar através de atividades de produção econômica com base em produtos derivados da cana e que, para tanto, precisou-se expurgar, desse mesmo lugar, aqueles agrupamentos políticos que, havendo condições para se organizarem, poderiam agitar as fundações de uma sociedade caracterizada pela crença de que a hierarquia estrutural e a desigualdade social deveriam ser permanentes. Com efeito, o fundamento da ingenuidade colonialista é uma postura natural, se apresentando como a expressão do que Edmund Russerl chamou de “tese geral”. A tese geral é um conceito que tem repercussão, na contemporaneidade, com a filosofia fenomenológica russearliana e que representa a postura dogmática do ser humano diante da existência. Nesse sentido, em relação à origem da cidade de Colônia Leopoldina, o comum é a dogmaticidade dos discursos e das estórias contadas até aqui, o que acaba, em último caso, contribuindo para a permanência da ignorância. Entretanto, o que constitui a postura natural? Sobre ela, Husserl afirma:
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O mundo natural, o mundo no sentido usual da palavra, desde que vivo naturalmente nele, é, e, para mim, sempre esteve aí. E, quando isso acontece, estou em uma postura natural. Encontro permanentemente a realidade espaciotemporal como o que está diante de mim, uma realidade à qual eu mesmo pertenço, e à qual pertencem todos os homens que nela se encontram e a ela se relacionam da mesma maneira. Como desperto que sou, encontro uma experiência conexa e sem rupturas, a realidade – já a palavra o diz – como existente, e a aceito, tal como ela se dá, como realmente existente3.
Nesse contexto, acerca da origem da cidade de Colônia Leopoldina, a ingenuidade colonialista é a fonte reprodutora da crença de que a sua instalação foi um ato bondoso da elite política da província das Alagoas e que o seu coroamento foi a visita, em 1860, do próprio Imperador do Brasil. Essas crenças estão afastadas de uma visão crítica de nossa história e não representam o conhecimento concreto do objetivo da instalação daquela estrutura colonial. Estas são as convicções fundamentais da parte discursiva da ingenuidade colonialista. Portanto, percebe-se, no que se refere ao saber social da origem histórica da cidade de Colônia Leopoldina, que há profundas relações entre as inconsistências históricas e a ignorância da história leopoldinense, visto que da ignorância da história se produz explicações históricas inconsistentes. Não obstante, em geral, as inconsistências e as ignorâncias conseguem ultrapassar o campo do meramente discursivo. Assim, embora sendo a ideologia o instrumento clássico de legitimação 3 BORNHEIM, Gerd. Introdução ao filosofar: o pensamento filosófico em bases existenciais. ed. 3. São Paulo: Globo, 2009, p. 66.
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de regimes e sistemas políticos no mundo moderno, ou seja, a justificação racional da organização do poder, as justificativas ideológicas possuem também elementos que extravasam o meramente discursivo, o cientificamente demonstrável, pois, conforme Carvalho (1990), “o discurso ideológico supõe modelos de poder, modelos de organização da sociedade, que traz embutido aspectos utópicos e visionários”.4 É nesse sentido que a ingenuidade colonialista pode ser também identificada no imaginário social local leopoldinense. Ela não está concentrada exclusivamente nos discursos políticos e nas dinâmicas e atividades pedagógicas escolares em nossa sociedade, mas também nos símbolos que têm a função de representar e de reproduzir os moveis da nossa história. Assim,
a
ingenuidade
colonialista,
que
nasce
simultaneamente com a instalação da Colônia Militar Leopoldina, se acha traduzida e plasmada, contemporaneamente, no hino do município, sendo este um dos principais símbolos cívicos da cidade. Desse ponto de vista, pode-se aceitar o fato de que a aquela determinada forma da política partidária, ensejada no discurso do poder dominante, ainda vigora em nossa sociedade, cuja função é reproduzir uma determinada visão de sociedade. Hino do Município de Colônia Leopoldina5 Salve! Salve! Colônia Leopoldina Que vieste da Colônia Militar Berço de heróicas famílias Por teus filhos a te glorificar Salve! Salve! Colônia Leopoldina Reminiscências de teu imperador 4 CARVALHO, José Murilo de. Formação das almas: o imaginário da república no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990, p. 9. 5 Letra de José Araújo Luna e melodia de Jodimarco Dionízio.
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Com teus filhos a estudar Doutores, poetas, escritores Para sua terra sempre honrar Salve! Salve! Colônia Leopoldina Castanholas simbolizam a Princesa Leopoldina Vivenciando suas matas verdejantes Do Rio Jacuípe das florestas exuberantes Memórias do passado traz lembrança no presente Que tua imagem não sai da mente Assim, todas as vezes que o hino é executado se está celebrando o poder dominante das famílias oligárquicas que, temporariamente, conseguiram adiar a efetivação do projeto social dos cabanos. De qualquer forma, esta ingenuidade, seja ela presente no discurso ideológico ou mesmo nos símbolos cívicos, esconde o fato de que a Colônia Militar Leopoldina foi uma estrutura política para sediar o poder dos engenhos de açúcar e impedir que o desejo de liberdade e de transformação social, que eram aspirações de negros escravos, de índios, de matutos e mulatos, assim como de brancos pobres e excluídos da sociedade, viesse a prosperar.
Castanhola plantada por D. Pedro II, em 18606 6 Outro símbolo que alimenta a ingenuidade colonialista é representado por duas castanholas plantadas, em 5 de janeiro de 1860, pelo imperador do Brasil, D. Pedro
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Ainda em 1850, antes mesmo de ser preso pelas autoridades da província de Pernambuco, Vicente de Paula era capaz de amedrontar os senhores de engenho da região do Jacuípe e as autoridades legalistas da mesma circunscrição política. Há notícias de que o temível “caudilho” cabano agia impunemente, de acordo com o ponto de vista legalista. Vicente Ferreira de Paula percorria diversas localidades entre Pernambuco e Alagoas. Em fevereiro de 1850, por exemplo, estava em Capoeiras, próximo a Garanhuns, quando foi acusado de roubar escravos. Lutava nas matas da fronteira, tendo ficado célebre seu cerco ao proprietário do engenho Roçadinho, Claudino da Costa Agra, dando nome a um núcleo da região, Piquete (depois Ibateguara)7.
Assim, diante do fato de que a concepção de transformação social cabana ainda vigorava na territorialidade do Jacuípe, podendo desestruturar o poder das elites dominantes, principalmente daquelas voltadas para o fabrico de açúcar, a fundação das colônias militares, sendo a primeira a Colônia Militar Leopoldina, como uma nova política de controle social. Em outros termos, “a fundação das colônias militares surge como uma nova estratégia, de ao mesmo tempo povoar, abrir estradas e deixar tropas em
II, quando de sua visita pelo Nordeste do império, a partir de 1859. Essas árvores despertam fascinação na maioria da população da cidade. Contudo, elas representam a celebração de um poder institucional que excluiu vastíssimas camadas populares do processo de desenvolvimento social do lugar. Sobre essa particularidade, é interessante a entrevista que o autor concedeu a emissora Gazeta de Alagoas, no dia 1 de janeiro de 2014, que pode ser acessada pelo seguinte link: http://g1.globo.com/al/alagoas/bomdia-alagoas/videos/v/castanhola-plantada-por-dom-pedro-ii-e-simbolo-de-colonialeopoldina/3053162/ 7 OLIVEIRA, Maria Luiza Ferreira de. As colônias militares na consolidação do estado brasileiro: 1850-1870. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, 2011, p. 6.
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caráter permanente nas localidades onde a tensão social era difícil de conter”1. O controle social através da Colônia Militar Leopoldina aparece na historiografia como fundamental para a consolidação da sociedade do açúcar, ao passo que Honório Carneiro Leão, justificando a efetivação do sistema de colônias militares, em 1849, diz que, (...) conveniente seria, que no centro das matas se estabelece uma ou mais colônias militares que fossem regidas com quanto o estado de barbaridade o exigisse, em conformidade de regulamentos especiais apropriados a esse estado. Apontarei o Riacho do Mato como ponto principal a ser ocupado pelos aquartelamentos e donde deverão partir estradas, que se dirigissem à vila da Imperatriz, a Jacuípe, a Porto Calvo, à Água Preta e daí pela ribeira do Uma até Barreiros2.
Por certo, com a instalação da Colônia Militar Leopoldina se visou assegurar o avanço e a progressão dos engenhos de açúcar. Com ela a territorialidade cabana passaria a abrigar a expansão de uma sociedade que continuaria se utilizando da mão-de-obra de escravos, visto que sem elas a produção econômica não seria possível. Finalmente, a Colônia Militar Leopoldina representou, naquele momento específico, o brilhareto do pensamento escravista que, estruturado para a geração e a expansão lucrativa do “capital doce do açúcar”, foi preciso militarizar o histórico polígono 1 OLIVEIRA, Maria Luiza Ferreira de. As colônias militares na consolidação do estado brasileiro: 1850-1870. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, 2011, p. 7. 2 OLIVEIRA, op. cit. p. 9.
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cabano, visto que os seus moradores poderiam acorbardar o poder do mando. Depois de 165 anos, as paragens leopoldinenses continuam sob o jugo e a opressão impetradas pelos déspotas do poder econômico oriundo da cana-de-açúcar, pois, Salve! Salve! Colônia Leopoldina Que vieste da Colônia Militar Berço de heroicas famílias Por teus filhos a te glorificar...
Ponderações finais Em meados do século XIX, a região fronteiriça entre as províncias de Pernambuco e de Alagoas passou a ser assistida e acompanhada mais de perto pelo Império brasileiro. Com as perturbações políticas sentidas durante os poucos anos em que o poder central se fragilizara com a administração das regências, achou por bem o governo carioca, através das províncias nacionais, efetuar um maior controle social aos grupos políticos que poderiam ameaçar uma ordem social que não tinha as condições absolutas para represar o sentimento de liberdade que se expandiu pelo país, desde as primeiras décadas do século XIX. É nesse contexto que a Guerra dos Cabanos deve ser apreendida. Conflito de gente pobre, depois do seu começo oligárquico e absolutista, conseguiu o pensamento cabano, por muito tempo, fazer frente às forças legalistas, representantes dos poderosos engenhos de açúcar e da sociedade civilizada. Um dos principais líderes cabanos foi o mulato Vicente Ferreira de Paula, denominado por seus seguidores, de “o capitão
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de todas as matas”, devido ao seu poder de persuasão e ao carisma com as gentes sofridas. Ele libertou grande quantidade de escravos das fazendas e dos engenhos, oferecendo aos mesmos, em muitas vezes, a primeira oportunidade de serem livres. Superintendendo os temíveis negros papa-méis, se tornou Vicente de Paula o mais perigoso cabano que os oligárquicos da cana-de-açúcar conheceu, causando prejuízos, ao mesmo tempo, aos senhores de escravos. Procurando sopesar os ideais de liberdade e o espírito de comunidade, em 1850, é colocado em funcionamento o sistema de colônias militares, sendo a Colônia Militar Leopoldina uma das mais importantes, quando serve de modelo para as demais espalhadas em diversas regiões do Império. Finalmente, a Colônia Militar Leopoldina, que ainda é hoje vista como símbolo de uma época nobiliária, não representou o progresso social para os pobres, sejam brancos, negros e índios, que habitavam as brenhas, os mocambos, os arraiais e as cabanas simples no interior de nossas matas. Na realidade, a Colônia Militar Leopoldina representava a superação da concepção do homem selvagem, do ponto de vista dos vencedores, que inibia o avanço da cana-de-açúcar. A Colônia Militar Leopoldina serviu para a efetivação do domínio político e econômico sobre aqueles que lutaram contra uma sociedade caracterizada pela desigualdade, pela escravidão e pela apropriação de terras. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Luiz Sávio de. Memorial biográfico de Vicente de Paula, o capitão de todas as matas: guerrilha e sociedade alternativa na mata alagoana. Maceió: EDUFAL, 2008, p. 27.
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Maria Lúriva Fagundes de Lima
3. M EMÓR I A S DA POLÍT ICA PA RT I DÁR I A Relato Histórico 1
Maria Lúriva Fagundes de Lima (NININHA)1
Introdução. A minha vida está ligada diretamente às atividades de minha mãe, Quitéria Maria da Conceição, conhecida também por Quitéria Fagundes. Nas décadas de 1950 e 1960, ela possuía o único estabelecimento Hoteleiro da cidade. Para isto, teve o apoio 1 Maria Lúriva, conhecida por Nininha Fagundes, sempre atuou na política partidária em Colônia Leopoldina. Inicialmente, em atividades com a sua mãe Quitéria Maria da Conceição, na organização do único Hotel da cidade, nas décadas de 1950 e 1960. Acompanhou os lideres políticos locais desde essa época, tendo sido primeira dama da cidade, no governo do esposo e ex-prefeito José Gomes de Lima ( Zequinha). É figura marcante na vida da cidade e da política partidária local.
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importante de todo o grupo político local principalmente do Sr Alfredo Cavalcante, pois era para lá que se dirigiam todos os grupos políticos que vinham de Maceió. Conheci todos os políticos de Colônia e os que aqui vinham fazer campanha. Eles se hospedavam naquele no Hotel Santa Terezinha. Ainda me lembro bem do prefeito, no início da década de 1950, Durval Gonçalves, Severino Ferreira que foi vice-prefeito, o prefeito Manoel de França e outros que ajudaram muito à toda minha família que era composta de seis irmãos. Esses políticos ficavam no Hotel de minha mãe e eu me lembro, ainda, de um desses grupos que veio de Ibateguara. Veio um comboio deles, acompanhado pelo capitão João Bezerra. Vinha também o Arnon de Mello, pai do ex-presidente e atual senador Fernando Collor de Mello. Da parte deles, sempre havia uma orientação à minha mãe para que ela botasse as meninas, as filhas, na escola. Assim, é que poderia arrumar um emprego para elas. E, assim, foi: fomos à escola. Maria do Carmo foi a primeira a estudar, atuando depois como enfermeira aqui mesmo em Colônia, juntamente, com Leôncio Caetano. Assim, é que as filhas e os filhos de Dona Quitéria Fagundes (como era chamada) começaram as suas vidas, sempre nesse movimento desses homens políticos. A política, assim, não poderia deixar de estar lá em casa e em todos. Foi importante, ainda, Alfredo de Paula Cavalcante que muito ajudou minha família.
Um modesto casamento. Chegando o ano de 1951, gostaria de destacar: casei com Zequinha. Ele foi o homem que fui buscar lá na Rua da Lama. Peguei-o pelo braço e lhe disse que era para que ele se casasse
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comigo. Isto era para logo, logo. Mas, a minha mãe não queria, pois todos lá em casa trabalhavam muito. A gente trabalhava muito!. Mesmo assim, decidi com ele marcar o casamento, mesmo que ele dissesse que não tinha nada na vida. Ora! Eu também não tinha nada.
A presente ajuda de políticos. Foi quando o seu Alfredo de Paula, então Prefeito, arranjoume um trabalho na Prefeitura e ajudou, ainda mais, o desejo de casamento meu e de Zequinha. Casei-me e tive seis filhos vivos. Minha família está aí. Tudo isto, trabalhando muito mesmo e com Zequinha. Botei alguns para estudarem fora devido a situação das escolas em Colônia. Foi quando Maria Fagundes, minha irmã, colheu dois deles em Maceió. A Casa de Maria Fagundes em Maceió não só servia a família, mas todos aqueles que ali quisessem estudar. Sebastião Silva Braga, Dr. Ernane Santana passaram um verão no aconchego da casa da minha irmã. Quanto ao casamento, era isso mesmo. Eu não poderia esperar um príncipe ou um homem muito bonito. Se fosse assim, eu sabia que essa espera nunca iria terminar. Zequinha foi aquele que escolhi para viver, a partir da força de trabalhar muito e com a ajuda desse povo político. Botei um comércio com ele na feira com miudezas, sapatos de crianças, tocas, fraldas de “morim” para crianças... vendendo essas pequenas coisas e bordando tudo à mão. Tudo que era pedido e que fosse possível esperar um pouco, eu dava um jeito e fazia o bordado na hora. Foi quando seu Alfredo ofereceu um lugar para botar um bar. Ele já era Prefeito. Esse estabelecimento seria na antiga delegacia. Zequinha fez as mesas e os tamboretes. Apareceu
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Sebastião Torres que foi delegado, o pai do Jorge Torres, e, que ajudou muito também. Zequinha botou um engenho de cana e eu fazia os pães. Depois, ele comprou uma geladeira a querosene e eu fui fazendo bolo, tapioca, munguzá, arroz doce, pamonha, canjica. Isto foi na década de 1953 para frente. Para esse bar, houve a ajuda de mais políticos como Alcides do Engenho Macaco, seu Legarião, o irmão de seu Balé, que foi lá de Recife de onde veio aquela geladeira Socic. Agora, a sorveteria já estava no prédio da antiga Câmara de Vereadores e contamos com a ajuda de Beba, Irene, Daniel e Zé Temisto e dos filhos mais velhos. Sempre inovou, principalmente com os picolés e sorvetes artesanais que fazia. Também estiveram no apoio o Gizo, que foi delegado da cidade, Zito Luna, e mesmo o Balé que tinha sido deputado. Todos estes ajudando para que fosse botado esse bar e daí seguir a vida.
Política é com Alfredo. Eu cheguei à política, assim como Zequinha, pelas mãos de seu Alfredo e, ao mesmo tempo, com Antônio Lins da Rocha. Antônio Lins foi o suporte de Zequinha que o apoiou e garantiu toda a segurança política. Também, ressalto que foi Zequinha quem também segurou muito o Antônio Lins. Houve uma combinação anteriormente que Zequinha sairia como vice de Antônio Lins e, depois, Antônio Lins apoiaria Zequinha a Prefeito. Mas, isso não se confirmou, mais tarde.
Uma porteira para o Engenho Santo Antônio. Mas, na política, o seu Alfredo sempre esteve ligado ao povo. Contudo, Dona Maroquinha, sua mulher, não correspondia a esse espírito político. O casal (Zequinha e Nininha) trabalhou
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muito para seu Alfredo. Ora, ele tinha nos ajudado muito. Mas havia o lado de Dona Maroquinha que era pesado. Ela não gostava muito de pobre. Ela era muito ciumenta. Imagine que seu Alfredo era carregado por homens e por mulheres, nos braços, e haja muito ciúme. E la chegou a fechar o Engenho Santo Antônio, proibindo a entrada de pessoas ali. Acontece que era lá que havia o cacimbão das pessoas tirarem água para beber já que não havia água encanada, nessa época. Ninguém entrava lá para tirar água, isto depois que seu Balé perdeu a campanha para deputado. Nem foi eleito ele e nem foi eleito o outro candidato, Zé Maria de Omena, da Usina Taquara. Depois desse resultado eleitoral, ninguém entrava lá para tirar água. Mas, isto depois que o Balé perdeu. O Engenho Santo Antônio passou a ter uma porteira, proibindo a entrada das pessoas.
Surge a liderança de Antônio Lins. Houve uma passagem de liderança de Alfredo para Antônio Lins, mas essa passagem foi meio lá e meio cá. Houve reuniões e reuniões para se decidir o apoio de Alfredo ao Antônio. Foi quando veio a decisão de um grupo seguidor de seu Alfredo - Manoel Marques, Sebastião Torres, Zequinha, seu Balé, genro de Alfredo, e que tinha perdido a eleição para deputado. Tinha Didi, irmão de Zequinha, enfim, todo esse povo. Foi quando veio a decisão de toda essa gente, em uma reunião no Engenho Santo Antônio: apoio a Antônio Lins para Prefeito. Alfredo aceitou com muita malquerença. Ele não queria mesmo. Mas, o povo tomou aquela decisão naquela reunião e se seguiu para a campanha.
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Tanto Zequinha como Didi e os demais, todos trabalharam para Antônio. Antônio liderou por que tinha toda essa gente que formava uma importante equipe: Sebastião Torres, Zé Brasilino, Zé Máximo de Sousa, Zequinha, Didi, Zé Duda, Zé Ramalho, e até o seu tio (do entrevistador) Zé Loló, além de Severino Rocha, Geraldo Nunes e outros. Com uma equipe dessas, foi possível a organização de uma grande campanha que foi vitoriosa. Estava selada a liderança de Antônio Lins.
Discreto e atuante: Zequinha. O governo de Antônio Lins que tinha Zequinha como viceprefeito possibilitou o aparecimento, ainda mais, de Zequinha, desde esse primeiro governo, já que ele teve dois governos. No segundo governo de Antônio Lins, Zequinha foi seu vice, e também o Secretário Geral da Prefeitura. Zequinha, com essa força, se firmou junto aos mais pobres da cidade. Antes de terminar o mandato, ele se apresentou como candidato apoiado pelo Prefeito Antônio Lins. No Hotel, todos caíram em campo. Começou uma luta muito grande, trabalhando em todas as propriedades, nas casas dos sítios e da rua. Zequinha sempre por ali e tal... mas atuando muito. Chegando perto das eleições, uns cinco meses antes, Antônio Lins decidiu não mais apoiar Zequinha. Ele foi apoiar o usineiro Zé Lessa, da Usina Taquara. Zequinha só conseguiu se candidatar pela oposição interna no partido, ainda, pela Arena 2. Mas, eu tinha um quadro geral de todo o eleitorado. E foi daí que veio a despeita política. Zé Ramalho, Zé Duda, Severino Rocha, Geraldo Nunes, Zé Brasilino e outros foram convidados por Antônio Lins a não mais apoiar Zequinha. Decidiu, juntamente
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com a Usina Taquara (Zé Lessa), que iria apoiar Antônio Luna. Eles formaram um grupo de dinheiro, mas Zequinha já tinha o apoio do povo. Zequinha ganhou a eleição a partir desse trabalho, anteriormente já feito, que era de visitar as pessoas, nas casas e nos engenhos. Eu ainda sei os nomes de todos os engenhos e propriedades no município. Foi feita uma comunicação com esses moradores, plantadores de cana e todo esse povo. Aqui na cidade, toda a classe pobre e as pessoas já citadas estavam com Zequinha.
Uma campanha de mulheres. Ora! Ora! A política para eleger Zequinha era aqui dentro de casa mesmo, principalmente mãe que era dona de Hotel. Além disso, a política passava também pela sorveteria e pelo bar. Aqui entrava todo mundo. Ele já tinha sido vereador por dois mandatos e Presidente da Câmara. Em algum momento, houve até um ti ti ti para que ele não fosse Presidente. Os dois irmãos, ele e o Didi sempre estavam ganhando nas disputas internas, tendo sido, logo em seguida, viceprefeito de Antônio Lins. Certa vez, queriam cassar Didi e usaram o vereador Zé Pretinho para isso. Eles diziam que Didi não ia às sessões. Retomando a campanha de Zequinha, lembro que quase não havia lugar para se fazer comício da campanha. Todas as ruas quase estavam proibidas para o grupo dele. Foi quando se passou a usar aqui mesmo esta casa, a minha casa. Definiu-se que o comício era na porta de casa. A bebida, ele sabia fazer. Botavam um teclado e a festa estava feita. Tocavam a noite toda. Foi quando passaram a chamar a bebida que tomavam de “xequeté”, chamado assim
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por seu Geraldo Marques. Já a receita é algo difícil de fixar, mas posso dizer que tinha maracujá, abacaxi e muitas frutas. Diziase que tinha um algo que enfeitiçava as pessoas. Aquelas que bebiam nunca mais deixariam de votar em seu Zequinha. Diziase que havia algo de mágico na bebida, mas era tudo conversa. O “xequeté” nada mais era uma batida feita por alguém que era dono de Bar. Mas, aqui, aqueles que caíam de bêbados eram todos recolhidos para os quartos da casa que são muitos. Ninguém nunca foi abandonado na rua. Todas as famílias dos engenhos vinham também em apoio como o pessoal do Engenho de Canto Escuro, as famílias de Aureliano, Biliu, Elpídio Carneiro, Zé Carneiro e sua mulher dona Liquinha. Era essa a massa que apoiava Zequinha. No comércio, era quase todo mundo com ele, com exceção seu Djalma Araújo que era vereador da outra banda política. Mas, quem fazia mesmo o “caquiado” político nessas eleições eram minha vó e mamãe. Elas eram políticas prá valer. Elas eram, sim, as articuladoras naquele ambiente de bar, de Hotel e de sorveteria. Também havia uma equipe de mulheres de primeira. Estava lá Jovanice, Dora Máximo, Odélia Marques, Marina Viana e a gente saia pelas propriedades e toda aquela equipe também estava lá. Foi um trabalho muito grande. Essas mulheres foram os esteios da campanha. Como Zequinha não tinha mais o apoio de Antônio Lins, então, deveria haver muitas atividades de caça aos votos. Antônio Lins passou a apoiar Antônio Luna, inclusive por incentivo de Severino Rocha. Mas, a essa altura gerou uma revolta em muita gente, devido ele não ter mais apoiado Zequinha. Zequinha continuou com o povo. Não se pode esquecer que
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Zequinha, quando vice-prefeito, também assumiu a Secretaria Geral da Prefeitura. Antônio Lins deu todos os poderes a ele. Não sei se isto não era um propósito por parte de Antônio, para que o seu vice já se preparasse para ser Prefeito. Zequinha administrou a cidade por ordem do próprio Antônio. Então, por conta deste trabalho todo é que Zequinha estava tão enraizado no eleitorado. Mas, veja em que nível chegaram as relações desses políticos. Eles, em certo momento, mandaram fazer um jantar aqui em casa para afastarem Zequinha do desejo de ser Prefeito para botarem Antonio Luna. Aqui mesmo neste lugar, na minha casa. Era uma reunião para tirar Zequinha do páreo. Mas, quem estava com Zequinha era o povo, a massa. Todo esse almoço era para Zequinha ser vice de Antônio Luna. Mas, nem isso afastou Zequinha de sair candidato. Ele saiu candidato pela Arena 2, uma espécie de oposição, à época. Você já imaginou eles virem à minha casa para traírem Zequinha. Figura importante em tudo isto também foi Odélia Marques. Nas reuniões políticas, ela sempre atiçava quem ia falar cobrando: fale que o candidato a prefeito é Zequinha. Todas elas iam procurando a todo e qualquer político que visitava Colônia para saber e se ele estava ou não ao lado de Zequinha. Veja bem que engraçado! Muitas pessoas sabiam da pouca condição financeira de Zequinha. E aí, várias pessoas traziam as coisas para ele. Traziam mandioca, banana, farinha e tudo mais. Como se via, Zequinha iria ganhar, pois tinha um trabalho feito. Eu lembro bem do apoio de sua família (entrevistador)2 - “a família dos Loló”. Seguia a família de Luis Tomé. Nuta Loló e sua tia Maliu eram muito fortes. Trabalhavam muito. Nuta perguntava o que era 2 A família do entrevistador é conhecida como “Loló”. Então, eram Zuza Loló (avô), Zé Loló (Tio,) Chico Loló (Pai) .... e demais.
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que estava precisando? Sandálias, chinelas, sapatos, roupas...etc...? Fazia as anotações para, então, trazer tudo de Caruaru. Foi destaque, ainda, o povo da Usina Porto Rico, à época, hoje, Destilaria Porto Alegre. Zequinha prometeu grupo escolar e cumpriu, assim como no engenho Riachão. Ele nunca prometeu o que não podia cumprir. Ao final, Zequinha teve mais de 600 (seiscentos) votos de diferença. Naquele momento, inclusive, em que o eleitorado não passava de uns 8(oito) mil eleitores. Mas tudo isto eu afirmo: um trabalho de família e de amigos e amigas. Até hoje, eu guardo os papéis de convênio feito para executarem a construção desses grupos escolares e postos de saúde. Quando a cidade tiver um ambiente adequado para receber esses documentos, então, eu disponibilizarei tudo isto. Mas, quando houver um lugar seguro. Eu ainda guardo muito material dos tempos de Zequinha quando era Prefeito.
Zequinha apoia o usineiro Zé Lessa. Na campanha seguinte, todavia, a movimentação política levou Zequinha a apoiar quem não tinha lhe apoiado que foi o usineiro Zé Lessa. A articulação desse povo era muito grande. Ele apoiou Zé Lessa contra Antônio Lins. Em seguida, o Zé Lessa trouxe o Zé de Melo, que trabalhava na Usina, chegando a ser Secretário Geral da Prefeitura e aí sim, com o propósito de fazêlo Prefeito. Então, seu Melo veio contra Zequinha e aqui chega com toda a família. Seu Melo foi eleito e sua família ocupou toda a Prefeitura. Foi um mandato pequeno de apenas dois anos, vindo a falecer inesperadamente. Assumiu a Prefeitura o seu vice Bilau.
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Esse grupo apoiou em seguida Dona Telma. O seu governo foi uma “coisa maravilhosa” e que todos sabem o desastre que foi. Ela foi retirada da Prefeitura por duas vezes. Sempre Zequinha era chamado às lutas políticas, mas ele foi se afastando.
A melhor administração da cidade. Para mim, Zequinha foi o melhor Prefeito desta cidade, pois conseguiu infraestrutura com os convênios que foram ampliados. Construiu-se posto de saúde que praticamente não existia, inclusive no povoado de Monte Alegre. Ele administrou apenas com o Fundo de Participação do Município (FPM). Foi o prefeito Zequinha que apostou na educação dos leopoldinenses, que queriam estudar o ensino superior, pagando carro para fazer o trajeto Colônia /Palmares. Nunca deixou salários atrasarem. Foi buscar convênios para hospital e para essa estrada para se chegar até a Br 101. Mas, tudo isso só foi possível porque teve que se aliar ora com Antônio Lins e ora com Zé Lessa. Até mesmo as festas em Colônia, toda a família da gente vinha para cá. Eram grandes festas. As pessoas vinham de qualquer lugar para Colônia. A festa de São Sebastião era um estrondo. Era a melhor festa da região. Aquelas mulheres, tiveram um papel grande também nisso tudo. Uma alegria geral na cidade ajuda também para a administração e a administração ajuda nessa alegria.
Um estranho no ninho. Um aspecto importante na vida de Zequinha é que ele sempre foi um autodidata. Tinha apenas a quarta série primária. Portanto, tinha poucos estudos. Ele era alfaiate de toda a Colônia;
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foi construtor; trabalhou como topógrafo nas estradas daqui para o Cocau, nas terras do Novo Lino. A vida é que foi ensinando tanto a ele como ao seu irmão Didi. Cada um muito político, mas tendo as suas questões à parte. Cada um organizava o seu eleitorado. Hoje, eu posso melhor ver que as elites, os ricos de Colônia não aceitavam e nunca aceitaram Zequinha. Foi chamado até de “Zequinha Macaco”. Ele nunca se incomodou com isto. Sabia que era coisa política. Vejo que só por conta da cor. Zequinha era negro, nascido na Rua da Lama e como poderia ser Prefeito da cidade? Ele passava a ser um estranho no ninho.
A atualidade. Depois de Dona Telma, foi eleito Severiano que foi derrotado por Manuilson Andrade. Este foi Prefeito por praticamente 12 anos, considerando os 4 anos do Prefeito Cássio que não passou de um seu preposto. Depois disto, foi derrotado por uma mulher, a Paula que foi eleita para fazer mudanças, mas que não está fazendo mudança alguma. Uma segunda mulher é prefeita da cidade. Mas, a política hoje está muito diferente, parece-me que vem mudando para pior. Há tempo que Colônia está sem prefeito. Parece também que se vive aqui com dois prefeitos - uma prefeita e um prefeito, o esposo da prefeita.
Uma visão de futuro. O que eu faria aqui nessa cidade se prefeita fosse? Em primeiro lugar, cuidaria dessas crianças que estão abandonadas na rua e usando droga. A droga está em Colônia. O Conselho Tutelar
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Maria Lúriva Fagundes de Lima
está muito falho. Qualquer um pode ver pivetes na rua, às altas horas, e sem qualquer acompanhamento. Se alguém perguntar por que ele está, àquela hora na rua, a resposta dele é braba em relação a você. Então, essas crianças precisam ser cuidadas já que os pais não estão conseguindo e até, alguns, nem pais têm. No tempo de Zequinha, havia creches funcionando. Lembro de Dona Odecilda, mulher de Legarião, que praticamente seria uma atual Secretária de Assistência Social. A creche funcionava. Hoje, é muita criança usando drogas e ela precisa ser cuidada. Ali mesmo do outro lado do rio, foram mortas duas crianças, recentemente, uma de 11 e outra de 14 anos. Isto é uma perca grande para uma família. Para finalizar, eu gostaria de destacar que a minha vida com Zequinha foi de muito trabalho e dedicação ao trabalho. Assim, é que pude criar os meus 6 filhos que estão aí com as suas próprias lutas, nos dias atuais. Obrigado, Nininha. Colônia Leopoldina, Agosto de 2015.
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Relato Histórico 2
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Introdução. Zé! É um prazer poder falar da política de Colônia Leopoldina. A política, eu imaginava ser uma coisa mas é outra coisa bem diferente. Eu pensava que podia fazer tudo dar certo. Pensava que era possível atingir todos os objetivos, no sentido de ajudar a comunidade e a cidade. Mas, é tudo muito diferente. Aquilo que pensava fazer depende de muita gente, da boa vontade de prefeito/a e dos colegas vereadores/as. Há a necessidade de envolvimento de muito mais gente. Cada um pensa que a sua proposta é a melhor para a cidade, mas é melhor para a cidade 1 Participante dos momentos políticos e partidários da cidade, em seus vários momentos - Ricardo Brasilino. Tem uma temporada de sua vida vivida em São Paulo e está, hoje, no seu quarto mandato de vereador no município de Colônia Leopoldina. Atua como pequeno comerciante na cidade.
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aquilo que é muito discutido, passando por todos aqueles que citei. Eu pensava ser a política uma coisa mas não é.
A composição dos grupos políticos. A força de uma mulher. Quanto à composição dos grupos políticos criados na política local, eu tenho pouca lembrança. Lembro-me bem do Antônio Lins da Rocha que participava do grupo do Alfredo de Paula Cavalcante, mas a política de seu Alfredo, mesmo, eu pouco conheci. Porém, nas minhas andanças com o meu pai José Brasilino que foi vereador por 6(seis) vezes, destaco o conhecimento de uma mulher que nunca fora candidata a qualquer posto político mas definia a política do líder Alfredo e de outros políticos. Esta mulher era sua esposa dona Maroquinha. Meu pai foi muito amigo dela e ela o tinha em bastante estima. Várias vezes, vi ela reclamar da ausência dele em seus cafés com sua família. Ela era uma mulher que muito definia a política para o grupo de seu Alfredo. Todo mundo sempre a ouvia.
O usineiro Zé Lessa. Eu me lembro do usineiro Zé Lessa. Este eu me recordo bem. Constituiu um importante grupo local, considerando o seu poder econômico como proprietário de uma usina, a Usina Taquara. Aliás, esta usina sempre esteve voltada à política local. Recordo-me dele pois era amigo de meu pai. Meu pai acompanhou o usineiro por várias eleições. Ele fez parte do grupo do Alfredo e, também, do grupo político do usineiro.
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Os grupos políticos de Colônia, ora se aproximavam e ora se afastavam deles mesmos. Conheci Zé Lessa e destaco que tive a honra de ter o seu voto quando fui candidato a vereador, pela primeira vez. Para mim, foi uma honra, de verdade. O Zé Lessa, enquanto foi vivo, de uma forma ou de outra, sempre esteve atuando na política partidária local.
O oráculo José Gomes de Lima - o Zequinha. De Zequinha, que alguns de forma pejorativa o chamavam de “zequinha macaco”, mas ele, como um bom político, não se incomodava. Penso que ele perdoava o preconceito daqueles. Dele, eu me lembro bem. Vejo que fez um trabalho muito bom, aqui no município, quando foi secretário de Antônio Lins e quando foi Prefeito. Sempre o respeitei diante de sua honestidade. Assumiu a Secretaria Geral1 do município quando Antônio Lins foi prefeito pela segunda vez. Conseguiu desenvolver um governo de muito agrado ao povo. Depois, foi eleito prefeito contra todas as forças políticas que não o apoiaram nessa disputa, isto é, ele ganhou do grupo de Antônio Lins, do Grupo de Zé Lessa e outros antigos aliados de Alfredo. Lembro-me dele como alguém que fez um bom trabalho. Aliás, alguém a quem eu consultava sempre. Tive boas conversas com ele desde quando ainda não tinha sido vereador e, mesmo depois, quando fui vereador. Posso dizer que sempre tive uma boa conversa com ele e que me orientava bastante. Zequinha fez muitas coisas aqui no município. 1 Nessa época, a prefeitura de Colônia não estava organizada em diversas secretarias. Tudo era em torno de uma Secretaria Geral.
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A chave da Prefeitura nas mãos de José Santana de Melo ou Zé de Melo. Na eleição seguinte ao governo de Zequinha, foi eleito Zé Lessa. Mas este, praticamente, passou a cidade para a administração de Zé de Melo, o seu secretário. Ele não era nascido em Colônia. Era baiano. Foi administrador na Usina Taquara, trazido por seu Zé Lessa. Seu Zé Lessa concedera uma grande oportunidade na cidade. Como Secretário Geral da Prefeitura teve carta branca para agir. Ele resolvia todos as questões da Prefeitura. Ele tinha a chave da Prefeitura. Seu Melo caiu na graça da população e se candidatou a Prefeito pelo grupo de seu Zé Lessa, enfrentando Dr. Oswaldo Gomes de Barros (natural de Maceió, com influência também na política de Novo Lino), Seu Zequinha e Irapuan Araújo (PT). Foi eleito, tendo sido Prefeito da cidade por, apenas, dois anos quando teve uma morte súbita. Zequinha que tinha sido apoiado por Zé Lessa, agora estava em outro grupo. Quatro eram, à época, os grupos claramente definidos: o grupo de Zequinha, o de Zé Lessa, o de Antônio Lins e o do PT.
Os “impeachments” na Colônia. Resolvi então passar uns tempos em São Paulo. Fui para passear e observar a cidade durante uma semana, mas terminei ficando por 6 (seis) anos. Isto, lá pelos idos de 1989, sem ter ainda sido vereador e com atuação discreta na política, mas sempre atuando.
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Eu retorno de São Paulo, isto em 1995, e passo a participar diretamente na política partidária. As minhas conversas com Zequinha só mais aumentaram. Eu o admirava bastante. Foi um momento em que houve 05(cinco) importantes candidaturas: a de Severiano, Dr. Marcos (médico local), Seu Zequinha, a de Diva do Banco(PV) e de José Ferreira (“Milonga” que era vigia do hospital local). Eu estive atuando ao lado de Zequinha, mas o vitorioso foi o vereador Severiano (PMDB). Já tinha havido dois momentos em que a justiça tinha retirado da Prefeitura a Prefeita Telma Melo, esposa do Zé de Melo. Esta foi vitoriosa enfrentando o grupo do Zé Lessa, de Júnior Luna (com o Seu Zequinha no grupo) e de Adelmo Lins (PT, que teve o apoio da Igreja Católica através do padre Aldo Giazzon e do Movimento Estudantil). O usineiro não deu apoio a ela. Eu ainda não tinha voltado de São Paulo quando ela foi eleita. O vereador Severiano, à época, teve importância grande nos dois momentos de afastamento da Dona Telma. Ela, contudo, finalizou o seu mandato com um governo muito tumultuado. Após esse mandato cheio de questionamentos, vem a eleição com as candidaturas já citadas, tendo sido eleito, como já disse, o Severiano.
Um partido para a renovação nacional - O PRONA. É neste tempo eleitoral que participo como candidato ao lado do Seu Zequinha, pelo Partido da Renovação Nacional, o PRONA, tendo obtido 99 (noventa e nove) votos. Fiquei como suplente, mas não consegui chegar à Câmara. Gustavo Marques foi candidato e eu, também, mas não chegamos lá. Assim, é que eu fui tendo
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mais experiência nesses processos eleitorais e de como conquistar o voto. Nesse caminho, eu encontrei também muita gente boa.
PMDB, um grupo de oposição vitoriosa porém logo derrotado. Severiano foi eleito. Manteve os mesmos mecanismos tradicionais da política. Mesmo que todo o povo possa afirmar que ele fez um bom governo, em especial na saúde e na educação, não conseguiu ter jogo de cintura para segurar as pessoas que o ajudaram na sua eleição. O problema de Severiano, ao meu ver, foi o próprio grupo dele ou parte do grupo dele. Severiano não apresentou habilidade suficiente para manter o seu grupo. Foi sendo formado um novo grupo dentro do grupo dele mesmo. Por exemplo, ele não teve habilidade para definir o seu novo vice. Manteve o Dr. Flávio quando boa parte do grupo não aceitava mais isso. Ele começou a se perder a partir dessas coisas. Deu muita confiança a secretários que chegaram a fazer contas demais. Houve um momento que não se podia mais pagar as despesas da Prefeitura, principalmente após a derrota nas urnas.
Da Usina Taquara, surge novo líder - Manuilson Andrade. Com o apoio do novo usineiro da Usina Taquara - seu Zé Maria -, surge o ainda desconhecido Manuilson, seu sobrinho. Isto, pois, o grupo do Severiano não se entendia mais, a exemplo do Zitinho, o Baleia, de uma grande família, os Caldas. Parece que aquela família queria ele como vice, afastando-se assim do grupo do Severiano. Nessa campanha, eu já também fui eleito. Ao que parece, o Severiano tinha certa a sua reeleição diante do trabalho que tinha realizado. Destaco o trabalho dele que foi
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importante. Afirmo que, mesmo sem tê-lo acompanhado em sua campanha, ele fez um bom governo, para época, em relação aos seus antecessores. Nesse momento, o eleito foi Manuilson, superando as expectativas. Eu estive também em seu apoio. Fez um bom primeiro mandato com buscas permanentes de verbas para o município. Ganhou a simpatia do povo, tendo sido também eleito para o seu segundo mandato. Conseguiu essa estrada, da cidade para a BR 101, e que depois, diz-se, com ajuda de emenda de João Caldas, chegou a ligar com Ibateguara. Posteriormente, essa estrada foi transformada em BR. Nunca atrasou o salário de servidores e foi firmando a sua marca, o seu papel, fortalecendo-se como uma grande liderança.
Cássio, um mandato dividido. Para a sua terceira participação em eleições, Manuilson apresentou o seu secretário de finanças - Cássio. A disputa estava entre ele, a Luciana, apoiada pelo PT, e seu Zé Maria, o tio do Manuilson que estavam separados politicamente. Manuilson fez campanha com a esposa que, não podendo mais ser candidata, foi substituída por Cássio que ganhou de seu Zé Maria, por um total apertado de 28 votos, apenas. Afirma-se a sua liderança que passou a ser, o secretário de finanças do Cássio. Eu acompanhei Manuilson. Nessa votação, fui o vereador mais votado do Município, com 894 votos, pelo PSL. Mas, ao finalizar a votação, com esse apoio que tive, então, fiz uma passeata de agradecimento aos votos obtidos. Fui também agradecer ao padre Cristóvão Almeida que me apoiou e daí saiu uma conversa que eu tinha traído o Manuilson, tendo votado em Luciana. Não
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pude entender isto tudo. Só posso entender como um grande ciúme de pessoas que não têm votos na cidade. Sempre fui honesto e sincero com o Manuilson (e o tempo encaminhou-se de provar). Naquela época, houve uma reunião em que você (o entrevistador) esteve presente, na horta do padre Aldo, para a definição de uma candidatura mas que o meu pessoal entendeu que não daria para sair com a Luciana, naquele momento. Diga-se de passagem que aquela reunião, inclusive, não tinha a finalidade de definir candidatura. Mas nessa nova eleição, vitorioso o Cássio, eu acompanhei Zé Maria. Mesmo com o estranhamento político e pessoal entre o sobrinho Manuilson e o tio Zé Maria, eu sempre via que a disputa não precisava chegar ao que chegou. Contudo, o Cássio conseguiu fazer um bom governo, em especial para os funcionários, mesmo que na visão geral tenha sido um governo dividido pela sombra de Manuilson. Mas, quem poderia explicar isso melhor seria o próprio Manuilson. Eu vejo que hoje, sem as brigas, o Manuilson poderia ter sido o deputado da região. Para mim, essa foi uma eleição também num tom muito agressivo, entre ambos, mas que só levou ao prejuízo político. Não adianta fazer política daquela forma. O Manuilson, por sua vez, virou Secretário de finanças de Cássio que tinha sido seu Secretário de finanças. Houve equívocos. Manuilson não precisaria participar de qualquer Secretaria. Não precisaria isto. Isto só pôde gerar suspeitas.
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Mudança tem nome - Paula Rocha. Manuilson volta a ser candidato, mas aparece a vereadora Paula Rocha pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Ela era uma vereadora de oposição sistemática na Câmara. Há coisas na política que acontece e que a gente nem sequer pensa. O Zé Maria perdeu a eleição, mas manteve o grupo, apesar das dificuldades financeiras por que passava a Usina. Por conta disto, muitos se afastaram dele. Ele esperava que as pessoas fizessem um consenso, definindo os nomes para campanha. Eu fazia parte desse grupo. Nesse momento, eu não estava em reunião. Tive a impressão de ter havido algo bem armado. Prepararam outra pessoa com a saída dele. Fiquei sabendo que o Zé Maria colocaria a Luciana, pois era a sua vice. Ela estava filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT). Ela é uma pessoa muito querida e carismática. Não tenho nada contra a sua pessoa. Mas, coube a pergunta naquele momento: Luciana! Você tem estrutura para enfrentar a campanha? A resposta foi não. Então, surgiu a vereadora Paula que se apresentava com condições melhores, com apoio do seu esposo Fabiano França, diretor da Associação dos Plantadores de Cana do Estado de Alagoas (Asplana) e um dos maiores fornecedores de cana da região. Luciana Luna seria vice da Paula mas ela não mais aceitou. O Grupo da Paula Rocha chamou o meu cunhado Júnior Lamenha (PRP) para candidatura. Eu havia deixado um partido (PRP) com ele. Mas, o processo de legalização partidária caducou, impedindo sua candidatura. Então, Fui Lamenha, também meu cunhado, era do partido de Zé Maria, Partido Socialista Brasileiro (PSB). Na correria do registro de candidatura, foi definido o nome do Fui.
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Penso que os seguidores do Zé Maria não deram, naquele momento, as devidas considerações a ele próprio. Surge assim a candidatura de Paula Rocha que disputou e ganhou de Manuilson Andrade. Também sinto que o Manuilson falhou quando imaginava que não poderia ser batido eleitoralmente, em Colônia. O poder pode ir para a cabeça das pessoas. O poder, todavia, é passageiro. Isto aqui não é da gente. O poder só de Deus. Tudo p Paula Rocha foi eleita, sendo, então, uma novidade. Ela foi uma candidata “surpresa”. Todavia, o desejo de mudança foi muito maior. Ganhou com uma votação de 129 votos a mais que Manuilson, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Quanto à sua administração, com todo respeito e nada contra a pessoa dela, mas precisa cumprir o seu plano de governo.
A contribuição dos grupos políticos para a cidade. Eu me lembro bem de seu Zé Lessa. Ele contribuiu muito com a cidade, sobretudo no saneamento, construindo o mercado público e cuidando melhor da saúde. Foi também o primeiro prefeito da cidade com formação superior. Era formado no curso de Farmácia. Dos outros, eu não me recordo bem das contribuições, apenas da estrada de Manuilson.
A força do interesse pessoal na política. O que vejo muito é o peso dos interesses pessoais. Mesmo quando se quer fazer algo pela cidade, isto é difícil devido aos interesses pessoais. As pessoas que foram bem com você passam a exigir o atendimento, tão somente, de seus interesses.
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Eu mesmo estou no meu quarto mandato e tenho apresentado projetos, requerimentos e pedidos de providências. Os prefeitos pouco se movem para o atendimento. Entendem que isto beneficiará apenas o vereador. Isto é um grande erro. Os prefeitos, parece, que temem os vereadores. Eles pouco atendem aos vereadores. Uma proposta do vereador é para melhoria da cidade, mas eles não atendem.
Ausência de novos blocos e de projetos para a cidade. O Fui Lamenha, vice de Paula Rocha, está rompido com ela. A sua família é grande e assegura confiança e credibilidade. Todavia, eu vejo aquela família como um bloco para enfrentar uma eleição. Eu analiso a política como um projeto necessário para Colônia. Mas não é isto que se vê. Muitos grupos, hoje, estão com Paula, pois ela é a Prefeita mas podem deixá-la na mão, porque política é diálogo. Como se vê, entra prefeito e sai prefeito, mas não se conhece qualquer tipo de projeto geral para a cidade. É preciso todos participarem mais da vida política do Município, construindo alternativas reais, para cumprir de fato um projeto arrojado de governo.
Segredos da vitória. Para se ter vários mandatos não há qualquer tipo de milagre. Este meu último mandato, de número quatro, por exemplo, foi muito acirrado. Há o vereador Franklin Amorim (atual presidente da Câmara) que é meu primo. Há o Lê Lamenha que também é meu
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cunhado, somos, entretanto, da mesma família. Mas, só afirmo que é muito difícil.
Caminhos futuros da cidade. Esta cidade está se apagando. É triste os filhos de Colônia ficarem em uma situação dessa. Para a pessoa tornar-se política precisa ter mais amor ao povo e menos interesse pessoal. Existe muita gente boa em Colônia mas não apresenta organização. A organização é fraca.
O entrevistado sendo prefeito e suas primeiras preocupações. Veja bem! Já foi inclusive cogitada essa possibilidade. Isto só porque eu aparecia com 10% nas pesquisas, mesmo sem haver campanha. Isso incomodou muita gente. Tudo aqui, quando se pensa em política, se pensa que é preciso ser rico, ter muito dinheiro. É importante combater essa visão, pois isso é péssimo. Mas, eu estou na Câmara. Deus tem me permitido as vitórias. Não estou com interesse de ser prefeito, mas depende das conjunturas políticas e do voto do povo. Mesmo assim, eu reuniria um pessoal bom de conhecimento, promovendo uma grande discussão sobre as propostas para a cidade. As preocupações maiores para a cidade seriam definidas dessa maneira. Obrigado, Vereador Ricardo Brasilino. Colônia Leopoldina, julho de 2015.
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Relato Histórico 3
Severino Inácio da Rocha1
Introdução Eu acompanho o movimento político partidário do país, desde Getúlio Vargas. Mesmo que ainda garoto, no tempo da ditadura de Vargas, e mais com a sua eleição quando findou o seu governo. Vieram as eleições e ele se reelegeu, vindo logo depois o suicídio e isto tudo me chamou muita atenção. Segui bem a política do Juscelino quando na Presidência da República. Eu considero que foi um grandioso presidente. Naquela época, não havia estrada asfaltada e nem havia energia elétrica, praticamente. Foi dinâmico inclusive na educação e na indústria para todo o país. Aqui mesmo em Colônia, tinha um gerador a 1 Participa das discussões políticas locais desde a década de 1955. Ex-vereador e exsecretário de Administração do Município de Colônia Leopoldina. É comerciante do ramo de supermercado e membro fundador da Academia de Cultura de Colônia Leopoldina, ACCL.
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diesel que funcionava à noite, apenas, das 18 horas até às 22 horas. Juscelino começou a construir estradas asfaltadas por todo o país e também trazer a energia. Na minha opinião, foi um dos maiores presidentes deste país. Mas, falando da política de Colônia, quero começar contando uma história de uma pessoa que saiu “corrido” da polícia, daqui de Ibateguara, fugindo a cavalo. Foi parar lá em Panelas de Miranda, no Agreste de Pernambuco. Era conhecido por Major Bastos, um título ainda dos tempos da monarquia. Em Panelas, comprou uma fazenda e passou a atuar politicamente. Logo depois, teve uma divergência com Zezinho Rufino, o coronel do lugar, passando a fazer política contra o mesmo. Foi quando Cupira ficou emancipada e, a partir daí, passei a morar em Alagoas, em Colônia. Aqui, comecei a acompanhar o movimento político partidário local.
“ Eu elejo até um poste”. A eleição de Manoel de França. Chegando a Colônia, em 1955, o prefeito era seu Manoel de França. Ele não tinha noção de administração de uma cidade. Mas, era um cidadão simples e muito conceituado. Praticamente, Alfredo o nomeou Prefeito da cidade. Alfredo tinha tal liderança que chegou a dizer que se botasse um poste para candidato, este seria eleito. Mas, eu entendo que ele não queria dizer que Manoel de França era um poste. Dizia que elegeria quem ele quisesse. Mas, comparativamente, pode-se dizer que Manoel de França correspondeu, atualmente, ao que foi o prefeito Cássio em relação ao ex-prefeito Manuilson Andrade. Seu Alfredo foi eleito logo depois do mandato de Manoel de França. Ele, portanto, foi “prefeito” no seu mandato antes de
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Manoel, durante o mandato de Manoel de França, e, foi eleito logo depois. Mas, continuou liderando a cidade por mais tempo. Em 1958, eu votei pela primeira vez em Alfredo de Paula Cavalcanti. O meu parente Antônio Lins, que veio de Frei Caneca, distrito de Maraial, estabeleceu-se na antiga Usina Porto Rico, hoje Destilaria Porto Alegre. Era filho do Aristides Apolônio que foi gerente da Usina Porto Rico. Antônio Lins viera a se eleger vereador no ano de 1958.
Colônia na Assembleia Legislativa - Manoel Borges (Balé). Antônio Lins era jovem. Devia ter uns 23 a 25 anos quando foi eleito vereador. Foi eleito em 1958 até 1962, apoiando o Alfredo, vindo a ser candidato a Prefeito com o seu apoio, posteriormente. Na eleição de 1962, a briga já vinha de muito tempo, mas o Alfredo se reelegeu. Já neste segundo mandato dele, o seu genro, Manoel Borges, o Balé, tinha sido eleito deputado, isto em 1955. Candidatouse novamente para a Assembleia, em 1962, concorrendo com José Maria de Omena, o Zé Maria, funcionário da Usina Taquara, usina do Município de Colônia Leopoldina. Zé Maria fazia parte do grupo de Paulo Gomes de Barros, político do Distrito de Novo Lino que, hoje, é cidade de mesmo nome. Estavam juntos Paulo Gomes e o usineiro José Lessa, o Zé Lessa, da Usina Taquara. Nessa disputa, o Zé Maria teve mais voto que o Manoel Borges, o Balé, mas nenhum deles foi eleito. Zé Maria levou os votos de Novo Lino, terra do Paulo Gomes e boa parte dos de Colônia. A partir daí, o Alfredo fez muita pressão no povo. São coisas de “coronel”. Para se ter uma vaga ideia, havia uma cacimba, mina de água onde o povo se abastecia, e o Alfredo proibiu o povo de buscar água de beber naquela cacimba que era em suas terras.
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O galegão é novo líder - Antônio Lins da Rocha Antônio Lins, jovem, a fim de ser prefeito, apresentou-se como candidato, em 1965. Ele veio do grupo de Alfredo. Era um Galegão, como se dizia, e muito jeitoso, tocando uma campanha por ele mesmo construída, já que não tivera o apoio inicial do Alfredo. Alfredo sempre me pareceu muito ciumento e sabendo que Antônio não seria igual a Manoel de França, mantinha-se, se não afastado de Antônio, contudo, não o apoiava abertamente até um certo momento de campanha. É tanto que, já definidas as candidaturas, articulou com Zé Lessa uma candidatura comum para ambos os lados. O caminho seria anularem-se os seus próprios candidatos e Zé Lessa seria esse candidato de consenso. Ora! Zé Lessa se sentiu impossibilitado de pedir o afastamento de seu empregado, o Zé Maria, passando tal conversa para o Alfredo. Nessa campanha, havia duas rádios: a Princesa Colônia Leopoldina, de Antônio Lins da Rocha, e a Voz do Jacuípe, do Zé Maria de Omena. Cada grupo político, portanto tinha a sua emissora de rádio. Zé Maria estava sempre aqui no final de semana. Por esse rádio, esperava-se a definição do Zé Maria. Afirmou, afinal, em um desses dias da semana que a sua candidatura estava definida - “Eu sou candidato a Prefeito”. Mas, o Alfredo não se dava por vencido em seu desejo de manter Antônio sob sua liderança. Planejou uma reunião com a presença de Severino Justino, Severino Rocha, Lourival Caldas (criador de Cavalos), o vice Severino Ferreira, José Máximo de Sousa que já era vice de Antônio Lins e outras pessoas. Este grupo aceitava tudo que o Alfredo propusesse. Essa reunião foi muito interessante. Balé era o barão derrotado mas ele era o mentor de todo aquele grupo político. Era o único leitor de jornal dessa
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cidade. Alfredo era aquele que fazia as coisas. O Balé dizia que a reunião era de cada uma dessas pessoas, procurando manter-se sempre discreto. Queria passar um ar que aquilo tudo não era de sua cabeça. Sebastião Torres, avô do Adelmo Torres, membro da Academia de Cultura, abriu a reunião discutindo sobre política. Sempre reforçava que em uma eleição tem que haver um líder. Quem era o líder? A meu ver, isto era um julgamento de Antônio. Cada um deu a sua opinião e ficou combinado o que eles queriam. Alfredo abertamente apoiaria Antônio Lins, mas a liderança era ele. Ora, Ora! Antônio precisava de votos e não podia menosprezar o Alfredo. Mas quando saiu da reunião, ele estava muito mais líder. Havia crescido muito. Aglutinou as forças que ainda estavam com dúvidas de sua candidatura. Finalizando, Balé dizia: “Eu não quis me manifestar. Eu só tenho uma opinião: política é uma questão de equipe. Para se ganhar uma campanha, é preciso o trabalho de todo mundo pois eleição se ganha por um voto”. Antônio se elegeu, mas ficou magoado com Alfredo que o havia apoiado meio-lá, meio-cá... Foi sem dúvida uma aventura de Antônio, pois o Zé Maria estava muito forte. Esse apoio de Alfredo, conquistado por Antônio, foi quase forçado. O Alfredo tinha maioria. O Balé não tinha qualquer carisma e não chegava ao povo. Mas, ele pensava. Alfredo chegava ao povo. Mesmo assim, Alfredo estava sem nome para prefeito. José Máximo de Sousa foi o vice-prefeito de Antônio, o avô de um futuro prefeito, o Severiano. Antônio eleito e já disparava seus comentários sobre o Alfredo, no linguajar do povo: “já andava falando mal de Alfredo”.
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Eu dizia para ele que primeiro tomasse posse e depois esperasse o que Alfredo queria fazer. Em nível de Estado, tinha havido a cassação por um “impeachment” do governador Muniz Falcão e ele voltava como candidato, outra vez, tendo a maioria dos votos, mas não o suficiente para sua posse, segundo análises dos seus opositores. Antônio apoiou Muniz que teve mais votos que o seu oponente Rui Palmeira. Mesmo assim, não tomou posse. Em seguida, com o regime militar, houve para governador do General João José Baptista. Ao que parece, era parente de João Baptista de Figueiredo, que viera tornar-se Presidente da República, tempos depois. Um general não conhecia as brigas paroquiais em Alagoas e queria conversa com os eleitos prefeitos. Assim, Antônio ficou de cima.
Alfredo sempre líder e armadilhas políticas. Nova armadilha é pensada por Alfredo. Comparo ele com o atual Manuilson quanto à criação de armadilhas. Abre-se o processo das possíveis candidaturas para deputado estadual. É quando Alfredo propõe Zé Maria para deputado. Aliás, quem inflacionou a campanha eleitoral em Colônia foi o seu Zé Lessa. Bom! Havia uma preparação na Câmara de Vereadores para apoiar o Zé Lessa, por meio de Zé Maria, como candidato a deputado. Alfredo não desejava Zé Lessa nessa campanha. Alfredo tomou conhecimento disto e pegou Zé Maria por baixo do braço e desapareceu com ele. Todos esperavam Zé Maria na Câmara e nada dele. Soube-se depois que Alfredo havia convencido Zé Maria de que Zé Lessa não seria um melhor político e candidato que o próprio Zé Maria. Zé Maria ficou sem ir à Câmara e não houve
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a reunião. A proposta de Alfredo era Zé Maria sair candidato a deputado, apoiado por ele, algo que nunca havia ocorrido, e o Alfredo sairia candidato a Prefeito, mais uma vez. Assim, é que saiu na rua que Zé Maria havia rompido com Zé Lessa e estava, agora, com o seu Alfredo.
Antônio, Alfredo e a sempre política Usina Taquara. Aconteceu a nova nomeação indireta do Governador, tendo sido indicado o Lamenha Filho. Este tinha sido deputado com o Balé, no tempo do impeachment de Muniz Falcão, em 1957. Os rescaldos desses tempos ainda estavam presentes em Colônia. O Governador era amigo e compadre de Balé. Colônia estava, agora, nas mãos não de Antônio, mas de Alfredo, indo Antônio prá canga, outra vez. O Governador chamou Antônio e exigiu que ele apoiasse Alfredo para deputado. Antônio resistiu pouco a essa investida do Governador e já estava admitindo essa possibilidade. Portanto, uma reviravolta geral no movimento político de Colônia. Eu ponderei para Antônio que não votaria nessa arrumação. Eu estava, na verdade, deixando o grupo de Antônio e de Alfredo juntos. Eu estava indo para a oposição, para o Movimento Democrático Brasileiro - MDB. Mas, eu ainda não tinha conversado isto com ninguém. Batia uns papos com Zé Loló (tio do entrevistador), Zé Pretinho que era vereador e meu amigo. Eu não votaria mais nesse grupo. Zé Pretinho passou a conversa para o usineiro Zé Lessa, e sempre se conversava sobre um rapaz que estava surgindo na política alagoana que era filho de Rui Palmeira. Era amigo do Zé Lessa e era parente de sua mulher. o Guilherme Palmeira. O
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usineiro procurou se podia conversar comigo. Claro que podia, foi a minha resposta. ele estava sondando o quadro político comigo com a possibilidade de um apoio a essa candidatura. Destacou inclusive que em Maceió, terra dos Palmeiras, onde havia um forte apoio a Guilherme. A conversa foi longa. Resumindo: veio a campanha e o Guilherme Palmeira foi eleito deputado estadual, ganhando uma boa votação em Colônia, com o apoio de Zé Lessa. Nas vésperas dessa eleição, Alfredo me procurou para confirmar se eu estaria apoiando o Guilherme e não ele. Expliquei que não tinha nada mais com ele e nem mais com Antônio Lins, em termos políticos. Nessa briga, eu não mais me meteria. Pois, eu havia feito um apelo a Antônio, depois de sua eleição a prefeito, para evitar os comentários políticos contra Alfredo, aguardando a sua própria posse. A partir daí, ele avaliaria como devia continuar o seu relacionamento com o Alfredo. Mas, o Antônio não aceitou minhas sugestões, continuando suas brigas. Agora, eles que são políticos que se entendessem. Eu, agora, estaria fora desse movimento. Na minha conversa com Alfredo, ele me fez lembrar da água que havia sido inaugurada. Que aquilo, dizia ele ter sido seu trabalho. Perguntei o porquê dele não apoiar, então, o deputado que conseguiu a verba para a água que foi o Sergismundo de Andrade. Ele apoiava, naquele momento, um outro deputado que nunca havia feito algo por Colônia. Ele então me lembra que eu era comerciante. Eu entendi isto como uma ameaça. Então, respondi imediatamente que já tinha chegado à Colônia, criado. Não sou filho da cidade. Mas, ele era muito matreiro. Para você ter uma ideia, no dia das eleições, ele baixou lá em casa, procurando o voto de minha mulher, Irene.
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Como você vê, eu não sabia de tudo que se passava na política local mas sabia muita coisa. Então, ele não sabia que eu tinha essa informação. Não teve mais nada a me dizer e foi embora. Antônio concluiu o primeiro mandato como uma grande liderança política, ajudado pelo Lamenha, o governador nomeado. Primeiro, para Antônio, não faltava nada e, depois, do Governador ele aceitou tudo. Mas, o reinado de Antônio foi curto. A essas alturas, já estava havendo divergências políticas de Zé Maria com o Zé Lessa. Houve um tal nível de articulações que se definiu por uma candidatura única, liderada por Zé Lessa. Acho que isso nunca mais vai acontecer nesta cidade. Com a popularidade de Antônio, apoiando Zé Lessa, este foi candidato único. Mas, diz-se que quando foi prefeito, por apenas três anos, num primeiro mandato, e ao completar o mandato, o Alfredo ainda consegue entrar na fofoca política e Zé Lessa rompe com Antônio Lins. Veio a segunda eleição de Antônio Lins e o funcionário de Zé Lessa, o Zé Maria, disputou novamente. Estabelece-se uma nova rearrumação política. Já estavam contra ele o Zé Lessa e o Alfredo. De novo, eleição entre Antônio Lins e Zé Maria, sendo aquele novamente o Antônio Lins. Ainda quando Zé Lessa era prefeito, tinha um funcionário, o Secretário Hercílio de Araújo que esculhambava muito Antônio. Antônio ficou como vereador depois que saiu do primeiro mandato de prefeito. A briga foi tamanha que Antônio esbofeteou Hercílio, tendo sido então processado por ele. Antônio, que estava em seu segundo mandato de vereador, passou para oposição ao Zé Lessa por conta do Hercílio. Penso que tinha a mão de Alfredo nisso tudo.
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Tempos depois, Antônio me chamou para uma conversa. Eu sempre participava das coisas sem ter força política. O negócio era uma conversa com Zé Maria, em Maceió, para ele abandonar a ideia de ser candidato novamente. Era Otacílio Wanderley o intermediário, mas que terminou não se realizando a conversa com Zé Maria. Ele me levou à Assembleia e, coincidentemente, Aroldo Loureiro estacionou o carro pertinho da gente. Era um deputado e usineiro da usina Camaragibe, em Matriz de Camaragibe, que tinha sido apoiado por Antônio. Então, veio logo a conversa: como estás? O deputado logo perguntou se ele seria candidato, pois ele sabia de todo o processo contra o Antônio, mas que isto dependeria, tão somente, dele mesmo. Para o deputado, aquele processo não impediria a candidatura dele. Dependeria só dele. Aquilo foi uma injeção para Antônio. Uma forte glicose. Ao voltar para Colônia, houve um contato no mesmo dia com o Promotor Geraldo Brasil, o promotor da cidade. Segundo ele, o que iria dizer não era bem para um promotor, mas já que estava na sua casa, então podia. A conversa foi o tal processo que tinha chegado às mãos dele. Antônio logo dispara se poderia ou não ser candidato. O promotor respondeu que isso dependia apenas dele. Um deputado e um promotor ajudando, foi muito interessante. Três dias depois ele chegou e disse: Severino, vá você levar essa encomenda em Maceió. Era uma pasta grande. Entreguei o pacote ao pessoal em Maceió, sem saber de que se tratava. Na possibilidade de novamente sair candidato, o meu nome foi lembrado como vice. Ele me chamou reservadamente e perguntou: “Severino: você é o candidato a vice na minha
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chapa. Mas, eu lhe consulto: você oferece problema se o vice for Zequinha?”. Concordei na mesma hora.
Novo líder é construído: Zequinha. Zequinha se torna vice e Antônio, prefeito, deu toda força a ele. Zequinha estava sendo preparado para derrotar Zé Lessa e vai prá lá e vai prá cá... Mas, aí ocorreu um infarto com o Zé Lessa. Antônio Lins apresentou, então, o nome de Antônio Luna, contando com o apoio do Zé Lessa que já havia retornado do seu problema de saúde. O meu nome surge, mais uma vez, como candidato a vice de Antônio Luna. Mas, eu não aceitei, novamente. Mas, certo dia, chega Alfredo lá na minha casa, procurando sobre a minha participação na campanha. Eu estava do lado de Zequinha, mesmo que já tivesse participado do grupo de Antônio e do grupo dele também, pois eram todos um mesmo grupo. Consultou sobre a possibilidade de eu me tornar Secretário da Prefeitura, no lugar de Zequinha. Ele até saiu meio aborrecido com o meu não, mas que ao final terminei aceitando essa tarefa, sendo finalmente Secretário Geral da Prefeitura. Alfredo faz alguma sondagem e vê que Zequinha podia ganhar para prefeito. Eu era prá sair vice na chapa de Antônio Luna. Ficaram Antônio Lins, Alfredo e Zé Lessa, todos contra Zequinha. Zequinha me fez Presidente do Diretório da Aliança Renovadora Nacional - Arena. Chamou Aristides Lamenha e o vereador Biéu que influenciou e, finalmente, este decidiu em ser o vice de Zequinha. Eu conversei com Aristides que tinha voto e tinha ainda as coisas de legenda e outras legendas que também dominava. O Alfredo também tinha amizade com Aristides. Conversaram prá lá
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e prá cá. Eu aproveitei para devolver a Presidência daquele partido. Eu não queria mais está naquele lenga-lenga. Mas isso me custou um preço alto.
A chapa com Antônio Luna - uma boca de caieira. A candidatura de Antônio Luna não estava bem na pesquisa, mesmo que ele era e tem sido uma pessoa muito boa e trabalhadora. Mas, ele não tinha ligação com o eleitorado em geral. Essa candidatura era uma boca de caieira. Foi quando sugeri o nome de Genildo Loureiro que era sobrinho de Dona Maroquinha, mulher de Alfredo, e filho adotivo de ambos. Uma forma para mais atrair o Alfredo. Porém, mesmo com Genildo, Alfredo era contra a chapa. O negócio dele era ser contra Antônio Lins. Ele não votou em Antônio Luna. Antônio Luna tinha tudo para ser prefeito. Tinha tudo. O Balé mantinha-se de olho em suas sondagens que não ajudavam Luna. Zé Lessa seguia doente, mas já estava melhorado. Ele tinha o dinheiro, Antônio Lins a Prefeitura e prestígio e, mesmo assim perderam para Zequinha. Tinha gente que vinha na conversa passar dinheiro para Zequinha, um dinheiro que tinha recebido da Usina ou de Antônio Lins.
A Arena de dissabores. A política tem muitos dissabores, também. A situação pior que passei foi quando Presidente da Arena, o partido do governo. O suplente do vereador Genival da Paraíba que estava doente e se caminhava para uma Convenção do Partido para a decisão de candidatos. Ora! Para a homologação de candidaturas é importante a decisão dos membros da Diretoria sobre se o suplente votaria ou
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não. Genival, que era vereador e membro do diretório, não havia confirmado presença na Convenção. Ele não iria comparecer pois estava hospitalizado. Pense, então, num negócio chato! Imagine uma mesa em que estavam presentes: o prefeito Antônio Lins, o deputado estadual José Alves, Zequinha e toda a cúpula político local a homologação das candidaturas. O voto do suplente de Genival decidiria todo o processo. Fiquei frio e segurei aquele momento até onde pude. Zé Alves de um lado, Antônio, Zequinha de outro, e eu segurando aquela situação. Afinal, o suplente votava ou não votava? Segurei a decisão até onde pude. Mas, aí, Zequinha explodiu. Imagine que ele esperava que eu estaria de acordo com ele pois foi ele quem havia me colocado na Presidência da Arena. Acontece que, nesta situação, eu estava do outro lado. Passei esse sufoco de homologação das candidaturas de Zequinha e Antônio Lins. Foi um caso sério! Finalmente, Zequinha foi eleito. Na verdade, ele já vinha sendo prefeito de fato. Como vice de Antônio Lins e como Secretário Geral da Prefeitura, ele assinava tudo. Como se não bastasse, ainda recebeu dois anos de graça, com a reforma política quando fora eleito. Em síntese: Zequinha se elegeu em 1976 a 1982. No final de seu mandato, apoiou Zé Lessa, sendo prefeito de 1983 a 1988. Este, por sua vez, veio eleger o José Santana de Melo, um novo funcionário da Usina Taquara, originado do Estado da Bahia. Este teve uma administração de apenas dois anos, vindo a falecer, assumindo o vice-prefeito Bilau.
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Um germe de oposição ideológica ronda a política local - surge o MDB. Eu não mais me encontrava satisfeito com aquela situação política geral pela qual passava o país. Estava chateado com tudo aquilo de ditadura e de militar mandando em tudo. Eu nunca simpatizei com o regime militar. Eu até vivia no meio, mas eu não decidia nada. Aquilo, verdadeiramente, nunca me foi importante. Eu agora estava no Movimento Democrático Brasileiro - MDB. Eu também sabia que não teria vez. Mesmo assim, estando certo ou errado, eu tinha de estar ali, no MDB. Eu praticamente peguei pela conversa de Zequinha, mesmo que ainda não houvesse a reestruturação partidária, indo para a oposição. Daqui para frente, eu participaria da política, mas pela oposição. Afinal, o regime militar já havia passado. Eu não tinha pretensão política eleitoral mesmo que sempre estivesse presente naqueles embates políticos. Saí de Zequinha, indo para a oposição. Eu não ficaria mais a serviço desses candidatos, sejam eles: Zé Lessa, Zequinha ou Antônio. Para mim, todos estavam sendo a mesma coisa. Mudasse em Maceió para Suruagy ou mesmo para Guilherme Palmeira, em Colônia, era tudo a mesma coisa. Antônio Lins tinha compromissos com Osvaldo Gomes que era deputado estadual governista. Assim, comecei a pensar na oposição, mesmo que eles insistissem na minha permanência na Arena. Nesse momento, aparece a figura de uma pessoa que era muito política, irmão do Zequinha, o Didi, que também sabia como eu era. Eu não tirava o chapéu para qualquer proposta política. Minha briga era com Zequinha e não com o irmão dele. Didi era político nato, um político até debaixo d`água.
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Zé Maria, o presidente do MDB, tinha sido eleito vereador e foi o Presidente da Câmara. Foi o único eleito do partido. Eu fiquei sabendo que ele estava se afastando do MDB e criando um novo partido, o partido do Tancredo. Era presidente da Câmara para, talvez, ser o sucessor de Zequinha. Eu penso que seria assim. Então, Didi me comunica esse movimento do Zé Maria. Com isso, abria precedente para o Antônio Bezerra, o gordo, que era o presidente do MDB, mas que nunca tinha tido oportunidade para ser vereador, pois era suplente de Zé Maria. Eu, quando fui vereador, dei 120 dias ao suplente Dedé Crisóstomo. Eu conversando com Antônio, o gordo, mostrei que tinha amizade com Maurício Melo, prefeito de Matriz de Camaragibe. Mendonça Neto, maior líder da oposição em Alagoas, é primo da esposa do prefeito. Havia Mendonça em Alagoas e Marcos Freire em Pernambuco, como imbatíveis lideranças. Se tu quiseres Antônio, eu falo com ele. E assim, eles apareceram três dias depois aqui em minha casa. Esse movimento ocorreu em 1980, sendo criado o Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB. Em 1982, houve duas candidaturas do PMDB, a minha e a de Vavá. Pelo lado de lá, apresentaram-se Antônio Lins e Zé Lessa. Então, vejo que fui decisivo no processo de eleição pois a minha votação e a de Vavá fizeram a diferença de uma candidatura para a outro. Zé Lessa foi eleito em 1982 e nós, a oposição apoiou Zé Costa ao governo do Estado. Em 1988, eu fui eleito vereador. Osvaldo veio para o PMDB. Antônio Lins faleceu, acidentalmente, em 1984. A candidatura agora estava nas mãos de Zé de Melo e Bilau. Nós caminhamos, agora, com Osvaldo Gomes de Barros.
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Uma mulher torna-se prefeita - Telma Melo O prefeito Bilau, no início, manifestou apoio à Telma Melo que era a viúva do ex-prefeito Zé Santana de Melo, conhecido também como Zé de Melo. Mas, depois veio apoiar Zé Lessa. Isso me chateou muito. Ele fez pior do que Antônio Lins. Essa opção de Bilau por Zé Lessa, de certa forma, me conduziu para apoiar a Telma, participando inclusive de comícios, respondendo sempre ao Osvaldo Gomes que não queria qualquer recompensa por isto. Eu não quis mais me candidatar, ficando fora. Tenho inclusive a grande satisfação que é não ter votado no Collor, nesse momento. Mas, eu votei nele para Governador. O responsável por esse voto foi o Renan que sugeriu o apoio do PMDB a ele. Mas, o Osmy Loureiro, presidente do PMDB em Colônia, não aceitou bem. Renan já liderava tudo, sendo ele e Mendonça os articuladores da campanha de Collor a governador. Renan se comprometeu pessoalmente com a oposição, aqui em Colônia. Ele veio aqui e selou esses compromissos. Mas em 1998, eu já não estava mais acreditando na política de então. A propósito, não digo isto para muita gente. No primeiro turno daquele ano, para Presidente da República, eu votei em Quércia. No segundo turno, eu votei no Lula. Aliás, a única vez que votei em Lula. Eu não votei em Collor para presidente.
Severiano liderou o processo eleitoral, mas não conseguiu ser líder político. Começa a aparecer o político Severiano que foi reeleito vereador. Foi o responsável pela cassação, por duas vezes, da prefeita Telma. O seu desempenho nesses movimentos de cassação fez dele a principal oposição ao governo de Telma e tornou-se
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prefeito, na campanha seguinte, em 1994. Eu pouco conheço desses processos de cassação. Sei que o Severiano tornou-se uma pessoa bem quista. Ele como Presidente da Câmara também não poderia deixar de informar à justiça tudo que era solicitado sobre o governo de Dona Telma. Severiano foi prefeito de 1996 a 2000. Fez um governo bom, especialmente na saúde e na educação. Colônia Leopoldina, nesse tempo, teve a maior assistência na saúde. O prefeito perdeu a eleição seguinte. Ele não soube se equilibrar e ultrapassou o limite da confiança em si mesmo. Não viu ninguém em condição de superá-lo. É quando aparece Manuilson Andrade.
A construção de um líder desconhecido - Manuilson Andrade. Sobre Manuilson Andrade, sobrinho do novo usineiro da Usina Taquara, Zé Maria, dizem, propôs-se sair vice de Severiano. E não foi possível. A orientação foi que passasse primeiro pela Câmara de Vereadores e, talvez, depois, quem sabe? Zé Maria, seu tio, disse, então, que ele seria o candidato a prefeito. Foi o usineiro Zé Maria que bancou a campanha dele. Severiano, todavia, podia segurar Manuilson, mas menosprezou-o. Manuilson elegeu-se, superando um prefeito em seu mandato, considerado bom prefeito. Elegeu-se pela segunda vez, além de fazer seu sucessor Cássio, um tipo de Prefeito à moda de Manoel de França, no tempo de Alfredo Cavalcanti. Pensando o problema de Manuilson, ele no primeiro mandato tinha compromisso de apoiar Zé Maria e não o fez. Ele apoiou a si mesmo e teve que enfrentar o seu próprio tio, ganhando com pouca diferença. Uma campanha com muitas acusações de
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ambas as partes, estabelecendo-se uma briga de família. Depois, elegeu o seu secretário Cássio. Mas, nada é eterno. O prefeito Cássio também teve um afastamento da Prefeitura pelo judiciário. Eu não conheço bem as razões. O Manuilson, eu não votei nele a primeira vez. No segundo mandato, eu também não ia votar e nem queria votar em qualquer candidato. Mas, o seu tio o Zé Maria me telefonou certa vez. Apresentou-se com um poder muito grande ao pedir o voto para si mesmo. Respondi que entre ele e Manuilson, eu não punha a mão no fogo. Falei que aquela briga entre eles era briga temporária. Ele ficou irritado. Mas foi um outro Cássio, prefeito da cidade de Jundiá, que me fez o apelo de, finalmente, votar em Zé Maria. Manuílson ganhou pela segunda vez contra Luciana Luna e contra Zé Maria. Voltando a se candidatar pela terceira vez, perde a eleição para a atual Prefeita Paula Rocha. Manuilson, contudo, tem se apresentado como um importante líder na cidade.
Outra mulher é eleita para mudanças. Hoje, a cidade é governada pela Prefeita Paula que, aliás, não foi uma atuante vereadora. Foi uma oposição ao Manuilson que é sobrinho do usineiro que estavam brigados. Ela seguia a orientação do usineiro, considerando também ser o seu esposo um importante fornecedor de cana à usina. Sobre Paula Rocha prefeita, sou sincero, não vejo correspondência com o apoio que lhe foi confiado. Para onde vai a política partidária? O voto só tem sentido se a ênfase for à conscientização das pessoas. Vender o voto é aquilo de mais estranho à cidadania. Voto é uma escolha pessoal. Eu fiquei surdo
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de ouvir nas campanhas eleitorais, em especial nesta última campanha: “que se alguém me ajudar eu também ajudo”. Veja bem: imagine uma campanha de mais de 100 vereadores como candidatos. Imagine quanto custa uma eleição dessa. O sujeito “come” do vereador e do candidato a prefeito.
O saldo desses governos. O que esses governos fizeram? O que trouxeram? Desses governos todinhos, o que mais fez foi Antônio Lins que fez muito pouco. Zé Lessa foi quem mais fez mesmo, realmente. Ele teve uma atitude grande: não fez restrição ao trabalho de seus antecessores. Zequinha não pensava assim. Zequinha foi mais fraco, mas liderou também. Zé Lessa foi o melhor governo em termos de investimento para a cidade. Zé Lessa construiu o Colégio com o nome de seu pai e concluiu o outro com o nome de Antônio Lins, na entrada da cidade. Isto foi mais brilhante. Atualmente, veja que o mercado público está indo de água abaixo. Isto é muito ruim para o governo de Paula.
Severino Rocha, prefeito, e suas primeiras preocupações. Claro que nem penso nisso e nem pretendo mais. Isto não quer dizer que me sinta incapaz e que não tenha capacidade física. Não me acho incapaz para nada, mesmo com 80 anos. Agora, não tenho pretensão a prefeito. Mas, se fosse falar em prioridade, eu reformaria em Colônia aquilo que mais me dói que é a falta da acessibilidade das pessoas com deficiência. Fico doente quando vejo uma construção jogando água no meio da rua. A água direcionada para cair no meio da rua. Não pode ser assim. A acessibilidade em Colônia é um caso muito
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sério. Imagine um deficiente, um cego andar pelas calçadas da cidade. Cada um faz o que quer na sua calçada. Isto é um problema grave. Eu arranjaria um jeito de corrigir ao máximo essa situação. Pensaria na educação que é importante mesmo que isto custe caro. Também vejo a saúde como fundamental. A segurança também eu olharia, pois esta não há. Além disso, gostaria de dizer e deixar claro que pretensão eleitoral não a tenho mais. Isto eu debito à corrupção eleitoral decorrente da compra de voto. Isto me choca muito. Para finalizar, eu lembro que quem está no comando da cidade sabe que chega um dinheiro considerável por três vezes, durante o mês, a toda prefeitura do país. Ora! A vida bem que pode ser melhor. Muito obrigado, Severino Rocha. Colônia Leopoldina, julho de 2015.
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Relato Histórico 4
Ernane Santana Santos1
1 – Introdução Quando ainda era estudante do grupo escolar Aristheu de Andrade (curso primário), lá pelos idos da década de 1950, meu pai Adalgiso Borges Santos já acompanhava o grupo político do senhor Alfredo Cavalcanti, meu padrinho e correligionário do meu avô materno, Francisco Santana e Silva, então presidente do partido político PSD (Partido Social Democrático). Ainda garoto, comecei a me interessar pela vida política de minha terra natal – Colônia Leopoldina, a qual, era administrada pelo político mais influente da cidade – Alfredo Cavalcanti. Nesse tempo, o então 1Ernane Santana Santos: Participante dos momentos políticos e partidários da cidade, desde a década de 50. Nascido em Colônia Leopoldina. É ex-professor da Universidade Federal de Alagoas e da Escola de Ciências Médicas de Alagoas. Encontra-se aposentado das Escolas Médicas. É médico especialista em saúde pública, clínica médica, psiquiatria e medicina do trabalho pela USP-SP. Exerceu o mandato de vereador na cidade por 5 quadriênios (1993-2012). É autor de vários livros como: As ruas da cidade de Colônia Leopoldina; Incruzando Espadas e poesias outras. É membro fundador da Academia de Cultura de Colônia Leopoldina-AL (ACCL).
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distrito de Novo Lino pertencia administrativamente ao município de Colônia Leopoldina. A política local também estendia-se ao distrito com a presença da tradicional família Gomes de Barros, dona do antigo engenho Amapá, situado no já mencionado distrito de Novo Lino. Todavia tenho melhor ciência dos fatos políticos, a partir do ano de 1955, quando o Sr. Alfredo Cavalcanti administrava o seu último ano de mandato de prefeito de Colônia Leopoldina. Em 1959, prestei exame de admissão para ingressar no ginásio Agamenon Magalhães, em Palmares-PE. Conclui o curso ginasial no ano de 1962. Nesse período de estudante secundarista, comecei a estudar com mais ênfase a questão da política partidária, chegando, inclusive, a participar ativamente da campanha política vitoriosa de 1962, que acabou elegendo o Dr. Miguel Arraes de Alencar, governador do Estado de Pernambuco. Foi assim que pude acompanhar mais de perto a política de Colônia Leopoldina.
2 – Alinhamento dos políticos locais aos estaduais Foi na eleição de 1954 que, ainda garoto, comecei a acompanhar meu pai durante boa parte da campanha eleitoral que elegeu nosso primo Manoel Freire Borges (Balé) para o cargo de deputado estadual, sendo ele genro do senhor Alfredo Cavalcanti. Chegou a ocupar a cadeira de vice-presidente da Assembleia Legislativa de Alagoas, quando então deputado Lamenha Filho presidia a Casa Legislativa “Tavares Bastos”. Numa ensolarada tarde de sexta-feira, 13 de setembro de 1957, nas dependências da Assembleia Legislativa de Alagoas ocorreu um tiroteio no qual perdeu a vida o líder da bancada governista, deputado Humberto Mendes, sogro do então governador Muniz Falcão.
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O episódio entrou para a história de Alagoas como um dos mais violentos acontecimentos da política local alagoana. Foram mais de 1.000 tiros disparados por metralhadoras, fuzis, pistolas e revólveres por cerca de 20 minutos. O motivo do entrevero foi a tentativa da oposição de votar o pedido de “impeachment” do governador Sebastião Marinho Muniz Falcão. Esse momento tenso da política alagoana refletiu-se sobremaneira na campanha eleitoral de 1958. Alguns permaneciam ao lado do bloco que tentara derrubar o governador, enquanto outros seguiam acompanhando os adeptos de Muniz Falcão. Diante dessa situação, o senhor Alfredo Cavalcanti perde a chefia política do município, a qual foi entregue à família Gomes de Barros, na pessoa do senhor Paulo Gomes. Nessa eleição de 1958, o grupo dividido assumiu lados distintos na política partidária, o que em muito contribuiu para a não reeleição do deputado Balé.
3 – Os ventos da organização dos grupos políticos: a formação dos grupos políticos de Alfredo Cavalcanti, Paulo Gomes de Barros e José Luiz Lessa. No ano de 1947, é eleito prefeito da cidade, o cidadão Porto Calvense Durval Gonçalves. Ele residia no engenho Tigre e era administrador desse e de outros engenhos de propriedade da usina Santa Therezinha, situada no município de Agua Preta-PE. Foi convidado para se candidatar ao cargo de prefeito através do conterrâneo e amigo Alfredo Cavalcanti, então vereador de Colônia Leopoldina. Com o importante apoio de Alfredo Cavalcanti, tornou-se mais fácil ainda a eleição de Durval Gonçalves. Eleito, ele governou o nosso município, de 1948 a 1951.
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Segundo Everaldo Araújo, no ano de 1950, após alguns vereadores abrirem mão de receberem seus subsídios, pôde o prefeito Durval Gonçalves adquirir o primeiro ônibus, que fazia regularmente a linha Colônia Leopoldina a Palmares-PE. A família Gomes de Barros gozava de grande prestígio político, desde que seu pai, o coronel Laurentino Gomes de Barros, assumiu a interventoria municipal durante 11 anos, no período do Estado Novo, instalado no Brasil após o golpe de 1930, o qual derrubou o presidente Washington Luiz do poder, numa manobra tecida pacientemente pelo movimento tenentista em comum acordo com o governo liberal do Dr Getúlio Vargas, então governador do Rio Grande do Sul, o qual assumiu a chefia do governo provisório do Brasil. Após o término do mandato do senhor Durval Gonçalves, Alfredo Cavalcanti é lançado candidato a prefeito e, numa luta eleitoral consegue vencer o candidato oposicionista Paulo Gomes de Barros. Eleito prefeito, Alfredo Cavalcanti e sua esposa D. Maroquinha (uma das mulheres mais políticas que Colônia Leopoldina conheceu), governam com liderança inconteste o município de 1951 a 1955. Apesar dos parcos recursos destinados ao município eles fazem uma verdadeira revolução administrativa para aquela época. Alfredo Cavalcanti plantou para o futuro, e ao final do seu mandato colheu frutos elegendo para prefeito o senhor Manoel Barbosa de França, homem justo e probo com a coisa pública, zeloso e temente a Deus. Muito católico, chegou a ser o presidente da Liga Católica Apostólica Romana de nossa cidade. Sua indicação teve a forte influência de seus padrinhos políticos – Alfredo e D. Maroquinha – a qual pertencia a Liga do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus.
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Findo o mandato de Manoel Barbosa de França, é eleito pela segunda vez o senhor Alfredo Cavalcanti para o cargo de prefeito municipal após uma disputada eleição contra José Maria de Omena. Alfredo Cavalcanti nasceu no município de Porto CalvoAL. Chegou em Colônia Leopoldina nos idos de 1910. Foi criado pelo seu tio e padrinho Dr. Anastácio de Paula Cavalcanti, juiz municipal de Colônia Leopoldina. Iniciou sua carreira política partidária como um dos mais sinceros seguidores da família Gomes de Barros. Estes chegaram a ocupar os cargos de Deputado Estadual e Federal e até de Governador do Estado (Antônio Gomes de Barros e Manoel Gomes de Barros). Alfredo foi vereador por 02 mandatos e chegou a presidir a Câmara de Vereadores. Candidatouse a Deputado Estadual em 1961, e ficou na 1ª suplência de seu partido. Sua divergência política com os Gomes de Barros ocorreu, possivelmente, quando ele indicou e apoio para disputar o cargo de prefeito, o seu amigo porto-calvense Durval Gonçalves Pereira. Daí, tornaram-se adversários políticos por quase 20 anos. Até o princípio da década de 1960, o distrito de Novo Lino pertencia administrativamente ao município de Colônia Leopoldina. A rodovia que liga o Norte ao Sul do país, com intenso tráfego de veículos, levou esse distrito a uma grande movimentação, e a rápida prosperidade fez com que a população sonhasse em sua independência política. Podemos destacar as famílias Gomes de Barros, Messias Dias, Guedes de Melo, Sebastião Lemos, os irmãos Antônio e Izaías Buarque de Lima, Alfredo Soares e tantos outros. Izaías Buarque, Dionísio Guedes e Alfredo Soares, chegaram a ocupar a presidência da Câmara de Vereadores de Colônia Leopoldina.
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Alfredo Cavalcanti, sentindo a vontade do povo pela emancipação política, dialogou com as lideranças envolvidas no projeto, notadamente os Gomes de Barros, e propôs a apresentação de um projeto de lei desmembrando o distrito de Novo Lino da cidade de Colônia Leopoldina. A emancipação política decorreu da Lei 2490, de 1º de dezembro de 1962. Manoel Messias assumiu interinamente a prefeitura em 1963. O primeiro prefeito eleito foi Paulo Gomes de Barros, que governou o município de 1963 a 1969, e seu filho Dr. Osvaldo Gomes na década de 90 foi eleito prefeito da cidade de Novo Lino. Parece-me que assim, encerrou-se a disputa política entre Alfredo Cavalcanti e os Gomes de Barros. No pleito eleitoral de 1958, o seu genro, o deputado Balé, não consegue sua reeleição, pois, o novo chefe político Paulo Gomes de Barros, junto com o usineiro José Luiz Lessa, seguindo orientação governamental, articulam e registram mais uma candidatura a deputado estadual, escolhendo um jovem político bem conceituado na comunidade Leopoldinense, José Maria de Omena, que era Contador da Usina Taquara pertencente ao senhor José Lessa, e também eficiente funcionário público dos correios e telégrafos daquela época. Assim, apesar do seu favoritismo, o deputado Balé não consegue sua reeleição, diante da divisão dos votos da pequena cidade. Nenhum dos dois postulantes conseguiu sucesso. Ambos ficaram como suplentes de deputado de seus respectivos partidos. Dessa forma, creio eu, que o governador Muniz Falcão, que não fora cassado e afastado do cargo, articulou o “troco” para aquele deputado que participara do “grupo dos 22 maus alagoanos”, que segundo ele, ousaram afastá-lo do poder.
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Como se vê, ao tempo em que se formava o grupo do senhor Alfredo Cavalcanti, também estava sendo composto o grupo do usineiro José Lessa. Com o seu aporte financeiro ele sozinho já se constituía um grupo, o seu próprio grupo. Ele próprio, já havia lançado o seu amigo José Maria de Omena, como candidato oposicionista em duas eleições consecutivas. Sem sucesso. Dessa maneira, por várias décadas, as questões político-partidárias passariam pelas mãos desse dois senhores: Alfredo Cavalcanti x José Lessa.
4 – Liderança conquistada com a força das mulheres - Antônio Lins da Rocha -1965 Após seu segundo mandato intercalado, o bloco político do Sr. Alfredo Cavalcanti e particularmente ele, sendo este também o grupo do meu pai, ainda não havia definido um nome para substituí-lo à frente da prefeitura. Nesse momento, entra em cena o nome do jovem comerciante e vereador do bloco alfredista – Antônio Lins da Rocha procedente de Pernambuco, da usina Frei Caneca, município de Maraial, com grande base política na antiga usina Porto Rico, onde seu pai Aristides Rocha era gerente de campo da referida usina. Aproveitando o vazio político, lançou-se candidato a prefeito após ouvir um sem número de simpatizantes, a maioria originária do bloco alfredista, do qual ele próprio era parte integrante. Alegando que no momento, uma campanha política contra o usineiro José Lessa teria um custo muito elevado, a cúpula partidária liderada pelo prefeito Alfredo Cavalcanti optou por aguardar o desenrolar natural dos acontecimentos políticos, embora já circulasse pelas ruas da cidade que o senhor José Maria
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de Omena teria o apoio do usineiro José Lessa. Impasse criado. O grupo político do prefeito opinava abertamente que não poderia ficar sem um candidato próprio. Enquanto o líder relutava em apresentar um candidato de sua preferência, alegando entre outros motivos, a própria despesa da campanha eleitoral. Então, o vereador Antônio Lins viu que era chegada a sua hora. Reuniu-se com velhos correligionários alfredista, e, principalmente alguns comerciantes locais que acreditavam na sua potencialidade como líder, além da juventude estudantil que começava a demonstrar gosto pela política, dentre eles, eu. Nesse período pré-eleitoral, começou a surgir um comentário de que caso seu Alfredo não apresentasse um candidato haveria a possibilidade do Sr. José Lessa sair candidato único ao governo municipal. Alternativa essa que os nossos partidários não admitiam por hipótese alguma. Daí, a tendência de se rebelarem e acompanharem o projeto político do Sr. Antônio Lins, mesmo que ele não viesse a ter o total aval do então prefeito. Dessa forma, logo se observou que José Lessa mudara o seu jeito de fazer política em razão dos reveses sofridos em disputas eleitorais anteriores. Era preciso “derrubar” o grande líder Alfredo Cavalcanti. Para tanto, adotou nova estratégia. Passou a convidar algumas pessoas para comparecerem a sua usina e, ali, ele expunha as razões do seu projeto político. Possivelmente acenava para os mesmos com outras oportunidades de participação em seu provável governo. Esses, passaram a ser chamados de os “Novos Cristãos”. Será que naquele momento estaria surgindo ali uma nova relação entre o capital e o poder? Não sabemos ao certo o que de fato aconteceu. O nosso grupo político assistia a tudo fazendo suas próprias análises e imaginando conclusões: quem estaria com quem naquele momento? Foi quando surgiu na cidade
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o comentário jocoso de que o grupo que passara a acompanhar o usineiro José Lessa seria apelidado de “cara preta”, e, como moeda de troca, o grupo do Alfredo passou a se chamar “bucho branco”, talvez em alusão a cor do açúcar produzido pela usina Taquara. Persistia o impasse. Alfredo continuava indeciso quanto ao nome a ser indicado por ele. Antônio prosseguia no seu objetivo maior, com ou sem apoio do líder. Dizia-se na época, que tamanha era a força política do Sr. Alfredo, que se o mesmo decidisse lançar para candidato uma “porteira”, a “porteira” seria eleita. A propósito: havia na cidade uma figura populaça chamada Migué cego. Miguel havia levado um tiro no olho esquerdo numa briga de bar, e ficara cego. Então, falava-se também, que se seu Alfredo resolvesse indicar como candidato a prefeito o Migué cego, ele seria eleito seu sucessor. Portanto, ninguém em sua sã consciência abriria mão de semelhante apoio político. Uma vez formado o grupo do Antônio Lins, eu e meu tio Zito Luna passamos a elaborar uns modelos de discursos para o nosso candidato, para que ele pudesse ir logo se entrosando com questões políticas da nação, do estado e do município. Em plena campanha ele ainda leu alguns discursos, porém, inteligente como era, logo percebeu que não mais precisava de nossa intervenção em suas “falas”, passando ele próprio a usar em seus discursos uma linguagem menos acadêmica e que pudesse atingir mais em “cheio” o eleitorado. Todavia, antes de Antônio registrar a sua candidatura, a cidade foi sacudida com o boato de que teria havido uma reunião entre os dois líderes políticos – Alfredo e José Lessa – no sentido de encontrarem um caminho para uma possível composição política visando afastar da disputa eleitoral, tanto o Sr. Antônio Lins
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quanto o Sr. José Maria de Omena. Caso isso fosse confirmado, o candidato de consenso seria o próprio José Lessa. No entanto, nunca tivemos prova cabal de que tal encontro houvesse de fato acontecido. O fato é que correu esse boato pela cidade e o povo ficou em pé de guerra. Mulheres e crianças protestavam pelas ruas contra essa possível união entre os grupos políticos que se digladiavam entre si há 20 anos. Então, nosso grupo encontrou-se com Antônio e a ele perguntou se procedia aquele boato. Ele negou veementemente a alternativa de abandonar a campanha, e disse que jamais participara de nenhuma reunião e tampouco desistiria de sua candidatura. Ela era irreversível. O povo aplaudiu sua resposta e o bloco ganhou as ruas. De fato, após esse episódio, o Antônio tomou gosto pela luta política e nós armamos o palanque para enfrentar o provável adversário, José Maria de Omena. Assim Antônio, que possui eleitores tanto do lado do Sr. Alfredo como do lado contrário, passou a dizer inteligentemente o seguinte: “eu não posso dizer que sou candidato totalmente apoiado por seu Alfredo, porque posso perder alguns votos, e, se for contra ele, será muito pior”.
5 – A unção de Antônio Lins da Rocha Um certo dia, fomos convidados a participar de uma reunião na casa grande do engenho Santo Antônio, de propriedade do Sr. Alfredo. Seria uma reunião para se discutir os rumos da política, para o qual foram convidados um seleto grupo de políticos locais, e mais alguns correligionários do prefeito. Eu e o Antônio fomos nos aconselhar com o ex-vereador Aristides Caetano. O encontro ocorreu no antigo engenho Forte do Mato, em Pernambuco, onde ele residia. Nessa época não havia telefonia na propriedade. Todavia, alguém descobriu nosso paradeiro, e fomos aconselhados a comparecer à
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reunião já marcada. E lá fomos nós. Em ali chegando, encontramos além do meu padrinho Alfredo, sua esposa D. Maroquinha, seu genro o ex-deputado Balé e os seguintes convidados: Adalgiso Borges, Sebastião Torres, José Gomes de Lima (Zequinha) e seu irmão Abdias (Didi). Também anotamos mentalmente as presenças dos senhores: José Brazilino (vereador), José Máximo (vereador), Rubens Carneiro Gama (galego sapateiro), Zito Luna, Lourival (negociante de arreios) e tantos outros que não consigo nominar com segurança. Ficamos naquela reunião, e a grande pergunta era: ¨quem é o líder político da cidade?¨ A resposta sempre era: “Seu Alfredo”. Porém, tanto Antônio como seu Alfredo permaneciam calados. Foram analisadas as vantagens e as desvantagens de uma candidatura contra o candidato de José Lessa. Finalmente, chegouse a um consenso: Antônio sairia candidato a prefeito com o apoio de Alfredo e José Máximo seria o candidato a vice. Anunciada a decisão, Antônio agradeceu, e saímos da reunião certos de que foi melhor fazer um acordo do que não ter acordo nenhum.
6- O bloco do usineiro José Luiz Lessa O outro bloco político não estava assistindo tudo isto passivamente. José Maria de Omena que à época era suplente de deputado estadual, assumiu uma vaga por um certo período. Ele compunha o bloco do José Lessa. Agora, munido de uma carteira de deputado, e com o apoio da usina Taquara e da família Gomes de Barros, sua candidatura a prefeito também se tornou irreversível, além de ganhar mais fôlego para mais uma disputa eleitoral. Reuniu seus correligionários e travou um bom combate contra o grupo do Antônio Lins. Disputou voto a voto, porém, mais uma vez não conseguiu alcançar seu objetivo tão almejado. Assim, como funcionário dos Correios e Telegráficos e deputado recém-
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empossado ele cria uma rádio comunitária de nome Rádio Jacuípe e passa aos sábados a realizar verdadeiros comícios dentro da própria rádio. Aquilo era uma festa. Colônia Leopoldina falando para o mundo através das ondas curtas e moduladas. De imediato, veio o troco: Socorro Fagundes, amiga do velho Alfredo, e também funcionária dos Correios, em Maceió, estimula, e sem licença alguma do DENTEL(Departamento Nacional de telecomunicações) resolve fundar a Rádio Princesa Colônia Leopoldina, pertencente ao bloco alfredista – Organizações José Gomes de Lima. Essas duas rádios clandestinas fizeram tanto barulho e interferência nas programações das outras emissoras que o caso foi bater na Diretoria dos Correios e no Quartel do 20ºBC – Exército. As duas, por determinação do DENTEL, foram obrigadas a suspenderem suas atividades radiofônicas. Na Rádio Jacuípe se sobressaiam os seguintes locutores: João Pureza, Iolita Araújo, Ana Lins, Xixi, Tico-Tico e o locutor de Caruaru de nome Jonas, além do assistente técnico Eduperron Chaleg. Na Rádio Princesa Colônia Leopoldina despontavam os aprendizes Ernane Santana, Sebastião Braga, Emiraldo Araújo, Gustavo Cabôclo e seu violão, Nelson Ramos, Zezinho Lebre, Romeu e tantos outros. Essa passagem meteórica de nossas incursões pelas ondas sonoras teria que ser registradas para a posteridade. E foi o que eu resolvi fazer. Naquele tempo, os eleitores votavam no candidato a prefeito e também tinham que votar para vice-prefeito. Pelo lado do José Maria, o escolhido como candidato a vice foi o combativo vereador oposicionista – Djalma Costa Araújo. A grande surpresa dessa eleição é que o vice de José Maria obteve mais voto do que o titular. Durante a campanha presidencial do Marechal Henrique Teixeira Lott, o Deputado Federal João Goulart (Jango) foi eleito Vice-Presidente da República, enquanto que, o candidato eleito
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presidente foi Jânio Quadros, ficando assim eleitos: Jânio e Jango, formando a famosa dupla Jan – Jan (Jânio e Jango), Presidente e Vice respectivamente, embora tivessem sido eleitos por partidos e coligações diferentes. Em síntese, com a eleição de Antônio Lins, o que se viu é que a partir daquele momento estaria surgindo uma nova liderança política local, a qual, com pouco tempo de governo, resolveu politicamente se afastar do Sr. Alfredo. Depois desse episódio, acreditamos que aquela “relutância” inicial de aceitá-lo como candidato oficial do grupo alfredista, fazia sentido – o velho cacique conhecia bem a política, e melhor ainda, seus correligionários.
7- Tempos de Antônio Lins e a presença permanente de José Lessa no cenário político Antônio Lins foi eleito e nomeou Zito Luna Secretário Geral da Administração. Ele governou o município de 1966 a 1970. Em seguida, teceu um acordo entre os grupos políticos visando o lançamento de uma candidatura única em torno do nome de José Lessa que saiu candidato. Tal decisão não agradou muito ao eleitorado acostumado a grandes disputas. Antônio e Alfredo, não ofereceram nenhuma resistência, tudo em nome da pacificação política. Dessa forma, o Sr. José Lessa é eleito prefeito para exercer um mandato de apenas 3 anos. Assim decidira o general presidente e seus apoiadores do golpe militar de 1964, que advogava a questão da coincidência de mandatos. Ele governou de 1971 a 1973, tendo como seu Secretário Geral, Hercílio Costa Araújo. No dia da eleição, anotamos o seguinte episódio: o povo não concordando com uma candidatura única começou a boicotar a eleição não comparecendo em massa para cumprir o seu dever cívico – Votar. À tarde,
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temendo-se que a votação em branco e o voto nulo superassem os votos válidos para a eleição do candidato José Lessa, tanto ele como seus apoiadores foram às ruas solicitar o comparecimento do povo às urnas. No final os votos foram apurados e suficientes para eleger o José Lessa. Enfim, ele conseguiu ser o candidato da união. Em 1972, Antônio Lins disputa nova eleição de prefeito contra José Maria de Omena, agora, tendo como vice o vereador José Gomes de Lima (Zequinha). É eleito e nomeia o seu vice como secretário de administração. Antônio Lins exerce o seu segundo mandato de 1973 a 1977. Tanto Antônio como José Lessa foram considerados bons prefeitos da cidade. Antônio realizou um bom trabalho em razão de sua experiência como comerciante, e José Lessa não teve maiores problemas para em tão pouco tempo governar com zelo e responsabilidade o município devido sua grande experiência como administrador de uma indústria do açúcar – sua Usina Taquara. Durante o seu primeiro mandato Antônio se fez presente em todo o seu período governamental, o que não aconteceria no seu segundo mandato, quando passou a demorar mais tempo na cidade de União dos Palmares, onde havia inaugurado um supermercado. Assim, boa parte da administração ficou sob a responsabilidade do seu vice e secretário de administração, José Gomes (Zequinha), que passou a realizar um bom trabalho e sempre em sintonia com as necessidades do povão. Tornou-se muito popular, ao tempo em que, também começou a se preparar para disputar o próximo pleito eleitoral, para suceder o então prefeito Antônio Lins.
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8- Nova força política “TAMPA” os grupos anteriores - José Gomes de Lima (ZEQUINHA) Passado algum tempo, o prefeito Antônio retorna definitivamente para Colônia e exonera, a pedido, o Sr. Zequinha da Secretaria de Administração. Nomeia pra o referido cargo seu primo Severino Rocha. Começa a trabalhar um nome para apresentar como seu sucessor. Vejam que, todos esses participantes eram egressos do grupo político do Sr. Alfredo ou do próprio José Lessa. Faltando pouco mais de oito meses para as eleições, Antônio Lins se movimenta e passa a coordenar uma nova aliança com o grupo de Alfredo e de José Lessa. Essa nova aliança convida para disputar a prefeitura o Sr. Antônio Luna, de tradicional família do município, e muito ligado politicamente ao amigo José Lessa. Ele reluta em aceitar semelhante tarefa, porém, convencido pelos grupos políticos, termina aceitando ser o novo candidato da conciliação política. Assim, o grupo resolve escolher como candidato a viceprefeito o filho adotivo de Seu Alfredo, Genildo Pinto Loureiro, sobrinho de D. Maroquinha, esposa do Sr. Alfredo. Agora, temos uma tríplice aliança: Antônio Lins – Alfredo Cavalcanti – José Lessa. Zequinha e seu irmão Didi eram velhos correligionários do Sr. Alfredo. Assim, mesmo pressionado pela tríplice aliança Zequinha não abriu mão de sua candidatura, e rompeu definitivamente com o prefeito Antônio Lins. Ele e seu irmão Didi convidam para o cargo de vice o vereador Manoel dos Santos Silva (Biel), casado com uma prima de Antônio Lins. Zequinha se sentia preparado para assumir o cargo de prefeito. Realizou uma campanha com forte aceitação popular, e vence o pleito eleitoral com uma vantagem de mais de 700 votos sobre seu oponente –
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Antônio Luna. O povo comentava: “Zequinha deu uma “tampa’’ em Antônio Lins”. Dessa forma, esse seu feito político exaltou mais ainda sua vitória. Assume o governo municipal para um período de quatro anos – 1978 a 1981. Nomeia sua esposa Maria Lúriva (Dona Nininha) para a Secretaria Geral de Administração. Zequinha teve seu mandato prorrogado por mais dois anos pelo governo revolucionário de 64. Então, governou de 1978 a 1983.
9- Uma casa sem tramela Dessa campanha política eu não participei. Apenas assisti a alguns comícios e votei. Durante a campanha, uma grande parte do povão foi às ruas movida pelo entusiasmo por seu candidato, e também movida por uma bebida inventada por Zequinha, a qual o povo deu logo o nome de “XEQUETÉ”. Essa mistura alcoólica com suco de frutas preparada em um grande caldeirão sem tampa, e que tanto acendia o ânimo da “galera” durante as passeatas, decerto deu origem ao dito popular: “ói a tampa”. Quando os eleitores de Zequinha cruzavam com os de Antônio Luna, gritavam “ói a tampa”. Esse tal de “xequeté” era distribuído dentro da casa do Zequinha a todos quantos desejassem dele tomar. E segue a onda: “ói a tampa”. D. Nininha, esposa do candidato, sabia tratar muito bem os eleitores. A sua casa vivia aberta ao público dia e noite. Era como se não tivesse tramela. O povão chegava e metia o copo no grande caldeirão de bebida e bebia à vontade. Dessa forma, o povão transformou-se naquilo que o ex-governador de Alagoas, Silvestre Péricles chamava a “poeira de ouro”. Com essa tal “poeira de ouro”, Zequinha ganhou a campanha contra a tríplice aliança. Ao cabo do seus seis anos de mandato, ele usou o mesmo artifício do Alfredo. Ficou calado. Não falava nada sobre o
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candidato à sua sucessão. Ele e o irmão Didi, “seguraram” o nome do seu candidato até última hora. Segredo total. Então, um belo dia, ele anunciou que o seu candidato seria o usineiro José Lessa. Agora, a máquina governamental associada ao poderio financeiro do José Lessa, estaria preparada para enfrentar o candidato oposicionista já declarado – Antônio Lins. Tudo estava conspirando a favor do retorno do ex-prefeito José Lessa. Nessa campanha, a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) lançou dois candidatos. A ARENA I apresentou José Lessa e a ARENA II indicou Antônio Lins, enquanto que o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) apresentou também dois candidatos: MDB 1 Severino Rocha (primo de Antônio) e MDB2 Edvaldo (Vavá do posto). Ocorreu uma grande disputa entre esses quatro candidatos. Após a apuração dos votos, José Lessa é eleito com uma diferença de pouco mais de 200 votos sobre seu principal oponente Antônio Lins. Nessa campanha acompanhei o candidato José Lessa, tanto o auxiliando como médico (atendendo na cidade e zona rural) como um dos oradores em seus comícios, defendendo o seu retorno à prefeitura.
10 - Oposição partidária com ideologia própria – MDB A candidatura de José Lessa era fato consumado. Antônio seria seu oponente. Nisso, os comerciantes Severino Rocha e Edvaldo (Vavá do posto), que haviam fundado o MDB lançam-se candidatos a prefeito – Severino Rocha (MDB1) e Vavá do posto (MDB2). Essa foi a grande novidade que surgiu na cidade. Agora, estamos diante uma “trava” na política local. Severino, preparou uma oposição consciente, seguindo orientação contrária ao governo revolucionário. Separa-se dos grupos políticos e sai candidato
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oficial na campanha de 1982. Assim, são quatro candidatos para que o povo possa escolher o mais capacitado. Comentam que Antônio Lins teria conversado com seu primo Severino Rocha para discutirem a viabilidade de suas candidaturas. O fato é que, Severino Rocha manteve-se na disputa eleitoral. Creio eu, que ali estava “selado” o destino das candidaturas de oposição. Não deu outro resultado, José Lessa foi eleito para seu segundo mandato. Com ele ocorreu o mesmo episódio de Zequinha. Foi eleito para quatro anos e terminou governando por seis anos – 1983 a 1988. Dessa vez, ele trouxe de Maceió o ex-gerente do Banco Bradesco, José Santana de Melo, para ocupar a Secretaria Geral durante todo o seu governo. Habilidoso, com vasta experiência de comando, logo se transformou num bom político e passou a atender todo o público: tanto atendia aos correligionários como também servia aos adversários. Daí essa sua grande popularidade o credenciou para ser o próximo candidato a prefeito, sucedendo ao seu padrinho José Lessa. Também era comentário geral de que se seu José Lessa resolvesse apoiar seu Zequinha, o mesmo seria eleito. Fato que não ocorreu. Zé Lessa resolve apoiar como candidato a sua sucessão o seu amigo e secretário geral José Santana de Melo. Nessa campanha política eleitoral de 1989, eu ocupava a presidência do PFL (Partido da Frente Liberal), juntamente com os senhores José Acioly (Zequinha Acioly), Aristides Lamenha da Rocha, José Alves Caldas (Baleia), José Araújo de Luna e Adalgiso Borges. O bloco do José Lessa ainda tentou conseguir essa legenda, porém, o nosso amigo deputado Nenoí Pinto que nos autorizou a fundar o PFL, não aceitou. Ameaçou deixar o partido caso isso ocorresse. José Lessa terminou fundando o PL (Partido Liberal) e o entregou ao José de Melo. Próximo da convenção para escolha do candidato oposicionista surge o nome do ex-deputado Dr. Osvaldo
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Gomes (Filho do Paulo Gomes), o qual recebeu o aval de Severiano Freitas, Severino Rocha, Vavá do Posto e Júnior Luna, ambos do PMDB. Reunimo-nos em Maceió sob o comando dos deputados Nenoí Pinto (Deputado Estadual) e Geraldo Bulhões (Deputado Federal). Foram convidados para compor a chapa do Dr. Osvaldo, o Severino Rocha, o Severiano Freitas e Aristides Lamenha. Ninguém aceitou ser o vice. Diante do impasse, foi o meu nome escolhido para ser o candidato. Relutei, porém fui convencido pelo deputado Nenoí Pinto, e formamos a chapa majoritária: Dr.Osvaldo – Dr. Ernane. Após nossa convenção partimos para a luta quase impossível de vencer a dupla José Lessa e José de Melo, com o vice Lourinaldo (Bilau). Sem grandes recursos, nos valemos de alguns colegas médicos e passamos a dar assistência médica tanto na área urbana como na área rural. Era a nossa arma mais forte para conter o avanço da candidatura José de Melo – Bilau. Sem ninguém esperar, surge Zequinha como candidato, fazendo fé na sua “poeira de ouro”. Às vezes, ninguém sabia para que lado pendia a vitória, embora José de Melo contasse com mais recursos financeiros. Após o encerramento da eleição todas as urnas foram conduzidas pelos presidentes e mesários das respectivas seções eleitorais acompanhados de uma escolta policial até o Grupo Escolar Joaquim Luiz Lessa, onde ocorreria a apuração somente no dia seguinte, pois os ânimos estavam muito exaltados. Durante toda a noite a polícia montou guarda no local onde se encontravam as urnas. Passamos a noite em vigília total: o grupo do PMDB – PFL, do PT de Irapuan e do partido do Sr. Zequinha . Houve uma série de contestações e pedidos de impugnação de algumas urnas, os quais não foram atendidos pelo Dr. Juiz Eleitoral, que autorizou a abertura e contagem dos votos. De nada adiantou as
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solicitações dos candidatos. Havia uma certa inquietação entre os fiscais e advogados do Dr. Osvaldo, do candidato do PT de Irapuan e do Sr. Zequinha. Apurados os votos, foram derrotados Osvaldo, Zequinha e Irapuan por uma margem de votos superior aos 1000 votos. Apesar de tudo, a nossa coligação conseguiu eleger dois vereadores: Severino Rocha e Severiano Freitas, e o partido do Zequinha, também elegeu dois vereadores: Dr. Márcio e Luiz Pedro, do distrito de Monte Alegre. À saída de Dr. Osvaldo, houve um princípio de tumulto, os correligionários do José de Melo tentaram empurrar o Dr. Osvaldo e seu filho Osvaldinho, jogando sobre eles o melaço (mel de usina). Era uma gozação do vencedor sobre o vencido. Para evitar maiores problemas, uma guarnição militar sob o comando do então cabo de polícia, Amaro Rodrigues (Marinho, atualmente vereador), escoltou ele e sua família até o engenho Amapá onde residia. Depois de tanta luta, o José Santana de Melo exerceu o mandato de prefeito por um curto período de tempo (02 anos), vitimado que foi por um “infarto” agudo do coração. Em seu lugar assume o seu vice Lourinaldo de Lima (Bilau), cujo mandato foi concluído em dezembro de 1992.
11- A Eleição de D. Telma – Esposa do Zé de Melo Em 1992, o nosso grupo político (PFL) passou a se organizar para lançar uma candidatura própria ao governo municipal, aproveitando o vazio político deixado pelo desaparecimento precoce do José de Melo. Meu primo Zitinho (Baleia) começou a insinuasse candidato do grupo e, afirmava que sua candidatura contaria com o apoio do Severino Rocha, Vavá do Posto e de tantos outros políticos
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da cidade. Chegou a investir alguns recursos financeiros em sua pré-campanha. Quando se aproximou o período das convenções partidárias fomos surpreendidos pela decisão do próprio Zitinho de aceitar ser o vice da chapa encabeçada por D. Telma Melo, frente a um estratagema de seu filho Talmo, que agora presidia o PL, partido fundado pelo seu pai. Para mim, presidente do PFL, foram duas novidades ao mesmo tempo: Zitinho alegava que não mais possuía recursos para enfrentar o candidato já declarado, o usineiro José Lessa, que tentava voltar ao governo pela terceira vez e que acabara de fechar um acordo com D. Telma para sair candidato a vice. À frente dessa articulação política encontravase o próprio filho do José de Melo, o qual, sem alarde, lançou a chapa majoritária – Telma Melo – Zitinho Caldas. Essa chapa encontrou grande dificuldade entre os próprios aliados de José Lessa, que em sua maioria eram filiados ao PL. Assim, estava decidida a separação entre os grupos de José de Melo e José Lessa. A possibilidade dessa frente PFL – PL era por todos considerada uma afronta ao “padrinho” José Lessa, uma vez que, o José de Melo era cria política do Lessa. Seria uma grande ingratidão política, falavam alguns eleitores. Sem acordo, enfrentamos o primeiro obstáculo político. Por determinação do TRE Alagoas todos os municípios teriam que fazer o recadastramento eleitoral em 1992. As exigências eram grandes. Nem todos mais residiam em Colônia Leopoldina; eram apenas eleitores desde o seu primeiro voto, mas faltava o requisito “residência”. A pressão foi enorme por parte do grupo oposicionista. As oposições souberam trabalhar e, no dia do recadastramento eleitoral, todos nós tivemos nossos pedidos de regularização negados. Orientados pela advogada Laureta de Medeiros, solicitamos ao escrivão José Bezerra um documento que informasse a negativa da nossa inscrição eleitoral. De posse
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desse documento, Doutora Laureta deu entrada num pedido junto ao TRE Alagoas, tomando como base o meu processo, e fez a defesa coletiva de mais de 30 eleitores. Após várias horas de discussão, o plenário do TRE decidiu acolher nosso pedido. Com essa decisão, continuamos com o direito de votar em Colônia Leopoldina, permanecendo intocáveis os nossos títulos eleitorais. Assim, vencemos o primeiro obstáculo.
Fomos à convenção e
sacramentamos as candidaturas Telma Melo – Zitinho Caldas. Exigiram, e eu aceitei ser candidato a vereador. A pergunta era: como esses dois sem grandes tradições políticas e pouco ou nenhum recurso financeiro vão enfrentar o Sr. Lessa? Era uma luta de Davi contra Golias. Desse jeito, sai o Zitinho como candidato, porque nem Zequinha Acioly, nem Aristides Lamenha e nem eu, criamos nenhum obstáculo às suas pretensões políticas. Apesar das dificuldades de toda ordem, financeira e de apoio material, vencemos essa eleição de 1992, ainda na sombra do trabalho político realizado pelo saudoso José de Melo e principalmente com a força do povo que queria mudança a qualquer preço. Dessa maneira, conseguimos interromper a trajetória política do líder José Lessa, o qual já se encontrava no comando da situação por quase 20 anos. Nessa eleição de 1992, também saíram como candidatos os senhores Júnior Luna e Pedro Josafá (Doca), a prefeito e viceprefeito, respectivamente. Eleitos D. Telma – Zitinho e eu vereador, logo fui indicado pelo seu filho Talmo Melo, como presidente da Câmara Municipal de Vereadores. Assim, iniciei um total de 20 anos consecutivos como vereador de nossa cidade – 1993-2012.
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12- Colônia Leopoldina tem o seu próprio “IMPEACHMENT” Presidi a Câmara por dois anos sem grandes cobranças da oposição liderada pelo vereador Severiano Freitas. Apenas ele sempre reclamava da falta do envio das “Notas de Empenho”, das despesas realizadas pela prefeita Telma Melo, que deveriam ser encaminhadas mensalmente para os vereadores. Dr. Flávio Lima, que havia sido eleito vereador pelo partido de D. Telma (PL) e com boa atuação na base de apoio do seu governo, após uns dois anos de mandato, por divergências políticas com o secretariado municipal, resolveu romper os laços políticos com a prefeita. Ele foi uma das peças decisivas na eleição da prefeita. A população começava a se inquietar com alguns erros cometidos pelo governo. Por iniciativa da oposição iniciou-se um movimento articulado que dizia: “Fora Telma”. Logo, surgiram os cara-pintadas pedindo o afastamento da prefeita que naquele momento começava a enfrentar problemas administrativos por falta de recursos financeiros, em razão, creio eu, do Plano Real que foi lançado, em 1994, quando houve a mudança da moeda brasileira de URV para REAL, uma vez que, naquele momento, as dívidas quase que dobraram de valor. Quem devia R$100,00 passou a dever R$200,00. Daí começou o calvário da prefeita Telma. Sem recursos não podia pagar seus compromissos, inclusive, os vencimentos dos servidores municipais. Foi o bastante. As cobranças aumentaram, e a população começou a exigir dos vereadores uma providência mais enérgica, chegando, inclusive um grande número de servidores, estudantes e o povo em geral a comparecerem às dependências da Câmara, protestando contra o atraso do pagamento salarial. Diante deste quadro o povo foi às ruas em passeata portando cartazes de cobrança aos legisladores.
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Em frente à Igreja Matriz, o padre Aldo Giazzon usou da palavra e solicitou responsabilidade e muita prudência aos representantes do povo. Alguns vereadores também usaram da palavra. A situação tornava-se cada vez mais crítica e a oposição mostrava-se disposta a levar adiante o seu propósito de afastar a prefeita através de um pedido de “impeachment” impetrado por um ilustre filho da terra, atendendo aos anseios da população. O pedido foi aceito pelo presidente, e eu, como primeiro secretário, autorizado, fiz a leitura da denúncia. D. Telma não se preocupou em se defender das acusações que lhe eram imputadas. Não aceitava receber as intimações da Câmara para proceder a sua defesa, e, o processo começou a correr quase que “a revelia”. A solicitação do afastamento prosseguiu com o patrocínio do advogado José de Moura Rocha, um expoente político do antigo MDB. Marcada a sessão de cassação e iniciada a leitura do processo, sem nenhuma comunicação à Câmara, ali chegou um advogado e pediu para fazer a ampla defesa da prefeita e apresentar o seu “princípio do contraditório”. Com isso, o mesmo pretendia encerrar a sessão extraordinária de cassação. O presidente recusou suas alegações por entendê-las fora do prazo. Assim, após a votação, a prefeita foi afastada por unanimidade dos vereadores Ernane, Valdecir, Dr. Flávio, Géo Emídio, Dr. Márcio, Lúcio Flávio, Maviael e Zequinha. Seu vice Zitinho, mesmo sem muita vontade, foi empossado prefeito. Nessa mesma votação, o vereador Severiano considerou-se suspeito para votar. Em seu lugar assumiu o primeiro suplente José Gomes de Lima (Zequinha), que votou favorável pela cassação. Passados onze dias, a prefeita deu entrada na Câmara a uma liminar concedida pelo presidente do Tribunal de Justiça
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de Alagoas, Dr. José Agnaldo. Com tal documento retorna ao comando do governo. Após oito meses, reunindo documentos comprobatórios de improbidade administrativa, a oposição através do presidente do PMDB local, entra com novo pedido de afastamento da prefeita. Dessa vez, ela apresenta sua defesa. Tudo em vão. Vai a novo julgamento e é novamente afastada do cargo. Nessa segunda votação, três vereadores não comparecem à sessão extraordinária (Géo Emídio, Dr. Márcio e Maviael ), ficando o voto de minerva com o presidente José Pereira (Fernando), que ao votar favorável à cassação, completou o “ quórum” necessário ( dois terços: seis votos). Assim, a Câmara empossa novamente o vice Zitinho Caldas. Ela (D. Telma), após ficar quarenta e um dias afastada do seu cargo, é reconduzida ao governo municipal através de uma nova liminar concedida pelo Tribunal de Justiça de Alagoas, e fica até o último dia de seu mandato (31-12-1996). Esse ”impeachment” deixou algumas sequelas e foi uma experiência bastante tensa e desagradável para todos nós que participamos desse processo, principalmente, por vivermos e defendermos o pleno Estado de Direito. Foi realmente uma grande lição para todos.
13 - Retorno da Usina Taquara – o usineiro José Maria Quirino e ascensão de Manuilson Andrade Antes do término do mandato de D. Telma, Severiano lança-se candidato a prefeito, aproveitando aquele tumultuado final de governo. Embarcamos com ele na campanha e, após longas tratativas, o vereador Dr. Flávio foi indicado vice do Severiano. Nesse período, D. Telma volta a fazer as pazes com José Lessa e os dois apoiam o Dr. Marcos como candidato governista. A luta foi
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COLÔNIA LEOPOLDINA (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015). (relatos e visões críticas)
grande e cheia de lances preocupantes. Nessa campanha contamos com o empenho do Zitinho Caldas e do Júnior Luna, cunhado do Severiano. Apurados os votos, conseguimos vencer mais uma vez o Sr. José Lessa, o qual se afastou dos próximos pleitos eleitorais e decidiu vender sua Usina ao José Maria Quirino. Ali se observou que um novo poder econômico-político poderia se levantar patrocinado por aquela mesma indústria açucareira. Era só uma questão de tempo e determinação. E assim ocorreu. Empossado prefeito, Severiano nomeia seu vice, Dr. Flávio, secretário de saúde municipal. A convivência do nosso grupo político com o prefeito durou mais ou menos uns três anos, até quando ele tomou a decisão de romper relações com o grupo, possivelmente já pensando na sua reeleição. A pressão do Executivo logo se fez sentir como muita determinação. Sugeriram que os secretários Fernando (Obras) e Luiz Costa (Urbanismo) solicitassem desfiliação de nosso partido. Pedido feito, pedido aceito. Depois, solicitaram que a vereadora Graça Leite do nosso partido PST, também providenciasse sua desfiliação partidária. Aceitei o pedido da vereadora, que no mesmo dia ingressou no PMDB. Visivelmente tentando torpedear a nossa reeleição, lançaram candidatos ao cargo de vereador os senhores: Luiz Costa, a enfermeira Carmelita, a Doutora Solange do PSF, e a sempre bem votada Graça Leite. Foi uma luta quase que perdida. No final, fomos eleitos eu e o Costa “meu antigo apoiador”. Obtivemos a mesma votação – 287 votos. Dos nove vereadores do quadriênio 1997-2000 apenas dois, eu e Graça, fomos reconduzidos à Câmara de Vereadores. Imaginem a luta. Este fato em muito contribuiu para conduzir o nosso partido (PST) a apoiar uma pessoa até então desconhecida do eleitorado leopoldinense – Manuilson Andrade, que era gerente e sobrinho do novo dono da Usina Taquara. Manuilson foi candidato com o
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apoio decisivo do seu tio José Maria, do nosso partido e de outras forças políticas descontentes. Severiano sempre foi um político bem avaliado como um excelente executivo. Quando candidato a reeleição estava com o Ibope em torno de uns 73% de aceitação. Até hoje, os cientistas políticos locais procuram uma explicação para a sua derrota. Manuilson estava eleito. Iniciou seu primeiro governo adotando uma série de providências administrativas. Conseguiu junto ao Ministério da Integração Nacional a liberação da verba de um projeto do deputado João Caldas, e inaugurou pela 2ª vez a tão sonhada pavimentação da estrada que liga a BR- 101 até Colônia Leopoldina. Em decorrência da sua boa administração pública credencia-se como candidato para a reeleição de 2004. Desta feita ele enfrenta a força e a coragem de Luciana Luna. Reelegese prefeito com uma significativa diferença de votos frente a sua oposicionista. Quando de sua sucessão em 2008, ele apresenta contra o seu tio José Maria Quirino a candidatura de sua esposa Eulália (D. Lala), primeira dama do município e secretária de Assistência Social, bem aceita por quase toda a população, principalmente o eleitorado feminino. De repente, quase no final da campanha, entende-se que ela poderia ser considerada inelegível. Após reunião da coligação PDT-PT-DEM e PV ela é substituída, ficando em seu lugar por indicação do próprio Manuilson, o jovem secretário de Finanças Cássio Reis. A campanha prossegue com um novo candidato a prefeito, mas na realidade, o nome e a foto que já se encontravam nas urnas, permaneciam o de D. Lala. Não havia mais prazo eleitoral para troca de fotos. Agora, com o apoio de Manuilson, o Cássio enfrenta a candidatura do Sr. José Maria Quirino e, consegue uma vitória apertadíssima de apenas 28 votos.
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Nesse dia, eu comentei com o grupo político: “hoje acendeu-se politicamente uma luz amarela para o nosso grupo”.
14 - O governo do Cássio O Governo do Cássio foi marcado por poucas ações governamentais. Tratou de manter em funcionamento o que já estava em andamento. Todavia, com apoio de alguns projetos federais iniciou algumas obras, tais como, a construção de uma creche com capacidade para mais de 200 crianças (no conj. José Maria Quirino), o Centro de Recreação de Idosos, ambos não concluídos, e recuperou alguma casas através do projeto “ Casa de Taipa, nunca mais”. Chegou a comprar o terreno onde seria construído o novo Matadouro Público Municipal (nas terras do Sítio São Pedro). Não conseguindo licença ambiental do IMA (Instituto do Meio Ambiente) nada pôde realizar, e os recursos advindos do governo Manuilson permaneceram aplicados na Caixa Econômica Federal. Quando, através de Projeto de Lei, realizou a reforma administrativa do município, criou a Secretaria de Cultura. Seu governo, também foi marcado com algumas ações no judicial (improbidade administrativa), sendo por isso o mesmo afastado do cargo por ordem judicial, antes mesmo que a Câmara terminasse de apresentar a apuração dos fatos, através de uma Comissão Processante por nós instalada. Em seu lugar, empossamos o vice Meilton Luna. Passados onze dias, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas concede-lhe uma liminar retornando-o ao cargo de prefeito. É reempossado e permanece até o final de seu mandato, 31 de dezembro de 2012.
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Antes de concluir o seu mandato, ele indicou e apoiou como seu sucessor o ex- prefeito Manuilson Andrade, e ambos indicaram meu nome candidato a vice, numa possível coligação PSDB-PDT. Creio eu, que a indicação do meu nome não foi uma unanimidade entre um ou dois partidos da coligação, inclusive o meu PDT, que estava sendo presidido pela colega vereadora Diva do Banco, a qual lança-se também ao cargo de vice de Manuilson. Estava criado um novo impasse do nosso grupo político. Então certa tarde, eu de posse de declarações de apoio a minha candidatura assinada por nove presidentes de partidos de nossa coligação, fomos eu e a presidenta Diva, discutir em Maceió, no Diretório Estadual do PDT, com o ex-governador Ronaldo Lessa e demais membros do Diretório, sobre a possibilidade de um dos dois sair candidato junto ao PSDB. Após minhas justificativas para a tal aliança PSDB-PDT, o presidente Ronaldo fez uma votação entre os membros do Diretório e anunciou o “veredictum”: O PDT de Colônia Leopoldina está autorizado a se coligar apenas na proporcional, na majoritária não consentimos, porque não pretendemos ajudar um candidato do PSDB . Fiquei pasmo com esta decisão inédita. Podíamos votar num candidato do PSDB pra prefeito mas não podíamos compor como vice em sua chapa. Entendi, e não entendi o que se passou naquela reunião. Houve muitas especulações por parte do eleitorado. Nenhuma explicação parecia convincente. Certo mesmo, é que, ainda sob o impacto da inédita decisão, resolvi não mais concorrer às eleições de vereador. Afastei-me do processo eleitoral. Fui apenas um simples eleitor.
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15 – Mudança tem nome – Paula Rocha Nas eleições de 2012, o usineiro José Maria Quirino (PSB) é o escolhido para enfrentar nas urnas o seu sobrinho Manuilson (PSDB). Ele já vinha de há muito organizando o seu grupo político, e se encontrava em franca pré-campanha eleitoral. Severiano Freitas, ex-prefeito, era então um de seus apoiadores políticos. No dia da convenção ocorreu o inesperado, José Maria convida o seu grupo para uma reunião em Maceió e anuncia sua decisão: “por motivos de ordem particular, estava desistindo de concorrer ao pleito eleitoral como candidato a prefeito”. Surpresa geral! Em princípio, o grupo fica “meio desorientado”, mas, logo se recompõe do susto, e passa a analisar as possíveis candidaturas de Luciana Luna e Paula Rocha. Nessa mesma reunião escolhem logo o vice, Fui Lamenha (Francisco). Ao fim da reunião, com o decisivo apoio de Fabiano França, sua esposa, a vereadora Paula Rocha é a escolhida como cabeça de chapa. Severiano Freitas, com a desistência de José Maria, permanece ao lado do grupo político e apoia Paula Rocha para prefeita. Nessa campanha permaneci ao lado de Manuilson. Estive presente em quase todos os comícios e passeatas. Mais uma vez, outra surpresa: José Maria Quirino resolve apoiar o seu sobrinho como candidato a prefeito. Terminada a votação fiquei na residência do Manuilson aguardando
o
resultado
da
apuração
dos
votos.
Então,
surpreendentemente chega para nós o resultado final: Paula Rocha é eleita prefeita com expressiva margem de segurança, mais ou menos uns 125 votos de diferença. Agora, a prefeita é Paula.
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16 - A contribuição desses políticos para a cidade Nem sempre a gente se lembra de tudo. Às vezes, a memória falha, então, nesse instante, podemos estar cometendo algum erro ao informar o que de relevante ocorreu, e a contribuição de cada um desses grupos que governaram o nosso município por vários anos. Mesmo assim, tentarei registrar algumas realizações feitas por estes senhores e que ainda teimam em permanecer em minha memória de evocação. Senão vejamos: A) DU RVAL G ONÇALV ES PEREI R A – Vice_ (19481951) - Abriu várias estradas vicinais; - Instalou o serviço de telefonia conectando Colônia Leopoldina à Usina Santa Terezinha-PE; - Inaugurou o 1º Posto de Saúde Estadual do município; - Em seu governo ocorreu a segunda restauração da Comarca de Colônia Leopoldina; - Adquiriu com recursos próprios o primeiro ônibus que fazia a linha Colônia Leopoldina a Palmares-PE; - Construiu a barragem geradora de energia elétrica na Fazenda São Pedro para iluminar a cidade após o desligamento do motor à diesel que gerava energia das 5:30 até as 20:00hs. B) ALF RED O DE PAU L A C AVALC A N T I – Vice (19511955) - Elaborou e iniciou o projeto de abastecimento d’água da cidade através da CAENE (Companhia de água e esgoto do nordeste) e o projeto de eletrificação do município; - Ampliou e melhorou o cemitério público municipal da cidade;
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COLÔNIA LEOPOLDINA (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015). (relatos e visões críticas)
C) M A NOEL BA R BO SA DE F R A NÇA – Vice (19561960) - Iniciou o projeto da estação de tratamento de água da cidade (...); - Adquiriu um veículo (caminhão) para o transporte do lixo domiciliar urbano. D) ALFRED O DE PAU L A C AVALC A N T I - Vice Severino Ferreira de Lima (1961-1965) - Seu Alfredo candidatou-se a Deputado Estadual. Ficou como suplente e assumiu o cargo por um período de aproximadamente 09 meses. Nesse espaço de tempo, exerceu o cargo de prefeito o seu vice Severino Ferreira de Lima. - Reestruturou a banda de música “Filarmônica Sabino de Souza”. E) A N TÔN IO LI NS DA RO C H A – Vice José Máximo de Souza (1966-1970) - Construiu uma quadra de voleibol ao lado da Igreja Matriz; - Inaugurou o serviço de abastecimento d’água da cidade. Um projeto que foi elaborado pelo ex-prefeito Alfredo Cavalcanti; - Inaugurou a energia elétrica da cidade, proveniente da CHESF-CEAL; - Construiu o prédio Castelo Branco, onde funcionou o fórum, os correios, o cartório eleitoral e a junta do Alistamento Militar; - Iniciou e não concluiu a Escola que leva seu nome: “Antônio Lins da Rocha”;
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F) JO SÉ LU I Z LES SA – Vice José Maria de Omena (19701972) - Incentivou a educação municipal. Era considerado o “Leão da Educação”; - Construiu a Escola Municipal Zora de Menezes; - Pavimentou a rua 7 de setembro e outras ruas da cidade; - Construiu o Mercado Público Presidente Médici; - Contratou médicos para o posto de Saúde Estadual do município -1972; - Reconstruiu a ponte sobre o rio Jacuípe que liga Colônia Leopoldina a Maraial-PE; - Em seu governo, ocorreu a criação do Colégio Cenecista Padre Francisco. G) A N TÔN IO LI NS DA RO C H A - Vice José Gomes de Lima (1973-1977) H) JO SÉ G OM ES DE LI M A – Vice Manoel dos Santos Silva (Biel) (1977-1982) - Pavimentou (a paralelepípedos) várias ruas da cidade; - Calçou a praça D. Pedro II; - Inaugurou os bustos de D. Pedro II, Princesa Colônia Leopoldina, Padre Francisco e o do Padre Cícero Romão Batista; - Inaugurou também a Unidade Mista de Saúde – “Hospital Maria Loureiro Cavalcanti”; - Inaugurou a pista asfáltica ligando a BR-101 a Colônia Leopoldina (Governo Guilherme Palmeira); - Reconstruiu o antigo matadouro público municipal;
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COLÔNIA LEOPOLDINA (AL): 65 anos de política partidária dominante (1950 a 2015). (relatos e visões críticas)
- Construiu o grupo escolar Ezequiel de Siqueira Campos; - Construiu o posto médico do distrito de Monte Alegre; - Construiu 08 salas de aula no grupo escolar Joaquim Luiz Lessa; I) JO SÉ LU I Z LES SA – Vice Nivaldo Alves da Silva (Vavá da Destilaria) - (1983-1988) J) JO SÉ SA N TA NA DE M ELO – Vice Lourinaldo de Lima (Bilau) – (1989-1992) Obs. Com a morte do prefeito, assume o vice Bilau por um período de quase 02 anos. - Quando secretário geral do município construiu ou reformou aproximadamente 200 casas; - Em seu governo foi criado o Fundo de Previdência Própria do Município. K) T ELM A G OM ES DE M ELO - Vice José Alves Caldas (Baleia) (1993-1996) - Realizou a reforma do prédio da prefeitura municipal – Centro Administrativo “José Luiz Lessa”; - Inaugurou o serviço médico odontológico e o posto de saúde “José Santana de Melo”, nas dependências do prédio Castelo Branco; - Reestruturou o plano de cargos e carreira do magistério; - Recuperou algumas estradas vicinais e o pavimento de algumas ruas da cidade; - Construiu uma pequena praça à entrada da rua Severino Ferreira de Lima;
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L) SEV ER I A NO JO SÉ FREI TA S DE S OUZ A – Vice Dr. Flávio Souza de Lima (1997-2000) - Assumiu a municipalização do Hospital Maria Loureiro Cavalcanti; - Adquiriu um ônibus médico-odontológico para atendimento na área rural; - Construiu com recursos próprios o Posto de Saúde José Luiz Lessa; - Recuperou e pintou as portas do Mercado Público Presidente Médici; - Recuperou algumas escolas da área rural; - Reestruturou o plano de cargos e carreiras da secretaria de educação; - Através de projeto de lei desmembrou a secretaria de saúde e assistência social em secretaria de saúde e secretaria de assistência social; - Realizou concurso público para todas as secretarias do município; - Reestruturou a Previdência Própria do Município FUNPRESERV; - Implantou o PSF – Programa de Saúde da Família, de Agentes Comunitários de Saúde e de Endemias Rurais; - Reformou o antigo Matadouro Público Municipal; - Recuperou algumas ruas da cidade (calçamento); - Contratou médicos especialistas para o Hospital Maria Loureiro Cavalcanti;
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M) M A N U I LS ON A N DR ADE SA N TO S - Vice José Alves Caldas (Baleia) (2001-2004 e 2005-2008) - Inaugurou a estrada asfaltada que liga a BR-101 à cidade; - Conseguiu a construção do Ginásio Poliesportivo local; - Recuperou a Quadra de Esportes “Mané Garrincha”; - Construiu a Praça do Centenário – que fica à entrada da cidade; - Reformou o Fundo de Previdência Própria do Município (ColôniaPrev); - Através do Projeto Luz no Campo levou energia elétrica para várias propriedades rurais; - Adquiriu ambulâncias, retroescavadeira, ônibus e caminhão para transporte do lixo; - Construiu o Conjunto Residencial “José Maria Quirino” – Projeto com a Caixa Econômica Federal; - Reestruturou o Plano de Cargos e Carreiras de Salários do magistério e do pessoal de apoio; - Realizou obras de calçamento de várias ruas centrais da cidade, e saneamento básico; - Construiu com recursos próprios a escola rural de Riacho da Lenha, com iluminação Fotovoltaica; - Recuperou o prédio Castelo Branco; - Inaugurou a Biblioteca Pública Municipal; - Indenizou prédios localizados na Praça Dom Pedro II (parte traseira e lateral), e reconstruiu a praça dotando-a de uma fonte luminosa; - Implantou o programa federal Bolsa Escola atendendo inicialmente mais de 1000 famílias;
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- Implantou o pagamento de insalubridade e periculosidade para os funcionários públicos do município; - Criou o transporte gratuito para todos os feirantes da área rural; - Executou a retirada do lixão existente na entrada da cidade; - Realizou concurso público para atender as necessidades do município; - Inaugurou o CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), no Loteamento José Maria de Omena. N) C ÁS SIO REI S DE A MOR I M U RT IGA - Vice Meilton Luna da Silva (2009-2012) - Iniciou a construção de uma creche-escola no Conjunto “José Maria Quirino” (projeto não concluído); - Projetou e começou a construção do Posto de Saúde do Belo Jardim (não concluído); - Inaugurou o PSF do Belo Jardim; - Deu início a construção do campo de futebol da cidade e do Centro de Recreação do Idoso (não concluídos); - Adquiriu o terreno para a construção do Matadouro Público Municipal. Não conseguindo a licença do IMA (Instituto do Meio Ambiente) o recurso financeiro ficou aplicado na Caixa Econômica Federal. Emenda do Deputado João Caldas; - Reformou algumas casas através do projeto federal “Casa de taipa, nunca mais”; - Durante a reforma administrativa municipal criou a secretaria de cultura; - Recuperou e calçou algumas ruas da cidade;
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- Inaugurou junto com a CASAL a nova estação de tratamento de água da cidade – ETA; - Manteve em funcionamento os programas sociais existentes no município; - inaugurou o CAPS (Centro de Atendimento Psicossocial) e o NASF (Núcleo de Assistência à Saúde da Família); - Adquiriu 03 (três) ônibus escolares através de convênio federal; - Comprou com recursos próprios 250 bicicletas para os alunos da zona rural; - Entregou fardamentos e material escolar a todos os alunos da rede municipal de educação; - Inaugurou o TELE-CENTRO no subsolo do edifício Castelo Branco; O) PAU L A RO SELM A RO C H A D O NA SC I M EN TO Vice Francisco Lamenha (Fui) (2013-2016) - Concluiu e colocou em funcionamento o Centro Recreativo dos Idosos; - Terminou a construção do Posto Médico de Belo Jardim (não inaugurado); - Reinaugurou o campo de futebol; - Reinaugurou o Mercado da Farinha.
17- Caminhos futuros da política local No momento, não vejo a formação de um novo grupo plantando uma semente política, nem para hoje nem para o futuro. Eu, pelo menos, não tenho conhecimento de que esteja se
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formando um novo grupo com esse objetivo. É possível que isto tenha ocorrido em outros tempos. O grupo político da prefeita deverá mantê-la como candidata a reeleição. Até o presente momento comentam que o grupo do Manuilson vem arregimentando forças para enfrentar a prefeita Paula Rocha numa nova eleição. Caso Manuilson seja o vencedor será o primeiro político da cidade a ocupar por três vezes o governo municipal.
18- Sendo o entrevistado, Prefeito da cidade - a marca do seu governo Eu elegeria como prioridade a área da educação. É na área da educação onde vejo a saída para se conscientizar todos os brasileiros. O político pode até ter um projeto de governo, mas não um projeto de poder, como estamos vendo agora. Ter um projeto é extremamente importante, mesmo que a gente só consiga cumprir vinte por cento do desejado. Infelizmente, não estamos vendo essa disposição nos políticos que ora conduzem a nação brasileira. É preciso que o povo, uma vez informado e educado, possa dizer: BASTA! REFERÊNC I A S SILVA, Everaldo Araújo. A Colônia da Princesa. 1ª Edição. Igasa. Maceió. 1983; SANTOS, Ernane Santana & LUNA, José de Araújo. Memorial Biográfico dos Ex-Presidentes da Câmara Municipal de Colônia Leopoldina a partir de 1948; Colônia Leopoldina. Ano 2000.
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SANTOS, Ernane Santana. As Ruas de nossa cidade. Q Gráfica. 2007. Maceió-AL; INSTITUTO ARNON DE MELLO. Municípios de Alagoas. Organização Arnon de Mello (ORG). Maceió-AL. 2006; TENÓRIO, Douglas Aprato. A Tragédia do populismo (O impeachement de Muniz Falcão). EDUFAL. 2ª Edição. Maceió-AL. 2007; ARQUIVO PÚBLICO DA CÂMARA MUNICIPAL DE COLÔNIA LEOPOLDINA-AL. Livros de Termos de Posse. Alguns livros mais antigos não foram encontrados no arquivo da Câmara. Entrevistados: José Araújo de Luna (já falecido), Severiano Freitas de Souza, Maria Lúriva Fagundes de Lima, Floro Araújo e Antônio Santana. Agradecimentos: Eutália Guerra, Natalie e Natassia Guerra, Fábio Rangel, Fátima Santana e Rosineide Xavier. Muito obrigado, Ernande Santana Santos. Colônia Leopoldina, setembro de 2015.
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4. PROBLEMÁTICAS DO CAMPO POLÍTICO: visões críticas A) DI SC US SÃO S OBRE A POLÍT ICA PA RT I DÁR I A DOM I NA N T E 1 NO RECORT E T EM POR AL EN T RE 1950 e 2015
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Noções Preliminares Desde a política de Estado das capitanias hereditárias, implementada para a produção de uma economia assentada na cana-de-açúcar e vinculada ao comércio ultramarino, o território brasileiro é governado por oligarquias. Os chefes políticos oligárquicos dos canaviais, até a burocratização do Estado Nacional, com a instauração do sistema republicano, foram as figuras centrais da política brasileira. É essa elite da cana que constitui a origem dos coronéis, personagens fundamentais para o entendimento da política na região nordeste do país. Ainda que os avanços democráticos e sociais tenham alterado o panorama da política brasileira nas últimas décadas, os municípios nordestinos se caracterizam pela reprodução, em um pano de fundo próprio, de práticas sociais que ainda se aproximam do coronelismo. É sobre essa plataforma teórica que se discute, nesse texto, a forma da política partidária no município de Colônia Leopoldina, 1 Se refere a análise da política partidária dominante na cidade de Colônia Leopoldina, em Alagoas.
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política fundamentalmente oligárquica, no sentido de permanência da classe canavieira e rica na administração do poder público. Ao mesmo tempo, se discute a constituição, os avanços e os retrocessos do movimento de esquerda no município. Trata-se de análise lacônica, construída a partir de certa percepção subjetiva. Em sua origem, com a fundação do Partido dos Trabalhadores, o movimento de esquerda era ferrenho combatente das políticas oligárquicas locais. No entanto, na atualidade, apresenta-se rachado, na medida em que, enquanto poucos heróis isolados se mantem fiéis à concepção ideológica marxista, outros se conformam com a permanência histórica da política oligárquica no município, desfrutando-se do que este pode lhes oferecer.
As Especialidades do Campo2 Histórico Entre os poucos consensos existentes entre os profissionais da História há um que se destaca; é o fato de que, desde o final da década de 1920, a História vem especializando-se. Uma visão panorâmica revela que as transformações históricas do “breve século XX3” imputaram à ciência história a necessidade de alterar, de rediscutir e de aprimorar toda a sua estrutura de produção de
2 A partir da teoria geral dos campos (BOURDIEU, 2003, p.20), a historiografia contemporânea define o campo histórico como “um espaço relativamente autônomo, sendo estruturado em um conjunto de leis próprias, vinculando-se a dimensão do mundo social e político”. 3 Refere-se ao subtítulo do livro A Era dos Extremos: O Breve Século XX: 1914-1991, do inglês Eric Hobsbawm, publicado em 1994. O autor faz uma análise dos principais acontecimentos do século XX, marcado por constantes alterações nas formas da organização política e econômica, tanto em países desenvolvidos quanto nas civilizações em processo de desenvolvimento. Na perspectiva de Hobsbawm, a ciência história não passou ilesa do processo de profundas modificações, o que implicou, concomitantemente, em alterações em toda a estrutura e forma de produção do saber histórico.
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conhecimento, sendo que esse processo de renovação da Histórica se consolidou com o movimento dos Analles4. Com efeito, é com os paradigmas historiográficos dos Analles que se consolida um corte epistemológico e metodológico no campo histórico contemporâneo. Se desde os tempos de Heródoto e Tucídides, a história ocidental tinha sido escrita, apesar de variadas formas de gêneros, como as crônicas monásticas, as memórias, as sunnas deontológicas5 e os tratados de antiquários, sob a regra da narrativa de acontecimentos políticos e militares, com os historiadores dos Analles a disciplina histórica amplia o seu campo de atuação. O conhecimento da história antes do pensamento filosófico-histórico do Iluminismo era formulado com base na vida de reis e de grandes guerreiros-soldado, símbolos iconográficos que representavam o próprio decurso da história. Contudo, a narração da vida desses personagens não era particularista ou problematizada, mas simplesmente em concordância com seus domínios de ação, ou seja, no campo político e militar, não havendo outros âmbitos existentes descritos sobre os mesmos6. 4 Os Analles foi um movimento historiográfico francês do final da década de 1920 e que procurou inovar a produção do conhecimento histórico com a adoção de teorias, técnicas e metodologias de outras ciências humanas, como a geografia e a sociologia, na análise histórica. Desse modo, os Analles deu início a um processo de renovação metodológica em que a interdisciplinaridade com as outras ciências sociais se constituía em um fator essencial. É preciso mencionar o fato de que os Analles, a consolidar o processo de renovação da ciência histórica, e enquanto movimento historiográfico deu continuidade ao processo de solapamento crítico ao modelo hegemônico da história política que, desde o final do século XIX, se consubstanciava em diversas correntes historiográficas. 5 Sunnas é a designação que se dá ao conjunto de livros medievais que tinham a finalidade de descrever os comportamentos sociais da época e orientar quais as condutas eram necessárias para a coesão social. Nessa última acepção, se caracteriza como compêndio deontológico. 6 BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 1992, p. 24.
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Cabe destacar que as críticas filosóficas de cunho iluministas foram de fundamental gravidade para a ampliação do saber histórico. É nesse contexto que os pensamentos de filósofos da estirpe de Voltaire, Rousseau e de Diderot incrementaram e excitaram a ciência histórica, contribuindo à consolidação do movimento historiográfico que mais tarde se denominou de Nova História7. Por outro lado, outra contribuição importante para a evolução do campo histórico será dada com o marxismo. Sob a égide do marxismo a história política deixa de ser predominante, pois o marxismo vai oferecer um paradigma à leitura histórica que é alternativa ao positivismo de Ranke8. Na realidade, segundo a visão histórica marxiana, as causas fundamentais à interpretação da histórica devem ser apreendidas nas tensões existentes no interior das estruturas socioeconômicas9. As críticas à hegemonia da história política se faziam no sentido de que, enquanto a história política priorizava a história de indivíduos apoderados, detentores de reconhecimento em sociedades geralmente estamentais, ela deixava de compreender que o processo histórico englobava outras dimensionalidades, como a economia, a cultura e a manifestação daquilo que décadas depois viria a se chamar de mentalidades, embora esses elementos 7 BURKE, Peter. A escola dos Analles: 1929-1989. São Paulo: Unesp, 2003, p. 11. 8 O marxismo se constitui, no final do século XIX, em importante fonte epistemológica para a produção do conhecimento histórico, na medida em que desloca o centro de gravidade do saber histórico das questões exclusivamente políticas para as questões da infraestrutura, rompendo, assim, com as concepções históricas que se fundamentavam no positivismo historicista. 9 Conforme Burke (2003, p. 24-25) os historiadores econômicos foram os opositores mais bem organizados da história política. Ele relata que, em 1893, Gustav Schomoller foi o responsável por uma importante escola histórica, quando organizou uma revista de história social e econômica na Alemanha. Enquanto isso, na França, Henri Hanser e Paul Mantoux começaram a escrever sobre história econômica no final do século XIX, contribuindo para a derrocada da hegemonia da história política.
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estivessem presentes no discurso da história política de forma secundária e dependente. Influído pela configuração ensejada pela Nova História, o economista François Simiand atacou o que chamou de os ídolos da tribo dos historiadores. Segundo ele, havia três ídolos que deveriam ser derrubados na produção da ciência histórica: o ídolo político, ou seja, a eterna preocupação com a história política, com os fatos políticos e com as guerras que conferiam a esses eventos uma exagerada importância; o ídolo individual ou a ênfase excessiva nos chamados grandes homens, de forma que representassem o centro da história; e por último, o ídolo cronológico ou o hábito de perder-se nos estudos das origens10. Assim, a Nova História vai se estruturar a partir de um conjunto de premissas críticas e que foram relevantes para o atual saber histórico. Em outros termos, o conhecimento histórico não mais podia se fechar, exclusivamente, no aporte político, mas, pelo contrário, devia se abrir a outras áreas da pesquisa social, assim como manter uma relação dialética com as demais ciências sociais. Originalmente
denominada
de
Annales
d’
histoire
éconimique et sociale , a revista que anos depois se constituiria 11
na Revista dos Analles foi planejada, desde o seu início, para ser algo mais do que uma outra revista histórica, pretendendo exercer uma liderança intelectual nos campos da história social e econômica. Ela pretendia ser a porta voz de uma abordagem nova e interdisciplinar da história. Quando Lucien Febvre e Marc Bloch lançaram em Estrasburgo, em 1929, uma revista que 10 BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 1992. p. 33. 11 A tradução livre é Anais da História Social e Econômica. A finalidade precípua desses anais era permitir que se fizessem uma releitura da história, através de novas abordagens conceituais e metodológicas. As mudanças historiográficas desse período se constituíram na Nova História.
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retoma um velho projeto de Lucien Febvre de uma revista intercional de história econômica que abortara antes, suas motivações eram de várias ordens. Antes de tudo, tirar a história do marasmo da rotina, em primeiro lugar, de seu confinamento em barreiras estritamente disciplinares, sendo o que, em 1932, o próprio Lucien Febvre chamava de derrubar as velhas paredes antiquadas, os amontoados babilônicos de preconceitos, rotinas, erros de concepção e de compreensão12.
A revista dos Analles passou a ser denominada de Escola dos Analles, porque ensejou o aparecimento de uma tendência metodológica e epistemológica, e se organizou, principalmente, em duas direções, que podem ser expressas pelos dois epítetos da revista. Nesse contexto, havia a pretensão de se afirmar, em detrimento da hegemonia da história política, a perspectiva da história econômica e da acepção social13. Estas breves considerações sobre a evolução da ciência histórica são pertinentes por dois escopos básicos. O primeiro diz respeito ao fato de que na atualidade têm surgido com frequência cada vez mais livros e coletâneas de livros que discorrem sobre as inúmeras especialidades da História, tais como a História Política, a História Cultural, a História Econômica, a Micro História e inúmeras outras14. Se em outrora o conhecimento histórico se
12 BURKE, Peter. A escola dos Analles: 1929-1989. São Paulo: Unesp, 2003, p. 29. 13 Lucien Febvre e Marc Bloch, fundadores da Revista dos Analles, afirmavam que a história política era, por um lado, uma história-narrativa e, por outro, uma história de acontecimentos, uma história factual, teatro de aparências que, assim, geralmente mascarava o verdadeiro jogo histórico, que se desenrola nos bastidores e nas estruturas ocultas, sendo cogente ser detectado, analisado e explicado de forma interdisciplinar. 14 BARROS, José D’Assunção. Os campos da história: uma introdução às especialidades da história. Revista HISTEDBR, n. 16. Campinas: HISTEDBR, 2004, p. 18.
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centrava na política, na atualidade ele consegue abranger uma gama enorme de campos ou especialidades15. O segundo motivo é que, doravante as subdivisões da História, torna-se possível delimitar, a partir de critérios metodológicos, as especialidades que serão adotadas à construção analítica sobre os 65 anos da política partidária dominante na cidade de Colônia Leopoldina. Em outras palavras, como o alvitre do texto é discorrer sobre um conjunto subjetivo de peculiaridades dos 65 anos da política partidária no município de Colônia Leopoldina, é necessária que haja uma demarcação das especialidades do campo da História, especialmente no tocante a dimensão (enfoque), a abordagem (modo de fazer a História) e ao domínio (área de concentração de concentração em torno de certas temáticas e objetos possíveis) que serão trabalhados no texto. Destarte, como o objeto da análise é ponderar sobre as manifestações da política partidária dominante no intervalo entre 1950 a 2015, ao que se refere à dimensão ou aquilo que será destacado em primeiro plano, o texto pretende desenvolver uma História da Mentalidade Política. Ao que compete ao tipo de abordagem ou ao modo e método de fazer História, busca-se com o texto o fomento da História Oral, isso em relação às fontes históricas, e o desenvolvimento da História Local, no que se refere ao campo de observação. Por último, tocante ao domínio, ao campo temático que é privilegiado na análise do texto se busca provocar uma História do Poder. 15 A mais recente conquista no Campo Histórico é a regulamentação da Profissão de Historiador, que se deu com a aprovação do PL 4699/2012. Essa regulamentação estabelece que o exercício da profissão é privativo dos diplomados em cursos de graduação, mestrado ou doutorado em História, ampliando o campo de trabalho dos historiadores, dado que poderão atuar não mais unicamente como professores de História nos ensinos básico e superior, porém também no setor terciário, como são os casos de planejamento, organização, implantação e de direção de serviços de pesquisa histórica em empresas e instituições públicas e privadas, além dos serviços de avaliação e seleção de documentos para fins de preservação.
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A produção analítica desenvolvida neste texto busca apreender como uma determinada política partidária, no período de 1950 a 2015, se apresenta historicamente dominante. Em outros termos, buscaremos saber como determinado modo de organização política, nesse recorte temporal, é hegemônico na cidade de Colônia Leopoldina, conhecendo as bases históricas da sua sustentação. Para esta empreitada, o autor se utilizou como recurso a assimilação de problemáticas que, a seu ver, são fundamentais para o conhecimento da predominância de determinada cosmovisão político-partidária na historicidade do tempo delimitado na análise. Na percepção científica, problema é qualquer questão não solvida e que é objeto de discussão, em qualquer domínio do conhecimento (...); é uma questão que mostra uma situação necessitada de discussão, investigação, decisão ou solução16.
Em resumo, com a leitura e reflexão das entrevistas foi possível catalogar os memes17 fundamentais inerentes às fontes históricas. São conteúdos semióticos e ideológicos que revelam os traços necessários para se entender como determinada forma de fazer política é preservada no campo social da política partidária municipal. O modo que o autor encontrou para a construção da análise se deu com a consideração subjetiva de problemáticas, como já assinalado, contribuem, a seu ver, para a manutenção de uma determinada maneira de organizar e de fazer política ser manter por esse longo período de tempo. 16 GOODE, William. Métodos em pesquisa social. São Paulo: Nacional, 1972, p. 80. 17 Entende-se o termo memes conforme trabalhado por Darwkins (2007). Nessa perspectiva, os memes são as ideias essenciais, sob o ponto de vista do autor, necessárias ao entendimento da política partidária dominante no município de Colônia Leopoldina.
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O Problema da Dominação Oligárquica: manifestação histórica da política e da mentalidade partidária dominante O campo histórico é extenso no que se refere ao estudo das práticas políticas. Desde os tempos mais remotos18, há tentativas para se explicar como as sociedades humanas adotam determinados padrões, certos critérios e específicas formas de exercício do poder, sendo que não poderia ser diferente, posto o fato de que viver em sociedade é viver sob a necessidade da organização do poder. Entretanto, depois de Karl Marx, Gaetano Mosca, Vilfredo Pareto e Robert Michels os estudos sobre a mais visível manifestação política, que é o poder, ganharam mais em substancialidade teórica, mesmo que seja possível encontrar os germes de suas teorias na filosofia grega clássica. De qualquer modo, as produções teóricas desses cientistas sociais são referências, na atualidade, para a compreensão do por que, na sociedade humana, ser quase impossível19 não existir a distinção entre aqueles que mandam e aqueles que obedecem. Com Mosca, Pareto e Michels se desenvolve o estudo da Teoria das Elites. Sendo um instrumental teórico formulado nas galerias da burguesia, a teoria elitista, nas acepções de Mosca e Pareto, é composta por um conjunto de premissas que se esforçam para demonstrar que, historicamente, em todas as sociedades, existe, sempre e exclusivamente, uma minoria que, por várias
18 Em sentido amplo, pode-se aceitar que a busca por construções teóricas para a justificação da existência do poder é uma recorrência antropológica. 19 A teoria social e a abordagem histórica do materialismo histórico de Karl Marx afirmam que não é impossível ao humano viver em sociedade de forma que as distinções sociais não sejam desfeitas. O materialismo histórico, inclusive, considera que, no passado remoto, antes da propriedade privada se tornar uma instituição social, as sociedades humanas eram regidas pelo igualitarismo. A sociedade sem classes, na acepção do marxismo, será o resultado da superação do capitalismo e da implantação do comunismo.
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formas é detentora do poder, em detrimento da maioria que é privada dele. Posto que a Teoria das Elites desenvolveu-se especificamente com o estudo das elites políticas, se apresenta ela como a teoria segundo a qual, em cada sociedade, o poder político, no sentido de disposição para se tomar e se impor as decisões válidas para todos os grupos sociais, pertence sempre a um restrito círculo de pessoas que sempre estarão no poder, representando a classe social pertencente, que no caso é a oligárquica. Foi a partir do século XIX que as ciências sociais se constituíram em disciplinas autônomas e se institucionalizaram por meio de cadeiras universitárias. Isso se deu, em boa medida, como resultado do trabalho de afirmação de alguns indivíduos, que se impuseram como fundadores de disciplinas e autores de teorias que passaram a orientar reflexões, a determinar temas legítimos de pesquisa e a tornar-se objeto de discussão e disputa. Uma dessas teorias foi a que ficou conhecida como elitismo, que se afirmou como uma crítica às ideias democráticas e socialistas que se difundiam naquele mesmo momento (...) seu argumento central, apresentado como descoberta científica, era o de que em qualquer sociedade, em qualquer grupo, em qualquer época ou lugar, havia sempre uma minoria, uma elite que, por seus dons, e sua competência e seus recursos, se destacava e detinha o poder, dirigindo a maioria20.
Portanto, apesar daqueles autores investigarem situações concretas e específicas de sociedade diferentes, cabe ressaltar que, 20 GRYNSZPAN, Mario. Ciência, política e trajetórias sociais: uma sociologia histórica da teoria das elites. Rio de Janeiro: FGV, 1999, p. 11.
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para fins explicativos, a noção de elite é estar sendo considerada pelo prisma da abstração, assim como também a de oligarquia21. Nesse sentido é que a oligarquia e a elite são entendidas como termos que podem ser aplicados em circunstâncias históricas diferentes. Gaetano Mosca, em Elementos de Ciência Política, diz que há uma tendência e um fato constante presentes em todos os organismos políticos, cuja evidência pode ser por todos apreendida, que é a existência de duas classes, a dos governantes e a dos governados. A primeira, que é sempre a menos numerosa, cumpre todas as funções públicas, monopoliza o poder e goza as vantagens que a ela estão anexas. Por sua vez, a segunda, que é a mais numerosa, é dirigida e regulada pela primeira, de modo mais ou menos legal ou de modo mais ou menos arbitrário e violento22. Da mesma forma, a tese de Sistemas Socialistas, de Vilfredo Pareto é que em toda sociedade há uma classe superior que detém geralmente o poder político e o poder econômico, à qual se deu o nome de aristocracia ou elite, em detrimento das outras classes sociais que não possuem o controle do poder econômico e do poder político23. Por seu turno, Robert Michels, doravante inspirando-se ideias de Mosca e de Pareto, em A Sociologia do Partido Político na Democracia Moderna, constata o fenômeno da concentração do poder num grupo restrito de pessoas. A este grupo detentor do poder deu o nome de oligarquia, usando um termo que, diferentemente 21 Embora, em sentido restrito e meramente conceitual, a oligarquia e a elite possam apresentar-se de múltiplas formas históricas, a depender das condições materiais, políticas, sociais e ideológicas de determinado tempo, em sentido amplo, oligarquia e elite são abstrações, na medida em que as próprias circunstancialidades que permitem as suas manifestações não são estanques. 22 BOBBIO, Norberto et al. Dicionário de política. Trad. Carmem Varriale et al. ed. 11. Brasília: UnB, 1998, p. 386. 23 Ibidem, p. 386.
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de aristocracia, usado por Pareto, tem uma conotação negativa de valor, e revela que para o autor, proveniente das filas do movimento socialista, o fenômeno tinha um caráter degenerativo, ainda que inevitável24. Embora as circunstâncias históricas sejam assimétricas, o que implica, necessariamente, no reconhecimento de fatores sociais específicos, pode-se aceitar, como dado memético presente em todos os relatos fornecidos pelas pessoas entrevistadas para a composição deste livro, que é possível balizar uma sinérgica correlação entre os ambientes analisados por aqueles pensadores da Teoria das Elites e a realidade histórica do município de Colônia Leopoldina, principalmente pela razão de que os conceitos concernentes à elite e a oligarquia, serem abstrações que conseguem se amoldar às próprias circunstâncias históricas de sociedades diferentes. Desse modo, uma forma interessante de compreender essa circunstância é pela visualização da cronologia histórica do Poder Executivo no município, o que possibilita certificar-se que quase todos os mandatos do executivo, com exceção do de José Gomes de Lima, foram exercidos, por personagens que, no momento da posse, poderiam ser vistos como pertencentes ao âmbito da oligarquia econômica e política.
Quadro 1: Posição na Estrutura Social Prefeito (a)
Período do
Posição na Estrutura Social no
Mandato
Momento da Posse
Alfredo de Paula Cavalcanti
1951-1955
Proprietário de engenho
Manoel Barbosa de França
1956-1960
Proprietário rural
Alfredo de Paula Cavalcanti
1961-1965
Proprietário de engenho
Antônio Lins da Rocha
1966-1970
Vereador e comerciante
José Luiz Lessa
1971-1972
Usineiro
Antônio Lins da Rocha
1973-1977
Comerciante
José Gomes de Lima (a)
1978-1982
Comerciante
José Luiz Lessa
1983-1988
Usineiro
José Santa de Melo (b)
1989-1990
Secretário Geral de Administração
24 Ibidem, p. 386.
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Sílvio César da Silva de Carvalho Telma Melo (c)
1993-1996
Esposa do ex-prefeito Zé de Melo
Severiano Freitas
1997-2000
Vereador, proprietário rural
Manuilson Andrade
2001-2004
Gerente da Usina Taquara
Manuilson Andrade
2005-2008
Prefeito, empresário
Cássio Alexandre Reis
2009-2012
Secretário de administração
Paula Rocha (d)
2013-2016
Vereadora, comerciante
Esse predicado parece ser a “sina” da cidade, entendido pelo senso comum quase como uma espécie de determinismo político25 e que ainda precisa ser estudada de forma mais aprofundada. Um argumento plausível sobre essa peculiaridade é o que afirma que o histórico processo político do município revela o fato de que a 25 A atitude naturalista, na estrita acepção dada por Pierre Bourdieu (2005, p. 86), pode definir a doxa de parte da comunidade leopoldinense. Quando o senso comum sentencia que o campo político é constituído de forma oligárquica e que não há possibilidade de mudança, sentença que pode se expressar em formas múltiplas, como é o caso quando se acredita que “a política não tem jeito” ou quando se afirma que “são sempre os poderosos que dominam a política”, se trata de fundamentá-la em um dogmatismo que, trabalhado ao longo do processo histórico e político local, implica na descrença no fato de que a política pode ser um campo social não oligárquico. (a) A partir da Teoria do Desvio de Robert Merton (1988) pode-se afirmar que a administração de José Gomes de Lima se caracterizou como um desvio de curva. Com formação política nas entranhas do grupo alfredista, poderia se esperar que ele exercesse o seu mandato em consonância as regras oligárquicas daquele agrupamento partidário e político. Porém, pelo contrário, se caracterizou por ter implementada uma administração preocupada com o melhoramento do município, realizando diversas obras de infraestrutura, a partir de recursos advindos de convênios com o governo federal. Talvez a não obediência aos dogmas da cartilha oligárquica se caracterize como o elemento principal para a compreensão da sua não reeleição. (b) Com a morte de José Santana de Melo, assume, por quase dois anos, o seu vice, Lourinaldo de Lima, concluindo o mandato em 1992. - A Secretaria Geral era a mais importante da estrutura funcional da prefeitura, concentrando as atribuições e competências concernentes, na atualidade, a Secretaria de Administração e Finanças. Cabe ressaltar que, em regra, quando algum oligarca desejava “preparar” o caminho para o seu sucessor, este era colocado na administração da Secretaria Geral. (c) Durante o exercício do mandato de Telma Melo, o vice-prefeito, José Alves Caldas é empossado prefeito em duas oportunidades, em decorrência de Telma Melo ter sido afastada do cargo por improbidade administrativa. - Simbolicamente podese considerar a posição de Telma Melo como oligárquica, na medida em que foi o imaginário social leopoldinense, construído sob o seu falecido marido e ex-prefeito que a conduziu ao exercício do mandato. Achava-se que ela daria continuidade a tipologia de governo de Zé de Melo. - Em 2010, por determinação do Ministério Público Estadual, o prefeito é afastado do cargo, conforme Ação de Responsabilidade por atos de improbidade administrativa e com ressarcimento ao erário. Por 11 dias quem assume o governo é Meilton Luna, vice-prefeito a época. (d) Refere-se a temporalidade do mandato vigente da Prefeita Paula Rocha, sendo que a mesma, tudo indica, concorrerá a reeleição em 2016.
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instalação da Colônia Militar Leopoldina, em 1852, é o resultado estratégico de parte da oligarquia alagoana que detinha interesses econômicos nas fecundas terras do Vale do Jacuípe e do Taquara e que precisavam ser protegidos socialmente e defendidos institucionalmente por uma complexa estrutura político-militar. O conjunto desses interesses, em meados do século XIX, é plasmado na dinâmica da produção econômica dos incipientes engenhos de açúcar e representaram o real motivo para a composição oligárquica da política municipal, em detrimento das forças sociais cabanas que ameaçavam a hegemonia da produção açucareira na territorialidade leopoldinense. Assim, em termos históricos, não é possível escamotear o fato de que o município, no que se refere à estruturação e a composição (modo da política, composição de quadros de mando, finalidade econômica, etc) do campo social político, se organizou, desde a temporalidade colonial, de modo oligárquico26. Aliás, o termo oligarquia, em função dos desdobramentos das particularidades históricas do município de Colônia Leopoldina, pode ser entendido como autóctone ou alóctone27. Embora seja fenômeno carente de sistemáticos estudos referentes à territorialidade municipal, é possível considerar que a histórica dominação oligárquica na cidade de Colônia 26 Refere-se unicamente ao exercício do mandato político, não fazendo referência ao processo específico de concorrência do mandato. Desse modo, em relação ao processo de disputa pelo mandato da majoritária, excluindo a concorrência do (a) vice, em algumas oportunidades se teve indivíduos não oligárquicos disputando a eleição, como foi o caso emblemático do servidor público José Ferreira, que na época exercia o cargo de vigilante hospitalar. 27 Utilizo aqui o termo autóctone para representar os chefes políticos oligárquicos que se elegeram em função da própria condição social oligárquica. Pelo contrário, os chefes políticos que se elegeram em função da organização e do desejo político de grupos oligárquicos podem ser denominados de alóctones. Em outros termos, os chefes políticos autóctones conseguem se eleger por si mesmos, enquanto os chefes políticos alóctones se elegem porque são apresentados e assistidos por agrupamentos oligárquicos.
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Leopoldina pode ser remetida a uma aproximação a certos elementos pertencentes ao sistema político coronelista. Torna-se necessário ressaltar que defender a manifestação de elementos do coronelismo na estrutura histórica da política leopoldinense não é procedimento anacronismo. A razão dessa negativa é que os elementos históricos do sistema coronelista se apresentam com outras roupagens sociais, porém sem perder o objetivo nuclear de criar ou consolidar a dominação social por parte das elites políticas locais. Assim sendo, a dominação oligárquica do campo político leopoldinense e que é passível de aferição estatística pode se assemelhar ao histórico sistema social coronelista. Em termos conceituais, o coronelismo é compreendido em sua historiografia como a prática política do exercício do poder, por quaisquer meios, sobre parcelas do eleitorado, com o objetivo de controlar votos e determinar resultados eleitorais, ou seja, o coronelismo foi um sistema que se sustentava em dois pilares: um político e outro econômico, sendo o pilar político o sistema representativo e o pilar econômico a estrutura agrária28. Com efeito, o coronelismo foi o resultado da superposição de formas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social precária, com predomínio, mesmo numa estrutura representativa, do poder privado. É, por esse prisma, que o coronelismo deve ser visualizado como um compromisso ou uma troca de proveitos entre o poder público e os chefes locais, sobretudo, dos senhores de terra29. 28 ARRUDA, Luiz Gustavo Lima. Apontamento sobre mandonismo, coronelismo e clientelismo: continuando o debate conceitual. XXVII Simpósio Nacional de História. Natal: ANPUH, 2013, p. 10. 29 LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, voto e enxada: o município e o regime
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O funcionamento e o controle do coronelismo se davam, sobretudo, no nível do sistema político. A essência do compromisso coronelista consistia em, da parte dos chefes locais, incondicional apoio aos candidatos do oficialismo nas eleições estaduais e federais, enquanto que, da parte da situação estadual e federal, carta branca ao chefe local governista, de preferência o líder da facção local majoritária, em todos os assuntos relativos ao município, inclusive na nomeação de funcionários estaduais do lugar. Tal modalidade de controle de votos foi um sistema de controle de poder político através do abuso de autoridade econômica na compra de votos ou na utilização da máquina pública, constituindo, assim, num mecanismo recorrente durante o processo de campanha eleitoral. Dessa forma, o coronel utilizavase do poderio econômico para garantir a eleição dos candidatos que apoiava, usando, em muitas ocasiões, do instrumental da violência. Justamente por sua força eleitoral é que o coronel carregava na comunidade grande prestigio político, geralmente derivado do seu poder econômico e social. Por outro lado, pode-se, facilmente, perceber que, o autêntico coronel foi um personagem políticomunicipal transcendente, haja vista a personificação institucional que o mesmo ilustrava e exercia. Essa particularidade é reproduzida em seus mínimos detalhes também em nossa municipalidade. (...) dentro da esfera própria de influência, o coronel como que resume em sua pessoa, sem substituí-las, importantes instituições sociais. Exerce, por exemplo, uma ampla jurisdição sobre seus dependentes, compondo rixas e desavenças e proferindo, às vezes, verdadeiros arbitramentos, que os interessados respeitam. representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p. 40.
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Também se enfeixam em suas mãos, com ou sem caráter oficial, extensas funções policiais, de que frequentemente se desincumbe com a sua pura ascendência social, mas que eventualmente pode tornar efetivas com o auxilio de empregados, agregados ou capangas30.
Como, em regra, a tessitura social e as relações políticas na cidade de Colônia Leopoldina são regidas pela total dependência para com os políticos, estejam em cargos eletivos ou não31, é notória a reprodução de algumas práticas descritas na historiografia como tipicamente coronelistas em sua estrutura histórica. Com efeito, em primeiro lugar, os chefes majoritários, em sua grande maioria, se destacam, antes da posse do mandato, por estarem na categoria dos proprietários de terras ou simplesmente como afins32. São detentores de grandes áreas de terras produtivas, onde as atividades econômicas da cana-de-açúcar se sobressaem não tão somente aos demais ramos da economia rural, mas também as dimensões produtivas urbanas. É por esta particularidade, que confere a oligarquia canavieira a concentração do poder econômico, que o contingente social mais pobre e miserável da cidade vai recorrer nos momentos mais difíceis33. 30 LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, voto e enxada: o município e o regime representativo no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p. 42. 31 A dependência política ultrapassa a temporalidade do exercício do mandato. Por certo, há muitos políticos que não estão em cargo eletivo, mas que mantem uma rede de dependência com o eleitorado municipal, com a distribuição de alimentos, com o pagamento das contas de luz e de água, fornecimento de transporte para praias e festas em outras municipalidades, etc. 32 O sentido de “afins” é aquele em que não sendo propriamente dono de terras, o político municipal se utiliza do fato de ser parente de algum cacique político dono de terras para participar do pleito eleitoral. 33 Apesar da notória redução da dependência rural aos chefes políticos oligárquicos, principalmente em função de diversos programas sociais federais de distribuição de renda e do processo de decadência pela qual passa a indústria açucareira na última década, ainda é ampla a rede de dependência do setor rural para com os chefes políticos. Com receio de ser expulso da terra do oligarca, geralmente votam segundo a orientação deste. No entanto, não são apenas os contingentes rurais que compõem a rede de dependência com as oligarquias políticas, pois parte do contingente urbano
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Se nas primeiras décadas do século passado um dos principais elementos do coronelismo era a troca de favores entre o principal chefe político local e deputados estaduais e federais, o mesmo ocorre em nossos dias, constituindo-se em prática recorrente. A questão criticável não está no fato de que, havendo a possibilidade, o deputado federal ou estadual, interessado no crescimento e desenvolvimento do município, possa trabalhar pela liberação de recursos e verbas, porém nas formas com que o apoio municipal é estabelecido34. Nesse contexto, a ideia é compreender o município como repasto de votos em épocas de eleição. Essa é a principal finalidade do município35 que o chefe do executivo deve apreender, porque sem o apoio político ou econômico de algum deputado, dificilmente ele chegará a ganhar a eleição, sendo esta uma das principais bases de sustentação do político oligárquico. No entanto, a principal fonte de sustentação da oligarquia municipal é a sua própria força econômica. É ela que dá condições materiais para participar do pleito eleitoral, porque à mentalidade municipal o candidato que se apresente sem recursos econômicos dificilmente sairá vencedor da disputa36. compõe também a rede de dependência com a oligarquia política no poder, se diferenciando da dependência do tipo rural em vários aspectos. 34 Não é de hoje que uma das práticas do apoio municipal se estabelece no ato de cooptar os votos dos servidores contratados. Em um município em que o crescimento econômico e o desenvolvimento social são frágeis, conforme os mais recentes dados estatísticos dos órgãos governamentais, é quase impossível não isentar o funcionalismo contratado que segue a orientação do chefe do executivo, dado que “é por causa deste que estou trabalhando...”. 35 O compromisso entre o chefe do executivo municipal com deputados não se estabelece apenas em épocas de eleições, quando estes últimos aparecem nos palanques defendendo determinada legenda, passando a sensação de que conhecem os problemas da cidade. Com efeito, o deputado, que quase nada, em regra, fez pelo município, tem que se fazer presente em outros momentos, isso para não apagar o seu nome da memoria popular. Assim, geralmente eles estão presentes nas principais festas da cidade e nos eventos cívicos mais relevantes, discursando sobre os momentos importantes da cidade ou desfilando em meio aos “santos” em procissões. 36 Por mais que o candidato se apresente à sociedade com a defesa de uma agenda social comprometida com as reais transformações sociais necessárias ao crescimento
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Por outro lado, é base econômica, a sua condição financeira satisfatória, aliada ao anseio de parte do eleitorado, que levará o político, necessariamente, a formar e estabelecer em bases sempre instáveis37 a rede de favorecimento com a população. Assim, o paternalismo se reproduz em nossos dias. Desse modo, o chefe político oligárquico se caracteriza, em não poucas ocasiões, pela prestação de favores pessoais de toda ordem, desde arranjar emprego no serviço público até os mínimos obséquios, de tal modo que, para favorecer os amigos, o oligarca, na condição de chefe político local, resvala, muitas vezes, para a zona confusa que medeia o legal e o ilícito. É na perspectiva do paternalismo que se pode entender o seu efeito mais característico, que é o clientelismo. De natureza substancialmente personalista, no clientelismo as relações políticas são socialmente construídas na base da pessoalidade ou no máximo na tradição familiar, isso porque, na municipalidade leopoldinense não são poucas as famílias que são dependentes eternas da prefeitura. Entra
governo,
sai
governo,
determinados
núcleos
familiares estão sempre no poder. São famílias que têm poder de barganhar cargos na administração municipal por vários motivos. O primeiro deles é o fato de conseguir considerável quantidade de da cidade, o eleitorado municipal, em sua maioria, está preocupado em “como ganhar alguma coisa do político”. A aparente exceção do condicionamento financeiro, em boa parte do eleitorado, estaria no voto de revolta. No entanto, a realidade empírica demonstra que, em geral, o voto de revolta, que parece composto por elementos complexos à inteligibilidade, tem a sua fundamentação na revolta de outro grupo está se fartando na materialidade do poder. De tal modo, o marxismo mais uma vez acerta, quando afirma que a superestrutura ideológica sofre forte condicionamento das condições da infraestrutura. 37 A rede de dependência sustentada pelos políticos é instável. Ela tem que ser mantida por longo período de tempo, não se resumindo “numa ajudinha aqui e em outra acolá”. Ele sabe que a rede de dependência tem que produzir resultados constantes, pois, caso assim não for, o seu eleitorado, ensaiando as leis da economia de mercado, “depositará” o seu voto na oferta de outro político.
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votos em seu interior. O segundo motivo principal, quando não há o poder de cooptar os votos para determinado oligarca, é quando a família resolver “colocar a cara na rua38”, sendo uma espécie de oferecimento de publicidade não ao eleitorado, mas ao político, de que ela acha-se alinhada com ele. Em suma, percebe-se que a linha divisória entre o sistema coronelista e as práticas sistemáticas dos chefes oligárquicos em nossa história política sempre foi tênue, sendo que, dependendo do resultado almejado e das condições históricas do momento, é a mesma coisa. A superação desse quadro será concretizado, possivelmente, quando a oligarquia, enquanto classe social, não for mais o núcleo a dominar a cena política no município, cedendo o espaço para um governo de esquerda.
O Problema da Esquerda39 Municipal: constituição, avanços e retrocessos A manhã amanheceu com um céu limpo. Era o ano de 1999. Enquanto comia o quase imutável cuscuz e bananas cozidas, acompanhado de uma xícara com café, já pensava sobre como seria 38 Alguns analistas da política municipal nos informam que há três tipos de famílias em cada conjuntura eleitoral. A mais comum é aquela que não se manifesta publicamente, sendo que somente passa a fazer isso quando percebe que as chances do seu candidato vencer as eleições são plausíveis. Há ainda aquele tipo de família que faz um loteamento dos seus votos, na busca de sempre obter condições de negociar com o oligarca. E por fim, aquele tipo de família que, fenomenologicamente, concretiza toda a ritualística social da adesão política. 39 Deve ser destacado que, por falta de documentação histórica, principalmente porque não há uma organização sustentável e avolumada de arquivos públicos sobre a historicidade das correntes de esquerda na cidade, a análise textual é fundamentada na parca documentação de pesquisadores e na percepção que o próprio autor possui sobre as questões pertinentes ao objeto do texto. Além disso, deve ser realçado que o autor não é especialista no movimento de esquerda no município, fato que não impossibilita a construção de uma plataforma analítica sobre o movimento. Finalmente, deve-se entender que a ideologia de esquerda é aqui tomada a partir de sua composição integral, ou seja, envolvendo partidos políticos, movimentos sociais e as pessoas que o compõe.
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aquele dia. Por certo, não seria mais um como os outros, exceto o cuscuz e a as bananas. Às oito horas daquela manhã dirigir-me ao pé da ponte que liga a cidade de Colônia Leopoldina ao distrito de Sertãozinho de Baixo, no estado de Pernambuco. Por ali já estavam algumas garotas e o ânimo inicial só aumentou com a presença delas. Entretanto, esse ânimo instintivo foi paulatinamente diminuindo à medida que o transporte que nos levaria à Horta do Padre40. Era uma Kombi de cor branca, surrada pelo tempo. Afinal, o que esperar? Não se esperava dos candidatos a revolucionários o fato de que terem que se adaptarem as circunstâncias sociais mais penosas possíveis? A Kombi já estava quase lotada, sendo que foram necessárias duas viagens para transportar todas as pessoas. No comando do translado estava Luciano do PT. Ao chegarmos a Horta do Padre já se encontram considerável quantidade de pessoas. Recordo-me de Silvânia, de Maurício, de dois irmãos de Luciano, principalmente de Hernandes, que hoje é estudante de Direito em Maceió, dentre outras pessoas, que não lembro os seus nomes. Todos do Partido dos Trabalhadores no município. Nas paredes de uma das salas do estabelecimento havia cartazes e alguns cartazes ideológicos, como o do MST. Enquanto recebia uma pasta com papéis para anotações e duas canetas, percebi que ao fundo da sala se tocava uma seleção de músicas que, depois de algum tempo, fui entender que formam o corpus musical de todo revolucionário. Na memória ficou “caminhando e cantando” de Geraldo Vandré! 40 A Horta Nossa Esperança, idealizada pela ATRAPO, foi um projeto social encabeçado vigário Aldo Giazzon, em meados da década de 1990, e administrado, por muito tempo. pelas principais lideranças do PT. Esse projeto tinha a finalidade de oferecer educação e cultura para crianças e adolescentes, através de múltiplas práticas culturais.
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Estávamos ali para estudarmos a teoria marxista na sua mais tradicional concepção. Fui convidado por Genésio, que na época tinha fortes ligações com a ideologia de esquerda através da ala revolucionária da Igreja Católica na cidade, ou seja, com os Monges do Catita. Era um curso de Formação Política que, sob os auspícios de Lourinaldo Versalhes, devia recarregar as energias dos simpatizantes das ideias da esquerda, não tão somente da cidade, mas da região, posto que participaram daquele evento pessoas de outros municípios. No meu caso, era a primeira vez que participava de um encontro de formação político-partidária. Não havia espaço mais apropriado para a realização daquele encontro, porque a própria história da Horta do Padre revelava que, quando os setores da esquerda estão mobilizados, pode-se conseguir concretizar as transformações sociais necessárias para uma vida mais digna. A manhã foi toda dedicada à teoria. O coordenador, Souza de Souza, ajudado pelos mais experientes na vida partidária, como Luciano do PT, Maurício e Silvânia, trabalhou diversos pontos do materialismo histórico. Embora já tivesse lido algumas coisas sobre aquele sistema teórico, múltiplas ideias foram clareadas no curso. Quase a uma da tarde paramos para o almoço. Acompanhados pelas batidas de Vandré e companhia, desfrutamos de arroz, feijão e frango. Para os interessados, havia a disposição à oportunidade de “tomar uma lapada de cana”. Depois do almoço, seguindo a velha e boa cartilha das práticas de esquerda, todos ajudaram na organização da cozinha. Enquanto alguns levavam os pratos, as panelas e quejandos, outros a variam. Tudo organizado, hora do descanso.
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Alguns foram jogar futebol, no diminuto campo que ainda existe naquele lugar. Outros foram verificar se as árvores frutíferas poderiam saciar os seus desejos. No meu caso, na condição de aprendente, de novato naquele ramo, preferi apenas escutar os mais habilidosos na analítica política. Falavam de superestrutura, de infraestrutura, da “desgraçada economia de mercado”, da conjuntura política da região e do país, etc. Como quase tudo era novidade, fiquei maravilhado com aquelas pessoas. No turno da tarde se formaram vários GT. Era a hora da discussão, embora na parte da manhã as intervenções não foram poucas. Cada grupo apresentava uma temática à plenária. Salientou-se que a discussão devia ser ancorada na dialética: tese, antítese e síntese. No meu caso, a minha participação se resumiu na contemplação dos que falavam e em ajudar a segurar os cartazes, pois não consegui vencer a timidez. Minha voz só foi ouvida, apenas, na apresentação, no começo do curso. Perto das 17h se concluiu o curso. As coisas mudaram com ele. O meu modo de ver o mundo se modificou profundamente, a ponto de, quando do retorno, ao avistar as torres da Igreja Católica, lembrei-me do que tinha aprendido naquele dia, ou seja, de que ela era uma das principais instituições sociais da superestrutura social, responsável pela ideologização do povo. Em casa, ao olhar para o meu pai, fui absorvido por uma sensação de revolta, porque, agora, tinha claramente compreendido que ele era mais um explorado na indústria açucareira que era a Usina Taquara. Assim, pode-se dizer que, naquela noite, fui dormir como aprendiz de revolucionário. Hoje, durmo como mais um revolucionário postiço!
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Esse acanhado relato é a porta de entrada para que seja possível a discussão da segunda problemática do texto, que é questão do movimento de esquerda na cidade. Tema central na construção da segunda parte do texto, a luta de classe é uma questão fundamental para se entender a predominância da política partidária dominante ser a oligárquica em nosso município. Ademais, se por um lado é tema fundamental, pelo motivo antes exposto, por outro a sua abordagem parece ser paradoxal, pois, em nenhum momento das fontes históricas, isto é, dos relatos dos entrevistados, se escuta ou se ler algo sobre a luta de classe. Porém, é uma mera aparência. Na realidade, não é paradoxal, porque, quando se tem a notícia de que, em 1989, o candidato Yrapuã disputou a eleição majoritária, pelo Partido dos Trabalhadores, é uma manifestação, dentre outras, da luta de classe. No entanto, essa foi a primeira vez41 que um legítimo candidato da esquerda municipal concorreu ao cargo público de prefeito na história de Colônia Leopoldina. Desde a outra candidatura legítima, por um partido político ideologicamente de esquerda, que aconteceu em 1992, com Adelmo Lins, a época membro do MST, a esquerda no município, como em sua origem, se resumiu em efetivar a luta de classe por outros meios, culminando, ao que se presencia atualmente, no total desaparecimento da noção de luta de classe. É a partir do incipiente saber sobre a fenomenologia ideológica da esquerda na cidade de Colônia Leopoldina que devem ser salientadas e discutidas as suas contradições históricas, tanto 41 A candidatura de Zé Maria Quirino, proprietário da Usina Taquara, na eleição de 2008, pelo Partido Socialista Brasileiro, não pode ser caracterizada como uma candidatura legítima. A sua candidatura foi uma contradição do movimento de esquerda municipal, principalmente pela falta da crítica sistêmica em relação a um usineiro se constituir, em nível institucional, no principal político do PSB. Além disso, revela o fato da ausência de ideologia por parte do Diretório Estadual.
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as internas, quanto as externas, posto que, como foi ponderada anteriormente, a superação da política partidária oligárquica, como política dominante, se dará quando a política municipal for orientada por uma agenda política genuinamente composta pelas demandas dos trabalhadores. Nesse caso, embora não haja a preocupação em estabelecer uma historiografia da ideologia de esquerda na cidade de Colônia Leopoldina, considerada sob uma perspectiva subjetiva, tornase imperiosa uma descrição lacônica da historicidade das ideias de esquerda na estrutura do campo político e social na cidade. Trata-se de apontar os principais momentos históricos, conforme a limitada e defeituosa capacidade do autor, de lutas da concepção ideologia de esquerda na tradicional “Terra da Princesa42”. Por certo, ainda que existissem manifestações isoladas e coletivas dos simpatizantes da ideologia de esquerda na cidade, principalmente em toda a década de 1980, ela só foi juridicamente instituída com a fundação do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores (PT), em 1982, pelo esforço incomensurável do militante José Francisco de Melo Neto, atualmente professor da Universidade Federal da Paraíba43.
42 Epíteto que serve para a identificação nominal da cidade de Colônia Leopoldina. Na verdade é uma denominação profundamente oligárquica, posto camuflar, mesmo que de forma não intencional, a sua origem política oligárquica. 43 Nascido em Colônia Leopoldina, se destaca como principal militante da concepção de esquerda na cidade. Autor de diversos livros, artigos e ensaios que busca salientar a organização popular como alternativa política ao domínio das elites, é também fundador do MCC e co-fundador e atual presidente da ACCL.
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Local da antiga Sede do PT
A instituição partidária da esquerda na cidade, com o diretório do PT, foi motivo de apreensão nas elites locais, pois, compreendia-se, entre as galerias do poder oligárquico, que a turma comunista queria acabar com as propriedades privadas. Em um município construído, originalmente, na expropriação compulsória das terras cabanas, de índios e de miseráveis posseiros, compelidos a entregar o quinhão de terra aos poderosos senhores de engenho, não era de estranhar que a reação das oligarquias locais fosse diferente. A memória partidária de esquerda44 nos revela que, nessa época, boa parte das ações políticas e sociais acontecia às escondidas. A distribuição de panfletos, de folders, de críticas sociais “se dava na calada da noite, porque temíamos a revanche das elites políticas”, revela um ex-membro do movimento de 44 Trata-se de informações obtidas em conversas com as pessoas que participaram desse momento inicial da instituição da ideologia de esquerda na cidade. Cabe ser mencionado que, por recomendação das mesmas, não me foi permitido divulgar os seus verdadeiros nomes. Assim, embora aprisionadas por questões diversas, principalmente políticas, trato tais informações como pertencentes a memória histórica do movimento de esquerda.
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esquerda. “O poder do dinheiro, naquele tempo, já era muito forte, e lutar contra os patrões era perigoso, pois, conscientizar o povo da exploração dos mais fortes sobre os pobres não é fácil” revela outro que combateu na linha de frente do movimento revolucionário. O tempo se encarregou de providenciar a assunção fenomenológica da concepção social de esquerda com a figura do Pe. Aldo Giazzon45. Com a ajuda dos membros do PT leopoldinense, este religioso conseguiu implantar uma considerável rede de assistência social e orientação política às crianças e aos adolescentes que, abandonados pelo poder público, encontravam na Horta Nossa Esperança um refrigério as suas existências miseráveis. Foi através dele que os monges do Mosteiro do Discípulo Amado, na Serra do Catita, puderam se instalar definitivamente no território da cidade. Até hoje os monges do Catita desenvolvem ações de conscientização das comunidades pobres contra as barbáries do poder oligárquico, tomando como referencial teórico as ideologias fundamentadas na Teologia da Liberação e outros aportes epistemológicos de cunho libertário cristão.
45 Foi pároco da cidade de Colônia Leopoldina entre os anos de 1984 a 1996. Seu trabalho se caracterizou por permitir o surgimento de diversos movimentos sociais no campo. Sofreu perseguições e ameaças de morte de membros das oligarquias locais por defender a posse igualitária da terra e denunciar a situação precária dos trabalhadores do campo.
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Pe. Aldo Giazzon em visita aos Monges da Serra do Catita
No entanto, a maior conquista histórica da esquerda leopoldinense, ajudada pela ala popular da Igreja Católica e outros movimentos da sociedade civil, até a temporalidade vigente, é a constituição do Mandacaru46. Desejo antigo de famílias pobres que não tinha residência para morar, o Mandacuru é hoje, depois de anos de lutas por melhorias sociais e de enfrentamento das elites da terra, o resultado visível de que a organização popular pode ser uma alternativa ao poder oligárquico dominante. Através da Igreja, transfigurada nas pessoas dos Padres Aldo e Luís, as pessoas venciam o medo e sentiam-se protegidas da violência (...); o caso do assentamento Mandacaru, na periferia do Município de Colônia de Leopoldina, foi exemplar de como essa proteção se operava nas representações dos seus 46 Um dos maiores bairros de Colônia Leopoldina e que conta com centenas de famílias residentes em sua territorialidade. É o resultado da política de ocupação da terra encabeçada pelo MST que, em 1991, estava em plena atividade na região da Mata Norte de Alagoas.
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participantes, desenhando o papel da Igreja como apoio político, moral e material. No ano de 1991, dezenas de famílias de trabalhadores canavieiros, não tendo onde morar, ocuparam uma área na periferia da Cidade, com o apoio do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto. Hoje a área é denominada de Vila Mandacaru, composta, em sua grande maioria, por famílias de assalariados na lavoura da cana com inserção precária no mercado de trabalho. A história do acampamento Mandacaru, até a sua atual condição de bairro da Cidade, foi marcada pela violência legítima do Estado-governo. Por ter se iniciado com uma ocupação, o local passou a ser conhecido como favela e “lugar de bandidos”. Seus habitantes ficaram, deste modo, discriminados pela população já estabelecida da cidade47.
A ideologia de esquerda, presente no PT, PSB e PCB, assim como em outras instâncias e movimentos sociais, no final dos anos 1980, ainda tinha vigor e seus principais quadros políticos combatiam distintamente o poder das oligarquias locais. Assim sendo, o núcleo ideológico esquerdista foi fundamental para despertar a necessidade da organização do movimento estudantil no município48. Os partidos de esquerda, principalmente o PT e o PCB, desde que o movimento estudantil se estruturou entre o final da década de 1980 e o começo de 1990, se fizeram presente na trajetória 47 Em Freitas (2003, p. 227), destaca o papel da ala progressista da Igreja Católica que nas figuras de padres combativos, como Aldo Giazzon, foi ponto de apoio na luta e na proteção das camadas pobres da sociedade perante o poder dominante da classe canavieira na região da Mata Norte de Alagoas. 48 São diversos os relatos sobre esse período que compõe a memória estudantil leopoldinense. Ainda que houvessem posicionamentos de direita no movimento estudantil, este se caracterizou por tentar assumir uma agenda social pertinentemente formada pelos dogmas da esquerda da época.
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do movimento de estudantes. Com efeito, havia uma confluência de interesses entre os partidos de esquerda e o movimento de estudantes, posto que se constituía em uma frente de luta que ainda se mostrava carente deste tipo de representação ideológica em nossa cidade. Em Colônia Leopoldina, no dia 22 de maio de 1990, o Partido Comunista do Brasil (PCB), foi regularizado pelos educadores Adelmo de Oliveira Torres, Rudson Sarmento Maia, Miguel Florêncio da Silva Júnior e Jair de Assis da Silva; (...) a meta do PCB era de uma proposta de conscientização política inovadora, sobretudo nos anseios da juventude leopoldinense; (...) uma parceria marcante entre os professores e os estudantes, fez com que os políticos tradicionais ficassem preocupados com o fortalecimento de mais uma esquerda (pois, na época, já contava com o PT) em nossa cidade49.
No entanto, a organização dos estudantes municipais em bases ideologicamente socialistas e comunistas foi o último grande evento politicamente histórico em que a homogeneidade ideológica de esquerda é percebida. De tal modo, o final da década de 1990 se sobressai, na medida em que há um corte posicional50 em parte da esquerda municipal. Percebe-se que a unidade ideológica de anos anteriores cede a cooptação de alguns membros do quadro de esquerda as ideologias oligárquicas. É nessa conjuntura histórica em que aparecem as contradições da esquerda na cidade. 49 AMORIM, José Júnior. A trajetória do movimento estudantil leopoldinense. Colônia Leopoldina: edição do autor, 2011, p. 30. 50 Corte posicional é a terminologia apropriada para a situação analisada, pois a historicidade da esquerda no município revela o fato de que, enquanto o movimento perdia importantes membros do seu quadro, não teve a capacidade institucional de revigorar o movimento nas bases da radicalidade política original.
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Em outras palavras, tomado em nível estritamente conceitual, o movimento de esquerda, a partir desse corte posicional, não deixou de criticar as ideologias e as políticas oligárquicas efetuadas no município51, principalmente por parte de sua ala mais radical. Porém, paulatinamente, nos embalos específicos das formas da cooptação social e partidária, relevantes membros do seu passado deixavam de ver o socialismo e o comunismo como alternativa ideológica à configuração social do município52. O movimento de esquerda não foi capaz de aumentar os seus recursos humanos partidários, posto que, atualmente, quase se equivale aos quadros dos partidos com políticas de direita53. Esse fenômeno evidencia a ausência, da parte do movimento de esquerda no município de Colônia Leopoldina, a ausência de políticas de formação partidária em bases eficientes54. Essa situação pode ser confirmada quando se utiliza como termo definidor a temporalidade para o primeiro candidato de esquerda ser eleito à vereança leopoldinense, fato ocorrido no 51 Merece destaque a instituição social do MCC. Fundada em 2008, foi por muito tempo a única organização civil responsável pela análise da conjuntura política municipal e elaboração de propostas para os governos constituídos, além de realizar importante papel crítico às configurações sociais do poder. 52 Em conversa com membro, a época, do movimento de esquerda, foi relatada que, nesse período, entre os últimos anos da década de 1980 e primeiros anos da década seguinte, “por causa da falta de emprego, da situação social e econômica insustentável, muitos companheiros foram absorvidos pelos grupos políticos tradicionais. Ou permanecia com as ideias de esquerda ou se enchia a barriga”. 53 Trata-se de situação política e institucional negativa, porque demonstra que, em uma região em que os trabalhadores são explorados em todos os níveis do incipiente campo social do trabalho, o movimento de esquerda não vem demonstrando a capacidade para que ocorra a aderência em massa desses trabalhadores em constantes explorações. Assim, não há políticas públicas para a luta de enfrentamento aos instrumentais ideológicos das oligarquias locais, situação ainda mais complicada, na atualidade, em função do processo midiático de desestruturação da esquerda no país. 54 Em bases eficientes representa a possibilidade para o surgimento da consciência de classe no setor proletário municipal. A esfera trabalhadora não possui a consciência de classe necessária para a modificação do sistema social do município. Talvez o caso mais evidente dessa ausência seja o Sindicato Rural em que, historicamente, e com poucas exceções, sempre foi administrado por trabalhadores que venceram o seu pleito com a ajuda do capital da oligarquia canavieira.
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último pleito eleitoral1. Discute-se se essa demora foi por causa das conjunturas históricas em cada eleição, impossibilitando, assim, a assunção da ideologia de esquerda ou se foi incompetência do movimento de esquerda em eleger o seu primeiro representante em cargo eletivo na cidade. O movimento de esquerda, na atualidade leopoldinense, deve ser visto em duas frentes de posicionamentos individuais. Há aqueles sujeitos sociais em que a unidade entre a ideologia e a prática é ainda vigorosa. São estes que, apesar do principal partido de esquerda da cidade, o PT, que na última década política sempre esteve compondo os governos oligárquicos, não se isentaram de oferecer à população um conjunto de pertinentes críticas referentes às políticas sociais que não se embasam na participação popular e na instituição de um governo crivado na liberdade e na igualdade. Por outro lado, no movimento de esquerda, em nossa cidade, se apresenta uma ala que não há a unidade entre a ideologia e a prática2. Embora se declarem favoráveis à implantação de um governo em bases populares no plano da teoria e do discurso, os seus membros são orientados pelo oportuno praticismo que confere os cargos e as alocações públicas, assim como pelos favorecimentos institucionais de todos os tipos. Relata um antigo participante da esquerda municipal que “essa turma, na verdade, procura jogar com os interesses partidários; 1 O último pleito eleitoral ficará marcado na história do movimento de esquerda porque, mesmo elegendo o seu primeiro representante, através do Partidos dos Trabalhadores, para muitos tal feito perde a sua legitimidade porque o vereador eleito não teve a sua formação no quadro municipal do partido, o que implica em aceitar a hipótese de que o movimento de esquerda não foi capaz de recompor o seu quadro institucional nos últimos anos. 2 É comum se atribuir as históricas participações em legendas destoantes ao corpus ideológico do movimento de esquerda em função das particularidades de cada conjuntura política. Trata-se de admitir, mesmo que de forma indireta e como subterfúgio político momentâneo, que o capital da cana nunca será superado pela conscientização da classe trabalhadora.
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se posicionam nos partidos de esquerda com a finalidade de negociar composições de governos quando ganham as eleições”, sendo que “não há mais um autêntico líder na esquerda municipal, como foi o padre Aldo; ou se rende ao dinheiro e aos empregos que servem para sustentar a família ou se rende a violência ou ameaça de violência dos poderosos”, nos comunica outro adepto da ideologia de esquerda. De tal modo, para que haja o avanço necessário ao processo político em Colônia Leopoldina, caberá ao movimento de esquerda repensar as suas bases de ação, principalmente à constituição de um projeto de poder3 na cidade. Depois da saída forçada do Pe. Aldo Giazzon não houve a constituição partidária de um líder carismático e preocupado com as questões populares, com crítica social afinada e adepto da autocrítica ao próprio movimento. Em suma, a concepção e a implantação de um projeto político em bases populares passarão, necessariamente, pela superação de inúmeros óbices4 que, na contemporaneidade, são reproduzidos socialmente e afetam a credibilidade do movimento de esquerda na cidade.
3 Precisa o movimento de esquerda no município pensar em não mais compor legendas em plano secundário. Deve lutar para vencer as contradições da política municipal para vigorar a concepção de governo popular, através de um projeto de projeto de poder, ou seja, a volição em que conquistar o poder e implantar um governo autenticamente popular e democrático. 4 O conjunto de contradições que afeta o movimento de esquerda no município é composto por diversas práticas sociais e culturais. Nesse sentido, se destacam o despreparo teorético de considerável parcela dos membros do movimento de esquerda que, como se não fosse demais desconhecer Karl Marx, Gramsci, Lukács, dentre outros, não se utilizam das ferramentas metodológicas e técnicas de análise de conjuntura a compreensão da realidade social. Conquanto, um dos principais traços do movimento de esquerda leopoldinense é a recorrente do maléfico conjunto de práticas fisiologistas que caracterizam a historicidade política do município.
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Ponderações Finais A partir dos memes aferíveis nos relatos dos entrevistados para esse livro, foi possível identificar dois problemas na política municipal. O primeiro foi em relação a predominância das oligarquias na cena política. São as elites oligárquicas locais que, entre si e em cada pleito político, disputam o poder municipal. Essas elites, entendidas doravante a explicação elitista de Mosca, Pareto e Michels, apresentam uma força política colossal, a ponto de se reversarem no poder e impossibilitar, até o momento, a efetivação de um governo popular na cidade. Para fazer frente a política partidária dominante municipal, a década de 1980, com o Partido dos Trabalhadores, apresenta a sociedade leopoldinense uma alternativa política. Seguido por outros partidos ideologicamente de esquerda, como o PSB e o PCB, essas agremiações partidárias foram de fundamental importância para o estabelecimento de críticas às forças oligárquicas e para a forma de como a política era realizada, além de ter contribuído para os avanços institucionais dos movimentos sociais na cidade. Entretanto, o movimento de esquerda no município se encontra em uma situação precária, em termos institucionais, dado que, com a exceção de poucos homens e poucas mulheres que ainda acreditam ser a ideologia de esquerda a melhor opção para orientar as políticas públicas que visem as reais transformações sociais, o movimento apresenta uma falência institucional no que diz respeito a recomposição do seu quadro humano, assim como no que se refere ao praticismo partidário que orienta a ação da maioria dos seus membros.
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b) U M OLH A R DI ALÉT ICO PA R A A POLÍT ICA DOM I NA N T E EM COLÔN I A LEOPOLDI NA: visão crítica. José Francisco de Melo Neto Este texto procura responder a questão: como compreender a política partidária dominante no município de Colônia Leopoldina1, de 1950 a 2015? A resposta à pergunta requer busca pelas dimensões de positividade e negatividade da política desse período, resultantes de discursos e de ações deliberados daqueles atores e atrizes, nesse intervalo de tempo, a partir de análise crítica, tendo por base empírica quatro entrevistas de pessoas que vivenciaram aqueles momentos políticos no município2. Tal esforço de análise seguiu a metodologia dialética marxista, orientando-se por um triplo movimento contendo uma síntese inicial; em seguida avança para análise do conteúdo das entrevistas, e, finalmente, nova síntese superadora da síntese primeira. O primeiro movimento é considerado a concretude ou a realidade, o concreto; o segundo, constituído de esforços de abstração, e, o terceiro, para além do primeiro concreto, um novo concreto permeado de pensamentos ou concreto pensado. Além desse movimento, a análise procurou adotar técnicas da entrevista compreensiva sem seguir, “in totum”, as orientações de Jean-Claude Kaufmann e amparada em perspectivas antropológicas de Bourdieu. Utilizou-se da técnica definida por um roteiro de entrevista e por um plano evolutivo de 1 Município do Estado de Alagoas, situado na Zona da Mata Norte do Estado, com aproximadamente 22 mil habitantes, fortemente determinado pela cultura da cana de açúcar. 2 As entrevistas compõem o corpo deste livro e passam a fazer parte do parco acervo historiográfico dessa época, no município.
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análise, próxima desses pensadores e permeada da dimensão da crítica. As categorias fundantes da análise são classe social, luta de classe e contradição, além daquelas direcionadas pelo plano evolutivo.
Terras cabanas3. Das terras cabanas, antes trilhas de Zumbi, corria o mel para as gentes que se alimentavam da selva, guerreiros em suas lutas por direito a viverem nas matas e por liberdade - a guerra dos cabanos. Guerra de índios e negros, todos escravos, nos idos de 1830 a 1835, em terras de boa parte da atual Zona da Mata sul de Pernambuco e norte do Estado de Alagoas. Junto ao mel corria o fel dos dissabores de batalhas por aqueles sonhos, ativando o surgimento da atual cidade de Colônia Leopoldina, a partir de uma Colônia Militar, nos idos de 1851, com a finalidade, possivelmente, de combater sistematicamente os amantes da liberdade e das matas, escravos das terras do vale do Rio Jacuípe. Mas, hoje, de forma política e ideológica, praticamente 200 anos depois, estão apagadas as pegadas dessas batalhas e do muito sangue derramado por aqueles ideais. Esse rio, inclusive, fora utilizado como via natural de chegada de material para aquela construção da Colônia Militar. Por ele, chegavam materiais como enxadas, foices, facões e armas de fogo, além de mantimentos para a sobrevivência dos colonos militares, conforme mostra Silva (1982). As lutas por liberdade persistem, estando permeadas de reações das elites de então, e que insistem em permanecer 3 Uma alusão à guerra dos cabanos, de 1830-1835, que abrangeu as terras da mata sul pernambucana, fazendo parte, hoje, a atual região da mata norte do Estado de Alagoas, palco das lutas daquele povo e onde se situa, atualmente, a cidade de Colônia Leopoldina.
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de variadas formas, nos dias atuais. Os últimos 65 anos da vida político-partidária do município estão cheios de esforços de manutenção da opressão com suas sutilezas, em especial quando se insiste na alienação geral da população a respeito das questões da realidade e do lugar. Problemas apercebidos também pelo Padre Aldo4, ao observar que quando a Igreja está mais comprometida com o povo mais forte permanece “embora queiram abafála”. Defende, portanto que “Assim é preciso denunciar e mudar aquelas estruturas de exploração e de servidão que fazem uns ricos mais ricos e outros pobres cada vez mais pobres” (In, JÚNIOR AMORIM, 2011:137). Situação econômica registrada pela autora do livro Memórias vivas do povo leopoldinense, em que sua infância fora marcada com o básico para a sua sustentação e nunca soube o que seria uma festa de aniversário. Esta foi a infância de praticamente toda criança nascida nessas plagas. “Menina de poucos brinquedos, apenas aqueles que a própria imaginação criava através das caixas de fósforos, embalagens plásticas, folhas e flores que a natureza dava gratuitamente para as minhas invenções”(COSTA, 2014:22). A cidade, em seu histórico econômico, destaca-se como um lugar crivado pela cana de açúcar, com duas empresas produtoras de álcool e açúcar, arrastando consigo as marcas da cultura canavieira - da riqueza à pobreza que lhes são imanentes. Riqueza para uns pouquinhos e pobreza para uma estrondosa maioria. Desenvolveu-se ainda a produção de banana e nos termos do IBGE(2015): “uma boa produção de alimentos de subsistência e razoável pecuária” . A população atinge a casa de 22.000 pessoas. Nesses anos, a política dominante na cidade arrastou consigo as mazelas todas de uma tradição não promotora de sujeitos, mas do seu silêncio, das terras da usinagem. Em termos do 4 Sacerdote da Igreja Católica, pároco da cidade no período de 1984 a 1996.
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desenvolvimento humano, o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil(2013), aponta o valor de 0,517 para o IDHM, isto para o ano de 2010, ficando o município entre os 100 mais de difícil sustentabilidade em todo o país. No Estado de Alagoas, situa-se entre aqueles 10 de mais baixa condição de se viver. Já no Atlas de Vulnerabilidade Social(2015), para se falar sobre a educação, o índice de desenvolvimento humano de educação (IDHM-Educação) é de 0,363, um baixo índice em termos nacionais e, além disso, o mais baixo índice entre os municípios de sua própria região, menor do que o das cidades de Campestre, Ibateguara, Jacuípe, Joaquim Gomes, Jundiá e Novo Lino.
Localização geográfica do município.
Como se não bastasse, para o ano de 2010, segundo as mesmas fontes, o indicador de percentual de crianças de 5 e 6 anos na escola, exibe o menor de sua região, ficando apenas em 73,65. Uma forte contribuição negativa para as futuras gerações. Desse
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modo, é de se considerar sensíveis incrementos nos últimos anos, mas ainda distante da média estadual e nacional. Nascer em Colônia, a expectativa média de vida, a partir de 2010, é de 66,6 anos, enquanto que o do Estado é de 70,3 e a do país, de 73,8. Portanto, vive-se com políticas que superaram os tempos de escravidão, mas que a mesma parece manter-se no presente, dificultando a organização social, mantendo os grilhões sobre aquilo que deve ou não ser dito e vivido. Mas, no conjunto de contradições surgiram débeis e isoladas resistências, como a criação de partidos fora da lógica geral da política, a exemplo do Partido dos Trabalhadores(1982), o Movimento Estudantil(1990), a presença da força da Igreja Católica com um vigário ligado à teologia da libertação (12 anos), a Associação Católica de Monges que se estabeleceram nas matas do Catita, cultivando os ensinamentos da Teologia da Enxada do Pe. Comblin, orientados pela teologia da libertação. Mesmo mais recente, há a criação do Partido Comunista do Brasil(PCdoB), do movimento pela cidadania - Movimento Colônia e Cidadania (MCC), em 2008, e de uma Academia de Cultura, em 2015, ainda com reduzida ação na política pública. Do ponto de vista cultural, está presente a forte repressão e a proibição à cultura negra que fez a riqueza econômica da região, além do desmonte geral da cultura indígena desaparecida. Outras expressões de bases populares caminham para o total esquecimento, a exemplo das festas e quermesses, cavalhada, festas de guerreiros e expressões musicais várias, como o samba-de-coco. Reforça-se a cultura de outras regiões nas festas gerais da cidade e, com isso, ainda mais se enfraquece uma identidade cultural do lugar.
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Há, todavia, um conjunto de pessoas, as elites, apesar das contradições internas e reflexos de suas posições de classe social, que foram conduzindo o município e, de certa forma a Região, a um estilo de política que levou a atual situação. Mas, uma reflexão dialética não encontrará respostas simplesmente na política local, em seus dirigentes, nas questões apenas do interior do espaço geográfico do município. Muito menos, vai se deparar com responsabilidades de algumas poucas pessoas. As razões dessas situações estão na ordem política interna, da economia interna, e das relações sociais internas. Além disso, o município não está imune à política geral do País e de sua economia com todas as crises, nesses últimos 65 anos. Passam pelas “bagunças” da “casa Brasil”, desde Juscelino, seguindo-se à renúncia de presidente(Jânio), ditadura militar(Castelo), explosão da inflação(Sarney), impeachment(Collor), dívidas com Fundo Monetário Internacional, moratórias(1982 e 1992), confisco de poupança(Plano Collor) e os avanços e as crises dos Governos Lula e Dilma. Estes carregam elementos que contribuíram e contribuem para esta situação em que se encontra a região da zona da cana e, de forma aguda, a cidade de Colônia. As discussões e acusações em tempos eleitorais entre as próprias elites enfatizam as questões locais como se fossem desconectadas das políticas gerais do Estado e do âmbito federal. Nunca é pouco lembrar que os votos aos candidatos conservadores dados em Colônia ou outra cidade interiorana servem para o conservadorismo geral do País. Para uma compreensão mais aguda dessa situação cobra-se a necessidade de se conhecer a origem desses políticos locais e que definiram e traçam, praticamente, todas as dimensões do mundo da vida das pessoas - jurídicas, sociais e econômicas.
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Origem dos políticos - Prefeitura e Casa-Grande A tendência dominante quando se deseja conhecer a identidade das pessoas é a orientação por sua árvore genealógica. Este é filho deste, que é neto daquele... e, desse jeito, se procede. A origem dos políticos aqui, entretanto, seguirá a visão na ótica da produção. O desejo é saber como esses políticos estão inseridos no processo produtivo. A que grupo pertencem, do ponto de vista da classe social, como se vinculam em suas relações e como se expressam nas ações políticas e, em especial, os papéis no ambiente econômico do lugar. Com esse olhar, convida-se a visitar o alto da Pioneira5 e, então, observar como é a vista da cidade, lá do alto. Além de beleza estética de todo o vale do Rio Jacuípe, a cidade parece muito como algo compacto, quase homogênea, em suas estruturas de moradias. As casas e a população aparentam ser todas iguais. Mas, ao se aproximar da cidade, vê-se que não é verdade. Depreende-se imediatamente a visão destacada do prédio único com expressiva arquitetura na cidade que é o prédio da Igreja Católica. Esta teve e ainda tem papel determinante no cultural da região e do País, acompanhando todo o movimento político partidário, ora fazendo críticas aos processos organizativos dominantes, ora compactuando com os mesmos. Às vezes, têm fechado os olhos diante das mazelas da exploração, pois rendida está ao seu projeto escatológico de juntar todos, opressores e oprimidos, em um reino dos céus.
5 Morro da região que dá uma ampla visão da cidade, situada no vale do Rio Jacuípe.
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Contudo, à moda marxiana, no seu método da economia política(MARX, 1974), ele mostra que há um profundo equívoco em se analisar uma população de tal maneira que não a reconhecesse como uma mera abstração. A população é uma abstração assim como classe social também o será, caso não se tenha o cuidado de se ver “os elementos em que repousam, por exemplo: o trabalho assalariado, o capital...” (p. 122). Aquele algo homogêneo, à medida que se entra na cidade, apercebe-se que as casas são distintas e que refletem a posição social de cada morador, gerado pela cultura da cana de açúcar, que definiu e mantém as relações sociais tradicionais do Senhor de Engenho, da Senzala e da Casa-Grande, em todo o ambiente da Zona da Mata. A cidade vai se revelando como ambiente de moradia de suas distintas classes, entendido o conceito de classe como expressão e resultado da produção do modo estabelecido, em que uns poucos detêm os meios de produção, como a terra e a indústria - a burguesia, e os demais vivem de força de seus trabalhos - a
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classe trabalhadora. Em Colônia, claramente, há aqueles que detêm os meios de produção, a exemplo das grandes propriedades de terras e os usineiros, considerando a existência de duas indústrias no município, ligadas à produção do álcool e do açúcar. São tidos como os “plantadores de cana”. Esquecem de propósito que quem, de forma efetiva, realizou esse trabalho de plantar cana - os antigos “tiradores de conta” (ticuqueiros), os cortadores de cana (canavieiros) - enfim, foram e ainda são os trabalhadores do campo. Além disso, há a constituição de um setor médio de assalariados que trabalha na Prefeitura e outros poucos em serviços do Estado e do comércio. Como setores médios, muito próximos do setor agrário, situa-se o pequeno comerciante e os médios, estes raros, que desejam expressão política partidária, participando de momentos de decisões eleitorais.
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À medida que se aventura ao interior da composição das classes locais, descobrem-se as forças políticas que têm assegurado
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a orientação moral e direção política da cidade. Há pouco mais de um século, constituíram o poder institucional com a criação de Prefeituras que vieram substituir o ponto de encontro geral que fora a Casa-Grande, ambiente de soluções de problemas, apadrinhamentos, ambiente de disputas pelo poder político com acordos de compras e vendas, inclusive, das próprias pessoas. Mudou-se o espaço de encontros, mas manteve-se o poder de mando. A Prefeitura é o ambiente de soluções de questões pendentes, desde a compra de uma bola para formação de um time de futebol até as próprias disputas eleitorais. Quando menos, o que se ver é a cultura da dependência e do “pedido”, originária na Casa-Grande, deslocar-se da Prefeitura recaindo sobre a Câmara de Vereadores, com os permanentes pedidos de pessoas, em busca de solução de seus problemas imediatos. Para Gaudêncio Torquato (2015), “O Estado brasileiro jamais deixou de ser considerado por parcela significativa da elite como “cosa nostra”, núcleo da grande família”. É a concretização da força da ideologia vitoriosa da classe dominante, entendida como aquele grupo que assegura o poder de mandar, ao manter-se pela força da hegemonia política ou pelo convencimento. Hegemonia entendida gramscianamente como produto das relações de produção que constituem a estrutura econômica da sociedade e sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política. Essa dominação expressase, como indica Limoeiro (1978: 42), “... existindo no jurídico, no político e nos demais aspectos (religiosos, artísticos, filosóficos) que passam a compor a superestrutura da sociedade”. Como se vê, todos esses sistemas formam um só conjunto. São determinações da base econômica e que, mesmo assim, às vezes, entram em conflitos internos. Explicam-se dessa forma as mudanças de
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opções tantas vezes realizadas pelos ditos “políticos” locais, ou o ´troca-troca` de partidos. Por outro lado, os trabalhadores passam a negar a construção de sua própria identidade ao declarar que é melhor votar em rico pois não rouba. Como se não houvesse corrupção entre os ditos “colarinhos brancos”. Esta expressão de senso comum contribui ao descrédito da própria Política quando veicula que “todo político é ladrão”. Mas, tudo isto não passa de mecanismos ideológicos afugentadores dos trabalhadores das lides partidárias, além de um desrespeito aos cidadãos e ao governo da cidade, aos negócios públicos. O bem estar das pessoas precisa ser tratado como questão pública e ser cuidado pela Política. A sociedade civil em Colônia compõe-se a partir de associações várias como a de motoristas, associações religiosas, de pequenos produtores, dos sindicatos rural e de servidores públicos - e de poucas cooperativas sempre com pouca expressão política, cujos líderes gravitam em encontrar conquistas junto à Prefeitura ou ao jurídico, aos usineiros, inclusive quando das épocas de negociação salarial coletiva. Uma sociedade civil com forte debilidade organizativa. Contraditoriamente, com a passagem do Pe. Aldo, pela região, vários líderes sindicais foram formados com a ideologia de suas classes, durante o tempo de sua presença na Paróquia. Passados esses tempos, o caudal dominante político volta ao seu lugar e os sindicatos assumem a rotina da conservação e pouca ação. Destaca-se a organização religiosa, com mais de 20 templos, sendo a mais importante representação a da Igreja Católica, acompanhada pela Igreja Assembleia de Deus, com 10 desses templos. Na visão de Florestand Fernandes, um dos patronos que compõe a Academia de Cultura local, religiosos que representam os “brancos” e que sempre esperam tornar “... trabalhador passivo,
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obediente, franco colaborador...”(p. 107). Algo como parecido à compreensão de Gilberto Freyre, em Casa Grande e Senzala (2013), sendo revelada nos versos de Manoel Bandeira, como “Grande livro que fala desta nossa leseira brasileira. Mas com aquele forte cheiro e sabor do Norte - dos engenhos de cana”. É quase a compreensão de uma escravidão cheia de bondades para com os escravos, um algo nunca existente. O que a mantém é a dimensão da opressão e do sofrimento. A construção de um sujeito assujeitado ao dominador. Contraditoriamente,
este
sistema,
historicamente,
já
provocou várias expressões de rebeldia, como a de Zumbi e a Cabanada, além das lutas impulsionadas pelas Ligas Camponesas. Mas, os desejos dominantes são muito distantes daqueles de que as pessoas se tornem sujeitos ativos e criadores de sua realidade. O que há são sujeitos submetidos a uma ordem estatal e espiritual. Na linguagem de Lacan, psicanalista francês, como um sujeito, sujeitado ao grande Outro. Nesses últimos 65 anos da vida política de Colônia, a cidade teve como Prefeito Durval Gonçalves, administrador de terras de vários engenhos da Usina Santa Therezinha, uma das maiores da América Latina, nas décadas de 1950 e 1960. É apresentado pelo amigo Alfredo de Paula Cavalcanti, então vereador e senhor do Engenho Santo Antônio. Entrar na cidade pela via principal precisava-se cruzar as suas terras. Foi dirigente do Partido Social Democrático (PSD), a confluência das forças políticas conservadoras do campo, dos senhores do campo, formando a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), após a quartelada de 1964. Em seguida, Alfredo elege-se Prefeito, pela primeira vez. Passa o bastão da Prefeitura para o seu afilhado Manoel de França com as qualidades descritas por Ernane Santana Santos (2015), como:
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... homem justo e probo com a coisa pública, zeloso e temente a Deus. Muito católico, chegou a ser presidente da Liga Católica Apostólica Romana de nossa cidade. Sua indicação teve a forte influência de seus padrinhos políticos Alfredo e D. Maroquinha - a qual pertencia à liga do Apostolado do Sagrado Coração de Jesus.
Um gestor da confiança de um grupo religioso, gestado no interior da sacristia da Igreja Católica, foi o ungido. Pois que, dessa forma talvez, como temer em não representar o Alfredo como continuador da gestão, possibilitando o seu retorno à Prefeitura novamente, como ocorrera? Severino Rocha(1915) assistira, em certo momento, uma afirmação de Alfredo de que “... se botasse um poste para candidato, este seria eleito”. Para ele, “praticamente, Alfredo nomeou o Manoel de França Prefeito da cidade”. Desse modo, Alfredo iniciou um período de 12 anos de liderança absoluta como um “meigo coronel”. Mas de sua doçura, outrossim, chegou a jorrar as raivas de derrotas quando proibiu a água ao povo de uma das poucas fontes, situada em seu engenho, devido a não eleição a deputado de seu genro, o Balé. Por outro lado, iniciou um período de contradições do próprio grupo, gerando as futuras lideranças sem haver tanto o seu apoio, como o Antônio Lins da Rocha, jovem e promissor comerciante, além de José Gomes de Lima(Zequinha), um legítimo filho das classes pobres, as classes trabalhadoras. Correndo paralelo ao grupo, em faixa própria, contudo fazendo parte do mesmo grupo ideológico conservador, está Zé Lessa, usineiro da Usina Taquara, fomentador das investidas políticas de José Maria de Omena e do José Santana de Melo, tempos depois. O Omena chegou a assumir uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado, quando fora suplente de
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deputado. Na Câmara de Vereadores, tornou-se seu Presidente, enquanto que o José Santana chegou a Prefeito. O usineiro Zé Lessa comandou o município por 9 anos, pessoalmente, tendo sido Prefeito por apenas dois mandatos, por meio da força financeira. Mesmo que gerenciada por outras mãos, a usinagem deseja retorno de seu novo filho ao comando político local com o Manuilson Andrade. Aparecem, portanto, dois grupos claramente opostos, mas sem política de diferenciação. Ambos pertencem aos mesmos grupos ideológicos e que se revezam no comando político da cidade, dando impressão à população que a cidade está mudando. Zequinha, por sua vez, liderou a cidade por 9 anos. Para isto, tornou-se oposição, chegando vitorioso contra todos os grupos que vinham dominando - Alfredo, Antônio Lins e Zé Lessa. Ele foi um filho dos trabalhadores que fora escolarizado na escola da dominação. Mesmo conseguindo a vitória contra eles, com forte apelo popular, não se propôs a promover a formação de novas lideranças para a sua classe. Não se preocupou na construção de novos líderes. Devolveu o comando à velha política da usinagem ao apoiar o usineiro Zé Lessa que não o havia apoiado, anteriormente. Nininha (Lima, 2015), tentando justificar essas reviravoltas dadas por ele e sua luta para governar a cidade e realizar a sua política, afirma que “tudo isso só foi possível, pois teve que se aliar ora com Antônio Lins e ora com Zé Lessa” (id. 2015). Do ponto de vista da classe social, nada estava fora do lugar. Mais adiante, três décadas posteriores, a Usina Taquara muda de proprietários. O novo usineiro é José Maria Quirino que se volta de novo à política da cidade, investindo em seu sobrinho Manuilson Andrade. Este governou a cidade por 12 anos seguidos, contados com a eleição do seu sucessor, Cássio Urtiga. Posterior a
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uma disputa interna na família da usina, entre o tio Zé Maria e o Manuilson, este perde a campanha para uma vereadora, esposa do maior plantador de cana da cidade, com fortes ligações com o usineiro e esposa do membro-diretor da mais importante associação de plantadores de cana do Estado. E, com forte ascendência sobre sua mulher, a prefeita, vem dando a tônica ideológica da mesma política dos Senhores de Engenho. Portanto, a oposição tem adquirido significado de apenas permuta de nomes, conduzindo as pessoas a apostarem em mudanças “mais profundas”, mas que nunca vêm. As mudanças são asseguradas, tão somente, pela prática da troca de trabalhadores eventuais da Prefeitura após a definição do nome do Prefeito de plantão. Sempre são esses trabalhadores os primeiros a pagarem a conta do final da festança eleitoral. Continuam aqueles que sempre estiveram no posto de mando da economia local. Como lembra Ricardo Brasilino(2015), “Eu analiso a política como um projeto necessário para Colônia. Mas não é isto que se vê. Muitos grupos, hoje, estão com a Prefeita Paula pois ela é a Prefeita mas podem deixá-la na mão”. É a fascinação do poder. Um movimento importante que aparentemente fugia da tradição foi com o Severiano. Um nome que se colocou na oposição, vindo pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) para estruturar um novo campo ideológico na política local. Impossível para ele a realização dessa vigorosa e gigantesca tarefa. Não entendeu o seu papel e liderou um processo, mas que não conseguiu afirmar-se como líder. Não estava isto claro em sua cabeça e, além disso, a sua condição de classe, de filho de grande plantador de cana, não demandaria e nem compreenderia essa áurea tarefa.
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A mesma história se repetiu com a campanha de sua exmulher Luciana Luna, filha de dono de engenho e ex-juiz de direito, tendo perdido várias campanhas, mesmo reconhecida como uma líder com propostas voltadas ao povo. Em tempos atrás, abandonou um grupo de apoio a sua candidatura, um grupo de formação crítica e de esquerda, para filiar-se ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Contraditoriamente, nas últimas eleições, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores (PT), sob condição de se nomear como Vice-Prefeita na chapa do usineiro Zé Maria. Esse projeto não prosperou. Então, deixou essa sigla, dois anos depois. A ela vem se oferecendo uma difícil tarefa que é a realização dos anseios da população. Mesmo que o seu discurso seja voltado às necessidades do povo, mas o seu brilho tem a luz da mesma tintura ideológica daqueles que pensava combater - os senhores da Casa-Grande. Esses políticos, em sua maioria, são denominados pelos trabalhadores e pelos eleitores como sendo pessoas boas. Para o vereador Brasilino (2015), “há muita gente boa em Colônia”. Qualquer pessoa pode aceitar a afirmativa como verdadeira. A questão é para onde se dirige essa bondade: para os outros ou para si mesmo? Contudo, as contradições expõem caminhos aos que vivem em terras cabanas. Em 1982, com a fundação do Partido dos Trabalhadores (PT), surge uma alternativa política à cidade, tentando escapar de amarras dos dominantes. São passados mais de 30 anos e suas lideranças não convenceram o eleitorado local. Só, agora, em 2014, foi possível a eleição do primeiro vereador explicitamente com aqueles compromissos, o vereador Antônio Timóteo(PT) e com todas as suas limitações ideológicas.
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Outros vereadores e vereadoras até são originários das classes trabalhadoras, porém todos sem a ideologia classista. Outro importante movimento pela autonomia aparece nos meados da década de 1980 e início de 1990. Movimentam-se os estudantes criando seu próprio movimento, mas sem assegurar a sua permanência. De qualquer maneira, foi um movimento que projetou para política partidária José Júnior Amorim, atualmente assessor parlamentar e autor de livro sobre esse movimento estudantil; Wilma Ferreira, graduada em Biologia e Secretária de Serviço Social; Gilberto Sobreira, ex-assessor do Prefeito Manuilson; Franklin Amorim, Presidente da Câmara de Vereadores e o atual vereador e professor de música Vitalino, além de outros. Todavia, surgiram candidatos a Prefeito, originários do outro naipe ideológico, filhos de trabalhadores, como Irapuan e, posteriormente, Adelmo que atualmente procura dar organicidade ao Partido Comunista do Brasil (PC do B), aliando-se a corrente religiosa protestante. São todos filhos das classes trabalhadoras, mas que não conseguiram avanços importantes junto à comunidade, do ponto de vista eleitoral. No entanto, uma grande dificuldade assola a ideologia no país, posta aos partidos de esquerda, presente na política eleitoral de Colônia, e já detectada por outros pensadores, que é a dificuldade na demonstração de que as mudanças radicais mais profundas venham mesmo desse ambiente da cultura socialista, da cultura crítica. Enquanto isso, a Casa-Grande comanda a galope a manutenção do conservadorismo. E apenas uma exceção dessa regra, a justificativa da regra, a eleição de D. Telma para prefeita, esposa do ex-Prefeito José Santana de Melo que fora eleita distante dessa tradição inteira. Contudo,
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fora impedida de governar, contando para isso, também, com as dificuldades de sua própria administração com as nomeações familiares equivocadas. Todavia, não estaria a questão de gênero contribuindo ao insucesso desse governo?
Preconceitos de gênero e étnico Os elementos que compõem os traços culturais do presente são marcas do longo aprendizado entre gerações. As maneiras de como os gêneros se relacionam são processos de aprendizagem e de ensino trazidos pela escola e pela vida fora dela. As relações entre etnias e mesmo outros preconceitos dos agrupamentos humanos são caminhos ensinados e aprendidos no percorrer do viver de cada um. As pessoas nascem e tornam-se humanas. Os elementos da cultura são repassados de gerações à gerações através dos mecanismos escolares formais e dos ambientes públicos, considerando que a aprendizagem e o ensino não ocorrem apenas nos espaços das escolas. São produtos do processo histórico de cada geração. As relações entre homens e mulheres seguem o mesmo desenvolvimento, inclusive nas questões sexuais. Todos esses processos históricos são construídos. Os padrões culturais ainda influenciam muito na divisão sexual do trabalho, fazendo com que as mulheres exerçam várias funções. Elas conquistaram espaço em lutas coletivas, mesmo assim, os padrões culturais não deixam de influenciar na divisão sexual do trabalho, nas tomadas de decisões e nas esferas do poder (TEIXEIRA & OLIVEIRA: 2013: 28).
Na região da mata nordestina, as mulheres assumiram também o trabalho do campo, do limpar mato e do cortar cana,
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mesmo que tais tipos de trabalho permaneçam masculinos. Durante os pleitos eleitorais, várias mulheres foram determinantes. Ernane Santana Santos(2015) afirma que foram fundamentais na definição de Antônio Lins como candidato, chamado de “Galegão”. Na campanha de Zequinha, Nininha Lima(2015) lembra a importante participação das mulheres na composição e definição da campanha de seu esposo. Também, por várias vezes, Luciana Luna fora candidata, inconteste liderança local, mas sem ter conseguido o sucesso eleitoral necessário. Por outro lado, é importante destacar que as relações de gênero, na Zona da Mata, bem como as relações sexuais entre homens e mulheres, seguem os padrões descritos por Gilberto Freyre, no livro Casa Grande & Senzala, quando descreve a respeito da relação do escravo negro na vida sexual da vida brasileira. Evidencia a “disponibilidade” das mulheres negras aos Senhores de Engenho que além da branca senhora de engenho, mantinham relações sexuais com essas, ainda. A Senzala, por sua vez, não dispunha sequer de ambiente reservado para este tipo de relação amorosa entre os negros. Na região da mata, passados mais de 100 anos da Lei Áurea, ainda mantivera a meia-parede para a separação entre as pequenas casas juntas, denominados de “arruados” nos engenhos da região. A mulher negra na casa grande, “... nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama de vento, a primeira sensação completa de homem” (FREYRE, 2013: 267). Elas serviam inclusive como iniciadoras da vida sexual dos filhos daqueles senhores e senhoras. Em Colônia, tal cultura perdura até os tempos atuais entre as elites, bem como entre classes trabalhadoras, do mesmo modo. Vários dos mais importantes dirigentes políticos mantiveram a sua fiel esposa e outro relacionamento paralelo, conforme é sabido
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em toda a comunidade. Manifestam, dessa forma, a dificuldade no trato com as relações de gênero e o machismo encastelado nas mentalidades dos homens do lugar. Dizia-se de uma dessas senhoras casadas, a existência de forte ciúme em relação ao seu esposo político, devido a todas “essas molecas”. Mas, a questão de gênero pôde se expressar quando o Prefeito Bilau, filho da classe trabalhadora, representando-a pela Destilaria Porto Alegre, mas sem consciência desse papel, optou pela campanha de Zé Lessa, o usineiro, negando compromissos anteriores com a primeira mulher candidata, esposa do ex-Prefeito Zé Santana de Melo, D. Telma. Esta seria uma grande novidade para a cidade. Apesar de tudo isso, foi ela vitoriosa enfrentando todas as forças dominantes tradicionais. Mas, não conseguiu tocar a contento o seu governo. Imaginam-se equívocos que passam pela composição familiar de seu governo, tendo sido, todavia, impedida de fazer gestão, sendo cassada por duas vezes. Possivelmente, as elites não aceitavam ser governadas por uma mulher e, além disso, fora de seu controle. A própria Luciana Luna, segundo afirmam os moradores do lugar, em vários momentos dos comícios, durante a sua campanha para Prefeita, foi detratada por seus opositores, sendo atacada no campo da moral, o que expressa o falso moralismo das elites locais e o preconceito de gênero. Possivelmente, isto ocorra nos momentos atuais. Há uma segunda mulher na Prefeitura. Um governo que parece seguir com profundas dificuldades no gerenciamento da Casa-Grande. Uma dificuldade, talvez, seria a insistência de seu esposo em ser a voz última nas definições políticas do Governo Municipal, como é propalado na cidade, tendo sido Secretário de Finanças,
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no início do governo da Prefeita Paula. Passa para a população a existência de uma duplicidade na gestão. O preconceito aparece na compreensão veiculada de que as mulheres não sabem governar. Entretanto, isto não significa que a ação de governar da Prefeita esteja a depender somente da questão de gênero. Quanto ao problema étnico, a expressão de preconceitos é assistida no interior mesmo dos grupos da elite. Nas campanhas políticas de Alfredo e de Antônio Lins, a presença do Zequinha sempre foi marcante como forte cabo eleitoral. Sempre fora tido como hábil político, acompanhado por seu irmão Didi - uma dupla de vitoriosos. Construiu a reputação de um carismático político, tendo sido vereador por dois mandatos, além de Presidente da Câmara. Zequinha, contudo, não era um branco, nas exigências do agrupamento da elite a quem ele tanto servira. Zequinha, tal qual Labão, que nos versos de Luiz Vaz de Camões, não servia ao pai (os brancos dominantes) de sua pretendente mas a ela (Prefeitura) que por prêmio pretendia. A pretensão de Zequinha era ela, a política, e não os seus proprietários, naquele momento. Foi Vice-Prefeito de Antônio Lins, mas quando do seu desejo de se tornar Prefeito do município, outras razões pesaram. Ele teve que enfrentar todo o conjunto de resistência de todos os lados, reunido nas figuras de Alfredo, Antônio Lins e Zé Lessa, os senhores da política, da Casa-Grande. A candidatura de Zequinha cresceu. Ele demonstrava a sua habilidade com o eleitorado. Na sua casa, chegaram a fazer reuniões para o demolirem do seu intento de ser Prefeito. “A sua casa era uma casa sem tramela” como dissera Ernane Santana Santos (2015). Zequinha não era branco como eles. Não conseguiram dissuadi-lo da candidatura devido sua obstinação em caminho à Prefeitura.
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Hoje, eu posso melhor ver que as elites, os ricos de Colônia não aceitavam e nunca aceitaram Zequinha. Foi chamado até de “Zequinha Macaco”. Ele nunca se incomodou com isto. Sabia que era coisa política. Vejo que só por conta da cor. Zequinha era negro, nascido na Rua da Lama e como poderia ser Prefeito da cidade? Ele passava a ser um estranho no ninho(Nininha Lima, 2015).
O que se vê é o preconceito racial intrincado nas elites locais, além do preconceito de classe. Zequinha era, sobretudo, um filho da classe trabalhadora mesmo que sem a consciência dela. Sempre viveu com a força de seu trabalho. Os desejos elitistas eram a sua manutenção como um forte cabo eleitoral, com necessário portfólio para campanhas, mas como Prefeito, isto foi demais. Algo semelhante ocorreu com José Brasilino, o vereador com maior número de mandatos na cidade, mas que não era aceito para ir à frente, para além desse posto institucional. Mesmo que transitasse nas hostes tanto de Alfredo como Zé Lessa, nunca lhe foi dada a oportunidade além disso. Era apenas um bom cabo eleitoral. Foi vereador por toda a vida. Se mais vida tivesse mais vereador seria. “Meu pai acompanhou o usineiro por várias eleições. Ele fez parte do grupo de Alfredo e do grupo político do usineiro”(Brasilino, 2015). Do ponto de vista da representação da classe social, não houve qualquer contradição em suas opções em participar de ambos os grupos, durante sua carreira política. Eles sempre foram a mesma coisa, apesar de, às vezes, exibirem-se em lados opostos. Isto se repete em todo o País. Muito se veem nacionalmente esses preconceitos das elites brancas e classes médias em relação ao ex-presidente Lula e à primeira mulher na Presidência da
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República. São os primeiros fora do diapasão dominante, após 500 anos, a chegarem ao cargo maior da República. Isto, na verdade, tem sido demais para as elites governantes do País. O preconceito étnico e de classe aparece ainda na relação com outros candidatos da classe trabalhadora. O candidato Adelmo, postulante à Prefeitura pelo PT, era denominado de “Adelmo Braçinho”, em alusão à sua deficiência física. O Irapuan, um negro, que igualmente foi candidato pelo PT, era chamado do “Barbudo Maluco”, devido a sua barba. A negra petista Ivanilda, candidata a vereadora, era denominada simplesmente de “a neguinha”, sem qualquer conotação de carinho para com ela mas de muito rancor contra a sua atitude de ser candidata. A um negro e, muito menos, uma negra cabe fazer política partidária! A política sempre foi ambiente para brancos, nas visões dominantes. Essas atitudes são repassadas às crianças e, inclusive, entre os de mesma classe social. Arraigados estão a aprendizagem e o ensino do preconceito aos filhos e filhas negras, índias, minorias e até de regiões diferentes do país. Introjetam-lhes a negação da própria cor, da região e da classe. O que é o jargão, tido como verdade absoluta, de que melhor é votar em rico, em usineiro, em Senhor de Engenho que em trabalhador? Uma visão ideológica que naturaliza em si mesmo e na classe trabalhadora a aceitação do preconceito inclusive contra a própria classe. Querem as elites que o poder mantenha-se nas mãos de sua cor. Desejam que as cores outras sejam extirpadas em um ambiente em que a economia foi totalmente debênture aos escravos negros e índios e, hoje, aos canavieiros. Isso se propaga um desejo entre os descendentes de negros, de índios e demais etnias para que se esforcem para se tornarem brancos. Mas, como? Tarefa impossível
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como faz ver Geni Guimarães em seu livro sobre A Cor da Ternura (1989: 69): “Esfreguei, esfreguei e vi que diante de tanta dor era impossível tirar todo o negro da pele”. Acrescente-se a isto a defesa da ideologia branca entre os próprios líderes das classes trabalhadoras. A ideologia dominante convence com seu desejo as mentes e corações dos dominados para que neguem a sua origem, neguem a sua classe, neguem a sua cor e neguem a si mesmos. Sejam seres inexistentes. Subsumam-se na escuridão do silêncio. A população de Colônia é de negros, de índios e de seus descendentes. Estes são os verdadeiros construtores desta cidade, além de pouquíssimos brancos. Uma identidade mesclada que só gera orgulho, todavia, precisa ser negada para a manutenção da dominação. Como gostaria o curumi de cor morena, de cabeça de cuia mas que desejava mesmo ser inglês. É o como não se desejar ser nordestino no sudeste ou sul do país, ou não aparecer como brasileiro quando no exterior. Entretanto, se sabe que mesmo com tantos dados, a interpretação está cheia de simbolismo. Como diz Vasconcelos (2013: 284)” ... mais adequados para expressar o significado de realidades subjetivas”. E é com simbolismo que a zona da cana continua, mesmo em profundo ambiente de crise da economia canavieira, atualmente. Assim, é que se buscam ainda ouvir as vozes do silêncio que tanto bradam e ecoam por essas bandas, matas e serras, pois muito cheias de lobisomem, ´comade fulozinha`, caipora, fogo-corredor, deuses, santos, fogos, fantasmas e sofrimentos:
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aprecio o entardecer, a praia, o silêncio, a brisa no rosto, a mata... Não é tanto por seus esplendores mas por evocarem minhas vozes interiores meus fantasmas e meus pensamentos-sentimentos (ib. 284). Estão soltos ao ar. Abrem-se, portanto, as possibilidades de serem conhecidas as ações concretas desses políticos por meio de seus principais instrumentos, os partidos políticos.
Partidos políticos Os partidos políticos aparecem como os instrumentos, no atual momento da organização da sociedade, de realização da política. Política entendida como tudo aquilo que diz respeito aos cidadãos, ao governo da cidade e aos negócios públicos. Arte como expressão da capacidade de planejar as ações para o dia de amanhã, o planejamento das coisas públicas. O político é traduzido como aquele em condição de “pastorear” o seu rebanho, na linguagem de Platão (Político, 1972: 320). Mas, que ferramenta é esta? Exatamente, uma associação com fins deliberados e executor de um plano com desejos objetivos, materiais ou ideais. Além disso, expressa objetivos pessoais, com resultados para determinadas pessoas. Esses objetivos podem ser coletivos e de conjuntos de indivíduos. Os partidos deveriam estar expressando muitos desejos de grupos e, portanto, oferecerem dimensões coletivas. O que se vê, contudo, é que expõem fortemente expressões de individualidade daqueles que se tornam seus proprietários e se voltam apenas ao interesse de apenas alguns. Se
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são partidos direcionados à democratização da sociedade, então, essas ferramentas careceriam conduzir as pessoas à participação nas decisões, no planejamento para ações de amanhã da vida da cidade, da vida da “polis”. Efetivamente, isto não tem ocorrido nas terras cabanas, a promoção da participação da coletividade. Ora, os escravos estavam sempre a mercê das ordens do Senhor de Engenho. Mesmo hoje, o poder de mando permanece. Ao povo está reservada a mera expectativa em saber o que eles, os ungidos das elites, definem para o coletivo. Tudo isso sob um manto de bondade e de engodo, emitindo discursos ideológicos de que todos estão participando das decisões. Todavia, essa participação é entendida como o exercício de definição das coisas da vida da cidade. Aqui, a cidadania é algo que o Senhor de Engenho assegurará aos seus súditos. Como nunca chegam a esse ponto, o exercício da cidadania da população mantém-se distante da questão central - a participação coletiva. Efetivamente, essa dimensão resume-se apenas ao chamado para o dia das eleições, cabendo, tão somente, o ato de votar. Observem-se os arranjos partidários em Colônia, na visão de Brasilino. Para ele, “Quatro eram, à época, os grupos claramente definidos: o grupo de Zequinha (sem feição de classe e apenas um agrupamento de pessoas), o de Zé Lessa (usineiro), o de Antônio Lins (alto comerciante) e o do PT, o Partido dos Trabalhadores “Brasilino (2015)”. Apercebe-se de que a estruturação de diferentes partidos, expressa por cada sigla, mesmo nas conversas informais não aparecem. O que interessa mesmo é o agrupamento das pessoas em torno de um líder e não a sigla do partido ou mesmo o projeto político e ideológico. Exceção é feita ao grupo constituído pelo PT que insiste em sua corporação interna, com uma ideologia claramente classista, promovendo a participação de seus filiados
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e, apesar disso, não consegue tanto escapar dessa formatação. “Eu analiso a política como um projeto necessário para Colônia” (BR A SI LI NO, 2015). A política para o vereador carece de muito mais amor ao coletivo, ao povo e menos ao indivíduo ou a sua pessoa (id, 2015). Os partidos são criados de maneira muito condicionada aos interesses pessoais e é comum que um grupo domine vários deles, promovendo a proliferação de siglas. Aquela diferenciação ideológica é deixada de lado. Mantém-se de forma dominante o interesse pessoal. Seguindo esse caminho, esse mesmo vereador criou duas agremiações partidárias, e claro, a serem utilizadas quando isto for de sua conveniência. Essas siglas são propriedades, em geral, de seus presidentes. Disputas praticamente inexistem para a definição de suas diretorias, desconhecendo-se qualquer fio condutor de vida orgânica. Os partidos atuam, único e exclusivamente, em tempos de eleições. É comum ver os seus “aperreios”, quando dos tempos pre-eleitorais, com a descoberta de que estão irregulares em suas burocracias, não tendo atualizado os filiados e até a própria direção. Os partidos são letras vazias e nada mais. São úteis para o exercício das barganhas de toda a natureza por meio das coligações ou facilitando coeficientes aos candidatos para atender a especial aritmética da legislação eleitoral. A sigla não oferece qualquer importância, e, talvez seja, num ambiente pontual, o reflexo do que acontece em todo o cenário da política nacional. Os eleitores do local desconhecem que os seus votos, adquiridos dessa maneira, vão inclusive alimentar a política estadual e nacional. De maneira contraditória, porém, a primeira novidade eleitoral na cidade foi dos tempos de criação do MDB, o Movimento
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Democrático Brasileiro, que se opunha à ditadura, desde a quartelada de 1964. Pessoas ligadas ao Severino Rocha, Vavá do Posto e Antônio Gordo conversavam dessa possibilidade, pois os mesmos cansados estavam desse “lenga-lenga” eleitoral. O próprio Severino, que era presidente de outra sigla partidária, resolvera criar, juntamente com essas pessoas, esse novo partido. Até então, oposição ideológica alguma existia no cenário eleitoral local e nem mesmo com essa iniciativa o quadro foi alterado. No entanto, uma oposição ideológica parecia rondar a política da cidade apesar de que Severino Rocha viera da mesma sigla daqueles dos quais se afastava, compondo praticamente uma mesma visão da política. Na eleição de 1982, Severino Rocha e Vavá do Posto candidataramse pelo MDB, possibilitando a construção do primeiro momento expressivo de oposição com perfumes ideológicos às relações políticas locais. Mas, ao que parece, se diz que houve algum acordo entre Antônio Lins e Severino, que eram primos, gerando essa oposição em comum acordo. Para Ernane Santana (2015), “... nesse momento estava selado o destino das candidaturas da oposição”. Os partidos são totalmente desconhecidos para o eleitor e suas divergências são tênues. Apenas quando Severiano Freitas assume a Prefeitura pelo PMDB parece surgir alguma diferença inicial mas que foi desfeita logo posteriormente, pois também é um dos membros das elites locais. As decisões eleitorais nunca se tornaram permanentes em encontrar projetos de melhoria no reordenamento da cidade e de sua continuidade. O peso personalístico dos eleitos é maior. As suas políticas não dão continuidade às ações iniciadas anteriormente. Exceção foi o Prefeito Zé Lessa, que em algum momento, assegurou a continuidade de obras de Antônio Lins. O que havia mesmo era
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muito mais uma indisposição pessoal entre esses candidatos do que diferenças políticas ou ideológicas. As alianças mais duradouras nunca aconteceram ao tempo em que Ernane Santana (2015) vê estranheza na coligação de seu partido, o PFL, em 2012, com o PSDB. Mas não foi por questão ideológica. “Fiquei pasmo com a decisão inédita. Podíamos votar num candidato do PSDB para Prefeito, mas não podíamos compor como vice em sua chapa”. O que existe são apenas coligações momentâneas circunstanciais e não alianças para a realização de um programa de governo ou um planejamento político de longo prazo. Todavia, qual a necessidade de alianças já que quaisquer resultados teria sempre a continuidade do grupo dominante? Talvez, nenhuma. Ao povo mesmo são lançadas as migalhas dessas políticas. Aliás, o gráfico do planejamento apresentado em seguida representa a sua ausência em todos os governos municipais, no tempo em análise. Desconfia-se até que o governo municipal não tenha estado, sequer, nos últimos tempos, em sintonia com o planejamento nacional articulado - PAR, que é obrigatório à todas Prefeituras e Estados da Federação. E, cada vez que uma Prefeitura não exibe o seu PAR, põe atrasos em obras e não promove novas obras e serviços à população menos assistida. Para os setores dominantes, a Prefeitura funciona sem a necessidade do planejamento.
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Observe-se o gráfico abaixo:
O não planejamento é observado do mesmo modo pelos estudantes, através da União Municipal dos Estudantes Leopoldinenses (UMEL), que já nos idos de 1994 promovera um debate questionando o descaso para com a história política, social e cultural da cidade, pois “não há um planejamento nem a curto e nem a longo prazo para valorizar essas categorias. Concluiu-se que, a comunidade está a mercê da sorte e do esforço das suas organizações, que buscam de certa forma preservar as raízes culturais e as tradições da população” (AMORIM, 2011: 107). Essa ausência é sentida ainda no pouco esforço para a conformação partidária. Excetua-se, talvez, no PT que insiste em suas reuniões com frequência para a discussão da política local e, em geral, para atendimento das demandas do Diretório Regional do Partido, situado na Capital. Mesmo o Partido dos Trabalhadores não tem efetuado um processo de sua própria integração com a classe trabalhadora
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canavieira, nem mesmo com os setores públicos de servidores municipais ou da área do comércio local. A participação operária de ambas as usinas no partido nunca se realizou como o setor dos pequenos produtores, permanecendo a necessidade dessa articulação. Todavia, são passados mais de 30 anos de sua fundação no município. Eleitoralmente, baixa tem sido a capacidade aglutinadora de forças que operem fora da tradição. Ressaltese que somente a Igreja Católica, através do Pe. Aldo Giazzon, veiculou um processo religioso e educativo que deu um forte impulso a uma ideologia organizadora para a classe trabalhadora, num espaço de 12 anos, em que pesem as dificuldades enfrentadas por um sacerdote em suas relações com sua própria Igreja. Hoje, até foi criado o Partido Comunista do Brasil (PC do B). A sua ação política ainda não se evidenciou. Na perspectiva de seguir a trajetória fora da tradição dominante, muito empenho político será necessário. A política partidária local segue a unidade de seus contrários. As elites mantêm o seu mando e os organismos associativos de trabalhadores só expressam as suas debilidades. As bandeiras nacionais e neoliberais continuam a comandar a política nacional e as bandeiras socialistas a tremularem ao vento, sem sustentação em qualquer mastro da região. Todavia, não se vê movimento político que faça reconhecer a classe trabalhadora representada por algum organismo no ambiente das margens do Rio Jacuípe, nem setores de classe trabalhadora que expressem disputa com a burguesia local. Os sindicatos quando aparecem é no tempo das negociações dos dissídios coletivos, exclusivamente para a discussão salarial. O que há é algo amorfo sem expressão suficiente para se fazer ouvir após as campanhas salariais. Para o ex-Prefeito de Porto Alegre, Pont (2000:17), há um antídoto que vem das lutas sociais que é o
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processo da promoção do debate ideológico necessário no interior dos organismos dos trabalhadores. Para ele: “Este, no entanto, não é espontâneo, natural. Só ocorre pela organização daqueles que pensam e agem dessa forma e disputam a hegemonia e a construção pragmática e partidária”. Sem isto, a gangorra eleitoral permanece: uma vez lá, outra vez cá. Mas, o poder continua mantido por práticas e discursos da dominação. E como isto se expressa?
Discurso político e suas práticas A dominação revela o seu discurso e realiza práticas internalizando a sua compreensão de mundo nas classes que estão em situação de subalternidade. Dessa forma, alimentam o seu poder. Ora, poder que se expressa, desde Aristóteles, em três formas: o poder paterno, o poder despótico e o poder político. O poder se exerce distintamente a partir do interesse dos filhos, o poder paterno. O poder se exerce quando do interesse exclusivo do senhor, o poder despótico e, o poder político, pelo interesse de quem governa e de quem é governado. Este último trata daquele tipo de poder não exercido somente pelos interesses do governante. Este tipo é considerado o poder viciado e cheio de suas próprias desonras e em cada situação e ambiente peculiar. A busca é pelo poder da coletividade. Mas, hoje, fala-se de outra maneira a distinção do poder. Diz-se do poder econômico, do poder ideológico e do poder político. O poder econômico expressa-se nas condições da produção ou dos meios de produção. Para qualquer um da região da mata, a terra dos canaviais, este é o poder dos usineiros e de Senhores de Engenho. Com este poder, quem está em situação de penúria ou miséria, facilmente se rende às falsas promessas ou
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concessão de vantagens. O poder ideológico coloca, a partir de uma visão gramsciana, a perspectiva da hegemonia que sujeita as classes, submetidas às explicações do mundo das elites, as ideias que explicam os problemas, convencendo as maiorias de seus esclarecimentos, tidos como os verdadeiros e justos. E o poder político que traduz a posse de instrumentos promotores da força, em sua expressão mais ampla, sendo o poder coator. Todas essas formas, todavia, mantêm uma estrutura social profundamente desigual. Em Colônia pode-se falar de um estilo de governança que se pautou dessas várias formas, mantendo sempre a desigualdade entre as pessoas. Mas, é razoável destacar que esses governos municipais seguiram um estilo que aproximando-se de um certo populismo por parte do Alfredo, Antônio Lins, Zequinha, José Santana de Melo e Manuilson Andrade, efetivamente, avizinhamse muito mais de uma escola em que se evidenciou o personalismo. Este estilo de ser governo em que se deposita naquela pessoa a condição última de solução de seus problemas. Não há ambiente para o discurso da classe. Aqui, o líder é glorificado como o protetor das massas trabalhadoras. Toda força é assegurada àquele que representa as condições de mando e de solução de problemas. O eleitor submete-se aos desígnios do outro poderoso. A autonomia das pessoas é repassada ao senhor das condições materiais e econômicas. Os processos eleitorais têm tido essa marca, elevando o patamar das relações ao campo do ódio e da raiva mesmo passados os tempos eleitorais, considerando que “O meu protetor não pode perder a eleição”. O vereador Brasilino(2015) estranha a vida concreta da política na qual está lidando, quando talvez alimentou o seu sonho de no futuro ser um protetor dessas massas:
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A política, eu imaginava ser uma coisa mas é outra coisa bem diferente. Eu pensava que podia fazer tudo dar certo. Pensava que era possível atingir todos os objetivos, no sentido de ajudar a comunidade, a cidade. Mas, é tudo muito diferente.
Despertou desse sonho de ser religiosamente um salvador de uma comunidade ou de sua cidade. Viu que tudo era muito diferente, pois a política depende de mais gente. Depende do Prefeito, dos vereadores, bem como, de muitos interesses pessoais. Em Colônia, dependeu, com menor dimensão, do povo. Cada político pensa ter a melhor proposta para a cidade, mas essa melhor proposta passa por mais gente. O discurso político adquiriu variedades inclusive no mesmo campo ideológico da classe dominante. Quando Prefeito, o Manuilson combinara com o tio o seu apoio para que ele fosse o próximo candidato. Mas não cumpriu o acordo, rompendo naquele momento com o seu parente, o usineiro, segundo dizem na cidade. Da mesma forma, ocorreu com o Antônio Lins quando tinha Zequinha como vice e uma promessa de torná-lo Prefeito. Mas isto não ocorreu. São muitos os discursos e práticas que são vistas em geral como traições. Para Severino Rocha (2015), o que vem mais desestimulando a sua participação política é a prática do político e seu discurso. Mesmo na última eleição, um pleito com discurso de mudança, contudo houve muito gasto financeiro para ambas as chapas concorrentes. Mas, enfim, para onde vai a política partidária? “O voto só tem sentido se a ênfase for a conscientização das pessoas. Vender o voto é aquilo de mais estranho à cidadania” (Ibid, 2015). Portanto, as práticas de todos os grupos políticos precisam ser reconsideradas se o discurso for o desejo de mudar.
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A mudança não se processa apenas depois que ocorreu a eleição. Ela precisa estabelecer-se durante todo o processo eleitoral. Sobre o discurso dos políticos, Ernane (2015) bem caracteriza os distanciamentos dos mesmos. Como sistematizador de campanha, chegou a preparar, como médico, os discursos elaborados para o convencimento da população por parte do candidato Antônio Lins. Mas, este só utilizara dessa orientação por dois ou três comícios. Depois, descambou para a improvisação e o despautério. Antônio logo abandonou a orientação do discurso e passou a “usar em seus discursos uma linguagem menos acadêmica e que pudesse atingir mais em “cheio” o eleitorado”. As práticas são vistas, por exemplo, no campo das articulações para a candidatura de Zequinha. Ele e seu irmão foram velhos correligionários do Alfredo e que não aceitou a sua candidatura, posteriormente. As práticas se distanciam dos amigos e a maldade passa muito próximo. Como afirma Fernando Henrique Cardoso (2015), ao expor questões políticas no seu tempo de presidência, que “O mal está no grupo próximo a mim”. E a prática do mesmo Zequinha, após o seu mandato, foi anunciar em cima dos últimos prazos de candidaturas a candidatura do usineiro Zé Lessa, aquele que não o tinha apoiado. Os discursos eleitorais discorrem apenas sobre amenidades locais, com fugas aos problemas reais. Quando muito, pensam sobre soluções de problemas localizados sem a menor dimensão de que esses estão ligados a questões políticas estaduais e nacionais. Nos comícios, contudo, chega-se às raias da agressão verbal, existindo, inclusive, ataques a moral das pessoas - uma prática também da política nacional.
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A região acumula historicamente um acervo de problemas que precisa ser equacionado a curto, médio e longo prazos. A educação é um desses problemas. O apoio aos pequenos produtores se arrasta na esteira dos desejos de mudanças de culturas agrícolas da região para a superação das dificuldades que enfrenta a monocultura da cana. As soluções práticas desses discursos estão voltadas apenas a pequenas soluções de necessidades particulares. As promessas são a regra do discurso e a não realização é a prática mais difundida. Mas essas práticas têm enfrentado dificuldades não só nas Câmaras de Vereadores, em análises ao trabalho do Executivo. O Cássio, por exemplo, foi afastado pelo Judiciário, que como diz Ernane (2015) “... antes mesmo que a Câmara terminasse de apresentar a apuração dos fatos, através de uma Comissão Processante por nós instalada”. As ações políticas não têm despertado para as questões mais pendentes do município como a que ronda os canaviais, com a quebra de usinas que tem sido constante no Nordeste do País. Os momentos de crises também avançam sobre em toda a região da cana e atingirão a sua célula que é o município. As usinas são expressão do avanço do capitalismo no campo, pondo fim aos engenhos de açúcar. Hoje, parece haver uma regressão capitalista na economia. Na região, cada vez mais se agudiza a relação capital versus trabalho. O trabalho parece sumir e abre-se um movimento reacionário contra todos os tipos de socialização de bens aos mais necessitados, a exemplos de bolsas contra a fome, asseguradas pelo Governo Federal. Mas o discurso e as práticas passam por longe dessas questões mais amplas que não parecem estar batendo às portas municipais. Pensa-se com
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Xavier ( 1993: 213), que já via a regressão das relações capitalistas de produção, como “... das forças produtivas, abrindo passo para a mutação da industrialização em desindustrialização” . Os políticos não se apercebem, enfim, da não realização de promessas devido a própria impotência de um município em solucionar questões de dimensões muito superiores às suas forças econômica e financeira. Avançam, quando muito, ao trabalho assistencial, base para a manutenção do poder de mando. Não há discussões com aqueles sujeitos, tidos como maiorias, pois já passou o tempo deles, o tempo das votações. Não se interessam mais por desejos dessas maiorias, suas condições e perspectivas. Não se abrem para novos caminhos, criando mais impasses. As vidas dos tempos de eleições são vidas nuas, como imagina Zizek (2013), à moda de Antígona na luta pelo direito de enterrar o seu irmão, despidas de quaisquer tipos de anseios, reclusas tais quais em campos de concentração. Aquelas vidas são apenas votos e nada mais.
Políticas e ideologias Na versão aristotélica, todo humano é um animal político e, portanto, em condição para a participação da vida do seu lugar. Mas não é bem isto o que ocorre pois a participação na vida da sociedade, o conhecimento de suas várias formas do poder se expressar são desconhecidas para uma maioria. Além do mais, às pessoas faltam-lhes as condições para exercer a prática política e construir possíveis alternativas de interpretação, construindo suas próprias interpretações de mundo. Desconhecem o próprio sistema de governo, a natureza do mesmo, a validade e a justificação das decisões e as explicações do mundo, pondo em cheque a capacidade
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de se tornarem cidadãos. A definição das políticas desenvolvidas está fora do seu alcance e as ações geradas são sempre aquelas ideias dominantes. Estar às vistas quem são os poderosos do lugar. São aqueles que detêm o poder econômico, pois com este agenciamse aos demais poderes: político e ideológico. Em Colônia, este poder econômico tem sido aquele que define as relações sociais e asseguradas as explicações da realidade às pessoas. O poder econômico também assenhorou-se do poder político, este que em última instância detém a força. É sabido que houve tempos em que políticos mandavam prender algum desafeto. Passados alguns dias, eles mesmos, surgiam abalados com a aquela situação e, então, mandavam soltar a pessoa a quem mandaram prender, como demonstração de poder de mando total na comunidade e trazê-la às rédeas de sua dominação. Enfim, uma sociedade que está dividida em uma pequena fatia da sociedade que se expõe como superior e uma grande fatia que precisa incorporar a sua inferioridade por meio de processos ideológicos, seja pela utilização da força ou pelo convencimento.Tudo isto tem forte contribuição da desorganização da sociedade civil da região que se encontra em praticamente total anomia e, portanto, sem condição de esboçar ações políticas autônomas. As finalidades dessas ações políticas dominantes são as definidas pelas políticas em nível de Estado e de País, variando de tempos e circunstâncias. Se a política é a razão do Estado, então, a razão e a moral naquele ambiente de comunidade são as do poder econômico. Contribuem à situação a falta de capacidade de direção de grupos não dirigentes de políticas sociais - as classes trabalhadoras. Não se tem conseguido até o momento a concretização de um projeto político que tenha tido alcance para governar, seja com
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as forças autonomamente ou definidas por processos de alianças. Aliás, se quer, há algum projeto conhecido. Sabe-se dos esboços muito gerais que os candidatos a Prefeito apresentam ao judiciário eleitoral. Este poder, inclusive, só nas últimas décadas vem demonstrando esforço para se manter na neutralidade quando das eleições. Contraditoriamente, as forças dominantes locais não o apresentam. Isto não significa uma inexistência, pois tal tarefa já é feita pelas elites do Estado e do País. Essas forças procuram universalizar seus interesses particulares de grupos que a constituem, bem como da própria classe, reproduzindo-o em todos os recantos. Ainda, atraem boa parte da intelectualidade para fundamentação desses projetos nacionais. Em Colônia, no momento de definição de candidatos, pela primeira vez, aquela hegemonia foi ameaçada por meio de um dos seus agentes - o Zequinha - que nem fora senhor de engenho e nem usineiro. O próprio Antônio Lins, quebra o compromisso de apoio a ele, passando a defender o usineiro Zé Lessa. Agora, haveria, na continuidade, uma grande disputa na manutenção ou não dessa sequência a ser quebrada por Zequinha. Segundo Lúriva (nininha) (2015), “Zequinha só conseguiu se candidatar pela oposição interna no partido, ainda, pela Arena 2”. Ela iria compreender melhor isto, muito tempo depois, quando vê que “hoje eu posso ver que as elites, os ricos de Colônia não aceitavam e nunca aceitaram Zequinha”. E aí, pouco interessou aos donos do poder que ele tenha sido um político que sempre demonstrou seriedade no trato com a coisa pública, exercendo mandatos de vereador. Brasilino (2015) o teve com muita estima. Para ele, sempre o teve com apreço e o respeitou como sendo um político com honestidade. Zequinha realizou uma das campanhas mais populares já ocorrida. Severino Rocha(2015)
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destacou que” tinha gente que vinha, na conversa de ouvidos, passar dinheiro para Zequinha, um dinheiro que tinha recebido da Usina ou de Antônio Lins”. As ações políticas e o jogo ideológico pelas opções, inclusive de gênero e etnia, põem à vista a profunda dificuldade da Prefeita Telma de exercer seu mandato, considerando, além disso, as suas nomeações familiares. Somem-se ainda as dificuldades das elites em aceitarem o governo de uma mulher fora de suas amarras. Houve os impeachments ao seu governo, concluindo seu mandato como um dos mais difíceis governos da cidade. Há contradições inclusive no campo das elites locais. Em determinado momento, desavenças familiares jogam os parentes em campos diferentes, porém com a mesma base de gerenciamento da política - as elites. O Manuilson derrotou seu tio, algo inesperado, mas que vieram, posteriormente, superar essas divergências. O campo ideológico não fora abalado com esses estranhamentos familiares. O povo assistiu com espanto esses movimentos e mantido às margens dessas pequenas futricas familiares. Mesmo no campo da oposição partidária, a criação do MDB, veio acompanhada de formulação política de fora da região. O debate político e ideológico se afirma na condução de fora para dentro, mesmo que a população e os políticos pouco mostrem essa relação. O MDB, quando de sua fundação, fora buscar apoio político em outros espaços da capital e outras famílias, mas todas vinculadas à tradição da política conservadora alagoana, neste caso, os Palmeiras. Clara estava a insatisfação interna na cidade a respeito da política do município. As brigas fazem parte das divergências políticas, mas não ideológicas. Um secretário houve que saiu às tapas com o Antônio
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Lins, vereador e depois Prefeito. Severino Rocha(2015) que acompanhou essas divergências afirma que “a briga foi tamanha que Antônio esbofeteou Hercílio, tendo sido então processado por ele”. Um processo que teve pouco efeito nas relações políticas locais e de pouca ou nenhuma atenção da população. E nem as siglas partidárias foram sequer abaladas em qualquer momento, até mesmo por que elas têm muito pouco significado, somada com a quase total desinformação das siglas partidárias no lugar. A política, centrada nas elites, não obstante, apresentou seus traumas na cidade. Atingiu inclusive um momento que envolveu a própria Igreja Católica. O vigário, naquele momento, Pe. Afonso, fora declaradamente defensor da candidatura de Alfredo. Por conta disso, os adversários de Alfredo espalharam fezes por toda a parede da casa paroquial. A política local nunca trouxe uma paz geral duradoura mesmo no campo dominante. O outro grande trauma foi um longo processo protagonizado pela Prefeitura, no tempo de Antônio Lins, e o seu tesoureiro. Acusações de falcatruas com o dinheiro público terminaram com a prisão de Genésio que sempre teve boa reputação na sociedade local. Antônio Lins foi não responsabilizado, cabendo a punição final ao tesoureiro. As pessoas na cidade ficaram muito divididas em apoio ou não a esse resultado do judiciário. A decisão final não fora consenso na população. Um outro grande trauma ocorreu com a morte súbita do Prefeito José Santana de Melo, tendo gerenciado a cidade, como Prefeito, por apenas dois anos mas já a administrava por 4 anos, no governo do Zé Lessa. Também, acompanham esses estranhamentos, pouco compreensíveis pela maioria da população, os dois “impeachments” da Prefeita Telma Melo, viúva do Prefeito José Santana de Melo. Finalmente, o
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afastamento do Prefeito Cássio pelo poder judiciário, mesmo que por pouco tempo. A concentração de poder de representações desses setores da cana, sejam usineiros ou Senhores de Engenho, é a marca do poder na comunidade. Um poder que se legitima em suas formas mais difusas e que igualmente se exerce em rede. Para Vasconcelos (2006:110), esse poder “não precisa ser visto como localizado aqui ou ali”. O poder não se divide apenas de cima para baixo, mas parece distribuído entre tantos. Inclusive, possibilita ver o poder em setores da própria classe dominada. Há o poder entre as representações de trabalhadores, sejam sindicatos ou associações que ainda carregam consigo as mazelas da permanência de seus dirigentes. Pouco tem sido o rodízio de pessoas no exercício de seus mandatos nessas instituições que se afirmam mais pela prestação de algum tipo de serviço assistencial aos seus sócios. Tudo isto contribui à política e ideologia da dominação em ambientes onde pouco ou algum movimento social existe, impossibilitando o encontro de sujeitos de práticas e saberes distintos para a construção de suas próprias identidades, forjadas não naquela orientação dos poderosos. Trabalhadores que por isso, alienados de seus trabalhos, não se reconhecem naquilo que fazem, como produtores da riqueza e das coisas. Um ambiente ideológico em que princípios e consequências ficam invertidos e produzindo ideias e imagens distorcidas, mas tidas como representação da realidade. Como bem manifesta Chauí (1994: 417) “As imagens formam um imaginário social invertido - conjunto de representações sobre os seres humanos e suas relações, sobre as coisas, sobre o bem e o mal, o justo e o injusto, os bons e os maus costumes, etc”. Essas explicações e o imaginário constituem o ideológico dominante. Diante disto tudo, parece não haver condições para o exercício
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da cidade. Todavia, a dialética da realidade expõe as contradições do lugar e procura encontrar possíveis caminhos para o fazer política pelas classes trabalhadoras. Então, cabe a questão: quais são as possíveis chances para o exercício da cidadania pelas classes trabalhadores, vislumbrando o governo local?
Chances para a cidadania A busca por respostas à questão conduz para o encontro de atividades ou ações
políticas que possam contrapôs-se a
essas condições de silenciamento da sociedade o que Paulo Freire denominou de “ Cultura do Silêncio”. Entretanto, a superação dessa cultura, analisando dados da década de 1980, estes mostram (MELO NETO, 1999: 34) que uma grande preocupação da população era com a escola, considerada nada boa por 61,4%, e que 25% da população gostaria de aprender a ler, escrever e contar, enquanto que 18,6% desejava tão somente aprender a ler. Passados mais de 30 anos, a educação municipal continua a preocupar qualquer governo com um percentual de analfabetos que beira a casa dos 40% da população, segundo as últimas estatísticas educacionais do Ministério da Educação. Mas, além da questão educacional será importante o destaque ao desemprego que afeta a vida das famílias e das pessoas. Naquela década, apenas 51,4% tinha alguma ocupação para superação da fome. Na época da entresafra, 70,0% da população passava privação, levando em conta que as aposentadorias eram raras e as bolsas da assistência do Governo Federal não existiam. A economia da cidade precisa ser estudada com destaque à produção agrícola. ao comércio varejista, à educação, saúde, família, emprego, profissão, esporte, tradições culturais, religiosidade da
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população, política partidária, sindicatos e demais organismos da sociedade civil e aspectos outros que dizem sobre o modo de vida atual. A cidade carece de superar indicadores tão baixos de condição de vida humana, situando-se entre os piores de Alagoas e do País. No trato com a educação, não será qualquer metodologia que atenda ao aprendizado da realidade e do mundo. Uma educação que seja popular como expressão de uma visão pedagógica em que tanto o docente quanto o discente aprendem e ensinam a partir do trabalho, pautada pelo diálogo. Uma educação como um fenômeno humano de ensino e aprendizagem pelo trabalho. Ela contém uma filosofia cujo ponto de partida para a sua produção de conhecimento e saberes é o ambiente mesmo da realidade - a base empírica. A pedagogia precisa ser própria, pois as relações econômicas estão sempre aí a pesarem sobre a definição dos conteúdos e do cronograma escolar. Uma educação claramente política, sem ser partidária, ao definir campos éticos com destaques aos valores do diálogo, solidariedade, liberdade, respeito, justiça e felicidade. Enfim, uma educação efetivamente popular (MELO NETO, 2015) e não como mera repetidora de conteúdos vazios e distantes do mundo do município. “Uma educação em que as suas atividades conduzam para uma ideia central - a liberdade”. Um movimento geral da sociedade capaz de ser apercebido pela visão freireana de uma Ação Cultural para a Liberdade (FREIRE, 1976, 1987, 1979). No livro Pedagogia do Oprimido (1987), Freire caracteriza essa Ação Cultural como colaboradora com o povo, pois uma ação dialógica que pressupõe a ética do respeito. Os governantes locais mantém o autoritarismo de Senhor de Engenho até mesmo quando recebe propostas para a cidade, identificadas por grupos locais.
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Sequer são formalmente recebidas. Reclamam dessas atitudes o Movimento Colônia e Cidadania que distribuíra propostas a todas as Secretarias e ao Gabinete da Prefeita. Somente a Secretária de Assistência Social acusou o recebimento. E quando recebem, não comunicam o recebimento e muito menos acenam com qualquer tipo de resposta como fizera o Prefeito Cássio em visita à Universidade Federal da Paraíba. Definira convênios entre a Prefeitura e a Universidade, e, logo em seguida, esquecendo-se totalmente das deliberações que ele mesmo tomara, sem qualquer comunicado àquela Instituição Acadêmica. Sua resposta foi o silêncio. Uma ação política realizada com a presença do Presidente da Câmara, à epoca, o Vereador Marinho. A Ação Cultural direcionada para promover a união das pessoas, pois juntas os problemas tornam-se possíveis de serem aliviados quando não resolvidos. Inclusive com lideranças que acompanham o processo de libertação das pessoas sem promoverem qualquer tipo de desejo de se tornar mais outro Senhor de Engenho. Um pressuposto para essa Ação Cultural é a organização das pessoas em instituições da sociedade civil, em seus sindicatos, suas igrejas, ou outros instrumentos que venham criar. O próprio movimento estudantil tem sido importante e mesmo que paralisado carece de reestruturação. Agrupamentos, a exemplo do Movimento Colônia e Cidadania, cabem aprofundar o seu processo de crescimento. Pouco tem crescido no imaginário das pessoas. Associações com mais tempo de existência podem mais ajudar na reordenação geral da sociedade. Da mesma forma, ultimamente, pode-se contar também com a Academia de Cultura que surge com pequena força política mas que situa-se no campo da mudança civilizatória da população local.
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Enfim, a realização de toda uma síntese cultural em que, como bem afirma Freire (1987:178), “toda Ação Cultural é sempre uma forma sistematizada e deliberada de ação que incide sobre a estrutura social, ora no sentido de mantê-la como está ou mais ou menos como está, ora no de transformá-la”. A Ação Cultural em discussão é expressão da superação do antidiálogo estabelecido na sociedade, mirando para o mundo da vida das pessoas. A Ação Cultural neste contexto arrasta uma pedagogia para a educação popular cujos educadores e educadoras trazem “alta sensibilidade aos contextos políticos, sociais e culturais onde atua. Visto que sua razão se define por seu questionamento e resistência às realidades injustas e por sua articulação com as lutas e movimentos populares...” (Streck & Esteban: 2013:19). Assim, possibilitam exercícios de construção de processos de individuação, socialização e de participação das pessoas. Uma educação popular que contribua para a superação do medo encastelado nas pessoas, seguindo a moda do `comunista´, em Colônia, Helvécio Afonso de Melo, na visão de Ernane Santana (2011). Este professor fora preso, interrogado por forças da repressão, em 1964. A acusação, sobretudo, era de que simpatizava com as ligas camponesas do Estado de Pernambuco e a sempre surrada acusação de comunista a qualquer crítico à ditadura. O mesmo nunca deixara de lado a sua simpatia de movimentos promotores de mudanças no Brasil ou no exterior mesmo sob o tacape das forças de repressão. “Foi posto em liberdade e retornou tranquilamente ao convívio dos seus amigos, familiares e alunos do Colégio Padre Francisco”(Ib. 31). Educação popular que enraíze forças para não abandonar experiências relevantes como as que já ocorreram na cidade e
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que sucumbiram sem explicação, como a do Site e Jornal Minha Colônia, com propósito de ser editado a cada mês, com mil cópias, contendo “entrevistas culturais, políticas, religiosas e as badaladas festas que acontecem na cidade”. Além disso, “Este é o principal objetivo do ´site` e do jornal: informar e anunciar o amor que sentimos por essa terra, por nossa terra, por minha colônia”(Jornal Minha Colônia: 2007, nº. 1). São experiências que merecem tornar-se rotina. Carecem de ser mantidas, pois muito ajudarão na informação das pessoas na cidade e no combate sistemático à desinformação. Experiências que ajudem na superação de desejos elitistas de negarem a informação como um perigo para a sua própria sustentação. No caso do terceiro mundo, o consumo de informações, já restrito devido a espoliação de vários séculos de colonialismo, de dependência, e de analfabetismo, apesar da revolução informacional, limita-se hoje, ainda mais, quando essas informações exigem como condição sine qua non, o consumo, também, dos meios eletrônicos (LOMBARDI, 2003: 90).
A ação da educação popular só tem sentido se for para a liberdade e por isso a necessária superação do analfabetismo local. Sempre se opondo a perspectivas que veem a educação do povo como elemento incitador de pensamentos radicais. Mas, só a ação radical é capaz de ir até a raiz dos problemas e tentar superá-los, desviando-se das abordagens meramente periféricas e aceitas pelo conservadorismo dominante. Um processo que é completo para a educação de pessoas em condição de contribuir para a organização e suspensão do patamar do entendimento coletivo para outros níveis superiores de vivência social.
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Entretanto, a Ação Cultural não fica apenas em formulações gerais. É fundamental a ajuda em formulações de políticas locais e específicas para comunidade. Nisto, já há um conjunto de propostas que foram colhidas de vários grupos ou pessoas e sistematizadas em uma brochura pelo Movimento Colônia e Cidade, denominada de Por uma Colônia Melhor (2014) e distribuída à população. Um dos seus objetivos foi a “implementação de mudanças nas relações político-partidárias; no cuidar das pessoas; nas mentalidades de toda a comunidade da cidade, visando a cidade ser conquistada por todas e todos” (p. 5). Propõe, por exemplo, a necessidade da transparência pública; preparação sistemática dos servidores e avançar para um maior fortalecimento dos Conselhos Municipais de saúde, educação, direitos humanos etc...; capacitação e incentivos aos pequenos produtores; insistência nas questões ambientais como a recuperação do Rio Jacuípe; ênfase no cuidar das crianças; desenvolvimento de grupos empreendedores em base à economia solidária valorizando os processos autogestionários; valorização da cultura local e dos artistas da terra; investimento sistemático na educação fundamental além das exigências legais, considerado o atraso escolar; exposição das receitas e despesas do município à população e não só à Câmara de Vereadores; arborização de trechos da BR que corta a cidade; funcionamento da maternidade para que os filhos de Colônia não precisem nascer fora da cidade, comprometendo futuras gerações, enfim, e outra centena de propostas existentes e geradas na própria população, pois como conclui aquele documento: “sempre é tempo de mudanças e de cidadania”. Veja como propõe Lúriva(2015):
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Qualquer um pode ver pivetes na rua, às altas horas, e sem qualquer acompanhamento. Se alguém perguntar por que ele está ali, àquela hora na rua, a resposta dele é braba em relação a você. Então, essas crianças precisam ser cuidadas, já que os pais não estão conseguindo e até, alguns, nem pais têm.
Cuidar das crianças é uma fundamental tarefa para se chegar a “melhores” adultos, por parte daqueles que exercem as funções públicas, no momento. Porém, vê-se ainda em Brasilino (2015) que se Prefeito fosse “reuniria um pessoal bom de conhecimento, promovendo uma grande discussão sobre as propostas para a cidade. As preocupações maiores para a cidade seriam definidas dessa maneira”. Portanto, traços de efetiva participação, outrossim, já passam pela cabeça de alguns com representação política. Da própria Câmara, espera-se mais e melhores proposituras para a governança municipal sem cair nas disputas pessoais e menores que pouco ajudam à população. Para Severino Rocha (2015), as regras de sociabilidade são fundamentais para serem cumpridas. Não é possível haver regras e nenhuma preocupação com o seu cumprimento. Contudo, preocupa-se com a “acessibilidade em Colônia que é um caso seríssimo. Imagine um deficiente, um cego andar pelas calçadas da cidade. Cada um está fazendo o que quer de sua calçada. Isto é um problema grave.” Na mesma linha de preocupações, Ernane Santana (2015) coloca a educação como uma prioridade fundamental. “É na área da educação onde vejo a saída para se conscientizar todos os brasileiros”.
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Como se vê, não faltam preocupações para melhoria das relações sociais no âmbito municipal com propostas muito concretas. Mas, serão mesmo os desejos dos que estão a exercer os cargos? Faz-se necessário ainda uma maior mobilização social como força capaz para reinventar a política com a promoção, por exemplo, da realização de um planejamento e orçamento participativo na cidade. As pessoas têm capacidade de atuar por região da cidade, culminando com uma ampla plenária onde se definirão aquilo que o poder municipal vai efetivar. Isto não é usurpação, mas um alastramento maior do próprio poder. Um exercício da democracia direta, transcendendo a forma clássica de que quem dispõe do poder sejam apenas vereadores ou mesmo só o executivo. Sistematizar necessidades e fomentar desejos de poder com a construção de possíveis lideranças classistas ou quadros para a organização de um longo processo de hegemonia dos trabalhadores e trabalhadoras. Dessa forma, talvez, se torne possível o exercício da arte da política pelos setores populares da cidade e de toda a região. Há necessidade de um arrastão pelas entranha das forças libertárias que eram imanentes aos povos cabanos, pois lutadores com suas próprias forças por seus direitos de viverem nas matas e em liberdade, clamando ainda para serem despertadas, novamente.
Considerações O despertamento dessas energias de positividade para a participação política das classes trabalhadoras dependerão do arregimentamento geral das forças em potencial presentes nas instituições da sociedade civil de Colônia. Será necessário o envolvimento de Academia de Cultura, do Movimento Colônia e Cidadania(MCC),
das associações todas existentes,
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de cooperativas, sindicatos, de grupos de universitários, de estudantes secundaristas, de grupos religiosos empenhados em seus trabalhos sociais, de indivíduos que vêm a necessidade de mudanças locais e gerais... todos em sincronia com um avançado projeto de participação de todos. Sabe-se que a cultura da usinagem estabelecida cria um imaginário de que só é possível a vida de forma centralizada e com um mentor direcionando as ações; com líderes sem os quais não há condição de vida e desde que os líderes sejam os seus escolhidos; com a falta de diálogo e o estabelecimento do autoritarismo além de que o mundo, efetivamente, se torne um presente da Casa Grande para todos os demais viventes. O resultado eleitoral das próximas eleições já está definido. Já se sabe o vitorioso. A se manter o ordenamento atual, com candidaturas de Manuilson e Paula Rocha, o resultado já está nos braços da Usina Taquara, devido a força do vínculo desses candidatos com aquela indústria. Mas, tudo isso é falso. Na vida, outro modo de viver é possível. Para se viver melhor é necessária a informação para os que ainda estão por vir. O mundo se move mesmo sem o desejo daqueles que aspiram a rotina, a monotonia e a permanência. É necessário destaques às diferenças e ao mesmo tempo promovendo-se a associação das maiorias, pois a elas deve ser devolvida a força do poder, se for o desejo coletivo para uma efetiva democracia. Nem mesmo a democracia, nos moldes burgueses que se vive, atende a participação de todas as pessoas de forma direta. A aglutinação geral dessas forças políticas, bastante adormecidas, precisam retomar o caudal do rio do poder. Isto vai exigir o caminho e o exercício do pensamento crítico para práticas conscientizadoras. O método da organização proposto precisa
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ser considerado com destaque ao esforço grandioso do trabalho político. Tudo isto contemplado pela criação de um jornal, modesto em número de páginas e com linguagem acessível, que veicule e permaneça oferecendo informações à toda sociedade local. Em todas essas ações políticas para com os setores subalternos da cidade passa a necessidade do forte debate ético, onde a questão financeira também se expõe. Esta pode ter a cooperação de políticos em nível estadual em sintonia com aqueles que defendem a mesma visão ou visão aproximada do mundo e de suas soluções. Articulações que se efetivarão conjuntamente com as instituições partidárias e não com o político de forma isolada como é comum. E se a política afastou-se historicamente de valores éticos, estes precisam retomar sem qualquer medo de sua discussão e em qualquer instância possível. Com essa pedagogia de sonhos realizáveis, o debate ético e seus valores não conseguem ser escamoteados em qualquer dos setores, em especial àqueles das classes que vivem e viverão do trabalho. Assim, é possível pensar a manutenção de sonhos possíveis reafirmando a liberdade, igualdade, justiça, autonomia e felicidade. Valores utópicos que conjuntamente foram tão caros e presentes nas lutas de negros, índios e cabanos, desconhecidos por conta da ideologia dos dominadores, mas que muito honraram e que ainda reclamam encher os olhos de orgulho de seus filhos e netos nascidos e viventes destas terras. REFERÊNC I A S AMORIM, José Júnior. A trajetória do movimento estudantil leopoldinense. Edição do Autor. Colônia Leopoldina, Alagoas, 2011.
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c) COM EN TÁR IO S A RESPEI TO DA M EMÓR I A POLÍT ICA DE COLÔN I A LEOPOLDI NA
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Dedico esse texto às professoras que me ensinaram a ler e escrever Brevíssima introdução Um dos modelos mais ricos e seguidos na escrita da história em Alagoas é aquele que se dedica a história municipal ou história local. Uma matriz para esse modelo é a obra de Caroatá, Crônica do Penedo, que inaugura a revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas no final do século XIX. Segundo Luiz Sávio de Almeida, esse tipo de abordagem privilegia as questões relacionadas com o poder, mais precisamente a política, com foco no âmbito municipal.1 Esse modelo, seguido consciente ou inconscientemente, aparece em trabalhos que são produzidos por historiadores profissionais, mas é seguido principalmente por historiadores amadores, que não estão preocupados com os procedimentos técnicos propiciados pela historiografia mais recente. Menos que da história, essa escrita se aproxima mais das memórias ou das próprias crônicas, como sugere o título da obra do Caroatá. Pois bem, o convite que me foi feito para participar dessa coletânea me levou a pensar nesse modelo, e me fez avaliar que há uma constelação muito grande de problemas e questões que envolvem pensar na relação entre a história municipal/local e as 1 ALMEIDA, Luiz Sávio. Dois textos alagoanos exemplares. Arapiraca: Funesa, 2004.
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relações de poder. Apenas para apontar algumas das dificuldades para o caso específico de Colônia Leopoldina, apesar do avanço e do aprofundamento da reflexão sobre a cidade e seu entorno que ocorreu nos últimos anos,2 penso que ainda há muito por ser feito, e que a iniciativa envolve a pesquisa em novos acervos, a organização e preservação de fontes oficiais (estou pensando no acervo produzido pelos poderes públicos, como a Câmara de Vereadores e a Prefeitura Municipal, por exemplo), e também a coleta e o registro da memória dos moradores mais antigos da cidade e dos distritos e sítios da região.3 Obviamente, não basta ter fontes apenas para realizar tal empreendimento. É preciso se acercar de um arsenal teórico e metodológico que, sem perder a dimensão local do que está em foco, pense nas dimensões mais amplas que envolvem a dialética relação estabelecida entre o município, a microrregião em que se encontra, a estrutura pública e administrativa estadual, e suas determinações mais gerais em âmbito nacional e mundial. Dito de outra forma, isso envolve produzir a história local sem cair na cilada da identidade provinciana, e perceber os eventos que ocorrem no cotidiano das pequenas cidades nordestinas como parte de processos históricos, culturais, políticos e econômicos maiores. Talvez um abandono à história local e um retorno à história regional nos ajude a construir uma abordagem mais firme para pensar este tipo de história.
2 Um rico debate passou a existir com a aproximação entre a formação acadêmica de professores, notadamente na FAMASUL-Palmares/PE, a articulação com colegas e profissionais de outras faculdades e universidades, e a criação da Academia de Cultura de Colônia Leopoldina.(ACCL). 3 Aliás, diga-se de passagem, as memórias enfeixadas no volume, apesar de privilegiarem a temática da política partidária, trazem um conjunto rico de outros sujeitos, lugares e experiências vividas pela população leopoldinense, ao longo do período.
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Por agora, fica apenas a sinalização dessa necessidade, e isso serve também como um alerta para os limites das breves reflexões que farei adiante. Essas reflexões fora feitas deliberadamente sem consultar material bibliográfico de forma exaustiva. Nelas, me detive principalmente nas entrevistas que compõem a primeira parte do livro. Para não ser influenciado pelas ideias e leituras contidas nas análises dos meus parceiros de livro, decidi que só iria consultar esse material depois de o texto estar terminado e aprovado. Esse procedimento pode ser entendido como um descuido, por um lado, e pode gerar repetições desnecessárias (se for o caso de eu vir a indicar aspectos já tratados nos outros escritos da coletânea), mas talvez possa ser interpretado como um cuidado para não ser demasiado influenciado por parceiros que vêm se debruçando com mais acuidade sobre o caso.
Sucinto comentário às memórias. Comecei com a primeira e mais marcante das surpresas que as memórias me revelaram. A presença forte das mulheres no cenário público e na esfera política local é algo que não apenas o presente, mas a memória acessada pelos entrevistados, deixa claro.4 Essa singularidade nos ajuda a pensar algumas questões. A primeira é a de que nem sempre as mulheres (ou a abordagem cultural e identitária acerca das questões de gênero) significam um calor humano e uma sensibilidade maior. Eventualmente, essa aproximação pode estar a serviço de grupos e interesses que perpetuem uma sociedade machista e patriarcal, violenta e excludente. A segunda está relacionada a identificação da importância dos bastidores da política, do que está por trás do 4 Não é casual que o primeiro depoimento seja o de uma mulher, e que a trajetória de seu esposo, Zequinha, ter nela e em sua linhagem materna um esteio seguro.
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palanque e das dimensões públicas para os destinos da sociedade, daquilo que sai propriamente da esfera política e se aproxima das relações de poder, em sentido mais amplo. Por fim, este traço revela a presença daquilo que Sérgio Buarque de Holanda denominou de cordialidade brasileira, de uma sensibilidade que transborda das relações pessoais e que adentra no âmbito da oficialidade, e que torna incompleta a chegada na modernidade. Deste âmbito, me aproximo também da política do favor, daquilo que Roberto Schwarz identifica como sendo uma das nossas mais marcantes características e, portanto, um dos maiores desafios. Este é um passado que não passa, e essas memórias contam não apenas sobre a história, mas também sobre a sobrevivência de muitos desses traços no presente. Uma segunda e grata surpresa, que me ajuda a entender traços da relação entre mídia e poder através do lento processo de massificação da cultura no país, e da circulação de ideias políticas e valores culturais, é a utilização de rádios para informar a comunidade e divulgar os interesses dos grupos políticos. Não foi à toa que Getúlio Vargas criou o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), pensando não apenas na imprensa escrita, mas também e principalmente na radiodifusão nacional. Em um determinado período dessa história, existiram duas rádios em Colônia Leopoldina, a Princesa Colônia Leopoldina e a Voz do Jacuípe (ou rádio Jacuípe). As programações disputavam ouvintes, corações e mentes. Talvez esse exemplo demonstre o quanto se sucumbiu, na atualidade, as campanhas políticas cujo apelo discursivo e debate de projetos chegaram em um nível baixíssimo. Hoje, como correlato da corrupção sistêmica do capitalismo e demonstração clara dos limites da nossa democracia, as candidaturas calculam o número de votos em razão dos valores
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investidos. Pela percepção de um dos entrevistados, inclusive, foi com a participação do usineiro José Lessa que as campanhas “inflacionaram”, financeiramente. Falar-se de um usineiro no auge do Próalcool – programa que injetou recursos de monta em diversas usinas no país inteiro. Na verdade, parece-me, o caso dele é um índice que ajuda a entender como se chegou ao atual estágio das campanhas eleitorais, onde a maioria dos políticos abortaram os canais diretos de comunicação com a sociedade, o debate e o diálogo entre projetos políticos distintos. A percepção é a de que, quanto mais caras ficam as eleições, mas pobre se torna a democracia. O sentido de comunidade, que muitas vezes embasa o cotidiano destas pequenas cidades do interior brasileiro, servem também para embaçar as clivagens de classe que ocorrem nesses espaços, nos vilarejos, nos distritos. A dureza dos tempos que se vive na atualidade tem reconfigurado essas fronteiras, impondo uma sociabilidade mais atenta a essas diferenças sociais, mas de alguma forma parece-me que os laços identitários ainda soam mais fortes que as diferenças. Uma nota relativa a essa impressão, por exemplo, refere-se a forma como há uma linha difusa que de alguma forma delimita quem é da “sociedade” e quem fica a margem dela; quem frequenta determinados lugares (como, na época, o Clube Udal) e possui trânsito mais fácil em áreas privilegiadas e centrais da cidade, e quem tem a entrada interditada ou restrita. Na esfera da política partidária, a necessidade de manter a ordem social vigente, parece ser a senha que permita fazer com que novos indivíduos apareçam nos palanques e nos espaços que concentram poder, e que outros personagens sejam interditados, deixados de fora do baile.5 5 É preciso, aqui, observar que as relações de poder são bem mais amplas do que o foco das memórias aqui analisadas. Enquanto as entrevistas se dedicam principalmente à política partidária, várias iniciativas realizadas por fora das estruturas partidárias dão conta de dimensões importantes daquilo que se chama de poder.
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Independentemente da classe ou fração de classe, talvez não seja exagero afirmar que a pequena cidade do interior brasileiro é o espaço da reprodução dos projetos, atitudes e práticas políticas hegemônicas no país. Independentemente da categoria, da ocupação profissional, ou da fração de classe, usineiros, latifundiários, pequenos e médios fornecedores, comerciantes, profissionais liberais, servidores públicos, assalariados (em suas diversas matizes, indo dos empregados do escritório da usina até os trabalhadores do comércio), parecem possuir um único trajeto no que diz respeito a trilhar caminhos políticos: ajudar a pavimentar o roteiro dos acordos com os coronéis e grupos oligárquicos do município/microrregião.6 Encontra-se a existência de grupos políticos que se reproduzem ao longo do tempo, que se desfazem ou que se dividem em outros grupos. Tais grupos, muitas vezes, se articulam em torno de lideranças cujas intrigas, querelas pessoais, inimizades que se fortalecem, conchavos que são construídos, muitas vezes revelam que não existem projetos políticos distintos, que as bases da disputa ficam pactuadas a serem reguladas pelos limites da ordem, e que a forma de fortalecimento destes grupos passa pelas alianças que são feitas com grupos oligárquicos estaduais, com esse ou aquele deputado. Assim, muitas vezes, as disputas de poder que aparecem no âmbito das eleições, terminam sendo meramente pontuais, sem maiores consequências para mudanças nas tendências mais amplas no nível municipal.
6 A análise de uma série de questões contribuem para entender essa característica, mas os limites desse escrito não me permitem explorar com profundidade tais questões. Apenas para citar um ponto que parece importante para garantir a confluência de opiniões e posturas políticas, o controle e a vigilância numa cidade tão pequena como Colônia Leopoldina – onde virtualmente se rastreiam facilmente a procedência dos seus habitantes – ajuda a entender essa monotonia do acorde político.
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Mesmo quando ocorrem descontinuidades nessa dialética, mesmo quando ocorrem surpresas e o inesperado surge por trás da cortina partidária, ele funciona como uma forma de aggiornamento limitado, como uma vereda que logo se reaproxima do trajeto conservador da política local. Um exemplo claro disso parece ter sido a trajetória política de Zequinha, com sua origem negra, popular, do arrabalde da cidade, características improváveis para um chefe do executivo municipal, e que chega ao poder para esboçar uma relação mais estreita com as classes populares da sociedade sem contudo realizar projetos mais consistentes para aquela população. Certamente conta para isso os marcos mais amplos do período ditatorial, período em que ele inicia sua trajetória política. A forma como o projeto classista que foi submetido à imensa maioria da população, numa articulação que envolveu o capital imperialista, setores do grande empresariado nacional, as principais lideranças políticas civis, deixou poucos espaços para a contestação e a construção de polos distintos. A resistência a este projeto, que tomara ora o caminho da luta armada, através de vários grupos guerrilheiros, ora o da oposição consentida no MDB, não teve força suficiente para barrar aquele processo em âmbito nacional. No cenário leopoldinense, ainda há muito por ser pesquisado. Apesar de alguns relatos já surgirem aqui, pelo menos no que se refere à opção pelo MDB, com a articulação de alguns importantes atores políticos locais com lideranças estaduais, isso é muito pouco. Do lado da postura da esquerda mais combativa, cuja hegemonia se dava pelo PCB, até o golpe. e durante um pouco tempo depois, ou não havia articulação alguma ou toda uma história ainda está por ser desvendada.
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Sobre o ponto, permitam-me uma primeira nota pessoal. Uma das memórias mais fortes que possuo da minha vivência leopoldinense é a reiteração da simbologia pública, dos rituais e do calendário da ditadura empresarial-militar vivida no Brasil entre 1964 e 1985. Ela aparece, por exemplo, quando lembro do perambular pela feira dominical, passando pelo Mercado Público, que possuía como patrono o General Médici, o mais violento de todos os generais daquele período. De alguma forma, conviver com aquele nome, fazê-lo familiar a um garoto, contribui decisivamente no mecanismo ideológico de apagamento dos interesses em jogo, naturaliza a memória daquele nome como sendo algo conhecido, de uma pessoa pública merecedora da homenagem, e que por tabela, aciona a possibilidade de identificação com a ditadura. Enfim, algo que remete ao cotidiano mais prosaico, o de perambular pelas ruas de sua cidade num domingo de feira, revela o quão distante aquele cotidiano conduz: a justificação de atos de violação de direitos, prisão, tortura e morte de milhares de pessoas.7 Apenas no lento processo da transição negociada pelo alto, com a reabertura e a anistia, o surgimento do PT enquanto alternativa política, e seu fortalecimento nacional, é que vimos chegar novas posturas políticas locais, articulados justamente nessa sigla partidária e na figura do elegante e firme padre Aldo Giazzon. Aqui e acolá, as memórias listam eventos e referem-se a esse momento, salvo engano iniciado em Colônia Leopoldina, em meado dos anos 1980, e cujos caminhos tortuosos levaram à impasses nacionais graves na atualidade em que se vive. 7 Essa lembrança associa-se naturalmente aos desfiles do sete de setembro, aos slogans, cartazes, plaquetas de promoção do regime de exceção, à sagração festiva da data da pátria, do nacionalismo ufanista associados a uma grandiloquência típicas do período. Aliás, nas memórias de estudantes e professores daquele período, das certamente fartas imagens que algumas famílias guardam dos desfiles, um conjunto imenso de possibilidades de pesquisa se apresentam para novos olhares. Esses “fundos pessoais” podem ser verdadeiros achados para novos estudos.
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Se, do ponto de vista da direita, está absolutamente claro que os grupos políticos locais só sobrevivem se estiverem articulados com caciques políticos regionais e nacionais, é imprescindível que aqueles que pretendam romper com o conservadorismo e com o carreirismo, e que pretendam produzir uma prática política diferente, também se pergunte acerca das articulações de seu grupo fora de Colônia Leopoldina: com quais deputados estaduais irá se associar? Com quais postulantes a cargo federal estarei coligado? Com que tipo de liderança que se apresenta no cenário estadual gostaria de realizar o corpo a corpo com o eleitorado? Qual o programa do partido ao qual estou me filiando? Quais suas práticas concretas? Às jovens lideranças que surgem e aqueles sujeitos mais calejados que pretendam assumir compromissos públicos desta ordem pela primeira vez, devem realizar um escrutínio dedicado com perguntas dessa natureza, pensando com clareza no passo decisivo que irá tomar para que, depois, não se veja envolto em situações pouco dignas, abraçados a figuras corruptas em palanques montados por quem está fora da cidade! Não tenho como desenvolver todas as implicações dessa argumentação no momento, mas gostaria de comentá-la brevemente, pois essa é certamente uma das chaves analíticas mais importantes para se entender o âmbito da política que se concretiza no município: o eixo de seu projeto localiza-se fora do município, em uma mediação muito variante – dependendo do partido - entre as diretorias e comitês estaduais e nacionais. Dificilmente, as decisões mais importantes de um partido são tomadas pelo comitê ou diretoria municipal. Explico essa afirmação aparentemente polêmica. Apesar de serem designados partidos, dando a impressão de que são organismos incompletos, “partidos”, cindidos, e que só produzem uma visão parcial das coisas, na sociedade capitalista o partido tem sido o
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sujeito coletivo que objetiva a visão de totalidade da sociedade e os projetos de envergadura (ora de manutenção ora de mudança) para todo um período ou conjuntura histórica. Não há nenhuma reforma significativa, nenhuma política de desenvolvimento regional ou nacional, nenhum projeto estruturante na sociedade moderna que não passe pela mediação de partidos políticos. Alguns projetos podem inclusive ser compostos em sua totalidade por integrantes que não pertençam a partidos, mas sempre terão a sombra próxima ou direta de partidos.8 De alguma forma, essa situação de que o eixo central da política se situa fora do município, gera o correlato relativo às necessidades de modernização mais prementes. Efetivamente, a criação e elaboração de serviços e projetos estruturais de um município de pequeno porte só são realizados a partir de articulações estaduais/federais, pois o poder executivo municipal não possui recursos financeiros e técnicos suficientes para realizálos. Isso, por um lado, responde ao arco de relações necessárias para serem realizados, como se tem argumentado. Por outro, potencializa toda sorte de clientelismo e de fortalecimentos oligárquicos na medida em que as prefeituras ficam a mercê de bancadas que consigam as verbas para garantir a execução dos projetos ou de parlamentares que façam a ponte com o governo estadual. Esse parece ser o caso, por exemplo, da rede de tratamento e abastecimento de água da cidade, articulada por Sergismundo de Andrade. Salvo uma leitura equivocada de minha parte, e levando em consideração as informações de Ernane Santana Santos, um dos entrevistados, essa iniciativa foi realizada entre os mandatos de Manoel Barbosa de França e Antonio Lins da Rocha, ou seja, atravessando três legislaturas e durando algo em torno de 15 anos. 8 Como exemplos, o caso do MST que é uma espécie de braço agrário do PT, e o caso recente e escandaloso do MBL e de outros movimentos que se dizem apartidários e que, no entanto, são como marionetes manipuladas por partidos como o DEM e o PSDB.
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Para além das questões técnicas e financeiras envolvidas nesses projetos, este tipo de articulação passa por cima dos programas de governo e das querelas entre grupos oposicionistas, justamente porque é realizada a partir de articulações externas ao “poder local”. Se essas reflexões adiantadas acima estão corretas, então é preciso perguntar sobre as articulações mais vivas que os grupos políticos dominantes leopoldinenses realizaram nesses últimos cinquenta anos. Ao que se depreende das memórias que saltam nessas páginas, tirando um breve esboço de aproximação de lideranças junto ao governo de Muniz Falcão9 e o período de surgimento do MDB local, no processo de distensão política que já foifrisado acima. Todas as campanhas vitoriosas que chegaram ao poder executivo local foram encampadas por partidos de direita, por articulações realizadas com deputados e senadores (ou pleiteantes ao cargo) que se situavam no espectro político e ideológico do lado destro, do conservadorismo, em alguns casos em grupos notadamente reacionários. A partir dessas conclusões, pode-se trabalhar com dois aspectos extremamente importantes para se entender a inserção de Colônia Leopoldina, no cenário regional e nacional. O primeiro está relacionado com o fato de que esta é uma região de ocupação antiga do território nacional, baseada na economia canavieira, cujos traços políticos são os mais conservadores do estado. Vários pesquisadores já identificaram o litoral e a mata norte de Alagoas como sendo as áreas onde os índices de violência física, de opressão étnica e de gênero são mais fortes, onde os salários são rebaixados ao limite na inanição familiar, onde uma gama imensa de pessoas sobrevive no nível 9 O governo de Muniz Falcão (1956-1960) é considerado por vários analistas como a principal experiência de governo progressista ou de esquerda realizada em Alagoas. Conferir, por exemplo, o livro de APRATTO TENÓRIO, Douglas. A tragédia do populismo. Maceió: Edufal, 2007.
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da miséria, e cujas faces muitas vezes nem aparece na área mais urbanizada da cidade. Com a decadência do setor canavieiro em todo o Nordeste, essa passa a ser uma das áreas mais atingidas pois as lideranças e os proprietários de terra da região foram abandonando alternativas econômicas e produtivas diversificadas e se concentrando na monocultura canavieira. Como, no âmbito municipal, devem-se tratar desse tipo de questão? Os relatos do livro possibilitam identificar, com maior ou menor ênfase, uma decadência da política local, os baixos índices de desenvolvimento em relação a outras cidades e regiões do país, uma sensação de estagnação e de impasse que dificulta a visagem de saídas para esta crise de longo prazo que assola o município. Obviamente este é um cenário que não será resolvido exclusivamente pelas forças políticas e econômicas do município pois referem-se a tendências mais gerais do âmbito do desenvolvimento regional e da articulação desta região com a mundialização da economia. Este tipo de desafio só pode ser enfrentado costurando-se uma dialética e complexa relação entre melhorias pontuais no âmbito local com a construção de vias alternativas de desenvolvimento no médio e longo prazo. Para tanto, é preciso enfrentar determinados setores e grupos, identificá-los como adversários políticos (o que não significa necessariamente romper relações, mas deixar claro os papéis dos atores na esfera pública), abandonar o patrimonialismo e as negociações que favoreçam sua condição particular ou de sua família em favor de se pensar nas categorias profissionais, em setores mais amplos da sociedade, em classes ou frações de classe. Em uma palavra: é preciso abandonar o clientelismo e pensar num novo e generoso projeto político, de ruptura com essas práticas tradicionais.
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O segundo aspecto que gostaria de tratar aqui diz respeito ao relativo isolamento de Colônia Leopoldina no âmbito microrregional e estadual. É interessante, inclusive, perceber que ao longo do período em foco houve apenas um deputado estadual oriundo do município, Manoel Freire Borges, mais conhecido como Balé, na segunda metade da década de 1950.10 Deixemme explicar melhor o caso. A microrregião da mata alagoana, onde está situada Colônia Leopoldina, é recortada por quatro rodovias (estaduais ou federais) que impuseram uma dinâmica de aproximação e distanciamento entre os municípios, que transborda o conceito dessa microrregião. Pegue-se apenas o caso da BR 101, que é a principal referência de rodovia para a sede do município, apesar de não estar próxima dela. Ao mesmo tempo que essa rodovia possibilitou uma independência mais objetiva de Colônia Leopoldina em relação a Porto Calvo, município de onde fora desmembrada, aproximou as possibilidades de articulação direta com o centro dinâmico e econômico do estado, Maceió. Por outro lado, o trajeto da rodovia, articulado com a comparação da rodovia estadual, AL-101, litorânea, separou significativamente municípios que compõem essa microrregião, como nos casos de Porto Calvo, Matriz do Camaragibe e São Luís do Quitunde, que mais parecem pertencer à microrregião do litoral norte. Ou seja: a definição da microrregião, que é um dos índices de identificação e implementação de políticas públicas do Estado brasileiro, fragiliza-se, dificultando a concretização dessas políticas públicas. Esta realidade impõe uma disputa mais acirrada no âmbito municipal pelos parcos favores do poder governamental. Isso de alguma forma é um reflexo (e, por conseguinte, reflete) a relação 10 Ao que parece, durante um curto intervalo de tempo, o deputado estadual suplente José Maria de Omena, também leopoldinense, assumiu o mandato, sem maiores efeitos políticos para a região.
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entre os grupos políticos locais e as oligarquias estaduais, seus representantes no parlamento. Se essa hipótese estiver correta, terse-á não apenas um dos vetores de explicação para o caso único do deputado estadual Balé, mas também visualizo um desafio que se impõe à saída de perspectivas para o município: a necessidade de articular – dialeticamente – projetos que contemplem do cenário local ao nacional e internacional, passando pelas escalas regional, estadual e microrregional. Um desafio dessa natureza não se enfrenta com o apelo à amizade e ao compadrio, nem reproduzindo parcerias com os principais interessados na manutenção desse estado de coisas. É preciso apostar em outras experiências, com a interlocução fraterna e generosa com sujeitos coletivos regionais e nacionais que proponham projetos políticos claramente distintos desses que se vêm sendo implantados no país e na região nas últimas décadas. Esse é um desafio que toda uma geração deve enfrentar.
Curtíssima e esperançoso despedida Para encerrar estas mal-traçadas reflexões, realizadas nos intervalos de outros compromissos profissionais, permitam-me os leitores uma última lembrança pessoal. Durante parte do tempo que morei em Colônia, na rua 16 de Julho, muitas vezes – logo cedinho – saia para jogar no campo de futebol que ficava depois do hospital municipal, já fora do perímetro urbano. Isso significa dizer que eu atravessava a cidade inteira para participar da diversão. Se a memória não me engana, eu pegava o sol da manhã de frente, nascendo, me ofuscando, abrindo-se para um novo dia. Já perto de chegar no campo, quando as casas rareavam, apareciam com mais clareza as serras que circundavam a cidade. Talvez essa memória
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sirva de metáfora para minha última vírgula nesse texto. Ela se situa entre as possibilidades que se abrem para uma nova jornada e os limites que aprisionam o cotidiano e impedem os passos para um novo caminhar, uma trajetória diferente da que se tem seguido. Este impasse entre a necessidade e a possibilidade, esta angústia que surge entre formular a crítica e concretizá-la em carne e osso, essa dialética, enfim, entre a liberdade e a estrutura, com suas particularidades, também está diante da sociedade leopoldinense. Embora tenha surgido numa região de brecha camponesa, negra, quilombola e ameríndia - multitudinária no sentido mais forte do termo -, cercada de alguns dos grupos sociais e etnias mais bravios da colonização brasileira, cuja mata real lhes dava guarida e alimento,11 não é demais lembrar que a colônia implantada naquelas matas não fora designada de militar, fortuitamente. Seus objetivos e seus chefes eram repressores, inocularam um ethos de violência, de vigília e de censura sobre o gesto popular-cabano. Junto com essa longa tradição – que se torna imemorial e inconsciente no coletivo regional, mas que é acionado com facilidade sempre que os poderosos julgam necessário –, os condicionantes da infraestrutura administrativa brasileira imposta aos milhares de pequenos municípios do país, particularmente forte no Nordeste e em sua área de ocupação canavieira colonial, produzem uma estrutura de poder ossificada, cujas demandas são filtradas por impedimentos de toda ordem, e que geram a sensação de que não há possibilidades de mudanças. Essa é uma realidade tão tradicional, tão comum e tão arraigada na experiência de gerações e gerações desses espaços que se tem a impressão de que não são realidades históricas, e sim uma quintessência natural que compõe a sociedade; e que as 11 Sigo aqui a leitura de LINDOSO, Dirceu. A utopia armada. Maceió: Edufal, 2005.
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coisas são assim mesmo e não podem deixar de sê-lo. Mas não podemos nos iludir em relação a isso, e mais cedo ou mais tarde, as condições de decadência que se apresentam, cada vez mais forte na região, vão exigir dos grupos dominantes novas formas de exploração e de opressão, um novo patamar de precarização dos serviços públicos, para garantir privilégios e as posições sociais em seus devidos lugares. Esta é uma tendência explosiva, pois vai esgarçar o sentimento de pertença comunitária local, desnudar os mecanismos da política do favor, e potencializar a dimensão da luta de classes na sociedade. Quem sabe um dia chega a hora de surgirem alternativas a tais grupos dominantes e, de forma consistente, vozes que sempre estiveram caladas ou que falaram muito pouco ao longo desses últimos cinquentas anos aqui retratado, esboçam palavras e frases de reação, num sussurro de discurso que vá ganhando fôlego? Quem sabe essas pessoas, comungadas em um projeto societário mais amplo, descubram que um dia as ruas e vielas dessa cidade já serviram de solo para camponeses descontentes, indígenas revoltados, negros escravizados, fugidos das senzalas, e que chegou a vez de novos sujeitos se apresentarem como construtores de sua própria história? Quem sabe essa descoberta não leva a desmontar a cortina da naturalidade desta decadência e desta opressão, e fazer aparecer a história aberta de possibilidades e futuro, como aquele sol que me ofuscava na infância e que continua a se levantar todas as manhãs?
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5. CONSI DER AÇÕES Na compreensão dos autores, a tarefa está cumprida. Apresenta-se aos futuros estudantes e futuros pesquisadores das áreas aqui aparecidas um instrumental muito próprio construído para esse livro que merece ser mais submetido a uma crítica epistemológica. Os dados estão aí como novos elementos empíricos que possam contribuir ainda mais aos estudos de outras pesquisas que certamente virão. A região é carente de registro e tudo exige o seu registro. Pensam ainda que com o material historiográfico apresentado seja possível não suprir totalmente uma lacuna presente com a ausência de dados, sobre a política local dominante, para que os jovens e futuros políticos possam mais e melhor conhecer. Nada precisa ser camuflado ou negado. Tudo carece de estar às claras. Do ponto de vista político, a opção muita cristalina dos autores trespassou em seus textos e que cada leitor pode, por si mesmo, identificá-la. Eles assumem, todavia, a posição política de busca por mudanças, as mais profundas que possam transformar as relações entre as pessoas, em todas as dimensões culturais de suas vidas. Transformações sempre para um viver melhor com participação das pessoas na política, no econômico, para que se alcance cidadania, liberdade, justiça e felicidade. Quanto à historiografia do lugar, em especial no que tange a dimensão histórica tão marcante e desconhecida, destacou-se a retomada da existência de uma guerra que durou quase 5 anos, em todo o polígono da Guerra dos Cabanos, tendo sido escondida das massas trabalhadoras do lugar e muito pouco estudada na região com recorrências até os dias de hoje. Mas este não é um estudo
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sobre tão importante guerra mas um início de pontuação de sua existência para aqueles e aquelas do lugar. O texto, é portanto, um forte desejo de explicitação dos ocorridos que ideologicamente se escondem nas interpretações da dominação e enganam aquelas camadas sociais mais desprotegidas de poder interpretativo e de reduzida consciência de classe social. Distancia-se da visão do homem preguiçoso posto ao índio, bem como, do desprezo para com a contribuição cultural negra à toda região. Sabe-se que não foi pela indolência que se construiu o atual patamar cultural que se vive. Aquilo que de bom existe passou e, hoje, se constrói pelas mãos calejadas por muita luta e coragem daqueles que viveram e continuam a viver com a força do seu trabalho, as classes trabalhadoras aqui estabelecidas. Assim, esperam os autores que este livro possa ajudar à formação de melhores líderes políticos, contribuindo para que a cidade de Colônia exerça o seu necessário papel de liderança em toda a região do vale do Rio Jacuípe. Para isto, urge melhorar as condições gerais da vida das pessoas.
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6. NOTA S S OBRE O S AU TORES JOSÉ FRANCISCO DE MELO NETO (ZÉ DE MELO NETO) Nasceu em 16 de janeiro de 1951, em Colônia Leopoldina, Alagoas. É filho de Doralice Bezerra de Melo (Dorinha Loló) e Francisco José de Melo (Chico Loló). É Professor Titular da Universidade Federal da Paraíba - UFPB. É Graduado em Química e em Filosofia, com Mestrado, Doutorado e Pós-doutoramento em Educação, pelas Universidades: Estadual da Paraíba (UEPB), Federal da Paraíba (UFPB), Universidade de Brasília (UnB), Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Universidade de São Paulo (USP), respectivamente. Organizou a coletânea em dois volumes da produção de livros sobre Colônia Leopoldina. Autor de vários livros, produtos de suas pesquisas, como: Usina Catende - para além dos vapores do diabo; Educação Popular - enunciados teóricos vol. 3; Diálogo em Educação - Platão, Habermas e Freire e outros livros. É membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPED), do Sindicato de Docentes da Universidade Federal da Paraíba (ADUFPB), membro-fundador da Academia de Cultura de Colônia Leopoldina - ACCL, e seu primeiro Presidente.
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OSVALDO BATISTA ACIOLY MACIEL
É licenciado em história pela Universidade Federal de Alagoas(UFAL), doutor em história pela UFPE e militante comunista. Pesquisador nas áreas da História Social do Trabalho e de Teoria e Metodologia da História, dedicando-se atualmente ao estudo crítico da historiografia a partir da perspectiva marxista, e à história da classe trabalhadora e do sindicalismo em Alagoas. Atualmente é professor adjunto da UFAL. Possui vários trabalhos publicados na área e sente saudades de andar com os pés descalços nas ruas de Colônia. Tem uma filha de dois anos, e de vez em quando, maltrata uma guitarra velha.
SÍLVIO CÉSAR DA SILVA DE CARVALHO Possui graduação em Licenciatura em História pela Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul (2009), Palmares, Pernambuco. Atualmente é professor-monitor - Secretaria de Educação de Alagoas e professor efetivo - Secretaria de Educação de Pernambuco. É fundador da Academia de Cultura de Colônia Leopoldina, no Estado de Alagoas.
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