NeF Out-Nov 24'

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N O V A e m F o l h a

O QUE NOS LEVA A FAZER UMA ESCOLHA? SEJA ELA PEQUENA, OU GRANDE, ALGUÉM A CADA SEGUNDO FAZ UMA ESCOLHA. PORQUE É QUE SE FAZ, E COMO O FAZEMOS? QUE PENSAMENTO INTRUSIVO DECIDIMOS OUVIR PARA COMETER O MAIOR ERRO DA NOSSA VIDA OU A MAIOR VITÓRIA DE TODAS? COMO É QUE OS GOVERNOS ESCOLHEM MUDAR A VIDA DAS PESSOAS E O QUE FAZEMOS POR ELES? NO FUNDO, ESTAMOS SEMPRE A PENSAR NELAS, EM COMO AGIMOS E COMO OS OUTROS AGEM E, POR ISSO, É NESTA EDIÇÃO QUE ESCOLHEMOS PENSAR SOBRE ELAS E O QUE NOS MOTIVAENQUANTOINDIVÍDUOS,ENQUANTOESTUDANTES,ENQUANTOCIDADÃOSEENQUANTOGERAÇÃO.

UMJORNALD@SESTUDANTESPARA@SESTUDANTES! S C L O H A S

Foto da capa

Montagem por NOVA em Folha.

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A ado(p)ção do acordo ortográfico em vigor é uma decisão individual d@s membr@s da equipa de reda(c)ção e colaborador@s

Após a revisão completa do material recolhido pela equipa editorial, o seu conteúdo e versão final são da responsabilidade e exprimem somente o ponto de vista d@s respectiv@s autor@s Este jornal é impresso em papel 100% reciclado. notas

Conteúdos

06 Editorial

No Editorial, Manuel Gorjão relembra um episódio contado por Jô Soares e reflete sobre as escolhas que verdadeiramente fazemos ao longo da vida (incluindo a escolha de escrever um editorial)

07 Notíciasdosúltimostempos

O NeF compila algumas notícias de todos os cantos do planeta que te podem ter passado ao lado durante o verão

09 Aescolhagovernativadevero paísaarder

A “tradição” dos incêndios e seus culpados: o capital, representantes políticos e o eucalipto O contraponto da luta popular rural pela segurança

12 Aliberdadedeterescolha

A realidade desfavorável dos Cuidadores Informais em Portugal, um estatuto reconhecido desde 2019 Invisibilidade deste trabalho sem proteção social e desvalorizado num país envelhecido

17 Gazaescolheuoutubro

O NEANTRO fala-nos de um ano de escalada de tensões no Médio Oriente A situação de sobrevivência e resistência de Gaza face ao colonialismo israelita que investe no seu genocídio

33 AGrevedosjogadoresna Europa:CalendárioDesumano

O João Correia e o Diogo D´Alessandro juntaram-se, nesta edição, para escrever um artigo aprofundado acerca das recentes greves dos jogadores de futebol masculino, devido ao pesado calendário de jogos agora em vigor Desde a história desta mudança às reações das diferentes estrelas deste desporto, este vasto artigo reúne tudo o que precisas de saber sobre o mais recente abalo no mundo do futebol

45 Destinosimprováveis,escolhas acertadas

Neste artigo, encontrarás três destinos turísticos menos conhecidos pelo público viajado, que podem valer tanto a pena quanto aqueles de maior renome! A Sofia Diniz partilha contigo as melhores características destes locais e as razões pelas quais deves apostar neles!

46 10livrosparalernoHalloween

A Ana Karapchuk fez-te uma surpresa e juntou uma lista de livros, desde o século XIX até ao século XXI, que te podem fazer companhia nas noites chuvosas e assustadoras deste Halloween! Há livros para todos os gostos e uma pequena descrição dos mesmos Boas leituras!

novaemfolha@fcsh.unl.pt

@novaemfolha.ae @novaemfolha.aefcsh

Out/Nov2024

Direção Clara Figueiredo

Margarida Calado

Tália Moniz

Redação Afonso Noronha

Ana Karapchuk

Alice Couto

Bárbara Rafael

Beatriz Martins

Carolina Gonçalves

Carolina Ramos

Dinis Fernandes

Diogo D’Alessandro

Diogo Mota Duarte

Gonçalo Pato

Guilherme Pinto

Helena Gregório

Inês Fonseca

Revisão Clara Figueiredo

Inês Fonseca

Leonor Moreira

Mar Ferreira

Margarida Calado

Margarida Figueiredo

Sofia Fernandes

Victoria Leite

Ficha Técnica

EdiçãoGráfica Clara Figueiredo

Eduardo Valério

Madalena Grilo Teles

Margarida Figueiredo

Mariana Sousa

Natali Gonçalves

Victoria Leite

Inês Lopes

Inês Moreira

Isabel Bentes

João Correia

João Pinhal

José Miguel Perfeito

Leonor Ribeiro

Leonor Vieira

Lourenço Rosa

Madalena Andaluz

Manuel Gorjão

Mar Ferreira

Maria Beatriz Silva

Maria Faria

Mariana Aleixo

Mariana Arruda

Mariana Ribeiro

Martin

Matilde Marques

Miguel Pereira

Pedro Lázaro

Raquel Francisco

Ricardo Reis

Sofia Diniz

Tiago Freitas

Tomás Amado

Tomás Vila Nova

Victoria Leite

Colaboradores AEFCSH

Ana Clara Cardoso

Guilherme Vaz

Inês Jorge

João Marchão

Laura Abreu

Luís Toledo

Mia NEANTRO

RTAN

Rita Esteves

Índice

AE em Folha

Editorial: Escolhas

Notícias dos últimos tempos

As escolhas do governo PSD-CDS: sobre a RTP e o Jornalismo

A escolha governativa de ver o país a arder/ Incêndios consomem parte da Ilha da Madeira

Regiões à Margem: A Luta pela Educação no

Interior

A escolha foi dela - o problema do revenge porn e a insistente violência contra as mulheres

A Liberdade de Ter Escolha

A emigração na campanha eleitoral dos EUA

Eleições Legislativas em França: Escolhas e Consequências

O Caminho dizemo-lo nós

Gaza escolheu outubro/ Extermínio televisionado

A escolha de não agir

E Quando Deus criou o mundo deu à Albânia

Uns no Pato outros na Prisão

O livre-arbítrio e a moralidade em Éric

Rhomer/ Estudar: Escolha ou Direito?

O que eu gostava que não me tivessem dito antes de ir para a universidade

Xeque-Mate/ Penúria

Lisboa menina e moça miserável

Cidade (des)encantada/ ÍCARO

O DoomScroll como uma luta contra o capitalismo

Tudo o que não escolhemos azer com o nosso tempo/ Entre Tik Toks e Escolhas - O Que Nos Guia?

(Más?) Escolhas/ Ode aos Camaleões

Leopoldo e Helena de Almeida: academismo propagandístico e a autorrepresentação libertária

In-Yun

Vai Descansar Vagabundo/ Medo de Futuro

Portinhola/ Omelete

Calendário Desumano

Euro 2024, O Verão dos Sonhos

Jogos Olímpicos 2024

As Descobertas de Nuno Folha

Bumble e a Faculdade/ Volante

O primeiro arraial da RTAN

Agenda Cultural

Divã + Maruja, Musicbox, 7-10-24

Destinos improváveis, escolhas acertadas

10 Livros para Ler no Halloween

Filmes e Séries para veres neste Halloween

Saliva Escorrendo

Galeria de Fotos do 1º Churrasco do Ano

Passatempos!

FOLHA AEEM

Sabemos que só com a devida união e organização dos estudantes alcançaremos o ensino que consta na Constituição da República Portuguesa. Pelos colegas que não conseguiram ingressar no Ensino Superior pois viram na propina e na falta de alojamento um entrave para tal, pela vontade de lutar pelo ensino a que temos direito. Não verão a AEFCSH de braços cruzados!”

Iniciado mais um semestre em todas as faculdades e escolas do país, os estudantes, deixando para trás a calmaria do verão, defrontam-se agora com os velhos problemas já conhe-

cidos do Ensino Superior português, mas também com outros que, sendo novos, têm as mesmas origens que os restantes

Em contacto com a comunidade estudantil nos vários sítios da faculdade, a AEFCSH recolheu inúmeros problemas que preocupam os estudantes A iniciativa, que ainda está a decorrer e que é um processo contínuo, pretende recolher os problemas concretos que a comunidade estudantil aponta relacionados na FCSH e no Ensino Superior no geral Estes elementos estão a ser agrupados num caderno reivindicativo que será apresentado em RGA e posteriormente à Direcção da Faculdade e Reitoria da Universidade

O caderno estará disponível na AE para consulta, mas também para acrescento do contributo de todos

Problemas como a subida do preço da refeição social para 3 euros, a manutenção

propina e outras taxas e emolumentos, a falta de alojamento estudantil e de psicólogos suficientes nas IES levaram a AEFCSH, junto com várias associações de estudantes do país, a sair à rua no dia 9 de outubro lançando o apelo “Aumentar? Só a Luta!” que culminou num grande momento de afirmação da união dos estudantes e daquilo por que lutam - o Ensino Superior de Abril, gratuito, público, democrático e de qualidade

Se o arranque do ano lectivo se deu em Portugal, tal não aconteceu em Gaza, onde mais de uma centena de escolas e universidades foram totalmente destruídas Como sempre solidários com a luta do povo palestiniano, os estudantes participaram numa Vigília pela Palestina, ao dia 24 de setembro, decorrida no campus de Berna, organizada pela AEFCSH e com a participação de associações como o MPPM e o CPPC. Participámos também na Manifestação de dia 12 de Outubro, que culminou uma jornada nacional de luta em solidariedade com o povo palestiniano. Para além disto, também decorreram várias actividades de lazer como um convívio de receção aos caloiros, sessões de cinema no espaço da AE, e o grande churrasco do pri-

meiro semestre – Acabar com a propina e beber uma fresquinha!

A AEFCSH continuará aberta e ao lado dos estudantes Sabemos que só com a devida união e organização dos estudantes alcançaremos o ensino que consta na Constituição da República Portuguesa. Pelos colegas que não conseguiram ingressar no Ensino Superior pois viram na propina e na falta de alojamento um entrave para tal, pela vontade de lutar pelo ensino a que temos direito Não verão a AEFCSH de braços cruzados! da

Foto do primeiro churrasco do ano: Margarida Calado

ESCOLHAS

Outubro/Novembro

Recordo um episódio relatado na primeira pessoa por Jô Soares e que se passou com o seu filho, Rafael Soares Estando os dois numa livraria, o Rafael chegaàcaixacom

uma dúzia de livros para pagar Surpreendido com a quantidade, Jô Soares diz-lhe «Espera aí, Rafa! É muito Escolhe seis!» «Não, então não quero nenhum» , responde-lhe o filho Vendo mácriação no acto, questiona Jô: «Como não quer nenhum?» «Eu prefiro não escolher Escolher é perder sempre» Esta história contada pela voz emocionada de Jô falando aquando do falecimento do seu filho tem mais interesse para o leitor do presente texto, mas mesmo assim eu escolhi tentar transcrevê-la tirando-lhe pois o interesse

Quando escolhemos uma coisa não estamos apenas a mostrar preferência por ela, estamos a perder a outra, as outras Talvez que a palavra não seja bem perder, talvez tenhamos que reavivar aquela ideia de deixar de ganhar Escolhendo uma coisa perde-se a oportunidade de ter outra e perder a oportunidade é meio caminho para não ter nunca Não se perde o que nunca se teve Nem também se ganha o que nunca se terá Perante o acto da escolha, temos nas nossas mãos o poder de decidir o futuro, tratando de tentar prever ou perceber previamente em que direcção aponta cada uma das possíveis escolhas e, em conformidade com as nossas convicções, agir, isto é, escolher

Muitas vezes não conseguimos medir ou quantificar a perda de algo que nalgum momento consideramos nosso, muito menos conseguimos medir ou quantificar aquilo que poderíamos ter tido caso o tivéssemos escolhido quando tivemos a oportunidade de o fazer O que perdemos nós por teimar que não sabemos por onde vamos, que não sabemos para onde vamos mas que sabemos que não vamos por aí? A vida, estou em crer, não tem acta final; o purgatório, a existir, vai ser local de reflexão de, no máximo, um Best ofPiores e Melhores Momentos dentro da Terra Não se mede ou quantifica porque na verdade não interessa bem Escolher não implica somente

ManuelGorjão

ter várias hipóteses a selecção, implica também a possibilidade, a oportunidade, a liberdade de escolher Escolher, quando o é realmente, é uma acção activa na sua plenitude As nossas escolhas serão sempre livres? A própria realidade de alguém formular esta pergunta é já a resposta, não é necessário responder o óbvio, de obviedades estão as colunas de opinião cheias A resposta está na vida de cada um, na vida em sociedade A vida mais não é (é mais, sim senhor) que o conjunto das escolhas que fazemos a cada momento É aí que reside a incerteza da vida Não tivéssemos nós de fazer uma única escolha e estaríamos condenados à linearidade daquilo a que não poderíamos então chamar de vida Eu escolhi escrever este texto, arrependi-me depois quando realizei que não tinha grande coisa a acrescentaraotemaelideicomasconsequências

mais imediatas da minha escolha, estou a escrever e vou acabar de escrever este texto, e hei de lidar mais tarde com as consequências menos imediatas da minha escolha, ter de ir à Academia Sueca agradecer o Nobel da Literatura e talvez, figas, o da Paz

Quantas foram as vezes que tivemos a possibilidade de escolher? Quantas vezes fomos livres de escolher qualquer uma das alternativas a escolha? Quantas vezes escolheram por nós? Quantas vezes pensamos estar escolhendo e o não estamos? Quantas vezes se trata algo de uma escolha entre o sim e o não, entre o bem o mal, entre mim e ti? Quantas vezes ganhamos pensando estar perdendo? Quantas vezes perdemos pensando estar ganhando? Quantas vezes uma escolha é uma escolha?

A Game of Chess, George Kilburne

Notíciasdosúltimostempos

Queprovavelmentenãoviste

GLOBAL

Verão de 2024 declarado por cientistas climáticos como o verão mais quente da história:

A Europa foi atingida por ondas de calor mortais e condições meteorológicas extremas durante todo o verão

AMÉRICA

São Paulo declarada a cidade com pior qualidade de ar do mundo:

A metrópole brasileira regista índices de qualidade de ar mais preocupantes do que países que se encontram em guerra

Milhares de pessoas em situação precária no México devido a restrições no pedido de asilo para os Estados Unidos:

Mexicanos esperam semanas na fronteira para conseguir uma entrevista

EUROPA

Extrema direita vence eleições na Áustria:

O “Partido da Liberdade (FPÖ)” obteve uma vitória histórica, registando 291% dos votos

Estudos sobre a eficácia dos transportes públicos declaram Roma a cidade com o pior grau de satisfação, com 29 pontos percentuais, enquanto Tirana lidera com 91%: Lisboa foi avaliada com 62% de satisfação

ÁSIA

China tenta transformar deserto em áreas florestais e pastagens:

Estão a ser utilizadas plantas nativas no deserto de Gobi de forma a torná-lo em terras agrícolas Coreia do Sul exibe o seu mais poderoso míssil balístico e deixa um aviso à Coreia do Norte: Yoon relembra o governo de Kim da aliança entre a Coreia do Sul e os Estados Unidos e a sua prontidão em atuar

ÁFRICA

Sudão atinge o mais alto número de desalojadas após meses de Guerra Civil: Há já 10.9 milhões de pessoas desalojadas, níveis apenas vistos na guerra da Síria

Venâncio Mondlane declara-se presidente de Moçambique nas eleições do passado dia 9 de outubro: Os resultados oficiais serão conhecidos 15 dias após a eleição

OCEANIA

Exposição “Ladies Lounge”, apresentada no museu Mona, na Tasmânia sofreu um processo de alegada discriminação por parte de um homem, pois a exposição é destinada apenas a mulheres:

O tribunal da Tasmânia decretou em favor do museu, decidindo que não houve qualquer discriminação

AsescolhasdogovernoPSD-CDS: sobreaRTPeoJornalismo

A redação do Nova em Folha não podia ficar indiferente às últimas declarações de Luís Montenegro e do seu governo acerca do novo Plano de Ação para a Comunicação Social, que procura essencialmente a resolução dos problemas do jornalismo nacional privado

A ideia com que fiquei, depois de ler o Plano de Ação, é que o atual governo, ao decorar a narrativa de chavões agradáveis como ‘transparência’, ‘pluralismo mediático’, ‘diversidade’ e ‘inclusão’, o que mostra, de facto, é um imenso menosprezo por aquilo que é o enorme serviço público oferecido pela RTP aos portugueses há mais de 50 anos Ao desprover progressivamente o canal de uma das suas principais fontes de financiamento (a publicidade comercial), e ao simultaneamente anunciar 250 ‘saídas voluntárias’ (despedimentos), sem qualquer tipo de reforço orçamental em vista para o canal, o governo está, resumidamente, a declarar o início do seu fim

A apologia a uma ‘nova RTP’ subfinanciada, em articulação com provável dinheiro para os privados e a promoção de uma tal de ‘igualdade de oportunidades’ (uma forma de ‘equiparar’ a RTP aos outros canais), é inevitavelmente uma enorme desvalorização da imensa história e variedade de serviço público que a RTP tem vindo a proporcionar a todos os portugueses ao longo das últimas décadas: desde os vários canais (RTP1, RTP2, RTP3, RTP memória, RTP Açores, RTP Madeira, RTP África, RTP Internacional), às Antenas de rádio 1, 2 e 3, a passar pela RTP Play e pela RTP Arquivos, falamos de uma panóplia de missões a nível sociocultural e jornalístico que ficam agora num clima de insegurança e instabilidade Destaco ainda a preocupação manifestada pela Associação Portuguesa de Argumentistas e Dramaturgos face às notícias, sendo que a RTP fornece múltiplos apoios financeiros, sobretudo nas áreas culturais do teatro, cinema e séries

Assim, a RTP é um canal diferenciado dos demais, é o canal dos contribuintes portugueses, e é inquietante que a escolha do governo seja pôr em causa essa diferenciação: ao questionar a sua exclusividade, a decisão do PSD-CDS é a progressiva descaracterização e menorização deste serviço

amento da RTP e possível benefício para os privados, Balsemão acrescenta que ‘será o mercado a ditar o destino dos €22M que esta medida libertará’, mas que ‘todos temos a obrigação de conseguir agarrar esta oportunidade’, todos menos a RTP; acaba o comentário com uma mensagem de esperança para todos os seus stakeholders, que fala por si1

Estamos, assim, perante um conjunto de opções políticas que determinam o desdém deste governo pela valorização e qualidade do serviço público jornalístico e cultural prestado pela RTP, e que deliberam a escolha e preferência pelo jornalismo submisso aos grupos económico-mediáticos

No fundo, é só mais um exemplo de política de direita, que parece esforçar-se sempre para desmantelar aquilo que de bom têm os portugueses e que construiu o estado português, desde o SNS à RTP, as estratégias são as mesmas, quem fica a perder são os mesmos, e quem fica a ganhar é, para variar, a iniciativa privada e os seus acionistas Um plano que visa a ‘reestruturação’ e ‘modernização’(vocabulário empresarial tipicamente neoliberal) da RTP não passa, assim, de um programa de fachada para satisfazer aquilo que as empresas de média privadas ansiavam há tempo, e como, aliás, Francisco Balsemão (CEO do grupo Impresa) tornou óbvio no seu comentário no Linkedin acerca do assunto: diz que ‘foi tomada uma decisão histórica’, ‘pela qual a SIC e a Impresa muito batalharam, e que só peca por tardia’; sobre o subfinanci-

https://www instagram com/p/DA9K--ZRatg/?img index 2

Fonte: Observador

InêsMoreiraeLeonorVieira

Fonte:SICNotícias

Aescolha governativadever opaísaarder:

Quemtemculpanacatástrofe incendiária?

InêsMoreira

Num país pequeno, mas que tanto gosta de honrar as suas tradições, era estranho ver-se um verão que terminava sem haver uma catástrofe incendiária provocada por meia dúzia de “maluquinhos piromaníacos” que adquirem um certo prazer em ver o país a arder Tardou, mas chegou a 16 de setembro quando a população de Aveiro viu terras e terras arderem, casas a irem pelos ares, trabalhadores a perderem as suas vidas, assim como bombeiros a combater um fogo que parecia não cessar O dia marcou o fim do verão, ironicamente pelo calor das chamas que invadiu a região Enterram-se os mortos e o Presidente da República comparece numa postura de impostor que quase parece tirada de um filme em que o assassino presta homenagem à sua vítima Fazem-se discursos comoventes nos meios de comunicação, “asseguram-se” abrigos para a população que precisa de ser realojada e homenageiam-se os bombeiros pela sua devoção incondicional em proteger a vida dos portugueses E no ano seguinte tudo se repetirá

E repetir-se-á a “lenga lenga” de que é necessário prender estes criminosos, limpar as matas e talvez ainda se fale um pouco das alterações climáticas para se denotar alguma sensibilidade para com o aumento da temperatura do planeta O assunto é varrido para debaixo do tapete e espera-se até ao próximo verão A população - a quem a voz não é dada - reza para que não sejam eles a arder futuramente, conscientes da sua impotência sobre a sua segurançaedassuascasas

A tragédia dos incêndios atormenta a população portuguesa já há décadas Relembremo-nos da guerra no Vale do Lila, escondidíssimo por entre a floresta em Valpaços, no final dos anos 80, mais precisamente em 1989 Protagonizada pela população local, que sofria regularmente com os incêndios na zona, levantouse um protesto em que se reuniram 800 transmontanos - decididos a deixar de ver a sua terra arder A este ponto a população já se teria apercebido do grande anjo do apocalipse que infortunava as suas vidas: o eucalipto e quem o plantava Com o lema “Oliveiras sim, eucaliptos não”, berrado em coro pelos homens, mulheres, crianças e idosos, decidiram destruir os 200 hectares de eucalipto que uma empresa de celulose andava a plantar na Quinta do Ermeiro, a maior propriedade agrícola da região E fizeram-no à mão, tão pequenos eram os troncos dos eucaliptos recém plantados na área Resistiram face à forte repressão policial que sofreram, mobilizando-se até para uma esquadra onde havia sido preso José Oliveira, um camarada que trazia um revólver consigo, pronto a proteger os demais de quem os viesse impedir de travar esta guerra contra o capital ameaçador da Soporcel, agora parte da fábrica de papel The Navigator Company E quando os tentaram impedir e cercar, voltaram clandestinamente à noite e arrancaram os eucaliptosquefaltavam Cumpriramasuamissãoe a sua terra nunca mais ardeu Provaram que o eucalipto - por ser uma árvore alta e extremamentecombustível-arderápidoeespalha o seu fado até uma longa distância, facilitando-lhe otrabalhoumapequenarajadadevento

Esta população lutou e libertou-se de um terrível destino No entanto, a indústria da celulose conquistou Portugal e este tornou-se um dos maiores produtores de papel da Europa, sendo as teses dos governos de Cavaco Silva, nessa década, e dos demais que “urgia substituir o minifúndio e a agricultura de subsistência por monoculturas mais rentáveis”, que fazem aldeias arderem todos os verões Estamos em 2024 e os incêndios a que assistimos o mês passado não falham em cumprir a tradição em seguir o mapa dos eucaliptos que quase ironicamente, delineia perfeitamente as áreas que arderam Portugal arde mais que qualquer país europeu Mas quem arde, apenas o faz em sacrifício destas empresas

que ganharam o seu papel de destaque na indústria da celulose

Neste momento, a Navigator Company, acima mencionada, e a Altri, ambas empresas de celulose, possuem uma área florestal conjunta de 2400km2 e ainda gerem mais de 1000km2 de área de pequenos proprietários, sendo quase 80% dela eucaliptal Criaram ainda uma companhia de bombeiros privada, a Afocelca, que apenas gere as suas propriedades, permitindo sempre a sua manutenção As outras propriedades que ardem, destruídas e deixadas ao abandono, integram os planos de expansão destas duas empresas e são 80% das vezes replantadas com eucaliptos Um plano perfeito para o capital, que não só arde e destrói as terras como deixa um rastro de poluição, cinzas, desalojados e mortos pelo caminho

O que fizeram no Vale do Lila, há 35 anos, na luta dos populares, militantes ecologistas e ambientalistas, mostra que é preciso reivindicar o direito e o controlo sobre a terra, responsabilizar os verdadeiros culpados Será isto ou esperar a total barbárie

“ O assunto é varrido para debaixo do tapete e espera-se até ao próximo verão A população - a quem a voz não é dada - reza para que não sejam eles a arder futuramente, conscientes da sua impotência sobre a sua segurança e das suas casas”

Incêndios consomemparte daIlhada

Madeira

LeonorVieira

O dia 14 de agosto de 2024 fica marcado pela grande destruição causada pelos incêndios na ilha da Madeira Só no primeiro dia, a área ardida equivale ao total de área afetada no ano de 2023 Neste ano de 2024 registou-se a maior área ardida desde 2010 O que fizeram no Vale do Lila, há 35 anos, na luta dos populares, militantes ecologistas e ambientalistas, mostra que é preciso reivindicar o direito e o controlo sobre a terra, responsabilizar os verdadeiros culpados

Será isto ou esperar a total barbárie

O incêndio começou na Serra de Água e durou mais de uma semana, o que resultou na sua expansão para os concelhos de Câmara de Lobos

onde se encontra o Curral das Freiras; o da Ponta do Sol por meio do Paul da Serra e o de Santana através do Pico Ruivo Foram registados pelo menos 4392 hectares de área ardida

A causa deste incêndio foi o lançamento de um foguete, que, por sinal, foi devidamente autorizado pelas autoridades Esta atitude coloca em causa todas as políticas e promessas feitas relativamente à prevenção de incêndios Além da origem questionável do fogo, a resposta de Miguel Albuquerque, Presidente do Governo Regional da Madeira, ao apoio da República, foi amplamente criticada

Adicionalmente, as condições organográficas foram favoráveis ao alastrar do fogo, sendo o relevo irregular, juntaram-se as elevadas temperaturas e a velocidade excessiva do vento No entanto, os bombeiros ressaltaram a possibilidade de recorrerem aos poços de água disponíveis nos terrenos, caso estes se encontrassem em boas condições de utilização

Ao longo dos dias a necessidade de evacuar as pessoas das suas casas foi aumentando Algumas acabaram por sair, ainda que com alguma resistência, enquanto outras recusaram qualquer tipo de aconselhamento que envolvesse abandonarasuacasaeosseusanimais Após interromper as férias em Porto Santo, uma das ilhas do arquipélago da Madeira, o Presidente da região dirigiu-se às zonas mais afetadas da ilha da Madeira, onde a sua receção não foi como imaginara A indignação da população era evidente, especialmente devido à sua atitude negligente e desvalorizante face ao risco e gravidade da situação Este conjunto de eventos causou assim uma onda de frustração na população, tendo ainda MiguelAlbuquerqueouvidoum“aculpaésua”

LeonorVieiraeGonçaloPato Política/Notícias

“ A causa de lançamento de sinal, foi devid pelas autorid coloca em cau e promessas fe prevenção de origem ques resposta de M Presidente do Madeira, ao ap amplame

Os incêndios levan à falta de controlo e sentido, surgiram especulações de que se tratasse de uma tentativa de gerar área para a construção de um sistema de teleférico na zona do Curral das Freiras, sem possibilidade de contestação por parte da população, o que, evidentemente, causou grande revolta por parte dos habitantes

Claramente, o objetivo deste projeto seria melhorar a experiência dos turistas, abdicando daquilo que a ilha tem de mais valioso: a sua vegetação Esta é essencial para garantir a qualidade ambiental, controlar os níveis de poluição e assegurar a disponibilidade de água ao longo do ano E por este motivo a população contra posicionou-se perante um projeto que serve única e exclusivamente para o entretenimento de visitantes que após um curto período se vão embora

Regiõesà Margem:ALuta PelaEducação noInterior

Em algumas regiões do interior, o silêncio faz-se sentir pelas universidades: cursos sem alunos, cadeiras sem ocupantes Faculdades outrora dinâmicas, que funcionavam como motores de desenvolvimento local, abrem as portas para salas vazias e programas que existem apenas no papel Após a saída dos resultados da segunda fa (Concurso Nacional de Ac Superior) e o aumento de v Superior, foi confirmado que lugares Destes lugares, const pertenciam a instituições Interior do País, formando qua Os institutos politécnicos Castelo Branco, Viseu, Gua destacaram-se por serem os maior número de vagas sobran

Cada vez mais se observa uma queda populacional no interior, que por sua vez intensifica a dificuldade observada no recrutamento de estudantes, como afirma António Fernandes, Presidente da Comissão Nacional de acesso ao ensino superior Esta desertificação académica é um reflexo direto da centralização do ensino superior nas grandes cidades, que atraem a maioria dos estudantes Ademais, as despesas associadas a ser um aluno deslocado continuam a ser um dos principais fatores para o abandono dos estudos no interior, considerando que estas chegam a ultrapassar os 900 euros por mês, além da alimentação Algo que, em parte, se deu devido ao aumento não só do custo de habitação mas igualmente do custo de bens e serviços

De forma a contrariar esta tendência, seria necessário um esforço coordenado entre o governo, as instituições de ensino superior e as autarquias, criando incentivos e proporcionando melhores condições de vida aos estudantes Apesar de programas como +Superior, especialistas, incluindo a Presidente do CCISP, alertam que o programa necessita de uma ampliação dos seus apoios A verdadeira revitalização das universidades do interior depende da descentralização do ensino superior, acompanhada por políticas que reduzam os preços dos bens, serviços e o custo da habitação Somente com a combinação das medidas se poderá criar um ambiente propício ao desenvolvimento

PolitécnicodeCasteloBranco;Fonte:PUCGoiás

AESCOLHAFOIDELA

Oproblemadorevengeporneainsistenteviolência contraasmulheres

Foi descoberto neste verão, em Portugal, um canal do telegram com mais de 70 000 utilizadores, maioritariamente do sexo masculino, onde se partilham diariamente fotos intimas de mulheres de todo o país, ou até mesmo vídeos íntimos feitos por duas pessoas que já estiveram numa relação juntas. Esta notícia foi originalmente divulgada num artigo de opinião de um conhecido jornal português, ganhando grande atenção através de um post do jornal e da respectiva autora do artigo no Instagram e é na secção de comentários deste post que os comentários mais misóginos surgem, sendo da autoria tanto de homens como de mulheres, atacando inclusive a autora do artigo “Ok… posso ser o 70.001 seguidor?”, “Alguém me pode adicionar pff?”, “Mulheres aprendam de uma vez por todas: PRESERVEM-SE”, “O ideal é mesmo não correr o risco e não enviar esse tipo de conteúdo”, “Como esta pacóvia chegou a cronista é um enigma por desvendar”- estes são todos comentários reais de homens e mulheres do país que se manifestaram acerca desta notícia nas redes sociais

Todos sabemos que uma grande percentagem de mulheres já foram vítimas de revenge porn e todos já ouvimos falar de nudes de uma amiga, de uma irmã, de uma colega, de uma prima, de uma colega de uma amiga que foram espalhados pelo namorado ou ex-parceiro, Também todos ouvimos os mesmos comentários “a escolha foi dela, de enviar este tipo de fotos” mas se pararmos para pensar estas vítimas simplesmente confiaram nos seus parceiros e a escolha foi deles de partilhar este tipo de conteúdo privado, a vítima viu toda a sua reputação destruída e vida privada partilhada publicamente e a escolha foi da sociedade em julgar a vítima em vez do abusador

IlustraçãodoJulgamentodocasodeGisèlePelicot Fonte:Swissinfo

Em França veio também a atenção do público que uma mulher de 70 anos foi dopada pelo seu marido para depois ser violada por diferentes homens Estes crimes duraram durante 10 anos, 10 anos durante os quais esta foi violada por entre 50 a 70 homens diferentes

Com certeza que este acontecimento não foi escolha dela, também não foi escolha dela as gravações que o marido fez destas mesmas violações

Mas foi escolha do marido dopá-la, permitir tais agressões e filmá-lo Foi uma escolha dos agressores praticarem estas agressões

1 em 3 mulheres já experienciaram violência física e/ou sexual durante a sua vida, 81% já foram vítimas de assédio sexual durante a sua vida e os casos de femicídio têm vindo a aumentar mundialmente Nenhuma destas mulheres fez a escolha de ser agredida, assediada ou assassinada

Mas a sociedade fez a escolha de normalizar

a pornografia e a violência contra as mulheres

E os agressores fizeram todas as escolhas que tornaram estas mulheres em vítimas e estatísticas

A violência contra as mulheres não inclui apenas mulheres cisgénero, brancas e heterosexuais, pois o risco de agressão, já elevado, aumenta para mulheres de cor, mulheres transexuais e mulheres com orientações sexuais que não a heterosexualidade

Não são todos os homens que fazem essas escolhas, mas foram pelo menos 70 000 em Portugal e mais de 70 em França São milhares ou até milhões em todo o mundo

Foi a escolha de várias sociedades de normalizar este tipo de comportamentos e culpar as mulheres pelas agressões que sofrem todos os dias

Foi uma escolha dizer: “A escolha foi dela!”

MarianaRibeiro

ALiberdadedeterEscolha

O verdadeiro dilema da liberdade e da escolha surge quando essas duas forças, encaradas como tão simples, são invisíveis para tantos Acreditamos que todos as possuem Mas, na sombra do quotidiano, são aqueles que vivem no rés-do-chão do nosso prédio, que se sentam ao nosso lado no metro e vão connosco de pé no autocarro, os que, em silêncio, são privados de um direito tão simples como o de escolher Esta é a realidade atual dos cuidadores informais que vivem em Portugal, uma realidade desvendada com maestria por Ana Paula Gil em “Quem Cuidará de Mim? Problemáticas em Torno dos Cuidados(In)formais”

Foi a 6 de setembro de 2019 que se deu a implementação do Estatuto do Cuidador Informal enquanto política pública, aprovado pela Lei nº 100/2019, representando o primeiro reconhecimento de um papel tantas vezes invisibilizado, não mais percecionado como uma responsabilidade familiar, moral e gratuita No entanto, o que poderia ter sido uma resposta de esperança para aqueles que carregam o peso do cuidado, revelou-se uma nova batalha: uma desproteçãosocialsobumnovodisfarce

À medida que a esperança de vida aumenta, a população portuguesa envelhece drasticamente, trazendo consigo uma crescente necessidade de apoio Portugal, contudo, ancora a sua política de cuidados em padrões mínimos e palavras ilusórias, ignorando o peso destas necessidades e o impactodestapressãocrescente

As alterações demográficas não apenas trazem uma maior demanda por cuidadores, como também forçam os mais jovens a integrar este cenário De acordo com os dados do INE, entre um total de 1059012 pessoas da população residente com 15 ou mais anos que prestavam cuidados, 66294 tinham entre os 15 e os 24 anos em 2019 O Inquérito Nacional de Saúde estima a presença de 6,3% dos cuidadores informais nesta faixa etária, na sua totalidade mulheres, uma lógica fortemente genderizada que espelha a contínuacentralizaçãodasmulheresnocuidado Estes números são profundamente alarmantes, revelando uma realidade em que o cuidado transborda as fronteiras dos adultos e idosos Muitosjovensassumemagoraopapeldecuida-

dor, sobretudo a familiares, enfrentando uma situação de acentuada fragilidade dada a maior probabilidade de menor suporte, o que pode levar à interrupção dos estudos ou abdicação da entrada no mercado de trabalho

Perante o rendimento insuficiente proporcionado pelo Estatuto de Cuidador Informal, fora as implicações psicológicas e morais, não existe qualquer possibilidade de mediação entre cuidado informal e formal A ausência de um apoio social robusto que realmente valorize o papel dos cuidadores e os inúmeros recursos que o ato de cuidar acarreta fazem com que estes cuidadores se encontrem numa situação de extrema vulnerabilidade

O sistema social força uma escolha impossível

antecipadas, aumento do risco de pobreza e uma prevalência de problemas de saúde mental

A contínua desvalorização e centralização no cuidador informal leva a que, enquanto uns vivem mais tempo, outros sejam forçados a deixar de viver para cuidar O cuidado torna-se, assim, um estilo de vida imposto, palco de subordinação e auto sacrifício disfarçado de dever, que paralisa a vida de quem cuida e monopoliza a liberdade e o direito a NÃO CUIDAR - que não deve ser confundido com abandono, mas sim com a escolha de não estar presente fisicamente de forma constante

Fonte:Bertrandsite

e cria uma armadilha de dependência, onde a conciliação entre cuidado e o mercado de trabalho se torna impraticável mas, simultaneamente, não existem rendimentos para sobreviver fora dele Somente aqueles que dispõem de meios financeiros conseguem vencer esta guerra de interdependência imposta, revelando um sistema social desprovido de ética, dominado pela insuficiência e inadequação de respostas de apoio, perpetuando a precariedade do envelhecimento e cuidados informais Este ciclo de desproteção conduz a uma maior desvinculação do mercado de trabalho, dependência econômica dos familiares, reformas

Embora agora revestido por uma narrativa eloquente e regulamentação, o cuidado informal continua mergulhado em invisibilidade, desamparo e desvalorização, que, apesar de não ser mais visto como trabalho não remunerado, permanece com uma remuneração irrisória É urgente que o Estado intervenha, que se invista mais na despesa pública com o envelhecimento e os cuidados informais, e que uma nova política se erga, uma que dignifique e proteja o cuidador Tal como destacado no ensaio “Quem Cuidará de mim? Problemáticas em Torno dos Cuidados (In)formais”, soluções como licenças para cuidar, flexibilidade do tempo de trabalho, maior apoio financeiro, benefícios ou reduções fiscais e acesso a serviços de suporte são fundamentais

É tempo de refletir, pensar e repensar Portugal, na forma como o sistema de proteção social responde ao desafio da longevidade e às necessidades de quem cuida, mas, é também tempo de olhar para o envelhecimento como, mais do que um desafio, uma oportunidade, não só pelas vidas mais longas, como também pela riqueza de novas aprendizagens

Destaco que a não exploração dos restantes tipos de cuidados e cuidadores não visa negligenciar essas categorias

Um especial agradecimento à investigadora e professora Ana Paula Gil que colaborou neste artigo e me permitiu explanar a sua obra, que acredito profundamente que todas as pessoas se deviam dedicar a ler Que este ensaio, assim como inspirou o meu caminho, continue a inspirar muitos outros a se dedicarem à compreensão deste fenómeno tão crucial

Out/Nov JoãoPinhal&GuilhermePinto

AIMIGRAÇÃONACAMPANHA

ELEITORALDOSEUA:

Comoosmediaandamdebraçodadocomciclosdedesinformação

É difícil o próximo dia 5 de novembro trazer ainda mais dor a Gaza e a Beirute, mas é possível Kyiv segura, para já, a respiração O dia depois das eleições presidenciais dos Estados Unidos da América é ainda uma incógnita Por isso, abstemo-nos de falar do futuro e analisamos a campanha eleitoral A imigração tem sido um dos tópicos-chave desta e das últimas É o 2º problema mais determinante para a escolha presidencial por parte dos eleitores republicanos ou com tendência para votar em Trump (63% deste eleitorado considera a imigração extremamente importante), segundo uma sondagem da Gallup, realizada em setembro deste ano Entre os democratas e respetivos simpatizantes, a percentagem desce para 23% De qualquer forma, no geral, os eleitores dos EUA colocam a imigração no top 5 das questões mais importantes na hora do voto Porquê?

Não existem imigrantes a comer cães nem gatos, nem as pessoas que chegam aos EUA estão a envenenar o sangue do país, como disse Trump recorrendo a teorias da conspiração e a expressões com reminiscências nazis O discurso anti-imigração não é uma novidade e os haitianos, em particular, não se tornaram vítimas ontem Como explica Danielle Boaz, professora de Estudos Africanos na Universidade da Carolina do Norte, a marginalização deste povo tem raízes na década de 1790, quando os haitianos, através de uma revolta de escravos bem-sucedida, desafiaram as potências coloniais Ao que consta, um dos grandes catalisadores para a Revolução Haitiana foi uma cerimónia de Vodu Acredita-se que naquela noite eles invocaram todos os “espíritos” para os guiarem e os protegerem naquele ato de resistência O su-

posto uso da religião Vodu tornou-se uma ferramenta de desinformação, alimentando estereótipos, nomeadamente, na cultura popular moderna, que perpetuam a sua exclusão Assim, a demonização da religião acaba por alimentar a demonização do povo haitiano, muitas vezes marginalizado por ser considerado uma “afronta” às tradições ocidentais cristãs, a uma “matriz americana” que se constrói a partir de uma visão idealizada, purista, dos valores americanos que, por definição, não são estanques como querem fazer parecer

Ao longo do tempo, os grupos-alvo da retórica anti-imigração mudaram Por exemplo, Benjamin Franklin, considerado um dos mais brilhantes fundadores dos EUA, temia que os imigrantes de ascendência alemã pudessem sobrecarregar os EUA e mudar as suas virtudes mais básicas ao introduzirem a cerveja e os parques de diversão na cultura americana Porém, a onda de imigrantes alemães não destruiu os EUA Nos dias de hoje, Trump considera que os haitianos estão

“Nãoexistemimigrantesa comercãesnemgatos, nemaspessoasque chegamaosEUAestãoa envenenarosanguedo país.”

associados a um aumento da criminalidade e das doenças transmissíveis A história repetese

Os EUA são, não só uma nação de imigrantes, como uma potência determinante nas dinâmicas migratórias mundiais A socióloga neerlandesa, Saskia Sassen, mostra como a imigração para os Estados Unidos é frequentemente impulsionada pela sua intervenção militar imperialista O tratamento colonial não desapareceu das relações internacionais, redirecionando-se para o mercado global de fluxos de capital e materiais O ambiente de instabilidade e violência permanente tem efeitos devastadores nas economias e nas estruturas

sociais dos países de origem A intervenção americana assenta na desapropriação de terras, na degradação ambiental e outros projetos de orientação neoliberal Os imigrantes sofrem duplamente: são vítimas de um sistema global que desestabiliza sociedades do Sul Global para beneficiar os interesses do Norte Global e são marginalizados quando se tentam integrar novamente

Não obstante, os fluxos migratórios em direção aos EUA não são suficientes para explicar o posicionamento da imigração no top 5 dos problemas mais importantes para o voto presidencial A literatura científica está povoada de estudos que apontam para a importância do papel dos media no entendimento da imigração como uma preocupação pública crescente Um estudo de 2007 quis perceber se, tendo a questão da “imigração ilegal” mais impacto sobre quem vive na fronteira entre o México e os EUA do que sobre quem não vive em estados fronteiriços, têm os media capacidade de tornar uma questão mais local numa preocupação nacional? Analisando a cobertura

Fonte: Notícias ao Minuto (2021)
Fonte: WHYY org

jornalística sobre imigração e dados de estudos de opinião sobre o que a população entendia como a sua maior preocupação, a conclusão veio confirmar a hipótese do agenda-setting, isto é, a ideia de que as notícias dos media podem condicionar o que o público considera importante ao dar mais destaque a certas questões e menos a outras

Em 1922, já Walter Lippmann, com a sua obra Opinião Pública, tinha sugerido que os media noticiosos são a principal fonte das imagens que ficam guardadas nas nossas mentes As representações do mundo que não estão ao nosso alcance imediato chegam-nos pelos media Por isso, o impacto dos media na opinião pública é enorme e essencial Num artigo de 2016, Joana Kosho corrobora a ideia de que a cobertura mediática de muitas questões da vida quotidiana torna-as nas principais preocupações das pessoas Além da perceção da opinião pública, a investigadora acredita que a cobertura dos media sobre imigração tem influenciado o discurso político, conduzindo, nomeadamente, à formulação de políticas, ancoradas numa sensação de crise, desvinculada da realidade Os media podem aproveitar-se da incerteza e desconforto existentes em torno das políticas migratórias para criar uma mentalidade de crise na qual esses grupos são retratados como “inimigos que tentam invadir as nações ocidentais” Esses retratos alarmistas são utilizados pelos media para captar público, concluem investigadores de psicologia

A representação negativa das pessoas migrantes nos media está vastamente documentada Analisando a cobertura de jornais italianos, alemães e britânicos, a jornalista Gabriela Jacomella encontrou “fortes mensagens negativas” na cobertura mediática das migrações, tendo os jornais associado o tema a “conceitos perturbadores, como emergência, segregação e diferenças culturais” A voz dos migrantes é altamente sub-representada, independentemente da orientação política dos jornais A jornalista conclui ainda que a linguagem usada nos media mainstream não só reflete a narrativa do migrante como “o outro”, como também a promove e molda

Esta atitude dos media tem consequências A cobertura noticiosa negativa de pessoas latinas e de outras com herança hispânica está correlacionada com sentimentos de ansiedade em relação às pessoas imigrantes Um estudo sobre a cobertura do New York Times e o USA Today sobre imigração, entre 2006 e 2010, mostrou como o discurso mediático acaba por perpetuar sistemas injustos de poder, mantendo o status social superior do grupo maioritário/dominante

JoãoPinhal&GuilhermePinto

Observou-se uma diminuição do foco numa visão positiva da imigração e um crescimento do discurso focado na “ineficácia” das políticas migratórias, a par de um reforço de narrativas sobre segurança nacional onde os imigrantes são retratados como uma ameaça à soberania dos EUA Os quadros jornalísticos evoluíram, pois, em apenas 4 anos, para uma abordagem mais crítica e alarmista, oferecendo uma plataforma poderosa para a narrativa anti-imigração

As investigadoras não têm dúvidas de que a atenção mediática às questões migratórias, muito mais do que refletir, ajudou a moldar os sentimentos públicos sobre imigração Em 2012, um outro artigo veio mostrar como tanto os telespectadores conservadores como os liberais da FOX News ficaram com opiniões mais

À medida que aumenta a atenção dos media à imigração, aumenta a probabilidade de os indivíduos identificarem a imigração como um dos problemas mais importantes do país, concluiu o estudo de 2007, com que iniciámos esta abordagem ao papel dos media Embora a imigração seja inerentemente uma questão local, afetando mais os estados fronteiriços, a maneira como os media dedicam uma atenção tão considerável a esta questão colocou-a na vanguarda da agenda política nacional Para contrariar a necessidade de responsabilização dos media pela preocupação pública com a imigração, poderiam argumentar que os aumentos na cobertura mediática ou níveis de ameaça percebida decorrem de um aumento nas atividades ilegais provocadas por um fluxo de imigrantes ilegais As mesmas académicas responsáveis pelo estudo anterior testaram essa hipótese, compilando estatísticas criminais do Departamento de Justiça, e não encontraram nenhuma relação entre essas três variáveis, caindo por terra a ideia de que só há mais notícias porque há mais crimes - não é verdade

O mesmo artigo aponta ainda para mais três resultados interessantes A probabilidade de identificar a imigração como o problema mais importante é 169% mais alta para os conservadores e 55% mais alta para os moderados, quando comparado com os liberais À medida que a idade dos entrevistados aumenta, aumenta também a probabilidade de identificar a imigração como um dos problemas mais importantes que a nação enfrenta Além disso, indivíduos mais instruídos são menos propensos a identificar a imigração como uma preocupação

A influência nos próprios resultados eleitorais já foi sugerida por um estudo sobre a cobertura da imigração nos Países Baixos: quanto mais os jornais fazem cobertura da imigração, maior é a probabilidade de os eleitores expressarem apoio a partidos anti-imigração, mesmo estando os desenvolvimentos do mundo real controlados Os investigadores creem que isto pode acontecer porque os eleitores veem o aumento da cobertura da imigração como uma evidência de uma suposta ameaça cultural por parte dos imigrantes

A campanha das presidenciais norteamericanas de 2016 foi também muito marcada pela imigração, desde logo pela célebre proposta de Trump de construir um muro entre os EUA e o México 2 anos depois, um estudo sobre a cobertura jornalística da questão migratória durante essa campanha eleitoral concluiu que os media falharam no seu papel de fornecer a informação necessária para o exercício esclarecido da liberdade de voto Em vez de contextualizar as posições dos candidatos sobre imigração, a maioria da cobertura jornalística focou-se na corrida eleitoral e ficou marcada pela predominância de notícias superficiais “Ao optar por destacar a retórica inflamatória de Donald Trump sobre a questão da imigração e dos refugiados, os jornalistas durante a eleição presidencial dos EUA ajudaram a perpetuar uma compreensão dos imigrantes como pessoas a serem temidas e como ameaças à América”, sublinha a investigação Cada escolha editorial tem consequências e o jornalismo não pode colocar a cabeça na areia fazendo de conta que não tem um impacto muito relevante no rumo que uma comunidade toma

Eleições Legislativas emFrança: Escolhase

Consequências

Os resultados colocaram Macron numa posição fragilizada Com 182 assentos conquistados pela esquerda, a coligação presidencial ficou reduzida a 168, enquanto o Rassemblement National (RN) de Marine Le Pen e Jordan Bardella não conseguiu mais do que 143 mandatos O parlamento francês saiu destas eleições fragmentado em três blocos: esquerda, liberais e extrema-direita Apesar disto, a vitória da esquerda pode ser entendida como uma rejeição clara do populismo xenófobo de Le Pen e Bardella e do centrismo neoliberal de Macron

O presidente francês viu-se confrontado com a realidade de negociar com uma coligação que sempre o combateu, fruto da sua decisão de antecipar o calendário eleitoral

A votação tática que ajudou a evitar uma vitória da extrema-direita, unindo parte dos liberais e a esquerda por meio de uma “Frente Republicana”, é uma prova do poder dos eleitores franceses Muitos viram estas eleições como um momento crítico para manter o partido de Le Pen fora do poder Embora Le Pen esperasse fazer história com a primeira maioria legislativa do seu partido, os eleitores uniram-se para bloquear a sua ascensão, mostrando ao mundo a importância da escolha coletiva, mesmo numa era de polarização

Perante um parlamento dividido em três blocos – a esquerda frentista, o centro macronista e a extrema-direita (à qual se uniram parte significativa dos conservadores), por número de mandatos –, Macron viu-se obrigado a convocar reuniões com as três partes, procurando uma nomeação adequada para liderar um novo governo A Nova Frente Popu-

As eleições legislativas de julho de 2024 em França foram um ponto de viragem inesperado, deixando o país num cenário político incerto Convocadas de forma precipitada pelo Presidente Emmanuel Macron, após a derrota do seu partido nas eleições europeias de junho, este ato eleitoral resultou num verdadeiro abalo do status quo Com uma participação notável de 63%, a mais alta desde 1981, os eleitores deram uma resposta clara ao escolherem a coligação de esquerda Nouveau Front Populaire (NFP) como a vencedora Inspirada na histórica Frente Popular de 1936, esta aliança de socialistas (PS), comunistas (PCF), ecologistas (EELV) e insoumis (LFI, o maior partido da coligação) apresentou um programa comum, procurando superar as suas diferenças ideológicas com vista a fazer face ao avanço da extremadireita e à degradação do Estado Social imposta pelo macronismo neoliberal

lar, coligação vencedora das eleições, sugeriu Lucie Castets para a posição de primeiraministra, uma economista e funcionária pública afeta ao PS e uma figura relativamente desconhecida na política francesa Esta escolha da NFP surge com o intuito persuadir o chefe de Estado a nomear alguém oriundo do campo político da esquerda que este não visse como “divisivo” ou “radical” Ainda assim, Macron rejeitou a sugestão da NFP, afirmando que um governo da coligação seria automaticamente chumbado, antevendo a posição dos restantes grupos parlamentares

Depois de 60 dias de negociações de bastidores, que o Presidente usou para pressionar o PS a abandonar a NFP (almejando que este formasse uma maioria ao centro, estratégia que soçobrou), Macron anuncia a sua escolha para liderar o novo governo francês –Michel Barnier, político conservador d’Os Republicanos, cultor da narrativa anti-imigração da extrema-direita europeia A escolha de uma figura do espaço político da direita conservadora surge com o objetivo de garantir uma maioria de apoio ao governo na Assembleia Nacional, sustentada pelos partidos macronistas e pela extrema-direita Com esta jogada, Macron trai qualquer réstia da “Frente Republicana”, formada na segunda volta das eleições, com vista a impedir a eleição de deputados do RN de Le Pen, ao optar firmar um acordo com a extrema-direita, rejeitando a coligação de esquerda

Fonte:RádioFrançaInternacional

No fundo, estas eleições refletem o poder e o perigo da escolha, espelhando um profundo cisma entre a vontade popular e o taticismo político de Macron Os eleitores franceses optaram por um desfecho complexo, que resiste a respostas fáceis e sublinha as profundas fissuras políticas do país

Fonte:FolhadeSãoPaulo

Ocaminho dizemo-lo

NÓS

As recentes semanas marcam o início de um novo ano lectivo em todos os graus de Ensino em Portuga propagandea

Eleições Leg passado, a enfrentados p prioridade de caminho que é, prova-o a caminho que que temos ho Neste texto que este Gov para a Educ Programa de fica bem claro referentes à Governo pod que é importa “O Program expressão “p Não refere escolar” no c diz respeita.”

Não aponta reivindicaçõe sistematicame aponta à gratuitidade, não há um objectivo re de aumentar as bolsas, não é objectiv contratar os psicólogos que façam cumprir rácio de 1 psicólogo para 500 estudantes (nes momento temos 1 para mais 3000), não h referências ao Programa Nacional para Alojamento no Ensino Superior (PNAES) nem a seu cumprimento e/ou alargamento, não h referências à refeição social e ao seu aumen sem travão

Pelo contrário, o caminho é outro, é o da lógica neoliberal O Estado tem que se tornar mais distante das IES, permitir-lhes a independência, fomentar a sua autonomia, financeira e decisória Ora, surge desde logo uma questão - como poderá ser possível às IES serem independentes financeiramente, servindo como espaço de formação integral do indíviduo, que todos possam frequentar, que permitam aos estudantes não só a aprendizagem e o acompanhamento na mesma, mas também a fruição cultural, o dieito à lazer e à recreação, o tempo para a prática desportiva? A questão é de fácil resposta - não é possível

A lógica do Governo é mais do que tornar o Ensino Superior inacessível a todos, e prova disso é a estatística recente que apenas 44% dos jovens carenciados prosseguem para o Ensino Superior É subordiná-lo á lógica do mercado é colocá lo sob uma lógica distante

“Essa intenção é uma subversão dos valores de Abril, um ataque aos direitos da Juventude e uma afronta à própria Constituição da República Portuguesa”

Em semanas que serão marcadas pelas discussões acessórias dos do costume em torno de elementos de relevância pouca ou inexistente, em que seremos inundados casas adentro com as tricae e tretas de um debate sobre o Orçamento do Estado longe do que dele é essencial, recentramos a discussão e apontamos o caminho - a gratuitidade, mais alojamento estudantil público, mais acção social escolar

Os estudantes demonstraram mais uma vez a sua força no passado dia 9 de Outubro, com uma grande mobilização, ainda mais se tivermos em conta a pouca antecedência com que foi anunciado Essa força continuará a ser exibida em muitas escolas e faculdades por esse país

Fonte:DiáriodeNotícias

EscolheuOutubro Gaza

NEANTRO

No passado dia 7 de Outubro, fez um ano que ocorreu a operação militar “tufão Al-Aqsa” Liderada pelas brigadas Al-Qassam e coordenada em conjunto com várias facções da resistência palestiniana, a operação, preparada meticulosamente, atingiu Israel sem precedentes Uma incursão, tanto militar como popular, derrubou os muros do “campo de concentração a céu aberto” e seguiu através dos campos e kibutz no cerco de Gaza Esquadras da polícia e postos de controlo das IDF foram invadidos e controlados, colonatos pilhados pela população que acompanhou a investida; centenas de membros do aparato policial e militar israelitas abatidos e capturados, assim como cerca de 255 civis levados como reféns para dentro da Faixa de Gaza À semelhança de outras rebeliões anticoloniais, a alvorada do dia 7 de outubro foi marcada por uma forte insurgência popular A operação militar “abriu os portões” para o que Fanon caracteriza como a incontrolável espontaneidade dos despossessados Os gritos de um militante que participou na operação representam bem o espírito das massas de Gaza que, pela primeira vez nas suas vidas, pisaram fora do cerco colonial:

“Estou a passear pela terra, irmãos! Estas são as nossas terras! Estou a passear por elas! O que se segue é a libertação da Palestina!”

Apanhado de surpresa pela revolta de Gazaque julgava como uma zona “contida” pelo bloqueio, cerco e uma estratégia de bombardeamentos e invasões periódicas - o aparato político e militar sionista reagiu implementando a diretiva Hannibal Esta consiste no abate indiscriminado, tanto de militantes da resistência palestiniana como de civis israelitas, de forma a que não sejam feitos reféns mais tarde, utilizados em trocas de civis israelitas, de forma a que não sejam feitos reféns mais tarde, utilizados em trocas de prisioneiros ou negociações diplomáticas Esta primeira reação pode ser vista como o prelúdio para a intensificação do genocídio do povo palestiniano que atravessa a Cisjordânia, que oblitera praticamente toda a possibilidade de vida em Gaza e que hoje se expande para o Líbano

Sabemos que estes eventos têm um contexto e uma história Para Israel, a racionalidade por detrás do massacre deste último ano é a tenta-

tiva de ultrapassar o impasse fundacional do projeto sionista: a existência e resistência dos povos nativos da Palestina E qual a racionalidade e motivações das ações da resistência? Podemos tentar iluminá-la a partir de um conjunto de episódios

Em 2007, com a vitória do Hamas nas eleições palestinianas do ano anterior, Israel reforça o bloqueio na Faixa de Gaza Passa então a controlar e restringir, em conjunto com o Egito, as entradas e saídas, o movimento de bens e pessoas Isto significou uma dependência praticamente total de bens de consumo e mercadorias israelitas Significou também uma estratégia de engenharia ativa de condições de fome, sede, epidemia e deterioramento de infraestrutura

Em 2012, a ONU previu que, a continuar assim, em 2020 Gaza não seria um sítio habitável Foi isto que se realizou Mesmo antes do 7 de Outubro, 90% da água em Gaza não era potável devido à poluição de esgoto e nível de salinidade elevado Em 2021, segundo a ONU, mais de metade da população vivia abaixo da linha de pobreza e o desemprego atingia metade da população A ocupação colonial foi gerida em Gaza nos anos que se antecederam através do engendramento da morte de uma população excedente aos seus olhos Já na Cisjordânia, 2023 (apenas até Setembro) marcou o ano mais mortífero para a população Palestiniana, sendo a chacina acompanhada do avanço dos colonatos Entre 2018 e 2019, protestos contra o bloqueio e afirmando o direito ao retorno dos refugiados mobilizaram-se em direção às vedações do gueto de Gaza - no que ficou conhecida com o a Grande Marcha de Retorno Esta forma de resistência pacífica foi recebida pelo exército sionista com tiroteios letais indiscriminados que provocaram 326 mortos e milhares de feridos A comunidade internacional assistiu em silêncio Gaza estava abandonada à sua morte

Fonte:FrentePopularparaaLibertaçãodaPalestina

motivação dos militantes que, saídos dos seus túneis, desferem golpes na invasão terrestre de Gaza Num contexto de normalização e parceria dos Estados de Israel com os Estados Árabes da região e suportada pelo bloco imperial do Ocidente, a escolha de resistência era entre morrer lentamente ou defender a sua existência; ser esquecida e sucumbir ou afirmar o projeto de libertação nacional da Palestina Com isto, colocou em cima da mesa a luta universal contra o colonialismo e o imperialismo Resta-nos ser inspirados e deixarmo-nos transformar por esta

1-ComomobilizadoporAdiCallaiem"TheGazaGhetto Uprising",brooklynrailorg;2-ReportadoporElectronicIntifada assimcomofontesisraelitascomoHaaretz;3-NasserAbourahme, 'Intunewiththeirtime',RadicalPhilosophy216,Summer2024, pp13–20;4-Paramaisdadoseinformaçõessobreoimpacto humanitáriodobloqueio,veroxfamorg;5-Comoreportadopor HaaretzeONU;6-Paraumadescriçãomaisdetalhadasobreo bloqueio,acatástrofehumanitáriaemGazaeaGrandeMarcha deRetorno,verStephenMcCloskeyemopendemocracynet

No dia 8 de Outubro, o poeta e escritor palestiniano, Refaat Alareer expressou como a resistência é a escolha existencial de Gaza:

“Israel is going to kill us anyway. Israel wants us kneeling. [...] So why not fight back and die in dignity? This is the lesson that Israel and the West have to understand That you can't oppress occupied people for about a 100 years, and not expect people to react, to defend their very existence”

No dia 8 de Outubro, o poeta e escritor palestiniano, Refaat Alareer expressou como a resistência é a escolha existencial de Gaza: Poucas semanas depois, tornou-se um mártir, tendo sido assassinado em Gaza, por um míssil deliberadamente enviado para a sua casa, martirizando também a sua família Mais do que um sentimento, foi esta a racionalidade política e estratégica por detrás do 7 de Outubro; é esta a

Extermínio

É 7 de outubro de 2024 A ocupação sionista, que já durava 75 anos e está construída sobre a limpeza étnica do povo palestiniano, entrou há 1 ano numa etapa de extermínio genocida em Gaza Os números oficiais apontam para mais de 42 000 pessoas assassinadas diretamente pelas forças militares israelitas, pelo menos 10 000 debaixo dos escombros 65% de todos os prédios em Gaza foram destruídos - incluindo escolas, universidades e hospitais - e perto de 2 milhões de pessoas, quase a população total de Gaza, tiveram de sair das suas casas Sabemos

que já caíram mais bombas sobre Gaza do que sobre Dresden, Hamburgo e Londres em conjunto na Segunda Guerra Mundial

No entanto, israel não mata só com bombas e utiliza também a fome como arma Em Gaza, morre-se sem se ter de disparar um único tiro Uma carta recente de trabalhadores de saúde estadunidenses aponta, numa estimativa conservadora, para 61 000 mortes resultantes de fome neste período Uma carta ao jornal Lancet em julho, comparando com outras zonas de guerra, estima que haja cerca de 186 000 pessoas mortas, contabilizando com as mortes indiretas A ocupação estrutura todos os níveis da vida dos palestinianos e tenta fazer deles meros números em contagens de óbitos, um passado sem presente nem futuro

A escala é inimaginável, mas não é algo distante de nós O ocidente dá a israel com uma mão (bombas, financiamento e cobertura diplomática) e tira aos palestinianos com a outra, tendo participado no desfinanciamento da UNRWA quando a situação em Gaza já era catastrófica O governo português não só não reconhece o Estado da Palestina, como mantém relações económicas e diplomáticas com o Estado de israel e tenta até vender-lhe bombas

As instituições da sociedade civil, como as universidades - a nossa inclusive, seguem o exemplo do seu governo Sem a cumplicidade da larga maioria das instituições e governos ocidentais, sem a UE e os EUA, este genocídio não seria concebível Vivemos o nosso quotidiano banhados de sangue israel é, neste momento, um cão sem trela, numa guerra genocida com várias frentes, Gaza Cisjordânia Líbano Iémen Síria Irão, justificando cada novo bombardeamento de um bairro residencial como uma campanha anti-terrorista "Terrorista" é simplesmente o que todos os imperialistas chamam aos que se recusam a morrer sem resistir Gaza é hoje sacrificada por ser o berço das Intifadas, a geografia de maior resistência anti-colonial dentro da Palestina histórica, casa de mais de 1 milhão de refugiados condenados há 17 anos a viver sob um cerco e bloqueio assassino

Esse bloqueio, assente na ideia de deixar os palestinianos no limiar da sobrevivência, estava a chegar a um ponto de lenta catástrofe A resistência anti-colonial parecia pacificada, israel seguia com os Acordos de Abraão, de normalização com os países árabes, e a anexação da Cisjordânia estava já no horizonte Toda esta realidade nacional e regional foi reconfigurada quando, no dia 7 de outubro, as várias fações palestinianas lideradas pelas Brigadas Al-Qassam rebentaram os muros desta prisão a céu aberto, derrotaram a infame Divisão de Gaza das IDF, ca-

pturaram centenas de soldados e destruíram o mito de invencibilidade israelita Em suma, o presente genocídio começou em resposta a uma vitória anti-colonial no campo de batalha israel consegue massacrar, mas não vencer Desde então temos visto diariamente estes infernos nos nossos ecrãs Quando israel começou a bombardear Beirute há duas semanas, já não inundámos as ruas, só assistimos tudo pelas televisões Tornámo-nos insensíveis, como se nos tivéssemos esquecido daquilo que temos nas mãos O Líbano é bombardeado porque o Hezbollah começou uma guerra de atrito em solidariedade com Gaza O Iémen é bombardeado (por israel e pelos EUA e o Reino Unido) porque bloqueou o Mar Vermelho em solidariedade com Gaza

São as pessoas comuns que fazem a histórianão os grandes impérios, com os seus aviões hipersónicos e as suas bombas de não-seiquantas-toneladas Esta semana, não nos limitamos a assinalar o aniversário de genocídio Também celebramos a resistência anti-colonial Em Portugal também pode florescer outra frente contra o imperialismo, depende de nós

Aescolhade nãoagir

Em outubro, fez 26 anos do primeiro Nobel de Literatura de Língua Portuguesa, provavelmente um dos momentos mais certeiros de que a comunidade cultural internacional decidiu abrir os seus olhos e validar as capacidades intelectuais lusófonas representadas num prémio Todavia, na mesma semana, fez um ano que a comunidade política internacional fechou os seus olhos e decidiu entrar numa omissão de consentimento com o status-quo sem deliberação ou, quem dirá, atuação

Faz um ano que o Ocidente toma pequenoalmoço a assistir à morte de inocentes Há um ano que a perspetiva dos palestinos foi assumidamente cortada, a Terra virou plana e resume-se a uma faixa De depois em depois foi-se adiando o agora; temos quase 17 mil crianças mortas, 1,8 milhões de pessoas sem casa A Palestina chegou até a ser suprimida do Google Maps, da mesma forma que não tem cadeira garantida na comunidade internacional ou como é ignorada da ordem do dia Apesar disso, cada uma dessas palavras poderia significar uma mudança de cenário, mas, a cada

dia, as potências internacionais e instituições globais demonstram uma escolha consciente, que perpetua o sofrimento do povo palestino e a instabilidade na região Eles preferem abrandar os gritos das manifestações generalizadas do que acordar um cessar-fogo e o reconhecimento de um Estado existente e de um povo que deve ter a sua existência validada, por instituições que visam a sua proteção

Creio que outubro de 2023 não marca um início, mas a continuação do projeto de décadas anteriores, a escolha de uma violação deliberada dos Direitos Humanos, das Convenções de Genebra e da Teoria da Guerra Justa Desde a data, assistimos a uma falta de progresso nas negociações de paz, de certa forma, revisitando dos escombros o facto: órgãos que na teoria deveriam proteger civis, encontram-se a serviço de interesses geopolíticos e alianças que visam a exploração, ao invés de uma resolução do conflito

A inação destes agentes mina a sua legitimidade, inclusive da própria a causa palestina, não pela sua incapacidade de agir, mas pelos seus meios estarem assumidamente a serviço de interesses que beneficiam com o prolongamento do conflito e contradizem as suas pautas

Noto que agir não significa ocupar os gabinetes de Bruxelas, invadir o Tribunal Penal Internacional ou substituir a bandeira de Israel pela da Palestina nas sedes da ONU, até porque a segurança destes órgãos são capacitadas para reprimir tais atos Contudo, após um ano, penso que a única forma de nós, enquanto indivíduos, agirmos seria corroendo a estrutura que sustenta este massacre por dentro

O primeiro passo para deixarmos de ser meros espectadores passivos e alcançar um cessar-fogo e cessar a dor palestina seria driblar o algoritmo das redes sociais, pesquisas sobre o que está a ocorrer, dar luz a canais de comunicação que realmente comprometem-se com a cobertura dos acontecimentos, sobretudo os da linha de frente no Oriente Médio, boicotar aqueles que usam o seu silêncio para consentir o genocídio, protestar e, sobretudo, não relativizar Permanecendo, assim, “firme na terra” e aos seus ideais ou, como diz a cultura palestina, sumud

Por vezes, agir significa simplesmente ficar um minuto num vídeo de uma mãe palestina de modo que a sua visibilidade seja traduzida em monetização para trazer leite e pão para os seus filhos naquele dia

Faz um ano que conheço quase a cada dia uma nova história palestina, desde a rapariga falecida que tinha o sonho de ir para a faculdade até o pai que saiu para registar os seus filhos e, no regresso, quer eles, quer a mulher, estavam mortos, restando apenas as certidões Ficar a conhecer isso e não agir é assumir que a Humanidade perdeu a sua principal característica, no meio dos corpos, ser humana

EquandoDeuscriou omundo,deuà Albânia

Oanúnciodoprimeiro-ministroalbanêsEdiRama,feitonopassadodia21de setembro,surpreendeuomundo:acriaçãodeumnovoEstadonaEuropa,dentro deTirana,aadministrarpelaOrdemBektashi,umaordemislâmicamísticae moderada

A surpresa veio mostrar, para além da possibilidade de criação de um Estado com o objetivo de promover uma visão moderada do Islão, que há alguma maleabilidade na questão da criação e dissolução de Estados

O que está aqui em causa é o facto de vermos um Estado, de livre e espontânea vontade, ceder parte do seu território para a formação de outro Estado Isto demonstra não só aquele meme conhecido que diz que, quando Deus criou o mundo, deu à Albânia, mas que esta, por ser tão generosa, cedeu o mundo a outros países; o que demonstra a maleabilidade do princípio da criação dos Estados

No caso da criação do Estado Soberano da Ordem Bektashi, não há nenhuma dificuldade do ponto de vista do Direito Internacional, pois é o próprio país que irá perder território que o propôs, de livre e espontânea vontade

Por outro lado, vemos, um pouco por todo o mundo, que o princípio da autodeterminação dos povos continua a ser preterido pelo princípio da inviolabilidade territorial dos Estados Este último não é mau per se O problema é vermos a instrumentalização destes dois princípios pelas grandes potências mundiais, como forma de servir os seus propósitos geopolíticos e geoestratégicos, assim como manter alianças com outros Estados

Tomemos como exemplo o caso da Palestina, que tem estado na ordem do dia O facto de este Estado não ser reconhecido por todos, com destaque para os Estados Unidos (apesar dos esforços feitos nos anos 90), faz com que a sua população não seja devidamente salvaguardada com os direitos mais básicos, ficando deixada à sua sorte É verdade que existe o Direito Internacional, mas também é verdade que o facto de Israel ser um dos principais aliados dos Estados Unidos, e de estar a invadir território palestiniano desde outubro de 2023, faz com que um povo que luta pela

sua autodeterminação há várias décadas não seja ouvido, pois algumas potências, designadamente os EUA, se recusam a reconhecer a Palestina como um Estado, o que, neste caso, facilitaria o estabelecimento de uma paz mais eficaz naquela região do globo

O exemplo da Palestina é um em muitos num histórico de delineação do mapa dos Estados por parte das grandes potências, em cada época histórica Basta recuarmos até ao século XIX para vermos as principais potências europeias a ser responsáveis pelo desenho de mapas e criação países de forma artificial, que ainda hoje impactam negativamente as populações de regiões do globo como África Nessa região, o desenho das fronteiras das então colónias “a regra e esquadro” faz com que, ainda hoje, vejamos várias notícias de guerras civis, ou de guerras étnicas, pois os mapas foram desenhados, não com base na unidade cultural, mas com base na ganância das potências europeias

Mas há mais exemplos, como o da retirada do reconhecimento de Taiwan com a reversão do reconhecimento da República da China (Taiwan), por vários países, a favor da China, que incluiu a saída do Taiwan das Nações Unidas, em 1971; ou a invasão da Ucrânia, em que vemos a Rússia a “delegar” para si própria “competências” em matéria de reconhecimento de territórios como russos ou não-russos, indo ao ponto de anular a existência da Ucrânia, não só como Estado, mas como nação, como história, como povo

Em suma, o reconhecimento de Estados no sistema internacional pressupõe, mais do que o cumprimento de certos critérios delineados pelo Direito Internacional, a predisposição dos Estados em aceitar o seu reconhecimento, seja devido a interesses das grandes potências, seja por outras razões O caso da criação do Estado Soberano da Ordem Bektashi demonstra o qual maleável é este princípio

No passado mês de julho, cinco ativistas climáticos do Reino Unido, com idades entre os 22 e os 58 anos, envolvidos no movimento Just Stop Oil, receberam uma das maiores sentenças atribuídas a um protesto não violento por “conspiração para causar incómodo público pela coordenação de protestos de ação direta na M25 durante quatro dias, em novembro de 2022” reportou o The Guardian Os ativistas reuniram-se numa plataforma online, onde estavam a planear a ação em causa e a recrutar pessoas para a mesma, quando um jornalista se juntou à chamada e enviou as gravações para a polícia

O facto de a justiça não estar do lado de quem mais precisa dela não é novidade, mas ser um jornalista (e tudo o que ele representa) a contribuir para o contínuo detrimento e desacreditação do sistema, é uma triste notícia para a, já difícil, crença na mudança Agora, questionemo-nos: contra quem é que estaremos realmen-

“Estamosperanteadicotomiaentredoismundos,ondenumum estudantede22anostomaumajolanoPatoReale,nooutro,umajovem damesmaidadeécondenadaa4anosdeprisãoporlutarporumfuturo quenospertenceatodos”

te a lutar? Porque é que o instinto é criticar a ação e individualizar a luta, sem perceber o que levou a recorrer a ações diretas disruptivas? Perceber o contexto da luta é tão, senão mais, importante quanto perceber a ação em si.

Estamos perante a dicotomia entre dois mundos, onde num um estudante de 22 anos toma uma jola no Pato Real e, no outro, uma jovem da mesma idade é condenada a 4 anos de prisão por lutar por um futuro que nos pertence a todos Porque é que um sente que tem mais responsabilidade do que o outro perante a luta por justiça climática? Se todas e todos partilham o “copo da responsabilidade” nesta luta, porque é que o copo só tem caído para uns e é deitado ao lixo (sem fazer a reciclagem) por outros? A questão não se prende

com o facto de ser ético ou não beber uma jola enquanto outros estão a ser detidos, mas sim no porquê de uns sentirem o peso da responsabilidade e, efetivamente, o personificarem na luta, e outros no “ativismo de café” Mas, de facto, é sempre mais cómodo atirar o “copo da responsabilidade” para o chão e dizer que X não é ativismo e, assim, excluírem-se da luta sem ter o peso na consciência, do que sair do café e ir para a rua gritar. A normalização de grandes sentenças a estudantes e jovens ativistas por protestos não violentos é uma ameaça perigosa à democracia, e sectorizar lutas torna ainda mais difícil impedir que isto aconteça “O pessoal é político” dentro e fora do café, por isso peguem na cerveja e venham para a rua

Protestos Just Stop Oil, M25; Fonte: BBC News

OLivre-Arbítrio eaMoralidade emÉricRhomer:

EntreoExistencialismo eoKantianismo

Todas as ações humanas envolvem escolhas, e até a inação surge da decisão consciente de não agir Por ser algo tão natural no quotidiano do ser humano, a questão do livre-arbítrio tem merecido palco em inúmeras discussões filosóficas e representações artísticas, ao longo da história

Num contexto pós 2ª Guerra Mundial, o existencialismo ganhou destaque como uma nova forma de entender a liberdade individual num mundo devastado pelo totalitarismo e guerra Em França, Sartre, Simone de Beauvoir e Camus foram vozes defensoras de que os indivíduos enfrentam um mundo sem sentido, onde as escolhas humanas determinam o significado das suas vidas

O existencialismo baseava-se na ideia de que não havia uma verdade moral objetiva que pudesse guiar as decisões humanas, estando cada indivíduo responsável por encontrar o seu próprio caminho e carregar o peso da angústia, proveniente dessa liberdade sem limites O Estrangeiro de Camus encarna esse absurdo existencial, onde a personagem principal é incapaz de sentir algum remorso após o assassinato de um homem ou então expressar qualquer reação aquando da morte da sua mãe, refletindo essa rejeição de uma moralidade objetiva

Contudo, a visão existencialista encontrou resistências dentro da intelectualidade francesa Éric Rohmer é um exemplo claro disso

Embora inicialmente influenciado pelo existencialismo, percetível na sua primeira longametragem O Signo do Leão (1959), Rohmer transitou rapidamente para uma visão kantiana, característica presente na sua série de filmes Os 6 contos morais (1963-1972)

Em O Signo do Leão, Rohmer realiza a história de Pierre, homem confiante que espera herdar uma fortuna, mas que devido a um infortúnio, acaba sem nada, enfrentando a miséria nas ruas de Paris Deste modo, Pierre diante de uma liberdade absoluta é obrigado a lidar com a responsabilidade da sua própria sobrevivência e consequência das suas ações, retrato típico existencialista

Já em Os 6 contos morais, o cineasta francês explora como o ser humano se encontra dividido entre ceder à tentação do desejo e o de permanecer fiel aos seus princípios morais, recorrendo assim ao princípio da moralidade kantiana De facto, para Kant o livre-arbítrio não está simplesmente em fazer uma escolha, mas em agir de acordo com um princípio moral que pode ser universalizado e aplicado a todos os seres racionais Por outras palavras, a verdadeira liberdade vem de agir moralmente, seguindo a razão, e não simplesmente os desejos e impulsos imediatos

Por exemplo, em A Minha Noite com Maud (1969), Jean-Louis, um católico devoto, enfrenta a tentação de passar a noite com Maud, uma mulher atraente, embora esteja comprometido espiritualmente com outra Efetivamente, através deste cenário entendemos que a sua decisão de resistir à tentação é guiada por um código moral pessoal à luz da filosofia kantiana

Desta forma, enquanto o existencialismo ofereceu uma visão libertadora da condição humana no pós-guerra, Éric Rohmer encontrou na filosofia de Kant uma visão consistente e clássica da arte num contexto de mudanças intelectuais da época, permitindo-o tornar-se numa das mais influentes figuras da cultura francesa do século XX

Estudar: Escolhaou direito?

A entrada na universidade abre um novo mundo a milhares de jovens todos os anos Esse mundo pode ser sinónimo de diversão, novas amizades e novas memórias, mas muitos também o veem com apreensão e com medo do desconhecido Para outros, a colocação no ensino superior não chega a significar algo, dado que não conseguem suportar os custos que a entrada na faculdade acarreta

Entre as várias escolhas que um estudante universitário tem de fazer, a primeira, antes de todas as outras, é, irremediavelmente, a da faculdade e do curso a que se vai candidatar Esta escolha é constrangida pela média do aluno, as suas áreas de interesse e a sua área de residência (um aluno que seguiu humanidades no secundário não vai, em princípio, candidatar-se a um curso de engenharia, e um aluno do interior do país pode aproveitar esta nova fase da sua vida para sair da aldeia que o viu crescer) Caso não tenha média para entrar no curso que ambiciona mas tenha dinheiro, pode optar por uma universidade privada; caso não tenha sequer na sua zona de residência o curso que deseja seguir, vê-se obrigado a ir de malas e bagagens para uma cidade desconhecida

Mas as escolhas não ficam por aqui Nestes casos, em que o aluno é deslocado, acrescentase a preocupação com a sua morada para os próximos três anos, e aqui dá-se outra escolha: ou mora no centro da cidade, a pagar uma renda exorbitante por um quarto minúsculo, ou mora na periferia, e perde horas e horas nos transportes públicos Para pagar ao senhorio, já se vai grande parte do dinheiro que um universitário pode ter, mas a isto se acresce o valor da propina, as taxas e emolumentos a pagar aos serviços administrativos da faculdade, os custos com a alimentação e os gastos extras, quer sejam destinados a materiais para as aulas, quer sejam para ter o mínimo de conforto em casa e no seu quotidiano

Estes custos pesam a todos os estudantes, sobretudo aos deslocados, que se veem obrigados a escolher entre comer uma refeição boa e pagar a renda, entre ir visitar a família à terrinha aos fins de semana e pagar a propina Contudo, também os nascidos na Área Metropolitana de Lisboa sofrem na FCSH: devem pagar três euros pela refeição social na cantina da faculdade todos os dias ou andar com uma marmita o dia todo?

Éric Rohmer, fotografia de Tyrone Dukes, New York Times
MiguelPereira
AliceCouto

E nas várias horas semanais que passam enfiados em transportes públicos, devem aproveitar para tentar estudar ou para tentar relaxar minimamente?

Todos os dias fazemos escolhas, que, por mais pequenas e insignificantes que nos pareçam, podem trazer as mais variadas consequências e que muitas vezes não temos em conta Entretanto, as universidades vão ficando cada vez mais elitizadas, com os alunos de classes mais altas a entrar nos cursos com médias mais elevadas e os alunos de classes inferiores a sofrer com a falta de apoios do Estado para prosseguirem os seus estudos (pelo contrário, recebem ameaças relativas ao descongelamento da propina)

É preciso democratizar o ensino superior e cumprir com o artigo nº74 da Constituição da República Portuguesa, que tem por objetivo o igual acesso à educação e a gratuitidade do ensino superior Muitas destas escolhas feitas pelos estudantes não partem deles, mas antes de um sistema que os obriga a optar por um direito básico em detrimento de outro A alguns, estas questões nem se colocam, mas a muitos, os seus resultados pesam demasiado

O que eu gostava que não me tivessem dito antes de ir para a universidade
ManuelGorjão

Que é uma nova etapa na minha vida Que vou aprender muito Que não vou aprender nada Que vou criar memórias que nunca mais irei esquecer Que é uma oportunidade única Que não estou sozinho Que se vai iniciar um novo período da minha vida académica Que é um espaço para poder errar Que não é a continuação do ensino secundário Que é a continuação do ensino secundário Que pode ser difícil nos primeiros tempos Que vão ser os melhores anos da minha vida Que vou ter dúvidas em relação às minhas decisões Que a universidade não é um bicho-de-sete-cabeças Que vou ganhar liberdade Que vou ganhar autonomia Que vou ganhar independência e responsabilidade Que devo fazer exercício físico e ter uma alimentação saudável Que há uma comida de estudante à base de atum e massas Que não devo faltar às aulas Que devo faltar a algumas aulas Que devo faltar a todas as aulas Que tenho de tirar apontamentos Que não é preciso tirar apontamentos Que vou perceber que não tenho de ser o melhor. Que não sei tudo. Que não sei nada. Que os anos vão passar a correr. Que o tempo vai passar por mim. Que tenho de me desafiar. Que as pessoas vêm da “terrinha”. Que a adaptação à cidade pode ser difícil. Que na terrinha se ouviam os pássaros e aqui não. Que a faculdade é o tempo de crescer. Que posso escolher ir ou não à praxe Que devo ter actividades extracurriculares Que tenho de fazer amigos Que vou levar amigos para a vida Que encontrar quarto é uma tarefa difícil Que devo pedir apontamentos a estudantes mais velhos Que posso mudar de curso se não gostar do meu Que o curso não me define Que devo aproveitar cada momento Que devo tentar morar perto da faculdade Que devo fazer as perguntas que tenho a fazer Que posso desistir do curso Que uma nota não me define Que tenha cuidado com a minha saúde mental Que não devo beber demais Que não devo ter expectativas muito altas Que não devo ter expectativas muito baixas Que devo descansar Que os professores não são acessíveis Que o meu curso não vai ter saída profissional Que se ganha bem com o meu curso Que se ganha mal com o meu curso Que se ganha bem é no curso do outro Que tenho de ir a casa no fim-de-semana Que o curso se faz no recurso Que tudo vai correr bem Que vou saber o que a vida custa Que vou para lá, gosto e nunca mais volto Que tenho de ter cuidado com onde deixo as coisas Que vou dormir pouco por causa do estudo Que vou dormir pouco por causa das saídas à noite Que tenho de ser proativo e ir atrás das oportunidades Que a vida não tem de ser linear Que posso dizer "não" Que tenho de dizer que sim a tudo, pelo menos no início Que a faculdade não me prepara para o mundo do trabalho Que a faculdade não me prepara para a vida Que posso procurar apoio quando precisar Que vou aprender a gerir o meu dinheiro Que vou abrir a mentalidade a outras coisas Que vou contactar com pessoas diferentes Que vou que vou

Xeque-Mate

TiagoFreitas

O tabuleiro de xadrez era uma extensão da alma A voz não jogava contra um adversário visível, mas contra o próprio tempo, contra as escolhas que efervesciam e ecoavam pelo silêncio sufocante da sala As peças, imóveis, suspensas, esperavam como soldados à beira do abismo, prontas para saltar e eclodir no caos de cada decisão Cada uma delas era um reflexo de uma possibilidade, uma vida, mil trajetos, um destino

Ela tocou o peão Tão insignificante, tão pequeno, tão inocente, e ainda assim, era sempre ele quem iniciava a guerra. Como uma palavra simples que destrói um mundo Ela o empurrou para frente, e com isso, a batalha começou Não era um jogo de lógica não, esqueçam isso Era um duelo entre o que ela poderia ter sido e o que ela era agora, entre os caminhos que deixou para trás e os abismos que navegou

As peças moviam-se sozinhas O tabuleiro pulsava, tremia, fervilhava, com uma vida própria, como se estivesse faminto pelas próximas escolhas. A cada movimento, ela sentia uma vertigem intensa, como se cada passo rasgasse uma parte do universo e trouxesse à tona outro Os cavalos saltavam como sonhos esquecidos, as torres ruíam como memórias irremediavelmente perdidas, e a rainha avançava como um desejo feroz, indomável, que queimava tudo no seu caminho

Mas o rei o rei era a própria essência da fragilidade Ele moviase devagar, como uma lembrança dolorosa, sempre na defensiva, sempre à beira da derrota, do fim.

Xeque.

O destino moveu a sua peça invisível. De repente, ela sentiu o impacto como um golpe direto no peito

Não era apenas um jogo Nunca fora Era um ciclo interminável de escolhas e consequências, onde cada passo significava abandonar outro O tempo ria exasperadamente no fundo da sala, a sua risada silenciosa respingava nas ondas do tabuleiro

Mas ela não recuaria Nunca Com dedos trémulos, moveu a rainha a última esperança, a peça mais poderosa que ela tinha Ela era o grito da liberdade, o ato final de quem não teme mais perder A rainha voou pelo tabuleiro, cortando e engolindo as diagonais como se rasgasse o próprio tecido da realidade Era tudo ou nada Ou vitória absoluta, ou um sacrifício cego Mas naquele movimento, ela não via derrota, apenas um salto no desconhecido, uma dança com o destino, onde o controlo era uma mera ilusão, e o caos, a única verdade

Xeque-mate?

O destino parou A sala encheu-se de um silêncio ainda mais profundo, e por um momento, o tabuleiro pareceu desvanecer, as peças dissolvendo-se no ar, como se nunca tivessem existido Ela sorriu, um sorriso de quem compreendeu a essência, a verdadeira mecânica do jogo Não havia vitória, nem derrota Só havia o movimento o ato de jogar A escolha constante, a coragem de avançar mesmo quando tudo ao redor gritava para parar O rei tombou, mas ela não sentiu perda, porque naquele instante, percebeu que o verdadeiro xeque-mate nunca foi sobre o fim, mas sobre o modo como jogou

Ela levantou-se O tabuleiro evaporou-se E no vazio que restou, finalmente entendeu: as escolhas não eram jaulas Eram asas

Xeque-mate!

Os dias reduzem-se a pó

E descalça sinto o metal

Da que liga as margens

Do rio gelado sem dó

Teço um teorema

Que me dispa a incerteza

Do não saber o tema

Da minha tese (de) salvação

Dor por deixar o teu sorriso

De verão cinzento

Afogar no esquecimento

Como castigo soberano

Os astros alinharam

No dia do juízo final Espero de novo encontrar teus olhos

Na idílica fácies marginal

Lisboameninae moçamiserável

Mia (Submissão Externa)

Vejo a miséria se alastrando como um cancro por toda a Lisboa, rápida e ignorantemente aos olhos daqueles que passam.

Em cada canto um pedido de ajuda, algo sem olho, um sem uma mão, outro a precisar de uma cirurgia.

Enfim, os miseráveis…

E, no entanto, o seu município e comunidade rejeita-os.

Os grandes ordenam a barricada dos degraus, expulsam-nos dos espaços públicos

Porque afinal a condição de humanidade tem um rosto e os bolsos cheios.

Não é uma solução, Nem penso rápido o é.

E assim vejo este miserável reciclar beatas já usadas do chão

Despeja o resto da nicotina numa pilha, misturando-a com outras substâncias letais: Fuma e esquece que é miserável.

Enfim, Lisboa…

Cidade (des)encantada

Imaginemos um mundo fantástico, encantado, que de encantado cada vez vai tendo menos Nesse mundo existe uma cidade, encantada, mágica, fantástica Ou, pelo menos, isso dizem dela A verdade é que nessa cidade, outrora encanto do mundo pela variedade, diversidade, ostento de cheiros sabores e culturas, se torna agora numa "catedral do consumo"

Antes de mais, imagine-se os senhores de leis dessa cidade Bem arranjados, bem falantes, bons vivants, que querem o bem de tudo e de todos e até sabem fazer discursos de Miss Mundo

Por isso é que, nessa cidade, quando estudantes, que eles dizem ser o futuro do país, se queixaram de ter percevejos nas residências universitárias onde residem, local de suposto relaxamento e descanso, esses governantes terão pensado <<Isto é o melhor que lhes poderia acontecer, é como que uma honraria real, pois também a rainha D Maria Ana e D João V os teriam na real cama>> Ou que, aquando das exigências desses mesmos estudantes, acerca de mais residências, a solução que encontram é fechar umas para abrir novas Não têm empatia alguma para com situações negativas e alteráveis Ou se lamentam e não há nada a fazer, ou não comentam; esses mesmos que tanto prometem e cujo cumprir é paupérrimo

Imagine-se, para além disto, que um ministério deste país, localizado na mais importante praça do país, estava a desmoronar-se E aparentava que nada se lhe fizesse Imagine-se, ainda, que nesta cidade histórica, profundamente visitada por gentes d'aquem e d'alem mar, expulsava, directa ou indirectamente, os seus habitantes para lá colocar visitantes E que, para além disto, fechava os históricos lugares da cidade, aqueles cuja memória dos antigos preserva, para lá deixar meter sua empresa, aqueles que já a têm por toda a parte

Visitantes citadinos e aventureiros, que a esta histórica cidade chegam, outrora esplendorosa, e que agora se vêem uns aos outros, vão aos locais que em todo o lado existem, mas com um fundo de cor diferente e "cheiro a alecrim"

Uma "catedral do consumo" para visitar é o que lhes é dado Os senhores das leis adoram, e vêm na "catedral" unicórnios felizes e saltitantes Os senhores de leis também se enganam, ou então só não querem ver A verdade é que esta cidade, neste mundo mágico cada vez mais sombrio, em que a tempestade parece aproximar-se cada vez mais depressa, não mais é que o exemplo da decadência de um sistema; já podre, velho, e que atinge o seu limite Por isso, quando passar a tempestade, que tenhamos na mente o progresso, a transformação, para que não só esta cidade, mas o Mundo possa mudar

“Averdadeéquenessacidade,outrora encantodomundopelavariedade, diversidade,ostentodecheirossaborese culturas,setornaagoranuma"catedraldo consumo".

Ícaro

Encontro-me dentro de um relógio parado Cometo erros a cada esquina e hoje, pela primeira vez, tenho dois caminhos certos: o da direita e o da esquerda, o passado e o futuro Não tenho grande afecto pelo meu passado e sou curioso, então escolho o da esquerda, sempre gostei da esquerda, sinistra, misteriosa, desconhecida Procuro o local em que a vida me fodeu Começo a andar Passo a passo, a floresta transfigura-se em cidade e o caminho do coração torna-se embriagado de luxúria, avareza e poder À minha volta existem seres imundos a espancar as cordas vocais a outras, mais fracas e mais belas do que eles Encontro-me agora em frente a um homem coroado com bagos de louro Não sei quem é, mas não pára de andar, apesar de estar quase a abalroar-me Por fim, como majestático adamastor, atira-me ao chão e continua o seu andar imponente, suas barbas grisalhas engrandecidas pelos contornos amargos da luz fugaz de um Sol desgastado Está a rezar A cidade torna-se cinzenta, o Homem decidiu cobrir o céu com uma colcha de egoísmo e agora ardemos nós, a parte rarefeita da nossa raça descontente O amor apodrece, lágrimas pueris são disparadas pelos canos encarvoados de fábricas apaixonadas Desejamos adeus a essa noção juvenil do mundo belo, deixamos a vida para trás, porque os homens não choram, porque os livros são lenha, porque a produção é destrutiva, porque o inferno não são os outros, mas o próprio, porque somos um “planeta azul” lavado por água castanha. Sento-me na calçada porque o homem entra na máquina humana e aproxima-se das estrelas, mas não me levou consigo Ele não quer saber Não choro, não posso, não me deixam Não quero, nunca quis, só queria saber que o podia fazer A cera derrete, as penas voam, solitárias, pela poeira, o astro flamejante que nos deu a vida engole-nos A humanidade está à beira do abismo e faz exactamente o que tem a fazer dá um passo em frente

“Acidadetorna-secinzenta,o Homemdecidiucobrirocéu comumacolchadeegoísmoe agoraardemosnós,aparte rarefeitadanossaraça descontente”

ODoomScrollcomoumaluta contraocapitalismo

Imaginemos um mundo fantástico, encantado, que de encantado cada vez vai tendo menos. Nesse mundo existe uma cidade, encantada, mágica, fantástica. Ou, pelo menos, isso dizem dela. A verdade é que nessa cidade, outrora encanto do mundo pela variedade, diversidade, ostento de cheiros sabores e culturas, se torna agora numa "catedral do consumo".

O sol brilha lá fora, os pássaros cantam, as crianças brincam, e uma leve brisa de verão carrega consigo um cheiro a pêssegos A vida é muito bonita, e tu sentes-te muito mal por estares deitado na cama a fazer doomscroll no TikTok há 2 horas Ora, o que eles (os maus) não te dizem é que, na verdade, estás a lutar contra a grande máquina capitalista

Se tens menos de 30 anos, vou assumir que a maior parte do humor que te aparece nas "for you pages" faria com que uma criança da dinastia de Avis tivesse um acidente cardiovascular Isto porque a história da comédia foi em grande parte construída por piadas que seguiam uma estrutura clara de princípio, meio e fim Nos últimos anos, no entanto, o humor tornou-se mais abstrato e pósirónico Os reels que mandas ao teu amigo, que nunca te responde, não fazem sentido nenhum e isso é precisamente o que os torna tão engraçados

A pós-ironia é uma resposta clara aos problemas que a nossa geração enfrenta, muitos dos quais são criados pelo sistema capitalista O capitalismo força-nos a viver em estruturas rígidaseprevisíveis Desdeoclássicotrabalho

9 às 5 até às metas de produtividade que somos obrigados a atingir, o sistema está desenhado para nos manter numa linha reta: previsível, eficiente e funcional A ideia de que “tempo é dinheiro” permeia todos os aspetos da nossa vida, e até o que fazemos fora do trabalho deve ser "útil" seja para melhorar as nossas competências ou para relaxar o suficiente para sermos mais produtivos no dia seguinte A vida torna-se um ciclo repetitivo, onde tudo tem que ter um propósito ou uma razão de ser

É neste ponto que a pós-ironia entra como uma forma de resistência silenciosa contra essa utilidade e necessidade de estrutura Ao consumir este tipo de conteúdo durante o teu doomscroll num dia solarengo, estás a rejeitar a ideia de que precisas de estar sempre a fazer algo produtivo para justificares a tua existência

A palavra "dopamina" tornou-se ela também uma constante nos dias de hoje, especialmente em círculos de autoajuda e saúde mental Figuras como Andrew Huberman (host de um podcast de “desenvolvimento pessoal”) e Anna Lembke (autora do livro “Dopamine Nation”) alertam-nos sobre como estamos todos viciados

viciados em dopamina, sugerindo práticas como o "detox de dopamina" para resolver este problema Contudo, essa obsessão com a dopamina é, em si, um reflexo do capitalismo Vivemos numa sociedade que nos sobrecarrega com estímulos constantes e nos exige que estejamos sempre a produzir ou consumir, alimentando ciclos de gratificação instantânea Por trás dessas discussões, vale lembrar que tanto Huberman, fã de Jordan Peterson um conhecido reacionário quanto Lembke, que colabora com igrejas evangélicas americanas igualmente reacionárias, têm as suas próprias agendas As abordagens que defendem sobre vícios e "soluções" acabam por reforçar narrativas que mantêm o status quo, em vez de desafiar o sistema que nos faz precisar constantemente de um "detox"

No final, escrevi isto para me sentir menos mal por não fazer nada o dia todo A verdade é que não precisamos estar sempre a ser produtivos; o trabalho já nos sobrecarrega o suficiente Não permitas que o teu descanso se torne uma fonte de culpa, até porque essa é sempre do capitalismo

Tudooquenão escolhemosfazer comonossotempo

CarolinaRamos

Ponhamo-nos num cenário hipotético, numa mão, Anna Karenina, noutra, telemóvel “Tolstói espera um bocadinho”, pensamos, “vou responder a uma mensagem”, “deixe-me dar aqui uma olhadinha”

Confrontamo-nos com um vídeo qualquer, possivelmente a falar sobre como a última música da Taylor Swift descreve tão bem a experiência da irmã do meio, e, sendo assim, nós, irmãs do meio e apreciadoras da Taylor Swift, fomos apanhadas No vídeo a seguir, mais uma experiência que consideramos única e íntima é exposta na frente dos nossos olhos Questionamo-nos por alguns segundos, “Como é possível que estes estranhos vivam vidas tão semelhantes à minha? Como é possível que alguém em algum lugar saiba disso e reúna-os todos para a minha apreciação?” A este ponto o Tolstói já é história, fomos sequestradas As próximas horas da nossa vida serão ocupadas por uma espécie de alimentação forçada de conteúdos variados Passados os primeiros trinta minutos já sabemos qual vai ser o nosso próximo perfume, mais trinta e já temos duas opções de malas para comprar, outros trinta e temos mais cinco produtos na wishlist para completar a nossa falha rotina de skin care

Eu não sei o que é o “algoritmo” Vejo-me obrigada a confessar, sou completamente alheia aos zeros e uns que compõem qualquer uma destas instituições de desperdício de tempo No entanto, continuo fascinada por elas e, principalmente, pela sua imposição Não quero atribuir aqui um valor pré-determinado a Anna Karenina, nem nada que se pareça, mas acredito que, estando em jogo este ou qualquer outro livro, lê-lo é uma escolha, virar cada página é uma escolha, interessar-se pelas personagens e pela sua história é uma escolha, identificar-se com estas personagensmesmo que elas nunca tenham ouvido Taylor Swift - é uma escolha Vídeos de 30 segundos não são uma escolha, eles consomem-nos, na mesma medida que os consumimos Deixamos de escolher e tornamo-nos aquilo que eles querem de nós, porque eles foram capazes de alienar um dos nossos bens mais preciosos, o nosso tempo Acreditando que fosse apenas uma visita passageira, presenteamos este invasor com as nossas horas, e ele nunca mais as devolveu Perdemo-nos nesta amálgama de conteúdos de nicho, publicidades não identificadas e reflexões pela metade, gostaria que nos encontrássemos novamente Não é preciso que a escolha seja sempre Tolstói, podemos escolher fumar um cigarro na esplanada, ou voltar a assistir os Diários de Bridget Jones, creio que o único ponto essencial é que possamos escolher

EntreTikTokseEscolhasOQueNosGuia?

A quantos de nós aparecem vídeos como ‘Usa este som para atrair boa sorte’ ou ‘Usei este som antes do exame e passei; não o saltes!’? Não sei se é culpa do algoritmo ou do nervosismo pré-exame que nos faz procurar sinais do universo; mas será que confiar no universo realmente nos livra da responsabilidade de escolher? Ou será que é apenas uma desculpa para deixar as coisas acontecerem?

A tensão entre o destino e as escolhas não é exclusiva da nossa Gen Z; já acompanhou muitas gerações antes de nós. Sempre houve uma dualidade entre seguir um caminho predeterminado e tomar as rédeas do nosso destino

Na nossa geração, no entanto, aparentase cada vez mais disseminada a crença de que ‘tudo acontece por uma razão’ Os vídeos de ‘manifesting’ e ‘trust the process’ que inundam o TikTok influenciam milhares de jovens a acreditar que há um plano cósmico traçado para cada um de nós Crescemos num mundo cheio de incertezas e essa ideia oferecenos um certo alívio; também eu já me perguntei se estou a confiar demasiado no destino ou se deveria estar a fazer mais pelo meu futuro

O que diferencia a Geração Z é o ritmo acelerado e a pressão constante para tomar as ‘melhores’ decisões Segundo o estudo “Gen Z and Millennial Survey 2022”, da Deloitte, cerca de 53% da Gen Z portuguesa (46% globalmente) garante sentir-se ansiosa ou stressada na maior parte do tempo As principais causas? O futuro financeiro e a saúde mental Mesmo com a crença de que ‘tudo acontece por uma razão’, a verdade é que fazemos constantemente escolhas e todas parecem moldar o nosso futuro, criando uma inquietação permanente Embora queiramos acreditar que existe um destino incrível à nossa espera, as nossas escolhas continuam a ser uma parte essencial da equação.

O que acho curioso na ideia de destino é como só se torna clara em retrospetiva Muitas vezes, olhamos para as nossas escolhas passadas e é fácil dizer: ‘Foi o que tinha de acontecer’ Mas será que estamos a vislumbrar o tal plano cósmico, ou estamos apenas a criar uma narrativa adaptada às nossas vivências?

Escolhas aparentemente insignificantes podem, com o tempo, tornar-se peças fundamentais da nossa vida; um emprego recusado que abre portas para algo melhor, por exemplo. Será o destino algo predeterminado ou o produto das nossas decisões, que só mais tarde ganham sentido? Esta tendência de justificar o passado como parte de um destino inevitável reafirma que ‘tudo acontece por uma razão’

A relação que temos com o destino e o controlo é complexa Fazemos escolhas diariamente e, no entanto, questionamonos se realmente estamos no comando da nossa vida ou se seguimos um caminho pré-determinado É certo que fatores externos, como as expetativas que nos são impostas, podem moldar as nossas decisões de maneiras que não percebemos Mas, no final, não foram as nossas escolhas que nos trouxeram até aqui?

Podemos deixar-nos iludir cegamente pelas tendências e acreditar que o destino tem um papel vital nas nossas vidas; no entanto, não menosprezemos o valor das nossas escolhas Se há 50 anos lutámos pela liberdade de fazer escolhas, talvez hoje devêssemos valorizar ainda mais esse privilégio

Ao fim e ao cabo, creio que a vida é como uma daquelas bicicletas ‘tandem’, em que o deixar andar e o fazer acontecer são os condutores Pedalemos juntos, tentando-nos equilibrar com o peso da aceitação do que não podemos controlar e a força de vontade de fazer acontecer.

(Más?)Escolhas

Talvez o descontentamento seja a nova normalidade

Agora sei que as más escolhas governam a minha cidade.

A tendência é o caminho errado, A maçã envenenada, o destino malfadado.

Saudade do que para trás deixei, da alternativa que nunca abracei

Pela minha vida sou responsável, mas o arrependimento os meus dias enegrece, rindo da sua própria assombração, fazendo de mim um mercenário vilão.

Escolher é uma faca de dois gumes, pois a minha liberdade, repleta de aparência, vai deambulando, espicaçando tudo e todos, como uma inocente borboleta

Encarcerada na minha consciência, luto entre a emoção e a prudência

Será que é sempre tudo em vão?

Ou a minha mudança só precisa de um empurrão?

Não sei se chegarei a hastear uma bandeira branca, Mas com as decisões a aprendizagem dança.

OdeaosCamaleões

Martin

Possuis o aroma que antecede a chuva, Queres mais Gostas do Reflexo, mas repugnas o que está lá Dentro. Sentes-te imparável, cheio de hérnias nesses intestinos

Se te dessem um barco que te levasse

Ao fim (no início), o instinto primordial

Era submergir na obscuridade, Que odeias e aspiras. Reivindicas

A vénia daqueles que são terrestres, Foges dos que (não) sabem o teu nome

Desta vez vou condensar tudo o que (não) quero sentir numa frase Foda-se.

LeopoldoeHelenadeAlmeida:oacademismo propagandísticoeaautorrepresentação libertária

Aimportânciada«escolha»noprocessoartístico

A escultura é uma arte a frio que tem por base o cálculo e na qual a febre artística só se expressa por meio do desenho no momento da criação da figura

Estampadas numa parede do Centro de Artes das Caldas da Rainha, que lhe dedicou um museu homónimo, estas foram as palavras que Leopoldo de Almeida usou para descrever a segunda arte, à qual dedicou 50 anos de vida artística Nascido em 1898, em Vila Nova de Gaia, num Portugal atribulado pela explosão do republicanismo e ânsias antimonárquicas, Leopoldo de Almeida viveu num dos períodos mais atribulados da História Política portuguesa: até 1975, data da sua morte, sucederam-se quatro regimes políticos Da monarquia contestada passou-se, a 5 de outubro de 1910, à instabilidade característica do parlamentarismo republicano; duas décadas volvidas, foi instaurado um regime militarista de tipo autoritário, progressor dos 48 anos de repressão salazarista A 25 de abril de 1974, com 75 anos, Leopoldo vê pela primeira vez a democracia

Contudo, é sobretudo o "antigo regime" que marca a sua vida e obra escultórica, de tal modo que é impossível desligar o autor do período histórico referido É esta ligação ao programa cultural do Estado Novo que distingue a sua produção artística da dos seus contemporâneos neorrealistas e surrealistas, sobre os quais abundam ensaios acerca do papel dos artistas enquanto agentes de mudança político-social Autor e/ou colaborador em diversos marcos patrimoniais do Estado Novo, como o Padrão dos Descobrimentos (1960), o Cineteatro Éden (1934) e a Igreja de Nossa Senhora do Rosário de Fátima (1938), Leopoldo foi uma figura subserviente e deveras importante nas demais estratégias propagandistas do regime, como a Exposição do Mundo Português (1940) Assim sendo, a sua escultura procura retratar um país de herança e passado imperial honroso, de grandes heróis coloniais, de boa ordem e paz social – a «portugalidade» e o «luso-tropicalismo» característicos da ideologia salazarista Foi este o caminho que Leopoldo de Almeida escolheu para desenvolver a sua arte, um caminho iliberal, de racionalismo extremo, de propaganda

autoritarista, desligado do significado primitivo dos vanguardismos – assim, a estética modernista é reaproveitada pelo regime, mas separada dos seus propósitos libertários Salazar afirmara que "a arte, a literatura e a Ciência constituem a grande fachada duma nacionalidade, o que se vê lá de fora" Este terá sido o principal propósito da campanha propagandística do Estado Novo: revestir a sociedade e cultura portuguesas de modernidade artística, acompanhando os movimentos internacionais, ainda que sem a liberdade e subversão que caracterizara o surgimento destas vanguardas Alicerçado na figura de António Ferro, figura proeminente da arte portuguesa do século XX, o Secretariado de Propaganda Nacional procurou apropriar-se do modernismo e adaptá-lo ao ideário do regime, de modo a que este não ficasse preso a correntes estéticas que contrariassem esta ideia de «Estado Novo» - como o realismo e naturalismo dominantes até à Primeira República portuguesa Quanto a esta dominância tardia da arte do século XIX, António Ferro chega a escrever, em 1922, inspirado nos programas artísticos do fascismo italiano, que «Portugal tem a volúpia de ser ontem, contrariando uma Itália febril, dinâmica, futurista», que serviria de modelo durante a sua presidência do SPN (1933 – 1949)

Quando Deus concebeu o Homem, quando concebeu a Mulher, não foi para que eles se resignassem à forma que lhes dera, não foi para que eles ficassem humanos. (…) O Homem e a Mulher, porém, não compreenderam assim Ficaram-se no preconceito da Humanidade, atrasados, inferiores, indignos de Deus. Começam, finalmente, a libertar-se, a artificializar-se, a ser deuses ( ) Bendita seja a nossa Época, Época em que todos nós trazemos o Sol a tilintar nos corações, como uma libra numa bolsa de prata. (Ferro, 1922) Esta linguagem modernista conservadora teve por base algum geometrismo, racionalidade e, até, classicismo, que se manifestaram no primado da linha reta sobre a curva, na ausência de elementos decorativos e num monumentalismo que, apesar de visar a representação da excecionalidade portuguesa, remetia para os grandes regimes e civilizações ocidentais A generalidade das obras arquitetónicas – salvo raras exceções, como os monumentos construídos no âmbito da Exposição do Mundo Português – foram edifícios de caráter funcionalista, concebidos para mera utilização quotidiana Na escultura e na pintura, os motivos eram distintos, mais associados à propaganda «estado-novista»: tal como referido aquando do aprofundamento dos traços escultóricos de Leopoldo de Almeida, eram sobretudo representados os grandes heróis da História de Portugal (intelectuais, monarcas e figuras da Expansão Marítima Portuguesa, entre outros), de forma idealizada e monumental – como nos salta à vista quando observadas as esculturas do Padrão dos Descobrimentos ou das salas do Museu Leopoldo de Almeida

Em 1934, nasce em Lisboa a única filha de Leopoldo, Helena Almeida Ávida frequentadora do atelier de escultura do pai, em Campo de Ourique, Helena apaixona-se pela arte e ingressa, à semelhança do seu progenitor, na Escola Superior de Belas-Artes de Lisboa, no curso de Pintura A sua carreira artística começa nos anos 60, desligada de quaisquer regras artísticas, academismos ou campanhas propagandísticas: contrariamente a Leopoldo, Helena Almeida segue o ramo da arte conceptual e da autorrepresentação livre, conjugando retratos fotográficos com pintura, cores irreverentes e performance teatral

MatildeMarques/BárbaraRafael

Este foi o caminho que Helena escolheu para vivenciar o seu percurso artístico, que em tudo se opõe ao de Leopoldo – desde a fusão de várias «artes», passando pela utilização de uma estética invulgar, conceptual e afastada dos cânones da Razão, à liberdade artística expressa na sua visão individualista da arte

Por toda esta excecionalidade, a artista foi considerada uma das mulheres com maior impacto no panorama artístico contemporâneo, tendo sido exposta a sua obra em vários centros de arte, galerias e museus internacionais, como o Tate Modern (2018) e o Museu de Arte Contemporânea de Serralves (2015) Este último adquiriu parte do seu espólio e expô-lo nos últimos meses (entre 19 de junho e 6 de outubro) sob o mote «Helena Almeida Habitar a Obra», no Museu Leopoldo de Almeida Foi esta exposição da Fundação Serralves que serviu de base para a realização deste artigo e de todas as comparações efetivadas: o contraste observado entre as duas salas dedicadas a Leopoldo e a última sala dedicada a Helena Almeida revelou-se surpreendente Mais do que duas personalidades e visões antagónicas da função artística, mais do que duas escolhas individuais que determinariam o seu percurso artístico, pai e filha representam duas fases distintas do panorama histórico-cultural do século XX português: Leopoldo vestiu o manto negro da ditadura portuguesa, Helena as pinceladas azuis da liberdade que luziu em 1974 A ligação de ambos a dois períodos antagónicos da política portuguesa remete-nos novamente para esta ideia de escolha e livre-arbítrio, que nos faz interrogar: até que ponto somos realmente livres e nunca condicionados pelas circunstâncias do tempo, modo e local onde crescemos? Este seria, de resto, um debate interessante a ter com Leopoldo e Helena de Almeida

Fotografias de Matilde Marques

Bárbara Rafael

De manta no colo e caneta na mão ela pensou, não pensou como antes (porque as anteriores não eram pensar), desta vez esmiuçou, chorou e não obteve resposta Refletiu sobre aquelas coisas estranhas: morte, pessoas, vida, destino, escolhas Sob a impossibilidade de resposta imaginou-se escritora (uma escolha de vida incerta, que só poderia constar nos mundos dos sonhos ou da imaginação), gostava de ter criado a história de Mia e Sebastian (1) ou de Nora e Hae Sun (2), mas escolheu não o fazer Ansiava por histórias poéticas como aquelas, vivia para a tragicidade das relações humanas Até que ponto é que a sua mísera vida valera a pena? Ao menos aqueles quatro tinham ganho o direito para estarem tristes, ela era apenas uma menina num quarto, uma observadora dos outros Passaram-se-lhe tantas vidas pela janela como livros que jamais teria tempo de ler Olhou pela lá e caiu-lhe uma lágrima, não soube bem o porquê, mas lembrou-se que o seu corpo sempre fora o pioneiro no que toca às suas emoções Chorou por chorar e, de repente, viu dois indivíduos sentados em lados opostos do jardim; um escrevia num caderno preto e outro lia um livro cuja capa não era decifrável devido à distância Não se conseguiam ver por estarem tapados por um tronco de figueira enormíssimo Será que teriam a chance de se conhecerem novamente durante esta vida?

Ela tinha a sensação de estar a viver um déjà-vu, via-os de um local privilegiado e

pôs em cima da mesa a possibilidade da natureza se estar a vingar daqueles que não olham Encontrar-se-iam num bar? Na faculdade? Na empresa em que nenhum dos dois gostava de trabalhar? No lar de idosos? Quantas vezes os seus caminhos se cruzariam sem se aperceberem um do outro?

Então, ela recebeu um murro no estômago, as lágrimas estagnaram, o coração palpitou, as mãos tremeram-lhe e os olhos não podiam acreditar. Seria aquilo o que Álvaro de Campos teria sentido ao ver o Esteves da metafísica? Seria aquilo que Deus sentia enquanto olhava para os humanos? Milhares de linhas que provavelmente nunca se chegariam a entrelaçar porque se impediam de observar, de realmente ver Pela primeira vez em muito tempo sentiu vontade de sair de casa e de gritar para que aquela alienação conjunta acabasse Todavia, não o fez

Naquele dia, quando se deitou, lembrou-se do episódio da janela, e a palavra destino ecoou-lhe sobre os pensamentos Talvez todos nós interfiramos nele através das nossas escolhas, dos caminhos que decidimos percorrer O destino não passava de uma consequência de uma certa quantidade de decisões Adormeceu com azia, mesmo sabendo que estava a pensar demasiado, amanhã, certamente, sairia de casa para comprar pão para o pequeno-almoço!

“There’s a word in Korean in-yun It means providence or fate But it’s specifically about relationships between people I think it comes from Buddhism and reincarnation. It’s an inyun if two strangers even walk by each other on the street and their clothes accidentally brush. It means there must be something between them in their past lives”

PastLives(2023)

VaiDescansar Vagabundo

É direito amar, é direito sentir, e, principalmente, é direito Viver, com V maiúsculo.

De todos os infames influencers que vagueiam pela internet, reservo um desdém especial aos que defendem que o propósito da vida é o trabalho. Qualquer leitor com uma conta numa rede social saberá qual o tipo de indivíduo a que me refiro – àqueles que acreditam que a maior falha do Orçamento de Estado é o facto de o Governo não distribuir cópias do Pai Rico, Pai Pobre aos sem abrigo

Sinto este desdém por uma simples razão: são completamente antagónicos à calma Um direito parcamente abordado, mas profundamente enraizado na nossa cultura

E sim, digo direito O Ser Humano tem o direito de viver uma vida com calma Tem o direito de ler um livro, seja ele qual for, à beira-mar, no silêncio ensurdecedor que o oceano traz Necessita de sentir o abraço leve do calor de julho no seu rosto Precisa de poder descontrair numa poltrona, no ópio do ócio, preferencialmente com um gato a ronronar em cima do colo É impreterível comer e beber bem, com sorrisos de amigos à volta, num almoço prolongado de domingo

A vida não é uma mina de onde se retiram publicações do LinkedIn O propósito da mesma não é maximizar o lucro dos acionistas da empresa para a qual se trabalha É necessário ser levemente letárgico É necessário ter alguma calma

Logo, não esqueçamos alguns direitos É direito amar, é direito sentir, e, principalmente, é direito Viver, com v maiúsculo

MedodeFuturo

Por volta dos cinco anos de idade, tive uma crise de choro e em meio às lágrimas, disse ao meu pai que não queria crescer Alguns anos depois, meu primeiro dente de leite caiu e com ele, lágrimas. Aos doze virei mulher e mais uma vez chorei Sempre ouvi dos outros que nasci cansada Na verdade, nasci com medo do futuro.

Que coisa engraçada que é o salgado das lágrimas! Ao provar do seu tempero, ele é o mesmo da comida que diariamente alimenta Humor divino, salgar as águas da tristeza, colocar sal no choro Não se escolhe chorar, mas se chora por escolhas e por medo de escolher As lágrimas, contudo, têm todas o mesmo sabor

Inútil divagação, questionar a agência, duvidar da escolha Escolheremos fatalmente até a morte E em meio a aquilo que não escolho, milhares de inevitabilidades, o salgado das lágrimas e o medo do futuro

Só resta então continuar escolhendo meu amor escolhendo minha fé. Fazendo escolhas certas, erradas, nulas Me escolhendo

Fonte: Inês's Gallery
Victoria Leite

Portinhola

Inês Fonseca

É notória a queda a pique da cera que arde, do pavio que se encurta Não evapora, não desaparece, fica somente por ficar Deixo-me derreter e acomodar ao chão diante de vidas que por mim vivem Fico estarrecida por aqueles que se concretizam vitoriosos, que não se amolecem perante as chamas Conseguem enfrentar o que o universo lhes oferece e seguir a partir desse princípio de fim Embora esteja no início da minha existência, adio o seu início proativo O ato do adiamento da ação é uma escolha contraproducente É o escolher não escolher no momento, passado, atual ou futuro. A apatia reina e atraiçoa o que comanda a carne Isto resume-se na procura do alçapão misterioso dos estúdios do Joker, sem a ajuda do Palmeirim ou da Patrícia, com vista a levar para casa o valor máximo ou, simplesmente, fugir sem ter de enfrentar as quatro opções cíclicas Nem os 25% de chances de acertar, seguindo o regime do Um Dó Li Tá, apaziguam Eleva-se o escapar da decisão prepotente, com peso determinante.

Nunca fui boa com decisões Fico assoberbada pelas hipóteses que tenho, concluindo que o melhor a fazer

é autossabotar-me Quantas vezes comi Nestum ao pequeno-almoço por não me decidir entre ovos ou torradas; quantas vezes criei um ambiente estranho por não saber se trato os pais dos meus amigos por tu ou você, salteando legumes de proximidade ou afastamento constantes. Até quanto à orientação dos meus cadernos sou indecisa, por isso é que me prendo àqueles que não são pautados, o que acaba por me dar a falsa sensação de livre-arbítrio Aposto que, no problema filosófico do trolley, eu atirar-me-ia para a frente do mesmo, só para não ter de decidir entre as duas linhas possíveis. Há respostas que se afirmam a pente claro na minha mente, por serem indubitáveis àquilo que sou, em contrapartida é a clareza de umas que me afo escuridão das demais Se soube que cartas são as mel prendas e que, por cada fat fiambre, são duas de queijo momentos em que não sei se usar rímel ou não, por isso, inte as minhas dúvidas com as m respostas Quando não o quando a força anímica não chega, deixo-me ficar à janel outros, a observar o que esco enquanto a minha vela derr me queima os dedos.

Boss Biche Poesia

Três ovos caseiros batidos

Na panela anti-aderente; Temperatura média-baixa Na boca de fogão mais quente;

Junta-se o sal e pimenta

E a verdura que nos convém

Depois, queijo à mistura, E tomate picado também;

Pego na melhor espátula (Aquela que não estraga aço)

Devagar, dobro a omelete

FODA-SE!

PARTIU-SE UM PEDAÇO!

Calendário Desumano

Parecia mais um jogo normal de Premier League, a bola rolava e os jogadores corriam por ela Aos 20 minutos do duelo entre Manchester City e Arsenal a normalidade foi interrompida Rodri Hernández, um dos melhores jogadores do planeta, após um choque na sua própria grande área, cai agarrado ao seu joelho direito A festa do futebol foi suspensa por gritos de dor e sofrimento O pior foi confirmado pouco depois da partida, o clube de Manchester informou que o espanhol sofreu uma rotura no ligamento cruzado do joelho direito, falhando o que resta da ainda longa temporada

O que aconteceu a Rodri não é caso único, o terror das lesões graves tem assolado todo o futebol europeu, levantando questionamentos sobre o futuro da modalidade Ironicamente, o espanhol, poucos dias antes do acontecido, teceu declarações importantíssimas, que lançaram um diálogo já há muito necessário no futebol mundial Na antevisão ao encontro a contar para o novo modelo da Champions League frente ao Inter de Milão, Rodri mencionou uma possibilidade de reação aos excessos de jogos no calendário do futebol europeu: “Penso que estamos perto disso É a opinião geral dos jogadores, e, se continuar assim, não teremos alternativa Penso que é algo que nos preocupa, verdadeiramente Somos nós que sofremos”

“Pela minha experiência diria 60 ou 70. Entre 40 e 50 é o número de jogos nos quais um jogador consegue render ao mais alto nível. Depois disso há uma quebra, porque é impossível suster o nível físico. Este ano, talvez venhamos a jogar 70 ou até mesmo 80. Na minha humilde opinião, é demasiado”

Novos Formatos, Mais jogos

A discussão ao redor do número de jogos é recente, e está diretamente ligada às novidades impostas pela Union of European Football Associations (UEFA) e pela Fédération Internationale de Football Association (FIFA) nas

suas respectivas competições A UEFA apresentou, no dia 19 de abril de 2021, o novo formato para a maior competição de clubes da Europa, a Champions League, tendo sido aprovado pelos clubes a 10 de maio de 2022 Esta “nova” Champions exclui a antiga fase-de-grupos, substituindo a mesma por uma tabela universal, onde as 36 equipas (alargamento face ao antigo formato, de 32 equipas para 36) apresentam-se numa tabela única Os clubes deixarão de enfrentar três adversários duas vezes, entrando agora em campo oito vezes contra oito adversários distintos, quatro em casa e quatro fora do seu recinto Após as oito partidas, os oito primeiros colocados nesta fase de liga, como a UEFA nomeia, têm passagem garantida aos oitavos de final da competição, já as que terminarem entre a 9ª e a 24ª posição, avançam para um pequeno playoff a eliminar de duas mãos, os colocados entre o 9º e o 16º posto terão como oponentes os colocados entre o 17º e o 24º lugar, sendo definidos os duelos por sorteio Os classificados do 25º lugar para baixo estão eliminados das provas europeias, ou seja, a descida de equipas da Champions League para a Europa League deixa de existir A UEFA remodelou igualmente o formato da Liga das Nações, competição de seleções criada em 2019, com a pretensão de substituir os amigáveis entre seleções europeias, adicionando mais uma nova fase de eliminação após os grupos A FIFA não quis ficar de parte na remodelação de provas, promovendo a criação de um novo formato do Mundial de Clubes, que pretende alargar a competição para um mês inteiro, no fim da época desportiva europeia, inflacionando um pouco mais o calendário

Faremos agora um pequeno cálculo, envolvendo o internacional português Bernardo Silva, atleta do Manchester City e companheiro de Rodri Tendo em conta todos as alterações de provas, quantos jogos o jogador português poderá realizar na época 2024/25 em todas as competições, por clube e seleção? A resposta são 84 partidas, num período entre 10 de agosto de 2024 e 13 de julho de 2025, um número bastante acima do citado como ideal por Rodri

Pesadas consequências

As preocupações dos jogadores foram apoiadas pela Fédération internationale des Associations de Footballeurs Professionnels (FIFPRO), o órgão representativo dos futebolistas profissionais a nível mundial, que emitiu um extenso relatório com dados e estatísticas fulcrais para a discussão Cerca de 88% dos especialistas concordam que nenhum atleta deveria realizar mais do que 55 jogos numa só época, um número muito abaixo daquilo que, por exemplo, Bernardo Silva tem pela frente O problema, contudo, não reside apenas na frequência e na carga de jogos, como pela redução do repouso após o fim da temporada, que vem sendo encurtada por diversas competições, desde o Mundial de Clubes até aos Jogos Olímpicos, não permitindo as 4 ou mais semanas de descanso que 88% dos especialistas consideram essenciais para evitar graves problemas físicos

Para além da questão fisiológica, um calendário extenso afeta a vida pessoal e familiar do atleta, que se vê cada vez mais afastado da mesma O central Marquinhos, internacional brasileiro e jogador do PSG, passou, na época de 2022/23, 80% do seu tempo no seu posto de trabalho (48%

Momento da lesão de Rodri, frente ao Arsenal; Fonte: Independent UK

internacional

em treinos ou instalações do clube, 14% em concentrações de partidas pelo clube, 7% em viagens pelo clube, 7% em viagens ou estágio pela seleção e 3% em jogos pela seleção), percentagens que são replicadas na grande maioria dos atletas do futebol europeu

O aumento do número de jogos pode ser igualmente observado aquando da análise de jovens atletas e do seu ainda curto percurso no desporto Aos 21 anos, Jude Bellingham já disputou mais partidas que qualquer lenda inglesa na mesma faixa etária (Beckham, 54 jogos, Gerrard, 93 jogos, Lampard, 98 jogos, Owen, 156 jogos, Rooney, 212, Bellingham, 251) Sendo que a estrela do Real Madrid não apenas disputou mais 39 partidas que Rooney como também foi utilizado por mais 3500 minutos A perspectiva para o final da sua carreira, se a mesma não for interrompida por nenhuma lesão, e durar até aos seus 38 anos, é de que Bellingham termine com inacreditáveis 1242 partidas (Lampard, o atual inglês com mais partidas oficiais disputadas, acabou a carreira com 1002 jogos) O caso do inglês não é único, Florian Wirtz, Jamal Musiala, Kylian Mbappé, Vinicius Junior, Pedri, Alvarez e muitos outros possuem similares números e projeções de carreira Estas projeções deixam sérias preocupações, pois, a alta intensidade deste tipo de calendário, possui o perigo de encurtar severamente a promissora carreira destes jovens atletas, criando mazelas que durariam não só o resto dos seus dias pelos relvados como pelo resto das suas vidas

nacional belga e jogador do Manchester City, após estar afastado dos relvados por 5 meses, afirmou ter “aproveitado” a ausência para descansar o corpo e a mente: “Claro que no início é um grande choque, mas depois sei que vou estar de fora cinco meses Depois da reação inicial, foquei-me em trabalhar duro no tempo de trabalho e, por outro lado, desfrutar um pouco das coisas que não conseguia fazer com a minha família e amigos Encarei dessa maneira Talvez tenha sido bom para me renovar Foi bom levar os meus filhos às atividades deles e aos jogos Até fui de férias, o que nunca é possível durante a época Foi um pouco diferente”

As conclusões do relatório da FIFPRO foram bastante evidentes, ao analisar os 28 dias antecedentes de atletas que sofreram graves lesões, os mesmos passaram por mais desgastantes períodos de competição, com mais minutos disputados, menos tempo de recuperação e mais jogos consecutivos com menos de cinco dias de intervalo em comparação com outros atletas que não sofreram lesões As viagens internacionais são, igualmente, uma aspecto comum entre atletas lesionados, gastando mais horas, viajando mais quilómetros e ultrapassando múltiplos fusos horários (por exemplo, Christian Romero, internacional argentino e jogador do Tottenham, fez 163,000 km em 25 viagens pela seleção argentina apenas na temporada 2023/24)

Queremos jogar futebol e desfrutar, mas temos de reduzir É demasiado Eu não estou a dizer para eliminar as seleções nacionais, ou a Champions League, ou a Premier League, ou todas as taças, mas temos de encontrar uma solução”

O aumento do calendário está diretamente relacionado com as intenções financeiras da UEFA e FIFA, mais jogos significam mais receita para ambas as instituições Nesse sentido, o treinador do Real Madrid, Carlo Ancelotti, abordou a temática: “O futebol necessita de refletir, porque o objetivo é tentar jogar menos jogos e ter menos lesões”, “Se para isso for necessário reduzir salários ( ) eu não acho que os jogadores terão qualquer problema em baixar os seus salários se jogarem menos”

Enquanto o grito de greve de Rodri não for ouvido coletivamente, jogadores, pela sua própria vontade, tentam encontrar soluções para reduzir o impacto dos calendários desportivos nas suas vidas, o que é o caso de Frederik Aursnes, internacional norueguês e atleta do Benfica A 12 de Março de 2024, o médio de 28 anos decidiu aposentar-se precocemente da seleção, alegando querer mais “tempo e liberdade de priorizar outras coisas na minha vida para além do futebol”

Desde julho de 2021, Aursnes apenas teve 36 dias de descanso durante a temporada, acumulando, até Maio de 2024, 168 partidas (146 pelo clube e 22 pela seleção) Na temporada de 2023/24, o norueguês disputou inacreditáveis 66 partidas pelo Benfica (94% dos jogos possíveis), dessas 66, 51 partidas foram realizadas consecutivamente O caso de Aursnes não é uma exceção, pelo contrário, cerca de 130 jogadores realizaram ainda mais jogos nesse mesmo período de tempo A norma é que, caso a carga de jogos continue, mais atletas tomem a desesperada decisão de deixar de representar as suas nações

O jovem Jude Bellingham, internacional inglês e estrela do Real Madrid; Fonte: Independent UK

Reação dos Protagonistas

O lado psicológico do desporto, nos últimos largos anos, tem ganho um palco e relevância superior, o bem estar mental dos atletas tornouse uma preocupação dos comités de futebolistas O intenso calendário não apenas deteriora o lado físico do atleta Mentalmente, não existindo momentos de descanso e alívio, graves problemas de stress, burnout mental e ansiedadepodemsurgir KevinDeBruyne,inter-

Atletas e treinadores não esconderam o descontentamento, as palavras de Rodri, “ameaçando” uma greve, são apenas uma das várias declarações que apontam a uma necessidade de mudança Pep Guardiola, treinador do Manchester City, apontou esta exata necessidade: “Durante onze meses são jogos, jogos, jogos Antes, a pré-época durava quatro a cinco semanas Agora temos dez dias

Exemplo a não ser seguido

Usaremos agora um arquétipo de calendário similar ao novo europeu para entendermos melhor a longo prazo essa mudança Nesse ano de 2024, o cronograma do futebol brsileiro começou, oficialmente, no dia 21 de janeiro, com os campeonatos estaduais e se encerra no dia 8 de dezembro Contudo, o intercontinental de clubes pode fazer esse encerramento se estender ainda mais Supondo que um time brasileiro seja campeão da Libertadores, esse time poderia ter jogos até o dia 18 de dezembro, com um intervalo de apenas 3 dias entre a última rodada do brasileirão e a estreia no intercontinental

Podemos usar como um exemplo concreto o Palmeiras em 2021 No ano em questão, o clube paulista fez todos os jogos possíveis, visto que chegou em todas as finais que poderia, especificamente do Paulista, Recopa Sulamericana, Supercopa do Brasil, Copa do Brasil, Libertadores e do antigo Mundial de Clubes, além das 38 rodadas do Campeonato Brasileiro Somando todas essas competições, o clube entrou em campo 91 vezes entre 11 de março (com a estreia no estadual) e 12 de fevereiro do ano seguinte (final do Mundial de

O
português, Bernardo Silva, em pela frente, na época 24/25, 84 partidas; Fonte: ESPN

Clubes) Com isso, o Palmeira fez um jogo a cada 4 dias, aproximadamente, algo que era considerado loucura em boa parte do mundo até pouco tempo atrás

Alguns dados da temporada contribuem para a percepção da insanidade que é uma temporada assim O Jogador que mais disputou jogos pelo alviverde no ano em questão foi Gustavo Scarpa, com 55 partidas, ou seja, o atleta que mais vezes defendeu o clube, entrou em campo em apenas 60% dos confrontos, mas nem todos como titular O jogador palmeirense com mais minutos na temporada foi o guardaredes Weverton, que esteve em campo por apenas 4475 dos aproximadamente 8190 minutos possíveis Percebe-se que o desgaste físico devido ao grande número de jogos afetou até mesmo a posição onde menos se costuma ver jogadores, deixando de disputar partidas por essas questões

Junto a isso, o técnico Abel Ferreira reclama, desde que chegou ao clube paulista, do denso calendário que vive o futebol brasileiro Entre lesões e desempenhos ruins, o treinador sempre apontou o alto número de partidas como um dos motivos que dificultam a construção de um trabalho e a manutenção de desempenho, visto que cresce também o número de lesões, e diminui o número de treinamentos para que seja possível a implementação de uma ideia de jogo

É evidente que existe uma diferença de enfrentamento e exigência entre o futebol europeu e o brasileiro, dessa forma, vendo os estragos que um calendário intenso pode causar nos atletas e equipas no Brasil, é possível imaginar o que pode vir a acontecer a longo prazo na Europa A sensação agora é que, a qualquer momento, a pressão de treinadores e jogadores pode rebentar, levando a uma ruptura daquilo que conhecemos como futebol europeu Até lá, mais atletas sofrem diariamente, colocando não só a sua carreira como a sua saúde em risco, em prol de um desumano calendário de jogos

Euro2024, OVerãodosSonhos

O EURO 2024 foi o Ex-libris do verão para quem ama a bola no tapete verde A Alemanha acolheu as 24 melhores seleções europeias que se digladiaram ao longo de um mês pela honra de serem proclamadas campeãs da Europa Vamos então embarcar numa viagem que terminará no Olympiastadion em Berlim com o novo maioral do velho Continente

Como todo o bom torneio, começou com a famigerada fase de grupos Wirtz inaugurou as balizas alemãs, enquanto Shaqiri, o eterno amor de verão, ofereceu mais um golo antológico digno do seu estatuto de lenda A Alemanha e a Suíça seguiram assim em frente no Grupo A O Grupo B reservounos o golo mais rápido da história dos Europeus da autoria de Bajrami (23 segundos), e o marcador mais velho de sempre, Modrić que se despediu dos Euros com lágrimas impotentes de quem sabe que o futebol ainda lhe deve um título com a sua seleção croata A Espanha foi a única a fazer os nove pontos com brio e competência, juntando-se à Itália, miraculosamente guiada pela inspiração de Zaccagni Os empates e a sonolência marcaram o Grupo C que apurou a Inglaterra, a Dinamarca e a Eslovénia, sem brilho algum

O Grupo D teve a chancela dourada da líder Áustria de Ralf Rangnick, que encantou com o seu gegenpressing personificado em Sabitzer, Laimer ou Arnautović Por outro lado, o estilo mais meticuloso e matreiro também deu à França o bilhete para os oitavos, juntamente com os Países Baixos do goleador Gakpo O Grupo E foi sui generis: a surpreendente Roménia, a desapontante Bélgica e a Eslováquia carimbaram a passagem num grupo em que também a Ucrânia terminou com quatro pontos, sendo a diferença de golos decisiva Por fim, o Grupo F teve a seleção nacional como vencevencedora, que se juntou à Turquia e à Geórgia, fechando os brilhantes 16

O golo de Chico Conceição em Leipzig, Cristiano Ronaldo a tornar-se o maior assistente da história dos Euros e Kvaratskhelia a carregar um país estreante às costas ficam como momentos para serem relembrados

Os oitavos-de-final iniciaram com uma categórica vitória da seleção suíça sobre a Itália, enquanto em Dortmund e debaixo de raios e trovões, a anfitriã Alemanha eliminou a Dinamarca A Espanha bailou a Geórgia e

a Inglaterra teve na bicicleta de Bellingham a salvação divina para os quartos A “chilena” do prodígio inglês, foi um grito de expressão como se de um pintor se tratasse, a aguarela em forma de bola pintou o mais bonito quadro do campeonato europeu O muro Diogo Costa ergueu-se três vezes nas grandes penalidades e ajudou a seleção das quinas a eliminar a Eslovénia A França precisou de um autogolo para eliminar a seleção belga Os romenos foram naturalmente eliminados pelos neerlandeses e a Turquia teve nos pés de Arda Güler a inspiração necessária para ultrapassar a Áustria

Nos quartos-de-final, a seleção inglesa venceu a Suíça nos penáltis, enquanto os Países Baixos suaram para eliminar a Turquia Portugal foi afastado pela França na despedida emocionante de Pepe e CR7 dos Euros enquanto a Espanha eliminou a Alemanha com um golo in extremis de Mikel Merino, pondo um ponto final na carreira de Toni Kroos O elegante médio, multicampeão e um dos meus favoritos de sempre pendurou as suas míticas botas, as únicas capazes de fazer um passe de 50 metros parecer banal Don Toni Kroos, o rei que se retirou no trono

Os bilhetes para a finalíssima ficaram com a Inglaterra graças ao pontapé canhão de Watkins em cima do minuto 90 e com a brilhante Espanha que banalizou a França, no jogo em que Lamine Yamal abriu a caixa de pandora da sua promissora carreira Na final, Yamal e Nico fabricaram o primeiro golo Tiki y Taka Magia de bairro, futebol de rua Maturidade e experiência com 22 e 17 anos A Europa aos seus pés Palmer, o injustiçado dos três leões, empatou o jogo decisivo com a classe habitual, antes da glória eterna chegar aos pés de Oyarzabal no fechar da cortina, dando o título europeu à Espanha La Roja transformou-se na maior campeã europeia da história com 4 títulos e engrandeceu a geração de craques como: o artista Fabián Ruiz, o equilibrador Rodri e o sempre batalhador Carvajal Foi a vitória de uma ideia de posse e pressão acima de qualquer outra coisa O verão da última dança de Kroos, da bicicleta de Bellingham, de Yamal e do fútbol bonito da Espanha Um verão de futebol, num país de futebol, sempre com os melhores intérpretes, a bola assim até sorri!

JOGOSOLÍMPICOS2024

EsteverãotodososcaminhosvãodaraParis

De 26 de julho a 11 de agosto não se falava de mais nada que não o evento dos eventos: os Jogos Olímpicos de Verão

Este ano, seguimos para a 33ª edição desta magnífica competição, onde quase 11 mil atletas entraram em campo, na pista, no tapete, na piscina, em luta pelo título dos títulos, pelo sonho e honra do ouro olímpico

Paris 2024 teve os seus altos e baixos, mas não deixou de ser uma das mais belas edições desta competição

Apesar da chuva, o sol brilhou sobre Simone Biles, que, após desistir da competição na edição de 2021 e anunciar uma pausa para se focar na sua saúde mental, regressou ao maior dos palcos e arrecadou quatro medalhas, reforçando o seu título de ginasta mais condecorada da história

Mas a americana não foi a única a dar espetáculo: Sifan Hassan, a extraordinária fundista holandesa, chocou (mais uma vez) o mundo do atletismo Em Tóquio já havia deixado o seu nome nos livros, com duas medalhas de ouro e uma de bronze Na capital francesa, depois de dois bronzes (10 000 e 5000 metros), Hassan venceu (ao sprint!) a maratona feminina, e não só estabeleceu um novo recorde olímpico, como se tornou na primeira mulher com um ouro olímpico em todas as distâncias olímpicas de fundo

Também não podemos falar destes jogos sem mencionar o herói da casa, Léon Marchand Com apenas 22 anos, na sua segunda participação olímpica, o jovem francês conquistou quatro medalhas, três delas de ouro, e duas destas somente com duas horas de diferença! E falando em fazer história, é impossível não falar do “duelo de titãs” entre duas enormes estrelas do ténis mundial,RafaelNadaleNovakDjokovic Opardeti-

tãs encontrou-se pela 60º e possivelmente última vez, tendo o servo levado a melhor, seguindo na competição, e Nadal despede-se de uma competição onde fora sem dúvida muito feliz

Muitos julgam que a melhor maneira de ficar na história dos Jogos Olímpicos é alcançando o ouro Mas quem acompanhou esta edição viu Yusuf Dikeç e Rachel “Raygun” Gunn, que não vencendo as respetivas competições de tiro de precisão e breaking, venceram a internet, tornando-se sensações nas redes sociais do dia para a noite, o turco pelo seu estilo descontraído a disparar (de mão no bolso!) e a australiana pela sua curiosa e controversa performance (recebeu 0 votos dos jurados, não passou a primeira fase da competição, mas detalhes técnicos levaramna a nº 1 do mundo)

De facto, Paris vibrou durante estas duas semanas, e os portugueses tiveram também razões de festejo Com uma comitiva de setenta e três atletas, Portugal arrecadou catorze diplomas olímpicos e quatro medalhas

A primeira medalha portuguesa foi ganha no judo, foi de bronze, e pertenceu a Patrícia Sampaio (categoria -78kg), oriunda de Tomar, atleta do Sporting Clube de Portugal e estudante de Ciências da Comunicação na nossa FCSH Seguiu-se a medalha de prata de Iuri Leitão, no Omnium masculino do ciclismo de pista, que representou a primeira medalha olímpica portuguesa no ciclismo de pista Também de prata foi a terceira medalha portuguesa, desta vez no triplo salto masculino, e pertenceu a Pedro Pablo Pichardo, que por muito pouco, no caso apenas três centímetros, não se sagrou bicampeão olímpico, mas não deixou de se tornar num dos maioresmedalhistasolímpicosdahistóriadonos-

so país Para encerrar o palmarés de 2024, Iuri Leitão voltou à pista, desta vez ao lado de Rui Oliveira, e a dupla fez o impensável ao vencer a prova de Madison, arrecadando o primeiro ouro olímpico fora do atletismo, e Leitão torna-se ainda no primeiro português a trazer duas medalhas para o país numa única edição

Já nos diplomas olímpicos, ou seja, atletas que se classificam entre quarto e oitavo lugar, tivemos Nelson Oliveira no contrarrelógio individual do ciclismo de pista, Vasco Vilaça e Ricardo Batista que, ao contrário do Sena, brilharam no triatlo masculino, conseguindo um 5º e um 6º lugar, respetivamente, Inês Barros conseguiu o 5º lugar na prova de tiro com armas, Gabriel Albuquerque, apesar de ambicionar chegar às medalhas, ficou pelo 5º lugar na final de ginástica de trampolins, Vasco Vilaça e Ricardo Batista entraram novamente em ação, juntamente com Melanie Santos e Maria Tomé, e atingiram o 5º lugar no triatlo misto, Diogo Costa e Carolina João ficaram também na 5ª posição na classe Dinghy misto de vela, Jéssica Inchude foi 8ª no lançamento do peso, e João Ribeiro e Messias Baptista foram 6ºs classificados na canoagem de velocidade, enquanto Fernando Pimenta não chega ao desejado pódio olímpico, ficando em 6º no K1 1000 metros

Portugal sai então de Paris com o mesmo número de medalhas de Tóquio 2020, com um pedido de casamento e duas infeções gastrointestinais, mas certamente também com a ambição de superar todos estes números na próxima edição (excetuando, esperemos, o número de infeções), que terá lugar em 2028, em Los Angeles, EUA

Olá, amantes de desporto da FCSH! Nós somos a Bancada 360, um projeto de jornalismo desportivo fundado e gerido exclusivamente por alunos da nossa faculdade Portanto, podem esperar não só informações sobre os diversos jogos das diversas modalidades, mas também sobre questões que afetem a prática desportiva fora dos recintos

O projeto é constituído por alunos do ensino superior e, como tal, não somos (por enquanto!) profissionais de jornalismo Mas nós vemos isso como uma vantagem, pois é uma garantia de que todos os membros desta organização estão aqui pela paixão, tanto pelo desporto, como pela prática jornalística

A Bancada 360 conta, também, com presença no Instagram (@bancada 360) e no X (@bancada360), tal como no nosso website (é só utilizar o código QR) Se nos quiserem contactar, podem fazê-lo pelas nossas redes sociais ou pelo nosso e-mail em bancada360@gmail com

A apresentação está feita, venham sentar-se connosco na bancada!

Anéis Olímpicos em Paris (Foto: goodfreephotos)

As Descobertas de Nuno Folha: Primeira semana na fcsh

A primeira semana de aulas chegou ao fim É sábado de manhã, o céu está nublado, ainda que alguns raios de sol tentem passar por entre as nuvens Um deles atravessa a persiana mal fechada do quarto de Nuno Folha, acordando-o O rapaz levanta-se e sobe-a na totalidade, ficando a vislumbrar a serra durante uns breves instantes

Nuno Folha cruza o portão da FCSH e depara-se com uma multidão de pessoas e um ambiente de intensa agitação Aproxima-se de uma bancada e uma rapariga, que esboça um grande sorriso, dirige-se a ele:

- Olá, sê bem-vindo à Nova FCSH! A tua segunda casa a partir de agora

A rapariga continua a falar, mas a sua voz soa de forma abafada na mente de Nuno Folha Ele agradece com um gesto cordial e um sorriso amarelo e segue para o interior da torre B

Nuno Folha está sozinho, na fila, à porta do Com Sabor Entretanto, apercebe-se de que atrás de si estão dois colegas do seu curso, os quais ele viu na sessão de apresentação e na aula anterior Nervoso, pensa “Ok, Nuno, tens de fazer amigos É só ganhares coragem, virareste para trás e dizer olá”

- Hm olá, tudo bem? Sou o Nuno Folha Creio que estamos os três em Estudos Portugueses

- Olá, sou a Ana Tesoura, prazer em conhecer-te

- Sou o Rafael Rocha E, sim, creio que assinamos os três a mesma sentença

Os três riem-se de forma contida

Já sentados, Ana Tesoura diz:

- Olhem, não acham que os preços são muito altos para uma cantina de faculdade?

- Deverá seguramente haver alguma alternativa por aqui ou então é começar a trazer almoço de casa – responde Rafael Rocha

- E tu, Nuno, o que te trouxe à FCSH? – pergunta Ana ao ver Nuno Folha perdido em pensamentos

- Então, eu venho de Línguas e Humanidades e sempre gostei muito de Português, de ler e estudar as obras E sempre gostei muito de ajudar os meus amigos com as dúvidas, então percebi que queria ser professor E depois de falar com o meu professor de Português, ele disse-me que tinha estudado aqui e que era uma excelente faculdade e que o programa do curso era muito bom

- Isso é incrível, também estou a contar que o curso seja bom Se bem que eu estou a pensar ir para a Associação de Estudantes Identificome bastante com os valores deles e quero ajudar a lutar por um ensino superior melhor Acho que não só crescerei como estudante, mas também como pessoa

- Quando estava a pesquisar a faculdade, vi que havia algumas manifestações, festas

- As festas é que devem ser de arromba – Rafael interrompe Nuno Folha – O ambiente da esplanada parece ser muito bom e os churrascos são sempre um grande sucesso

- O Rafa veio pelas festas No secundário, não parava de ver publicações sobre isso – diz Ana num tom provocatório

- Bem, parece que, no fundo, todos fizemos a mesma escolha, mas o que a motivou foi completamente diferente

Nuno Folha continua a conversar com os seus amigos Os três falam do seu percurso e tentam conhecer melhor a FCSH, acabando por descobrir, inclusive, uma cantina onde podem almoçar por 3€ (escolher comer ali ou não, já é toda uma outra história)

- Bom fim-de-semana, Nuno Esperamos ver-te segunda-feira e que não nos troques pela serra, ainda que o sinal de Wi-Fi seja tão mau quanto aqui – diz Rafael em tom de brincadeira

- Mesmo que quisesse, já escolhi a minha nova casa – responde Nuno Folha a rir-se

Nuno Folha afasta-se do parapeito da janela e após fechá-la diz: Acho que fiz uma boa escolha

PS: Se encontrarem o Nuno Folha algures na FCSH, digam-lhe olá Ele é muito simpático e será um grande amigo, seguramente

Victoria Leite @ivileg7

TomásAmadoeInêsFonseca

Bumble e a Faculdade

Tomás Amado

Não posso deixar de me perguntar – quando é que conhecer a nossa pessoa na faculdade deixou de ser como uma comédia romântica e começou a ser um episódio de um survival show onde temos de escolher quem tem menos red flags?

As linhas das relações borram-se entre elas e existem regras, mas não estão escritas e muito menos faladas Não importa o quanto te incomode, tens de estar habituada a viver numa grey area de “estamos ou não estamos?”, mas será que temos de nos contentar com isto?

Penso para mim mesmo várias vezes, será que todos os homens na faculdade são verdadeiramente tão emocionalmente indisponíveis como a presença de pessoas de esquerda em geografia? Tratam de detalhes importantes como se fossem apenas notas de rodapé e desmarcam-se de qualquer dever emocional aos quais se comprometeram no início

É como se todos estivéssemos a fazer uma audição para o papel de namoradx, mas o guião estivesse constantemente a ser reescrito e como se a honeymoon phase fosse não os primeiros meses de um relacionamento sério, mas as primeiras horas de conversa com alguém que vamos odiar ver na esplanada daqui a um mês

Ter uma dating life na faculdade é muito parecido a inscreveres-te numa cadeira de opção livre que achavas que ia ser fácil para depois descobrires que a assiduidade vale 30 ou 40% da mesma (é uma experiência pessoal mas não única) Todos nós já nos perdemos nas águas turvas de situationships, esperando algum tipo de compromisso de alguém que mal consegue planear um date

Estará na hora de deixarmos de nos darmos por satisfeitos com migalhas, ou será que temos de mudar o ponto de vista e perceber que o romance como o lemos nos romances do século XIX já não existe?

Volante

Inês Fonseca

ficou à espera que a espera se declarasse extinta que a tua aura ficasse descoberta presa sem a pressa que a validade finta

por meio da apneia do sono levantaste brônquios, abriste olhos ergueste corpo morto em vão de escadas aos molhos

entre a margem do fim e a que no início fica conduziste frutífera o jasmim por alguém que (de si) abdica

face às hipóteses do artista entraste para a tela sem esboço iluminaste as noites do fadista encheste salas ao almoço

OprimeiroarraialdaRealTuna AcadémicaNeOlisipo

RealTunaAcadémicaNeOlisipo/CulturaeSustentabilidade

No passado dia 21 de setembro, a Real Tuna Académica NeOlisipo inaugurou o ano académico ao organizar o seu primeiro arraial A festa teve lugar no campus de Campolide e contou com a presença de outras quatro tunas: a TUBA (Faculdade de BelasArtes), a Magna Tuna Apocaliscspiana (ISCSP), a Palatuna (Faculdade de Medicina Dentária) e a TUIMs (NOVA IMS)

Caloiros, Tunos e Bardamerdas (designações atribuídas internamente) uniram-se na organização daquele que viria a ser o primeiro “encontro de Tunas” com a NeOlisipo como anfitriã O evento contou com o apoio da direção da faculdade, da AEFCSH e ainda com o patrocínio da Adega de Borba

A TUBA estreou o palco, com os seus tutus cor-de-rosa, seguida pela TUIMs, a tuna que, tecnicamente, estava em casa, e nos fez sentir como se também estivéssemos A Magna Tuna Apocaliscspiana veio depois, com os seus sorrisos e energéticas coreografias e, por fim, antes da Tuna anfitriã, subiram ao palco os futuros dentistas da Palatuna Cada uma destas tunas animou o pátio de Campolide e colocou toda a gente nos seus pés, a dançar e a cantar, celebrando o privilégio de ser estudante, e tunante! Por fim, a nossa prezada Real Tuna Académica NeOlissipo subiu a palco, animando o público com o repertório que com tanto amor foi preparado O ato teve fim com uma “Madalena” interpretada por todos os tunantes e convidados presentes no palco e a festa continuou na tenda da IMS, na qual desfrutamos de um longo convívio animado, repleto de música, dança e claro, cerveja!

O anúncio deste evento surge numa fase positiva no que diz respeito ao processo de reintegração da nossa tuna no meio académico Desde 2018, o ano da refundação da Neolisipo como a conhecemos hoje, temos vindo a encontrar dificuldades em projetarmosnos entre as restantes tunas da cidade de Lisboa, por sermos, por um lado, “novos” nisto e, por outro, por uma falta de membros agravada pela época da pandemia Por essas razões, são muitos os alunos da faculdade que desconhecem da nossa existência, ou do nosso trabalho No entanto, temos tido uma notória evolução desde aí, pelo que este nosso Cáligo significa não só o nosso crescimento no mundo académico de Lisboa, como também a nossa capacidade de evoluir, de trabalhar em equipa e de trazer de volta aquilo que a Neolisipo era antes de ser refundada

A nossa atividade mantém-se essencialmente através dos ensaios, das atuações e da nossa participação na vida académica da FCSH - cada vez mais assídua. Para além disso, a presença da nossa NeOlissipo tem sido cada vez mais notada nas parcerias com outros núcleos da faculdade, com outras tunas, e também nas redes sociais, nas quais divulgamos continuamente as nossas atuações e iniciativas ao longo do semestre

É nesse sentido que a organização do nosso primeiro Cáligo marca o início de uma nova fase de atividade da nossa tuna Foi um privilégio e uma alegria partilhar momentos e música com outros tunantes! Fica assim a promessa de novos encontros e partilhas entre os amigos que fizemos e os que viremos a fazer!

O evento ‘Cultura e Sustentabilidade’ é coorganizado anualmente pelo Projecto DME no espaço Lisboa Incomum Contando com sete edições desde 2017, tem como objetivo fomentar uma discussão interdisciplinar (artística, científica, política) sobre os papéis que as práticas artísticas podem assumir para a consciencialização ambiental, intervindo na discussão sobre temas como a sustentabilidade e a ecologia. Esta discussão é feita entre o público e os convidados do evento através de diferentes tipos de atividades Sob o mote “Espécies em extinção”, a programação desta edição contempla três concertos, quatro conferências, um workshop, uma ‘sala de escuta’ e um mercado

Agenda cultural out/nov.

Cinema.Poesia.Outro

out

Cinema

AFaceintheCrowd(1957)2ªsessãodociclo"Os HomensdoPresidente"

Estúdio no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian, 17:00H.

3€ (10% desconto c/ cartão gulbenkian)

nov.01

EspetáculodeRapePoesia comSirScratch+Showcase -MariaCaetanoVilalobos Poesia

Templo da Poesia - Oeiras, 21:30H Gratuito

nov.05

30aténov

OutroTipodeEvento

Comunidades-Ciclosde arte

aténov

Cinema

30

FestadoCinemaFrancês

Vários Locais em Portugal- 10 munícipios com um plano de atividades diferente Vários preços, consultar site

30aténov

Cinema

Zona Franco nos Anjos, 20:30 H Apresentação/ criação cartão sócio à entrada “CinemaParaíso”,de GiuseppeTornatore

nov.28

É uma programação de cruzamento disciplinar e colaborativa, que conta com artistas de várias comunidades, em busca de um lugar de partilha de resistência, luta e existência PENHASCO, Vários Horários (programa completo em https://drivegooglecom/file/d/1sK7BEQv OOJlXJGPkSgI807N-SrxOK9Qe/view) Gratuito ou 6€ (dependendo da programação)

Cinema 24-out.

APrincesaMononoke (HayaoMiyazaki,1997)sessãopromovidapelo CineClubeCiências (@c.ao.cubo)

Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, 16:30 H Entrada livre.

Cinema 28-out.

CineFbaul

Várias Datas - Todos os meses. Faculdade Belas Artes da Universidade de Lisboa, vários horários Gratuito

LisbonInternational ConferenceonFeminist Epistemology Conferência 29 out.

28/10 das 9:00 às 18:30H na FCUL

29/10 das 9:00 às 18:30H no ISCTE Gratuito

10 nov.

OutroTipodeEvento

Fragmentsofthe Mediterranean

"Evoca uma série diversificada de futuros imaginados, entrelaçando as forças da mitologia, da metamorfose e da transformação para abordar questões críticas sobre a condição feminina na região do Mediterrâneo" Casa do Comum. Site sem indicação da preço

26-out.

30 nov.

OutroTipodeEvento

YogaeArte.Sessõesde yoganomuseu

MAAT, Lisboa

25€ (desconto com cartão MAAT)

Festivais.

17-out.

Culturgest, Cinema São Jorge, Cinemateca Portuguesa, Cinema Ideal e Casa do Comum

Bilhete normal avulso – 5,00€; Bilhete normal Cinemateca Portuguesa – 3,20€ Doclisboa2024 27 out. 17-out.

SèteLisboa-Festival InternacionaldeArte Contemporânea 03 nov.

O festival decorre de 15 -19 /10, mas as exposições permanecem até 3 /11. Convento dos Capuchos, Casa do Comum Centro Cultural do Bairro Alto, Jardins da Fundação Gulbenkian, Galeria Rui Freire, MAAT – Museu de Arte Arquitetura e Tecnologia, Galeria Ojo e Galeria Salto Consulta do preçário no local

31-nov.

OlhadesdoMediterrâneoWomen'sfilmfestival 07 nov.

Cinema São Jorge, na Cinemateca Portuguesa, na Casa do Comum e no Goethe Institut Vários Horários Estudantes 2,15€; estudantes de cinema 1,35€.

03-nov.

Parque da Liberdade, Bedeteca da Amadora, Galeria Municipal e Casa Roque Gameiro

Entrada paga, com desconto estudante. 35ªediçãodoAmadoraBD 27 out. 01-nov.

Barreiro Sala, horário e preço consultar o programa em @entreolharescinema Estudante 2,50€ EntreOlhares-Festivalde cinema 10 nov.

#precárias:festivalde performances 05 nov. 08-nov.

Leffest-LisboaFilmFestival nov.17 15-out.

Vários Cinemas em Lisboa Preços variados (6-8€)

Rua das Gaivotas 6 Vários Horários 10€ (diário) / 30€ (três dias).

Concertos.Exposições

Concerto

AfroJam

Todas as quartas-feiras

Fábrica Braço de Prata, 21:30H Gratuito 30aténov

nov.09

ConcertoLapso

Sala 6, Barreiro, 22:30H 4€

Concerto nov.14

nov.16

Concerto

ConcertoÉme

Sala 6, Barreiro, 22:30 4€

nov.17

RichardBona Concerto

CCB - Grande Auditório, 17:00H Gratuito

nov.27

Concerto 25-out.

SalvadorSobral-MistyFest

CCB - Grande Auditório, 21:00H 22,50€ - 38€

Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Gratuito atéout

AquestãoPalestina:O Essencial Exposição 30

"NãováoDiaboTecê-las!A tapeçariaemdiálogoa partirdacoleção Millenniumbcp Exposição

Torreão Nascente da Cordoaria Nacional - Até ao dia 12 de Janeiro, terça a domingo 10-13h e 14-18H Gratuito aténov

30

LisboaemRevolução13831974.6momentosque mudaramanossaHistória Exposição

Museu de Lisboa, Palácio Pimenta, Pavilhão Preto - até 5 de janeiro 1,50€ para jovens (13 - 25 anos) - bilhete inclui a exposição permanente e a temporária) aténov

30

ConcertoJessicaPratt+ LeonorArnaut,dentroda iniciativa/festivalVale

Perdido Concerto

Clube Bleza, 21:00 H 20€

VenezaemFesta.De CanalettoaGuardi Exposição 13 jan.

Fundação Calouste Gulbenkian - Edifício

Sede 8 - 10€ (-50% para menores de 30 e -15% para maiores de 65)

WilliamKlein–OMundo InteiroÉumPalco,curadoria deDavidCampany Exposição

Maat Central, todos os dias exceto terçaaté 3 de fevereiro

8€ jovens Entrada gratuita 1º domingo de cada mês (10h-13h) aténov

Divã+Maruja,Musicbox,7-10-24

A Noite demora o seu tempo e vai andando ao seu ritmo, sem dar conta da expectativa com que a costumamos enfrentar Dia 7 de outubro, senti isto quando os Maruja marcaram presença no Musicbox, sala de espetáculos no Cais do Sodré Com 2 EPs (Knockarea e Connla’s Well, disponíveis em todas as plataformas) e um projeto mais longo de improvisação (The Vault, disponível no Youtube) lançados, a banda com berço em Manchester parece ter chegado para ficar O som deles é difícil de catalogar e põe em relação estilos que vão do jazz ao noise-rock – há quem o classifique como um pós-qualquer-coisa

Nunca lá tinha estado e a sensação que tive ao entrar foi a de uma claustrofobia Eu era um corpo enclausurado no meio de outros tantos sob o mesmo teto As paredes laterais estreitavam o nosso campo de visão, o palco ocupava-o quase por inteiro Com isso, não veio propriamente desconforto, mas uma vontade de expansão, todos pareciam senti-lo ali, um desejo de libertação talvez O primeiro momento foi protagonizado pelos Divã - banda portuguesa de pós-punk sediada na Amadora Uma luz vermelha envolvianos e transformava os corpos da banda em puras sombras A voz do vocalista/saxofonista Gabriel Nery conduzia-nos ao longo de versos e refrões incisivos que iam como que ativando o movimento nas pessoas - os pés a trocar de posição e as cabeças cada vez mais leves e gravitantes Quem

“Entreguitarrasatmosféricaselinhasdesaxofone(JosephCarroll)queabrem osnossossentidos,asreflexõespolíticasdosartistasvãosendoacolhidaspor nós.Ostatusquoépostoadescobertonaquelemomento,grita-semuito,grita-se contraarededepoderintermináveldocapitalismotardio.”

correu já não tem pernas para andar Como posso aqui estar? Foi dos últimos versos que ouvimos antes da segunda parte, servindo quase como epígrafe do que estava para vir

Depois de um compasso de espera, importante para a criação de expectativa, Maruja entram em palco com a atitude de quem vai comandar a noite Começamos por ouvir The Invisible Man: ao mesmo tempo que se justapõem o baixo (Matthew Buonaccorsi) e a bateria (Jacob Hayes), há um sentimento de leveza que inunda o local Vai ecoando o verso The truth, it hides e o vocalista/guitarrista Harry Wilkinson assume convictamente o papel de narrador da noite Entre guitarras atmosféricas e linhas de saxofone (Joseph Carroll) que abrem os nossos sentidos, as reflexões políticas dos artistas vão sendo acolhidas por nós O status quo é posto a descoberto naquele momento, grita-se muito, grita-se contra a rede de poder interminável do capitalismo tardio The money speaks so loud / It's drowning out the voice of men (em Zeitgeist) Somos incentivados a gritar de volta, gera-se uma espécie de efeito reflexivo, eles olham-nos e nós olhamo-los de volta, com muita intenção

Inicia-se também o contacto corpo a corpo, abrem-se moshpits que trazem em si uma espécie de poder atrativo O intenso jogo de luzes da produção não deixou que ninguém se sentisse observado; ao seu próprio ritmo, todos começaram a lutar pelo seu espaço naquela sala A certo ponto da noite, Carroll desce do palco e dá ordens para que se crie um corredor no meio da plateia Chega o momento da Wall of Death, característica do metal pesado Corpos correm uns contra os outros, entramos todos no jogo e, entre saltos e empurrões, atinge-se quase uma espiritualidade conjunta Há algo de libertador em reivindicares o teu lugar numa sala, dando uso à tua força física A desordem do local é regulada pela mutualidade das forças que vêm de sentidos opostos; chega-se a um equilíbrio, a um ponto zero Perto do fim do concerto, e depois de um impressionante e caótico momento de improviso, vem ter connosco a instrumental e menos acelerada Resisting Resistance, ajudando os corpos já cansados a transitar de um estado de explosividade para um de serenidade O espectro de emoções que experienciei na noite de dia 7 fez-me voltar a um artigo escrito pelo jorna-

lista Miguel Rocha com o título A noite é uma arma (publicado na revista digital playback) Quando o li, tive a sensação de que estava a descobrir uma nova forma de agência: afinal há um caminho de dentro para fora disto tudo O que permaneceu mais comigo foi a ideia de que as salas escuras em que escolhemos estar, na expectativa de experienciar algo, não só autorizam, como exponenciam o sentimento de coletividade De um momento para o outro, somos uma força gregária exposta a um mesmo conjunto de sensações, que se vai desmultiplicando em cada um dos nossos corpos São surtos de energia com capacidade para abanar o nosso sistema de crenças, para reconfigurar a nossa consciência política Como se evidencia nesse artigo, é urgente recuperar e pensar essa humanidade da cultura noturna. Um dos caminhos possíveis apontados é olharmos atentamente para a forma como ela se organiza e manifesta fora das grandes cidades - do capitalismo selvagem que a quer canibalizar - e deslocarmo-nos nessa direção

Artigocitado: A noite é uma arma (2024) Playback (https://wwwplaybackpt/reportagens/a-noite-e-umaarma/)

Destinosimprováveis, escolhasacertadas

Viajar é escolher É escolher soltar as amarras e partir rumo ao desconhecido, adentrando numa narrativa inesperada É construir o próprio novelo do tempo e espreitar sobre uma janela que não sabíamos existir A coragem clareia o discernimento, sabendo que depois de saltar não se poderá regressar ao ponto inicial, transformando tudo aquilo que compõe a nossa existência Opta-se por colocar um pé seguido do outro, embarcando em algo que é muito mais do que uma jornada, pois na viagem é que se cria o destino A arte de viver coloca-se em prática, e, por vezes, caminhos improváveis tornamse meio da procura pela nossa identidade e compreensão Locais menos mainstream podem valer tanto a pena quanto aqueles de maior renome, é apenas necessário optar por algo diferente e arriscar abrir a tal outra janela Assim, aqui partilho três destinos inusitados que não me arrependo de ter escolhido

1. Maurícias

À sombra da fama das ilhas Seychelles e Maldivas esconde-se uma verdadeira gema do Oceano Índico: as Maurícias Perto de Madagáscar, o conjunto de ilhas oferece cenários idílicos propícios ao snorkeling e mergulho, bem como água clara e praias de areia branca As Maurícias são um dos meus destinos preferidos pela sua diversidade de atrações e pela atmosfera pacífica Na Ilha Maurícia (a principal) convivem diferentes religiões em harmonia, sendo possível encontrar uma mesquita ao lado de um templo hindu e de uma igreja cristã A natureza reina neste local: a força das cascatas rasga o ruído da floresta (Black River Gorges), a terra tem literalmente sete cores (Chamarel), os nenúfares e as tartarugas centenárias são gigantes (Pamplemousses), o rio castanho funde-se com o mar azulado (Rivière du Cap), as salinas contrastam com o verde da cana-de-açúcar (Tamarin), sobrevoa-se uma “cascata subaquática” (Le Morne) e almoçase cercado por veados numa plantação de chá (Bois Cheri) Uma das mais importantes celebrações hindu fora da Índia ocorre no lago sagrado Grand Bassin, que contém água do Ganges

2. Caminito del Rey e Setenil de las Bodegas, Espanha

Entre Sevilha e Málaga surge aquele que já foi considerado um dos percursos mais perigosos do mundo O Caminito del Rey conta hoje com uma extensão de 8 quilómetros, cruzando o Desfiladero de los Gaitanes As vistas indescritíveis sobre o vale desenrolam-se à medida que percorremos o trilho suspenso a mais de 100 metros de altura A natureza, o rio Guadalhorce e a vida selvagem são também uma constante e o desafio é não se deixar arrepiar pela imensidão da garganta

3.

Para complementar a visita ao Caminito del Rey, recomendo uma passagem por Setenil de las Bodegas, uma localidade pertencente aos “pueblos blancos” A sua originalidade arquitetónica torna-a peculiar, na medida em que as casas se encontram edificadas sob a própria rocha, colocando o branco em oposição ao ocre Setenil proporciona a experiência autêntica da Andaluzia, na qual é possível respirar a essência de uma terra de sabores, história, comunidade e natureza

Dica: A cidade romântica de Ronda, construída no topo de um desfiladeiro, e Zahara de La Sierra também valem totalmente a paragem

Ainda que menos popular que a Tailândia, a Malásia possui um arquipélago digno de nota: Langkawi As deslumbrantes cascatas e praias cercadas por rochedos verdejantes (como Tanjung Rhu e Cenang) são um deleite visual, contrastando com as agitadas Kuala Lumpur e George Town no continente Apesar das praias serem o ex-libris de Langkawi, existem outras atividades interessantes como jantar num mercado noturno (que variam de localização consoante o dia da semana), conhecendo a gastronomia e cultura local O teleférico com maior declive do mundo sobrevoa a densa floresta tropical na zona este da ilha, atingindo a Sky Bridge A vista apresenta matizes de verde e azul, enquanto inúmeros macacos andam tranquilamente entre os miradouros e tentam a sua sorte na ladroagem de objetos dos turistas Um passeio de barco por Pulau Dayang Bunting transporta-nos para o interior de uma pintura, inexplicavelmente fluída e melódica

Langkawi, Malásia
Maurícias (fotografias de totraveltheworld com e youtouroperater pt)
Caminito del Rey (acima) e Setenil de las Bodegas (abaixo) (fotografias de spain info e theorangebackpack nl)
Langkawi, Malásia (fotografias de Portal Met@lica e atickettotakeoff com)

10Livrosparaler noHalloween

1 - Drácula

de Bram Stoker (1897)

Um clássico gótico que popularizou o mito dos vampiros Narrado através de cartas, entradas de diários e artigos de jornal, a história acompanha a luta do jovem Jonathan Harker contra o temível Conde Drácula, num ambiente sombrioerepletodemistério #terror#vampiros#mistério#clássico

3 - Frankenstein

Considerado o primeiro romance de ficção científica, este clássico aborda a ambição de Victor Frankenstein, um cientista obcecado em dar vida a um corpo morto No entanto, a sua criação traz consequências devastadoras Um livro que levanta questões profundas sobre mortalidadeeresponsabilidadecientífica #ciência#morto-vivo#mortalidade#clássico de Mary Shelley (1818)

5 - 101 Lugares para Ter Medo em Portugal

de Vanessa Fidalgo (2013)

Este livro leva-te numa viagem pelos mitos e lendas de lugares assombrados em Portugal A autora explora relatos verídicos e histórias locais que vão arrepiar até os mais corajosos Ideal para quemquerdescobriroladoobscurodopaís #relatos#mitos#Portugal

7 - Masters of Death

Este romance mistura vampiros, fantasmas e outros seres paranormais num universo dark academia, com toques de humor e representatividade queer Uma leitura moderna e envolvente que explora a mortalidade e o sobrenaturaldeformaoriginal #vampiros#paranormal#queer#dark-academia de Olivie Blake (2018)

9

- Porém Bruxa

de Carol Chiovato (2020)

Esta história segue a vida de Cecília, uma jovem bruxa brasileira, enquanto explora os seus poderes e enfrenta dilemas amorosos e mágicos Um romance envolvente que mistura elementosmísticoscomaculturabrasileira

#bruxas#magia#romance#Brasil

2 - Fui Morar com um Vampiro de Jenna Levine (2023)

Uma comédia romântica com um toque sobrenatural Cassie descobre que seu novo colega de casa é um vampiro centenário que se ajusta ao mundo moderno com muito humor Uma leitura leve e divertida, ideal para quem prefereumHalloweenmenosassustador #romance#comédia#vampiros#leitura-ligeira

4 - Entrevista com o Vampiro

Louis de Pointe du Lac narra a sua vida imortal como vampiro, explorando temas de imortalidade, solidão e decadência Um livro intenso e cativante que mudou a maneira como os vampiros são retratados na literatura moderna #vampiros#histórico de Anne Rice (1976)

6 - Coraline

Coraline explora a sua nova casa e descobre uma porta secreta para um mundo paralelo que é uma versão distorcida e assustadora do seu próprio lar Embora pareça perfeito no início, esse mundo esconde segredos tenebrosos Um conto sombrio que se torna ainda mais inquietante que a adaptaçãoparaanimação #mistério#paranormal#terror-infantil de Neil Gaiman (2002)

8 - Alice

Uma releitura sombria e macabra do clássico "Alice no País das Maravilhas" Nesta versão, Alice enfrenta uma realidade retorcida e cheia de perigos, numa narrativa cheia de suspense e magia negra Perfeito para quem gosta de thrillers com um toque de fantasiasombria #recontagem#magia#thriller de Christina Henry (2015)

10 - A Hora do Lobisomem

de Stephen King (1983)

Uma história clássica de horror que narra os eventos sombrios numa pequena cidade aterrorizada por uma criatura monstruosa durante as noites de lua cheia Com ilustrações intensas e uma narrativa cheia de suspense, este livro é um pratocheioparaosfãsdohorrorexplícito #lobisomens#horror-explícito#StephenKing

filmesesériespara

veresnestehalloween

Hocus Pocus (1993)

Três bruxas loucas são involuntariamente conjuradas por uns miúdos em “modo Halloween” e estão de volta diretamente de Salem do século XVII Numa noite hilariante, as tricentenárias bruxas preparam-se para lançar um feitiço sobre a cidade e reclamar a sua juventude de volta Mas primeiro vão ter de se coordenar e de vencer pela astúcia três miúdos e um gato falante

Realizador: Kenny Ortega

The Nightmare Before Christmas (1993)

Aborrecido com a rotina de gritar e assustar, o Rei das Abóboras Jack Skellington deseja espalhar a alegria do Natal Mas a sua missão feliz deixa o Pai Natal em Perigo e cria um pesadelo para todos os meninos e meninas

Realizador: Henry Selick

Sweeney Todd: The Demon Barber of Fleet Street (2007)

O filme conta a história de um barbeiro que regressa a Londres, após ter estado preso durante 15 anos injustamente Sweeney Todd procura vingar-se do juiz que o condenou, bem como das consequências que se abateram sobre a sua família

Realizador: Tim Burton

Enquanto explora sua nova casa à noite, a pequena Coraline descobre uma porta secreta que contém um mundo parecido com o dela, porém melhor em muitas maneiras Todos têm botões no lugar dos olhos, os pais são carinhosos e os sonhos de Coraline tornam-se realidade por lá Encantada por essa descoberta, Coraline rapidamente percebe que existem segredos estranhos: uma outra mãe e o resto de sua família tentam mantê-la nesse mundo paralelo

It (2017)

Realizador: Henry Selick Coraline (2009)

Um grupo de crianças une-se para investigar o misterioso desaparecimento de vários jovens na sua cidade Estes acabam por descobrir que o culpado é Pennywise, um palhaço cruel que se alimenta de seus medos e cuja violência teve origem há vários séculos

Realizador: Andy Muschietti

Inteligente, sarcástica e um pouco morta por dentro, Wednesday Addams investiga uma vaga de homicídios e faz novos amigos, e inimigos, na Academia Nevermore

Realizador: Tim Burton Wednesday (2022)

S A L I V A E S C O R R E N D O

MarFerreira

A minha irmã é uma mulher que não se deixa calar

Ela sempre fez questão de mostrar o descontentamento quando os cavalheiros teimavam em falar com ela durante os bailes Coçava desavergonhadamente o escalpe debaixo da cabeleira empoeirada e pesada Ria-se alto das piadas que sussurrávamos uma à outra durante a missa

Neste momento, ela desliza pelo chão de mármore do salão com a cabeça altiva, como se a sua coluna de uma vara se tratasse O seu sorriso tímido pinta a cara pálida, completamente oculta pelo pó de arroz

Mas esta mulher não é minha irmã

A minha irmã não pestaneja os olhos adoravelmente enquanto ouve as palavras dos jovens solteiros que a abordam A minha irmã não acena submissivamente a cabeça perante os seus intermináveis monólogos ou espera em silêncio enquanto discutem política local

A minha irmã não tomaria o braço de um conde qualquer e me deixaria para trás sem aviso Daí não pensar duas vezes antes de me esconder por detrás de arbustos enquanto os dois conversavam

- Fico imensamente agradecido pela sua amistável disponibilidade, Menina Mendonça - o rapaz, evidentemente suado, mostrou o sorriso amarelado

- Certamente

- Sabe, não é que seja de intrigas, mas o que se ouve é que como direi? Que a Menina Mendonça tem um carácter desobediente - ele nem esperou para que um contra-argumento se fizesse ouvirMas deixe-me dizer-lhe que a sua companhia esta noite tem sido sublime

- Certamente

- Ouvi até uma conversa na Ópera, há uns dias Um casal mencionou como as filhas da Madame Mendonça estariam destinadas a envergonhá-la Senti um profundo desgosto, visto que ambas são jovens bem-parecidas Mas fico feliz por descobrir que uma moça tão bela como a Menina irá dar uma ainda mais bela esposa

- Certamente - o rapaz tirou do bolso um pequeno cachimbo

- Peço que me perdoe, mas preciso de espairecer Não demoro nada Não sendo alvo de qualquer protesto, o conde pôsse a caminho até ao ponto do jardim onde pretendia fumar Foi a minha deixa para me fazer presente

- Deve achar que alguém quer saber do que ele pensa - refilei por entre asneiras enquanto mirava a nuca já calva do homem - Não achas, Irmã? Passados segundos sem resposta, virei a atenção para ela Era notável que a sua visão não estava ocada Os músculos das bochechas haveriam relaxado, resultando numa cara sem quaisquer sinais de expressão A boca estava entreaberta, saliva escorrendo pelo queixo

- Certamente

***

A Mamã tem visitado o nosso armário de arrumos duas vezes ao dia Sempre com uma chave na mão,

olha sobre o ombro antes de escapulir um pão e um copo de água por entre a pesada porta Tomei conhecimento destes dez minutos diários há pouco mais de uma semana só Deus sabe há quanto as carcaças secas são transportadas sorrateiramente até ao piso de cima

Várias vezes tentei, em pézinhos de lã, encostar a orelha para ver do que se tratava O maldito carvalho abafara toda a informação que me pudesse satisfazer

Mas esta noite todo o mistério acabará Pela hora do jantar mandei a criada embora mal a Mamã se retirou para uma refeição na casa da Madame Paiva Revirei tudo cada canto, cada bibelô caro e até cada sombra provocada pelo pôr-do-sol para encontrar aquela peça de metal maldita

Tenho-a agora nas mãos enquanto a coloco na velha ranhura, já larga e acessível devido ao uso recente Por mais surpreendente que seja, não me treme por entre os dedos Nada mais que alívio se apodera do meu corpo quando a escuridão do pequeno quarto me deixa presenciá-la Passo o meu corpo esguio por entre a frecha e cerro a porta atrás de mim sem qualquer ruído

Aproximo-me dos suspiros abafados, algo que, acompanhado pelo ranger das tábuas de chão velhas, me faz os pelos do corpo eretos

Os meus olhos lentamente começam a habituar-se à falta de luz Apenas o luar que entra pela minúscula janela no topo da parede serve de iluminação Ao fim de três passos, consigo distinguir um vulto Na ideia de ser um grande baú ou uma pilha de roupa, não hesito em aproximar-me

Até reparar que esta forma escura se mexe

- Quem está aí? - a pergunta força-se para além dos meus lábios

Em resposta apenas recebo um gemido extremamente baixo, como se estivesse à beira de um pequeno animal De seguida, faz-se ouvir uma espécie de grunhidos, claramente sofridos

A luz passa pelo vidro num ângulo novo, finalmente focando-se no corpo, dobrado sobre si - Por Deus, está bem? - Sofia?

A mão que havia estendido em gesto de auxílio congela no sítio A voz mal se faz ouvir o esforço feito pelas cordas vocais traem a sonoridade e as sílabas mal se distinguem Mas conheceria esta voz em qualquer lado

- Irmã?

Lanço-me a ela sem medir a força Os meus dedos rapidamente encontram a sua face, que está gélida e seca As pálpebras semicerradas revelam-se inchadas pelo choro

O mais difícil de encarar é a mordaça que se encaixa por entre os seus dentes O pano velho e húmido está atado num nó apertado saliva escorrendo pelo queixo

- Quem te fez isto, Irmã? Quem?

Num estrondo inesperado, a porta do quarto abrese

Mesmo
Fotografias:
1, 3, 8, 10, 11, 13 - Sofia Diniz; 2, 5, 18 - Natali Gonçalves; 4, 6, 7, 9, 12, 15 - Margarida Calado.
Melhores óculos do churrasco

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3. Estou no Mercadona às 18h. No carrinho tenho um....

5. Pessoa que mais serviu nos Globos de Ouro da SIC.

6 O grande inimigo da AEFCSH (plural)

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