[HELOISA MARINGONI] Monografia

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processo e linguagem. Heloisa Martins Maringoni

Analisar os conceitos estruturais da linguagem envolvidos no discurso arquitetônico, sua compreensão e intenção; a sintaxe do pensamento em função dos meios de linguagem é o objeto|tema desta pesquisa. Tecer um panorama dos conceitos de linguagem no desenvolvimento dos projetos arquitetônicos nos últimos 30 anos, sob a ótica das plataformas onde foram desenvolvidos. Para esta analise foram feitas pesquisas junto a escritórios de arquitetura sob a ótica geracional, abrangendo escritórios com formação desde os anos 80 até 2010, com foco na análise do conceito e intenção estrutural nas propostas arquitetônicas desde sua fase de concepção, passando pela plataforma em que se desenvolvem estes projetos, até a análise dos textos editoriais em publicações específicas. Por mais fascinante que seja, a ponte é o meio, não o desejo. Discutir a linguagem do projeto, é como discutir a ponte. O objetivo é chegar ao outro lado, e não a ponte em si; mas concretizar este desejo envolve a análise do rio, o ponto onde ele deva ser transposto, os materiais disponíveis, as técnicas conhecidas, a previsão dos problemas executivos, suas soluções, o planejamento, o tempo limite para chegar ao outro lado,o tempo necessário à construção enfim, da ponte. Ela é a jornada. Quando afirma “Me fascina mais o processo que a ideia”, Paulo Pederneiras, responsável pelas cenografias do grupo Corpo, fala do tempo e do crescimento entre a ideia-esboço, e o espetáculo no momento da estreia, onde o espaço, a luz, a música e os dançarinos se tornam o balé. A ideia foi a centelha, mas ao desenvolver o projeto do cenário, as possibilidades daquele espaço, a iluminação, atender ao gesto da dança, a consonância com a música, a ideia inicial sofre uma metamorfoseque não a enfraquece ou mutila,ao contrário, lhe dá corpo e significado.


Quando busca um especialista em estruturas, José Resende, artista plástico,está buscando resolver problemas de concretização de sua obra. Há nesta busca o compromisso de realização de uma ideia, mas não seu engessamento na concepção original a ponto de comprometer sua realização.


Ao desenhar riscos metálicos no ar, Fernando Vilela, o fez muitas vezes no papel antes de trazê-lo à tridimensionalidade física, ajustando-o ao trabalho na oficina, ao transporte, à montagem para que ele volte a poética do desenho no ar.


A linguagem arquitetônica vem mudando ao longo do tempo, atrelada a filosofia, a arte, a tecnologia, ao desenvolvimento e desejo humano. A arquitetura é fruto do pensararquitetônico, não basta o talento e vocação, aprender está no processo. Não há, nem haverá nunca o outro lado do rio para a arquitetura, mas há o outro lado da ponte para cada projeto arquitetônico. Não há como ensinar arquitetura, só como construir pontes. Arquitetos e artistas, cujas obras atinjam as dimensões espaciais de uma construção, foram base em traçar um panorama da linguagem adotada para seus projetos, frente as possibilidades do meio onde elas se desenvolveram nos últimos 30 anos. A escolha deste período se deve ao uso de computadores e programas de desenho e maquetes eletrônicas que se deu a partir dos anos 80, com a entrada no Brasil dos computadores pessoais,com programas de desenho para engenharia e arquitetura, desenhos em 2D plantas e cortes. Na década seguinte os desenhos com renderização, maquetes eletrônicas e tour virtual. Em 2004 oinício dos programas bin no brasil e em 2006 a popularização dosketchupcomo ferramenta de modelagem arquitetônica.Também em 2006, o Google Earth traz a possibilidade de entendimento da escalas e inserção dos projetos em sítios reais. A prancheta virtual, criou possibilidades, e facilidades que revolucionaram a forma de pensar o objeto. É possível sua visualização, percepção de texturas, luz e espaços muito antes de sua concretude; ouseja, de sua execução, algumas vezes da própria possibilidade de execução, quando a construção virtual, por prescindir da gravidade, anula uma das maiores preocupações da arquitetura: ainda que ilusoriamente, vencê-la.

Geração 1980 1- As idéias iniciais são desenvolvidas através de croquis no papel manteiga. 2- Na fase de concepção, o uso das plantas e perspectivas é simultâneo 3- A ênfase das plantas no desenvolver do projeto se deve ao fato de que ocupamos o plano. 4- A noção de tridimensionalidade é transmitida através do código de linguagem do desenho. A visão tridimensional do objeto é mental. 5- A linguagem do desenho técnico é adaptada ao CAD. 6- O desenho do projeto não é executado por quem o concebe. 7- Os desenhos ganham em precisão e na possibilidade de ajustes no desenvolver do projeto. 8- A facilidade das ferramentas gráficas leva ao desuso, conceitos construtivos de geometria. 9- As informações ora são excessivas, ora ignoradas, referencias de locação, raios de curvatura, são muitas vezes referenciados a pontos inacessíveis devido a transposição do plano infinitoda plataforma virtual para o sitio da obra. 10- A maquete física é bastante utilizada em vários momentos, com finalidades distintas, desde a volumetria, insolação, como modelo de estudo até a aparência final. 11- Há preocupação com a exequibilidade da obra, meios construtivos e materiais. 12- A busca de suporte de consultoressobre assuntos específicos é frequente.



Geração 1990 1- As ideias iniciais são desenvolvidas através de croquis no papel manteiga. 2- Plantas e cortes são realizados nos programas gráficos. 3- São poucos os arquitetos que dão continuidade ao desenvolvimento dos seus projetos na plataforma virtual, ela ainda é vista como apresentação do projeto e na maioria das vezes executada por colaboradores. 4- Há um movimento em direção a padronização dos desenhos no que se refere a cotas e peso das linhas na plotagem. 5- O uso de hachuras é objetivo como indicação de diferenciação de materiais, uso ou níveis. 6- A noção de tridimensionalidade é transmitida através de maquetes eletrônicas. 7- Estudos de insolação se baseiam em programas aplicados às maquetes virtuais. 8- Há preocupação com a exequibilidade da obra, meios construtivos e materiais 9- A busca de suporte de consultores sobre assuntos específicos é frequente.



Geração 2000 1- o objeto é pensado espacialmente e não através de plantas e cortes, é possível visualizá-lo por todos os ângulos, 2- oskethup é utilizado primeiramente como croquis, e muitas vezes nele desenvolvido até a fase final na apresentação de materiais construtivos, acabamentos, texturas e paisagismo. 3- os desenhos técnicos são desenvolvidos no sistema BIN e complementado por desenhos 2D no que se refere a detalhes. 4- o objeto pode ser estudado em seu volume e proporção facilitando a análise da aparência, escala e composição. 5- A modelagem virtual permite maior liberdade de experimentação. 6- Plantas e cortes são obtidos, sempre que necessários, do modelo tridimensional. 7- O uso de hachuras é intenso, buscando mais a estética do desenho que a informação. 8- Há situações em que o projeto arquitetônico se completa sem a preocupação com sua execução:Frank Owen Gehry (Guggenheim Bilbao, 1997, e Walt Disney Concert Hall, 2003) e ZahaHadid (tais como ContemporaryArts Center, 2003, em Cincinatti e MAXXI Museo, 2010, em Roma), esta fase é vista como um problema de engenharia. Outras em que o projeto nasce de uma simbiose total da arquitetura com a engenharia (Calatrava) ou tecnologia construtiva (Renzo Piano, Estadio de Bari, 1990, na Itália, e Richard Rogers, Aeroporto de Barajas, 2006, Espanha). Herzog e de Meuron adotam modelos de exploração e geração de forma, caracterizado como um processo contínuo com auxílio do computador e sem final determinado, como no projeto para o Pavilhão JinhuaStructure II – Vertical Basilea (ver AV Proyectos 007 2005, p. 40). 9- A busca de suporte de consultoressobre assuntos específicos é frequente.



Em todas estas “gerações” profissionais, alguns itens são comuns como estruturalizadores do processo: • • • • •

Fazer como forma de pensar Aceitação do erro como parte do processo de fazer Recorrência como fator de aprimoramento Transformação Não existe projeto ideal, o projeto está ligado ao momento, a possibilidade e ao local

O movimento no sentido de utilização dos meios virtuais como linguagem é galopante e irreversível, este é o meio natural para os estudantes. A naturalidade com que operam esta plataforma e se expressam através dela, faz com que se sintam extremamente confortáveis em utilizá-la para desenvolver seus projetos. Só não podemos confundir a ferramenta com o processo. Ignorar conceitos de geometria por que a ferramenta lhe dá uma resposta geometricamente precisa. Ignorar conceitos de perspectiva porque o 3D permite uma visualização no espaço. Ignorar a gravidade porque uma maquete eletrônica pode ser construída a partir da cobertura. A linguagem deve ser vista como meio para expressão de ideias e desenvolvimento do processo, jamais como uma mecanização. Ela não é nada sem percepção e criação. Não basta conhecer ortografia e sintaxe para ser poeta. A facilidade de manipulação dos meios virtuais para construção do discurso arquitetônico, quase intuitivos para as novas gerações de arquitetos, deve ser aceita como natural, o que deve ser questionado é o esvaziamento do conteúdo deste discurso. “Na realidade não existe conhecimento intuitivo independente das demais espécies de conhecimento. A intuição não funciona sem o auxílio dos sentidos e da razão, sem os conhecimentos sensíveis e racionais” (Bazarian) O conforto da construção tridimensional do objeto, da obtenção de dados, da montagem das bases interdisciplinares, da apropriação de referências em um banco de imagens, da precisão das construções, da qualidade da apresentação gráfica, não deve ofuscar o desenvolvimento do processo.

“Nosso tempo busca muito. Mas encontrou, antes de tudo, uma coisa: o conforto. Este avança, em toda sua amplitude, inclusive pelo mundo das ideias, nos tornando tão acomodados como jamais poderíamos supor. [...] O conforto, porem, ou rejeita a culpa ou a eleva à virtude. Para aquele que enxerga mais além, isso significa o reconhecimento da culpa como culpa. O pensador que, no entanto, busca, realiza o oposto. Mostra que existem problemas, e que estes não estão resolvidos. ” (Shoenberg)


Bibliografia: BISELLI, Mario .Teoria e prática do partido arquitetônico – <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/12.134/3974>.

AMARAL, Cláudio Silveira. Descartes e a caixa preta no ensino-aprendizagem da arquitetura. Arquitextos, São Paulo, n. 08.090, Vitruvius, nov. 2007 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.090/194>.

BRAWNE, M. Architecturalthoughtandthe design process: continuity, innovation, andtheexpectanteye. New York: Architectural Press, 2003


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