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REVISTA DA ALERJ Ano II - Número 05 - Dezembro de 2008

Água de beber Setor de águas minerais no estado resiste à concorrência, emprega mais de dez mil pessoas e gera cerca de R$ 50 milhões anuais de ICMS



nes te n úm ero

REVISTA DA ALERJ Ano II - Número 05 - Dezembro de 2008

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MEMÓRIA

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ENTREVISTA

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TRADIÇÃO

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PUBLICIDADE

Água de beber

Os 60 jogos que fizeram a glória do Maracanã

Setor de águas minerais no estado resiste à concorrência, emprega mais de dez mil pessoas e gera cerca de R$ 50 milhões anuais de ICMS

Água de beber Só o fato de o nosso planeta ser composto de dois terços de água justificaria a importância do mineral na vida da população mundial. Mas, ao contrário dessa constatação, no Rio, a água ainda não goza de um merecido status, pois o estado, que possui mais de 50 indústrias envasadoras e despejou 325 milhões de litros no mercado em 2007, esbarra em empecilhos quando o assunto é taxação e fiscalização. Se for levada em consideração a produção de São Paulo e Minas Gerais, onde o ICMS é menor, o Rio estaciona no terceiro lugar nacional – um disparate, de acordo com os empresários do setor, já que os mais de 15 milhões de fluminenses e o turismo constante teriam tudo para deflagar um consumo maior da água aqui produzida.

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Carlos Lyra derruba mitos da história da Bossa Nova

A celebração do nascimento de Cristo nas folias de reis

Anúncios irreverentes das comissões da Alerj recebem 14 prêmios

DEVOÇÃO / SÃO JUDAS TADEU OPINIÃO / MARIA LUCIA TEIXEIRA WERNECK VIANNA PANORAMA

Páginas 14 a 21 REVISTA DA ALERJ

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de abordar assuntos de interesse “deAlém todo o estado, como cultura, história e

economia, o foco no ser humano torna suas matérias ainda mais ricas e interessantes

Léa Tiriba Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro Presidente Jorge Picciani

Foco no ser humano

1ª Vice-presidente Coronel Jairo 2º Vice-presidente Gilberto Palmares 3º Vice-presidente Pedro Fernandes 4º Vice-presidente Gerson Bergher 1ª Secretária Graça Matos 2º Secretário Zito 3º Secretário Dica 4ª Secretário Fabio Silva 1a Suplente

Meus parabéns à Alerj por esta bela publicação. Além de ter uma bela apresentação gráfica e abordar assuntos de interesse de todo o estado, como cultura, história e economia, o foco no ser humano torna suas matérias ainda mais ricas e interessantes. A REVISTA DA ALERJ mostrou que veio para ficar, sendo, assim, mais um instrumento de conexão entre o Poder Legislativo e a população de todo o território fluminense. Léa Tiriba Professora do Departamento de Educação da PUC-Rio

Acesso à população

2 o Suplente Armando José 3º Suplente Pedro Augusto 4º Suplente Edino Fonseca

REVISTA da Alerj Ano II - Nº 5 dezembro de 2008 Publicação trimestral da Diretoria Geral de Comunicação Social da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro

Jornalista responsável Fernanda Pedrosa (MT-13511) Coordenação: Pedro Motta Lima e Everton Silvalima Reportagem: Fernanda Porto, Luciana Ferreira e Marcela Maciel Fotografia: Rafael Wallace Diagramação: Daniel Tiriba Telefones: (21) 2588-1383/1627 Fax: (21) 2588-1404 Rua Primeiro de Março s/nº sala 406 CEP-20010-090 – Rio de Janeiro/RJ Email: dcs@alerj.rj.gov.br www.alerj.rj.gov.br Impressão: WalPrint Tiragem: 3 mil exemplares

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CARTAS

REVISTA DA ALERJ

Sempre que entro no site da Alerj leio o JORNAL DA ALERJ. Agora tenho também o prazer de ler a REVISTA DA ALERJ. Sugiro que ambos sejam distribuídos para escolas e bibliotecas do Rio, para que cada vez mais pessoas tenham oportunidade de lê-los. Dessa forma, o Parlamento garantirá que muito mais gente tenha acesso às importantes matérias estampadas nas páginas de suas publicações. Hudson Mendonça Rio de Janeiro


Ed it o rial

Jorge Picciani

Para espantar o pessimismo

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iariamente estamos sendo bombardeados com notícias ruins sobre a economia mundial. O pessimismo parece que tomou conta daqueles que fazem as notícias circularem. Apesar de tudo, as expectativas de crescimento do Estado do Rio de Janeiro são boas. Isto só é possível por conta dos investimentos em infraestrutura que, com a parceria do Governo federal, finalmente estão saindo do papel. Eles serão responsáveis por tornar nosso estado mais competitivo e atrativo. Sabemos que em momentos de crise é preciso ter cautela. Cabe, portanto, aos governantes, aos especialistas e à sociedade civil organizada olhar para a economia real e analisar de que forma é possível avançar neste novo quadro, ainda indefinido. Num cenário de retração como o atual, vale usar de todos os mecanismos para gerar emprego, renda e desenvolvimento, e não sucumbir ao pessimismo geral. Esta postura diante das adversidades é bem conhecida de um setor produtivo do nosso estado: o das águas minerais, assunto de capa desta quinta edição da REVISTA DA ALERJ. Com mais de 50

indústrias envasadoras e 325 milhões de litros despejados no mercado em 2007, o estado é o terceiro produtor de água mineral do Brasil, mas ainda está bem atrás do primeiro colocado, São Paulo. A resistência das engarrafadoras do Rio de Janeiro frente ao poderio das marcas de fora e à invasão do mercado pelas águas mineralizadas artificialmente é um exemplo de otimismo. Com o mesmo otimismo, o Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Estado do Rio de Janeiro Jornalista Roberto Marinho, criado em 2003 por meio de uma resolução de minha autoria, tem ajudado no processo de análise da economia fluminense e permitido, por meio de reuniões e debates, o contato dos parlamentares com questões como esta. Formado pela Alerj e por mais 25 entidades da sociedade civil e universidades, o Fórum, a partir deste número, passa a ocupar duas páginas da revista. Nesta edição também estão dois temas que merecem a devoção do brasileiro: o futebol, que tem no Maracanã seu templo mais emblemático, e a religiosidade, que se revela na festa de São Judas Tadeu, padroeiro das causas impossíveis, e na folia de reis, tradição que resiste de norte a sul do nosso estado.

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Viagem através do futebol

Livro conta a história dos principais jogos realizados no Maracanã

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MEMÓRI A aul, Carlos Alberto Torres, Leandro, Nilton Santos e Júnior; Gérson, Zico, Rivelino e Tostão; Garrincha e Pelé. Se fosse possível escalar uma Seleção Brasileira de todos os tempos do "Maior do Mundo", esta seria a escolha dos jornalistas Roberto Assaf e Roger Garcia, autores do livro Grandes jogos do Maracanã. "A quantidade de craques que atuou no estádio possibilitaria a escalação de umas dez seleções", afirma Assaf. Já na capa, uma promessa: uma viagem através de fatos e fotos que fizeram história no futebol. Expectativa superada. A história das 60 partidas é toda contextualizada, sendo possível reviver (ou, para os mais novos, conhecer) o que acontecia no Brasil e no Mundo. Uma verdadeira seleção de craques, técnicos, árbitros, jornalistas e escritores dá o ponto de vista de pessoas direta ou indiretamente ligadas aos jogos. Entre jornalistas e escritores, Luiz Fernando Veríssimo, Sérgio Cabral, Armando Nogueira, Renato Maurício Prado, Juca Kfouri, Galvão Bueno e Pedro Bial. Na galeria de craques e técnicos que deixaram seus depoimentos estão Pelé, Zico, Romário, Edmundo, Júnior, Zagallo, Carlos 6

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Daniel de Azevedo Jornal dos Sports

Acompanhado de Jairzinho, Tostão passa por dois paraguaios, que armaram uma retranca difícil de ser superada pelo Brasil Alberto Torres, Tostão, Rivelino e Roberto Dinamite. Como se já não fosse difícil selecionar 60, entre tantos jogos inesquecíveis de nosso tempo do futebol, pedimos aos autores que destacassem cinco. Um da Seleção Brasileira e um para cada um dos quatro grandes clubes do Rio de Janeiro. O livro já está esgotado, mas uma nova edição é prometida para 2009. Brasil 1 x 0 Paraguai A vitória brasileira, em 31 de agosto de 1969, teve o recorde de público da história do futebol. Foram 183.341 pagantes e um total de 192.781 presentes no jogo que

garantiu a vaga da seleção canarinho na Copa de 1970. O medo de uma tragédia causada pela superlotação fez com que a transmissão da partida para o Rio fosse liberada com três horas de antecedência. O objetivo maior era desviar as atenções da população para o jogo, pois durante a disputa ministros militares definiam no Palácio Guanabara o afastamento do presidente da República, general Costa e Silva, vítima de trombose. A censura imposta aos meios de comunicação pelo regime militar impedia que se soubesse exatamente o que se passava. Era uma situação de poucas notícias e muitas versões.


Botafogo 3 x 0 Flamengo Dia 15 de dezembro de 1962. Mais de 145 mil pagantes para ver a final do Campeonato Carioca. A vantagem do empate fez com que o Flamengo entrasse em campo com Gérson escalado como terceiro homem de meio-campo. A decisão tática do técnico Flávio Costa foi desastrosa para a equipe rubro-negra. Além de perder criatividade na armação

Wilnei / CPDoc JB

Dentro de campo, o técnico João Saldanha escalou sete jogadores do Santos: Carlos Alberto Torres, Djalma Dias, Joel Camargo, Rildo, Clodoaldo, Edu e Pelé. As Feras do Saldanha, como ficou conhecida sua seleção, tinham a chance de provar seu valor. Boas chances de gol eram criadas, mas a retranca paraguaia e a excelente atuação do goleiro Aguillera impediam que o Brasil abrisse o placar. Na melhor delas, Jairzinho cruzou com perfeição para Pelé cabecear, obrigando o arqueiro paraguaio a fazer uma bela defesa. Aos 23 minutos do segundo tempo, Edu passou pelo zagueiro Enciso e chutou com força. No rebote de Aguilera, Pelé concluiu com força para fazer o gol da classificação. A população festejou nas ruas a vaga na Copa e, à noite, através de uma cadeia nacional de rádio e TV, ficou sabendo que uma Junta Militar havia assumido o poder. Em 30 de outubro, foi empossado o general Garrastazu Médici. Pouco mais de um mês depois, Costa e Silva morreu. No ano seguinte, a Seleção conquistaria o tricampeonato no México.

Ninguém foi capaz de parar Mané Garrincha no Carioca de 1962 de jogadas, a tarefa de auxílio na marcação não foi bem executada por Gérson. Quem agradeceu foi Mané Garrincha, que reviveu as atuações fundamentais para o bicampeonato mundial da Seleção Brasileira, seis meses antes. Um túnel ligando o Rio a Niterói. A possibilidade de início das obras era anunciada pelo governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda. Enquanto isso, o Conselho de Ministros da República aprovava a regulamentação do 13º salário. Como no domingo a Avenida Presidente Vargas, principal via de acesso ao estádio para quem vem da zona Sul, estaria interditada para a Cruzada do Rosário em Família, do pastor americano Joseph Quinn, o jogo precisou ser disputado no sábado. Mesmo dispondo de um grande time, com quatro bicampeões mundiais pela Seleção — Nílton Santos, Amarildo, Zagallo e Garrincha

—, a tradição falou alto e os alvinegros foram a campo com camisas de mangas compridas, mesmo com um calor de 35 graus. O Flamengo tinha uma equipe menos famosa, mas muito eficiente. Tanto que chegou à final com um ponto à frente. Além de Gérson, os atacantes Henrique e Dida chamavam a atenção. Nove minutos depois de iniciada a partida, Garrincha se livrou da marcação e marcou o primeiro. O Botafogo administrou a vantagem e, aos 36 minutos, após chute cruzado do Mané, a bola bateu no rosto do zagueiro Vanderlei e entrou. Gol contra, assinalou o árbitro Armando Marques. O Flamengo nem teve tempo de tentar uma reação na segunda etapa. Logo aos dois minutos, Zagallo passou para Quarentinha, que chutou forte contra o goleiro Fernando, que espalmou. O rebote caiu nos pés de Garrincha, que fechou o caixão rubro-negro. REVISTA DA ALERJ

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Fotos: Jornal dos Sports

Roberto Dinamite, com apenas 20 anos no título de 1974, disputa a bola com o zagueiro do Cruzeiro (esq.) ; Nunes faz o gol do título do Flamengo sobre o Atlético-MG, em 1980 (dir.) Vasco 2 x 1 Cruzeiro O quadrangular final do Campeonato Brasileiro de 1974 era composto por Cruzeiro, Vasco, Santos e Internacional. O time carioca começou bem, com uma vitória no Maracanã por 2 a 1 sobre o Santos de Pelé. Na rodada seguinte, arrancou um empate com o Cruzeiro em Belo Horizonte, numa partida marcada pela invasão do campo por parte de um dirigente e do técnico do clube mineiro, que protestavam contra a arbitragem. A decisão do campeonato seria na última rodada, quando Roberto Dinamite e Cia. enfrentariam o Internacional no Rio. Porém, o empate por 2 a 2 e a vitória do Cruzeiro por 3 a 1 sobre o Santos obrigaram a realização de um jogo extra para a decisão do título. Como o Cruzeiro havia conquistado mais pontos ao longo do campeonato — 38 contra 34 da equipe cruzmaltina —, a decisão 8

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estava marcada para o dia 31 de julho, no Mineirão. Porém, o Vasco entrou com um pedido de inversão do mando de campo, com base no artigo do regulamento que prevê este tipo de punição para casos como os incidentes da primeira partida entre as duas equipes. O jogo, então, foi remarcado para o Maracanã, no dia 1º de agosto, quinta-feira. Quase 113 mil pessoas compraram ingressos para testemunhar o que seria a primeira conquista de um título do Campeonato Brasileiro por um clube carioca. Equivocadamente taxado de fraco, o time vascaíno era composto por jogadores como Andrada, Fidélis, Miguel, Alcir, Zanata, Luiz Carlos Tatu e Roberto Dinamite, que despontava como craque, aos 20 anos de idade. Aos 14 minutos, Ademir aproveitou uma sobra e abriu o placar. A vantagem no placar durou até a metade do segundo tempo, quando Nelinho empatou para

os cruzeirenses com um bonito chute de fora da área. A torcida pôde respirar aliviada aos 31 minutos, quando Jorginho Carvoeiro dividiu com o goleiro Vitor e marcou o segundo gol vascaíno. Bastava esperar o apito final para soltar o grito campeão. Flamengo 3 x 2 Atlético-MG Quase 155 mil pessoas compraram ingressos para a grande final, no dia 1º de junho de 1980. Naquele ano, nem mesmo o Carnaval com três escolas campeãs — Beija-Flor, Imperatriz e Portela — chamou mais atenção que Fernando Gabeira, ícone do Verão da Anistia por desfilar pelas areias da Praia de Ipanema usando uma tanga de crochê. Nos bastidores do gramado, Dinamite retornava da Espanha para o Vasco, depois da tentativa fracassada do Flamengo em contratá-lo. O plano B dos dirigentes rubro-negros foi a contratação de Nunes, que atuava no futebol mexicano.


No campeonato, com exceção de uma derrota em casa para o Botafogo da Paraíba por 2 a 1, o time colecionava bons resultados, como a goleada de 6 a 2 sobre o Palmeiras. Zico e Júlio César Uri Geller saíram contundidos da vitória sobre o Coritiba nas semifinais. O desfalque no primeiro jogo da final contra o Atlético-MG, no Mineirão, resultou em derrota por 1 a 0, com gol de Reinaldo. O Flamengo reclamou muito da violência do time mineiro. Rondinelli quebrou o maxilar após levar um chute de Éder. Momentos antes da grande decisão, Adílio leu um bilhete de incentivo de Rondinelli aos companheiros. Logo aos sete minutos, Nunes abriu o placar após receber bela assistência de Zico. Nem deu tempo para comemorar. Um minuto depois, Reinaldo empatou para o Galo mineiro. No finalzinho do primeiro tempo, Júnior chutou duas vezes. A bola sobrou para Zico, que desempatou. Mesmo mancando, Reinaldo conseguiu empatar o jogo aos 21 minutos do segundo tempo. No momento de sua substituição, demorou muito para sair de campo e foi expulso. Aos 37, Nunes fez valer sua fama de Artilheiro das Decisões e, numa linda jogada, driblou um zagueiro e acertou o ângulo do goleiro João Leite. Um golaço que entrou para a história e deu ao Flamengo o primeiro de seus cinco títulos do Campeonato Brasileiro. Fluminense 1 x 0 Flamengo O mesmo placar, dois anos seguidos — 11 de dezembro de 1983 e 16 de dezembro de 1984 —, o

No jogo de 1983, Assis invade a área e toca no canto do goleiro Raul, gol que deu início à sua fama de "Carrasco do Flamengo" mesmo carrasco: Assis. Em 1983, o gol aos 45 minutos do segundo tempo garantiu vitória sobre o Flamengo e deixou o Tricolor das Laranjeiras muito próximo do título estadual. Em 1984, o gol aconteceu aos 30 da segunda etapa e consagrou o Fluminense bicampeão carioca. Em 1983, um triangular formado por Fluminense, Flamengo e Bangu decidiria o título. O primeiro jogo, um empate de 1 a 1 entre Bangu e Fluminense, reforçou a crença de que as equipes haviam feito um acordo para provocar um segundo triangular. O Fla-Flu acabou esvaziado, com um público de menos de 85 mil pagantes, apenas razoável para as decisões da época. Já se escutavam gritos de "marmelada" quando Júnior, numa linda jogada, cruzou para Cláudio Adão desperdiçar a melhor oportunidade do time rubro-negro. Perto do fim, os tricolores se aproveitaram da distração dos jogadores do Flamengo, que reclamavam a marcação de um impedimento de Adílio. Delei tocou com velocidade para Assis invadir a área e chutar à direita do goleiro

Raul. O tricolor teve de torcer pela vitória do Flamengo contra o Bangu para comemorar o título. Em 1984 o Bangu deu lugar ao Vasco no triangular decisivo. O Fluminense venceu a equipe cruzmaltina por 2 a 0. O Flamengo ganhou de 1 a 0. Mais uma vez a decisão ficou para o Fla-Flu. Como não havia desempate por saldo de gols, um empate provocaria uma segunda partida. Dessa vez, a torcida não acreditou na possibilidade de armação e mais de 150 mil ingressos foram vendidos. No Fluminense, o preparador físico Raul Carlesso substituía o técnico Carlos Alberto Torres, suspenso. Além de Zagallo como técnico, o Flamengo tinha ainda seis campeões mundiais em 1981: Leandro, Mozer, Andrade, Adílio, Tita e Nunes. A disputa foi muito parecida com a do ano anterior. O equilíbrio e as poucas chances novamente deram lugar ao gol de Assis, que cabeceou no canto direito do goleiro argentino Fillol, após cruzamento de Aldo. O Fluminense, bicampeão, ainda seria tri sobre o Bangu em 1985. REVISTA DA ALERJ

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“Economicamente burguês, politicamente proletário e esteticamente aristocrata” e nt re vi sta Carlos Lyra Quando jovem, você namorou com a medicina e a arquitetura, mas deixou tudo para trás e se dedicou exclusivamente à música. Por quê? No início dos anos 1950 a música caiu sobre a minha cabeça. Eu, Tom Jobim, Roberto Menescal, todos nós éramos meninos de classe média. E a gente não tinha uma música para ouvir, a classe média não tinha música. Era tudo uma chatice, com poucas coisas interessantes. Mas aquilo que se fazia nunca me pareceu que fosse a minha cara, nem do Tom nem do Menescal. Nada tínhamos a ver com Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Dalva de Oliveira. Nós os respeitávamos, mas não os admirávamos. Porque todos eles, sem exceção, eram de extração popular. Nós realmente não tínhamos uma ligação com aquele tipo de música. Então preferíamos colher nos Estados Unidos. Frank Sinatra, Cole Porter, George Gershwin, que diziam muito mais aquilo que a gente sentia do que a música popular brasileira. Até o bolero mexicano de Agostín Lara, a música francesa, tudo isso nos dizia mais respeito do que a música brasileira de então. Até que... Bem, até que aparece o Dick Farney. Quando 10

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C elso

de

Castro Barbosa

nquanto houver classe média espalhada pelo mundo, a Bossa Nova não acaba. A convicção é de um dos mais talentosos criadores do gênero, certamente o mais representativo entre os vivos. Carioca de Botafogo, mais precisamente da rua Voluntários da Pátria, Carlos Eduardo Lyra Barbosa, o Carlos Lyra, ou simplesmente Carlinhos, tem a agenda lotada de espetáculos espalhados pelo planeta. São compromissos por aqui mesmo, no Paraguai ou em locais distantes como Finlândia ou Japão, onde platéias contadas aos milhares, que preferem ouvi-lo em português, têm sempre um aplauso emocionado e sincero para o autor de Minha namorada. Carlinhos também acaba de lançar, pela Casa da Palavra, o CDbook Eu e a Bossa – Uma história da Bossa Nova, livro com histórias saborosas que percorrem mais de meio século e, de quebra, ainda traz dois CDs com o melhor de sua obra. À primeira vista, seu discurso pode dar a impressão de que se trata de um homem elitista, que despreza tudo o que vem do povo. É só impressão. No ano em que se comemoram os 50 anos da Bossa, Carlos Lyra, com a língua mais afiada do que nunca, reafirma seus valores e sua crença em belas melodias, harmonias e letras. Mais: faz correções históricas sobre o início do que se convencionou chamar de "movimento", termo com o qual não concorda, e deixa bem claro que sua praia foi, é e sempre será a zona Sul do Rio de Janeiro, bem longe do som que vem da periferia, como o rap, que ele detesta.

ouvi o Dick cantando daquele jeito fiquei deslumbrado. Todo mundo fala que foi João Gilberto quem trouxe aquele jeito de cantar, mas isso é conversa, quem trouxe foram Dick Farney e Lúcio Alves. Foram eles que inventaram uma nova interpretação, um jeito de classe média. Eles queriam fazer uma música melhor e, para fazer essa música melhor, começaram a pôr nomes americanos em si próprios. Dick Farney, Johnny Alf,

Leny Everson... Para eles, isso era um passaporte para outro planeta. Nessa época, você, Tom e Menescal já eram amigos? Não. Nem sabia quem eram. Quando comecei a conviver com Menescal no colégio Mallet Soares, eu já estava fazendo música, isso por volta de 1956. Um ano antes, tive minha primeira música gravada, em 78 rotações, com Silvinha Teles. De um lado, Foi a noi-


rativo para a turma de Nova York que falava mal do pessoal de Los Angeles. Mas esse jazz é que nos interessava, o jazz branco. Fotos: Zô Guimarães

A Bossa Nova, que traz toda uma novidade melódica, harmônica, rítmica e nas letras, só é possível de acontecer numa cidade como o Rio de Janeiro? Claro. Por uma razão simples. O Rio era a cidade do Brasil por excelência, cidade da cultura, uma cidade feito Nova York. Só que aqui era a capital do Brasil, ainda tinha mais essa. Todo mundo vinha para cá. Então a Bossa Nova não é uma música carioca, ela é uma música feita por pessoas de todo lado que estavam aqui. Tinha o Sérgio Ricardo, de São Paulo, o Menescal e a Nara Leão, do Espírito Santo, o João Gilberto, da Bahia, o João Donato, do Acre, tinha de todo lado.

te, de Tom Jobim. Do outro, Menina, de minha autoria. O Menescal ficou sabendo, ouviu a música e se apaixonou. Quando soube que estudávamos no mesmo colégio foi me buscar na sala de aula dizendo que também queria tocar violão, fazer aquilo. Daí passei a ensinar violão a ele, que já sabia alguma coisa, mas eu tinha mais experiência. Eu estudava não só com o Bandeirante, um professor sofisticado que conhecia música moderna, o samba-canção moderno, mas também com meu vizinho, que era simplesmente o

Garoto, o Aníbal José Sardinha. Também estudei piano. Como diz um amigo, você toca violão por vocação e piano por maldição. Uso o piano para compor, mas não tem nada a ver, nunca consegui muita coisa. O violão é que foi meu veículo de comunicação com a música. Se bem que o chuveiro às vezes foi muito mais. Cansei de fazer música no chuveiro. Só a melodia, que para mim é o principal. Conversando com Tom Jobim, descobrimos que as influências eram as mesmíssimas. Era o jazz west coast, um termo pejo-

Mas os grandes melodistas, como você e o Tom, são cariocas... Tá bom. Mas também tinha o Sérgio Ricardo, grande melodista de São Paulo. Vinicius de Moraes dizia que São Paulo era o túmulo do samba, mas até certo ponto. Porque Sérgio Ricardo, para mim, é um melodista maravilhoso. Ele mesmo não se considera Bossa Nova. Esteve no concerto do Carnegie Hall em 1962, mas procurava se afastar dessa coisa da Bossa Nova. Não era charme, ele achava uma coisa muito burguesa e ele, muito comuna. Era mais ideológico. Mas eu também era comuna. E conjugava essas coisas perfeitamente bem. Porque eu acho que muito cedo percebi que eu era economicaREVISTA DA ALERJ

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Todo mundo fala que foi João Gilberto quem trouxe aquele jeito de cantar, mas isso é conversa, quem trouxe foram Dick Farney e Lúcio Alves

mente burguês, politicamente proletário e esteticamente aristocrata. A arte, para mim, é a forma. Quando o Centro Popular de Cultura da UNE começou a falar em panfleto, em música de protesto, protestei imediatamente. Panfleto eu não faço, não quero saber de canção de protesto. O bom é levar a cultura ao povo, não inventar uma cultura popular que não existe, do tipo "viva a revolução!", "abaixo isso e aquilo". Jamais gostei disso, sempre fui a contracorrente daquelas coisas dos comunas. E quem me apoiava era um artista também comuna, o Ferreira Gullar. A primeira fase da Bossa Nova, então, é toda uma busca incessante e desvairada da forma. Isso acabou... O Menescal continua fiel a isso... Estou falando dos novos... Os novos não levo em conta. Outro dia levei umas broncas aí no Globo Online. Os caras perguntaram se eu acho que o rap está matando a música. Eu disse não, eu estou vivo, não morri ainda. Menescal está vivo, João Gilberto está vivo. O rap tem a pretensão de matar a música? Não sei se tem a pretensão, mas eu nada tenho a ver com eles. Não sou nem vizinho deles, moro em Ipanema. Me chamaram de racista, de 12

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velho ressentido, coisa e tal. Estou pouco ligando. Não me diz nada. Pode ser que apareça alguém. O Gabriel, o Pensador tem umas coisas bem interessantes, mas música sem melodia é outro papo. Podem fazer à vontade. Se eu fosse presidente, polícia, alguma coisa, não iria proibir, não iria interferir. Simplesmente não quero saber disso. Vamos repetir a pergunta, mas de outra maneira. A Bossa Nova poderia surgir numa cidade com a natureza, a geografia diferente da do Rio de Janeiro? Isso varia de acordo com o autor. O Tom, por exemplo, bastava chegar no Corcovado, ver a onda que quebrou no mar e saíam aquelas obras-primas. Eu, não. Não quero saber de sol, de lua, de estrela nem de onda que quebra no mar. Estou pouco ligando para a natureza, morta ou viva. As referências, em minhas letras, são os conflitos pessoais. Raramente falo da lua, da montanha. Sou inteiramente figurativista, nada tenho de abstrato. Neoclássico por excelência. Meus parceiros, parece, percebem isso. O Bôscoli, quando compõe com o Menescal, remete ao "barquinho que vai pro mar". Quando faz música comigo, vem de "se é tarde me perdoa, eu não sabia que você sabia" e "era uma vez um lobo mau...".

Você é saudosista, sente saudade do Rio dos anos 50? Não é saudade, é uma coisa realista. O Rio de Janeiro era uma cidade, hoje é uma ocorrência. Acabou. Depois que o general Geisel juntou o estado do Rio com a Guanabara, ele acabou com o Rio de Janeiro. Ao transferir a capital, o Juscelino também ajudou nesse processo de decadência? Esse foi o primeiro golpe, mas não foi tão fatal porque, mudando a capital para Brasília, ele levou a política para lá, mas a cultura continuaria aqui. Agora, juntar a Guanabara com o Rio foi uma zona. E o Brizola vem depois e dá o tiro de misericórdia, transformando o Rio numa cidade de traficantes. Mas a esperança é a última que morde


A Bossa Nova não é uma música carioca, ela é uma música feita por pessoas de todo lado que estavam aqui

Quem é a grande cantora da Bossa Nova? Antes da Elizeth tinha uma outra, da época, que era muito mais expressiva, a Silvinha Teles. Era craque. Muito melhor que Nara Leão, por exemplo. Muito mais cantora, suingada, com inflexão, tinha uma vocação musical muito boa.

(sic). Estou esperando que aconteça alguma coisa. Tenho esperança, mas não tenho confiança... Ao inventar a Bossa Nova você tinha idéia de que estava fundando um movimento? Que movimento? Movimento dos quadris, na praia, tinha muito. Mas a Bossa não tinha finalidade, não tinha perspectiva do tipo vamos fazer isso, aquilo, não tinha nem manifesto. Todo movimento que se preze precisa de um manifesto. Mas de todos os supostos movimentos da época, vamos chamar assim, Jovem Guarda, Tropicalismo, o que permaneceu, a música que se eternizou, foi a Bossa Nova. De fato, o LP Chega de saudade, de João Gilberto, de 1959, é um

marco da Bossa Nova. A primeira geração era Tom, Vinícius, eu, João Gilberto e Ronaldo Bôscoli. Nem Menescal entrou nessa. Tem as parcerias minhas com o Bôscoli, que são outra visão, diferente da do Tom e do Vinícius; tem o Alberto Guimarães, que é de Minas, autor de Amor à primeira vista; tem o Trevo de quatro folhas, que mostra que a Bossa Nova não é só sambinha, tem marchinhas também, e tem a revisitação do Caymmi e do Ary Barroso, uma maneira nova de cantar os antigos. Aquele é um documento de Bossa Nova que permanece. O LP anterior, da Elizeth Cardoso, Canção do amor demais, não tem nada, ela era uma cantora popular. E Bossa Nova é classe média. Elizeth não era nem boa sambista, era uma boa baladista.

O que você pensa sobre a versão de que a Bossa Nova nasceu no apartamento da Nara Leão? Sem possibilidade. Como é que um evento, um acontecimento cultural da importância da Bossa Nova vai nascer no apartamento de uma menina, que diabo é isso? Quer dizer que o impressionismo nasceu na casa do Degas? São burrices do Ronaldo Bôscoli, que dizia essas batatas e as pessoas repetiam. Como é que a Bossa Nova nasce na casa da Nara se eu nunca vi o Tom e o Vinícius lá? Um jornalista bobão, chamado Jairo Severiano, escreveu que o marco da Bossa Nova era o disco da Elizeth. Isso pegou e as pessoas ficam repetindo. Então agora vou fazer o contrário, vou repetir que tudo isso é mentira. Agora, com a comemoração dos 50 anos da Bossa Nova, talvez eu tenha mais tribuna. REVISTA DA ALERJ

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re s is tênci a

T exto F rancisco L uiz Noel Fotos R afael Wallace

Estado do Rio é o terceiro produtor de água mineral do País, mas setor ainda luta para eliminar gargalos e enfrentar a concorrência

Caminho das águas 14

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om gás ou sem gás? Nos bares e restaurantes do estado, quando a preferência dos consumidores vai além de uma das duas opções, as marcas de água mineral de São Paulo e Minas Gerais logo saltam à ponta da língua, enquanto as do Rio de Janeiro mal vêm à memória. A indiferença dos conterrâneos é grande, mas as águas da terra continuam batendo em pedra dura – sem nomes famosos, grandes indústrias e vantagens fiscais, desfrutadas pelas concorrentes de fora. Prova da resistência está no mercado dos garrafões, que abastece casas e empresas, onde as minerais fluminenses são imbatíveis. Com mais de 50 indústrias envasadoras e 325 milhões de litros despejados no mercado em 2007, de acordo com números do Departamento de Recursos Minerais do Rio de Janeiro (DRM-RJ), o estado é o terceiro produtor de água mineral do Brasil. Apesar da posição, a diferença é grande em relação à liderança dos paulistas. Eles responderam por 46% da oferta nacional no ano passado, enquanto as empresas fluminenses alcançaram 6%, na cola das mineiras, que engarrafaram 6,7%. Depois do Rio de Janeiro ficaram Pernambuco (5%), Rio Grande do Sul (4,7%) e Bahia (4,3%). Graças aos nomes afamados no segmento de garrafas e copinhos, as águas paulistas e mineiras enxugam parte graúda do faturamento do setor no Rio de Janeiro. A presença reduzida das fluminenses nos balcões e mesas é flagrante, mas há controvérsia na medida da desvantagem: enquanto o DRM-RJ calcula que elas suprem 65% a 70% do mercado de descartáveis, o empresário Francisco Loureiro, um dos líderes do setor, diz que elas não detêm 50%. No total, o estado consome 500 milhões de litros anuais, que – estima no departamento o economista Ronaldo Maurício – movimentam R$ 350 milhões por ano.

As minerais fluminenses também disputam com as águas mineralizadas. O produto passou a inundar o mercado por obra das gigantes do mercado de bebidas, que tratam grandes volumes de água destinada ao fabrico de cervejas e refrigerantes. Uma parte é reservada para a adição de sais minerais. As mineralizadas são expostas nos supermercados junto das minerais autênticas e acabam compradas por consumidores desavisados, que pensam adquirir uma água natural. “O povo não lê rótulo. Elas são vendidas como minerais, mas são industrializadas”, alerta Loureiro. A resistência das envasadoras do Rio de Janeiro frente ao poderio das marcas de fora é resumida por Loureiro, dono da Nova Friburgo e da Lumiar, que enchem 25 mil garrafões por mês: “Só sobrevivemos porque somos pequenos”. Ele destaca que o estado, com 15,5 milhões de habitantes e turismo o ano inteiro, tem tudo para elevar o consumo de suas minerais, que nada devem às concorrentes. Mas, observa, é preciso eliminar gargalos e abrir novos caminhos. “Nossas empresas são familiares, ao contrário das paulistas, mas somos tratados como grandes. O recolhimento de impostos poderia ser maior se o estado nos ajudasse a nos defendermos”, pondera. O engarrafamento das águas fluminenses, que gera cerca de R$ 50 milhões anuais de ICMS, ocupa em torno de mil trabalhadores. Vai muito além, no entanto, o número de empregos no setor, nas mais de 240 distribuidoras que espalham as minerais da terra e de fora por milhares de pontos de venda – de supermercados a tendinhas rurais. “A água emprega mais de dez mil pessoas no estado”, afiança o empresário José Ênio Manhães, da Cascataí e da Superlev. As duas, que enchem mais de cem mil garrafões por mês, mantêm 120 postos de trabalho em Cachoeiras de Macacu (região Metropolitana), que possui – recorde estadual –12 fontes de minerais em atividade.

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Cabe às envasadoras de águas minerais fluminenses pagar o ICMS de toda a cadeia produtiva

O gargalo da concorrência desigual Um dos gargalos que afunilam o mercado para as águas fluminenses, apontam empresários, são as diferentes políticas fiscais dos estados. A exemplo de bebidas industrializadas e cigarros, as minerais da terra são taxadas pelo regime de substituição tributária,

cabendo às envasadoras pagar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de toda a cadeia produtiva. O tributo corresponde a 38% do preço de venda na fonte, enquanto o total pago pelas marcas paulistas e mineiras que desembarcam no

Rio de Janeiro fica em 24%, pois o ICMS é menor em seus estados. Às distinções de tratamento fiscal, assinala Francisco Loureiro, somam-se problemas de fiscalização. “Mesmo com a diferença do imposto, ela não é suficiente para fazer com que águas de São Paulo

A 'água santa' que virou bairro A água mineral Santa Cruz, reza a lenda, foi descoberta entre 1888 e 89 pelo ex-escravo Domingos Camões, conhecido como Beiçola – um dos muitos negros que, sem ter para onde ir após a Abolição, fixaram moradia no local que se tornou conhecido como Morro dos Pretos Forros, entre o Engenho Novo, Méier e Engenho de Dentro, na zona Norte carioca. Pelas virtudes curativas vinculadas à mineral, ela passou a ser chamada de “água santa” – expressão que acabou virando nome do bairro em redor da fonte. O ex-escravo começou a envasar a mineral em 1909. Domingos

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aproveitava garrafões de cinco litros usados no comércio de vinho e tampava os vasilhames com rolhas feitas com sabugo de milho. O produto artesanal era acondicionado em cestos e transportado em lombo de burro por Água Santa e localidades vizinhas, onde o pioneiro vendia a mineral a 5 vinténs. Em 1914, a área da fonte foi comprada pelo comerciante português Artur Esteves, que criou a Empresa de Águas Santa Cruz. O ex-escravo morreu em 1974, com 104 anos. Na década de 40, quando a mineral era engarrafada com o maquinário mais moderno da

época, Esteves abriu um novo veio de negócio: um parque de lazer em torno da fonte. O lugar, com 500 mil metros quadrados, transformou-se em local de piqueniques para as famílias da região nos fins de semana, nos moldes da Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão. Como outras minerais, a Santa Cruz era envasada em litros de vidro escuro, com gás e sem gás, e vendida em várias partes da capital. No rótulo, uma caravela fazia alusão ao passado navegador dos lusitanos. Os tempos gloriosos da mineral de Água Santa ficaram para trás. Fechado nos anos 90, o parque está


percorram 1,7 mil quilômetros e cheguem aqui mais baratas do que as nossas, quando teriam que ser mais caras, por causa do frete. Onde está o milagre?”, questiona. Em contrapartida, o peso da tributação desigual impede às minerais fluminenses ultrapassar as fronteiras do estado. “Ela já sairia daqui custando mais caro”, lamenta Loureiro. A produção brasileira de água mineral supera cinco bilhões de litros por ano. A tendência é de expansão, embalada pelo crescimento natural da economia, o aumento da renda entre as camadas pobres e a difusão do garrafão de 20 litros, trocado nos pontos de venda pelos compradores. Sinal de boas perspectivas é o consumo per capita no País, de 25 litros anuais.

Modesto, o patamar indica que há muita sede a saciar. Na Itália, França e México, cada pessoa bebe por ano de 140 a 160 litros. Nos EUA, maior produtor mundial, com 24 bilhões de litros anais, o consumo per capita é de 86 litros. Francisco Loureiro lidera, há dois anos, a organização do Sindicato das Indústrias Envasadoras de Águas do Estado do Rio de Janeiro (Sienva-RJ). À espera da carta sindical do Ministério do Trabalho e Emprego, os empresários contam, com a nova entidade, passar a ter assento nos fóruns da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan). Atualmente, o setor é representado na federação pelo Sindicato Nacional da Indústria de Águas Minerais (Sindnam), ligado à Associação

Gilson e a coleção da garrafas antigas da Santa Cruz: tradição tomado pelo mato. Da cachoeira que refrescava os freqüentadores, ficaram as pedras secas, pois, no alto da montanha, a água foi desviada para comunidades vizinhas.

E, durante a construção da Linha Amarela, inaugurada em 1997, a fonte achada por Beiçola secou. O fenômeno é associado pelo gerente da empresa, Gilson Nunes da Silva,

Brasileira da Indústria de Águas Minerais (Abinm), com sede na capital paulista. O presidente do DRM-RJ, Flávio Erthal, reconhece a desvantagem do tratamento tributário no Rio de Janeiro. “Somos parceiros do setor, mas é preciso que ele invista na organização e na sua representatividade”, observa. Vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços, o departamento apoiou as envasadoras, nos últimos anos, ante a fiscalização das autoridades sanitárias e do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). O DRM-RJ, que lançou em 2006 o livro Águas minerais do Estado do Rio de Janeiro, estuda a criação de um selo de origem – o Água Rio.

à dinamitação de pedreiras para a passagem da via expressa. Sem a fonte original, a sobrevivência da Santa Cruz vem de outros mananciais da mineral no terreno – três surgências e um poço artesiano. A vazão total, de quatro mil litros por hora, não permite à empresa acalentar planos de expansão nem de retomada do envase de embalagens de meio litro, parada em 2001. “Os herdeiros mantêm a empresa por causa da tradição. Não há intenção de expandir”, diz Gilson. Dos tempos em que a Santa Cruz era bebida nos bares e restaurantes resta, no escritório da empresa, uma coleção de garrafas antigas na prateleira.

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Pelo menos 32 engarrafadoras trabalham com garrafões

Em alta no mercado dos garrafões Depois de resistir há décadas, em vasilhames de mão, à investida dos refrigerantes, a água mineral deu um salto de mercado nos anos 1990, graças aos garrafões de polipropileno. Eles impulsionaram o consumo residencial nas cidades e tornaram o produto presença obrigatória nos bebedouros de indústrias de todos os portes, escritórios e repar-

tições. O estado, que possuía 21 envasadoras em 99, mais do que dobrou o número em nove anos. Das minerais fluminenses, 80% chegam aos compradores em garrafões, incluídos os de dez litros, mais práticos ao manuseio. “O Rio de Janeiro tem tudo para ser autossuficiente na oferta em garrafões”, aposta o economista Ronaldo Maurício, que acompanha

a evolução do setor, que detém 72 autorizações do DNPM para a exploração de fontes. Na disputa pelo filão, pelo menos 32 engarrafadoras só trabalham com esses recipientes, que são mais de cinco milhões em circulação no estado. Das empresas que envasam em garrafas e copos, só duas não utilizam também os garrafões – a Petrópolis, no município serrano, e a Schinchariol, em Cachoeiras de Macacu. Com tantos produtores, a queda de braço entre envasadoras, distribuidores e varejistas é permanente. Na batalha pela preferência dos compradores, práticas pouco ortodoxas de envasadoras da terra somam-se à concorrência de fora. “Tem gente vendendo o garrafão a R$ 0,80 ao distribuidor, quando vale mais de R$ 1. Nessa história, quem menos ganha é a fonte. As empresas maiores superam a dificuldade no volume de produção,

Em Raposo, economia movida a mineral Única estância hidromineral que restou ao Rio de Janeiro, Raposo ganha a vida graças à fama de suas águas e ao bucolismo típico de lugarejo do interior. Distrito de Itaperuna (Noroeste fluminense), a 350 quilômetros da capital, o local recebe mais de 60 mil turistas por ano, em mais de dez hotéis e pousadas, que somam 1,5 mil leitos. Em dois parques hidrominerais vizinhos, das águas Raposo e Soledade, os visitantes têm à disposição três tipos de minerais – da marcante sulfurosa à leve fluoretada, passando pela 18

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digesitiva carbogasosa, a primeira a ser descoberta, em 1915. A lenda reza que tropeiros apeados na fazenda de Antônio Raposo de Medeiros ouviram um estrondo no subsolo e, cavando a terra, foram surpreendidos com o jorro de uma água de gosto diferente. Um estafeta que ajudara a cavar sarou de um eczema dias depois, creditando a cura a poderes medicinais da mineral. Ela tornou-se afamada como a “água santa do Raposo” e passou a ser engarrafada em 1936, conduzida em carros de boi à estação ferrovi-

ária e despachada para o interior fluminense afora. A fluoretada e a sulfurosa foram encontradas mais tarde. Na década de 40, a voga nacional do uso medicamentoso das minerais fez surgir no povoado os primeiros hotéis para fluminenses, mineiros e capixabas em busca de curas por ingestão ou banhos. As águas eram promessa de efeitos terapêuticos sobre o corpo; e a tranqüilidade local, sobre a mente. O turismo despontou como fonte de empregos no distrito, com cinco mil habitantes. “Se não fosse a água, não tinha nem serviço”, diz


mas a coisa é complicada para as menores”, queixa-se na capital o gerente da Água Mineral Santa Cruz, Gilson Nunes da Silva. Uma das mais antigas do estado, a empresa enche 1,3 mil garrafões por dia, depois de ter desistido, há sete anos, das garrafas de meio litro. O uso de filme plástico em torno dos garrafões, proibido em vários estados, é outra peculiaridade problemática para a maioria das envasadoras fluminenses. A eliminação da “camisa”, como o invólucro é conhecido, foi inaugurada no País em 2004, por iniciativa da Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo, com base em parecer técnico da Abinan, que apontou mais malefícios do que benefícios na utilização da película. As desvantagens apontadas incluem a atração de poeira e contaminantes e o risco de microorganismos desenvolvidos sob o plástico alcançarem os bebedou-

ros, além da falta de visão da água e do estado do vasilhame. Como o Rio de Janeiro ainda cochila diante do problema, a “camisa” tende a facilitar a entrada de garrafões em fim de vida útil no estado. “Estamos nos tornando a lixeira dos garrafões velhos, pois o plástico esconde o que vem por baixo”, alerta o empresário Francisco Loureiro. Os concorrentes de fora estariam aproveitando a “camisa” para exportar os vasilhames em mau estado aos fluminenses. A situação tende a piorar, pois, além de o cerco sanitário apertar em outros estados, o controle dos garrafões terá regras mais rigorosas do DNPM a partir de setembro de 2009. As águas Nova Friburgo e Lumiar estão entre as primeiras a despir a “camisa”, afixando apenas os rótulos nos vasilhames. Outra que deixou para trás a película de plástico é a Teresópolis. “A ‘camisa’ não serve para nada e só

acumula sujeira”, diz o empresário Ricardo Coutinho, observando que o material, depois de retirado pelo consumidor, é mais uma ameaça ao meio ambiente. Num dos galpões da envasadora, no distrito do Frade, acumulavam-se em outubro mais de 700 garrafões inúteis recolhidos por caminhões da empresa em apenas 20 dias, misturados a vasilhames bons, na troca por garrafões cheios. Atento ao nicho de consumidores preocupados com ecologia e qualidade, a Teresópolis lançou no estado os garrafões de 20 litros com tampas de rosca, usados em cidades paulistas. Após o consumo, eles são trocados por outros iguais com a água da marca, como parte de estratégia empresarial para tornar fiel a clientela. “Isso nos dá o controle sobre os garrafões e permite a fidelização do distribuidor e do consumidor”, diz Ricardo Coutinho.

Saulo Francisco Ribeiro, 60 anos, três filhos criados, que ingressou na Raposo em 68, lavando garrafas com escovinha. O empresário Armando José Gomes, que emprega 15 trabalhadores na envasadora e no Parque Soledade, destaca que a baixa altitude é uma virtude adicional do lugar. “Somos a única estância do Brasil a apenas 250 metros acima do nível do mar, enquanto as outras estão a mais de 700”, exalta. Além de não gerar sensação de desconforto para quem está desabituado a locais altos, ele acrescenta, a situação do distrito proporciona clima mais ameno no inverno. O Parque

Soledade, com piscinas das minerais sulfurosa e fluoretada, recebe até três mil pessoas por mês. O forte do turismo de Raposo é o público da terceira idade. Parte dos visitantes forma uma clientela cativa, que retorna ao distrito em datas especiais, como o Ano Novo e o Carnaval. Um desses frequentadores é o bancário aposentado Ildison de Barros Abreu, 63 anos, três filhos, morador no bairro carioca de Todos os Santos. “Venho a Raposo há 30 anos. Lá em casa, sair de férias era sinônimo de vir para cá. E nada de cerveja ou refrigerante: é só água e muita tranqüilidade”, diz, ao lado da mulher, Luni, e da filha Suy.

Armando dirige única estância hidromineral a baixa altitude REVISTA DA ALERJ

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A água da chuva pode levar séculos para se mineralizar a grandes profundidades

Produto nobre de dentro da Terra As minerais estão a meio caminho entre a legislação mineral e a sanitária, que a considera um alimento. Instituído em 1945, pelo Decreto-Lei 7.841, o Código de Águas Minerais define a bebida e classifica os seus tipos, de acordo com os sais de sua composição, gases e temperaturas das fontes. Em 2000, no rastro de resoluções e portarias baixadas desde os anos 1970 pelo Ministério da Saúde, a

Da fonte ao fundo do poço Na história das minerais do interior fluminense, a exploração turística das fontes não é exclusividade de Raposo, embora a tentativa seja a única que resistiu ao tempo. Na década de 1940, em Paraíba do Sul (região do Médio Paraíba), a construção de um hotel e um parque junto ao fontanário da água fluretada Salutaris fez do lugar a primeira estância hidromineral do estado, fechada nos anos 1990. Na tentativa de salvar o local para o lazer, a Prefeitura reabriu o parque em abril de 2008, com quadras e campos de futebol soçaite. 20

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Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) criou suas primeiras resoluções sobre identidade e qualidade das águas minerais. As normas foram revistas em 2005 pelas resoluções 274 e 275. As fontes também são protegidas pelas leis de uso dos recursos hídricos. Vertidas de forma natural, nas surgências, ou extraídas em poços artesianos, as minerais são o fruto nobre do que os cientistas chamam de ciclo hidrológico, renovado a cada instante quando a água evapora-se nos rios e lagos, oceanos e florestas, forma nuvens e volta à terra sob a forma de gotas, neve e neblina. “As águas minerais nada mais são do que a chuva infiltrada a grandes profundidades, que se mineraliza no contato com as rochas”, explica no DRM-RJ o hidrogeólogo Aderson Marques Martins, especialista em águas subterrâneas. As águas levam meses e até séculos para se mineralizarem, incorporando sais ao fluir entre fissuras de rochas duras e através das porosas. Na formação geológica do Rio de Janeiro predominam as rochas ígneas, cristalinas e metamórficas – respectivamente, as originadas do magma e da sua cristalização, pelo esfriamento, e aquelas derivadas de outras rochas, submetidas a pressões e temperaturas elevadas. “Nossas águas mais comuns são as radioativas na fonte e as fluoretadas, leves e de bom paladar. Isso tem relação com a geologia das rochas do estado”, assinala Aderson.

Outra tentativa foi por água abaixo em Santo Antônio de Pádua (Noroeste fluminense). Vertida em uma das poucas fontes de mineral iodetada no País, a água Pádua, engarrafada desde 1952, deu origem à construção do Hotel das Águas, nos anos 70, por obra do Governo do estado. Em 2000, quando o fracasso da empreitada turística era patente, a Pádua deixou de ser envasada. “Só funcionava no prejuízo”, conta o ex-prefeito e professor Fernando Lavaquial, que tocava o negócio. Lavaquial, nomeado para a Prefeitura em 75, debita o malogro à vazão reduzida da fonte: “Eram 20 mil litros por dia; não dava para nada”. Perto do fontanário, uma área pertencente à família do ex-prefeito virou condomínio residencial, afetando


Um olho na clientela, outro na estrada Como a maioria das fontes está em áreas rurais do estado, as minerais percorrem muita terra batida antes de chegar aos balcões, mesas e bebedouros. As dificuldades de acesso fazem parte do cotidiano nas envasadoras, assim como de caminhoneiros a serviço dos distribuidores, acostumados à poeira, nos dias de sol, e à lama, nos de chuva. Em municípios próximos da região Metropolitana, nos períodos de temporais, a precariedade dos caminhos de chão prejudica envasadoras menos acessíveis, em favor daquelas que estão mais perto do mercado de consumo ou têm o privilégio do asfalto. Exemplo dessa desvantagem competitiva são a Cascataí e a Superlev, em Cachoeiras de Macacu. “Muita gente deixa de pegar a nossa água por causa da estrada”, queixa-se o empresário José Ênio Manhães. Quando chove forte, o trajeto no lameiro de trechos da Estrada Santo Amaro, no distrito de Guapiaçu, é uma aventura. Para não perder a clientela de distribuidores, que espalham as marcas por pontos de venda no Grande Rio, a Cascataí “adotou” a Santo Amaro, com 20 quilômetros. “Temos patrol, retroescavadeira e empregado só para a estrada. O problema é que isso também é custo”, diz Manhães.

de forma irreversível o ambiente natural. A fonte e a envasadora foram arrendadas a uma empresa, que briga na Justiça contra os Lavaquial. Como a Pádua, também acabaram as minerais paduanas Solú, carbogasosa, e Pagé, com lítio. Para resgatar a importância histórica da iodetada de Pádua, o DRM-RJ defende a transformação do local em museu, como parte do projeto Caminhos Geológicos, voltado à proteção desses monumentos naturais do estado. O principal foco do interesse é o chamado patrimônio geomineiro da velha envasadora, formado pelo fontanário decorado com azulejos e pelos antigos equipamentos de lavagem, envase e selagem das garrafas.

José Ênio cuida da estrada para poder escoar a produção da Cascataí A Teresópolis é outra que cuida do acesso, sob pena de afastar os caminhoneiros. Uma das três envasadoras do município, a empresa é vizinha do Parque Nacional da Serra dos Órgãos e do Parque Estadual dos Três Picos, situada ao fim dos 11 quilômetros de terra batida da sinuosa e íngreme Estrada Getúlio da Fonseca Veiga, com entrada pela RJ-130 (Teresópolis–Nova Friburgo). Não é por menos que a envasadora – a mais nova do estado, ativada em abril de 2008 e beneficiada pela marca antiga – possui pequena frota de caminhões, para não deixar em falta a clientela em formação, no caso de intempéries que afastem os distribuidores.

Engarrafada de 1952 a 2000, a água Pádua poderá virar peça de museu REVISTA DA ALERJ

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d evoçã o

T exto Celina Côrtes Fotos R afael Wallace

Causas (im)possíveis Festa de São Judas Tadeu atrai 30 mil visitantes ao Cosme Velho em um só dia

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esde os anos 70 a cena se repete. No Dia 28 de outubro, uma multidão se dirige à Paróquia de São Judas Tadeu, no Cosme Velho (zona Sul do Rio de Janeiro), a um quarteirão de onde existia a casa de Machado de Assis. O objetivo é o mesmo: festejar o santo padroeiro das causas impossíveis no provável dia de sua morte. No início a festa se concentrava no dia 28 e era tanta gente que ficava quase impossível aos fiéis chegar à igreja, e aos moradores dos arredores alcançar suas residências. Aos poucos, os festejos foram se ampliando e, este ano, por exemplo, na semana de 20 de outubro as calçadas já

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começavam a ficar tomadas pelos barraqueiros e as comemorações se estenderam até a procissão, em 1º de novembro. Embora o público tenha se diluído, só no dia 28 foram cerca de 30 mil visitantes, segundo o padre Diegues, que comanda a paróquia desde 2004. Em comum, vão os fiéis em busca de graças ou pagam promessas pelo que teriam conseguido conquistar por intercessão do santo. Próximo à data dos festejos, em 20 de outubro, a paróquia sediou o velório de um de seus mais importantes devotos, o empresário Arthur Sendas, criador do Grupo Sendas. Entre os mais alegres devotos, porém, estão os torcedores do Clube de Regatas do Flamengo, do qual São Judas se tornou patrono por meio do contagiante desempenho do padre Góes, um rubro-negro que levava para as partidas no Maracanã a

bandeira do clube e um guardachuva, muitas vezes usado para 'defender' o time. – Padre Góes faleceu em 1976, poucos anos depois que assumi a presidência do Flamengo. Percebi a interação magnífica entre a torcida e São Judas, e resolvi investir na mística. Chegamos ao ponto de dar ao santo o título de Grande Benemérito do Flamengo, no final da década de 70. Com isso, o time foi campeão, bi-campeão e campeão do mundo, graças à força de São Judas – propaga Márcio Braga, mais uma vez à frente do clube. Em 2004, o Ministério Público entrou com uma ação que proibia o Flamengo de assinar com a Petrobras o contrato que o salvaria da insolvência. Eram R$ 139 milhões de patrimônio negativo. – Se não tivéssemos recebido a ajuda de São Judas, não teríamos saído dessa – acredita Braga que,


na véspera de uma nova viagem do time, acompanhou os jogadores em 27 de outubro à capela de São Judas Tadeu, erguida em 2007 na sede do Flamengo, na Lagoa Rodrigo de Freitas (zona Sul). – Eles estavam com viagem marcada e optamos por fazer a missa em nossa capela. Durante a cerimônia, quem também apareceu foi Fernando Gabeira, que acabava de nadar na piscina do clube. Foi no dia seguinte à eleição de seu concorrente, Eduardo Paes, para prefeito do Rio. São Judas serve não apenas para iluminar nossos caminhos, como para nos consolar quando perdemos – filosofa o presidente do time. Quem lota a igreja no dia das festas, entretanto, são os simples mortais, como a aposentada Helena de Lima Silva, 60 anos, chegou à gruta com um ex-voto na forma de uma pequena cabeça de criança, em pagamento à promessa pelos bons resultados alcançados por seu neto. Ela saiu às 5h30 de sua casa, no município de Nilópolis (Baixada Fluminense), e mesmo depois de tanto esforço parecia em estado de graça: – Meu neto estudava em uma escola municipal e um dia a professora me chamou, dizendo que ele precisava de um psiquiatra. Tiramos o menino de lá e o transferimos para uma escola particular. Ele já está no quarto ano, foi uma coisa fora de série – festejava. A própria permanência na fila parece ser um voto de penitência, por fiéis que dividem sua devoção entre gestos de gratidão ou nas missas, das 6h às 20h do dia 28. A gruta é um cenário à parte, com

A professora do meu neto disse que ele precisava de um psiquiatra. Trocamos a escola e, hoje, ele já está no quarto ano Helena de Lima Silva

o acesso revestido pelas centenas de placas agradecendo graças, como a de Maria Barbosa, pelo resultado do transplante de rins e pâncreas, em 2006 e 2007. Contritos ou alegres, todos acreditam que seus pedidos foram alcançados através do poder de São Judas junto a Jesus Cristo. É o caso do aposentado Milton Fialo, que saiu cedo do Méier (zona Norte) e comprou uma enorme vela de quase dois metros, correspondente à sua altura, e outra do tamanho de sua mulher. – Sou devoto de São Judas há mais de 20 anos. Em 1990, consegui sair de uma difícil situação judicial graças a ele. Minha esposa teve câncer de rim em 2006 e extraiu o órgão doente numa cirurgia bem sucedida. Venho aqui demonstrar minha gratidão todo dia 28 com minha mulher, que está na missa – relata. Já a aposentada Clarita Vellaco, 77 anos. Ela saiu cedinho de Copacabana para agradecer ao santo as graças recebidas. No seu caso, o mais curioso é que

Milton Fialo saiu cedo do Méier com duas enormes velas de quase dois metros REVISTA DA ALERJ

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O acesso à gruta, nos fundos da igreja, é revestido pelas centenas de placas agradecendo graças o alvo da gratidão são seus amigos. Ela percorreu a enorme fila que conduzia à gruta, nos fundos da igreja, levando uma mão, dois braços e duas pernas, ex-votos de cera que representam os órgãos beneficiados pela suposta interferência do santo. – A mãozinha foi para um amigo que serrou o dedo e conseguiu recuperar o movimento. Outro quebrou o braço e também se recuperou. E um terceiro sofreu um derrame e conseguiu resgatar o movimento do braço e da perna. No ano que vem, quero voltar com um seio para festejar o sucesso da cirurgia de minha sobrinha, que operou um câncer – contava Clarita, exultante. A comerciante Sylvia Regina Lourenço, 32 anos, saiu da gruta às lágrimas, depois de acender velas para o santo. Ela fez promessa porque suspeitava que seu filho, Leonardo, de sete anos, tivesse celíaca, doença que torna o organismo do portador incompatível ao glúten. – Pedi muito a São Judas e o resultado do exame deu negativo. Saí de casa às 6h, no Recreio dos Bandeirantes (zona Oeste), e vim pegando as amigas pelo caminho – lembrava, comovida. 24

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Para garantir o brilho da festa, um punhado de voluntários atendia os fiéis em barracas montadas dentro do terreno da igreja, oferecendo todo tipo de penduricalhos religiosos, como ex-votos, terços, imagens, fitinhas, rifas e lembranças do santo, além de comidas e bebidas. – Sou devota há 30 anos e sempre trabalho na festa como voluntária. A graça maior é ter minha saúde perfeita – comentou Irelva Azevedo, 71 anos, à

vontade entre os ex-votos que vende em sua barraca. A festa só não é uma unanimidade pelo desconforto que causa à vizinhança. Além do trânsito infernal, os moradores são obrigados a conviver com a falta de limites dos barraqueiros, que dormem na rua e prejudicam ainda mais o deslocamento dos veículos. São eles que vendem flores, além dos mesmos objetos religiosos oferecidos na igreja.

Irelva Azevedo é devota há 30 anos e trabalha na festa como voluntária, vendendo ex-votos em sua barraca


Padroeiro das causas impossíveis

A igreja no Cosme Velho é o templo mais importante do estado dedicado a São Judas – Quando acontecia num dia só era ainda pior. Os flamenguistas começavam a soltar bombas a partir das 5h, não dava para dormir. Melhorou um pouco porque os visitantes se diluíram, mas continuo obrigada a criar estratégias para sobreviver às festas – lamenta Eliane Esch, educadora de 59 anos que mora há mais de 30 no bairro. Nesse aspecto, padre Diegues parece ser adepto da tese de que os fins justificam os meios. Visivelmente contagiado pelo clima da festa, ele cita o tripé que sintetiza a mensagem de São Judas Tadeu: "confiança, paciência e determinação". Traços que os fiéis têm de sobra.

A fama de São Judas Tadeu de resolver os chamados casos impossíveis é explicada pela Igreja católica a partir de duas supostas aparições de Jesus Cristo. Uma delas é citada por Santa Gertrudes em sua biografia. Segundo ela, Jesus lhe teria aparecido e aconselhado a invocação de São Judas até "nos casos mais desesperados". Santa Brígida, durante uma oração, também teria tido uma visão do filho de Deus, que lhe sugeriu: "Invocai com grande confiança meu apóstolo Judas Tadeu. Prometo socorrer a todos quantos por seu intermédio a mim recorrerem". São relatos que ajudam a compreender por que, a cada dia 28 de setembro, multidões se deslocam de toda parte para cultuar São Judas Tadeu no provável dia de sua morte. Outra história que contribui para a construção do mito é que, após receberem o Espírito Santo no Cenáculo de Jerusalém, os 12 apóstolos de Jesus iniciaram a construção do que viria a ser a Igreja Católica e partiram para evangelizar os povos. São Judas começou a pregar na Galiléia, depois viajou para Samaria, Iduméria e foi ao encontro de outras populações judaicas. Sua principal característica era a fervorosa pregação, que atraía grande número de fiéis e que, mesmo após a sua morte, continua mobilizando multidões. Nascido em Cana da Galiléia, na Palestina, São Judas era filho de Alfeu, irmão de São José, e de Maria Cleofas, prima-irmã de Maria, mãe de Jesus. Era, portanto, primo de Jesus Cristo. Entre seus

irmãos havia outro apóstolo: Tiago, chamado o Menor, para distinguir de Tiago Maior. Segundo a Bíblia, Judas Tadeu foi escolhido a dedo por Jesus para ser um de seus apóstolos. Sua mais importante citação no livro sagrado remete à Santa Ceia, na Quinta-feira Santa, às vésperas do martírio de Cristo. Jesus falava das maravilhas do amor do Pai e Judas Tadeu não se conteve: "Mestre, por que razão hás de manifestar-se a nós e não ao mundo?". Simbolizado por uma machadinha, São Judas teria participado do 1º Concílio de Jerusalém, no ano 50, e a seguir partiu para evangelizar a Síria, Armênia, Mesopotâmia e Pérsia. No ano 70 foi cruelmente martirizado, vítima da inveja e ódio de sacerdotes por causa das conversões de pagãos que provocou com seu convincente testemunho. Sofreu golpes de machado – daí o símbolo – e morreu decapitado junto a outro apóstolo, Simão. As relíquias de São Judas estão na Basílica de São Pedro, em Roma, onde são até hoje veneradas. A Paróquia de São Judas no Rio também guarda uma relíquia – um fragmento de osso do santo –, recebida em 1945 de um padre capelão militar, que serviu durante a guerra a um convento de religiosas, na Itália. A relíquia foi recebida junto ao documento garantindo sua autenticidade. A igreja, no Cosme Velho, é o mais importante templo do estado dedicado a São Judas Tadeu. A pedra fundamental foi lançada em 1952, com bênção do cardeal Jaime Câmara, responsável também pela inauguração da igreja, em 28 de dezembro de 1968. REVISTA DA ALERJ

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Encontro em Duas Barras celebra força do reisado como festa da fé popular

No reino das Tr a d ição

folias T exto F rancisco L uiz Noel Fotos Fabiano Veneza

Tradição não tem idade: a mestra Marli (à dir.) e o neto Darlan, dois anos, da Estrela do Dia

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as vésperas do Natal ao fim de janeiro, a temporada é de folia para milhares de fluminenses que celebram o nascimento de Cristo com a força da religiosidade popular. Os versos inspirados na Bíblia e o toque dos tambores variam de mestre para mestre, de lugar para lugar, assim como a indumentária dos personagens. Mas, de norte a sul do estado, as folias de reis seguem o mesmo roteiro – a pe26

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regrinação dos reis magos rumo à manjedoura de Jesus recémnascido e as peripécias de São José e da Virgem Maria para pôr o menino a salvo do vilão Herodes. A festa mantém vivo um enredo trazido ao País pelos portugueses e temperado pela contribuição afro-brasileira. No rastro dos reis magos, o espetáculo itinerante percorre casas e rende louvor ao Jesus figurado nos presépios, num ritual

em que o anfitrião retribui com ceia, prendas ou dinheiro para as atividades da folia. O canto dolente e a batida contagiante dos mestres e foliões são marca sonora do período natalino em várias cidades e povoados do Rio de Janeiro – de Paraty, no Sul, a Varre-Sai, no extremo Noroeste. A região que desponta como a principal guardiã do reisado é a Centro fluminense, onde encontros como os promovidos nos municípios de


Meu senhor dono da casa / peço pra me desculpá / Venha abrir a vossa porta / para ver quem é que está / É uma bandeira de reis / que hoje vei lhe visitá

Mestre Geraldio Abel, Folia Três Reis do Oriente, Duas Barras, RJ

Duas Barras, Macuco e Cordeiro já se incorporaram ao calendário regional de festas populares. Os bibarrenses fazem o encontro de reis mais tradicional do estado. Criado em 1975 pelo prefeito Victorino Araújo de Barros, morto em 2007, o Festival de Folclore de Duas Barras reuniu em sua 34° edição, dias 10 e 11 de janeiro, 39 folias. Além das 15 do município – a maioria, da zona rural –, grupos de Bom Jardim, Cordeiro, Macuco, Cantagalo, Nova Friburgo e Três Rios também participaram do festival. A arte das folias foi apresentada diante de um presépio armado ao lado da prefeitura, na Praça Governador Portela, incluindo improvisos e desafios de palhaços – personagem que simboliza o mal e faz a alegria visual e coreográfica dos grupos reiseiros. Os encontros têm sido um estímulo adicional à resistência das folias. Em Duas Barras, a prefeitura doa a roupa escolhida pelos participantes – a farda, na linguagem dos foliões –, serve alimentação e ajuda nas despesas de transporte. "É uma forma de valorizar essa manifestação popular", afirma a secretária municipal de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer,

Camila Ponce, responsável por um pequeno museu do reisado e por um acervo com objetos pessoais de um bibarrense famoso criado no meio da folia – o sambista Martinho da Vila. Em Macuco e Cordeiro, as prefeituras também vêm saindo em apoio à tradição. Festa levada a sério Apesar do nome, do ritmo às vezes esfuziante e das cabriolas dos palhaços, folia de reis é coisa séria. O louvor ao Menino Jesus dá o tom da alegria, discreta e comedida. "Os reis têm mistério. Não é farra: é compromisso, devoção", resume um dos mais antigos mestres reiseiros de Duas Barras, Geraldo Abel, 65 anos, da folia Três Reis do Oriente. Alegre, mesmo, só a dança pulada dos palhaços, que representam a tentação do diabo entre os foliões. Nem por isso o palhaço Joel Henriques Guimarães, 34 anos, dois filhos, da Folia Santa

Cecília, de Cordeiro, deixa de fazer coro com Abel: "Folia é nome dado por causa do barulho. Na verdade, é procissão". À frente, como símbolo máximo da fé, vai a bandeira multicolorida, em pano trabalhado com adereços, cuidada com zelo religioso pelos mestres. Algumas folias escoltam seus estandartes com crianças no papel de pastorinhas ou coroinhas. Mestre e contramestres vão em seguida – às vezes, encarnando reis magos, outras vezes, secundados por seguidores que figuram esses personagens. Empunhando os instrumentos, os foliões completam o grupo. Em contraste com a rigidez da formação, os palhaços dançam e saltam, trançando no meio do grupo. A eles só não é permitido passar à frente da bandeira. Cada folia tem repertório, batida e cores próprios, modelados pelas preferências e vivências do REVISTA DA ALERJ

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Presépio: a reverência e o louvor dos foliões diante da cena do nascimento de Jesus, seguindo o exemplo do reis magos mestre. É ele, com auxílio do contramestre, quem puxa os versos, repetidos pelos foliões ou entoados por todos ao mesmo tempo, enquanto tangem os instrumentos. A percussão mistura tambores – caixas (taróis) e surdos –, pandeiros, chocalhos, reco-recos e, em alguns grupos, cuícas e agogôs. A sanfona é presença obrigatória, acompanhada às vezes pelo violão. O comando do mestre inclui responsabilidades como a aprovação de novos integrantes, a guarda dos instrumentos durante o ano, o atendimento de convites para visitas e a organização de festas comunitárias. As folias nascem da devoção, de forma espontânea, ou de promessas. Enquanto a devocional Três Reis do Oriente foi criada por Geraldo Abel há 30 anos, reunindo parentes e amigos que já saíam em outros grupos, folias como a Estrela do Dia, da mestra Marli Teixeira, 45 anos, foram organizadas em retribuição a graças atribuídas a santos ou a Jesus. A de Marli surgiu de uma promessa do marido, o 28

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contramestre Silvino, funcionário da limpeza pública, curado de fortes dores no abdome. Depois de saírem durante sete anos – prazo recorrente para o pagamento de promessas no reisado –, essas formações quase sempre seguem ativas, alcançando o status da devoção. Relatos de fé em curas milagrosas não faltam nos dois tipos de folias. Na folia de Marli e Silvino, exemplo vivo é a filha Paola, 20 anos, que estreou no reisado mal saída do colo, em pagamento de promessa da mãe. Marli conta que a filha passou mais de um ano entre a casa e o hospital, com pneumonia, e foi desenganada pelos médicos. "Peguei uma fita da bandeira, fui para o hospital e botei embaixo do travesseiro dela. Depois que acordou, foi ficando boa. Os santos reis me deram essa graça", crê a mestra. Paola teve que sair durante sete anos como pastorinha de uma foliamirim, organizada com o irmão. Tomou gosto e, na adolescência, tornou-se um dos palhaços do grupo dos pais.

Mãe e filha estão entre as poucas mulheres nas folias de reis da região. "Muitos maridos e namorados não gostam. Têm ciúmes, dizem que o pessoal bebe", comenta Marli, uma das raras mestras reiseiras no estado. Ela assumiu o posto há 15 anos, ao demonstrar mais traquejo com os versos do que o marido, que lhe passou o bastão e ficou como contramestre. A ascensão foi conquistada degrau a degrau. "Namorei na folia e casei. Entrei como foliã, batendo tarol, quando Silvino era o contramestre. Toquei sanfona por sete anos e fui subindo", ela refaz a escalada. Cantoria de casa em casa O giro das folias pelas residências começa na segunda semana de dezembro. Os pontos altos da cantoria são o anúncio do nascimento de Jesus, a visita dos reis Melquior, Baltasar e Gaspar a Belém e as atribulações de José e Maria para proteger dos soldados de Herodes, rei da Judéia, o filho recém-nascido. Fora do período natalino, os mestres reiseiros versejam também sobre o êxodo dos hebreus rumo ao Egito, os 12 apóstolos e a ressureição de Cristo, além de louvar São Sebastião, mártir do século III, reverenciado em 20 de janeiro. "Não tem nada a ver com os reis", reconhece Geraldo Abel, para se curvar à tradição: "Como o pessoal botou tudo junto, então temos que cantar". À frente da Três Reis do Oriente, o mestre reiseiro tinha percorrido, até meados de janeiro, mais de 15 casas em Duas


Folia de Cordeiro: a tentação na dança multicolorida dos palhaços Joel de Laranjais e Juninho Barras e no vizinho município do Carmo. Colono de uma fazenda na localidade de Quilombo, quatro filhos e seis netos, Geraldo Abel começou no reisado aos dez anos. Com alguns dos 12 irmãos, tornou-se folião de um mestre vizinho da família – uma das inúmeras que descendem dos escravos que fizeram a riqueza da cafeicultura na região, na segunda metade do século XIX. "Fui criado no café", ele relembra o passado, vivido na Fazenda Boa Esperança, localidade de Quatro Encruzilhadas. Geraldo Abel ascendeu ao posto de mestre numa noite de Natal, na estréia da folia que acabara de organizar com um irmão, José Arlei. Chegada a hora de dar início à cantoria, Arlei não deu conta do recado e Abel foi obrigado a versejar as rimas que conhecia, para não deixar o grupo fazer feio na frente do dono da casa. "Tinha garganta boa. Aí arrumei contramestre bom. Fiquei de mestre e nunca mais

parei", ele se gaba. O reiseiro lembra dos tempos em que o prefeito Victorino mandava buscar a folia Boa Lembrança na fazenda, em caçamba de caminhão da prefeitura, para cantar em outros lugares do município. Mestre que se preza cultiva os versos dos mais antigos e, lendo ou ouvindo, bebe na fonte das escrituras sagradas. Analfabeto, Geraldo Abel fez seu acervo com rimas ouvidas desde a infância. "Canto pela memória. Ninguém sabe o que sei. Meu testamento é o velho", diz. Outro orgulho são as cinco caixas da folia, feitas a mão com tambores de óleo, arco de cipó rabo-de-gambá e couro de cabrito raspado a canivete, sem tarraxas. Por conta da formação familiar da folia – mais uma tradição no reisado –, o mestre entrou em 2009 sem palhaço, porque a cunhada que fazia o papel mudou de cidade. "Mas, tendo palhaço ou não", ele minimiza a baixa, "o bicho ruim acompanha a folia".

'Quanto mais feio, mais bonito é' Os palhaços são um capítulo à parte nas folias. "É o diabo em figura. Fica em torno da folia para tirar da pregação do mestre a atenção do povo, que sempre gosta mais das coisas do mundo", explica Joel Henriques Guimarães, o Joel de Laranjais, em alusão ao lugar em que mora, no município de Itaocara. O personagem saltitante do reisado representa os soldados de Herodes, mas seu significado é pródigo em ambiguidades. Para muitos foliões, o palhaço repete a tentativa dos soldados de privar Jesus da atenção do povo; para outros, os militares de Herodes não acharam o menino, ficaram com medo de um castigo do rei e, divididos entre o bem e o mal, se juntaram à fuga de José e Maria. Em contraste com a fidelidade do mestre às velhas rimas, o palhaço improvisa versos religiosos e profanos. Seu sucesso, sobretudo entre as crianças, depende também da energia para dançar e da REVISTA DA ALERJ

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Netinho: aos 12 anos, folia o ano inteiro e destreza na sanfona, ao lado do contra-mestre Bruno originalidade da farda e da máscara horripilante. "Quanto mais feia, mas bonita é", diz Joel, construtor civil. Máscaras valorizadas são as feitas no município de Miracema, que custam R$ 250. Ornadas com chifres, têm cabelos de rabo de boi e couro de cabrito por dentro. "A gente passa xampu, penteia, põe no sol, tem um carinho danado", conta o palhaço. Outro adereço indispensável são as bengalas de cipó retorcido, pintadas como cobra coral, com uma cabeça do réptil esculpida no castão. A farda colorida também sai caro. Osmar Júnior da Conceição, 28 anos, um filho, recepcionista no Carmo, desenha as suas, compra o material e leva para uma costureira fazer. Sobre panos de chita ou cetim, Juninho, como é chamado, aplica fitas acetinadas, linhas de lã, rendas e outros enfeites, que fazem a indumentária pesar até seis quilos. "Já tive 18 fardas. Por ano, faço 30

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duas ou três. Uso e vou vendendo", conta o palhaço, também da folia cordeirense Santa Cecília. Pelo material usado, uma farda caprichada chega a custar R$ 400. Um dos compradores das de Juninho é Joel de Laranjais, que, depois de usar, doa as roupas de palhaço àqueles que não podem comprar. Mestres reiseiros de futuro Sinal de resistência da tradição, o Centro fluminense conta com pelo menos duas folias mirins. Em Macuco, seguindo os passos do avô, o reiseiro João Ferreira, o Nico, o garoto João da Rocha Ferreira da Silva, 12 anos, é mestre da Estrela Cadente, do bairro Santos Reis. Netinho, como é conhecido, começou no reisado aos três anos, foi decorando os versos, aprendeu a tocar sanfona e logo arregimentou pequenos foliões, apoiado pela família. Aluno da 6ª série, ele lapida versos e assiste

a vídeos com reiseiros na função. "Brinco de folia o ano todo", diz. Seus foliões não chegam a tanto, mas estão sempre por perto. "Tem uns que saem, mas voltam logo quando escutam a folia." Outra infanto-juvenil é a Estrela do Oriente, do mestre Charles Carvalho, 13 anos, estudante da 3ª série em Bom Jardim. Formada por crianças e adolescentes pobres do bairro Jardim Boa Esperança, a folia depende do empréstimo de tambores pertencentes à banda de uma escola municipal. "Eles deixam de sair, às vezes, porque não têm os instrumentos", lamenta a madrinha de Charles e do grupo, Fátima Alexandrino, catadora de café. Apesar das dificuldades financeiras, o pequeno mestre compartilha com Netinho a mesma paixão juvenil pelo reisado. "Começamos batendo lata e carregando quadro de santo como bandeira", conta o menino reiseiro de Bom Jardim.


opiniã o

Saudações à Constituição de 88

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Carta Magna de um país, debatida e aprovada pelo Congresso Nacional, expressa o pacto que os diferentes (e desiguais) membros da polis firmam entre si, para estabelecer as regras fundamentais de convivência sob as quais querem viver. Quando rasgada, o pacto se dissolve e a sociedade fica à mercê do arbítrio da força. Maquiavel já afirmava, há 500 anos, que a ordem social só se torna estável quando o governo que a administra faz uso simultâneo da coerção e do consenso, vale dizer, da força e das leis. Tivemos rasgadas, ao longo do século XX, duas Constituições democraticamente formuladas – a de 1934 e a de 1946 – e vivenciamos ditaduras, com suas consequências negativas sobre nosso processo civilizatório. Mas hoje comemoramos um fato alvissareiro: a Constituição Federal de 1988 completa 20 anos. E os motivos para comemorar são reais. A Constituição de 88 contou com significativa participação da sociedade em sua elaboração. O envolvimento de grupos de interesses os mais diversos, nos debates, nas audiências públicas e nas plenárias de votação, conferiu legitimidade e vigor ao Texto, dotando-o de resistência a possíveis ataques. Ela revitalizou a Federação brasileira, o que consiste num segundo motivo para comemorar. Restituiu poderes aos estados e transformou os municípios em entes federativos, possibilitando que as decisões sejam tomadas de forma mais adequada e consistente. Finalmente, entre os motivos que há para comemorar os 20 anos da Constituição, está, particular-

M aria L ucia T eixeira Werneck Vianna

mente, a inovação trazida pelo Título VIII, "Da ordem social". Trata-se de um inédito conjunto de capítulos e artigos dedicado à garantia de direitos sociais: direitos coletivos à seguridade social, à educação, à cultura, ao meio ambiente saudável; direitos coletivos de crianças, de idosos e de minorias. Logo no capítulo I os objetivos da ordem social são identificados como o bem-estar e a justiça social. Estabelecidos como direitos constitucionalizados, esses bens públicos não são apenas benesses que um ou outro governo se disponha a prover. São obrigações que o Estado brasileiro tem que cumprir. Ora, o risco que a Constituição de 88 corre, na atualidade, não é o de sua derrogação, como aconteceu no passado. O risco reside em reformas parciais – muitas já realizadas – que visam a reduzir os direitos sociais consignados. Sobretudo no que diz respeito à seguridade social, um conceito extremamente importante que a Carta introduziu. Não por ela, mas pelo volume de recursos que permite manejar, a Seguridade é um objeto do desejo de qualquer governo. Parte desses recursos tem tido papel muito relevante em termos de redistribuição de renda e preservação da vida das populações mais pobres. A Constituição de 88 merece saudações comemorativas nos seus 20 anos. Mas precisa também que os brasileiros permaneçam alertas, para que ela continue a ser, de fato, a Constituição Cidadã que abriu ao Brasil as portas da civilização. Maria Lucia Vianna é professora do Instituto de Economia e coordenadora do Laboratório de Economia Política da Saúde da UFRJ.

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Rafael Wallace

Incentivo fiscal: pontos para reflexão

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eunir deputados, representantes de entidades da sociedade civil organizada e secretários de Estado para refletir sobre os limites e potenciais do incentivo fiscal para o desenvolvimento do estado foi a estratégia encontrada pelo Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Estado do Rio de Janeiro Jornalista Roberto Marinho para abordar tema tão controverso. É evidente a importância deste instrumento na atual conjuntura econômica, em que a guerra fiscal não pode ser ignorada. Porém, também foram abordados os seus limites. O secretário estadual de Fazenda, Joaquim Levy, destaca a necessidade de cautela para evitar a assimetria tributária: "Ao estado que não tem indústria nenhuma, a um setor que não tem nada, é fácil dar benefício, porque tudo que vier é ganho.

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Para um estado como o Rio de Janeiro, onde já existem muitas empresas, não posso dar ao novo e deixar o velho se acabar". Já o presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani, ressalta a transparência e a fiscalização como fatores fundamentais para se aumentar a arrecadação e diminuírem as desigualdades na competição "entre aqueles que pagam e os que sonegam impostos". Outros fatores fundamentais para se criar um estado mais competitivo: ambiente de negócios adequado, capital humano, mecanismos de financiamento, infraestrutura e segurança jurídica. "Na verdade, os incentivos tributários são a cereja do bolo", definiu o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Julio Bueno, ao citar, no encontro realizado no plenário da Alerj em novembro, outros itens que influenciam a decisão de um investidor.

Turismo e desenvolvimento Mapear os circuitos turísticos do Rio de Janeiro e contribuir na definição de políticas públicas para o setor. É este o objetivo do Caderno de Turismo do Estado do Rio de Janeiro, que está sendo elaborado sob a coordenação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e da FecomércioRJ. Com lançamento previsto para abril de 2009, o estudo foi proposto pela Câmara Setorial de Cultura, Turismo e Esportes do Fórum de Desenvolvimento Estratégico do Estado. A publicação contemplará a análise dos 92 municípios do estado, dividindo-os de acordo com o tipo de turismo realizado e o impacto econômico da atividade em cada localidade.


Licenciamento ambiental Dos 92 municípios do Rio, 38 estão aptos a fazer hoje o licenciamento ambiental, dirigido às micro e pequenas empresas. A permissão para a descentralização do licenciamento teve início em 2006 e, segundo a coordenadora estadual do projeto Meio Ambiente do Sebrae-RJ, Dolores Lustosa, um município que inovou foi Mesquita, na Baixada Fluminense. Sancionada em setembro de 2008, a Lei municipal 473 unificou a licença ambiental, fixou em dois meses o prazo para análise do pedido de

✎ A partir de dezembro de 2008, o prazo de validade das certidões de débitos fiscais emitidas pela Procuradoria Geral do Estado passou de 90 para 180 dias. A necessidade de unificar os prazos das certidões emitidas pelo estado e de desonerar o contribuinte foram os principais fatores levantados pela Câmara Setorial de Desenvolvimento Industrial, do Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Estado, para justificar o pedido, encaminhado via ofício à Procuradoria pelo presidente da Alerj, deputado Jorge Picciani.

licenciamento, isentou as empresas do pagamento da publicação no Diário Oficial e reduziu as taxas para o licenciamento simplificado. "O que observamos é que esta lei foi além daquilo que estava previsto na Lei Geral da Micro e Pequena Empresa", ressaltou a coordenadora, durante exposição feita na Câmara Setorial de Desenvolvimento Sustentável do Fórum.

Custos dos feriados Segundo levantamento divulgado pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), a perda na economia fluminense por conta dos feriados pode chegar em 2009 a R$ 23,1 bilhões, o que representa 5,5% do PIB fluminense. A Fecomércio estima que o setor de comércio de bens e serviços e turismo deixa de faturar R$ 500 milhões por dia parado no estado do Rio. Em relação aos feriados nacionais, das 12 datas comemorativas 11 caem em dias úteis. A preocupação com o impacto econômico dos feriados foi aborda-

da pela Câmara Setorial de Bens e Serviços do Fórum, que recomendou a aprovação do projeto de lei 1.339/2008, de autoria do deputado João Pedro (DEM), que impede que a instituição de datas para homenagear santos, profissões e outros temas de interesse comemorativo no estado implique na decretação de feriados. "Se aprovada, a lei não resolverá os problema dos feriados já existentes, mas impedirá a criação de novos", explica o superintendente de Desenvolvimento da Fecomércio, Sérgio Paiva, coordenador da Câmara Setorial.

✎ Para acompanhar a evolução do Mapa de Desenvolvimento do Estado do Rio, lançado pela Firjan em 2006, basta acessar o site www.firjan.org.br. Além das propostas concretas dos empresários para a solução dos principais problemas do estado, agrupadas em 13 temas estratégicos, estão disponíveis no site informações sobre o que já foi efetivamente realizado desde então. Divulgação

✎ Os debates que estão sendo realizados no Fórum de Desenvolvimento Estratégico do Estado do Rio podem ser acompanhados pelo o blog: www. riodesenvolvimentoestrategico. blogspot.com

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mídia

L eo Pinheiro

TV Você

Eleito como a melhor invenção de 2006, o site YouTube ganha cada vez mais importância como veículo de divulgação

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ornal, revista, televisão, outdoor, internet. Além destes tradicionais e novos veículos de informação e entretenimento, existe uma nova mídia que a cada dia é explorada por mais pessoas em todo o mundo: o YouTube – traduzido ao pé da letra, "você no tubo". Mas, como tubo é uma gíria norte-americana utilizada para definir TV, a tradução mais adequada é "você na TV". Gerado dentro da internet, o site YouTube ganha importância como veículo de comunicação e se coloca à parte da rede mundial de computadores. Desde que foi fundado, em fevereiro de 2005, nos Estados Unidos, o site, que permite que seus usuários carreguem, assistam e compartilhem vídeos, tornou-se o mais visitado do espaço virtual. Nele o usuário tem a possibilidade de hospedar filmes, videoclipes e materiais caseiros e mais uma gama de idéias com fins promocionais ou não. Para se ter uma idéia da importância que o YouTube tem para o público mundial atualmente, desde outubro de 2006, quando o site de vídeos foi vendido para o Google pela quantia de US$ 1,65 bilhão, a empresa americana foi eleita duas vezes consecutivas a marca mais poderosa do mundo, à frente de nomes consagrados como Coca-Cola, McDonald's e 34

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da própria Microsoft. Os dados são do instituto de pesquisa americano Millward Brown, que ouviu mais de um milhão de consumidores em todo o mundo e considerou nada menos que 50 mil empresas. A revista Time elegeu o YouTube a melhor invenção de 2006 por, entre outros motivos, "criar uma nova forma para milhões de pessoas se entreterem, se educarem e se chocarem de uma maneira nunca vista". Para a colunista da revista Digital do jornal O Globo, Cora Rónai, esta unanimidade é justa. "O YouTube é a grande sacada do momento. Até aqui a internet já permitia fazer um jornal – porque o blog é o jornal de uma pessoa. Com a questão do aumento da banda e o fato de quase todo mundo ter um telefone com câmera que pode fazer vídeo, você precisava de um canal para isso, e o YouTube é esse canal", afirma a jornalista, lembrando que o crescimento do site foi proporcional à popularização da banda larga. Primeira jornalista brasileira a criar um blog, o internETC, ativo desde 2001, Cora acredita que brevemente o YouTube também será uma ferramenta de divulgação da produção jornalística dos profissionais que não estão na grande mídia. "É uma questão de tempo, os blogs foram parar na mídia quando já estavam num determinado grau de amadurecimento. O YouTube ainda não teve esse tempo. Assim como hoje eu não contrataria um jornalista que não tem blog, eu acho que amanhã qualquer pessoa que quiser ser repórter de TV e não tiver uma experiência de YouTube vai estar em desvantagem. Os novos talentos vão ser descobertos no YouTube", afirma convicta.


Considerada a pioneira do jornalismo de tecnologia no País (lançou, em 1987, no Jornal do Brasil, a primeira coluna sobre computação da grande imprensa brasileira), a jornalista vê na falta de organização das idéias do YouTube e na ausência de um padrão estético pré-definido o recorrente interesse do público. "A gente vê coisas que não aparecem normalmente na TV. Você monta a sua programação. Isso é totalmente inédito e uma forma revolucionária de comunicação. Eu não vejo televisão, mas assisto ao YouTube durante horas, porque o fio da meada não acaba nunca", diverte-se Cora. Cerca de 20 mil novos vídeos são carregados no site diariamente. As visualizações diárias beiram a casa dos 30 milhões. Desde junho de 2007, podese acessar o YouTube em outros idiomas além do inglês, como português, francês, italiano e japonês. Desta forma, tornou-se uma importante ferramenta de propaganda política. Fundamentalistas muçulmanos, israelitas, comunistas, capitalistas, entre outros, aproveitam a internacionalização do site e a vocação democrática do veículo para divulgar mundial e instantaneamente eventos locais que não seriam conhecidos pelo resto do mundo se não existisse o YouTube. Foi através dele que o mundo tomou conhecimento, em primeira mão, da rebelião dos monges tibetanos contra o governo da China. O site conseguiu burlar o apertado cerco da censura chinesa.

No entanto, nenhum exemplo de alcance do YouTube foi tão impressionante como o uso do site como veículo publicitário nas prévias presidenciais do Partido Democrata, entre Barack Obama e Hilary Clinton. Os então pré-candidatos à presidência do país mais rico do mundo trocaram farpas em diversos vídeos postados pelos correligionários, até chegarem ao debate promovido pela emissora de tevê CNN, via YouTube. O canal de notícias recebeu mais de duas mil perguntas, das quais 30 foram selecionadas pelos seus editores. Entre os "entrevistadores" estavam funcionários de um campo de refugiados, um boneco de neve "falando" do aquecimento global e um guitarrista que cantou e tocou uma pergunta sobre o aumento de impostos. O debate alcançou índices de audiência comparáveis aos das principais redes de tevê aberta dos Estados Unidos. No Brasil, o site também foi alvo de diversas polêmicas, a mais conhecida delas envolvendo a modelo e apresentadora de TV Daniella Cicarelli e seu namorado, que conseguiram na Justiça o bloqueio do acesso ao site por 5,5 milhões de usuários brasileiros. O objetivo era impedir a divulgação de um vídeo onde o casal troca carícias na praia. Diante da repercussão negativa no Brasil e no mundo deste ato de censura por motivo fútil, a Justiça voltou atrás, esclarecendo que a ordem era para bloquear apenas o vídeo e não o site inteiro. A medida é tecnicamente inviável, já que os vídeos são publicados pelos usuários e podem ter títulos diferentes, que nada remetam ao tema em questão, ou até mesmo estar dentro de outros vídeos. Para não prejudicar a imagem do site, o vídeo em questão foi removido. Em busca de mais credibilidade, o YouTube fechou recentemente uma parceria com a TV Globo para exibir vídeos da emissora, anunciou o principal executivo do Google no Brasil, Alexandre Hohagen. REVISTA DA ALERJ

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pu b licidade

L uciana F erreira

Criatividade premiada

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s classificados de prostituição de um grande jornal são um lugar apropriado para veicular um anúncio institucional de uma Assembleia Legislativa? A resposta positiva pode surpreender, mas é reforçada pela série de prêmios ganhos pela peça publicitária Quando pensar em sexo, não pense duas vezes: use camisinha, criada pela agência de propaganda Staff para a Comissão de Saúde da Assembleia do Rio. A propaganda, que mostra uma camisinha envolvendo anúncios de prostituição publicados nos classificados de um jornal e alerta para a importância do uso do preservativo, ganhou, só em novembro, o Grand Prix de Melhor Aproveitamento do Meio Jornal do 12º Prêmio de Propaganda de O Globo; o ouro na categoria Serviço Público Comunitário da mesma premiação, e o prêmio O Melhor do Rio 8, promovido pelo Clube de Criação do Rio de Janeiro, na categoria Jornal. A nova linha publicitária da Alerj, menos tradicional e mais irreverente, foi reconhecida com frequência em 2008. Além dos já citados, outros anúncios da Casa ganharam prêmios da Associação Brasileira de Propaganda, da Associação Nacional de Jornais e o prêmio Colunistas Rio de Janeiro, da Associação Brasileira dos Colunistas de Marketing e Propaganda. Só este ano, foram 14 prêmios a anúncios e mais um título de Destaque do Ano, concedido pelo Prêmio Colunistas ao chefe 36

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Irreverência e humor rendem 14 prêmios aos anúncios institucionais da Alerj

de gabinete da Presidência da Casa, Aloysio Neves, responsável pela orientação e aprovação das peças. "Não temos a verba de uma Coca-Cola para preencher a mídia o ano todo. Por isso optamos por uma linha mais criativa, fugindo dos padrões convencionais, com peças que marcassem e dessem o que falar. E deram", comemora Neves. A irreverência encontrada em anúncios impressos, que foram publicados em grandes jornais como O Globo e O Dia e em revistas de grande circulação, como Veja, Época e IstoÉ, também é a marca dos spots de rádio da Alerj. O anúncio Pamonha, feito para divulgar o serviço Alô, Alerj, é um bom exemplo do uso do humor para chamar a atenção. Nele, ouve-se uma gravação que imita o som do alto-falante de um carro de venda de pamonhas, tradicional nas ruas do Rio de Janeiro. Mas a mensagem é um pouco diferente: "Quentinhas, as contas lá de casa estão quentinhas. Só cobrança abusiva, freguesa... Sabe como eu me sinto? Pamonha! Pamonha! Cadê o respeito às leis? Reclamo e ninguém resolve nada. Acham que eu sou pamonha, freguesa". O spot é completado com a fala do narrador, que lembra que o serviço Alô, Alerj, da Assembleia do Rio, é o lugar certo para reclamar ou denunciar. Segundo o diretor do Alô, Alerj, Wellington Nascimento, o número de telefonemas para o serviço


Anúncio do Disque Saúde foi publicado entre os classificados de prostituição do jornal O Globo aumentou consideravelmente a partir da veiculação da propaganda. "Várias pessoas que ligaram para o Alô, Alerj na época disseram que conheceram o serviço por causa da propaganda da pamonha. O spot teve um retorno muito além do esperado", afirmou. Além deste, outros spots premiados foram veiculados nas principais emissoras AM e FM de todo o estado, tanto na capital quanto nas regiões Metropolitana (Niterói, São Gonçalo, Duque de Caxias, Nova Iguaçu e Queimados), Serrana (Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo), Centro-Sul (Três Rios, Paraíba do Sul e Vassouras), Médio Paraíba (Barra do Piraí, Valença, Pinheiral, Barra Mansa e Volta Redonda), Baixadas Litorâneas (Saquarema, Araruama, Cabo Frio e Rio das Ostras), Norte (Macaé, Campos e São Fidélis) e Noroeste fluminense (Itaperuna, Bom Jesus do Itabapoana e Santo Antônio de Pádua).

Para o diretor de criação da agência Staff, Paulo Castro, a Alerj acertou em cheio ao redirecionar a linha de publicidade da Casa, passando a ter como foco o trabalho desenvolvido pelas comissões. "O humor e a irreverência são um jeito de chamar a atenção. Não é porque se trata de um serviço público que o anúncio tem que ser chato. A propaganda diferenciada é um modo de estar mais perto da população", explica Castro. O publicitário ressalta ainda o pioneirismo da Alerj. "Não conheço nenhuma instituição pública que adote uma linha como esta, mais irreverente. Somos um case no meio publicitário. E, para ousarmos assim, precisávamos de um cliente que apostasse na novidade", comemora. Esta parceria, pelo visto, ainda vai render muitos prêmios. REVISTA DA ALERJ

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Felipe Hanower / Agência O Globo

pa n orama Aula de democracia Rafael Wallace

No caminho das Índias De Casa Legislativa a salão indiano em poucas horas. Transformações como esta já não surpreendem os funcionários da Alerj, acostumados a conviver com gravações de novelas, filmes e minisséries que utilizam como cenário sua sede, o Palácio Tiradentes, construído em 1926. Desta vez a Casa recebeu a equipe da novela Caminho das Índias, da TV Globo, para gravar cenas onde os personagens, representados pelos atores José de Abreu, Osmar Prado e Nívea Maria, entre outros, percorrem as escadarias e corredores transformados em um hotel indiano, e se encontram no salão para uma reunião entre famílias. A obra, da novelista Glória Perez, estréia no dia 19 de janeiro. Diversas outras dependências do Palácio, como o Plenário Barbosa Lima Sobrinho, já serviram como locação para gravações e filmagens de obras como Olga, Senhora do destino, JK, Páginas da vida e, mais recentemente, a minissérie Maysa, da TV Globo, que vai ao ar também em janeiro de 2009.

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A quarta edição do Parlamento Juvenil da Alerj, realizada em dezembro de 2008, teve como tema central o combate ao aquecimento global. Participaram do evento 42 alunos dos ensinos médio e fundamental da rede pública estadual, que debateram e elegeram três projetos para serem apreciados pelo governador Sérgio Cabral e que poderão ser transformados em lei. Foram eles: o que cria a coleta de óleo vegetal saturado nas escolas da rede pública, de autoria de Dalmeire Andrade, de 14 anos, moradora de Paraty; o que determina que 20% da energia utilizada nas indústrias do estado devem ser de origem renovável, de Pedro Henrique Lopes, de 16 anos, morador de Bom Jardim; e o que dispõe sobre as fontes fixas de emissão de gases provocadores do efeito estufa e suas medidas compensatórias, como o plantio de árvores e campanhas educativas, de Brayan Lima, também de 16 anos, morador de Belford Roxo.

Cenário para Stallone O ator novaiorquino Sylvester Stallone, que esteve no Rio recentemente, fez questão de conhecer o Palácio Tiradentes, cenário de 80 anos de história política do País. A sede do Legislativo fluminense poderá ser locação do próximo Érica Ramalho filme de Stallone, que, além de atuar, será roteirista e diretor do longa, chamado The Expendables. O projeto terá a participação dos atores Jet Li (chinês) e Jason Statham (britânico). Ao lado de Stallone, o trio interpretará um grupo de mercenários que recebem a missão de derrubar um ditador na América do Sul. As filmagens estão marcadas para começar este semestre.


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